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Estigma e Diversidade Sexual Nos Discursos Dos (As) Profissionais Do SUS

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RITA DE CÁSSIA PASSOS GUIMARÃES

Estigma e Diversidade Sexual nos Discursos dos (as) profissionais do SUS


Desafios para a saúde da população LGBT

Brasília – DF
2018

1
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

Estigma e Diversidade Sexual nos Discursos dos (as) profissionais do SUS:


Desafios para a saúde da população LGBT

Tese apresentada como requisito para a obtenção do título


de Doutorado em Saúde Coletiva pelo programa de Pós-
Graduação em Saúde Coletiva da Universidade de Brasília

Orientadora: Dra. Ana Valéria Machado Mendonça


Co - orientadora: Dra. Flávia Bonsucesso Teixeira

Brasília - DF
2018

2
RITA DE CÁSSIA PASSOS GUIMARÃES

Estigma e Diversidade Sexual nos Discursos dos (as) profissionais do SUS:


Desafios para a saúde da população LGBT

Tese apresentada como requisito para a obtenção


do título de Doutorado em Saúde Coletiva pelo
programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva
da Universidade de Brasília.

Aprovada em Defesa de Tese dia 7 de novembro de 2018.

BANCA EXAMINADORA

Ana Valéria Machado Mendonça (presidente)


Universidade de Brasília

Flávia Bonsucesso Teixeira (co-orientadora)


Universidade de Uberlândia

Maria Fátima Sousa


Universidade de Brasília

Tatiana Lionço
Universidade de Brasília

Ana Maria Costa


Escola Superior de Ciências da Saúde do Distrito Federal

Dais Gonçalves Rocha


Universidade de Brasília (suplente)

3
DEDICATÓRIA

A tantas e tantos amigas e amigos de alma


que passam por cima da "imposição" de uma única forma de amar, pela coragem de
serem felizes e pela sorte de tê-las(os) perto.

As pessoas LGBT que cruzaram meu caminho no campo da pesquisa, por suas
resistências, forças e potencialidades e pelo aprendizado de vida sou grata!
E ás suas dores, sofrimentos e angústias por seus relatos de violência na saúde...
peço perdão...

Tenho esperança de recontar uma outra história, de ofertar uma outra forma de
cuidado mais humana e acolhedora que respeite e considere toda maneira de ser e amar.

4
AGRADECIMENTOS

À Grande Mãe, por abrigar generosamente diversas formas e manifestações de vida, aos
Orixás e ao babalorixá João por me acolher e abençoar em muitos momentos. Axé.

Ao meu grande bem, meu companheiro, meu amor... que me tira de abismo, segura minha
mão nos momentos mais angustiantes... e as vezes acredita em mim mas que eu mesma...
que respeita minha liberdade, acompanha meu vôo e que não me deixa cair.

Ao meu filho Peu, à minha mãe iluminada, às minhas manas e ao meu mano, aos meus
enteados, às minhas amigas e amigos pelas presenças e incentivos sempre, e a Yoda e Léia,
meu gato e minha gata que acompanharam docemente minha escrita em muitos momentos.

À minha orientadora Valéria pelo riso e confiança constantes, pelo apoio na pesquisa de
campo e por me abrir muitas portas pelo caminho.

À minha co-orientadora Flavinha pela delicadeza e firmeza, pelo olhar atento, sábio e
preciso, por sua sensibilidade e paixão na percepção do outro.

À querida professora Fátima por sua força, coragem e palavras de incentivo e confiança,
exemplo de mulher na luta pela justiça social.

À professora Dais querida, por tantos momentos me despertar o ânimo, pelo carinho, por me
mostrar caminhos seguros no fazer qualitativo e por sua iluminada presença.

Aos colegas de campo de pesquisa, às meninas e aos meninos do NESP pelo carinho,
trabalhos construídos e por acreditar em políticas e ações que contemplem o bem de todas e
todas, sem nenhuma forma de exclusão.

Aos colegas de doutorado que compartilharam momentos de incertezas, medos, risos


conquistas.

A Fabi do departamento de Saúde Coletiva sempre competente, carinhosa e querida no


acolhimento das nossas demanda.

A CAPES pelo auxilio financeiro.

5
RESUMO
O objetivo principal da presente tese foi investigar a percepção de médicos(as) e
enfermeiros(as) sobre a atenção à saúde ofertada à população de Lésbicas, Gays,
Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT) na Atenção Básica. Buscou, sobretudo,
perceber nas subjetividades geradoras dos discursos, a influência do processo patologizante
da sexualidade na geração de possíveis preconceitos e estigmas, como causadores de
prejuízo à qualidade da atenção à saúde desta população. A 13ª Conferência Nacional de
Saúde (2007) garantiu o acesso aos serviços de saúde, nos três níveis de atenção do SUS
para população LGBT, considerando suas vulnerabilidades causadas por estigma e
preconceito. A Política Nacional de Saúde Integral de LGBT (2011) tem como marca o
reconhecimento de que a discriminação por orientação sexual e por identidade de gênero
incide no processo de sofrimento e adoecimento decorrente do preconceito e do estigma
social, e apresenta em uma de suas diretrizes a eliminação destes com foco ao combate das
homofobias, inclusive a institucional. Mesmo após 28 anos da exclusão da
homossexualidade do código internacional de doenças, a literatura tem apontado uma
tendência à compreensão da condição ainda relacionada a patologias e grupos de risco para
doenças sexualmente transmissíveis, configurando barreiras simbólicas ao acesso e
qualidade da atenção. Estes são alguns dos marcos que potencializam a necessidade de
compreender como a patologização e estigma poderão agir nas subjetividades de
profissionais da saúde produzindo obstáculos à atenção a saúde integral a esta população e
assim contribuir para a elaboração de novas estratégias para a educação permanente que
mobilizem efetivamente tais estruturas subjetivas. Foram analisados as falas de 22
enfermeiros(as) e 21 médicos(as) nas regiões do Centro Oeste e Nordeste do País, através
da Análise de Discurso. O resultado permitiu verificar que para os profissionais: a
condição LGBT causa doença e transtornos mentais, estando também associada a
comportamentos moralmente condenáveis; os princípios da equidade e igualdade são
percebidos como antagônicos e nenhum dos(as) entrevistados(as) referiu ter sido
profissionalmente formados para o atendimento da população LGBT. Tais resultados
corroboram com nossa hipótese, de que a racionalidade biomédica, ela mesma,
influenciada por uma Scientia Sexualis, tal como descrita por Foucault, contribui para um
processo estigmatizador de deterioração das identidades, na forma descrita por Goffman, e
se revela nos discursos dos profissionais e em suas práticas de cuidado.
PALAVRAS-CHAVE: Sexualidade; Políticas de Saúde; Estigma Social; Sexismo;
Atenção Básica à Saúde
6
SUMMARY
The main objective of the present research is to investigate the perception of doctors and
nurses about the health care offered to the population of Lesbian, Gay, Bisexual,
Transvestite and Transsexual (LGBT) in Primary Care. It aims, above all, to perceive in
the subjectivities that generate the discourses, the influence of the pathologization process
of sexuality in the generation of possible prejudices and stigmas, as causers of prejudice to
the quality of health care of this population. The 13th National Health Conference (2007)
guaranteed access to health services at the three levels of attention of the Brasilian National
System of Health for the LGBT population, considering their vulnerabilities caused by
stigma and prejudice. The Politics National of Integral Health for LGBT population
(2011) is marked by the recognition that discrimination based on sexual orientation and
gender identity affects the process of suffering and illness due to prejudice and social
stigma, and presents in one of its guidelines the elimination of these with a focus on
combating homophobia, including institutional. Evenafter 28 years of exclusion of
homosexuality from the international code of diseases, the literature has pointed to a
tendency to understand the condition still related to to pathologies and risk groups for
sexually transmitted diseases, configuring symbolic barriers to access and quality of care.
These are some of the milestones that potentiate the need to understand how
pathologization and stigma can act in the subjectivities of health professionals, hindering
the health care integral to this population and thus contribute to the development of new
strategies for permanent education that effectively mobilize such subjective structures. The
speeches of 22 nurses and 21 doctors were analyzed in the regions of the Midwest and
Northeast of Brazil, through Discourse Analysis. The result showed that for the
professionals: the LGBT condition causes disease and mental disorders, being also
associated with morally condemnable behaviors; the principles of equity and equality are
perceived as antagonistic and none of the respondents said they have been professionally
trained to care for the LGBT population. These results corroborate our hypothesis that
biomedical rationality, itself, influenced by a Scientia Sexualis, as described by Foucault,
contributes to a stigmatizing process of identity deterioration, as described by Goffman,
and is revealed in the discourses of professionals and their care practices.
KEY-WORDS: Sexuality, Health Policy, Social Stigma, Sexism, Primary Health Care.

7
SIGLAS

AB Atenção Básica
AD Análise de Discurso
AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
ACS Agente Comunitário de Saúde
ANTRA Articulação Nacional de Travestis, Transexuais e Transgêneros
ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária
APA Associação Americana de Psicologia
CID Código Internacional de Doenças
CNES Conselho Nacional de Estabelecimento de Saúde
CNS Conferência Nacional de Saúde
CTA Centro de Testagem e Aconselhamento
CEP Comitê de Ética de Pesquisa
DAGEP Departamento de Apoio à Gestão Participativa
DSM Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mental
DATASUS Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde
DSS Determinante Sociais de Saúde
DST Doenças Sexualmente Transmissíveis
EPS Educação Permanente em Saúde
ESF Estratégia Saúde da Família
HIV Vírus da Imunodeficiência Humana
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDHM Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
IST Infecções Sexualmente Transmissíveis
LGBT Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
MS Ministério da Saúde
NESP Núcleo de Estudos em Saúde Pública
OMS Organização Mundial de Saúde
ONG Organização não Governamental
PACS Programa Nacional de Agentes Comunitário de Saúde
SEDH-PR Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República
SUS Sistema Único de Saúde

8
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UBS Unidade Básica de Saúde
UnB Universidade de Brasília
USF Unidade de Saúde da Família
UNB Universidade de Brasília
UNAIDS Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS

QUADRO

Quadro 1 – Distribuição do número e tipo de profissional por cidade envolvida____89

9
SUMÁRIO
1. APRESENTAÇÃO.....................................................................................................11
2. INTRODUÇÃO..........................................................................................................13
3. OBJETIVOS...............................................................................................................16
4. REFERENCIAL TEÓRICO E REVISÃO DE LITERATURA............................17
4.1 Dispositivos da Sexualidade, ScientiaSexualis e Heteronormatidade...................17
4.2 A Formação do Estigma Dirigido à Diversidade Sexual.......................................32
4.3 A Luta pela Despatologização das Identidades Sexuais Diversas e a Proposição da
"Cura Gay"........................................................................................................................40
4.4 Homofobia, a materialização do Estigma e seu impacto sobre a Saúde ...............48
4.5 A Trajetória do Movimento LGBT no Brasil até a implantação da Política Nacional
de Saúde Integral Da População LGBT............................................................................59
5. CONTEXTUALIZANDO O CAMPO......................................................................71
5.1 Estratégia de Saúde da Família e sua importância para as políticas de equidade..71
5.2 Campo: Organização da ABS e caracterização das populações nas cidades
envolvidas.........................................................................................................................75
6. MATERIAL E MÉTODO..........................................................................................83
6.1 Caminhos Metodológico.........................................................................................83
6.2 Participantes/Amostragem......................................................................................88
6.3 Entrevistas e Coleta de Dados................................................................................89
7. RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................................91
7.1. A condição LGBT causa doença...........................................................................92
7. 1.2 A condição LGBT causa transtornos mentais...............................................102
7.2 LGBT: ser um dissidente das normas permanece como comportamento moralmente
condenável..................................................................................................................... 105
7.3. A formação profissional para a atenção à população LGBT..............................108
7.3.1 Competências e capacitação para lidar com a população LGBT................ 108
7.2.2 Dificuldade em abordar a orientação sexual ............................................... 113
7.4 As UBS e os espaços de (des)atenção à Saúde LGBT........................................117
7.4.1 Contradições da UBS: nem igualdade, nem equidade. ............................... 117
7.3.2 Responsabilização da população LGBT pela baixa procura das UBS ....... 124
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................130
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 136

10
1. APRESENTAÇÃO

"O que fez a espécie humana sobreviver não foi apenas a inteligência, mas a
nossa capacidade de produzir diversidade."
Mia Couto

O labor como enfermeira me trouxe experiências diversas e me permitiu vivenciar o


cuidado integral do ser humano. Desde o uso das mais complexas tecnologias para salvar
vidas durante minha atuação por sete anos em unidades de terapias intensiva, até atividades
de prevenção e promoção a saúde como coordenadora do antigo Programa Nacional de
Agentes Comunitário de Saúde (PACS) e gestora em controle domiciliar de pacientes
crônicos em uma seguradora de saúde do setor público na modalidade de autogestão. A
minha dissertação em Especialização em Enfermagem Clinico Cirúrgica teve como título
“Apoio Emocional ao paciente em UTI” e a teoria das necessidades humanas básicas de
Wanda Horta, a qual incluía aspectos psicossociais, além do biológico, reforçava essa
perspectiva de atenção integral em minha trajetória.
Ainda trabalhando com saúde, as angustias na procura do entendimento do outro e de
mim mesma, me levaram ao encontro de uma formação profissionalizante em teatro,
seguido de um mestrado em artes cênicas na Universidade Federal da Bahia. Na arte teatral,
a necessidade de se distanciar dos aspectos específicos do eu, de esvaziara própria
personalidade para interpretar, “encarnar” o personagem, exigia um exercício intenso de
compreensão, um mergulho profundo na alma do outro, mesmo que este outro fosse de
complexidade e vivências bem divergentes das minhas. Também o “meio teatral”
democrático e inclusivo, por tradição e essência, me possibilitou a oportunidade de
convivência e formação de vínculos de empatia e amizade com gays e lésbicas, dentro de
um espaço de expressão onde a população LGBT parecia ter voz, brilho e autoestima, o que
enriqueceu minha existência através desses elos emocionais que me permitiram conhecer,
em maior profundidade, as dores e alegrias da diversidade humana, e que me proporcionou
uma vivência ilustrada com lágrimas, risos e criatividade. E ainda que esse “solo sagrado”
do teatro não fosse imune aos perigos de uma sociedade marcada pelo machismo,
intolerância e heterosexismo, pude observar nele um maior respeito e compreensão das
diversidades sexuais.
Assim a formação e experiência tanto em saúde como em artes cênicas forjaram em
mim a sensibilidade à alteridade, fosse pelo cuidado ofertado ao outro na assistência à saúde,

11
fosse pelo ofício de “interpretar”, de “dar vida a um outro”, pacientes e personagens com
vivencias socioeconômicas, culturais e comportamentais bastante diferente das minhas.
O sentido de alteridade que permeava minhas ações tanto como enfermeira, quanto
como atriz era exatamente este de enxergar o outro na completude de sua dignidade,
considerando as dores, angústias, doenças e dramas. Por isso, sempre me impressionou o
fato de nos serviços de saúde, onde se deveria primar pela equidade da oferta, e onde se
pressume que o profissional esteja devidamente preparado para atender a todos e todas com
respeito e competência eram tão frequentes preconceitos, discriminações e estigmas com
populações vulneráveis de diversas naturezas e muito especialmente com a população
LGBT, além do pouco ou nenhum investimento na capacitação dos profissionais para atuar
em contextos de diversidade.
Assim sendo, ao decidir seguir minha formação profissional a partir de um
Doutorado em Saúde Coletiva, enquanto primeiro passo para o desenvolvimento futuro de
projetos em que elementos do teatro possam ser utilizados como ferramenta para
sensibilização e capacitação profissional no respeito à diversidade, o tema da atenção à
saúde da população LGBT, se tornou extremamente atrativo.
A presente pesquisa, braço de uma pesquisa maior intitulada “Análise do acesso e da
qualidade da Atenção Integral à Saúde da população LGBT no Sistema Único de Saúde”
conduzido pelo Núcleo de Estudos em Saúde Pública (NESP) da Universidade de Brasília
(UNB), com parceria de universidades públicas em todas as regiões do país, me permitirá
investigar elementos que se cruzam nas entrelinhas dos fazeres do profissional de saúde
forjando a constituição de suas subjetividades, com vistas a desenvolver futuramente
estratégias de educação permanente que ultrapassem a dimensão puramente normativa e
cognitiva do conhecimento de regras ou diretivas de políticas, contribuindo assim, para a
transformação dos aspectos que na formação das subjetividades são as responsáveis pelas
condutas discriminatórias, adotadas de forma conscientes ou não.

12
2. INTRODUÇÃO

Já está bem estabelecido na literatura que a discriminação e o estigma aos


comportamentos sexuais que divergem do padrão heteronormativo, além de ser um
determinante de saúde, uma vez que implica em vulnerabilidades específicas e carrega
forte potencial para causar sofrimento psíquico, constituem também uma forma de barreira
simbólica ao acesso 1,2,3 comprometendo o cumprimento dos princípios de integralidade,
universalidade e equidade. Foi na 13ª Conferência Nacional de Saúde (CNS) em 2008,
quando finalmente, pela primeira vez, a orientação sexual e a identidade de gênero são
incluídas na análise da determinação social da saúde4.
No ano de 2010 o Ministério da Saúde (MS) publicou a Política Nacional de Saúde
Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT)5, resultado da luta
da sociedade civil organizada, representado pelos movimentos sociais, e do Estado. Entre
os antecedentes desta política, vale ressaltar o lançamento em 2004, pela Secretaria
Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH-PR), do programa
Brasil sem Homofobia6, também fruto da articulação sociedade civil e Estado, e um marco
para fortalecimento da cidadania, direitos e dignidade para população LGBT.
A política, entretanto, existe agora há oito anos e foi construída para incidir em
todos os três níveis de complexidade da atenção à saúde, estabelecendo ações e
responsabilidade específicas nas três esferas de governo e contemplando, portanto, toda a
organização da atenção e execução de práticas de saúde no âmbito do SUS.
Estudos demonstram7,8,9 que enquanto na etapa de elaboração da política, o diálogo
com lideranças e movimentos sociais facilitaram a construção de um texto de qualidade,
capaz de dar cobertura às principais demandas da população alvo, a implementação efetiva
das ações se depara com resistências políticas locais, motivadas por posições morais
muitas vezes de ordem religiosa, bem como nas subjetividades que envolvem funcionários
e profissionais de saúde, refletidas em condutas muitas vezes discriminatórias e
estigmatizantes. O impacto dessas condutas faz-se sobre a qualidade do acolhimento e da
assistência, além de constituir-se como uma barreira simbólica ao acesso desse grupo
populacional aos serviços e impedir, por provocar a omissão da informação da orientação
sexual pelos pacientes, a geração de dados fidedignos sobre a morbidade nesse grupo
populacional.

13
Foucault em sua obra clássica História da Sexualidade 10 apresenta a sexualidade
como uma construção histórica e cultural, cujo saberes em torno dela são produzidos de
forma discursiva, de maneira a dar sentido ao exercício do poder. Neste sentido ele cria o
conceito de dispositivo de sexualidade, que compreende um conjunto de elementos
intencionalmente diversos e organizados discursivamente para envolver normas
administrativas, regras institucionais, pressupostos científicos, formulações filosófico
morais, onde um jogo de enunciados se autorregulam através daquilo que se pode ou não
se pode dizer, num movimento de afirmações e interdições. Neste sentido o dispositivo da
sexualidade opera seus mecanismos associando a homossexualidade a ideia de perversão, e
seus enunciados moldariam discursos médicos e jurídicos, estendendo-se o biopoder e suas
consequentes decisões biopolíticas à expressão da diversidade sexual dispersas nas
populações.
Para Spargo11 entre o final do século XIX e início do século XX, a expressão da
homossexualidade foi definitivamente patologizada pela medicina enquanto
comportamento desviante da natural heterossexualidade, uma forma de perversão sobre a
qual deveria incidir tratamentos. É interessante notar, que a homossexualidade esteve
presente no Código Internacional de Doenças (CID) até os anos 80 do século passado,
tendo sido constante no bojo da luta dos movimentos sociais da população LGBT em torno
do agravamento dos preconceitos durante a explosão da pandemia da AIDS. Desta forma,
ainda que a história, as ciências sociais e a antropologia tenham demonstrado que a
homossexualidade é uma expressão da sexualidade presente em todas as civilizações
através dos tempos, permanece na contemporaneidade, uma racionalidade que compreende
a heterossexualidade como natural, como norma moral e científica e, portanto, como
comportamento para o qual não se necessita de explicação, enquanto as demais formas de
expressão da sexualidade precisam ser justificadas, estudadas, classificadas e definidas.
O discurso jurídico e médico associam-se ao discurso religioso nesse processo de
desnaturalização da homossexualidade e juntos vem exercendo pressões através das
décadas sobre as informações circuladas e sobre a educação das pessoas. Prado Filho12
argumenta que as religiões, e em especial o cristianismo não se limitam a questões de
dogmas internos e cultos de fé, mas se constitui como proponente protagonista de valores e
modos de vida incidindo fortemente sobre a constituição das subjetividades e das relações
interpessoais.

14
No Brasil é patente essa influência que se dá tanto nessa dimensão intersubjetiva
descrita por Prado Filho12, como na dimensão propriamente política através, sobretudo, da
oposição de partidos e associações políticas de caráter religioso cristão e suas formas de
pressão sobre decisões legislativas e executivas relacionadas ao combate ao preconceito e a
discriminação. No atual cenário brasileiro, Lionço13 aponta as danosas consequências do
impacto do discurso religioso de viés fundamentalista na pauta política, além infringir os
princípios democráticos, provoca contundentes retrocessos de direitos humanos, sobretudo
em grupos marcados por vulnerabilidades históricas como as minorias sexuais, mulheres e
população negra.
Considerando-se a grande expressividade das religiões cristãs na sociedade
brasileira, pode-se estimar o grau de influência exercida por essa visão heteronormativa da
sexualidade no Brasil. A literatura especializada14,15,16 denuncia os sofrimentos vividos por
membros da população LGBT, dificuldade de acesso, redução da qualidade de
atendimento, e de argumentações contrárias à medicalização ou psiquiatrização dos
comportamentos e em defesa dos direitos desta população.
Tanto a literatura 17 , 18 quanto a própria Política Nacional de Saúde Integral da
População LGBT dão ênfase à necessidade de reformas curriculares e estabelecimento de
campanhas e programas de educação permanente para profissionais de saúde. Em função
da realidade de um preconceito encarnado na sociedade e sustentado em discursos
religiosos, científicos e em diversas manifestações na mídia de massa, a efetivação das
ações em curto e médio prazo depende do desenvolvimento de um programa educacional
para profissionais de saúde, o qual deve ser tratado como uma prioridade e ultrapassar a
mera realização de campanhas e inclusão de informações em material didático.
A elaboração de programas de educação permanente no curso de implantação da
Política Nacional de Saúde Integral da População LGBT propondo estratégias mais
adequadas a uma reflexão aprofundada dos profissionais sobre o tema, com capacidade de
abalar a rigidez dos preconceitos desenvolvidos em toda uma história de vida, necessita de
um conhecimento sobre como se estrutura as práticas discursivas e as condutas
discriminatórias e como eles vão impactar as relações de assistência com a população
LGBT em todos os níveis de complexidade.
Deste problema emergiram as questões norteadoras da presente tese: 1. Qual a
percepção de médicos(as) e enfermeiros(as) que atuam na Atenção Básica sobre a relação
entre diversidade sexual e saúde? 2. De que modo a noção de patologização, e outros

15
estigmas associados à diversidade sexual, influenciam as práticas assistenciais? 3.
Médicos(as) e enfermeiros(as) da atenção básica sentem-se capacitados profissionalmente
para o cuidado com pacientes LGBT? A partir dessas questões foram estabelecidos os
objetivos da pesquisa que compõe a presente tese.

3. OBJETIVOS
Geral
Compreender a percepção de médicos(as) e enfermeiros(as) que atuam na Atenção
Básica sobre a atenção à saúde ofertada à população LGBT no Sistema Único de Saúde
(SUS) em quatro municípios das regiões do Centro Oeste e Nordeste do País.

Específicos
3.1 Analisar a percepção de médicos(as) e enfermeiros(as) da atenção básica sobre
diversidade sexual;

3.2 Identificar os efeitos dessa percepção no reconhecimento das demandas em


saúde para população LGBT na atenção básica;

3.3. Analisar a percepção dos profissionais sobre sua formação/qualificação para


atender as diretrizes da Política Nacional de Saúde Integral da População LGBT.

16
4. REFERENCIAL TEÓRICO E REVISÃO DE LITERATURA

4.1 Dispositivos da sexualidade, scientia sexualis e heteronormatividade

O filósofo francês Michael Foucault nos fornece um estudo relevante sobre a


História da Sexualidade, na tentativa de compreender e desvelar os mecanismos que
corroboraram para a exacerbada racionalidade conferida ao sexo, sustentando o estudo no
regime de poder-saber-prazer sobre a sexualidade humana. Seu trabalho é importante para
a presente tese na medida em que permite uma compreensão do dispositivo da sexualidade,
enquanto mecanismo de normatização, através do qual o poder sobre os corpos se exerce,
determinando a legitimidade e ilegitimidade das práticas sexuais e o lugar de patologia ou
crime reservado às chamadas "sexualidades periféricas".
Se busca através desse referencial contribuir para a compreensão de como a
produção de discursos sobre sexualidade considerados socialmente úteis e definidores do
normal e do patológico contribuíram para a formação de subjetividades estigmatizantes em
relação a indivíduos e grupos cuja expressão da sexualidade ou a busca de prazer e afeto
erótico não correspondem ao padrão de casal heterossexual. Acredita-se que as barreiras
simbólicas ao acesso da população LGBT e os problemas na qualidade da atenção à saúde
que lhes é dedicada tem sua base na influência sobre as subjetividades dessa normatização
exercida pelo dispositivo da sexualidade, considerando-se a participação da religião, do
direito e da medicina, em sua constituição.
Será de interesse especial aqui analisar a participação da medicina e da psiquiatria
neste dispositivo de poder, por meio da constituição de uma "Scientia Sexualis", uma vez
que a mesma influenciou toda a racionalidade médica, e pode, portanto, ter uma
contribuição significativa sobre a formação de estigmas contra a população LGBT no
campo da saúde.
A obra a História da Sexualidade é formada por três volumes: 1. A Vontade de
Saber; 2. O Uso dos Prazeres; 3. O Cuidado de Si. No primeiro livro Foucault propõe uma
abordagem inteiramente original em relação ao que tinha sido produzido até então sobre a
história da sexualidade, questionando o que ele chama de “hipótese repressiva”, afirmando
que, em lugar de silêncio e censura, a história da sexualidade nos últimos três séculos do
ocidente centra-se na verdade em uma explosão de discursos considerados socialmente
úteis em torno das sexualidades e onde a elaboração de uma Scientia Sexualis constitui a
base de ações médicas, pedagógicas e jurídicas.
17
No segundo livro mantendo o foco na investigação da noção de sexualidade nas
sociedades ocidentais modernas, o autor problematiza a moral dos prazeres retornando à
época clássica da Grécia examinando como o domínio da moral e dos modos de
subjetivação agem no desejo, propondo o que ele denomina uma “hermenêutica do desejo”
e do sujeito desejante. Já no último volume, Foucault buscará investigar o processo de
subjetivação direcionado ao próprio corpo, a partir da produção discursiva ocorrida em
especial no império romano em seus dois primeiros séculos.
Foucault começa seu volume “A vontade de saber”19 pela descrição detalhada da
“hipótese repressiva”, segundo a qual até o início do século XVII, as práticas da
sexualidade estavam socialmente expostas, havia uma maior tolerância com aquelas
consideradas ilícitas, havia menor rigor na definição da obscenidade ou das indecências.
Gestos e discursos desavergonhados encontravam-se facilmente presente na vida social,
“os corpos pavoneavam” (ibdem, p. 9). No correr dos séculos XVII e XVIII e chegando ao
auge no século XIX, teria se desenvolvido um processo de aprisionamento da sexualidade
no interior da família conjugal burguesa, a partir da qual se teria estabelecido para ela uma
função eminentemente procriadora que legitima o casal adulto heterossexual. Ele passaria a
ser o modelo, a norma, a verdade, instaurando-se em torno das práticas sexuais, o segredo
e o silêncio.
Foucault afirma que essa hipótese vinha sendo aceita até então pela facilidade em
defendê-la a partir de uma articulação histórica e política com o desenvolvimento do
capitalismo. A repressão do sexo teria encontrado sentido no fato de que as práticas livres
dissipariam a energia que precisava ser aproveitada na exploração dos corpos para o
trabalho através desses prazeres, tornando-se incompatível com o projeto capitalista. O
prazer então passa a ser restrito à prática procriadora.
Assim, ele irá começar seu questionamento sobre essa hipótese, afirmando que
“dizer que o sexo não é reprimido, ou melhor, dizer que entre o sexo e o poder a relação
entre eles não é de repressão, corre o risco de ser apenas um paradoxo estéril” (ibdem, p.
13). Foucault vai partir da tentativa de compreender porque as sociedades ditas modernas,
que sofreram esse processo transformador repressivo, vem há mais de um século buscando
demonstrar a hipocrisia dessa repressão, falando prolixamente sobre seu próprio silencio,
se esforçando tanto em detalhar aquilo que não diz sobre o sexo, denunciando os poderes
que exercem a repressão e ameaçando-se sempre abandonar o cumprimento das leis que a
instauram. A partir daí, Foucault vai definir seu projeto como sendo o de apresentar um

18
panorama não apenas dos discursos da repressão e seu enfrentamento, mas também a
vontade por trás desses discursos e suas estratégias de disseminação. O que ele quer é
entender, por qual meio essa sociedade vem afirmando positivamente a negação da
sexualidade, expondo tão ostensivamente sua ocultação, dizendo tão frequentemente que a
silenciamos e tudo isso formulado com palavras que desvelam uma realidade cada vez
mais explícita, reforçando seus poderes e efeitos.
O ponto essencial para Foucault não é necessariamente se contrapor à hipótese
repressiva, mas antes compreender a sexualidade a partir da dinâmica de produção dos
discursos e suas estratégias, a relação dos mesmos com o poder e com o prazer, enfim o
sexo estruturado como discurso.

Daí o fato de que o ponto essencial (pelo menos, em primeira instância) não é tanto
saber o que dizer ao sexo, sim ou não, se formular-lhe interdições ou permissões,
afirmar sua importância, ou negar seus efeitos, se policiar ou não palavras
empregadas para designá-lo; mas levar em consideração o fato de se falar de sexo,
quem fala, os lugares e os pontos de vista de que se fala, as instituições que a
incitam a fazê-lo, que armazenam e difundem o que dele se diz, em suma, o “fato
discursivo” global, a “colocação do sexo em discurso. (ibdem, p. 16)

O autor deixa claro que a repressão, a interdição, o mutismo sobre a sexualidade na


época clássica não é uma ilusão, e o que é ilusão é fazer apenas fazer desta hipótese
repressiva o elemento substancial e formativo a partir do qual poderia se escrever a história
da sexualidade na Idade Moderna.

Destarte, a questão que importa aqui não é precisar se esses efeitos de poder e
essas produções discursivas levam a formulação da verdade sobre o sexo ou, ao
contrário, mentiras destinadas a escondê-lo, mas a vontade de saber que lhe
serve ao mesmo tempo de estrutura e apoio. (ibdem, p. 17 - grifo nosso).

Ele retira, portanto, a hipótese repressiva do lugar de elemento fundamental


para a compreensão da história da sexualidade e transpõe para esse lugar a profícua
produção discursiva do período, sua economia, dinâmica e estratégias.

É necessário deixar bem claro: não pretendo afirmar que o sexo não tenha sido
proibido, bloqueado, mascarado ou desconhecido desde a época clássica; nem
mesmo afirmo que a partir daí ele o tenha sido menos do antes. Não digo que a
interdição do sexo é uma ilusão; e sim que a ilusão está em fazer da interdição o
elemento fundamental e constituinte a partir do qual se poderia escrever a história
do que foi dito do sexo a partir da idade moderna. (ibdem, p. 17)

Ou seja, em lugar de um projeto de dominação da sexualidade baseado no silêncio


sobre o sexo, no bloqueio à circulação dos discursos, proibições, mutismos e censuras, o

19
que viria a ocorrer, sobretudo a partir do século XVII, é antes esse processo de “colocação
do sexo em discurso”. A sexualidade foi crescentemente incitada. As estratégias de poder
em lugar de operar uma seleção rigorosa sobre a sexualidade e submetê-la a uma forte
restrição, preferiu constituir uma ciência da sexualidade, por meio da qual e a despeito de
seus tantos erros, buscava descrever em detalhes as práticas variantes e as sexualidades
polimorfas, disseminando informações e classificando-as a partir delas.
Esta scientia sexualis foi a técnica de poder a partir da qual expressou-se com maior
vigor a “vontade de saber” na modernidade, o que teria deslocado a confissão religiosa de
seu lugar central. Assim, teria surgido uma “incitação ao discurso” que veio culminar mais
tarde em uma verdadeira “explosão discursiva”.
Dessa maneira, os processos restritivos, a determinação de quem pode falar, quando
e onde falar, faz parte do próprio jogo discursivo e não do silêncio estabelecido em torno
do sexo.

É preciso ficar claro. Talvez tenha havido uma depuração — e bastante


rigorosa — do vocabulário autorizado. Pode ser que se tenha codificado
toda uma retórica da alusão e da metáfora. Novas regras de decência, sem
dúvida alguma, filtraram as palavras: polícia dos enunciados. Controle
também das enunciações: definiu-se de maneira muito mais estrita onde e
quando não era possível falar dele; em que situações, entre quais locutores,
e em que relações sociais; estabeleceram-se, assim, regiões, senão de
silêncio absoluto, pelo menos de tato e discrição: entre pais e filhos, por
exemplo, ou educadores e alunos, patrões e serviçais. É quase certo ter
havido aí toda uma economia restritiva. Ela se integra nessa política da
língua e da palavra espontânea por um lado e deliberada por outro [...]
(ibdem, p. 21)

Ele discutirá ainda como esta paradoxal explosão discursiva ocorre em plena época
de expansão burguesa e seus valores conservadores de forte rigor e moral religioso.
Demonstrando também que é nesse período de tentativa de controle e domínio da
sociedade moderna sobre o sexo, que surgem, por exemplo, na literatura de um marquês de
Sade, os discursos mais profícuos, libidinosos e profundos em torno de práticas periféricas
da sexualidade.

[...] o cerceamento das regras de decência provocou, provavelmente, como


um contra efeito, uma valorização e uma intensificação dos discursos
indecentes. Mas o essencial é a multiplicação dos discursos sobre sexo no
próprio campo do exercício do poder; incitação institucional a falar do sexo
e a falar dele cada vez mais; obstinação das instâncias de poder a ouvir falar
e a fazê-lo falar ele próprio sob a forma de articulação explicita e do detalhe
infinitamente acumulado [...](ibdem,p.28)

20
Entretanto, Foucault afirmará também que o mais importante é analisar como o
exercício do poder fomentou a multiplicação dos discursos sobre o sexo, como as
instâncias de poder passaram a falar cada vez mais nele, e a desenvolver mecanismos
eficientes de escuta, de fazer os sujeitos descreverem, em detalhes, desejos, formas e
práticas sexuais: “ O que é próprio das sociedades modernas não é o terem condenado o
sexo a permanecer na obscuridade, mas sim o terem-se devotado a falar dele sempre,
valorizando-o como o segredo” (ibdem, p. 36).
Foucault identifica três grandes códigos de conduta que regiam as práticas sexuais
ao final do século XVIII: o direito canônico, a pastoral cristã e a lei civil.
Independentemente das diferenças de natureza desses três códigos, o que importava aqui
era uma distinção objetiva do que era lícito e ilícito, sendo que as relações heterossexuais
matrimoniais tornaram-se o eixo central para o desenvolvimento dos critérios de distinção.
Surge então uma sobrecarga de regras mesmo para o cumprimento do “dever
matrimonial”, e desobedecê-las, seja no sentido de lesar essa aliança sagrada e
juridicamente reconhecida, até o sentido de “desvios da gentilidade” variava entre o
pecado e o crime, no sentido da condenação. Tanto a infidelidade, quanto o estupro, ou a
homossexualidade eram passíveis de pena condenatória, sendo que obviamente, os desvios,
considerados contra a natureza, como a sodomia, ou a “inversão de gênero”, tinham um
estatuto de gravidade ainda maior.
Desta forma, se havia direito a silêncio, segredo e discrição quanto à sexualidade,
ele era exclusivo do casal heterossexual adulto cristão.

O casal legítimo, com sua sexualidade regular, tem direito à maior


discrição, tende a funcionar como uma norma mais rigorosa talvez, porém
mais silenciosa. Em compensação o que se interroga é a sexualidade das
crianças, a dos loucos e dos criminosos; é o prazer dos que não amam o
outro sexo; os devaneios, as obsessões, as pequenas manias ou as grandes
raivas. Todas estas figuras, outrora apenas entrevistas, têm agora de avançar
para tomar a palavra e fazer a difícil confissão daquilo que são. (ibdem,
p.25)

Participavam desse dispositivo de controle diversas instâncias, entre as quais as


principais eram a igreja, o Estado (com suas políticas e leis), a escola, a medicina, as três
últimas mais especialmente fundamentadas em uma ciência da sexualidade. Foucault falará
de uma “incitação política, econômica e técnica, a falar de sexo” (ibdem, p.26), interessada
em analisar, contabilizar, classificar e especificar práticas e desejos.

21
Nesse processo, primeiro foi desenvolvido uma espécie de extensão da confissão.
Os chamados pecados da carne passam a ter maior importância para a penitência.

A todas as insinuações da carne: pensamentos, desejos, imaginações


voluptuosas, deleites, movimentos simultâneos da alma e do corpo, tudo
isso deve entrar, agora, e em detalhe, no jogo da confissão e da direção
espiritual. (...) Uma dupla evolução tende a fazer, da carne, a origem de
todos os pecados e a deslocar o momento mais importante do ato em si para
a inquietação do desejo, tão difícil de perceber e formular; pois que é um
mal que atinge todo o homem e sob as mais secretas formas [...] (ibdem, p.
23)

Busca-se com isso atingir um imperativo de conduta que não pretende apenas
conhecer as práticas contrárias a lei, mas converter o próprio desejo em discurso, fazer
circular no exterior aquilo sobre o sexo que está aprisionado nas mentes.
O Estado participa do processo, transformando o sexo, a partir do século XVIII em
“questão de polícia”, buscando fundamentar seus regulamentos no conhecimento sobre o
sexo. A intitulada “polícia do sexo” não tem aqui o sentido da repressão da desordem, mas
de organização do coletivo, por meio da regulação do sexo baseada na produção de
discursos públicos de utilidade social. O surgimento da categoria “população” integra-se
aqui. O Estado passa então a analisar a taxa de natalidade, contabilizar filhos legítimos e
ilegítimos, identificar momento de início e frequência das relações sexuais, estudar os
efeitos das proibições, as práticas secretas, incluindo aqui as “perversões” e os métodos
anticonceptivos. É o biopoder exercido por meio de uma biopolítica pensada para a
sexualidade humana.

Mas é a primeira vez em que, pelo menos de maneira constante, uma


sociedade afirma que seu futuro e sua fortuna estão ligados não somente ao
número e à virtude dos cidadãos, não apenas às regras de casamentos e à
organização familiar, mas à maneira como cada qual usa seu sexo. (...)
Surge a análise das condutas sexuais, de suas determinações e efeitos, nos
limites entre o biológico e o econômico. (...) Que o Estado saiba o que se
passa com o sexo dos cidadãos e o uso que dele fazem e, também, que cada
um seja capaz de controlar sua prática. Entre o Estado e o indivíduo o sexo
tornou-se objeto de disputa, e disputa pública; toda uma teia de discursos,
de saberes, de análise e de injunções o investiram. (ibdem, p. 28-29)

O colégio e sua pedagogia constituirão outro espaço institucional que integra esse
dispositivo da sexualidade. Foucault dirá que ao analisarmos sua política pedagógica no
século XVIII, teríamos uma primeira impressão de que seria um espaço onde se praticaria
um certo mutismo em torno do sexo. Entretanto, ao se analisar mais profundamente sua

22
estrutura arquitetônica, sua organização e seus regulamentos para disciplinar condutas e
comportamentos, conclui-se pelo fato da sexualidade das crianças ser o elemento
estruturante principal.

[...] o discurso interno da instituição — o que ela profere para si mesma e


circula entre os que a fazem funcionar — articula-se, em grande parte,
sobre a constatação de que essa sexualidade existe: precoce, ativa,
permanente. (ibdem, p.30).

Como exemplo o autor cita a organização das salas, dos dormitórios, dos horários
de recreio e de recolhimento, com a separação ou não, mesmo entre as crianças menores,
sendo principalmente por conta desta constatação de uma sexualidade existente e
socialmente inadequada. Assim, o sexo do colegial, passa a tornar-se um problema público,
sobre o qual médicos e professores dedicam-se a produzir discursos normalizadores,
incluindo propostas que Foucault nomeia de “ortopedia discursiva”, a qual seria um plano
pedagógico para que a criança e o jovem adquiram e reproduzam, eles mesmos um
discurso correto, verdadeiro e útil sobre o sexo.

Seria inexato dizer que a instituição pedagógica impôs um silêncio geral ao


sexo das crianças e dos adolescentes. Pelo contrário, desde o século XVIII
ela concentrou as formas do discurso neste tema; estabeleceu pontos de
implantação diferentes; codificou os conteúdos e qualificou os locutores.
Falar do sexo das crianças, fazer com que falem dele os educadores, os
médicos, os administradores e os pais. Ou então, falar de sexo com as
crianças, fazer falarem elas mesmas, encerrá-las numa teia de discurso que
ora se dirigem a elas, ora falam delas, impondo-lhes conhecimentos
canônicos ou formando, a partir delas, um saber que lhes escapa — tudo
isso permite vincular a intensificação dos poderes à multiplicação do
discurso. (ibdem, p.31)

É inegável a importância desse processo educacional que ainda hoje apresenta


elementos importantes na constituição de subjetividades estigmatizadoras em relação às
expressões da sexualidade externas à normatividade procriadora e matrimonial. O bulling
de nossos dias, ocorrido nas escolas em relação às expressões da diversidade não
heterossexual, tem sem nenhuma dúvida, suas origens nesse processo. O Brasil vem
sofrendo uma constante interdição política a que materiais e conteúdos programáticos que
visem combater a discriminação e defender a diversidade façam parte dos projetos
pedagógicos das escolas públicas. E outra vez não é o silêncio que se impõe e sim o
confronto de discursos sobre as “sexualidades periféricas”.

23
Não obstante, para o propósito da presente tese, interessa ainda mais a participação
da medicina e sua Scientias Sexualis neste dispositivo de poder. Mesmo sobre o casal
considerado legítimo, segundo Foucault, a medicina tomou como objetivo a caracterização
das formas normais de busca de prazer, criou patologias orgânicas e mentais originadas na
falta ou incompletude das práticas, criou mecanismos de vigilância sobre “formas de
prazer anexos”, investigou os instintos, seu desenvolvimento, seus distúrbios. Mas foi
ainda mais rigorosa em suas pesquisas para explicar, nomear, classificar e determinar
práticas e desejos que circulassem fora dessa constituição do casal legítimo. Foi assim que
todas as sexualidades periféricas passaram a carregar o estigma da “loucura moral”, da
“neurose genital”, da “degenerescência” ou do “desequilíbrio psíquico”, todos esses,
termos encontrados por Foucault em documentos médicos-psiquiátricos do período.
A ciência da sexualidade, com seus mecanismos de poder instaurados sobre o corpo
e o sobre o sexo, surge como necessidade de classificar e de nominar qualquer
“anormalidade” ou desvio da sexualidade. Segundo Foucault, sua interdição e censura é
antes uma de suas consequências que um de seus objetivos. Mas é também sobre essa
ciência que passa a se apoiar a lei, as condenações, as terapêuticas. O que antes podia ser
no âmbito da religião ou do direito considerado pecado e má conduta, passa agora a ser um
dos critérios centrais de definição da identidade dos sujeitos, como caráter definidor de
uma patologização do gênero, um transtorno de confusão interna entre feminino e
masculino e torna-se, por isso, uma nova forma de especificar o individuo inteiro e não
simplesmente suas práticas de prazer.

Esta nova caça às sexualidades periféricas provoca a incorporação das


perversões e nova especificação dos indivíduos. A sodomia — a dos
antigos direitos civil ou canônico — era um tipo de ato interdito e o autor
não passava de seu sujeito jurídico. O homossexual do século XIX torna-se
uma personagem: um passado, uma história, uma infância, um caráter, uma
forma de vida; também é morfologia, com uma anatomia indiscreta e,
talvez, uma fisiologia misteriosa. Nada daquilo que ele é, no fim das contas,
escapa à sua sexualidade. (ibdem, p.42)

Esse giro de perspectiva trazido pela ciência da sexualidade tem uma importância
fundamental também na geração dos estigmas ou do preconceito, que deixam de dirigir-se
às práticas de prazer para atingir agora as próprias identidades, os próprios indivíduos e
seus semelhantes, estejam eles ou não organizados em grupos.
Mas não só a homossexualidade, como qualquer sensação ou desejo diferente
daquele do heterossexual, monogâmico e destinado à reprodução, necessitavam de uma

24
nomeação, de uma classificação e de uma possível patologização, até mesmo os atos mais
solitários, como o onanismo (masturbação), como também, a prostituição e as relações
extraconjugais. Toda esta construção social e científica sobre as “sexualidades periféricas”
eram fomentadas por mecanismos de prazer que não se dissociava em nenhum momento
dos mecanismos de poder. O prazer da escuta de cada detalhe, da penitência, da
condenação, da busca de cura, se associa ao poder de normatizar os corpos, de organizar as
populações.

Há, sem dúvida, aumento da eficácia e extensão do domínio sob controle,


mas também sensualização do poder e benefício de prazer. O que produz
duplo efeito: o poder ganha impulso pelo seu próprio exercício; o controle
vigilante é recompensado por uma emoção que o reforça; a intensidade da
confissão relança a curiosidade do questionário; o prazer descoberto reflui
em direção ao poder que o cerca. (ibdem, p.44)

As preocupações políticas e morais consistiam em fomentar o poder sobre o corpo


para que a sexualidade ideal fosse mantida nos termos biologicistas, heterossexuais e
imutáveis, e mais uma vez aqui se repete a prolixidade, além dos discursos, também sobre
o poder em suas diversas ramificações. A medicina, a psiquiatria, a justiça, enfim, diversas
instâncias no esforço de consolidar e controlar as “sexualidades periféricas" provocaram
também a sua multiplicação e disseminação.
No entanto, de todas estas instâncias de poder, o discurso científico foi sem dúvida
o mais dominante, não por discorrer sobre a própria sexualidade humana, mas, sobretudo
por classificar uma imensa lista de “transtornos sexuais” e “anomalias”, que iam da
zoofilia até as pequenas manias mais solitárias ou aos atos disfarçados dos tímidos,
provocando muito mais temor e medo à sociedade do que o reconhecimento do seu corpo e
de seus prazeres legítimos.
Apenas para ilustrar o “peso” das Ciências Sexuais, importante alicerce onde
Foucault desenvolve suas discussões, o também psiquiatra alemão Krafft-Ebing, torna-se
reconhecido por seu livro Psychopathia Sexualis (1886) 20, cuja primeira edição foi no ano
de 1886. Nesta obra Krafft discorre sobre “sensibilidade sexual contrária” e propõe uma
tabela esquemática dos transtornos sexuais em sua obra com a seguinte definição da
homossexualidade: Senso sexual fraco ou nulo por outro sexo e substituição para uma
inclinação sexual pelo mesmo sexo (Senso Homossexual ou Invertido), e nesta tabela o
autor nomeia e descreve o masoquismo, sadismo e a pedofilia, na mesma ordem dos
transtornos sexuais do homossexual ou do invertido (p. 27).
25
O autor ainda assume a falta de evidências científicas para justificar a “inversão
sexual”, visto que mesmo os individuos que tinham crescimento sexual normal, tanto físico
como geneticamente, apresentavam esta tendência. Explica que esta influência “prejudicial”
na sexualidade do “invertido” seria causada provavelmente por uma disfunção psíquica, o
que chama de “estigma de degeneração funcional”. A intenção de Krafft era provar a
tendência perversa do individuo por seu próprio sexo e não de constatar os atos sexuais
realizados por pessoas do mesmo sexo.
Apesar de críticas posteriores a esta obra, ela teve grande importância e influência
na época, sobretudo pelo rigor descritivo das “perversões” sexuais, e tornou-se, segundo
Pereira 21 "uma espécie de paradigma da apropriação do erotismo humano pelo discurso
médico e positivista a partir do século XIX”. Em suma, ele aborda a legitimidade do prazer
sexual apenas para fins de reprodução, assim como a moral religiosa e o contexto social da
época pregava, e neste sentido todo erotismo fora do contexto da procriação seria
considerado digressivo.
Curiosamente outro título que abordava as “perversões”, escrito pelo psicanalista
francês George Lanteri-Laura 22, quase um século depois da obra de Krafft e três anos após
o primeiro volume da História da Sexualidade, sob o título Lecture des perversions -
Histoire de leur appropriation médicale (1979), não dialoga em momento algum com a
obra de Foulcaut 23, apesar de abordar a sexualidade também por uma perspectiva histórica.
Ele foca, entretanto, a soberania médica sobre os aspectos do positivismo jurídico e o
status religioso nos estudos da sexualidade, instaurando, o que ele denomina de
apropriação médico-moral da sexualidade.
Assim como Krafft, Lanteri-Laura (1979) analisa as “perversões sexuais" todas as
satisfações eróticas cujo objetivo não seja a preservação da espécie, no entanto, não
classifica a homossexualidade no mesmo patamar de sadismo, masoquismo ou pedofilia,
aproximando-a mais aos grupos dos “neuróticos” do que das manias. Segundo sua
abordagem, a homossexualidade "nada tinha de monstruoso, mas representava uma
variedade rara e talvez doentia do acesso ao gozo, susceptível de tratamento" (p. 29).
Produções, como as de Lanteri-Laura, ainda que em abordagem mais suave que de
antecessores como Krafft, reafirmam a perspectiva foucaultiana sobre a importância de
uma ciência da sexualidade normatizadora e patologizante que permanece viva até nossos
tempos na ancoragem de preconceitos e estigmas.

26
Ainda segundo Foucault, em nome do fundamento da “verdade” as normas
médicas, contaminadas pelo vigor moral da época e pela visão biológica reprodutora,
construíram uma normalidade científica sobre a sexualidade sustentada mais uma vez nos
discursos e confissões e na incessante e obstinada “vontade de saber” sobre o sexo inerente
do mundo ocidental.

Vinculou-se, com isso, a uma prática médica insistente e indiscreta, volúvel


no proclamar suas repugnâncias, pronta a correr em socorro da lei e da
opinião dominante; mais servil ante às potências da ordem do que dócil às
exigências da verdade18. (p.46)

Essa medicina para Foucault era “voluntariamente mentirosa”, e reivindicava para


si o estatuto de instância social definidora dos princípios gerais de higiene que viriam a
permanecer por muitas décadas depois na Saúde Pública, bem como da ordem moral
social, eliminando tanto as condições para o desenvolvimento das antigas doenças
venéreas, como a diversas formas de taras e degenerações, contribuindo inclusive, para o
desenvolvimento de um evolucionismo social por meio da construção de falsos
fundamentos para sustentar os “racismos oficiais”.
A racionalidade médica em torno da sexualidade que chegou aos nossos dias é sem
qualquer dúvida, derivada dessa Scientia Sexualis. Vale notar, que o “homossexualismo”,
expressão de caráter patologizante, entra no CID na sua sexta revisão, em 1948 no capítulo
dos Transtornos Mentais, na categoria de “personalidades patológicas” e subcategoria
“desvios sexuais”. Apenas em 1990, a OMS, após posicionamento de associações
internacionais de psiquiatria e psicologia, deixou de considerá-lo um transtorno, e a
condição, agora nomeada homossexualidade sai da lista de doenças.
Em editorial de 1984 da Revista de Saúde Pública, Laurenti 24 ao discutir as
pressões dos movimentos sociais para retirar o termo “homossexualismo” do código
internacional de doenças, argumenta que o código não registra apenas doenças, mas
também os motivos de consulta para constar em documentos oficiais, tal como calvície ou
cabelos grisalhos, informando que não raro pais e responsáveis de crianças e adolescentes e
mesmo o adulto autônomo busca ajuda médica em função de comportamento homossexual.
Ele argui que não cabe aos formuladores do código se manifestarem quanto ao mérito da
retirada: “Isso compete à psiquiatria, área que sempre tratou do assunto, inclusive
aparecendo a matéria em seus livros de textos.” (p.1).

27
A compreensão enunciada por Laurenti, no editorial de um dos mais importantes
periódicos de saúde coletiva do Brasil, de que a autoridade para determinar se o
comportamento homossexual é ou não doença é da psiquiatria, ajuda a demonstrar como a
produção discursiva da Scientia Sexualis atravessou os séculos e encontra-se
profundamente impregnada na racionalidade médica, e como consequência nas demais
ciências da saúde.
Foucault vai dizer que é essa forma de associação poder-prazer da sociedade
burguesa em torno da sexualidade, a qual alcançará seu auge no século XIX, mas persistirá
por todo o século XX, virá instaurar um caráter perverso assumido diretamente por
“discursos e instituições”. E essa perversão não se dá exatamente por ter tentado
estabelecer barreiras sólidas contra a sexualidade, o que, como consequência, teria
provocado patologias sobre o instinto sexual, mas antes pelo “tipo de poder que exerceu
sobre o corpo e o sexo, um poder que, justamente, não tem a forma da lei nem os efeitos da
interdição: ao contrário, que procede mediante a redução das sexualidades singulares.”
18
(p.46).
Esta sociedade disciplinar fundamentada no biopoder, ancorada pelas ciências
sexuais, se debruçará cada vez mais na genitalidade e no corpo para distinguir macho e
fêmea e legitimar o desejo heterossexual. Discussões recentes sobre as sexualidades
“desviantes” ratificam a permanência quase obrigatória do controle e do poder sobre os
corpos. Leite Junior25 através da sua tese "Nossos corpos também mudam: a invenção das
categorias "travesti" e "transexual" no discurso científico" retoma a questão do discurso
patologizante imposto pela ciência a partir de uma analise “arqueológica” da origem do
hermafrodita na antiguidade, onde a ambiguidade sexual era tomada como “sagrada”, até o
pseudo-hermafrodita da idade moderna, ou o hermafrodita psíquico, em que esta
ambiguidade é internalizada pela necessidade das ciências médicas de separar, categorizar
o sexo no padrão exclusivo feminino e masculino e patologizar corpos, sexos e desejos que
se desviassem desta norma.
O foco da pesquisa do autor é pensar como se desenvolveu as categorias “travesti”
e “transexuais” ao longo dos anos, sob a perspectiva positivista das ciências médicas, a
qual compreendia a transição entre sexo e gênero sempre como uma manifestação (psico)
patológica e situa a figura da travesti como transgressora desta sociedade disciplinar,
sempre questionando as intersecções entre homens e mulheres e suas legitimidades sociais
históricas. Compreendendo que as normas sociais têm a necessidade de organizar toda e

28
qualquer diferença de gênero, Leite Junior investiga como se construiu historicamente esse
tipo de “senso comum” da “natureza” ou “essência” do feminino e masculino.
É com a ascensão da mentalidade burguesa do século XIX e o surgimento do
racionalismo que "as diferenças pressupostas entre o que é feminino ou masculino passam
a ser buscadas insistentemente no corpo humano" (p. 73). Antes disto até o século XVIII
valores como espiritualidade, posição social, comportamento, aparência é que distinguia o
masculino e feminino, sendo a supremacia masculina notoriamente cultivada:

Até o século XVIII e o novo modelo médico conceitual de dois corpos e


dois gêneros distintos, mas ao mesmo tempo complementares, a diferença entre
homens e mulheres era uma questão de hierarquia fisiológica, social e espiritual,
onde uma característica refletia e confirmava a outra. Se a pessoa nascesse com
vagina, já se sabia que seu corpo não tivera forças e calor o suficiente para os
genitais voltarem-se para fora (e assim surgir o pênis), logo deveria ficar em
posição subordinada na hierarquia social, o que por sua vez confirmava a
inferioridade e precariedade espirituais, que só poderiam vir de um corpo também
mais “frágil” por ser “incompleto". (Ibdem, p. 43).

O autor cita Laquer na sua obra Inventando o Sexo26 o qual resgata a genealogia
entre feminino e masculino a partir do modelo clássico (Galeno, Aristóteles e Platão)
baseado no sexo único, que iria evoluir para o masculino, ou involuir para o feminino a
partir dos "humores" e não da anatomia. Para Salles 27 as mudanças com base no
racionalismo ocorridas após século XVIII, além de promover a separação absoluta entre os
sexos e determinar o sujeito autônomo, fortaleceu "a supremacia do sexo masculino sobre
o sistema nervoso feminino centrado no útero". O foco no sexo genitalizado redimensionou
o discurso cientifico e os limites do gênero, mantendo a subordinação feminina e a
legitimidade da heterossexualidade.
A “naturalização” da subordinação feminina, do heterosexismo, da divergência
absoluta homem/mulher e da abjeção das ambiguidades sexuais, persiste ao longo da
história e suas raízes são profundas, assim como o são a “desnaturalização” de toda forma
de diversidade sexual, consequências do biopoder, da violência simbólica, mas, sobretudo
das biociências e das ciências da psique humana.
Assim como Leite Junior coloca a figura da travesti como transgressora desta
ordem naturalizada, Bento28 diz que nenhuma experiência de gênero é tão forte no sentido
de desnaturalizar o que é ser homem e mulher do que as transexualidades, capaz de
mobilizar a construção cultural alicerçada neste binarismo:

29
Uma concepção de gênero que pensa que o masculino e o feminino são os
significados culturais que as sociedades atribuem à diferença sexual reafirma a
naturalização. Além de uma desnaturalização limitada, e aqui penso no livro O
Segundo Sexo (Beauvoir, 1970) uma concepção de gênero fundada na diferença
sexual como princípio estruturante das performances de gênero, não alcança o
debate sobre o caráter político da sexualidade. E aí nos restam duas alternativas
para analisar as experiências trans: ou as interpretamos como uma patologia, e o
passo seguinte será a sua universalização - porque, se é uma patologia, os
indicadores vão se repetir em todos os lugares do mundo; ou então relativizamos,
e aí compreendemos que existem muitas possibilidades de viver as
transexualidades, e como corolário imediato teremos os deslocamentos das
noções de masculinidade e feminilidade de qualquer referente biológico. (p. 480-
481)

Lamentavelmente estamos longe de relativizar as transexualidades, e não são


poucos os esforços das biociências e das ciências da psique humana para "naturalizar" estes
corpos, para torná-los "inteligíveis", "aceitáveis" pela sociedade e inseri-los nas políticas
públicas de acordo com as premissas da normatividade. E é a patologização e a
medicalização que tornarão “inteligíveis” estes corpos e alinharão sexo, gênero e desejo,
tornando-os inseparáveis, seguindo rigidamente os preceitos normativos de
“masculinidades” e “feminilidades” essencialmente predefinidas, o que vem a organizar,
segundo Foucault, uma vigilância e uma gestão das sexualidades. Leite Junior dirá que a
partir desse padrão a integração social das pessoas travestis e transexuais é atualmente
proposta, como decorrente do "reconhecimento de suas parafilias e transtornos".
Paiva e Felix29 apoiados no conceito de tecnologia de gênero de Preciado (2011)
discorrem sobre uma “inteligibilidade cientifica”, ou seja, a imposição do discurso
científico em forjar uma identidade apoiado no sistema binário de sexo e gênero, que não
necessariamente esteja vinculado às complexas experiências das pessoas trans, devendo
este corpo se estabelecer socialmente como feminino ou masculino e jamais portar
ambiguidades.
Mas o ponto nevrálgico destas “inteligibilidades” é o grau de desumanidade
conferido as pessoas que não se encaixam neste sistema binário. Segundo Buttler30 é esta
inteligibilidade que faz com que os corpos possam ser legitimados e reconhecidos como
humanos:

O “sexo” é, pois, não simplesmente aquilo que alguém tem ou uma descrição
estática daquilo que alguém é: ele é uma das normas pelas quais o “alguém”
simplesmente se torna viável, é aquilo que qualifica um corpo para a vida no
interior do domínio da inteligibilidade cultural (p. 154)

Consequência desta inteligibilidade imposta a estes "corpos desviantes", sustentada


na patologização e medicalização para que se tornem "verdadeiros" homens ou mulheres, e
30
o grau de humanidade conferido e este corpo devidamente "corrigido", observa-se o grau
de violência, que segundo Silva et cols 31 é sofrido por pessoas trans, sobretudo, por
algumas travestis que desejam apenas investir no processo de hormonização, porém não
querem passar pelo processo transexualizador genital, pois suas subjetividades e prazeres
passam por este corpo feminino que possui um pênis, logo, de acordo com a normas de
poder e controle não são nem"inteligíveis" nem "humanos".
Dessa maneira, para Leite Junior 32 a desestabilização que pessoas travestis e
transexuais fazem nas normas de gênero, com uma estética provocadora de "enganos" a
partir da "aparência", está por trás de muitas das violências praticadas contra elas em
espaços públicos, enquanto a patologização da condição corresponderia a uma certa
tentativa de " humanização" da punição pelo desvio.

Inclusive, a própria patologização dos sexos/gêneros pode ser compreendida


como uma forma ‘humanizada’ de punição por algum tipo de transgressão
criminosa. O que causa a agressiva reação com que essas pessoas são tratadas
não é o fato de elas se apresentarem como ‘mulher de verdade’, ‘homem vestido
de mulher’ ou qualquer coisa do tipo, mas o fato de já serem compreendidas
dentro de uma categoria (científica, religiosa ou jurídica) de desvio, de
‘monstruosidade’ que legitima e autoriza a violência contra elas. (p. 566)

Ou seja, segundo este autor, foi a necessidade de criar uma base firme, sólida e
estruturante também para os desviantes sexuais, que obrigará a medicina a agir sobre eles,
não para compreender seus desejos e subjetividades e sim para adestrá-los conforme um
parâmetro universalizante.
Foucault defende ainda que as correlações de forças múltiplas constituídas e
atuantes nos diversos espaços de produção discursiva sustentam os efeitos oriundos das
divisões que se fazem no corpo social, as quais compõem por sua vez linhas de força que
definem redistribuições, alinhamentos, homogeneizações, convergências de afrontamentos,
etc. Um exemplo disso é a disputa em torno da forma de designar a população não alinhada
a formas hegemônicas de sexualidade. No jogo de disputas, o grupo já passou de GLS
(gays lésbicas e simpatizantes), para excluir essa palavra pouco definidora e incluir os
bissexuais e travestis através das siglas GLBT e depois LGBT, por uma reivindicação das
lésbicas para maior visibilidade, ou a incorporação mais recente dos transexuais, passando
a LGBTT, e ainda vivem-se tensões em torno de uma série de outras definições de
identidade que não se sentem representadas, como aqueles que se definem como
pansexuais, ou dos “homens que fazem sexo com homens” e “mulheres que fazem sexo
com mulheres”, mas refutam a designação de Gay ou Lésbica. Além disso, existe toda uma

31
tensão social nos espaços de debate em torno da aplicação correta dos artigos de maneira
adequada à auto identificação de gênero de cada grupo.
Ainda que essas definições possam ser consideradas importantes pelos movimentos
sociais e suas lutas, não é possível ignorar que elas são decorrentes desta mesma prática de
poder de nomear, classificar e definir através de práticas as diversas identidades e que elas
também se constituem como problemáticas para os processos educativos.
Assim sendo, a compreensão foucaultiana de que a partir da ciência da sexualidade
as práticas de obtenção de prazer sexual distintas daquelas implicadas com a procriação, a
exemplo da sodomia, deixaram de ser consideradas como pecados, ou má conduta, para
tornarem-se ponto central da definição de um indivíduo inteiro, como elemento
fundamental para determinar sua identidade, foi de certa forma assumida pelos próprios
movimentos. O preconceito não se dirige à prática propriamente, mas ao indivíduo por ela
definido.
Parece fundamental, portanto, compreender que os dois séculos e outras tantas
décadas de desenvolvimento de uma ciência da sexualidade, fundada na patologização das
práticas sexuais distintas das heterossexuais, nos dispositivos da sexualidade de Foucault,
tenham influenciado o surgimento do termo “heteronormatividade”, como nomeou
33
recentemente Michel Warner . Para ele heteronormatividade é o paradigma que
regulamenta a forma como as sociedades ocidentais se organizam em torno do sexo e do
gênero. Neste conceito, o “normal” é o comportamento heterossexual, e ao se atestar a
heterossexualidade como forma única de exercício do desejo, é estabelecida a pertinência e
materialidade ao “sexo” biológico na construção de uma naturalização do “gênero” e
“sexo”, objetivando-se eliminar qualquer vivência de sexualidade e gênero divergente
desta norma 34 . O termo heteronormativo soma-se a esta discussão, pois nos auxilia a
identificar situações nas quais orientações sexuais divergente da heterossexual são
ignoradas, negadas, patologizadas consideradas desviantes de normas e padrões
estabelecidos.

4.2 A Formação do Estigma dirigido à Diversidade Sexual

De toda forma, compreendidos os processos de criação do dispositivo da


sexualidade e sua da heteronormatividade reinante, é preciso avançar um pouco na
compreensão do processo pelo qual, como consequência, se forma e se mantém estigmas, o
que por sua vez desencadeará preconceitos e discriminações. Isso ajudará a compreender
32
os pontos de vista e percepções direcionadas a estas “sexualidades periféricas” por
profissionais de saúde, no cotidiano de suas práticas de cuidado.
O livro “Estigma: Notas sobre a manipulação de uma identidade deteriorada” de
Erving Goffman 35 já é considerado um clássico nas ciências sociais para o estudo da
questão do estigma. A obra tem um valor específico para nossa tese por investigar o
processo de formação dos estigmas, as interações sociais em torno dele, bem como as
formas possíveis de reações subjetivas em torno dos “encontros mistos”, como ele chama a
relações intersubjetivas entre aqueles considerados “normais” e aqueles que portam um
estigma.
Entretanto, o autor, em uma nota de pé de página, afirma que a categorização do
termo homossexual de origem médico-legal não se adéqua ao seu propósito de discussão e
tenta ele mesmo reconstruir o conceito:

O termo "homossexual" é, geralmente, usado em referência a alguém que se


engaja em práticas homossexuais abertas com um membro de seu mesmo
sexo, sendo essa prática chamada de "homossexualismo". Esse emprego
parece estar baseado num quadro de referência médico e legal e nos dá uma
categorização muito ampla e heterogênea para ser usada aqui. Refiro-me,
somente, a indivíduos que participam de uma comunidade específica de
entendimento dentro da qual os membros do mesmo sexo são definidos
como os objetos sexuais mais desejáveis, e a sociabilidade está
energeticamente organizada ao redor da busca e conservação desses objetos.
(p.121)

Ele distingue três tipos de estigma: o primeiro se dirigem às “abominações do corpo”


ou deformidade física, o segundo as culpas de caráter individual, nas quais incluiriam
fragilidade de caráter, vícios, onde o homossexualismo e outras “sexualidades desviantes”
estariam acrescentados, e o terceiro os estigmas tribais, de raça, nação ou religião (ibdem,p.
7). Em comum estes tipos de estigma carregam o mesmo traço sociológico, o individuo
estigmatizado encontra-se inabilitado para plena aceitação social, cujo foco da relação com
outro recai justamente no atributo “depreciativo” e a impossibilidade de enxergar demais
características da sua personalidade.
Goffman inicia seu estudo do estigma apresentando a origem do termo na
antiguidade grega, como derivado da palavra stygma (que significava punção, picada,
marca sobre a pele). Em geral essas marcas eram feitas por instrumentos perfuro cortantes
ou fogo e brasa, e buscavam designar algo de ruim sobre o estatuto moral de quem o
portava, de forma que escravos, ladrões, prostitutas, estrangeiros fossem facilmente
reconhecidos pelo corpo social.
33
Em seguida ele apresenta como uma característica da sociedade o estabelecimento
de meios para categorizar as pessoas, e os atributos que os definem dentro dessas diversas
categorias, bem como os ambientes sociais onde é possível ou comum encontrá-las. Desta
forma quando um determinado indivíduo ou grupo se vê diante de outros de categoria
diferente, imediatamente buscam identificar a categoria desse “estranho”, sua “identidade
social” e daí avançar, tomando os julgamento prévios já elaborados sobre esses grupos,
como uma forma de conhecimento do que esperamos deles: “Baseando-nos nessas
preconcepções, nós as transformamos em expectativas normativas, em exigências
apresentadas de modo rigoroso”( ibdem,p.5).
Partindo desse ponto Goffman vai criar uma dupla categorização de identidade do
sujeito estigmatizado, aquela que lhe é imputada, através dos atributos predefinidos pelos
grupos considerados normais, que ele chamará de “identidade social virtual” e aquelas que
os sujeitos realmente possuem que ele chama de “identidade social real”.

Enquanto o estranho está à nossa frente, podem surgir evidências de que ele
tem um atributo que o torna diferente de outros que se encontram numa
categoria em que pudesse ser - incluído, sendo, até, de uma espécie menos
desejável - num caso extremo, uma pessoa completamente má, perigosa ou
fraca. Assim, deixamos de considerá-lo criatura comum e total, reduzindo-o
a uma pessoa estragada e diminuída. (...) e constitui uma discrepância
específica entre a identidade social virtual e a identidade social real”.(ibdem,
p.6)

Portanto, Goffman, percebe que o estigma não pode ser compreendido através de
uma “linguagem do atributo”, mas de uma “linguagem relacional”, ou seja, é no encontro
entre o sujeito pretensamente normal e o estigmatizado, que o estigma cumpre sua função
social, uma vez que “um atributo que estigmatiza alguém pode confirmar a normalidade de
outrem” (ibdem, p.6).
Assim podemos compreender como determinados julgamentos preconcebidos,
como de que os homossexuais têm um apetite sexual maior, ou dificuldades maiores para
manter fidelidade, sendo consequentemente mais promíscuos em seus relacionamentos,
associou-se, por exemplo, à racionalidade médica na construção da noção de “grupos de
risco” para doenças sexualmente transmissíveis. E é o que favorece a que um sujeito
específico, diante do médico ou outro profissional de saúde, imediatamente já seja visto a
partir das preconcepções que caracterizam seu grupo social e que reafirma no lado do
profissional de saúde sua própria normalidade e superioridade moral.
Goffman apresentará também duas possíveis condutas do sujeito estigmatizado:
34
Quando o sujeito assume seu atributo distintivo que o estigmatiza, ou esse atributo já é
conhecido, ou está óbvio ao olhar dos demais, nesse caso, Goffman fala de um sujeito
“desacreditado”, ou quando o atributo distintivo não é conhecido pelos demais, nem é
facilmente percebido, e então o sujeito é “desacreditável”.
Se pensarmos os relatos sobre sexismo e homofobia institucional no campo da
saúde, descritos na literatura, compreenderemos que diferentes situações podem envolver
as pessoas LGBT. Quando, ao procurar um serviço de saúde suas estéticas pessoais de
gesto, fala e figurino, seu estilo propriamente dito, denunciam uma suposta dissidência da
norma, as manifestações discriminatórias tendem a ocorrer logo no seu acolhimento. São
posicionados como sujeitos “desacreditados”. Outras pessoas cujo estilo pessoal não
evidencia a orientação sexual, ou o pertencimento de gênero, as atitudes discriminatórias
passam a integrar o repertório de cuidado a partir de sua enunciação, ou seja, o indivíduo, a
partir de sua “revelação/descoberta” desloca do lugar de desacreditável, para ser
posicionado como desacreditado.
Goffman dirá que as características da produção e consequências do estigma nas
sociedades ocidentais atravessam os tempos desde a antiguidade:

Em todos esses exemplos de estigma, entretanto, inclusive aqueles que os


gregos tinham em mente, encontram-se as mesmas características
sociológicas: um indivíduo que poderia ter sido facilmente recebido na
relação social quotidiana possui um traço que pode-se impor a atenção e
afastar aqueles que ele encontra, destruindo a possibilidade de atenção para
outros atributos seus(ibdem, p.7)

Segundo Goffman, "os normais" costumam ter algumas variedades de formas de


pensar e agir em direção aos estigmatizados. Eles podem buscar racionalizar a
inferioridade do estigmatizado e produzir teorias que justificam os riscos que eles
representam as ações de animosidade e a necessidade de excluí-los; fortalecer o estigma
pela criação de termos pejorativos que designem estes sujeitos diferentes (em nosso tema:
bichinha, veado, sapatão, traveco); ou tentar primeiro proceder como se aquele sujeito
correspondesse também à normalidade, fazendo esforço para considerá-lo melhor do que
realmente o julga, ou ainda pautar-se por um tipo de piedade, envolvida em ações e
palavras benevolentes, buscando tornar mais leve o peso do estigma e melhorar a relação.
Entretanto todas essas formas operam para produzir desumanização do sujeito
estigmatizado e reafirmar a superioridade de quem estigmatiza. Goffman também afirmará
que quando aquele que estigmatiza não se sente capaz de nenhuma daquelas condutas

35
tenderá a agir como se o sujeito estigmatizado fosse invisível, inexistente, uma "não
pessoa".
No que se refere ao sujeito estigmatizado, Goffman analisa também outras formas
de reações. Indivíduos considerados dissidentes das normas que reivindicam o seu
reconhecimento e legitimidade. Nestes casos o estigma não imobiliza, não produz
silenciamento ou vergonha.
Podemos dizer que essa forma de reação caracterizaria o recente ativismo que uniu
academia, movimentos sociais, e parte da população LGBTT, em torno do que
convencionou-se chamar de Teoria Queer. Originalmente depreciativa, a palavra foi
ressignificada como marca de identidade tanto para suas ações políticas quanto para
produção intelectual.
Quando o sujeito marcado pelo estigma compartilha com os estigmatizadores as
mesmas crenças sobre sua identidade, ele incorpora em sua subjetividade os supostos
defeitos que imputam ao grupo a que pertence, assumindo que alguns de seus atributos são
impuros, imorais ou falsos. Uma das maiores consequencias desse processo de
subjetivação é expresso por atitudes de vergonha, pecado ou doença.
A demanda ou imposição para tratamento psiquiátrico ou psicológico se ancoram
no sofrimento advindo do estigma e ao mesmo tempo o reiteram deslocando para o
individuo a causa de seu próprio sofrimento.
Essa tensão sempre existente, seja qual for o tipo de reação de ambas as partes, em
torno do encontro entre os ditos normais e os estigmatizados, que Goffman nomeará
“contatos mistos” pode estar na base do que chamamos em saúde pública de “barreira
simbólica de acesso”.

A simples previsão de tais contatos pode, é claro, levar os normais e os


estigmatizados a esquematizar a vida de forma a evitá-los.
Presumivelmente, isso terá maiores consequências para os estigmatizados, à
medida que uma esquematização maior de sua parte será sempre necessária.
(ibdem, p.14)

Finalmente, um último aspecto que gostaríamos de explorar no pensamento de


Goffman, seria aquele de quando ele classifica os três tipos de lugares que se destinam aos
indivíduos posicionados à margem da norma. Os lugares claramente proibidos e
inacessíveis, onde há uma interdição explícita, e a exposição desse atributo corresponderia
imediatamente à sua expulsão do local, e, ao querer ficar “o intruso busca um disfarce”, um

36
tipo de “cooperação tácita para evitá-la”. Relatos de literatura revelam que a permanência
no “armário” guarda relação com a possibilidade de ser ou não aceito em determinado
espaço, como por exemplo, as igrejas e o futebol masculino. O segundo tipo de lugar é
representado pelos lugares públicos nos quais os estigmatizados são tratados como
exceção, “como se não estivessem desqualificadas para uma aceitação rotineira, quando na
verdade o estão” (ibdem, p.71). Há julgar pelos relatos de literatura sobre acesso aos
serviços de saúde da população LGBT, as unidades básicas de saúde estariam incluídas
neste segundo tipo de lugar. Finalmente, o terceiro tipo lugar, que ele nomeia “retirados”
que são aqueles em que os indivíduos não precisam esconder características e atributos, e
nem se preocupar com os esforços que algumas pessoas fazem para não percebê-los, em
geral esses espaços são produzidos e mantidos por pessoas que compartilham um mesmo
estigma, os guetos.

Essa divisão do mundo do indivíduo em lugares públicos, proibidos, e


lugares retirados, estabelece o preço que se paga pela revelação ou pelo
ocultamento e o significado que tem o fato de o estigma ser conhecido ou
não, quaisquer que sejam as estratégias de informação escolhidas. (ibdem,
p.73)

Isso nos leva a interrogar o lugar de cuidado para a população LGBT no SUS. O
enfrentamento da questão de oferta de atenção em saúde, unicamente baseada na
informação cognitiva sobre direitos e reafirmação de diretrizes de políticas, parece ser
capaz de manter as unidades apenas com as características do segundo tipo de lugar
descrito por Goffman, onde indivíduos anunciam o respeito e igualdade agora incorporados
pelo novo discurso do Estado, através de suas políticas, mas não a sente interiormente
como verdade, o que, facilmente, um e outro lado da relação percebem. Por outro lado, a
criação de serviços e espaços especializados para a população LGBTT, ainda que possa
constituir uma estratégia compensatória, corre o risco de criar dentro do SUS os lugares
“retirados”, que mesmo oferecendo maior conforto a esse grupo, reafirma e cristaliza a
distinção estigmatizada.
Parker36 vai além do conceito de estigma estabelecido por Goffman, sustentado de
“marca”, de “diferença de valor negativo” atribuído através das relações interpessoais, e
pensa o estigma “como uma espécie de processo social”, fundamentalmente ligado às
produções e reproduções das práticas de poder e controle de grupos sociais sobre outros. O
estigma seria, portanto mais que uma marca de distinção de inferioridade moral, e se
constitui como ferramenta própria ao exercício do poder e da dominação. Entretanto ele
37
reconhece que mesmo para Goffman, a expressão interpessoal da atribuição e
reconhecimento de um estigma, não prescinde de um processo social que o antecede.
Entretanto, o que surge em Parker que não aparece em Goffman é a ênfase no papel
crucial do estigma enquanto determinante da desigualdade social, onde alguns grupos são
desvalorizados e outros valorizados de forma inerentemente discriminatória, e associada à
variação dos contextos, de maneira que o estigma encontra-se sempre envolto em uma
espécie de flutuação social, absolutamente vinculado as características culturais e aos
sistemas de poder. Essa distinção operada pelo estigma define grupos e indivíduos que
passam a ser socialmente excluídos.
Parker trabalha ainda as relações conceituais entre estigma, preconceito e
discriminação. Ele vê muitas proximidades entre estigma e preconceito, chegando a propô-
lo como um só elemento e não dois, argumentando que o estigma estaria mais relacionado
a sua origem tradicional (doença mental, desfigurações faciais e outras deformidades e
deficiências físicas) enquanto o preconceito se dirigiria a condições mais "comuns" na
atualidade, dando o exemplo da própria homossexualidade e do HIV/AIDS. Ele enfatiza
que tanto o preconceito quanto o estigma envolvem categorização, rotulagem,
estereotipagem e exclusão social, no entanto o processo social que desencadeia um ou
outro advém de mecanismos os mais diversos.
Enquanto o estigma e o preconceito são as representações mentais das causas de
discriminação, a discriminação seria o ato propriamente de exclusão dos indivíduos e
grupos. Dessa forma preconceito e estigma seriam diretamente responsáveis pela
"violência estrutural", que Parker define como ações discriminatórias de desvalorização
social responsáveis por agravos e lesões evitáveis provocados em determinados grupos
sociais. Essa violência está bem representada por indicadores como mortalidade infantil,
expectativa de vida, acesso a cuidados de saúde, acesso a saneamento, entre outros.
Dessa forma a violência surge na própria estrutura e se apresenta nos diferentes
graus de poder sociopolítico, cultural e econômico dos grupos e na constituição de
diferentes oportunidades de realização da vida. A desigualdade social está, portanto, no
cerne da violência estrutural e cria oportunidades de vida desproporcionais por causa de
comportamentos, raça/etnia, doença e pobreza. Além disso, a reestruturação social em
tempos de globalização promove intensas mudanças nas relações sociais de produção
como na distribuição do capitalismo global, que contribuem diretamente para criar a
violência estrutural do mundo contemporâneo. Isso tudo implica compreender que a

38
discriminação em relação à saúde não é apenas resultado do preconceito e do estigma
exercido nas relações interpessoais em torno da assistência, mas é também e
principalmente, resultado das próprias estruturas sociais e econômicas desiguais
construídas com base no preconceito e no estigma.
Monteiro e cols. 37 refletindo sobre como a produção cientifica atual apreende a
temática do estigma e discriminação, conclui que, em certo nível, ela reflete a forma
dominante como a sociedade brasileira tem percebido e determinado suas ações
relacionadas com o tema, em outros diversos campos. Dessa forma a maioria dos trabalhos
sobre estigma não focam nos processos sociais geradores e reprodutores do estigma e
discriminação e sim em experiências e concepções individuais sobre o tema. O estigma é
procurado desta maneira em grupos sociais reconhecidamente vulneráveis (pessoas
vivendo com HIV/AIDS, mulheres, idosos, negros, gays, etc.) e assim busca-se
compreender as experiências individuais ou “as concepções dominantes em determinados
espaços e instituições acerca destes corpos”.
Ao discutir estigma, discriminação e sofrimento as autoras evidenciam o víeis
“biomédico" de “tratar” o sofrimento na dimensão individual e privada (família), tendo por
base a conceito “goffminiano” de estigma, como marca corporal, que pontua o sujeito, seu
corpo e sua experiência, negligenciando a análise dos processos sociais que dão sentido ao
sujeito e sua corporalidade.
Apesar do reparo crítico de Monteiro e cols., sobre a necessidade de pensar as
estruturas coletivas, sociais, culturais e políticas da constituição do estigma e preconceito
na produção científica, na dimensão clínica do cuidado, ressalta-se a relevância de pensar
os corpos individuais e as subjetividades marcadas por estigmas determinados pelo senso
social dominante e comum. É importante também destacar que muitos estudos sobre
equidade e humanização no atendimento a saúde, tem retomado a necessidade de olhar “o
sujeito”, suas necessidades e suas subjetividades, para além de protocolos e condutas
rígidas e mecânicas, tão criticadas no acolhimento da atenção básica.
Dessa forma, uma estratégia que pode se mostrar eficiente para o enfrentamento do
estigma nos serviços de saúde seria investir nas ações de educação e a formação
permanente dos profissionais. Isso é reafirmado quando estudamos o impacto do estigma
sobre a saúde desses grupos.

39
4.3 A Luta pela Despatologização das Identidades Sexuais Diversas e a Proposição da
"Cura Gay".
Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas
não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão
sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior

Guimarães Rosa

No cenário ideológico-moral mais recente no Brasil, assistimos a um confronto


bastante significativo em relação às identidades sexuais distintas do padrão
heteronormativo. De um lado, a luta pela despatologização das identidades diversas, em
especial aquela das pessoas trans, onde o processo é ainda mais frequente e
institucionalizado, e de outro, o recrudescimento de um plano terapêutico para as
"identidades desviantes", a chamada "cura gay", baseada em uma noção naturalizada e
sagrada da heteronormatividade, que vem sendo defendido por determinados setores
conservadores e, ou fundamentalistas cristãos da sociedade brasileira. Estes setores agem
buscando influenciar o entendimento social geral do problema, os conteúdos programáticos
da educação formal, a regulamentação de profissões de saúde e a própria lei. Dada a
atualidade e importância do problema precisaremos analisar um pouco os dois lados destes.
Em 1948, a Organização Mundial de Saúde (OMS), integrante da Organização das
Nações Unidas (ONU), assumiu responsabilidade pela Classificação Internacional de
Doenças (CID) 38. A homossexualidade entra no rol da CID neste mesmo ano em sua 6ª
edição quando é incluído o capitulo de transtornos mentais, na Categoria 320
“Personalidade Patológica”, subcategoria 320.6, “Desvio Sexual”24. Em 1965, na 8ª edição
da CID sai da categoria "Personalidade Patológica", mas permanece na categoria “Desvio e
Transtornos Sexuais”, mantendo o código 302, com a subcategoria específica 302.0
“Homossexualismo”. Em 1975, na 9ª revisão, a CID manteve o homossexualismo na
mesma categoria e subcategoria, no entanto devido às intensas discussões e opiniões
divergentes entre escolas psiquiátricas, o código foi inserido com a seguinte orientação
“codifique a homossexualidade aqui seja ou não a mesma considerada transtorno mental”
(idem, p. 344). Apenas em 1990, a OMS excluiu o termo homossexualismo da CID-10,
respondendo à intensa mobilização internacional e a absoluta falta de evidencias cientifica
que comprovasse a homossexualidade como doença.
Nos anos anteriores importantes associações das ciências da psique já haviam
chegado à conclusão que a homossexualidade não era uma doença. A considerada bíblia da
psiquiatria, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mental (DSM) já tinha
40
retirado a homossexualidade do seu compêndio em 1973. Até esta data a condição era
considerada doença mental, no mesmo grupo que necrofilia, zoofilia, pedofilia, dentre
outros. E em 1975, a Associação Americana de Psicologia (APA) também retira a
homossexualidade do rol de doenças.
Merece especial destaque, o fato de no Brasil, o Conselho Federal de Psicologia ter
deixado de considerar a homossexualidade como desvio antes da decisão da ONU, em
1985 e foi o mesmo Conselho que na luta contra a patologização e homofobia lança a
Resolução 001/99 que apresenta em seus artigos 3º e 4º:

Art. 3° - os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização


de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva
tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados. Parágrafo
único - Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham
tratamento e cura das homossexualidades. Art. 4° - Os psicólogos não se
pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de
comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em
relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica.

A resolução criou, entretanto, enorme polêmica no início, polêmica esta que veio
esmaecendo na década seguinte, para ser retomada de maneira mais agressiva a partir de
2015. Para Kahhale39 a motivação da polêmica em torno da resolução 001/99 decorre do
fato de vivermos numa sociedade normatizadora de identidade de gênero focada no
binarismo masculino e feminino e toda conformação ou manifestação que difere desta
concepção hegemônica tende a ser patologizada. A autora ainda afirma que "expressões
LGBT são possibilidades humanas e não quadros de comportamentos ou psíquicos
doentios" (p. 206).
A patologização da sexualidade se mostra em nossos dias de forma mais evidente
quando tratamos dos direitos das travestis e transexuais. Se por um lado associações
mundiais de psiquiatria e psicologia, já declararam a homossexualidade, fora do conceito
de transtornos psíquicos ou mentais e para a qual se desconhece a legitimidade de
propostas terapêuticas, o mesmo ainda não ocorre quanto ao travestismo e a
transexualidade. Lionço40 questiona, por exemplo, o fato do processo transexualizador no
SUS depender de que o paciente se submeta a dois anos de acompanhamento psiquiátrico,
para que se confirme a demanda. Ou seja, persiste neste caso uma noção de transtorno de
identidade de gênero, também chamada tecnicamente de "disforia de gênero".
As discussões sobre a despatologização da condição trans ganhou corpo em 2012
com a campanha de ativismo internacional "Stop Trans Pathologization", que tem entre
41
suas principais demandas a retirada da classificação dos processos de transição entre
gêneros como transtorno mental nos catálogos diagnósticos (DSM e CID)1, reivindicar o
livre acesso a hormônios e cirurgia e o combate à transfobia.41
Esta campanha é fruto de um longo debate entre militantes e cientistas, apesar de
uma parcela do movimento ponderar a perda de direitos que poderia resultar da
despatologização, uma vez que só a partir do seu entendimento enquanto problema de
saúde estaria assegurado o direito das pessoas ao processo transexualizador nos sistemas
públicos de saúde, a exemplo do SUS, no caso do Brasil. Segundo Bento 42 "a
patologização não garantiu direitos de fato, mas impôs um modelo para se pensar a
transexualidade como experiência catalogável, curável e passível de normalização (p.
574)".
Teixeira 43 , tomando como base os trabalhos de Berenice Bento, problematiza o
processo transexualizador implantado pelo Ministério da Saúde justamente por vincular a
cirurgia a rígidos protocolos e a necessidade do diagnostico médico das transexualidades,
não criando espaços para discussões, sobretudo das ciências sociais, quanto a construção
histórica dos "desvios sexuais" ancorada no biopoder, no binarismo macho e fêmea, na
heterossexualidade compulsória e na ausência de compreensão das complexidades
vivenciadas por pessoas trans, as quais apresentam em suas performances, experiências
que desestabilizam a noção homem e mulher, distantes do que entendemos por
“patológico” e mais próximas de subjetividades legitimas quanto ao sexo/gênero/desejo
podendo ou não recorrer ao processo cirúrgico.

A transexualidade pode ser lida como uma experiência de mobilidade que


carrega um desejo de finitude. Alcançar a “outra margem do rio” e declarar o fim
desta passagem. [...] A questão maior é que a armadilha desse discurso reside no
caminho escolhido para alcançar a outra margem do rio: a imposição da cirurgia
(p. 193).

Bento e Pelúcio42 denominam essa forma de exercício de poder sobre as pessoas


trans como “tutelamento dos corpos e das subjetividades" e afirma a necessidade da

1
A ultima revisão do Manual do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mentais
(DSM), de 2012, considerado a bíblia dos profissionais da psique, retirou o diagnóstico das transexualidades
do Transtorno de Identidades de Gênero (TIG),e inseriu Disforia de Gênero, não deixando de patologizar a
condição trans. A última atualização da Classificação Internacional de Doenças (CID 10) manteve o nome
"transsexualismo" o qual foi classificado de Transtornos da Identidade Sexual [F64] inserido no capitulo de
Transtornos mentais e comportamentais.
42
discussão sobre protocolo do processo transexualizador da forma que foi implantado, o
qual recai no ponto crucial da patologização.

Se partirmos do pressuposto de que há múltiplas possibilidades de experiências e


práticas de gênero, e de que as pessoas que solicitam alterações corporais ou
desejam migrar legalmente de um gênero imposto para outro com o qual se
identificam são sujeitos capazes de conferir sentido para essas transformações,
não há justificativa para definir um protocolo fundamentado no transtorno
mental. Questionar o protocolo, nos termos em que vem sendo implementado, é
encarar a questão da patologização do gênero e colocá-lo na arena de debates,
situando-o como categoria científica, por isso mesmo, histórica, o que significa
considerar também seu caráter político. (p. 576)

As autoras citam ainda que os as classificações do DSM e do CID são falaciosas


devido a carência de dados científicos para enquadrar as transexualidades como patologias,
questionando o caráter diagnóstico das inter-relações de profissionais de saúde com as
pessoas trans:

Quem autoriza os psicólogos, psiquiatras, endocrinologistas e outras


especialidades das equipes multidisciplinares a avaliarem as pessoas transexuais
e travestis como “doentes”? Se não existe exame clinico que conduza a produção
do diagnostico, como determinar a ocorrência do transtorno (p.579)

A ausência de bases cientificas e históricas para determinar as transexualidades e


homossexualidades como patológicas não é de hoje. Como vimos anteriormente, Krafft20
desde o século XIX assumia a falta de evidências científicas para justificar a “inversão
sexual”, apesar de persistir classificando e categorizando toda especie de "desvios sexuais"
em relação à heteronormatividade. Diante do poder biomédico dominante, nem a
"fragilidade" científica, nem as evidências sobre a enorme diversidade das subjetividades
humanas em viver a tríade gênero/sexo/desejo parecem suficientes para transformar as
práticas assistenciais, tornando mais árduo o caminho da despatologização.
Santos 44 partindo das ideias de Foucault acerca do dispositivo da sexualidade
pautado nas práticas do biopoder e na sustentação e produção de verdades pelos discursos
sobre a sexualidade faz um paralelo entre o conceito foucaultiano de dispositivo da
sexualidade, com o que esta autora denomina como "dispositivos das transexualidade",
onde as normativas e regras do processo transexualizador refletem mais uma vez o controle
e poder sobre os corpos ao longo da história e o papel soberano das ciências médicas e da
psique na medicalização e patologização das subjetividade dos “desviantes sexuais”.
Essa autora refaz a construção da genealogia das transexualidades a partir deste
contexto da sociedade disciplinar e coloca a visibilidade das transexualidades como um
43
fenômeno contemporâneo. A questão pertinente levantada por Santos é situar as
tecnologias de gêneros também como "produtoras" na construção da transexualidade.
Ressalta os importantes estudos na área da endocrinologia entre as décadas de 1920 a 1950
sobre hormonização e a cirurgia plástica como uma resposta as emergentes transformações
pleiteadas por estes sujeitos que não se reconheciam em seus corpos, necessitando assim
deste aparato tecnológico para se reconstruir conforme suas subjetividades e vivências e
não de categorização e classificação na engrenagem nosológica. A partir daí ela pontua a
necessidade de compreender a construção sócio-histórica do “dispositivo da
transexualidade” e a resistência ao mesmo como caminho possível para despatologização.
No Brasil no âmbito acadêmico encontramos importantes trabalhos (Júnior (2008),
Teixeira (2009), Arán, Murta e Lionço (2009) Bento e Murta (2011), Pelúcio (2011)) que
defendem a despatologização e o Conselho Federal de Psicologia (CFP) lançou no dia 22
de maio de 2015, na semana internacional de luta contra a homofobia, o site
especial Despatologização das Identidades Trans, projeto integrante de campanha,
iniciativa da Comissão de Direitos Humanos do CFP, contra a patologização das
transexualidades.45
Recentemente, em janeiro de 2018, o CPF lançou no Dia Nacional da Visibilidade
de Travestis e Transexuais a resolução 01/2018, mais um importante instrumento na luta
pelos direitos das pessoas trans. O documento proíbe qualquer ação que favoreça a
discriminação, preconceito ou patologização de transexuais e travestis e reconhece a
legitimidade da autodeterminação destas pessoas em relação a sua identidade de gênero. O
CPF assume a posição de vanguarda no reconhecimento da livre expressão e identidade de
gênero, da autoafirmação da dignidade da pessoa humana e da despatologização das
transexualidades, visto que a revisão da pauta na OMS e CID ainda está em curso, e visa
deslocar as transexualidade do capitulo de transtornos mentais para a saúde sexual.
Evidente que a resolução já foi alvo de ação judiciária contrária pelo Ministério Público
Federal (MPF) de Goiás, pelas mesmas alegações direcionadas a 01/99, mas a justiça de
Goiás extinguiu o processo sem julgamento de mérito.
Em junho de 2018 a OMS toma uma decisão histórica ao deixar de considerar
as transexualidades como doença mental. Na futura atualização do CID 11 a
transexualidade passará a integrar um novo capítulo intitulado "condições relacionadas à
saúde sexual" e será classificada como "incongruência de gênero" onde há uma dissonância
do gênero experimentado pelo individuo e aquele do seu nascimento. No entanto a CID 11

44
entrará em vigor apenas em 1º de janeiro de 2022, no momento continua a validade da
categoria F64 dos "transtornos da identidade sexual" (CID 10) onde os médicos podem
enquadrar travestis e transexuais.
Apesar de toda essa trajetória de luta e alguns avanços conquistados, o projeto da
"Cura Gay" ressurge anacronicamente e vem ganhando força, movido pela onda
conservadora que atingiu o país nos últimos anos46, como consequência das transformações
políticas e enfraquecimento das instituições democráticas vividas após o golpe institucional
perpetrado pela união de diversos setores dos poderes executivos, legislativos e judiciários
e a grande mídia de massa. Esse novo contexto obviamente representa uma das maiores
ameaças aos direitos da população LGBT e tem sido comandada por uma bancada
fundamentalista cristã que compõe a atual Câmara dos Deputados. Contrário a corrente
mundial, visto ações da comunidade internacional em retirar as homossexualidades dos
compêndios científicos, o projeto da "Cura Gay" derrubado e indeferido nas suas primeiras
apresentações em 2011, retoma fôlego em 2017 por uma decisão do juiz do estado do Rio
de Janeiro.47
A proposta da "Cura Gay" obviamente sustenta-se na compreensão da
homossexualidade como desvio da normalidade, busca revogar resoluções que interditem
práticas terapêuticas focadas na reversão da condição, e defendem enquanto "respeito à
liberdade", uma espécie de direito a este tipo de terapia.
Teixeira48, analisando o problema, afirma que o CFP já expediu 147 resoluções
desde 2005 e que nenhuma foi tão popular quanto a 001/99, atribuindo sua popularidade à
própria temática de orientação sexual abordada, bem como às inúmeras reações de
oposição, tais como o pedido de anulação parcial movido pelo MPF do Estado do Rio de
Janeiro.
Em sua tese "Cura gay é meu caralho", esta autora busca compreender as práticas
discursivas de ordem jurídica, política e do próprio código de ética que rege a psicologia,
sobre a legitimação da Resolução CFP nº 1/99 em seus enunciados contrários e favoráveis,
e situa a resolução como ato de resistência:

O CFP certamente através da Res. 1/99 desempenha resistência a homofobia


institucional entre psicólog@s, além de incluir entre as prioridades da profissão
temáticas inexistentes há algumas décadas, pauta temas sociais entre questões a
serem abordadas pel@s profissionais (p.134)

45
Entre as ações movidas contra a resolução 01/99 do CFP doze anos após sua
publicação, encontra-se o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 234/1149, de autoria de um
deputado que é pastor auxiliar da Igreja Assembléia de Deus em Vila Nova, Goiás, o qual
pretende sustar a aplicação do dos art. 3º e o art. 4º da Resolução do CFP. Entre os
defensores da PDC 234/11 com maior visibilidade encontramos a psicóloga Marisa Lobo,
autodeclarada como evangélica e autointitulada "psicóloga cristã", a qual já recebeu
advertências punitivas pelo CFP por oferecer "terapias de reversão" e pelas inúmeras
publicações nas redes sociais nas quais considera homossexualidade como doença, até ter o
seu registro profissional cassado pelo Conselho, o que veio a ser suspenso pela Justiça
Federal, pela alegação de liberdade religiosa e na liberdade de expressão.
Em nome da "liberdade humana" a psicóloga tem se mobilizado numa luta pessoal
contra o CFP, apoiada sobre seus princípios cristãos, coloca o Evangelho acima do código
de Ética da profissão, acusa o movimento de gay de persegui-la e de ser vítima de
heterofobia, teofobia, e preconceito" (p. 114), acusando o Conselho de parceiros e
partidários "ideológicos" a favor dos homossexuais, a partir do que lança o slogan: "Não
podemos para acabar com a homofobia criar a Cristofobia" (p. 106). Afirma ainda que no
Brasil se instalou uma “ditadura de minorias". Junta-se à psicóloga, o deputado e pastor
Marcos Feliciano do PSC, a também psicóloga e missionária evangélica Rozangela Alves
Justino, que diz tratar o "sofrimento das pessoas que tem atração por outras do mesmo
sexo", além de vários outros(as) nomes e associações como Associação de Defesa da
Heterossexualidade50 ligados ao fundamentalismo cristão.
Esses grupos de abordagens psicoterapêuticas que buscam a reversão da condição
têm sido chamados de “Terapias do Armário". Segundo Sedgwick51 a designação se remete
a expressão "armário", oriunda da língua inglesa que descreve uma condição de
clandestinidade vivida por pessoas homossexuais, na maioria das vezes por receio de
descriminações, injúrias ou violências homofóbicas provocadas por uma declaração
pública.
Na ausência de bases científicas biológicas, históricas, sociológicas ou
antropológicas para sustentar as "terapias do armário", alguns autores foram investigar de
que fontes de conhecimentos essas propostas buscaram subsídios para fundamentar suas
ideias de naturalização da orientação sexual e identidade de gênero. Montoya52 identificou
facilmente o vínculo estabelecido entre as terapias restauradoras e as concepções
teológicas cristãs de existência humana e constituição dos gêneros, o que também é

46
explícito no discurso de seus defensores leigos. Ele sustenta que a busca por esse tipo de
terapia é feita em geral por indivíduos que enfrentam sérios obstáculos para a expressão
livre de sua sexualidade nos ambientes sociais, os quais desencadeiam baixa de autoestima.
Este indivíduo encontrará em "terapeutas do armário", um profissional que
interpretará seus conflitos, angústias e sofrimentos, como tendo origem em sua atração
homoerótica, a qual passa a ser o foco da terapia, e não nos estigmas, preconceitos e
descriminações produzidos por um ambiente hostil a ele. Tomando assim a
heterossexualidade como a normal e as demais identidades como patológicas, os
"terapeutas do armário" consideram que existe em todo homossexual uma
heterossexualidade inata que por problemas de desenvolvimento psíquico não foi
desenvolvida da forma correta e daí provoca sofrimento. Ou seja, a razão do sofrimento
não é a hostilidade moralmente mediada, mas a estrutura desejante do indivíduo que
encontra-se alterada. Para este autor, além da carência de fundamentação teórica válida, as
"terapias do armário" também não são capazes de produzir evidências empíricas capazes
de comprovar sua suposta efetividade.
Souza53 demonstra que é a partir do questionamento da validade ética e técnica de
uma terapia com bases teóricas inconsistentes, fundamentadas em dogmas moralizadores
religiosos, e sem demonstração empírica de efetividade, que a Associação Americana de
Psicologia (2010) bem como o CFP do Brasil, interditam essas práticas. E é exatamente a
revogação dessas recomendações de regulamentação das práticas assistenciais que a
bancada evangélica da câmara e outros setores conservadores e fundamentalistas buscam
por meio de várias formas de atuação social.
O PDC 234/11 foi indeferido e arquivado em 2013. A ação movida pelo MPF do
Rio de Janeiro em 2011 alegou dentre outros motivos, que a resolução 01/99 fere o "direito
fundamental a liberdade" e o "livre exercício profissional". A ação foi rejeitada em 2013,
pela Justiça Federal do RJ 54. Percebe-se, entretanto que o conteúdo moral que embasava
aquele projeto de lei vem ganhando cada dia mais adeptos nas redes sociais.
Não é difícil, entretanto, demonstrar que as ações movidas contra a resolução 01/99
foram pautadas em discursos pseudo democráticos e são desprovidas de evidências
científicas que a sustentem. As psicólogas em questão falam do respeito ao livre arbítrio do
individuo que sente sofrimento por sua orientação sexual homoafetiva, mas não
demonstram nenhum estudo de caso que tenha êxito na "reversão sexual". Pelo contrário, a
American Psychological Association (APA) vem demonstrando preocupação diante os

47
debates religiosos e políticos que têm "obscurecido os dados científicos sobre mudanças de
orientação sexual" 55 e afirma que estes posicionamentos vão contra a corrente do consenso
cientifico sobre as homossexualidades e os "tratamentos" para "cura" desencadeiam
processos de sofrimento e angustia:

O consenso de longa data das ciências comportamentais e sociais e dos


profissionais de saúde mental e geral é de que a homossexualidade, per se, é uma
variação normal e positiva da orientação sexual humana. Pesquisas já realizadas
têm falhado consistentemente em fornecer qualquer base empírica ou científica
para considerar a homossexualidade como uma doença ou anormalidade.
Existem pessoas que passam por terapias de reorientação sexual e tendem a ter
visões religiosas fortemente conservadoras que as levam a procurar uma forma
de mudar a sua orientação sexual. Não há estudos de suficiente rigor científico
para concluir que os recentes esforços de mudança de orientação sexual têm sido
eficazes. Embora dados de confiança sobre a segurança dessas terapias sejam
extremamente limitados, algumas pessoas relataram terem sido prejudicadas por
esse tipo de técnica. Angústia e depressão foram exacerbadas. A crença na
esperança de mudar a orientação sexual seguida pela falha do tratamento em
alcançar tal objetivo, foi identificada como uma importante causa de sofrimento
e de uma autoimagem negativa.

4.4 Homofobia, a materialização do Estigma e seu impacto sobre a Saúde

"Há duas vontades que movem o homem o poder e sexualidade. É nestas


duas regiões onde a malha "grelha" é mais apertado e onde é mais difícil de analisar”
Foucault

Quando aplicamos a abordagem teórica que acabou de ser descrita, ao problema das
barreiras simbólicas de acesso da população LGBT aos serviços de saúde, ou à qualidade
da atenção que lhes é dispensada, não podemos esquecer que as instituições de saúde
encontram-se impregnadas pela racionalidade de uma ciência da sexualidade, fundada para
um lugar de dominação do diverso, que o faz falar, o estuda, classifica-o, busca moldá-lo a
padrões universalizantes.

[...] a instância de dominação não se encontra do lado do que fala (pois é


ele o pressionado), mas do lado de quem escuta e cala; não do lado do que
sabe e responde, mas do que interroga e supostamente ignora. E,
finalmente, esse discurso de verdade adquire efeito, não em quem o recebe,
mas sim naquele de quem é extorquido. (Foucault, p.61)

Muito dos constrangimentos vividos pela população LGBT parece estar ligada ao
fato mesmo de saber-se assim, investigada, classificada, não por suas necessidades de
saúde, mas, antes por seus desejos sensuais, suas práticas de prazer e formas de amar, e por

48
perceber-se sempre sob alguma forma de julgamento ou avaliação, no plano moral ou
científico de forma atrelada à sua própria identidade como pessoa. Esta reflexão demonstra
a natureza problemática do atendimento, seja de recomendações oriundas de fóruns sociais
amplos, como o da 13ª Conferência Nacional de Saúde (CNS), seja de diretrizes de ação
presentes em políticas públicas.
É fundamental ter em conta, que no cotidiano dos serviços as diretrizes como, por
exemplo, “a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos e o respeito ao direito à intimidade
e à individualidade” ou “estabelecimento de normas e protocolos de atendimento
específicos para lésbicas e travestis”, ou “a eliminação das homofobias e demais formas de
discriminação e violência contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no
âmbito do SUS...” ou a “promoção da cidadania e inclusão de LGBT por meio da
articulação com os diversos setores de desenvolvimento social como: educação, trabalho,
segurança e outros”, não são possíveis de serem cumpridas na dimensão puramente técnica
da estruturação do acolhimento, ou organização da oferta. Faz-se necessário compreender
como as subjetividades dos profissionais de saúde responsáveis pelo cuidado e assistência
a população LGBT são influenciadas pelos confrontos de posicionamentos ideológico-
morais dos discursos sobre sexualidade.
A literatura especializada1, 3, 14, 15, 16 está repleta de relato sobre os sofrimentos
vividos por membros da população LGBT, em diversos aspectos, como dificuldade de
acesso aos serviços de saúde e redução da qualidade de atendimento, vulnerabilidades
específicas e violação de direitos humanos.
Para melhor compreender os impactos do sofrimento vivenciado por esta
população, além da abordagem quanto à origem do preconceito e estigma da sexualidade
na nossa sociedade e das consequências prejudiciais da heteronormatividade, é necessário
discutir especificamente a homofobia, enquanto forma de concretização do estigma contra
pessoas e grupos que não se enquadram nas expressões heteronormatizadas da sexualidade,
e em seguida buscarei a partir de dados e informações colhidas na literatura apresentar os
impactos reais e simbólicos sobre a saúde deste seguimento populacional.
Na Política Nacional de Saúde Integral da população LGBT encontra-se uma
diretriz clara e especifica para o combate à homofobia como via para o cumprimento dos
princípios básicos do Sistema Único de Saúde de equidade e universalidade:

Há um consenso sobre a necessidade do combate à homofobia no SUS, tendo


como base o conceito de saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS), que

49
entende que a proteção do direito à livre orientação sexual e identidade de
gênero não é apenas uma questão de segurança pública, mas envolve também,
de maneira significativa, questões pertinentes à saúde mental e a atenção a
outras vulnerabilidades atinentes a esses segmentos. O combate à homofobia é
uma estratégia fundamental e estruturante para a garantia do acesso aos
serviços e da qualidade da atenção. (MS-DAGEP)56

A Homofobia traz dimensões complexas que se traduzem nas subjetividades das


relações interpessoais e institucionais, como também no caráter simbólico destas relações.
Em termos gerais, o termo se refere à hostilidade, desprezo e intolerância aos
homossexuais. O movimento LGBT motiva o uso de outros termos como “lesbofobia” e
“transfobia” para dar maior visibilidade aos processos de exclusão e discriminação que
vitimizam as pessoas lésbicas e trans respectivamente. O termo homofobia é considerado
um neologismo surgido em 1972 para definir a totalidade de sentimentos e atitudes
negativas com relação à homossexualidade e as diversidades sexuais57.
O conceito de homofobia abrange dois aspectos significativos a considerar na
análise da realidade. O primeiro aspecto refere-se a dimensão afetiva, ou seja, a rejeição às
homossexualidades, e o outro às dimensões culturais e cognitivas, no qual além da rejeição
pura e simples, há a falta de tolerância a quaisquer ações políticas que garantam direito e
igualdade a esta população. Em todos os sentidos, a homofobia se assemelha a outras
condutas discriminatórias, como o racismo, o antissemitismo e a xenofobia, nos quais o
outro é considerado inferior, anormal, excluído de direitos e consequentemente de sua
própria humanidade e afetos. Assim a homofobia ultrapassa as questões de relações
interpessoais, ocupando espaços institucionais como escolas, igrejas, serviços de saúde,
dentre outros.
A relação de homofobia e saúde começou a ser discutida em estudos recentes,
diferente da homofobia institucional, homofobia na educação e associada aos direitos
humanos LGBT, cuja discussão é ampla na literatura. Meinez58 revela que a compreensão
da homofobia na saúde perpassa o entendimento/imaginário médico sobre a noção da
homossexualidade ainda relacionada à patologia, e que apesar dos avanços da retirada da
homossexualidade do DSM na década de noventa, ainda persiste, por parte de alguns
setores conservadores da sociedade impregnados por este imaginário, o esforço em
implementar terapias restaurativas, visando a “cura gay”. Outro aspecto criticado pela
autora e que contribui para homofobia na saúde é a associação frequente da saúde LGBT
apenas relacionada às DST/AIDS.
Em outro estudo na área de Antropologia e Bioética do México 59 a analise foca

50
justamente nos discursos homofóbicos da aérea de saúde, deixando claro a inexistência de
um discurso especifico de determinados sujeitos, estabelecendo a analise na estrutura
extralinguística da linguagem cotidiana entre o emissor e receptor, onde as expressões
homofóbicas reveladas nestes discursos dependem do contexto cultural, da linguagem e do
pensamento do individuo.
O estudo conclui que os discursos homofóbicos fazem parte de falas cotidianas de
qualquer temática, porém sem refletir na concepção destes discursos como
discriminatórios. Revela que o discurso homofóbico é reproduzido em toda área da saúde,
e em todos os serviços onde haja prática médica, sendo neste setor onde há maior impacto
da discriminação e preconceito gerados pela homofobia.
Outra pesquisa conclui que a homofobia é frequente ainda na formação profissional
de estudantes de enfermagem e que esta atitude negativa interfere no atendimento integral
a população LGBT, causando discriminação e preconceito60.
A homofobia intrafamiliar61,62 também é apontada como forte fator de sofrimento
em jovens gays e lésbicas, com diversas situações de violência e abandono familiar,
motivadas pela “legitimidade” da heteronormatividade, impactando na saúde destes jovens,
sobretudo quanto aos aspectos psicossociais afetados pelo rompimento do elo com a
família.
Estudo latino americano 63 demonstra a homofobia como uma experiência que
infringi a saúde mental do jovem homossexual, causando grave sofrimento psíquico que
são comumente associados à ideação suicida. Este sofrimento está fortemente relacionado
a vivências de isolamento, baixa autoestima, violência verbal e física e rejeição social,
revelando a homofobia como modo causal do processo de adoecer destes indivíduos.
Estes estudos demonstram que o conceito de homofobia utilizado tanto na literatura
como no movimento LGBT, ultrapassa o sentido semântico da palavra cuja origem grega
do prefixo “homo” remete a homossexualidade e “phobos” à fobia, medo, ou seja, um
medo quase patológico da homossexualidade. Este sentido é ampliado para hostilidade,
desprezo e intolerância aos homossexuais de forma geral, em seus aspectos cognitivos e
subjetivos, como define Borrillo56, e desencadeia condutas de preconceito e discriminação.
Assim a saúde da população LGBT compreendida como “completo bem-estar
físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de doença ou enfermidade” segundo
OMS 64 , implica em condições de equilíbrio e compreensão dos determinantes sócio-

51
econômico-culturais, e no entendimento dos processos de sofrimento, angustias e
violências causados pelo preconceito e discriminação traduzidos pela homofobia.
Quanto à saúde das mulheres homossexuais um estudo realizado por Fachinni e
Barbosa 65 , reconhece na literatura a homofobia como dificuldade real do acesso aos
serviços de saúde, porém não a considera como barreira única na procura de cuidados
ginecológicos por mulheres que fazem sexo com mulheres. O resultado da pesquisa
sugeriu que o preconceito e receio estão mais associados à abordagem das práticas eróticas
pelos profissionais, sobretudo nas mulheres que nunca fizeram sexo com homens, as de
baixa renda e as que têm postura corporal “masculinizada”, concluindo que não apenas a
experiências negativas e representações são determinantes, há de se considerar a
construção de identidade associadas ao gênero e sexualidade também como obstáculo ao
acesso á saúde.
Estudos internacionais demonstram que a mulher lésbica só procura atendimento
66
médico em último caso e urgências e agravos mais complexos , e o despreparo dos
profissionais para lidar com as “especificidades” desse grupo populacional e às
dificuldades das mulheres em revelar a homo ou a bissexualidade aos profissionais de
saúde67,68.
Neste sentido outra pesquisa nacional concluiu que mulheres lésbicas e bissexuais
não contam com apoio por parte dos profissionais de saúde para dialogar sobre suas
orientações sexuais quando buscam assistência, e que este contexto impede atendimento
seguro, e produz exclusão e violência simbólica.69
Quanto à especificidade do cuidado de saúde com as mulheres lésbicas tanto a
literatura nacional, quanto a internacional apontam para uma menor frequência de
realização de Papanicolau nestas mulheres 70 , 71 , 72 , 73 , 74 . As DST e AIDS também são
negligenciadas na saúde da lésbica. Moraes e Esteves75 apontam que a maioria dos estudos
no Brasil está associada ao universo homossexual masculino, sendo incomum encontrar
algo a respeito de lésbicas e bissexuais.
Barbosa e Koyama, citadas por Cardoso72 evidenciam que algumas doenças são
agravadas, como câncer de colo de útero e de mama, pela baixa regularidade de procura
aos serviços de saúde, além de outros fatores associados que provocam o adoecimento,
como “o uso abusivo de drogas lícitas, tabaco, álcool e o grande sofrimento psíquico”.
O Dossiê Saúde das Mulheres Lésbicas71 resume estes achados científicos e cita
alguns dos principais motivos que conduzem à menor procura dos serviços de saúde:

52
A existência de discriminação, o despreparo dos profissionais para lidar
com as especificidades dessa população, as dificuldades dessas mulheres se
assumirem como homo ou bissexuais e, por fim, a negação do risco quanto
às doenças sexualmente transmissíveis. (p. 19)

É relatado que mulheres que fazem sexo com mulheres são “excluídas” dos
serviços de atenção/cuidado à saúde, corroborando com contexto discriminatório dos
serviços organizados em função de uma heteronormatividade.
Se as DST/AIDS são negligenciadas com relação à homossexualidade feminina,
estas são exacerbadas quanto à homossexualidade masculina, consequência da epidemia da
AIDS na década de 80 e ainda persistente na atualidade, sempre relacionada à peste gay,
mesmo após evidencias cientificas sobre a doença, demonstrem sua incidência em todas as
formas de orientação sexual.
São inúmeros os artigos e periódicos tantos nacionais quanto internacionais que
estudam a associação de HIV/AIDS com homossexualidade masculina, os quais têm
grande relevância para a Saúde Pública, no entanto, percebe-se frequentemente a
abordagem da saúde do homossexual masculino apenas associada a HIV, em detrimento
outras causas biopsicossociais de adoecimento desta população.
O perfil epidemiológico do HIV mudou significativamente nas últimas décadas.
Além dos avanços na notificação e tratamento, também a população exposta não é mais
classificada como “grupo de risco” e sim como população vulnerável e comportamentos de
risco, como por exemplo, uso de drogas injetáveis e sexo desprotegido, dentre outros. No
Brasil o último Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde (2016) apresentou a
notificação dos casos de AIDS pelo SINAN de acordo com faixa etária, gênero e
orientação sexual (maiores de 13 anos do sexo masculino) nas seguintes porcentagens:
8,3% Bissexual; 37,9% Homossexual e 48,8 % Heterossexual.
A mudança do perfil epidemiológico da doença, não significa que a mesma esteja
controlada no Brasil e no mundo. Apesar de todos os avanços a UNAIDS76 ainda considera
a AIDS como epidemia, visto o crescimento vertiginoso do número de casos em todo
mundo, principalmente em países com desigualdades sociais profundas, como o Brasil e a
África. No Brasil o Boletim Epidemiológico HIV/AIDS de 2016 também demonstrou que
o numero de casos entre em homens que fazem sexo com homens (HSH) aumentou
significativamente nos últimos dez anos, passando de 35,3% em 2006 para 45,4% em
2015, entre os jovens de 15 a 19 anos os casos triplicaram (de 2,2 para 6,9 casos/100 mil
hab.) e dobraram entre os de 20 a 24 anos (de 16,2 para 33,1 casos/100 mil hab.) no mesmo
intervalo de tempo, ou seja, de 2006 a 2015.
53
Estes dados sugerem não a exclusão da vulnerabilidade para população
homossexual, e sim, justamente devido à epidemia da AIDS e sua associação quase que
exclusiva a uma doença gay na década de 80, uma maior mobilização e planejamento tanto
de políticas publicas como das ONG e da sociedade civil com campanhas de prevenção
direcionadas aos homossexuais. Também justifica o grande número de estudos relacionado
ao tema e o avanço de terapias e medidas diagnósticas para o HIV.
Estudo feito em Portugal avaliou o nível de testagem e prevenção em homossexuais
masculinos e heterossexuais, e conclui que os homossexuais têm comportamento mais
preventivo e maior número de testagem para HIV, em relação aos heterossexuais. Deduz
que este resultado pode estar relacionado maior conscientização quanto ao risco frente ao
HIV pelos homossexuais, e pela baixa percepção de vulnerabilidade pelos heterossexuais77.
Terto78 chama atenção que mesmo passado mais de três décadas do surgimento da
AIDS exclusivamente associada as homo e transexualidades, e dos avanços tecnológicos e
científicos que contribuíram para esta dissociação, permanece em nossos dias as
representações sociais que reconhece os homossexuais como vitima ou vilões da doença, e
a continuidade dos preconceitos e estigmas individuas, decorrentes da associação AIDS -
homossexualidade. O autor cita um exemplo muito oportuno da complexidade das relações
entre homossexualidade e os normativos de saúde no país, a exemplo da Portaria 158/16 do
MS Saúde e a da Resolução 34/14 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA), que restringe a doação de sangue por orientação sexual homoafetiva, por
considerá-los ainda "grupo de risco" e potenciais transmissores de IST e AIDS, ação que
não controla a epidemia, apenas fortalece os estigma e preconceitos.
Moscheta 79 identifica três momentos históricos da atenção à saúde com relação à
diversidade sexual. O primeiro seria o foco no individuo doente, nas "sexualidades
desviantes", decorrente da imposição das Scientias Sexualis. O segundo o foco seria no
coletivo, decorrente do surgimento da peste gay, do "grupo de risco" e a necessidade de
repostas para epidemia. E o terceiro, com os grupos sociais mais organizados e articulados
a políticas públicas, o foco será no combate ao preconceito e discriminação da sociedade
desigual, o maior desafio a saúde da atenção integral a população LGBT em nossos dias.
É consenso que no caso da epidemia do HIV/AIDS o estigma é reconhecido como
maior obstáculo para o avanço de políticas e ações sociais que visam a garantia dos
direitos, dignidade e cidadania a quem porta o vírus37, 80, 81 . Mann declara:
A epidemia nos ensinou algo que não poderíamos ter aprendido nos livros...
Levou-nos a compreender que a marginalização social, a discriminação e a

54
estigmatização... em outras palavras a falta de respeito aos direitos e à
dignidade... é em si mesma a causa raiz desta epidemia. (Jonathan Mann,
entrevista online) 82

Com relação a homofobia e estigma, Monteiro et al37 em um levantamento da


produção acadêmica recente sobre Estigma, Discriminação, Saúde e AIDS no Brasil,
chama a atenção para escassez de estudos que investigam a associação entre homofobia e
estigma com relação a HIV/AIDS “como parte de processos sociais mais amplos de
exclusão social” e complementa que “a maior parte dos estudos HIV/AIDS toma o estigma
associado à epidemia e à homofobia como dados, e não como dispositivos sociais a serem
discutidos e analisados” (p. 71).
Sobre dispositivo Pelúcio e Miskolci 83 discute a maneira preconceituosa que a
Saúde Pública abordou inicialmente a epidemia, desenvolvendo formas de prevenção e
controle focados em padrões heteronormativos e na normalização das relações afetivas,
lançando suporte para o "dispositivo da AIDS", termo discutido em 1987, no auge da
epidemia, por Nestor Perlongher no livro "O que é AIDS?". Este autor em artigo datado
dois anos antes do livro, diz: "a ameaça da AIDS já transcendeu o sofrimento privado das
suas vítimas para se converter num dispositivo de moralização que busca reordenar os
corpos e suas paixões." (p. 35) 84
As percepções de Pelúcio e Miskolci sobre o dispositivo da AIDS e a
repatologização das sexualidades dissidentes corroboram com toda a discussão que
fizemos no referencial teórico, na medida em que os autores afirmam que: "a epidemia
permitiu o reforço da norma heterossexual que servira como modelo para patologizar as
sexualidades dissidentes desde início do século XIX". A forma como as instituições
trataram a AIDS, colocando a via sexual como principal forma de contágio e as homo
afetividades a ameaça mais evidente em portar este vírus mortal, instaurou um dos maiores
temores da historia sexual contemporânea e que diacronicamente, apesar dos avanços
científicos, ainda pode permanecer nas subjetividades de profissionais de saúde e nos
discursos institucionais.
Porém as complexas questões políticas, sociais e cientificas que envolve a epidemia
da AIDS na contemporaneidade, não caberiam ser discutidas em profundidade aqui, visto
que o nosso foco é abordar a persistência do estigma e preconceito da associação da AIDS
e homossexualidades ainda no nosso século, o que impede a visão integral da saúde desta
população. Na atualidade é crucial considerar a diversidade dos determinantes causadores

55
do adoecimento/sofrimento desta população para prestar um atendimento integral e
humano.
Naum, citado por Cardoso72, indica que o preconceito da sociedade com as
homossexualidades pode ser absorvido pelo gay, gerando o que é denominado por ele
como “preconceito internalizado” que desencadeiam baixa autoestima, e
consequentemente, sentimentos de inferioridade, depressão, medo, vergonha, ansiedade,
isolamento social, aumentando o risco de disfunções sexuais, abuso de álcool e outras
drogas, além de distúrbios alimentares e ideação suicida. Processo que se aproxima
bastante de uma das reações do estigmatizado descritas por Goffman e já apresentadas
anteriormente nesta tese.
Para o segmento jovem da população homossexual a vulnerabilidade é ainda maior,
além da maior exposição e incidência do HIV, segundo dados do MS, há a violência
intrafamiliar como já citado, e certa invisibilidade em relação às campanhas preventivas.
Terto76 aponta que a culpa e vergonha destes jovens, baseadas nas representações que
associam frequentemente a homossexualidade a AIDS, impedem a procura de apoio e a
realização de testagem, por acreditarem que são potenciais portadores do vírus.
Um estudo canadense 85 alertou para o aumento do número de suicídio entre os
homens homossexuais e bissexuais, e aponta como causas os efeitos da marginalização e
violência para esta população. No Brasil os estudos neste sentido são raros, apesar de
dados da grande mídia e de dados extra-oficiais revelarem um alto índice de suicídio
principalmente nos jovens homossexuais.
Evidencia-se nos estudos a cerca das homossexualidades forte carga de preconceito
e discriminação agindo prejudicialmente sobre a saúde deste segmento populacional, e
nota-se que mesmo após 26 anos da exclusão da homossexualidade da CID, ainda
prevalece uma ideação que a vincula ao patológico, sobretudo na percepção dos
profissionais de saúde, persistindo a marca do biopoder dos discursos médicos científicos.
Quanto à saúde das travestis e transexuais fica ainda mais evidente o processo de
adoecimento/sofrimento associado aos estigmas e preconceito desencadeados pela
homofobia.
Mesmo após discussão e debates dos ativistas e acadêmicos com entidades
responsáveis, no sentido de excluir a denominação destas transexualidades como
Transtorno de Identidade de Gênero pelo DSM, a substituição recente por Disforia de
Gênero (DSM V), não contemplou os anseios dos ativistas e manteve ainda uma noção

56
patológica. Segundo Sampaio e Coelho 86 a permanência como disforia configura-se
enquanto via de manutenção do processo patologizador da transexualidade.
Lionço 87 contextualiza que a atual definição de transexualismo não considera as
complexidades e subjetividades da transexualidade, determinando como critério
diagnóstico o anseio para modificação da genitália relacionada exclusivamente pela
“experiência de gênero”, a qual é definida pelo binarismo característico
feminino/masculino, e da heterossexualidade como valor normativo.
Assim revela o caráter parcial do processo transexualizador no SUS atrelado
rigidamente aos normativos e diagnósticos médicos, sem prescindir do reconhecimento
desta conquista como grande avanço para esta população. Neste sentido a autora recorre às
reflexões de Butler: “se por um lado a psiquiatrização da transexualidade instrumentaliza o
acesso aos serviços de saúde, por outro engendra novos sofrimentos por meio do estigma
associado ao diagnóstico psiquiátrico”.
Neste mesmo estudo Lionço chama atenção de que apenas o processo
transexualizador não soluciona o problema do acesso precário na atenção básica e da
qualidade da atenção em todos os níveis do sistema para travestis e transexuais, sendo
necessária uma compreensão ampliada das identidades de gênero, subjetividades e
vulnerabilidades que envolvem este grupo populacional.
A compreensão do travestismo também é pouco assimilada tanto nos contextos da
saúde quanto nos sociais. No travestismo há uma necessidade de mudança nos caracteres
secundários sem necessariamente implicar na mudança da genitália. As travestis
desarticulam estes parâmetros sociais exclusivamente binários, visto que nascem com o
sexo biológico masculino, mas constroem aparência e corpo femininos, numa configuração
ambígua que desencadeia incompreensão e intolerância frente a uma sociedade
heteronormativa. Neste sentido são elas, as travestis, as maiores vítimas da homofobia
segundo relatório da SEDH/PR sobre violência homofóbica no Brasil, no ano de 2012, o
que traz consequências danosas, sobretudo para sua saúde mental.
Amorim 88 afirma que a discriminação com as travestis provoca um processo de
exclusão inevitável, o qual as tornam descrentes de serem sujeitos de direitos e assim
submetidas a complexas questões de vulnerabilidade social, como a aceitação de qualquer
ínfimo beneficio para sua sobrevivência. Revela também que este processo de exclusão
implica em sofrimento intenso provocando sérios problemas na saúde mental destes
indivíduos.

57
Nas especificidades de saúde deste segmento, França89 aponta que muitos estudos
com relação à saúde das travestis estão direcionados à prevenção de DST/AIDS, tanto em
abordagem quantitativa, enfatizando comportamento e práticas sexuais e uso do
preservativo, quanto qualitativas, destacando as vulnerabilidades e acrescenta que
pesquisas no acesso e atendimento de travestis em serviços de saúde são recentes.
Pelúcio90 diz que, para as travestis, manter-se bela é sinônimo de autocuidado, que
a associação entre saúde beleza e feminização é ideia recorrente para elas. Assim na busca
de reconstruir um corpo feminino, porém sem assumir uma identidade restrita ao gênero
feminino, elabora e sustenta uma androgenia.
E é neste processo de formação e transformação de um novo corpo desejado que
residem os maiores problemas de saúde para as travestis. A aplicação de silicone e
hormonioterapia sem acompanhamento profissional adequado causam danos irreversíveis à
saúde desta população. A conduta biomédica, conforme resolução do Conselho Federal de
Medicina vincula a aplicação dos procedimentos para alteração dos caracteres sexuais ao
diagnóstico de transexualismo, tanto em relação à transgenitalização quanto à
hormonioterapia. Para Lionço 91 este processo contribui para exclusão das travestis da
atenção à saúde, e assim elas ficam “relegadas à automedicação ou à ação das bombadeiras
- travestis que injetam silicone industrial para a modelagem dos corpos de outras travestis”.
Constata-se então que o poder biomédico é ainda mais evidente sobre transexuais e
travestis, através da imposição de interdições e restrições normativas para o acesso aos
procedimentos que corroboram sobre transformações corporais de seus caracteres sexuais,
produz processos regulatórios que dificultam o acesso desta população aos avanços
biotecnológicos e aos bens de serviços.
Nesse embate discursivo, onde de um lado começa a haver maior atenção ao
discurso dos direitos humanos, de uma diversidade saudável da sexualidade, de uma
compreensão da condição diversa dos sujeitos não como determinante negativo para a
situação de saúde, e de outro um discurso heteronormatizador e patologizante, quando não
claramente homofóbico, não podemos deixar de compreender que a balança pesa ainda
para o lado estigmatizante, devido a hegemonia que perdura em nossos dias de um sistema
de crenças discriminatório, uma educação masculinizante, uma reafirmação de diversas
práticas sociais calcadas nas desigualdades entre os gêneros, entre outras formas de
reforçar os dispositivos de sexualidade, sua heteronormatividade, sua heterossexualidade
compulsória e seu falocentrismo.

58
As mudanças verdadeiras de compreensão e postura em relação a diversidade da
sexualidade humana, depende, portanto, de maiores investimentos tanto intelectuais quanto
de mobilização e mesmo logístico-financeiros para uma educação social e em especial
daqueles responsáveis pelos cuidados de saúde da população:

[...] uma política de enfrentamento das iniquidades da população GLBT requer


iniciativas estratégicas vigorosas, entre as quais a capacitação dos profissionais
de saúde sobre as práticas sexuais e sociais de GLBT. Esta é questão
fundamental para que o cuidado seja condizente com suas reais necessidades
em saúde, superando a estrita associação da saúde dessas populações à
epidemia de HIV/AIDS. (MS-DAGEP)

4.5 A Trajetória do Movimento LGBT no Brasil até a implantação da Política


Nacional de Saúde Integral Da População LGBT.

Nesta seção traçaremos uma breve trajetória dos movimentos sociais inicialmente
homossexuais, com evolução posterior aos demais segmentos de lésbicas, bissexuais,
travesti e transexuais, focando, sobretudo na inter-relação histórica desta trajetória com a
construção de políticas públicas que viabilizaram direitos e exercício da cidadania.
O que se apresenta aqui é então, uma outra produção discursiva sobre a diversidade,
conduzida por esses movimentos, o que confrontaria a produção discursiva
heteronormativa tradicional, numa luta permanente por espaço e reconhecimento, de uma
forma tal que acabaria por influenciar o próprio discurso oficial do Estado na
fundamentação de sua biopolítica relacionada à diversidade sexual.
A apropriação médico-moral da sexualidade, a exclusividade binária macho/fêmea,
normal/patológico, os dispositivos da sexualidade, a heterossexualidade compulsória,
aspectos discutidos em profundidade no capítulo anterior, nos ajudam a compreender o
retardo na aquisição de direito e cidadania para esta população. Exemplo disto é que, como
citado anteriormente, a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou a
homossexualidade da CID apenas na última década do século XX, em 17 de maio de 1990.
Quatro anos antes (1984) a Associação Brasileira de Psiquiatria, seguida pelo Conselho
Federal de Medicina em 1985, já haviam se posicionado contra a discriminação da
homossexualidade, e deixou de considerá-la como desvio sexual.
O ativismo político desses grupos começa a se desenhar no inicio do século XX nos
países europeus e na América do Norte. Na Europa, impulsionado pela Liga Mundial da
Reforma Sexual (1928) ocorreram campanhas contra a criminalização da
homossexualidade lideradas por um dos pioneiros na defesa dos direitos dos homossexuais,
59
o médico e sexólogo alemão Hirschfeld (1868-1935). Nos Estados Unidos o movimento
ganhou força na década de 60 e foi marcado pela contracultura hippie, numa crescente
busca de politização e liberdade sexual. 92
Diferente do contexto euramericano que inicialmente buscava a descriminalização
da homossexualidade, no Brasil o movimento começa com atores sociais na busca pela
garantia de direitos relacionados à livre orientação sexual e a promoção de direitos
humanos, visto que aqui a sodomia deixou de fazer parte do código penal desde 1830.
O movimento social brasileiro traz características peculiares e tornou-se força
decisiva na construção de políticas publicas para o segmento LGBT, apesar de começar
mais tardiamente em comparação aos movimentos euramericanos. Facchini93 através do
seu artigo “Movimento Homossexual no Brasil: recompondo um histórico”, oferece um
substrato pertinente e profundo sobre as características políticas e sociais que marcaram
este movimento no país.
Os movimentos homossexuais surgiram no Brasil no final dos anos 70. Importante
salientar que inicialmente o movimento era formado exclusivamente por homens
homossexuais, com adesão das lésbicas em momento posterior. Nos anos 90 as travestis e
depois transexuais passam a participar mais ativamente, e os bissexuais começam a buscar
reconhecimento do movimento apenas no inicio do ano 2000.94
Quanto as travestis, segundo entrevista recente de Jovanna Baby95, ex presidente da
Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) a invisibilidade é uma das
razões da ausência de um registro sistematizado sobre o histórico de luta por direitos desta
população e constitui uma lacuna com informações imprecisas e desencontradas. No
entanto ao longo da historia consolidou-se importantes conquistas e marcos, como a
própria formação da ANTRA e o Encontro Nacional de Travestis que trabalham com
AIDS/Violência, que já esta na sua 21ª edição.
A adesão tardia das lésbicas ao movimento não significa a falta de protagonismo
político das mulheres. Pelo contrário, o movimento feminista começa no Brasil em 1932
com a conquista do sufrágio universal, e é marcado em sua trajetória histórica por várias
lutas em prol da cidadania, como o movimento sindical, a luta por direitos sexuais e
reprodutivos e mais recentemente pela descriminalização do aborto e contra violência a
mulher.
E mesmo que o movimento feminista tenha inicialmente sido liderado por mulheres
heterossexuais, sem dúvida que abriu caminhos para as diversas manifestações de gênero

60
num sentido mais social e equânime, como diz Fraser: “A história padrão (do feminismo) é
uma narrativa de progresso, segundo a qual nós saímos de um movimento exclusivista,
dominado por mulheres brancas heterossexuais de classe média, para um movimento maior
e mais inclusivo que permitiu integrar as preocupações de lésbicas, mulheres negras e/ou
pobres e mulheres trabalhadoras." 96
Assim o movimento LGBT nasce da herança política do movimento feminista que
contribui para sua formação compactuando agendas e buscando fomentar na dimensão
pública um bem comum para ambos que é a “liberdade sexual” e a busca de direitos e
cidadania97.
Necessário pontuar aqui o período de transição democrática pelo qual o país estava
atravessando naquela época. Em meados dos anos 70 diversas manifestações
antiautoritárias contra o regime militar mobilizaram movimentos sociais. Marcados por
características da contracultura, com caráter revolucionário e contestatório, o movimento
homossexual, não só no Brasil como em toda América Latina, muitas vezes se aliou aos
partidos de esquerda na busca de transformações sociais e culturais. 98

Ainda não sabemos a história completa sobre a fundação dos primeiros grupos
politizados de homossexuais na América Latina, mas parece que a maioria dos
grupos que surgiram no início dos anos de 1970 e 1980, tiveram entre seus
fundadores e líderes, membros de partidos comunistas ou de seus grupos
dissidentes, ou ainda, provenientes de outras formações esquerdistas (ibdem p.
25)

Fachinni93 nomeia este período de “primeira onda” do movimento, que possuía


características revolucionárias e era abordado na rara bibliografia sobre tema como
“alternativos ou libertários”. O primeiro grupo com uma proposta um pouco mais
politizada sobre a homossexualidade é o SOMOS, nascido em São Paulo em 1978. O
grupo tinha composição exclusiva de homossexuais masculinos, contando com a
participação de mulheres homossexuais posteriormente que se organizavam de forma
separada, através do Grupo de Ação Lésbica-Feminista (GALF – 1982). O lema do
movimento neste período era “O Movimento Homossexual é revolucionário e não apenas
Reformista”. (p. 90).
No entanto, ela pede atenção a outros autores, a exemplo de Macrae99 e Trevisan100,
que começam a trabalhar sobre a proposta organizacional do grupo, pontuando o
nascimento do movimento com a criação do SOMOS. Eles afirmam que anteriormente,
diversos grupos menores já haviam se mobilizado, e ainda que estivessem sendo

61
caracterizados à época como “guetos” e “grupos não políticos”, já demonstravam a
diversidade de militância no qual o movimento foi construído73. (p. 85-88).
Outros grupos foram formados ao longo da “primeira onda” do movimento, porém
como cito no inicio do capítulo o foco deste breve histórico do movimento é a inter-relação
desta trajetória com a construção de políticas publicas que viabilizaram direitos e cidadania
para população LGBT, e fugiria do propósito aqui a descrição quase arqueológica que
Fachinni elabora através de sua pesquisa bibliográfica, documental e etnográfica sobre o
movimento homossexual no Brasil.
Na “primeira onda” do movimento o destaque foi o primeiro Encontro de
Homossexuais Militantes, ocorrido final de 1979, com a participação de diversos grupos do
Brasil, cuja principal resolução seria a demanda pela inclusão do respeito pela “orientação
sexual” na Constituição Federal e uma campanha para retirar a homossexualidade da lista
de doenças mentais no CID (p. 90-91).
A década de 80 foi marcada por uma redução significativa na quantidade de grupos
e muitos consideram que houve “declínio do movimento”. O advento da AIDS de certa
forma desmobilizou as lideranças do movimento quanto a questões de “liberdade sexual”,
por exemplo, e estas se voltaram para luta contra Síndrome, constituindo uma primeira
resposta da sociedade civil a epidemia. Expressões como “peste gay” eclodiram na época
reacendendo a relação de homossexualidade e doença, mesmo depois da comprovação
cientifica que o vírus poderia ser transmitido por qualquer pessoa, através do sangue,
esperma e outros fluidos corporais.
Mas não só a AIDS como outros fatores sócios políticos contribuíram para este
novo cenário do movimento, reconhecido como “segunda onda”. A época agora era de
redemocratização e abertura política, assim o ideal revolucionário e comunista que
influenciou a “primeira onda” do movimento necessitava ser recontextualizado.
Além deste contexto Fachinni, citando Green, levanta aspectos importantes que
podem ter contribuído para o “declínio do movimento”, dentre os quais destaca-se: a falsa
ideia de que em tempos democráticos os direitos civis dos homossexuais poderiam
expandir-se mais facilmente e a ilusão de liberdade causada pela expansão de um mercado
voltado e produzido para homossexuais que causava a sensação de que a organização
política não era necessária. (p. 97-98).
As reflexões tanto de Facchini como de outros autores, é que este novo contexto
social político de redemocratização contribuiu muito mais para transformações na estrutura

62
e organização do movimento, do que para seu declínio. E aqui dois atores sociais são
imprescindíveis para esta discussão, João Carlos Mascarenhas, advogado e fundador do
grupo Triângulo Rosa (SP), e Luiz Mott, antropólogo e fundador do Grupo Gay da Bahia
(GGB), ambos os grupos criados na década de 80.
Tanto Mascarenhas quanto Mott haviam participado da “primeira onda” do
movimento, mas não se vinculavam aos ideias da contracultura e revolucionário que
marcaram esta primeira fase de militância e buscavam estabelecer organizações mais
formais que comunitárias. Fachinni supõe que esta nova forma de atuação do movimento,
por razões do contexto sócio político e da eclosão da AIDS, contribui para mantê-lo vivo
apesar da pseudo perspectiva de declínio. O grupo SOMOS se dissolveu neste período,
além de outros grupos, e só a dissidência feminista do SOMOS, o GALF, perdurou até os
anos 90, o qual passou a ser nomeado de Rede de Informação – Um Outro Olhar, após ter
adotado o formato organizacional de ONG. (p. 93).
Mascarenhas e Mott evidenciam uma ação mais objetiva no sentido da garantia dos
direitos civis e contra a violência e a discriminação dirigidas aos homossexuais do que um
engajamento maior com projetos de transformação social. De todo modo, a necessidade de
desvinculação da imagem da homossexualidade de seus aspectos marginais passa a ser
uma característica bastante presente nessa segunda onda do movimento. O processo de
redemocratização na sociedade brasileira e a consequente redução das propostas mais
antiautoritárias e revolucionárias de militância podem estar relacionadas a essa tendência
de desvalorização dos aspectos marginais da homossexualidade e necessidade de
construção de uma nova imagem publica do movimento como todo.
O Triangulo Rosa lidera outra importante campanha em 1987 pela inclusão da
“opção sexual”, renomeada posteriormente por orientação sexual, na Constituição Federal.
A campanha não alcançou êxito junto a Constituição Federal, mas a partir do trabalho feito
por Mascarenhas, a discriminação por orientação sexual entrou em duas Constituições
Estaduais (Sergipe e Mato Grosso), e mais recentemente na do Pará, e em 27 leis orgânicas
municipais, incluindo São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador.
A logística organizacional dos grupos da “segunda onda” do movimento e suas
perspectivas mais pragmáticas contribuiu para estas conquistas. O GGB foi registrado
legalmente como sociedade civil sem fins lucrativos (ONG) em 1983 e em 1988 já
possuíam infraestrutura própria. O Triangulo Rosa também é oficializado em 1985 no
Registro Civil de Pessoa Jurídica.

63
Paradoxalmente a epidemia da AIDS ao mesmo tempo em que construiu o estigma
sobre a homossexualidade - “peste gay” -, trazendo sofrimento, preconceito, morte para
esta população e fortalecendo a ideia de homossexualismo relacionado à doença, fomentou
importantes debates sobre a sexualidade. Práticas sexuais reconhecidas pelo senso comum
relacionada apenas à homoafetividade, como sexo oral, sexo anal, além do uso de
camisinhas e das doenças venéreas, passaram a ser intensamente comentadas e debatidas.
Além disso, houve a mobilização e apoio de outros atores sociais na luta anti AIDS,
como associações científicas, parlamentares, organizações não governamentais,
instituições internacionais e programas estatais, justamente no momento em que a
associação de caráter negativo entre homossexualidade e AIDS era muito forte.
Para Facchini a associação da AIDS com a homossexualidade, além de fomentar
todo debate social que se deu nesse sentido e promover encaminhamentos de políticas
públicas de saúde com objetivo de promover ações de prevenção e cuidados que
envolvessem a participação da comunidade homossexual viabiliza também a construção
política de identidades homossexual no Brasil.
Neste sentido de busca de identidades, a discussão sobre práticas homossexuais
desloca o foco sobre quem é “ativo” ou “passivo”, ou quem se aproxima mais do
“feminino” ou “masculino” na relação, para focar no sexo biológico do parceiro,
ampliando as questões sobre a bissexualidade e promovendo maior visibilidade da
homossexualidade (p. 119). Este contexto também mobiliza as políticas públicas adotarem
a nomenclatura de comportamento de risco no lugar de grupo de risco, a fim de evitar
julgamentos preconceituosos de populações mais vulneráveis.
O Programa Nacional de Controle de Doenças Sexualmente Transmissíveis e AIDS
foi criado em 1988, exatamente no contexto da redemocratização do país e da “segunda
onda” do movimento LGBT. Para Monteiro e Vilella o processo de redemocratização do
país fortaleceu os movimentos sociais, como também a criação do SUS, o qual pontua um
novo parâmetro para o acesso da saúde, substituindo o caráter previdenciário e
assistencialista, para assumir a saúde como direito de todo cidadão e dever do Estado,
garantidos na Constituição Federal de 1988. 101
Villela afirma também que “o surgimento da AIDS no painel mundial inaugura um
modelo de articulação entre Estado e sociedade civil inédito até então no enfrentamento
das questões de saúde”, caracterizado pelo estabelecimento de parcerias e pelo
financiamento direto do governo para organizações não governamentais que já estavam

64
atuando na área e cuja associação com os meios atingidos facilitava as ações previstas.
Assim o movimento político e social convergem demandas de vários grupos e diversos
atores sociais, acadêmicos, intelectuais, ativistas sociais e grupos marginalizados se unem
para defender um objetivo comum, confluência rara na realidade brasileira.
Evidencia-se então que a epidemia da AIDS apesar de causar uma desarticulação
inicial no movimento influenciou no seu processo de reestruturação, sobretudo na estrutura
organizacional e política dos grupos, resultado do contexto de redemocratização do país, e
da parceria da sociedade civil organizada com o Estado.
O movimento na década de 90 consegue assim se estabelecer de forma mais
regularizada e articulada, desencadeando marcos importante neste sentido. A Associação
Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) foi criada em
1995, primeira instituição nacional e representativa do movimento no Brasil. Neste mesmo
ano foi apresentado o projeto de lei 1.151 que instituía a união civil entre pessoas do
mesmo sexo. Vale notar que foram necessários mais 16 anos de luta até ela viesse a ser
aprovada em 2011.
A primeira Parada Gay do Orgulho GLBT ocorreu em 1997 em SP, e tornou-se a
maior do mundo. O movimento ganha forças, se institucionaliza e amplia suas conexões
com o Estado passando a demandar seus direitos perante o judiciário e a exigir políticas
publicas.
Em 2004 é lançado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da
República, o programa Brasil sem Homofobia102 que propunha ações direcionadas a cinco
componentes estruturais da vida social: direito à segurança; direito à educação; direito à
saúde, direito ao trabalho e direito à cultura. Na 13a Conferência Nacional de Saúde em
2008, a orientação sexual e a identidade de gênero são incluídas na análise da
determinação social da saúde e viria a gerar recomendações que seriam dois anos depois,
em 2010, citadas no texto da Política Nacional de Saúde Integral da população LGBT 103
publicada pelo Ministério da Saúde. Configurando assim o sucesso das estratégias de luta
do Movimento LGBT, e a consolidação da importância de suas proposições na construção
de marcos políticos determinantes na construção de cidadania e dignidade para este
contingente segmento populacional.
No entanto os obstáculos para “fazer valer” na vida real e cotidiana todas estas
conquistas ainda se configuram como um enorme abismo entre construção das leis e sua
execução. Desta forma, ainda que a mobilização dos movimentos tenha sido capaz de

65
influenciar a produção discursiva do Estado, assumindo agora em suas políticas as
propostas de despatologização das práticas, efetivação de direitos iguais de acesso e
qualidade e o combate ao estigma, preconceito e discriminação, e ainda que esse novo
discurso possa ser assumido performaticamente por gestores e profissionais de saúde que
trabalham para o Estado, isto ainda está muito distante de ter efeito sobre atitudes,
comportamentos e condutas nas unidades de saúde quando da ocorrência dos "contatos
mistos" dos quais falava Goffman entre os pretensamente normais (representados pelos
profissionais de saúde) e os estigmatizados (representados pelos sujeitos incluídos nas
populações LGBT).
Por outro lado, o fundamentalismo religioso avança vertiginosamente no país,
numa violação sistemática a laicidade do Estado, com grupos influenciando o processo
legislativo e constituindo uma persuasiva bancada homofóbica, o que se torna um enorme
desafio para solidificação das conquistas dos movimentos sociais na defesa do
reconhecimento legal do segmento LGBT.
Este cenário deixa evidente que o Brasil passa atualmente por um momento
desafiador com relação aos direitos da população LGBT. Se por um lado, foram
conquistados direitos, como o reconhecimento legal da união homoafetiva, o uso do nome
social para travestis e transexuais, a garantia do processo transexualizador pelo SUS, a
recente decisão do STF da retificação do registro civil das pessoas trans sem necessidade
de cirurgia, por outro a sociedade, marcada por uma construção sócio histórica
conservadora, sexista e machista, ameaça a concretização destes direitos.
Nessa perspectiva, o desafio tem sido concretizar as demandas apresentadas pelo
movimento social por meio de implementação de políticas transversais pelos diversos
órgãos governamentais. Nesse sentido, a 1ª Conferência Nacional GLBT de 2008, foi um
marco histórico que resultou no Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos
Humanos de LGBT da SEDH/PR. Em consonância com tal conjuntura, o MS lança em
2011, a Política Nacional de Saúde Integral de LGBT.
Além destes marcos, a Política é ancorada também na resolução da 13ª Conferência
Nacional de Saúde (Brasil, 2008) onde "a orientação sexual e a identidade de gênero são
incluídas na análise da determinação social da saúde"5(p. 11). Sobre os determinantes
sociais de saúde (DSS) as diversas definições que incidem sobre o tema, abordam os
fatores causais do processo saúde-doença, para além da visão biologicista, considerando as
condições de vida e trabalho dos indivíduos e de grupos da população. A OMS104 cria a

66
Comissão sobre os Determinantes Sociais da Saúde (CDSS) em 2005, reconhecendo a
crescente globalização e expansão do capitalismo como causadoras do aumento das
desigualdades sociais no mundo, e assim atribui visibilidade aos determinantes sociais na
situação de saúde de indivíduos, e sua importância no combate às iniquidades em saúde 105.
A Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais de Saúde (CNDSS) 106 instaurada
em 2006 pelo MS/FIOCRUZ, seguindo a decisão da OMS, reafirma os aspectos sociais,
econômicos, culturais, étnico-raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a
ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população.
No entanto, apesar da importância e visibilidade proferida aos DSS no contexto
da saúde global, considerando o avanço neoliberal, e o consequente aumento da iniquidade
e das injustiças sociais, estudiosos do tema 107, 108, 109 criticam a fragmentação do social em
camadas, fatores de riscos, grupos de risco onde perde-se a dimensão do processo sócio
histórico e fortalece a posição positivista da epidemiologia e aponta a "redução do
problema da desigualdade social a um problema distributivo"105 (p. 1176). Costa110 segue
esta perspectiva e reforça que a CNDSS foi idealizada sob os ideias da Reforma Sanitária
Brasileira (RSB), e que prevista para atuar na produção acadêmica, na ação governamental
e na mobilização social, a sua crítica recai justamente no excessivo enfoque científico e
epidemiológico, em detrimento dos aspetos socioculturais.
A RSB é um movimento social e acadêmico ainda em construção no cenário
nacional, que aparece no inicio dos anos 70 na luta contra ditadura militar com tema saúde
e democracia e não se limitou as políticas de saúde, nem à própria reorganização do
sistema de saúde, pois além de mudanças administrativas e financeiras, exigia uma
reformulação mais profunda de dimensões ideológicas e institucionais visando o conceito
amplo de saúde, e se estabelecendo como projeto ético, político e civilizatório, inserindo a
saúde no modelo de desenvolvimento que de fato promova a melhoria das condições de
vida das pessoas.111
Tanto Costa como outros autores105 apontam o DSS como conceito estruturante
da RSB e ressaltam a importância de situá-los na matriz marxista na conjuntura da saúde
como bem coletivo, portanto, consequencia da acumulação social. A complexidade dos
processos sociais e econômicos que causam as desigualdade e iniquidades exige análise
crítica e concepções políticas intersetoriais não menos complexas que valorizem a vida
humana e grupos e classes sociais diversas em suas realidades.

67
Costa110 aponta que para suprir a necessidade e desejos de grupos sociais
diversos e coletividade, fortemente obstacularizada pela corrente hegemônica do modelo
capitalista de exploração das classes sociais é imprescindível uma tomada de consciência
destes grupos na exigência do direito, considerando os aspectos sociais e econômicos
relacionados à saúde, e coloca a participação social como elemento fundante desta
conquista que poderá ser significativo na compreensão ampliada dos DSS.

Os movimentos sociais devem ser considerados e valorizados como base de


resistência da luta pelo direito a saúde. A existência de uma extensa rede de
organizações e movimentos sociais vem sendo estruturada sob urna ética de
solidariedade social que constitui e mobiliza a luta social. Em todas as suas
modalidades e dimensões, essa ação pode trazer elementos importantes ao
entendimento da determinação social da saúde. (p. 445)

A CNDSS106 em seu relatório final “As Causas Sociais das Iniquidades em


Saúde no Brasil”, também coloca como pilares fundamentais para atuação dos
determinantes sociais a participação social, a promoção da autonomia dos grupos mais
vulneráveis da população e ações intersetoriais que visem à melhoria da qualidade de vida
e saúde. Neste sentido a Política Nacional de Saúde Integral da População LGBT
compactua com o que é consenso para a compreensão aprofundada do DSS, na medida em
que traz em sua formulação a intensa participação do movimento social, reconhece
orientação sexual e identidade de gênero como determinantes sociais e tem entres seus
princípios a intersetorialidade.
Também, enquanto política social 112 , considerando o alinhamento das condutas
organizacionais e estatais de promoção da seguridade social, do compromisso com a
diminuição das desigualdades e com o desenvolvimento de estratégias coletivas na redução
das vulnerabilidades das pessoas aos riscos sociais, a construção da Política Nacional de
Saúde Integral da População LGBT, é um exemplo na universalização de direitos em um
contexto de desigualdade e no exercício da cidadania e da participação social.
O próprio texto de apresentação da Política, a reconhece como resultado de uma
ampla mobilização histórica dos movimentos sociais que lutam pelos direitos da população
LGBT. Desde a década de 80, em face da explosão da pandemia da AIDS, vem-se
marcando posição em espaços formais de diálogo com o Estado, tais como as Conferências
Nacionais de Saúde, no Conselho Nacional de Saúde, nos fóruns específicos e grupos de
trabalho, contribuindo para a elaboração de ações e programas.
A Política foi construída para atuar nos três níveis de complexidade de atenção à

68
saúde, estabelecendo ações e responsabilidades específicas nas três esferas de governo e
contemplando toda a organização da atenção. Estabelece seus objetivos tomando como
referências reivindicações tradicionais dos movimentos sociais, dentre as quais destaca-se
a promoção da saúde integral de LGBT eliminando a discriminação e o preconceito
institucional bem como contribuindo, para redução das desigualdades.
Dentre os objetivos específicos da Política, destacam-se: instituir mecanismos de
gestão para atingir maior equidade no SUS, com especial atenção às demandas e
necessidades em saúde da população LGBT, incluídas as especificidades de raça, cor,
etnia, territorial e outras congêneres; ampliar o acesso da população LGBT aos serviços de
saúde do SUS, garantindo às pessoas o respeito e a prestação de serviços de saúde com
qualidade e resolução de suas demandas e necessidades; qualificar a rede de serviços do
SUS para a atenção e o cuidado integral à saúde da população LGBT; garantir acesso ao
processo transexualizador na rede do SUS, nos moldes regulamentados; promover
iniciativas voltadas à redução de riscos e oferecer atenção aos problemas decorrentes do
uso prolongado de hormônios femininos e masculinos para travestis e transexuais; reduzir
danos à saúde da população LGBT no que diz respeito ao uso excessivo de medicamentos,
drogas e fármacos, especialmente para travestis e transexuais; definir estratégias setoriais e
intersetoriais que visem reduzir a morbidade e a mortalidade de travestis; buscar no âmbito
da saúde suplementar a garantia da extensão da cobertura dos planos e seguros privados de
saúde ao cônjuge dependente para casais de lésbicas, gays e bissexuais; atuar na
eliminação do preconceito e da discriminação da população LGBT nos serviços de saúde;
garantir o uso do nome social de travestis e transexuais, de acordo com a Carta dos
Direitos dos Usuários da Saúde; fortalecer a participação de representações da população
LGBT nos Conselhos e Conferências de Saúde; incluir ações educativas nas rotinas dos
serviços de saúde voltadas à promoção da autoestima desta população.
Um dos valores maiores da Política Nacional de Saúde Integral da População
LGBT é combater toda forma de discriminação e preconceito. Quando a Política faz
referência ao “preconceito institucional”, esta deixa claro, a vulnerabilidade a que esta
população está exposta nos serviços de saúde, e o preconceito de profissionais sobre as
práticas sexuais e sociais de LGBT, ocasionando a desqualificação da atenção dispensada a
essa população, e ratificando que os processos discriminatórios alcançam portanto, o
próprio sistema de saúde.
O resultado de pesquisas recentes que avaliaram a percepção de gestores, usuários e

69
ativistas de movimentos sociais sobre a implantação dessas ações contra homofobia, e seus
impactos concretos na vida da população alvo, não são muito animadores. Demonstrou-se
que percepções de uso político do programa, sem efetivação das ações, ausência de
sensibilização na sociedade, apontam para a fragilidade do programa por este servir apenas
como diretrizes, não podendo representar a força de uma política pública propriamente
dita113.
Entende-se assim a crucial importância do reconhecimento da trajetória histórica do
movimento LGBT na construção de políticas públicas e na conquista de direitos e
cidadania, como também se reconhece diante do cenário sócio político do nosso país, que o
fundamentalismo religioso, a heteronormatividade e a homofobia, podem apresentar-se
como grandes desafios para consolidação plena da Política Nacional de Saúde Integral da
População LGBT e de outros aspectos jurídicos legais que garantam o bem estar físico
emocional e social desta população.

70
5. CONTEXTUALIZANDO O CAMPO

A pesquisa foi elaborada para ser realizada em unidades de Atenção Básica à Saúde
(ABS) onde já se encontrassem implantadas a Estratégia de Saúde da Família (ESF),
envolvendo cidades de duas diferentes regiões do país, no Centro-Oeste com a cidade de
Goiânia (GO), nas Regiões Administrativas do Distrito Federal (DF)2: Brasília, Ceilândia e
Taguatinga e na região Nordeste, no Estado da Bahia, Vitória da Conquista e a capital
Salvador.
Para uma melhor compreensão dos procedimentos de pesquisa que serão descritos
no capítulo de material e métodos, bem como dos significados dos resultados obtidos, faz-
se necessário contextualizar o campo de pesquisa, traçando uma breve caracterização da
estrutura, organização e processos de trabalho dos profissionais das Unidades de Saúde da
Família (USF) no SUS, do nível de desenvolvimento da ESF nas cidades envolvidas, como
também da realidade social das populações, da ocorrência sobre violência homofóbica
nestas populações, e a presença ou não de programas e ações instituídos pelos poderes
públicos e sociedade para combate a homofobia e promoção do respeito à diversidade de
orientação.

5.1 Atenção Básica e Estratégia de Saúde da Família


Foi na 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986), considerada marco histórico no
caminho da redemocratização, que a RSB consolidou-se e colocou em pauta importantes
temas: saúde como direito, reformulação do Sistema Nacional de Saúde e financiamento
do setor. Em seguida a Constituição de 1988, reconhecida como constituição cidadã,
garante no seu Art. 196 a saúde como direito de todos e dever do Estado, e as leis orgânica
(Lei N.º 8.080/90 e N.º 8.142/90) criam o arcabouço legal para a construção de um dos
maiores sistemas públicos de saúde, o SUS, que passou a oferecer a todo cidadão brasileiro
acesso integral, universal e gratuito a serviços de saúde nos três níveis de atenção.
Os princípios de igualdade, universalidade, equidade, integralidade, da participação
da sociedade no controle da política e da saúde como direito social (cidadania) norteiam as
ações de planejamento e execução do sistema. Nesse cenário, o Programa de Saúde da
Família (PSF) foi idealizado em 1994 como estratégia de reordenamento do modelo de

2
Regiões administrativas do DF na prática funcionam como típicas cidades, mas com a
particularidade de não possuir prefeitos nem vereadores e sim administradores regionais e secretários
indicados pelo Governador do Distrito Federal.
71
atenção a saúde, buscando ampliar a cobertura dos serviços, através da reorganização da
atenção básica (ABS), com foco na promoção da saúde e no território.114
A concepção de ABS adotada no país sofreu grandes influências das mobilizações
mundiais para reconhecimento da saúde como direito humano básico a exemplo das
Conferências de Alma-Ata (1978) e de Ottawa (1986), as quais enfatizavam a necessidade
da substituição do modelo assistencial biomédico privatista, pautado no abuso tecnológico
e diagnose, e dirigido a grupos socialmente mais favorecidos, para uma visão de saúde
ampliada onde ações de prevenção e promoção à saúde tivessem o mesmo peso que o
tratamento e reabilitação, e onde o abismo das desigualdades sociais pudesse ser
progressivamente reduzido por meio de uma atenção à saúde centrada na equidade com
foco nas populações vulneráveis e de baixa renda.
Inicialmente as ações implantadas pelo Estado na década de 90 visavam à
racionalização dos gastos públicos e se expressavam na focalização de grupos em
desvantagem social como forma mais assertiva para reestruturação dos modelos de atenção
à saúde. Giovanella e Mendonça (2008)115 também sustentam que a ABS no país na época
de sua implantação foi compreendida e formulada com parâmetros voltados à seletividade
e focalização, pautada nos princípios da equidade e melhoria da qualidade de vida dos
grupos excluídos, o que, por sua vez, já vinha sendo impulsionado pelos potenciais
resultados do Programa Nacional de Agentes Comunitários de Saúde (PNACS). Neste
sentido diversas ações foram elaboradas para fortalecer o novo Modelo de Atenção à
Saúde, a exemplo das Normas Operacionais Básicas/96, que estimulou a descentralização,
proporcionando maior poder econômico e de gestão aos municípios, com o fim de reduzir
a desigualdade no acesso e avançar além da seletividade.
A questão da seletividade para populações de baixa renda foi criticada por muitos
autores 116 , 117 , 118 pelo víeis da proposição verticalizada de organismos internacionais
baseada no modelo neoliberal e no assistencialismo, prevendo a incorporação de políticas
sociais e de saúde, principalmente em países em desenvolvimento, como paliativo na
resolução das desigualdades e extrema pobreza, uma vez que não mobiliza os nós caóticos
da disparidade social econômica. Outros estudiosos percebem a focalização como uma
discriminação positiva face ao cenário de grandes desigualdades socioeconômicas e
culturais que vivemos, fortemente marcado pelos determinantes sociais de exclusão como
etnia, raça e gênero, e reconhece a reestruturação do sistema de saúde como ação de

72
política necessária e urgente para o acesso saúde, programas e serviços sociais aos
segmentos mais vulneráveis e excluídos da sociedade119,120.
121
Souza acrescenta que ao privilegiar territórios onde existam maiores
vulnerabilidades socioeconômicas, a ESF se estabelece como estratégia de promoção de
equidade (vertical) em saúde, oferecendo maior oferta de serviços onde existem as maiores
necessidades, desta forma compreende que o principio da universalização não contradiz o
critério de seletividade ou focalização, deste de que seja um instrumento da política de
universalização e não um fim único como política social.
Giovanella e Mendonça argumentam ainda que a ABS foi tomando
progressivamente um caráter mais abrangente e articulado com os demais níveis de
complexidade de saúde, assumindo o papel de coordenadora de cuidados da população, na
medida em que a Saúde da Família passa de programa a estratégia. Isso significou uma
mudança de perspectiva de sistematização de ações dirigidas à compensação de
desvantagens, proteção de vulnerabilidades e vias de construção de equidade, para uma
estratégia de organização do próprio modelo de atenção dentro de um sistema de saúde
pública que pretende cumprir os princípios de universalidade e integralidade.
Em 2006 foi aprovada a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) tendo como
pilares o processo de descentralização e controle social da gestão e como fundamento as
diretrizes organizacionais e assistenciais do SUS, focando na reelaboração dos processos
de trabalho a partir da ESF. No mesmo ano o Pacto pela Saúde, tramitado pela Comissão
Intergestores Tripartite (CIT), determina três dimensões de ação: Pacto pela Vida, Pacto
em Defesa do SUS e Pacto de Gestão. A prioridade do Pacto pela Vida foi: “consolidar e
qualificar a estratégia Saúde da Família como modelo de Atenção Básica e centro
ordenador das redes de atenção à saúde no SUS” (Brasil, 2006)122.
A ESF é constituída pela formação de equipes multiprofissionais compostas, no
mínimo, por um médico generalista ou com especialização em Saúde da Família, um
enfermeiro generalista ou especialista em Saúde da Família, auxiliar ou técnico de
enfermagem e agentes comunitários de saúde (ACS). Os ACS são indivíduos pertencentes
às próprias comunidades, que recebem formação específica para exercer determinadas
funções de atenção à saúde nos territórios e atuarem como mediadores entre a comunidade
e os serviços. As equipes podem ter ainda a composição ampliada, podendo acrescentar
cirurgião e auxiliar ou técnico em saúde bucal. As equipes de cada unidade são distribuídas
por território de forma que fiquem responsáveis por, no máximo, 4.000 pessoas, e cada

73
ACS deve atender um grupo de famílias, perfazendo um máximo de750 pessoas,devendo
cobrir 100% da população cadastrada.123
O método de trabalho da ESF fortalece o planejamento da equipe de saúde na
medida em que focaliza o atendimento de uma dada população adstrita ao território
delimitado de abrangência, priorizando sistematicamente visitas domiciliares, promoção e
educação em saúde, atendimento ambulatorial, resolutividade das demandas básicas,
encaminhamentos e um acompanhamento mais próximo dos problemas de saúde
individuais e coletivos. Esta lógica promove um vínculo mais estreito da comunidade com
a equipe de saúde e tende a valorizar o indivíduo além de sua doença, no sentido de
integralidade e continuidade da atenção a partir das necessidades reais de saúde
apresentadas pelas pessoas124.O modelo de ação da ESF pressupõe assim estratégias que
facilitem a proximidade população/profissional, estabelecendo uma comunicação eficaz e
reconhecimento da realidade sócio-sanitária local, a fim de que sejam atingidos os
objetivos institucionais propostos125.
A nova PNAB publicada em 2011 reforça e amplia o modelo de atenção a saúde
conforme os princípios da ABS e a ESF como porta de entrada preferencial aos usuários,
promovendo uma estrutura mais acolhedora e uma coordenação de cuidados diversificada,
incluindo os Consultórios de Rua, as UBS fluviais e ESF para populações ribeirinhas,
como também expandiu os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) 126.Os NAFS
foram criados em 2008, com o intuito de fortalecer e consolidar a ESF na ABS por meio da
ampliação das ofertas, abrangência dos serviços e melhoria da resolutividade. São
formados por grupos de profissionais que não fazem parte da estrutura básica da ESF, tais
como pediatras, nutricionistas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e buscam
qualificar a atenção, pela construção conjunta de projetos terapêuticos e intervenções em
prevenção de agravos e promoção da saúde127.
Segundo Starfield128 a ABS é a base que determina o trabalho de todos os outros
níveis dos sistemas de saúde e promove a organização e racionalização da utilização dos
recursos, tanto básicos como especializados, direcionados para a promoção, manutenção e
melhoria da saúde. Considerada como porta de entrada do SUS e, sobretudo, quando tendo
a ESF estabelecida, a ABS torna-se arena privilegiada para implantação, avaliação e
monitoramento de toda e qualquer política pública de busca de equidade129.
Sousa121 afirma que apesar das inúmeras dificuldades no percurso do processo de
implementação do programa, dificuldades próprias do legado de um modelo de atenção

74
curativista, hospitalocêntrico e médico-assistencial-privatista, a ESF apresenta-se como um
programa inovador de grandes potencialidades para contribuir com a universalização do
acesso. Aponta ainda que diante as abismais desigualdades sociais no Brasil, com sistema
de proteção social ainda fragilizado, a ESF apresenta-se como ferramenta de construção de
capacidades comunitárias nas problematizações de saúde, fortalecimento da consciência
sanitária, sendo necessário para isto assumir sua função social e política na superação do
modelo médico hegemônico e na construção de projetos e programas que tenham a
capacidade de interferir positivamente nos determinantes sociais de saúde, e favorecer na
efetivação de uma política pública afinada com os princípios e diretrizes do SUS.
Assim sendo, estes espaços passam a constituir também um campo de pesquisa
fundamental para compreensão da perspectiva dos profissionais de saúde ao lidarem com
as vulnerabilidades socioculturais, as diversidades e os determinantes sociais, e, portanto,
um campo adequado para compreender a percepção dos médicos(as) e enfermeiros(as)
sobre a diversidade sexual e atenção à saúde ofertada a população LGBT, objetivo
norteador desta pesquisa.

5.2 Campo: Organização da ABS e caracterização das populações nas cidades


envolvidas.

Serão apresentados o modelo de ABS adotada em cada município, a quantidade de


USF e de equipes de saúde da família implantadas e a cobertura populacional atingida,
bem como os programas de combate à homofobia e promoção do respeito à diversidade em
atividade no município. A breve caracterização das populações será baseada no tamanho
populacional das cidades, no índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM -
medida que envolve três dimensões de avaliação: a expectativa de vida, o nível de
educação, e o acesso à renda, com índice variando de 0 a 1, sendo que quanto mais
próximo de 1, maior o desenvolvimento humano) 130 e finalmente, a gravidade da
homofobia segundo relatórios da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da
República e do Grupo Gay da Bahia (GGB).
Aqui é necessário abrir um espaço para contextualizar as inconstâncias dos dados
sobre homofobia no Brasil. O Relatório de Violência Homofobia da Secretaria de Direitos
Humanos da Presidência da República (SDH/PR) foi lançado em 2011 numa iniciativa
pioneira na America Latina na apuração de dados quantificáveis por órgãos oficiais
(Disque 100) sobre a violência/violação por homofobia com o objetivo de fomentar
75
estatísticas para formulação de políticas publicas no combate ao arraigado preconceito e
discriminação por orientação sexual no nosso país. O Relatório foi publicado anualmente e
infelizmente teve vida curta, sendo sua ultima publicação em 2013.
O Relatório apura também os dados não oficiais, ou seja, dados hemerográficos,
aqueles obtidos da pelas mídias, internet, incluindo as diversidades de redes sociais
existentes e noticias de jornais. A iniciativa pioneira deste levantamento foi
responsabilidade do Grupo Gay da Bahia (GGB) que desde a década de 80 faz uma linha
histórica dos assassinatos homofóbicos, não o numero total, mas o que foi noticiado na
mídia no Brasil. O objetivo do Relatório ao incorporar estes dados é de “compreender a
abordagem das violações contra a população LGBT a partir de um importante vetor social:
a mídia" e realizar um levantamento minucioso de notícias de jornais, redes sociais,
revistas, blogs de notícias, televisão e rádio. No entanto os dados hemerográficos não são
somados aos dados oficiais por prescindirem de metodologias distintas.
A escolha por apresentar os dados hemerográficos dos dois Relatórios nesta breve
contextualização do campo, se justifica, pois o ultimo Relatório da SDH de 2013
apresentou diminuição significativa de percentual das denuncias feitas por violação ao
segmento LGBT através do Disque 100, porém segundo o próprio relatório não se pode
inferir que a violência tenha diminuído, pois “variáveis como a falta de manutenção de
campanhas de divulgação pelos entes federativos e o alcance restrito desse meio de
denúncia que possui dificuldades de acessar municípios de menor porte são causas
possíveis de flutuação na taxa de denúncia”. O pouco tempo de vida útil e de implantação
do Relatório e consequente fragilidade na absorção da cultura de denunciar as violências
contra o segmente LGBT, também podem influenciar nesta variação, não configurando
dados absolutamente fidedignos. Entretanto, os dados hemerográficos aqui apresentados
nos auxiliam a ter uma ideia da violência homofóbica em cada região, ainda que não
correspondam à totalidade violação dos direitos humanos e violência contra o segmento
LGBT.
O último relatório do movimento contabiliza 445 mortes do segmento LGBT no
país em 2017, um aumento de 30% em relação a 2016, quando foram registrados 343
casos. Dados alarmantes que faz com que o Brasil ocupe o primeiro lugar no mundo de
crimes causados pela “LGBTfobia”, sendo um assassinato a cada 19 horas. Os dois
relatórios trazem a discussão da invisibilidade trans, devido os limites da sociedade em
reconhecer as transexualidades e associar os homicídios desta população as

76
vulnerabilidades a que estão expostas, como prostituição e uso de drogas, e não ao fato da
transfobia. Segundo o Transgender Europe131nos últimos oito anos o Brasil matou 868
travestis e transexuais, liderando a morte deste segmento no mundo, revelando a
invisibilidade e a rotina de exclusão e violência a que são submetidas.
Também o Transgender calcula o risco de uma pessoa trans ser assassinada é 14
vezes maior que um homem gay cis e as trans brasileiras têm 9 vezes mais chance de morte
violenta do que as trans norte-americanas. Em 2016 foram 144 travestis brasileiras
assassinadas, face às 21 trans americanas. A ANTRA contabilizou em 2017, 179
assassinatos de pessoas trans, sendo 169 travestis e mulheres transexuais e 10 homens
Trans.
Os dois relatórios também evidenciam que apesar de todos os marcos legais e
políticos instaurados no país, a partir do programa Brasil sem Homofobia (2004), ainda
não foi revertido cenário de crueldade causadas pela “LGBTfobia” no país, requerendo
medidas ainda mais eficazes e que transformem o cotidiano violento destas pessoas em
espaços de cidadania e respeito, tarefa árdua frente a uma sociedade historicamente
machista e heteronormativa, agravada pela atual conjuntura de retrocesso sociopolítico
instaurada no ultimo ano no país.
Na região Centro-Oeste foram selecionadas a capital do Estado de Goiás, Goiânia, e
capital do país Brasília, no Distrito Federal (DF) com mais duas regiões administrativas
Ceilândia e Taguatinga. Goiânia é a segunda maior cidade do Centro Oeste com
aproximadamente 1.448.639habitantes (IBGE/2016) encontra-se no 45º lugar entre as
cidades brasileiras, com IDHM de 0,799, considerado alto 132. A Organização da Atenção
Básica à Saúde (ABS) na cidade de Goiânia é feita por Distritos Sanitários, que
corresponde à alocação dos recursos de saúde de acordo com as características sociais e
epidemiológicas de determinada área geográfica, podendo compreender vários bairros de
um município, ou vários municípios de uma região133. Na época da coleta de dados (2014),
possuía 183 Equipes de Saúde de Família implantadas espalhadas em 62 Centro de Saúde
da Família (CSF)134 significando uma percentagem de cobertura da população da ordem de
47,85%135.
A ABS nesta cidade comporta ainda o Centro de Atenção Integrada à Saúde (Cais),
o Centro Integrado de Atenção Médico Sanitária (CIAMS) que oferecem serviços
ambulatoriais e de urgência e emergência 24 horas aos usuários do SUS, Centros de

77
Atenção Psicossocial (CAPS), NASF, além de diversos programas de saúde, conforme
informação do próprio site da Secretaria de Saúde local.
No que se refere a programas de combate à homofobia e promoção do respeito à
diversidade, quando da coleta de dados, o município contava com o Conselho Estadual de
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais-LGBTT, o Dia Estadual do combate à
homofobia, instituído pela lei nº 16.659/2009, o Comitê Técnico de Saúde Integral de
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais e a garantia do uso do Nome Social
para travestis transgêneros e transexuais em todas as instâncias publicas estaduais 136. Em
2013 foi instaurada a Assessoria Especial de Diversidade Sexual que objetiva apoiar e
acompanhar diagnósticos sobre a situação da população de lésbicas, gays, bissexuais,
travestis e transexuais no município e elaborar projetos ou programas voltados a esses
grupos, dentre outras funções. No mesmo ano a Secretaria de Políticas para Mulheres e
Promoção da Igualdade Racial e a Secretaria Estadual de Segurança Pública cria um Grupo
de Trabalho com a finalidade de elaborar o Plano de Ação para enfrentamento à violência
doméstica e homofóbica no Estado de Goiás. No âmbito acadêmico a Universidade Federal
de Goiás conta com o O Ser-Tão, Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gênero e
Sexualidade, da Universidade Federal de Goiás, tem por objetivo produzir e divulgar
conhecimentos compromissados com a equidade de gênero e a garantia dos direitos
sexuais, como também o combate a LGBTfobia.
Apesar de todos estes avanços em termos de legislação, e possuir um forte
movimento social na defesa da população LGBT Goiânia ainda apresenta marcantes
características conservadoras e hierárquicas de sua sociedade. Braz et cols. 137 ao analisar
discursos da população LGBT em Goiânia, ressaltaram que um dos temas mais presentes
nas falas, foi falta de autonomia e de liberdade para demonstrações afetivas em públicos,
falta de espaços de lazer e convivência, relatos de preconceitos praticados por proprietários
ou clientes de estabelecimentos comerciais, shoppings, restaurantes, e ainda mais graves
para travestis e transexuais.Segundo o último Relatório de Violência Homofóbica da
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República – SDH/PR de 2013 o estado
de Goiás ocupa 15º lugar no país de homicídios por homofobia 138 . Dados recentes
139
levantados pelo Relatório de Assassinatos LGBT no Brasil/2016 coordenado pelo
Grupo Gay da Bahia (GGB) coloca o estado de Goiás em 9º lugar no país em assassinatos
homofóbicos com relação as demais UF brasileiras.

78
O Distrito Federal com população de 2.977.216 habitantes (IBGE/2016), é a
primeira da região mais populosa do Centro Oeste. Brasília que corresponde ao Plano
Piloto do DF tem 220,3 mil moradores (IBGE 2016), os demais habitantes do DF estão
espalhados entre as 18 Regiões Administrativas (cidades satélites). Duas dessas cidades
satélites estiveram envolvidas na pesquisa, Ceilândia e Taguatinga. Historicamente criadas
para abrigar trabalhadores que vieram para a construção de Brasília, elas não costumam
figurar nos mapas de desenvolvimento humano de forma isolada, apesar das evidentes
diferenças nas condições socioeconômicas das populações das cidades satélites, muito
inferiores as da população que habita o chamado plano piloto da cidade. Estudo do IBGE,
já demonstrou um índice de pobreza de 37,7%, superior ao de cidades como Rio de Janeiro
e São Paulo140. Dessa forma o IDHM de Brasília, quando calculado de forma agregada
com as das demais regiões administrativas, encobre a realidade destas cidades satélites. O
mapa do desenvolvimento coloca Brasília em 9º lugar entre todos os municípios do país,
com um IDHM de 0,824, considerado muito alto. Entretanto, sabe-se que em regiões
administrativas como Ceilândia e Taguatinga, esses índices são muito mais baixos.
A organização da Atenção Básica dá-se a nível central através da
coordenação Atenção Primária da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, pelas DIRAPS,
direção de Atenção Primária presentes em cada região administrativa e as distribuições das
UBS são ordenadas por Região de Saúde. A ABS também conta com o suporte dos
Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) os Centros de Apoio Psicossociais (CAPS),
além de outros centros e programas que complementam a assistência integral aos usuários.
A Regional de Saúde de cada região consta com UBS mistas que associa o modelo de
Centro de Saúde e ESF, e outras UBS apenas com ESF.
O DF na época da coleta de dados da pesquisa contava com um total de 243
Equipes de Saúde da Família (DAB/2015) e com 158 UBS instaladas, sendo 103 apenas
com ESF e as demais 55 mistas, com cobertura da população geral de 31,65%. O Plano
Piloto de Brasília, que faz parte da Região Centro Sul e Centro Norte, conta com 11
Centros de Saúde e apenas 01 PSF. Ceilândia compõe a Região de Saúde Oeste, tem 12
UBS mistas e 4 contam com ESF. Já Taguatinga faz parte da Região de Saúde Sudoeste,
tem 8 UBS e 4 com ESF. 141
Na legislação do Distrito Federal consta a Lei nº 2.615/2000 142 que determina
sanções às práticas discriminadas em razão da orientação sexual das pessoas, a portaria que
autoriza o uso do Nome Social em todas as instâncias e também o dia de Combate a

79
Homofobia. Recentemente, em 23 de junho/2017, o governo local regulamentou a lei que
pune a homofobia, antiga reivindicação do movimento LGBT local, porém após três dias,
em 26 de junho/2017, o mesmo foi derrubado pela bancada fundamentalista cristã e seus
aliados da Câmara dos Deputados, que atualmente apresenta uma das maiores ameaças a
consolidação dos poucos direitos conquistados pela população LGBT 143. No que se refere
ao mapa da Homofobia, o Distrito Federal figura em 23º lugar no país segundo o relatório
do Governo (2013) e 13º lugar no recente relatório do GGB (2016), juntamente com Mato
Grosso, Sergipe e Acre129. Nesse ponto também as diferenças nos níveis educacionais e de
influência de fundamentalismos religiosos entre as populações do plano piloto e
populações de cidades satélites como Ceilândia e Taguatinga podem criar cenários bastante
distintos, no que se refere a conservadorismos morais e práticas de intolerância.
A região nordeste esteve representada na pesquisa pelas cidades de Vitória da
Conquista e a capital do Estado, Salvador. Salvador é a maior cidade do nordeste brasileiro,
com 2.938.092 habitantes, tem IDHM de 0,759, considerado alto e está no 383º lugar dos
municípios brasileiros 144 . Na organização da Atenção Básica a cidade conta com a
Diretoria de Atenção Básica, que possui diversos núcleos e coordenações de apoio a
exemplo da Coordenação de Avaliação e Monitoramento (COAM) e a Coordenação de
Apoio e Desenvolvimento da Atenção Básica (COAD), dentre outros, e também com
NASF e CAPS. As UBS com ESF e também são organizadas por Distritos Sanitários119.
Na época da coleta de dados contava com 230 Equipes de Saúde da Família Implantadas
com cobertura populacional estimada em 30,8% (DAB/2016) espalhadas nas 61 USF
distribuídas nos oito Distritos Sanitários145.
Apresenta instituído como ações para população LGBT o Plano Municipal de
Políticas Públicas de Cidadania e Direitos LGBT (PMLGBT) lançado em 2016 que tem
por objetivo garantir direitos e viabilizar a dignidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais,
Travestis, Transexuais e Transgêneros146, o Núcleo de Políticas Públicas de Cidadania e
Direitos LGBT147 e o Comitê Municipal de Promoção e Defesa dos Direitos de Lésbicas,
Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (Comitê LGBT).
Pelo Relatório do GGB há dez anos o nordeste é a região que lidera crimes de
homofobia no país e Salvador a cidade mais violenta. No Relatório oficial da SDH (2013)
a Bahia está em 4º lugar, atrás apenas de São Paulo (1), Pernambuco (2) e Minas Gerais (3)
e no ultimo relatório do GGB (2016) está em segundo lugar, atrás apenas de São Paulo 148.
Em recente entrevista (Maio/2017) o professor da Universidade Federal da Bahia, Leandro

80
Colling, criador e coordenador do grupo de pesquisa de Cultura e Sexualidade (CUS),
descreve a violência homofóbica na cidade como "alarmante" porém "previsível" devido a
ausência de políticas públicas eficazes:

Infelizmente, para quem pesquisa e é militante dessa causa, o aumento da violência não
surpreende. Aliás, diante do quadro que vivemos hoje, com a falta de políticas públicas
voltadas para combater o preconceito de ódio e de gênero, o que a gente teme é que essa
violência aumente cada vez mais. O quadro, infelizmente, não é de esperança para que
isso diminua.

Observa-se que mesmo com as políticas publicas para população LGBT existentes
na cidade, ainda persiste o preconceito e discriminação as diversidades sexuais,
enfatizando a distancia entre a implantação de uma política e a sua execução. Outros
fatores corroboram com esta premissa, como o uso destas diretrizes apenas para
campanhas políticas sem nenhuma sensibilização da sociedade, capacitação para
profissionais e consequente ausência de mudanças positivas no cotidiano da população,
como já foi discutido nesta tese.
Vitoria da Conquista, cidade de médio porte da região do Nordeste tem IDHM de
0,678 considerado médio e está no 2481º dos municípios brasileiros, dentre os 5565
existentes no país. É a terceira maior cidade da Bahia, atrás apenas de Salvador e Feira de
Santana e possui 350.284 habitantes (IBGE 2016). A Rede de Atenção Básica local possui
ESF instalada conforme o que preconiza o SUS na área urbana e rural. Conta também com o
apoio do NASF, do CAPS e outros centros de atenção a saúde relacionado a ABS. Na época da
coleta de dados contava com 42 Equipes de Saúde da Família instaladas com cobertura
populacional de 42,2% (DAB/2016) espalhadas em 30 USF da zona rural e urbana149.
A cidade detém diversos prêmios no âmbito das políticas sociais na área de assistência
social, educação básica e criança e adolescentes 150 e em 1999 recebe o Prêmio Saúde
Brasil, concedido pelo Ministério da Saúde como reconhecimento pelos resultados obtidos
com a implantação do Programa de Saúde da Família, especialmente no que se refere à
redução da mortalidade infantil151.
Na época da coleta de dados a cidade contava com a Assessoria de Políticas para
Diversidade Sexual e a Coordenação de Políticas de Promoção da Cidadania e Direitos de
LGBT (Coordenação LGBT) 152 responsável por propor e formular diretrizes no âmbito
municipal e promover ações no combate a homofobia e a livre orientação sexual e
identidade de gênero.A cidade é pioneira, do interior da Bahia, a garantir o Nome Social de
travestis e transexuais153 e também a única em regulamentar o Dia da Visibilidade Trans.
81
Por estes marcos, a cidade até 2016, era referência em políticas e ações para população
LGBT, além da abertura política da época, o protagonismo do jornalista e comunicador
social Danillo Bittencourt Santos, que foi coordenador e assessor das duas pastas de políticas
LGBT, contribuiu com excelência para tal reconhecimento.
Os dados sobre a violência homofóbica não são mensurados por municípios e sim por
regiões. Configurando a região do sudoeste baiano, está inserida na terceira região mais violenta
do país segundo o relatório da SDH e na segunda região conforme relatório GGB de 2016.
Dados da mídia154 informam que a cidade concentrou metade das mortes de homossexuais do
estado da Bahia no ano de 2014. Danillo Bittencourt declarou nesta matéria: "São crimes
bárbaros, em que a pessoa é morta não só com tiros, mas também é agredida com chutes,
murros e outros objetos, o que evidencia uma raiva maior para com a vítima porque ela
escolheu amar pessoas do mesmo sexo".
Considerando os dados de homofobia apresentados, fica claro que as políticas de
combate a homofobia e de promoção de direitos e cidadania da população LGBT
implantadas em cada cidade ainda não são suficientes para combater o preconceito e
discriminação contra esta população visto os dados de homofobia apresentados.
Esta apresentação sumária e descritiva do campo quanto à organização da UBS, dos
dados demográficos de cada região e da existência de programas e ações implementadas
contra homofobia contribui para a compreensão dos contextos sócios culturais dentro dos
quais os dados foram coletados, corroborando assim para situarmos no tempo e espaço
onde e quando os atores/profissionais estavam inseridos no momento que responderam a
entrevista.
No entanto pareceria metodologicamente inadequado buscar estabelecer relações
entre os achados nos discursos dos profissionais entrevistados e o contexto aqui
apresentado, visto que este aspecto não está entre os objetivos desta pesquisa, nem há um
estudo social de contexto em profundidade suficiente para sustentar essa vinculação.

82
6. MATERIAL E MÉTODOS

6.1 Caminhos Metodológicos

“Não há discurso sem sujeito, nem sujeito sem ideologia.”


Orlandi, 1966

O percurso metodológico da presente tese segue pela via da análise de discurso de


natureza qualitativa, envolvendo a fala dos(as) médicos(as) e enfermeiras(os) das Unidades
Básicas de Saúde sobre diversidade sexual e atenção à saúde da população LGBT. O
método foi escolhido por melhor se adaptar aos objetivos da pesquisa, pois possibilita fazer
emergir no processo de análise, ideologias e percepções componentes do discurso
enunciado, bem como os aspectos compreensivos e críticos sobre uma dada realidade
social.
155
Para Minayo a natureza do método qualitativo reside na capacidade de
assimilação do significado e da intencionalidade como condição inseparável e intrínseca
“aos atos, as relações e as estruturas sociais” compreendendo tanto as relações como as
estruturas sociais como processos dinâmicos históricos e contextuais produtores de
“construções humanas significativas”, superando aspectos puramente positivistas, sem
prescindi-los, na busca de associar o rigor científico com os complexos achados na
realidade do campo subjetivo e objetivo.
Valores, crenças, representações, contexto sócio-histórico precisam ser
incorporadas às análises qualitativas, sem perder de vista a complexa compreensão
sociológica de que o pesquisador é da mesma natureza do seu objeto. Minayo também
chama atenção para outro aspecto inerente à pesquisa social, esteja ela ou não no campo da
saúde, o fato que ela é intrinsicamente e extrinsecamente ideológica. Desde a escolha do
objeto até os resultados e análises, as questões de subjetividades permeiam toda a
construção de um estudo, baseadas em interesses e visões de mundo historicamente
construídas.
Para moderar a “contaminação” destas subjetividades na compreensão critica da
realidade e para evitar vieses nas inferências dos resultados, a autora coloca a objetivação
como condição imprescindível para uma boa analise qualitativa, utilizando para isto de
referencial teórico e metodológico eficaz e coerente.

83
Isto é, cabe ao pesquisador usar um acurado instrumental teórico e
metodológico que o municie na aproximação e na construção da realidade,
ao mesmo tempo, que mantém a crítica não só sobre as condições de
compreensão do objeto como de seus próprios procedimentos. (p. 42)

Dentro da abordagem qualitativa como uma das diversas técnicas capazes de dar
conta da compreensão critica da realidade, encontra-se a Análise de Discurso (AD), que
para Minayo traz uma contribuição importante para análise do material qualitativo,
"sobretudo numa situação em que a hegemonia sempre coube ás análises positivista dos
conteúdos das falas"(p. 321). A AD possibilita a compreensão dos sentidos do texto,
analisando a semântica, mas indo além desta, procurando decifrar o conteúdo ideológico
que sustenta os discursos.
Michel Pêcheux156, estudioso e um dos fundadores do método, estabelece a relação
existente no discurso entre língua/sujeito/história ou língua/ideologia, ou seja, articula o
lingüístico com o social e o histórico. Minayo coloca como objetivo essencial desta analise
"realizar uma reflexão geral sobre as condições de produção e apreensão da significação
dos textos produzidos nos mais diversos campos" (p. 319), ou seja, onde e como estes
discursos foram gerados e qual a ideologia implícita e explicita nas entrelinhas dos
mesmos.
Compreendendo que os discursos dos agentes de saúde aqui analisados carregam
em sua linguagem formações ideológicas que lhe são correspondentes, é com o fundador
da Escola Francesa da Análise de Discurso, Michel Pêcheux, que encontramos o arcabouço
teórico necessário para orientar nossa análise. Pêcheux "teoriza como a linguagem é
materializada na ideologia e como esta se manifesta na linguagem (p. 10)" 157. A partir
desta premissa coloca sujeito e seu discurso constituídos pela conjuntura social e pelas
condições históricas que o cercam, indo além da regras formais que produzem a fala, indo
além da lingüística, considerada limitante para compreensão das condições complexas que
formulam o discurso.
Como teoria, a Análise do Discurso se associa a três domínios disciplinares: A
Lingüística, O Materialismo Histórico e a Psicanálise, estabelecendo que o contexto
histórico e econômico, as relações sociais e de produção, o estudo da linguagem e do
sujeito, se articulam na formação discursiva. A ideia central do pensamento do autor é que
um evento discursivo seja de natureza política, educacional, informativa, não pode se
desvincular de sua exterioridade, ou seja, o sujeito discursivo é influenciado por uma

84
ideologia e pela conjuntura sócio-histórica que o envolve ainda que o mesmo não tenha
consciência desta influencia no espaço tempo que desenvolve o discurso.
Assim o discurso não se revela desprovido do contexto em que foi produzido,
apenas na compreensão dos textos em si, pois o sentido do discurso não é obvio e
transparente. É necessário analisá-lo para além da superfície, pois é na sua estrutura
profunda de produção que os reais sentidos do texto são desvelados. Pêcheux é enfático
sobre a determinação de compreender o arcabouço produtivo nos quais os discursos foram
elaborados, percebendo a linguagem, a fala materializada, subordinada a estruturas
macrossocias e a sua construção lingüística, ressaltando que “todo dizer é ideologicamente
158
marcado" (p. 38). Os planos materiais e simbólicos contidos em todo discurso são
considerados e sempre relacionados com o contexto, ou seja, a linguagem é trabalhada
tanto no senso comum como em suas noções contextuais e históricas.
Toda esta noção implica na percepção dos processos e no entendimento do sujeito
político/social para o entendimento do discurso. A linguagem desta forma não é neutra e
está centralizada na construção da vida em sociedade, compreendendo assim o sujeito não
individual e sim assujeitado ao coletivo, assim os discursos são proferidos a partir de uma
circunstância dada 159 . Pêcheux 160 exemplifica os discursos do sujeito político, o qual é
porta voz de forças e poder relacionadas a determinada ideologia, e as intersecções
antagônicas que interferem nesta fala, não estando o sujeito falando por si só, e sim
representando um pensamento maior que o atravessa.
Caregnato e Mutti161 chamam a atenção que a AD é uma disciplina de interpretação
e não uma metodologia visto os princípios de diferentes áreas que a regem, compreendidos
como a lingüística, o materialismo histórico e da psicanálise, como já mencionamos aqui e
citam que Pêcheux reforça a AD “sob o prisma de uma leitura interpretativa”. Trabalhar a
interpretação das falas é substancial neste contexto da AD, visto que não é conteúdo e a
forma que pretenderemos analisar e sim os sentidos produzidos naquele discurso,
considerando as circunstâncias no qual o mesmo é produzido.
As autoras ratificam que "a interpretação sempre é passível de equívoco" e colocam
o analista como interprete "que faz uma leitura também discursiva influenciada pelo seu
afeto, sua posição, suas crenças, suas experiências e vivências; portanto, a interpretação
nunca será absoluta e única, pois também produzirá seu sentido (p. 682)". Pontuam
também que não é preciso analisar tudo que aparece na entrevista, visto que é uma analise
vertical e não horizontal, focando na importância de trabalhar os recortes discursivos

85
relacionados com o arcabouço teórico levantado pelo analista. Deste modo a teoria trazida
pela AD de Pêcheux assim como a forma de analisá-los se relevam pertinentes para
averiguar os discursos dos profissionais aqui elencados, considerando suas representações
sociais, suas ideologias, o tempo espaço onde estes discursos emergiram, assim como
permitirá uma avaliação dos discursos a luz dos objetivos e do referencial teórico
levantados nesta pesquisa.
Sobre os passos metodológicos para AD, Macedo e cols 162 discutem que nos
estudos atuais há uma variedade de instrumentos utilizados para realizar a AD gerada pelo
sujeito e que o processo de análise propriamente dito não difere muito de outras tantas
análises de natureza qualitativa, ou seja, leitura exaustiva, categorização, compreensão e
interpretação dos dados, considerando sempre o contexto nos quais os discursos são
produzidos:

Em estudos atuais, observamos diferentes instrumentos aplicados para se


proceder à AD produzido pelo sujeito. Entre estes se destacam: as observações
estruturadas, as entrevistas por meio de instrumentos previamente estabelecidos,
grupo focal e análise documental em registros. A análise propriamente é
realizada pela leitura exaustiva do material, para explorá-lo e construir o
tratamento e a interpretação dos dados. Neste momento, o pesquisador identifica
o contexto da produção do discurso para codificá-lo, identificar suas unidades de
registros, bem como as categorias que dele emergem. (p. 652)

Macedo e cols. retomam Minayo a fim de enfatizar a importância da AD para as


pesquisas na área da saúde na medida em que compreendemos a saúde inteiramente
relacionada com a realidade social e os determinantes sócio culturais econômicos, e a
possibilidade da AD permitir a reflexão sobre os discursos inseridos na complexidade de
fatores em que foram produzidos, proporcionando a compreensão não apenas do sujeito,
mas da coletividade e do contexto sócio cultural que o cerca.
Alguns percursos são imprescindíveis para conferir confiabilidade e consistência a
pesquisa qualitativa, independente do método especifico selecionado, devido a própria
subjetividade característica da mesma. O International Journal for Quality in Health
Care 163 descreve critérios relevantes que deverão ser considerados para validação do
método. A totalidade do processo de pesquisa precisa ser devidamente descrita, desde a
produção da entrevista até a análise de dados. É necessário neste processo, esclarecer o
quadro teórico que sustenta o estudo, demonstrar como e quando os participantes foram
selecionados, como ocorreu a aplicação das entrevistas e a descrição do contexto em que
os dados foram coletados, conforme apresentamos a seguir.

86
Esta pesquisa faz parte de um dos braços de investigação de um projeto maior
intitulado “Análise do acesso e da qualidade da atenção integral à saúde da população
LGBT no Sistema Único de Saúde” conduzido pelo Núcleo de Estudos em Saúde Pública
(NESP) da Universidade de Brasília (UNB) em parceria com a FIOCRUZ/PE, as
Universidades Federais da Paraíba, Piauí, Uberlândia, Universidade Universidades
Estaduais de São Paulo, Maringá e do Rio de Janeiro.
A pesquisa multicêntrica incluiu as seguintes regiões do Brasil:
 Região Norte: Pará (Belém e Santarém), Amapá (Macapá), Acre (Rio
Branco);
 Região Nordeste: Bahia (Salvador e Vitória da Conquista),
Pernambuco (Recife), Paraíba (João Pessoa), Ceará (Fortaleza e Juazeiro
do Norte); Piauí (Terezina e Picos);
 Região Centro Oeste: Mato Grosso do Sul (Campo Grande); Distrito
Federal (Brasília, Cinelândia, Taguatinga e Sobradinho), Goiás
(Goiânia);
 Região Sudeste: Rio de Janeiro (Rio de Janeiro), São Paulo (São Paulo e
São José do Rio Preto), Minas Gerais (Belo Horizonte e Uberlândia),
Espírito Santo (Vitória),
 Região Sul: Paraná (Curitiba e Maringá), Rio Grande do Sul (Porto
Alegre).
Para selecionar os municípios de cada região, foram utilizados os seguintes
critérios:
 municípios que tenham a política LGBT implementada;
 municípios acima de 50 mil habitantes;
 equipe das Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF) completa com
cadastro atualizado no Sistema de Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde – SCNES;
 equipe da UBSF que há pelo menos um ano conta com a mesma composição
de trabalhadores
Cada região possuía um coordenador de área vinculado a Universidade local. O
recorte da minha pesquisa nas duas cidades da região Centro Oeste se deu devido ao meu
vinculo como doutoranda em Saúde Coletiva pela Universidade de Brasília e pesquisadora
associada do NESP. E nas duas cidades do Nordeste pelo meu vinculo afetivo, visto que

87
sou natural da Bahia e assim, possuo conhecimento da estrutura sócio política da região, o
que me possibilitou ser coordenadora de área local.
O cálculo3 da amostra de UBS em cada cidade foi realizado utilizando os seguintes
pressupostos: tamanho da população, número total de UBS, cobertura populacional, a
probabilidade de indivíduos LGBT por região (na população geral é de 10%) e proporção
UBS com PSF por município. No campo desta pesquisa a quantidade de USF ficou assim
definida: Goiânia - 04 USF; Distrito Federal - 14 USF; Vitória da Conquista - 04 USF e
Salvador - 10 USF. A escolha das USF foi feita de forma aleatória através de sorteio,
contando que para serem incluídas deveriam contar com uma equipe mínima da ESF com
pelo menos um médico (a), enfermeiro (a) e agente comunitário de saúde. Já havia sido
definido no âmbito da Pesquisa Nacional a quantidade de 5 profissionais por USF a serem
entrevistados, sendo 01 médico(a), 01 enfermeiro (a) e 03 agentes comunitários de saúde.

6.2 Participantes/Amostragem

A amostragem considerou o perfil de relevância dos sujeitos em relação ao objeto de


estudo. Já justificamos nesta tese a UBS/ESF como local ideal para implementação de
políticas e ações para a saúde integral de populações vulneráveis e dentro dela os profissionais
de saúde, médicos(as) enfermeiros(as), considerados aptos para responder as demandas desta
população e, consequentemente, as questões sobre diversidade sexual e saúde.
Os trâmites burocráticos de recrutamento dos participantes se deram através da
comunicação com a Diretoria de Atenção Básica (DAB) de cada região. O(a) coordenador(a)
de área munido da documentação de aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) e do
parecer favorável do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS)
contatava com DAB que emitia outra autorização local e informava as UBS da presente
pesquisa.
No momento da entrevista, mesmo com o TCLE já assinado era ratificado para o(a)
participante o objetivo principal da pesquisa maior: analisar o acesso e a qualidade da

3
Cálculo realizado pela Dra. Ana Maria de Brito (PhD em epidemiologia, pesquisadora da Fiocruz de Pernambuco e professora da
Universidade de Pernambuco) para pesquisa multicêntrica de âmbito nacional: “Análise do acesso e da qualidade da Atenção Integral à
Saúde da população LGBT no Sistema Único de Saúde” sob a coordenação do Núcleo de Estudos de Saúde Pública/NESP/CEAM/UNB.

88
Atenção Integral à Saúde da população LGBT no SUS, e a pesquisadora se mostrou
disponível para esclarecer qualquer dúvida que ainda surgisse sobre o trabalho. Isso garantiu
bases éticas e técnicas necessárias à abordagem dos(as) participantes dentro de uma relação de
confiabilidade. Os profissionais pesquisados, totalizaram 43 relatos, sendo 21 dos(as) médicos
(as) e 22 dos(as) enfermeiros (as) conforme o quadro abaixo:

Quadro 1 –
Distribuição do número e tipo de profissional por cidade:
Profissionais ENFERMEIRO (A) MÉDICO (A)
Campo
Goiânia - GO 04 04
Brasília - DF 06 05
Vitória da Conquista - BA 04 04
Salvador - BA 08 08

TOTAL 22 21

TOTAL GERAL 43

Fonte: Elaboração Própria

Nota-se pela tabela acima que o campo de Brasília apresenta o desfalque de 03


entrevistas e o de Salvador de 04, de acordo com o que foi preconizado inicialmente. Este
desfalque deu-se, pois uma profissional médica de Salvador recusou participar e nos
demais casos os(as) profissionais não estavam presentes na Unidade de Saúde no momento
da coleta de dados. Os participantes foram codificados com M de 1 a 21 e E de 1 a 22,
respectivamente para médicos(as) e enfermeiros(as).

6.3 Entrevistas e Coleta De Dados

O instrumento realizado para coleta de dados foi entrevista semi-estruturada a qual


permite uma maior exploração das experiências dos sujeitos, pois a técnica proporciona
"ao entrevistado decidir-se pela forma de construir a resposta" 164 além de possibilitar ao
pesquisador reelaborar ou reordenar as questões com a finalidade de manter o foco no
objetivo principal do tema pesquisado.

89
Como a pesquisa nacional era uma demanda vinculada ao Ministério da Saúde e
tramitava pelas diretorias de atenção básica de cada região para autorização local, quando a
equipe de pesquisadores chegava nas UBSF para aplicar as entrevistas, sempre o
responsável pela Unidade já estava ciente da pesquisa e desta forma era reservado um
espaço físico (consultório, sala de reunião, copa, etc) e na agenda dos profissionais para
que a entrevista fosse realizada com o sigilo necessário e distante da intensa movimentação
corriqueira das UBS. Apesar destes tramites prévios, alguns profissionais entrevistados se
surpreendiam com o tema proposto, visto a ausência de ações propostas nas USF para esta
população e outros não tinham nenhum contato, ou mesmo desconheciam o que significava
a sigla LGBT.
A equipe de pesquisadoras nos campos desta pesquisa contava sempre comigo na
coordenação e na aplicação das entrevistas e mais uma ou duas profissionais graduadas em
Saúde Coletiva e devidamente treinadas, exceto na cidade de Goiânia, em que acompanhei
e realizei as entrevistas com um dos coordenadores da pesquisa nacional, o professor Edu
Cavadinha.
O encontro pessoal com os participantes geralmente ocorria com cordialidade e
respeito, favorecido pela informação prévia sobre a pesquisa, não havendo relato, nem
experiências de situações desagradáveis que pudessem interferir no processo de coleta.
Uma única profissional médica em uma das UBSF de Salvador desistiu de dar entrevista,
alegando sobrecarga de consultas e reuniões. Não temos elementos suficientes para inferir
se a recusa deu-se pela temática, o que poderia ser relevante.
As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas pela equipe responsável
do NESP. As 43 entrevistas aqui analisadas passaram por minha revisão tanto do áudio
quanto da transcrição. Os dados foram coletados entre novembro/2014 no Centro-Oeste e
entre maio e junho/2016 na Região Nordeste. O tempo entre uma coleta e outra deu-se
devido a alguns entraves burocráticos com relação a autorização da pesquisa na Região
Nordeste.

90
7. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Mas, a linguagem não traz a experiência pura, pois vem organizada pelo sujeito
por meio da reflexão e da interpretação num movimento em que o narrado e o
vivido por si estão entranhados na e pela cultura, precedendo à narrativa e ao
narrador. Minayo

O exercício de compreensão e interpretação dos relatos dentro dos contextos em


que se apresentam requer uma fidedignidade plena aos passos da análise qualitativa de
discurso, desde a etapa da leitura flutuante que favorece um primeiro contato do material,
deixando-nos impregnar por seu conteúdo, até a categorização e o processo de análise
propriamente dito.
A partir do referencial teórico, da revisão de literatura, e dos objetivos específicos
duas ideias norteavam o deslocamento das leituras: observar tendência à patologização das
condições LGBT e a percepção dos profissionais sobre a formação recebida para o cuidado
dessa população. Dessa forma podemos considerar que houve uma categorização mista,
constando de categorias prévias e categorias e subcategorias empíricas que emergiram do
discurso
A categorização proposta passou por revisão de pares, incluindo dois competentes
especialistas na temática abordada, o que confere maior validade externa e confiabilidade
as mesmas. A validade interna sustenta-se na relação entre as inferências feitas a partir dos
fragmentos de discurso e as categorias a elas estabelecidas e a uma análise fundamentada
de forma coerente com o referencial teórico estabelecido.
Foi feita uma primeira tentativa de analisar os discursos por região, mas na medida
em que examinávamos cada entrevista, percebemos que os aspectos e as diferenças sócios
regionais não influenciaram nas respostas dos participantes, sobretudo quanto a abordagem
era sobre a diversidade sexual e saúde. O que podemos perceber é a confiabilidade da
estrutura básica em que o campo da pesquisa foi realizado, visto que todas as cidades
possuem a ESF organizada e implantada com equipes de saúde da família correspondentes
conforme preconiza a PNAB e desta forma confere uma "unidade" aos discursos quanto ao
local de fala dos participantes. O conjunto final de categorias analíticas ficou assim
constituída:

91
7.1 A condição LGBT causa doença, contando duas subcategorias:
7.1.1A condição LGBT causa IST/AIDS;
7.1.2 A condição LGBT causa transtornos mentais;

7.2 LGBT: ser um dissidente das normas permanece como comportamento


moralmente condenável

7.3 A formação profissional para a atenção à população LGBT, também com duas
subcategorias:
7.3.1 Competências e capacitação para lidar com a população LGBT;
7.3.2 Dificuldades em abordar a orientação sexual dos usuários.

7.4 As UBS e as (Des)atenção à Saúde LGBT


7.4.1 Contradições da UBS: nem igualdade, nem equidade.
7.4.2 Responsabilidade da população LGBT pela baixa procura da UBS

7.1. A condição LGBT causa doença

Nos capítulos de revisão de literatura e referencial teórico desta tese, apresentamos


a luta pela despatologização do gênero e da sexualidade, descrevendo a complexidade do
processo histórico político-social que culminou na retirada da homossexualidade da
classificação internacional de doenças e a recente retirada da transexualidades do capítulo
de transtornos mentais.
Entretanto, a associação entre enfermidade e "comportamento sexual desviante"
parece ainda encarnado nas racionalidades de médicos e enfermeiros. Apesar de não ter
sido possível obter inferências dos discursos dos profissionais entrevistados de que a
condição LGBT constitui para eles uma patologia, por outro lado, ficou muito claro, que ao
pensar nas especificidades das demandas de saúde, os profissionais atribuem a condição
LGBT como causadora de doenças.
A ausência de discursos afirmando a condição LGBT como doença, pode ser
considerado um avanço obtido pelos movimentos sociais e também da academia, mesmo
considerando-se o recrudescimento nas mídias da proposta de "Cura Gay". No entanto, a
associação direta da condição LGBT como causadora de doenças, presentes com grande
freqüência nos discursos de enfermeiros e médicos entrevistados, revela que as relações
interpessoais estabelecidas entre profissional e paciente em torno da assistência é mediada,
sobretudo pela marca estigmatizante de sua diversidade, compreendidos como
comportamentos ou condições de risco. Dois conjuntos de enfermidades se destacaram
neste discurso: as doenças sexualmente transmissíveis e as doenças mentais, donde

92
dividimos em duas subcategorias: a condição LGBT causa IST/AIDS e a condição LGBT
causa transtornos mentais.

7.1.1 A condição LGBT causa IST/AIDS

Um primeiro ponto que se destaca na análise dos discursos de médicos e


enfermeiros ao relatarem como compreendem as demandas da população LGBT nas UBS,
é a vinculação dessa condição considerada desviante com o aumento de risco para IST com
destaque para HIV-AIDS. Assim a própria condição da população LGBT é vista como via
para instalação dessas doenças.
Esse aspecto esteve presente em praticamente a totalidade dos discursos dos(as)
médicos(as) e enfermeiros(as), e não diferiu nas regiões. Entretanto, se pôde notar que essa
articulação, considerada central pelos profissionais, se apresentou nos discursos de duas
formas: como algo estabelecido pelos próprios indivíduos LGBT e como algo decorrente
da conduta profissional, sabedora da incidência dessas doenças no grupo. Na primeira
perspectiva, a demanda da população LGBT centrada em IST e AIDS é assim constituída
pelos próprios indivíduos que procuram as unidades por esses motivos:

M1 - A maioria das vezes eles solicitam muito sorologias. Vem para


fazer exames de rotina e perguntam se no meio disso tem como a
gente solicitar sorologias de DST...

E2 - …nesse grupo ai que você tá falando, muitas vezes eles procuram


a vigilância epidemiológica por alguma questão sexual mesmo, com
algum tipo de doença que eles adquiriram, então é uma porta que é
mais aberta é essa pra eles.

M4- De demanda é geralmente doenças sexualmente transmissíveis...


e consultas gerais não tem…

E7 - Os principais agravos que tem são as doenças sexualmente


transmissíveis mesmo né, toda vez que eu atendia era focado a esse
assunto, eles se preocupam muito com essa questão e é o que eles
mais procuram também né, prevenção, a camisinha, é o que eles mais
procuram aqui na unidade ...A principal demanda é essa, é a sexual,
atividade sexual, educação sexual, é o que eles mais procuram né...

M14 - ...só aquela coisa que eu te falei que os pacientes normalmente


homossexuais quando chegam aqui na unidade eles na maioria pedem
muito exames sorológicos de HIV...

93
E14 - ...O que a gente vê é... As vezes é mais por conta da parte
sexual, tem a preocupação com as doenças sexualmente
transmissíveis, então, as vezes, procuram nesse sentido...

Já na segunda perspectiva é a própria estrutura do saber do campo da saúde, que


dirige a compreensão das demandas como geradas por essa ameaça sempre presente de
doenças transmitidas sexualmente.

E4 -... teve um rapaz mesmo, que ele é travesti e um dia tava na


reunião de hipertenso, levando a avó, ai foi que eu falei, vamos lá
fazer o teste rápido de HIV...

E 7 -... é o que a gente consegue abranger mais esse grupo, mais que
uma hipertensão, com diabetes que é pouco frequentado por esse
grupo, só se tem alguém que a gente não sabe, mas assim, quando a
gente trata mais em questão sexual é que a gente consegue captar um
pouco mais dessas pessoas. A gente vê mais esta população nos
grupos ou em atividades específicas pra doenças sexualmente
transmissíveis

E13 – as doenças que acometem o publico LGBT são as DSTs, a


gente tem...HPV, e a gente tem sífilis e o HIV, então assim, claro que
tem as outras DSTs geral, mas para o grupo LGBT são estas...

E14 - Uma coisa que eu tinha percebido em um comportamento era


assim quando eu via uma paciente assim... eu oferecia muito né, os
exames...ai depois eu pensei , poxa será que essa associação certa ta
fazendo isso? Mas, depois eu falei assim "não, deixa o paciente né" se
ele achar que quer fazer ele vai fazer

E 17 - talvez... não saiba bem como abordar essa população visto que
a maior procura é voltada pra parte de DST, teste rápido pra HIV e
demandas em cima de DST. Difícilmente procura aqui pra uma
avaliação de rotina, fazer uma consulta mesmo.

E 20 - Ah sim, da LGBT em si. Nada muito grave. A saúde da


população em geral é ruim, mas a do público LGBT são pontuais...
Principais agravos são as DST

M5 - mas população trans eu acho que pensando assim né, no geral,


quais são as principais demandas é infecção sexualmente
transmissível...

M7 - Para o masculino as DST’S, pro masculino a prevalência é um


pouco mais alta, coisa de 20 e 26%, olhei os dados esses dias, por
volta de 10,5%, população geral 0,4% algo assim, e por incrível que
pareça a gente tem a mesma experiência né, voltam muito pro uretrite,
síndrome do corrimento uretral, desconfortos relacionados à DST’s e
HIV, é isso que mais os traz...

94
M9 - DST logo de cara, DST´s... Os agravos que mais acometem esta
população... É muito com relação à questão de saúde sexual e
reprodutiva... eu não vejo outras não...

M10 - Bom realmente, esse tipo de pessoa tem que ter uma orientação
realmente, clara, porque pela estatística eles têm mais índice de
doenças de transmissões sexuais...

Esses discursos demonstram representações sociais da população LGBT


fundamentadas em uma ideação patologizante das "sexualidades desviantes", alguns
discursos inclusive demonstram de forma bem clara o processo de estigmatização, no
sentido intersubjetivo discutido por Goffman36, no qual a doença ou a possibilidade de
adoecer está ligada a um atributo moralmente condenável, por meio do qual, o sujeito
"normal" reconhece o sujeito estigmatizado. Essa correlação é sugerida quando M9 diz:
"DST, logo de cara...", ou quando E4 parece sentir-se profissionalmente responsável ao
convidar uma travesti que está apenas acompanhando um familiar para fazer o teste rápido
de HIV. Nomear como rapaz, usar o artigo no masculino para se referir a uma travesti que
estava como acompanhante na Unidade deixa escapar o despreparo e o desrespeito do
serviço.
Apesar de alguns profissionais parecerem situar suas condutas em bases científicas,
tal como M7 que fornece alguns dados para fundamentar sua posição, está evidente que
esses comportamentos, sobretudo em relação a HIV-AIDS, sofrem mais a influência dos
processos discriminatórios que emergiram a partir de todo o histórico da AIDS enquanto
peste gay, e não de um acompanhamento cientificamente mediado sobre o comportamento
epidemiológico da doença. Prova disto é que o ultimo relatório da UNAIDS165 demonstra
que as populações chaves (pessoas que injetam drogas, profissionais do sexo, pessoas
transgêneros, pessoas privadas de liberdade, homens gays e outros homens que fazem sexo
com homens e seus parceiros sexuais) são importantes em todos os cenários da epidemia,
sobretudo em regiões com epidemia concentrada, como na África. Entretanto, globalmente
o número total de pessoas infectadas é hoje menor que na população chave, respondendo
por 44% da epidemia, sendo 56% encontra-se no restante da população. O Relatório
também aponta a questão discriminação e ainda criminalização da população chave em
alguns países como fatores que dificultam o acesso a prevenção.
Entretanto, apareceu também como forma de categoria singular, a posição
profissional que não atribui um risco maior à população LGBT.

95
M3 - Acho que não porque as doenças do público LGBT não é
específica do grupo LGBT são universais qualquer pessoa pode ter
doenças sexualmente transmissíveis, infectocontagiosa comum...

M15 - eu acho que a gente peca na saúde LGBT ao focar a saúde


LGBT em doenças sexualmente transmissíveis, eu acho que várias
coisas permeiam a saúde LGBT, a gente tem um risco maior de
exposição a violência do que qualquer outro grupo social e isso não é
abordado na saúde LGBT, a questão da transexualidade, não existe
uma orientação direcionada pra quem quer fazer tratamento hormonal
ou não, então assim o foco é DST, Hepatites e virais e isso é para a
população geral, não existe grupo de risco, existe comportamento de
risco e pra mim essa é a falha da política.

As manifestações acima supostamente apresentam perspectivas divergentes, no


entanto, o entrevistado M15 inicia a frase enunciando “a gente peca na saúde LGBT”. E
novamente ao utilizar o termo “a gente”, o entrevistado parece se identificar como parte do
grupo pesquisado, médico e gay talvez sejam os componentes identitários do entrevistado
que colaboraram para uma reflexão crítica sobre o cuidado e a política.
Os relatos dos demais profissionais demonstram que eles compreendem a saúde
destas pessoas como apenas determinadas por práticas sexuais, deixando de percebê-las
como indivíduos plenos em suas necessidades biopsicossociais. O individuo que se assume
LGBT já carrega uma "marca", que deteriora, no sentido de Goffman36, sua identidade nos
encontros intersubjetivos. Pertencer ao segmento LGBT parece imprimir uma "marca", que
deteriora, no sentido de Goffman36, sua identidade nos encontros intersubjetivos. O
indivíduo torna-se, seja pelo auto reconhecimento, seja pelo reconhecimento médico, um
potencial portador de IST, não importando qual o motivo real que o levou a consulta,
Algumas vezes a consulta geral é vista como um engodo para a solicitação de sorologias
para IST, como sugere o entrevistado M1 "vem para fazer exames de rotina e perguntam
no meio disso, se tem como agente solicitar sorologias de DST".
Causa estranhamento pensar nos motivos que levaria um usuário a construir
estratégias para solicitar disfarçadamente exames de sorologia quando essa ação é
fortemente valorizada através de campanhas educativas há décadas. Qual a relação de
cuidado e acolhimento está acionada nessa interação? Como o profissional maneja a
anamnese? Essa afirmação nos diz mais sobre as dificuldades de interação e
reconhecimento do marcador orientação sexual como determinante no processo saúde
cuidado do que sobre uma demanda que motiva uma consulta.

96
Ou seja, parece estar muito vinculada à racionalidade dos profissionais de saúde os
efeitos, já descritos nesta tese, relacionados ao inicio da epidemia de AIDS, quando os
programas e políticas voltadas para prevenção reforçavam o padrão heteronormativo e,
toda manifestação dos corpos fora desta estrutura, era patologizada. Pelúcio e Miskolci80,
por exemplo, falam em repatologização das sexualidades dissidentes, afirmando que a
epidemia reforçou tanto nas subjetividades dos profissionais de saúde quanto na própria
estrutura das instituições o dispositivo normalizador das sexualidades, de forma que as
homoafetividades passaram a apresentar a ameaça mais significativa em relação à
contaminação pelo HIV. Esse processo acabou por envolver todas as demais IST.
Meinez60 discute que a homofobia na saúde é fundamentada justamente por este
imaginário biomédico que compreende a homossexualidade como condição de risco e pela
associação frequente da saúde da população LGBT as IST/AIDS.
Esta persistente associação tem inúmeras causas, sobre as quais já dissertamos no
capitulo sobre a trajetória do movimento LGBT. Da "peste gay" na década de 80 e as
consequentes articulações políticas entre o organismo governamental e os movimentos
sociais, que resultaram em diversas ações eficientes e eficazes para lidar com a epidemia,
até as evidências científicas que a AIDS não eram exclusividade da população LGBT.
Entretanto, resiste na atualidade, a prática em saúde alicerçada no conceito de grupo de
risco e no potencial agente contaminador da população LGBT como revelaram os
discursos dos profissionais de saúde aqui analisados.
Terto166, desde 2002, já sinalizava preconceitos e estigmas sofridos pela associação
AIDS-homossexualidade, com abordagem da saúde do gay apenas relacionada à HIV, "em
detrimento outras causas biopsicossociais de adoecimento desta população."
Gays parecem significar todo o universo LGBT para a maioria dos profissionais
entrevistados. As mulheres lésbicas, transexuais e as travestis foram nomeadas algumas
vezes, no entanto, os homens trans são sujeitos (quase) ocultos para os profissionais
identificados. Nos poucos momentos em que as lésbicas são citadas, o profissional associa
a orientação sexual à agressividade, ou seja, um ícone do masculino.

M7 -… a gente atendeu aqui, o que lembro 3 mulheres lésbicas elas


tiveram conflitos sérios relacionados à agressividade do
relacionamento...de violência doméstica mesmo

M8 - Temos uma paciente que é lésbica e tem mostrado um


comportamento de agressividade com a família...

97
Também para o entrevistado M8, a agressividade parece ter denunciado um lugar de
não pertencimento às mulheres, ou de desestabilizar a posição de mulher das lésbicas a partir
de um suposto atributo masculino. Considerando os dados epidemiológicos, a prática médica
deve ter, muito provavelmente, apresentado ao entrevistado, inúmeros casos de violência
doméstica perpetrada por homens contra as mulheres, entre casais heterossexuais. O que ele
informaria ao selecionar da memória os casos envolvendo as mulheres lésbicas e relacioná-los
à agressividade no relacionamento como se fosse algo específico entre os casais formados por
mulheres lésbicas?
Com relação às transexualidades e travestilidades é exarcebada a ausência nos
discursos dos profissionais, parece haver um “estranhamento” maior com relação a este
segmento da população, além do relevante despreparo, e consequentemente estigma e
preconceito de forma mais desvelada:
E 16 - Nunca uma travesti vai entrar na unidade sem gerar conversa,
uma conversinha, uma fofoquinha, um risinho, um olhar torto,
entendeu.

O "olhar torto", a "fofoquinha" são as estratégias de denuncia acionadas para


demarcar o estranho, o monstruoso como aponta Leite Junior24, 32
. Ele destaca as
consequências da categorização biomédica destas pessoas ainda como desviantes ou
aberrantes, portadoras de transtornos de personalidades, quase "monstruosas", o que vem a
resultar em uma espécie de "consentimento" sobre as violências vivenciadas por elas, desde a
violência simbólica dos risinhos e olhares tortos, até a violência física propriamente dita. A
utilização temporal NUNCA informa a impossibilidade, na perspectiva do entrevistado, de
que uma travesti venha a se tornar inteligível para o serviço de saúde.

E16 -... a gente já teve vários casos aqui, que eu posso citar um, que é
emblemático, de mulher trans que veio né... e a gente tem aqui na
unidade várias pessoas, com várias diferenças religiosas... Ele, Ela se
apresentou com nome social, mas ela estava lógico com documento de
identidade com nome de nascença, com nome masculino e uma das
técnicas de enfermagem que inclusive não trabalha mais aqui, fazia
questão de chamar lá pelo nome de homem, entendeu?... Pra que as
pessoas ficam de “Tchchchu” conversando que é o que sempre
acontece, entendeu, fazendo chacota, fazendo piada...

M5 - eu acho que a população trans também tem muita dificuldade de


acesso, é impressionante a pessoa se chama, chega na recepção, meu
nome é Alessandra e fazem questão de pegar a identidade e chamar de
Alex, né assim, então existe assim, de chamar de Ele, não chamar de
Ela né?
98
A cena recontada pela entrevistada denota a cumplicidade do serviço que corrobora
a violência perpetrada pela servidora e avaliza a conduta discriminatória dos outros
usuários. O que faz o tema religião ser acionado nesse fragmento? Por que exatamente foi
a diferença escolhida pela entrevistada para representar? O direito à diversidade religiosa e
o direito de crença se sobreporiam ao direto à identidade de gênero e orientação sexual? O
uso do nome social é um direito garantido pela carta de Direitos dos Usuários do SUS
(Portaria 1.820 de 13 de agosto de 2009), e deve constar em todos os documentos do(a)
usuário(a), inclusive o Cartão do SUS. Diversas campanhas foram feitas neste sentido, mas
sua efetividade pouco se percebe nos serviços de saúde.
Os profissionais também relatam que as travestis e transexuais não procuram os
serviços de saúde. No entanto parece não haver uma compreensão de que a escassez pela
busca de cuidados pode ser exatamente pelas violências simbólicas sofridas:

E1 - Não! Enquanto eu estou aqui nunca chegou nessa unidade


atendimento(travesti e transexual), atendi em outros lugares. Aqui,
enquanto eu trabalho aqui, nunca tive.

M5 -Eu acho que ainda estão muito desassistidos... eu tenho muitos


gays muitos, tanto femininos quanto masculinos, transexuais
nenhum...

M8 - Aqui sim que não temos é o travesti, na minha abrangência não


há muitos desses.

O entrevistado E1 se recusa a nomear, enquanto M5 equivocadamente refere


a existência no serviço de gays masculinos e femininos para dizer de homens e
mulheres homossexuais, M8 utiliza o artigo no masculino para também demarcar
um campo de desconhecimento. Como se reconhecer no serviço de saúde um mero
desconhecido? Essas pessoas transexuais e travestis não são vistas e não são
encontradas nos serviços de saúde que, por sua vez, não estão desejosos de suas
presenças. A ausência na Unidade é uma contestação que parece deslocar a
responsabilização para o próprio sujeito:

M16 - Eu nunca vi uma pessoa trans ser atendida aqui na unidade


nunca atendi nunca vi ninguém entrar na unidade...

E 11 - que tenha condições teoricamente mais favoráveis ou que às


vezes mais procura o serviço seria os gays, os homossexuais... eu acho
que teria uma condição pouco menos satisfatória de saúde da
99
população de travestis, que eu acho que tem uma dificuldade maior
de ter acesso ao serviço, procurar atendimento, por conta do estigma

Ainda que tenha aparecido enquanto categoria singular, esse achado é importante,
por demonstrar que encontra-se diluído entre o senso comum dessas categorias
profissionais, pontos de vista divergentes que reconhecem como o estigma e a
discriminação funcionam enquanto barreira simbólica de acesso a essas pacientes.
Reconhecer o estigma como barreira simbólica de acesso a essas pacientes não
significa reconhecer que o serviço opera também nesse sentido. Como identificou
Paulino167, a responsabilidade pela ausência é deslocada para o próprio usuário como se o
profissional e o serviço fossem apenas agente passivo nessa relação.
Além do aspecto da invisibilidade, nota-se a questão do estigma e preconceito mais
exacerbado quanto se trata desta população. As mulheres transexuais e as travestis são
invisíveis no serviço, mas são hipervisibilizadas a partir de uma única possibilidade: a
prostituição.
M5 - mas populacão trans eu acho que pensando assim né, no geral, quais são as
principais demandas é infecção sexualmente transmissível, reposição hormonal, é, eu
acho que essa questão de estarem todas profissionais do sexo... eu acho que a pessoa pode
escolher ser profissional do sexo mas assim é meio uma coisa fadada...

E 12 -porque ele(ACS) ta naquele meio ali né, ele mora lá na Unidade, ele vê falar, ele
sabe, olha ele é travesti ele se prostitui tal...

Associar aids/prostituição/transexualidade/travestilidade é a estratégia de saber dos


profissionais de saúde para justificar suas ações focadas no enfrentamento da epidemia e
de outras IST. No entanto, é o aspecto (i)moral da prostituição que está sendo adicionado
ao aspecto também (i)moral da transgressão do gênero para estabelecer os limites do
estigma.
Anteriormente, nesta tese, a partir da abordagem foulcautiana11 da sexualidade,
discutimos como os "desvios sexuais" saíram do domínio da religião, da moral e do direito,
deixando de ser crime ou pecado para ser enquadrado no campo da patologia. Os nossos
resultados demonstram como essa Scientia Sexualis persiste em nossos dias, na medida em
que normaliza a atenção à saúde, por uma classificação de risco, vinculada a
comportamentos considerados imorais.
Ressalto aqui, o que já discutimos da luta do movimento LGBT na conquista de
políticas públicas que garantam seus direitos, sua cidadania, a livre expressão de suas
100
identidades, o combate a violência, dentre outras reivindicações, e também na construção
de projetos eficientes no combate a IST/AIDS, o que resultou num dos programas com
ações e resultados de maior respeitabilidade internacional. Transformações do perfil
epidemiológico destas doenças e o controle maior das mesmas na população LGBT (com
exceção dos HSH e jovens gays), ainda não são resolutivos, nem desejáveis, mas do ponto
de vista de vigilância sanitária, suprimi a "exclusividade" atreladas a população LGBT.
Assim, embora o fortalecimento e manutenção das ações de prevenção e
enfrentamento das ISTs/AIDS sejam indispensáveis no planejamento de políticas públicas
e integrar um dos objetivos específicos da Política de Saúde Integral da população LGBT,
o cuidado para as pessoas LGBT parece focado exclusivamente a partir desse lugar.
Consituiu o único foco de cuidado, a "marca" exclusiva pelas quais são vistas, percebidas e
acolhidas numa Unidade de Saúde, conforme entendimento dos profissionais entrevistados.
Esta perspectiva corrobora com os achados dos estudos que tiveram como objeto a
mesma pesquisa multicêntrica, mas em diferentes regiões. As dissertações de Paulino163
(Uberlândia - MG) envolvendo a fala de doze profissionais, e a de Pereira168 (Terezina -
PI) a de sete profissionais, identificaram o olhar sobre a saúde desta população também
marcado pelas DST/AIDS.
Já em Fébole169 (Maringá - SC)4, outro estudo importante como braço da pesquisa
multicêntrica, expõe dados ainda mais contundes pois examina a perspectiva da população
LGBT, e na analise das produções de violência na relação de cuidado em saúde, também
encontra a "hipervisibilização das DST a partir da identidade de gênero visível" (p. 95) em
detrimento de um olhar integral e humano sobre a saúde desta população.
Desta forma, se a Política reconhece a discriminação, o preconceito e o estigma por
orientação sexual e por identidade de gênero, como potenciais causadores do sofrimento e
adoecimento às populações de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, torna-se
fundamental reconhecer como esses elementos se apresentam nos serviços de saúde através
das ações e fazeres dos profissionais de saúde.

4
Além da escuta dos profissionais e gestores, a pesquisa multicêntrica também objetivou a
escuta da população LGBT através de Oficinas realizadas com cada segmento desta população, nas regiões
determinadas. A dissertação da autora Fébole analisou 8 oficinas realizadas na estação de Maringá - SC.
101
7. 1.2 A condição LGBT causa transtornos mentais

Outro elemento presente no discurso dos profissionais, tanto de médicos, quanto de


enfermeiros, se refere a transtornos mentais associados à condição LGBT. Em alguns deles
os transtornos são apresentados como conseqüência das dificuldades de relacionamento
familiar, e por preconceitos da comunidade.

E1-...mas a pessoa já tá tão sofrida, porque eu acho que... eles já


sofrem tanto no dia-a-dia,... né coitados?...

E2 -...a parte física eu acredito que tá saudável, agora pode ser que a
parte psicológica tenha que ser trabalhada algumas vezes, porque as
vezes são pessoas que sofrem vários tipos de discriminação, de
violência né, então essa parte a gente não trabalha com eles que é a
parte da saúde mental...

M8 - Pois se caem em um transtorno emocional ou de conduta, porque


não são aceitos na sociedade, então temos que tomar outro grupo de
medidas. Se a sua sexualidade não é reconhecida, não é aceita, então
terão que interferir.

M11 - ...a população LGBT por ser mais reprimida pelo


conservadorismo tende um pouco mais a depressão a tristeza a esse
tipo de coisa né?

M16 - pelo que eu percebo na sociedade tende a acreditar que o grupo


vai está bem mais fragilizado em determinadas questões,(...) a pessoa
quer um cuidado relacionado à saúde mental por conta de uma
dificuldade de aceitação da família da comunidade e acho que essas
pessoas vão tá bem mais fragilizada

Os médicos e enfermeiros consideram aqui os transtornos mentais como


decorrentes do preconceito e da discriminação. Também autores têm afirmado que o
estigma, o preconceito, e a discriminação causam sofrimento psíquico, em especial em
crianças e adolescentes, o que pode estar associado a processos depressivos e mesmo
suicídio.72,158,170
Apesar de se tratarem de considerações importantes em relação ao potencial de
sofrimento causado pelo estigma, preconceito e estigmatização, elas se tornam
problemáticas se levadas de forma generalizante para a dimensão interpessoal da relação
profissional paciente.
No entanto, é preciso demarcar a diferença entre a conduta profissional sustentada
no reconhecimento dos efeitos do estigma e da discriminação sobre a saúde mental dos

102
sujeitos, e assim, engajar-se em ações de alcance coletivo para enfrentar a homofobia e
considerar esses marcadores no momento de prestar assistência as pessoas LGBTs e a
percepção de que a orientação sexual e o gênero seriam condição necessária e suficiente
para a produção de sofrimento e adoecimento.
A participante E1 chega a dizer: "... mas a pessoa já tá tão sofrida, porque eu acho
que... eles já sofrem tanto no dia-a-dia,... né coitados?...". Como se não pudesse haver
equilíbrio, felicidade e prazer naquela forma de expressão da sexualidade. O discurso de
E1 é um exemplo claro da atitude de piedade que Goffman descreve como uma das formas
dos "normais" reagirem ao encontro com os estigmatizados, quando sob um véu de
acolhimento e piedade reforça as marcas estigmatizadoras de inferiorização.
O reconhecimento da mulher lésbica se faz através de uma linguagem recorrente no
campo da saúde mental que atrela ou delega à mulher o lugar de transtornada, a
desequilíbrios, ansiedades e instabilidade emocional, como marca do próprio gênero
feminino, em um claro processo de generalização machista:

M7 - e nas mulheres lésbicas, transtornos mentais, principalmente


transtornos ansiosos e transtorno depressivo também, mais o ansioso
do que o depressivo, que acho que também não seja tão diferente da
mulher né, eu brinco que mulher ansiosa campeonato vicioso...

Entre desequilíbrios, ansiedades e instabilidade emocional, esse parece ser o único


lugar possível para as lésbicas habitarem o gênero feminino. Em outros discursos,
entretanto a compreensão dos transtornos mentais surgem como se fossem inerente às
sexualidades, como se o transtorno mental fosse próprio à condição de uma "sexualidade
desviante":

M8- E tenho associado a depressão... Essas são as duas doenças tenho


acompanhado, a depressão e o alcoolismo. Temos uma paciente que é
lésbica e tem mostrado um comportamento de agressividade com a
família, parece igual, é a aceitação e a agressividade.

M10 - A questão de transtorno de personalidade desde criança... que


eu acho que eles também podem ter esse tipo de questões, esses tipos
de doenças. Eu acho...

M 11 - e tinha dificuldade pra falar e em nenhum momento durante a


consulta ele disse sobre a orientação sexual nem nada... precisava
mesmo de acompanhamento psicológico.

103
Aqui os profissionais desvinculam os conflitos psicológicos desencadeados por
situações externas de vulnerabilidade, como preconceito e discriminação, e atribuem como
intrínsecos, são problemas de saúde mental atribuídos a população LGBT. A percepção de
ser uma patologia escapa mais uma vez nos discursos e se revela como “esses tipos de
doenças”.
Marques et al. 171 em um estudo crítico e abrangente sobre a saúde das lésbicas
fazem uma metanálise da literatura internacional e identificam que problemas de
transtornos mentais, de depressão, de ansiedade e abuso de substâncias químicas são mais
prevalentes nesta população do que na heterossexual, no entanto, destacam que apesar da
evidencia dos resultados obtidos pela metanálise há a necessidade "de clarificar as
componentes desta vulnerabilidade potencial e os mecanismos envolvidos, nomeadamente
com o contributo de estudos qualitativos." (p. 2042), e concluem:

O conhecimento aprofundado sobre a suscetibilidade à doença e a exposição aos


riscos dificilmente será alcançado sem a consideração dos contextos sociais e
culturais e dos níveis de acesso aos recursos que contribuem para a promoção da
saúde e prevenção da doença explicar os determinantes estruturais da saúde... (p.
2044)

Corroborando com a perspectiva dos autores sobre a pertinência de estudos


qualitativos que complementem os quantitativos e que evidenciem os determinantes
estruturais e sociais desencadeadores de vulnerabilidades desta população, alguns estudos
latinos americanos63, 64, 72, 163 compreendem o preconceito da sociedade, a discriminação e
a homofobia, experienciada pela violência verbal e física, e outros processos de exclusão e
rejeição social, como causadores de distúrbios psíquicos principalmente nos jovens gays.
Os homens trans surgem na pesquisa através dos discursos do não reconhecimento
e da impossibilidade:

M13 - nossa vivência aqui confirma isso as situações de ansiedade e


depressão, claro eles emocionalmente estão sempre com mais
conflitos né, os seus já naturais do conflito é mente corpo né...

E21 - ...tem outras pacientes, psiquiátricas, ela tem distúrbio


psiquiátrico, e a outra alcoolista, elas são homossexuais, se enxergam
como homem, falam né, se reconhecem como homens...

104
O conflito clássico entre corpo e mente é recuperado como potencializador de
outros transtornos. A fabricação de um sujeito débil é um argumento que sustenta a tutela
das pessoas transexuais e o domínio médico.
A entrevistada E21 define as duas pacientes lésbicas, que "se enxergam como
homens", ou seja, sequer menciona o reconhecimento da existência de homens trans.
“Elas” seriam então o próprio transtorno. Pesquisadores apontam a entrada recente da
discussão sobre os homens trans no cenário brasileiro e seu impacto, silenciamento até
mesmo na política pública172, 173. No entanto, trata-se aqui da recusa de ouvir o que os
usuários estão dizendo. A deslegitimação apontada por Fébole (p. 104) pode ser
identificada na incerteza produzida na expressão “... enxergam como homem, falam né, se
reconhecem”. Ou seja, existe uma distância entre o que esses usuários dizem e o que é
considerado pelos profissionais de saúde.
O domínio psi para falar sobre a sexualidade e gênero se apresenta nos
fragmentos dos discursos dos profissionais. Nessa seara tem espaço para a existência de
gays, lésbicas, transexuais e travestis, afinal, historicamente atrelados pela aliança dos
desvios e da patologia.
No caso da transexualidades, a patologização não surge apenas pela
compreensão da condição como risco para doenças, mas como um transtorno em si mesmo.
Lionço40 argui que essa perspectiva está encarnada no próprio processo transexualizador no
SUS, na medida em que a realização de cirurgias e o acesso à reposição hormonal estão
condicionados à manutenção de um acompanhamento psiquiátrico de dois anos.

7.2 LGBT: ser um dissidente das normas permanece como comportamento


moralmente condenável

Se a ruptura com a perspectiva da patologia associada à questão da sexualidade e


gênero parece desafiadora, reencontrar elementos que demarcam o julgamento moral e o
crime associado aos usuários LGBT não se constituiu uma exceção.

E10 - ...eles são muito descuidados, não usa preservativo, tem mais de
um parceiro né, e nem é porque são profissionais do sexo não...

E11 - ...a questão de álcool e drogas geralmente assim, que a gente


percebe, que nessa população o uso de álcool e de outras drogas
também é um pouco maior...

105
E18 -... Por questão mesmo da falta de prevenção, acho que eles são
mais vulneráveis apesar de eles terem o acesso aos meios de evitar
como a camisinha né, os métodos de barreira. Não sei se por conta de
drogas ou alguma coisa assim que tire um pouco a questão do bom
senso na hora de ter a relação, eu acho que eles ainda são mais
acometidos por isso...

M2 - O uso de drogas o uso de bebida alcoólica as saídas noturnas


né?...a gente preocupa com o uso de drogas e álcool, do tabaco né,
então sempre essa população tá envolvida

M5 - eu acho que as vezes ficam com várias infecções lá e acabam


uma levando a outro e levando a outra e ai aquele grupo no final das
contas todo mundo tem... todo mundo tem

M7 - … a gente atendeu aqui, o que lembro 3 mulheres lésbicas elas


tiveram conflitos sérios relacionados à agressividade do
relacionamento...de violência doméstica mesmo

M8 - Essa população, atualmente é... pode colocar o alcoolismo como


uma doença. O alcoolismo...

M13 - mas é os números da saúde em geral no Brasil mostram esse o


jovem homossexual a....os múltiplos parceiros...

E10 atribui claramente à condição LGBT ao sexo sem proteção, à multiplicidade de


parceiros, mesmo quando não se trata de uma situação de trabalhadoras do sexo. Para M2,
além da promiscuidade sexual que aumenta o risco de IST, o uso de drogas e o alcoolismo
também são considerados como comportamentos vinculados a esta população. Já para M7,
apesar de que sua experiência médica o tenha posto, muito provavelmente em face de
diversos casos de violência doméstica perpretada por homens em casais heterossexuais,
dada a incidência e prevalência deste tipo de violência em nosso país, a agressividade no
relacionamento é atribuído como algo especial das mulheres lésbicas, de onde o
profissional constrói um padrão moralizador de discurso centrado na família. Os mitos de
apetite sexual exacerbado, de sexualidade promíscua, de pessoas com a vida desregrada
servem aqui como base para as generalizações estigmatizantes através das quais processa-
se a discriminação.
A relação de promiscuidade e homossexualidades faz parte do senso comum174, 175
e possui bases históricas de fundamentos diversos. Castañeda176 atribui esta associação a
toda onda de amor livre e revolução sexual nos anos 60 e 70 onde os corpos, independente
de orientação sexual, se permitiam a comportamentos sexuais desmedidos e de risco. No
entanto, foi nos corpos das "sexualidades desviantes", que mesmo passado esta onda no
106
período pós guerra e graças a posturas morais e científicas que a promiscuidade
permaneceu vinculada a "essência gay". Desta forma a promiscuidade não pode ser
considerada parte da essência do homossexual "pois ela é uma produção cultural sócio-
177
historicamente localizada" . A reprodução destes discursos, da promiscuidade e das
infecções sexualmente transmissíveis vinculadas à população LGBT, ainda nos tempos de
hoje, alimenta o estigma e compromete a assistência a essas pessoas, tornando a atenção a
saúde reducionista e focada no modelo biomédico e curativista.
Com relação ao uso abusivo de álcool e drogas diversos estudos também
demonstram a propensão desta população no envolvimento com estas práticas65, 76, 178. No
entanto todos apontam contextos sociais como desencadeadores para o uso destas
substâncias, além da "homofobia internalizada". Dentre os contextos encontram-se a
violência, sobretudo com as travestis, discriminação, preconceito, homofobia, designados
como estressores sociais179, potencias determinantes para o uso de substancias ilícitas desta
população, não sendo as drogas os "problemas de saúde" e sim mecanismos de
sobrevivência e defesa diante da imposição de padrões heteronormativos, do sofrimento
social180 e dos diversos estressores sociais citados.
Aqui podemos retomar a mesma argumentação apresentada ao discutirmos a
questão da incidência de transtornos mentais relacionados com a condição LGBT. Se por
um lado a consideração dos estudos que demonstram uma maior incidência de alcoolismo
e dependência a drogas psicoativas na população LGBT é importante para o planejamento
de ações preventivas, em uma dimensão coletiva, sua transposição acrítica e generalizante
para os indivíduos, no momento do estabelecimento de uma relação de cuidado entre
profissional e paciente, se constitui como processo estigmatizador, onde a marca da
"sexualidade desviante" e seus problemas secundários tornam-se o principal atributo de
identificação dos sujeitos.
Portanto, o que pode ser bem percebido é que determinados julgamentos pré-
concebidos, típicos do processo estigmatizador do senso comum, tais como aqueles que
consideram que os homossexuais têm um maior apetite sexual, ou que mais
frequentemente quebram os acordos de fidelidade, ou que apreciam a vida noturna mais
que os heterossexuais, donde maior tendência para uso abusivo de álcool e outras drogas,
parece ter se vinculado estreitamente à racionalidade médica na construção da noção de
“grupos de risco” para doenças sexualmente transmissíveis e mesmo de "comportamentos
de risco". E é o que favorece a que um sujeito específico, diante do médico ou outro

107
profissional de saúde, imediatamente já seja visto a partir das preconcepções que
caracterizam seu grupo social e que reafirma no lado no profissional de saúde sua própria
normalidade e superioridade moral.
Goffman35 afirma que a "linguagem relacional" é imprescindível para o
estabelecimento do estigma, ou seja, o estigma performa através da relação interpessoal
entre o sujeito pretensamente "normal" e aquele "estigmatizado". O julgamento moral que
o profissional faz sobre os usuários da população LGBT torna-se constituinte de sua a
“identidade social virtual”, ou seja, reitera a identidade deteriorada do sujeito
estigmatizado, consolidada pela representação negativa das homossexualidades e
transexualidades causadoras de doença quando não da própria condição de doença.

7.3. A formação profissional para a atenção à população LGBT

Esta categoria encontra-se entre aquelas que previamente estabelecemos para


investigar nos discursos dos médicos e enfermeiros, tendo como objetivo compreender
como os profissionais avaliavam o seu preparo para lidar com a população LGBT. Do
material empírico emergiram duas subcategorias: uma sobre competências e habilidades
pessoais dos profissionais para lidar com a população e sobre ausência de capacitações
institucionalizadas para formação e uma outra que aponta uma dificuldade concreta em
abordar questões envolvidas com a sexualidade dos pacientes.

7.3.1 Competências e capacitação para lidar com a população LGBT

Os(as) médicos(as) e enfermeiros(as) entrevistados abordaram a questão da formação


profissional principalmente por duas vias, por uma espécie de divisão dos profissionais:
aqueles que reconhecem o despreparo profissional por questões subjetivas, envolvendo
preconceitos e valores que interferem em suas condutas e aqueles que reivindicam uma
maior responsabilidade do próprio sistema de saúde capacitá-los para a atenção à saúde
LGBT. Vejamos a primeira dessas perspectivas:

E7 - Eu não posso dizer que é 100% preparada, acho que é a cabeça de


cada um é diferente né... alguns tem muita mais facilidade, é livre de
preconceito, outros já têm a questão da religião... tem alguns
profissionais que ainda não se adaptaram, que ainda são muito
preconceituosos...

108
E 11 - porque quando a gente fala dessa questão, a gente sabe, nem
todo mundo tem a formação em saúde... tem a questão também
religiosa, tem o fator também da opinião que ele já vem formado
daquilo ali sobre a sexualidade, então tudo isso ai acho que acaba
interferindo...

M3 - Não, nem todos profissionais são sensíveis a esta questão... Ah,


porque vai da vivência... Da sua criação ... Os conceitos que cada um
tem né, então eu acho que isso ai é muito pessoal assim às vezes tem
pessoas que tem um pouco mais de... preconceito... Não é que você
concorde com a prática né, mas você tem tolerância né, você tem que
tolerar e mesmo que você não seja a favor, mas você não pode jamais
discriminar...

E 13 -...eu percebo que hoje não é qualquer profissional que consegue


desenvolver um trabalho nessa área, porque também tem essa questão
dos valores pessoais, questões intrínsecas do profissional... os
profissionais ainda não estão bem treinados e capacitados para isso

É importante notar aqui como os profissionais reconhecem que diversos fatores


subjetivos implicados na educação e história de vida, na medida em que forjam valores
e, consequentemente, estabelecem moralidades distintas, funcionam como obstáculos ao
atendimento integral e de qualidade a esta população. Importante também perceber que
a religião surge nos discursos como elemento produtor de valores que se concretizam
em condutas discriminatórias. Perspectiva já abordada nessa tese, quando ressaltamos as
preocupações com a institucionalização, sobretudo no poder legislativo brasileiro, do
fundamentalismo religioso que passa a constituir um poder obstaculizador dos direitos
da população LGBT e está implicado na patologização de suas sexualidades.
Nestes discursos observamos, também, o quanto os profissionais de saúde estão
imersos nesta cultura e como suas subjetividades e "opiniões pessoais" interferem no
acolhimento desta população. A profissional M3, apesar de afirmar a não discriminação,
chega a assumir que "não concorda com a prática", mas que tem "tolerância", como se a
forma de amar ou de obter prazer de uma pessoa pudesse ser objeto de concordância ou
discordância de outra pessoa.
Sendo a subjetividade um construto sócio-cultural-histórico181,182 numa relação
dialética e constante entre o mundo objetivo e subjetivo, esses discursos nos
demonstram como a heteronormatividade encontra-se encarnada na conduta e
pensamento da sociedade em geral, e aqui em especial dos médicos e enfermeiros,
mesmo quando estes não têm o preconceito elaborado conscientemente. Qual seria

109
então o fundamento de uma estratégia eficaz de capacitação para o enfrentamento do
preconceito e da discriminação no serviço de saúde?
Paradoxalmente os profissionais reivindicam e depositam a responsabilização no
Estado por uma capacitação que os habilite a cumprir as determinações de um cuidado
estabelecido numa Política Pública. Os profissionais parecem delegar ao Estado, a partir
do próprio sistema de saúde, a responsabilidade por formar e capacitar os profissionais
na atenção aos(as) usuários(as) da população LGBT.

E15 - Mas tem coisas especificas que deveria ter uma rede de apoio,
entendeu? A questão do nome social, é... a gente meio confuso as
vezes para onde levar essas pessoas para fazer a troca, para ter direito
a um nome social. Essa questão da rede de apoio que a gente fica meio
perdida, entendeu?

E 13 - mas a maioria dos nossos profissionais eles já são arraigados de


outro contexto de trabalho que ele não consegue às vezes ter essa
abertura para tratar o paciente da forma como hoje preconiza, então
assim a minha preocupação é mais nesse sentido, deveria ter mais
capacitações para preparar ou o serviço, o nosso serviço, capacitar as
equipes ou então capacitar logo todos os profissionais que estão
envolvidos...

E18 -... Porque a gente não tem muito treinamento pra isso...mas
dentro das particularidades deles né eu não me acho muito bem
preparada para isso, acho que deveria ter uma atenção para os
profissionais com relação a isso.

E20 -... na verdade eu não tive um preparo para trabalhar com esse
público. Se chegar aqui com algum problema de saúde eu vou saber
resolver, agora com algumas coisas ligadas a essa questão, eu acredito
que precisaria de um treinamento, de uma capacitação pra lidar melhor
com as situações.

M5 - ...completamente despreparada, existe um completo despreparo e


invisibilidade sobre o tema...na verdade é muito difícil porque a gente
não aprendeu nada sobre isso na graduação, eu fiz residência de saúde
da família e ainda assim não se tocou no assunto

M19 - Não me sinto preparada. Porque... não totalmente. Porque


assim... a gente não recebe muita... Na verdade eu nunca tive
capacitação nesse sentido

Diversos estudos já citados nesta tese3, 65, 66, 67, 68, 72, 183,184
corroboram com os
discursos apresentados quanto a falta de preparo e capacitação para o atendimento
adequado a estas pessoas. Esses fragmentos também se aproximam da categoria "Não

110
saber" desenvolvida por Paulino163 em que a culpabilização de não saber dos
profissionais é da própria estrutura do sistema, transferindo para outras instâncias a
responsabilidade pelo cuidado e saúde da população LGBT.
Lionço3 aponta que o desconhecimento dos profissionais da área de saúde sobre
a diversidade sexual pode levar a ausência de encaminhamentos que considerem
“especificação da realidade de vida e saúde” da população LGBT. Freitas183 e Paulino163
detectam em seus estudos o despreparo dos profissionais para responder os objetivos e
diretrizes Política Nacional de Saúde Integral da população LGBT e não identifica na
formação dos médicos pesquisados conteúdos que possam contribuir para o
atendimento a saúde integral da população LGBT.
A grade acadêmica que forma os profissionais de saúde e os capacitam
tecnicamente para esta função é comum a todos(as), no entanto as questões sobre as
sexualidades ainda seguem a força biomédica das Scientias Sexualis. Paulino aponta que as
Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) dos cursos de graduação em Medicina abordam
de forma ampla a questão de gênero e sexualidade, no entanto negligenciam e silenciam
sobre a saúde da população LGBT. Outro estudo185 demonstra a abordagem interdisciplinar
das sexualidades na graduação de medicina, porém centrada nos aspectos patológicos e
biológicos, com pouca ênfase a construção sócio cultural da historia da sexualidade.
No âmbito das capacitações, o Ministério da Saúde conta com uma secretaria
especifica para formação e educação continuada de profissionais, a Secretaria de Gestão do
Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), no entanto na prática observamos a
fragilidade dos processos na aplicação destas ferramentas educacionais, já que gestores e
trabalhadores da área de saúde frequentemente constatam que apesar de investimentos
significativos e esforços em processos educacionais, não se pode observar impactos nos
serviços 186 . Esta realidade foi bem observada na presente pesquisa. Uma das questões
abordadas foi sobre o conhecimento dos profissionais sobre a Política de Saúde Integral
para população LGBT, e foi unanimidade nas falas dos(as) profissionais o
desconhecimento da política e ausência de capacitação sobre o tema, sendo que a coleta de
dados foi realizada entre 2014 e 2016, e a política implantada em 2011 em todos os
municípios pesquisados.
Mello e Maroja187enfatizam que o uso político da implantação de políticas, sem
ações efetivas e sem sensibilização da sociedade, não teria o alcance eficiente e
potencialmente transformador das diretrizes e objetivos contidos nas políticas.

111
Dentre as estratégias de operacionalização da PNSIPLGBT, encontra-se definido no
terceiro de seus quatro eixos: "Educação permanente e educação popular em saúde com
foco na população LGBT". Como forma de viabilizar formação o MS ofertou pela
UNA/SUS (Universidade Aberta do Sistema Único de Saúde) em convenio com a UFRJ
(Universidade Federal do Rio de Janeiro) curso online sobre a política de Saúde da
população LGBT. Apesar da importância desse tipo de iniciativa, que por sua estrutura
de Ensino à Distância pode alcançar um número muito grande de profissionais, por um
custo baixo, existe um problema central que é o fato de que por seu caráter voluntário, o
curso alcança exatamente aqueles que já estão sensibilizados para importância dessa
formação. Isso não implica obviamente na proposição de torná-lo obrigatório, o que do
ponto de vista pedagógico seria desastroso, mas, que os resultados da presente tese estão
demonstrando é que dada a profundidade com a qual o processo estigmatizante se inscreve
nas subjetividades, mediadas por valores religiosos, ou racionalidades disciplinares, são
necessárias estratégias prévias de sensibilização para o problema, o que me parece só ser
possível a partir de processos presenciais que aproveitem as vivências dos próprios
profissionais e pacientes.
As dificuldades para transformações construtivas de práticas e condutas devem-se à
própria à reestruturação organizacional do SUS por implantar processos verticalizados e
“excessivamente normativos” que não consideram adequadamente grupos de profissionais
da ponta do sistema como protagonistas deste processo educacional. Assim os modelos
educacionais vigentes subestimam as subjetividades e vivências dos profissionais,
desconsiderando os saberes que podem ser gerados nos espaços de cuidado, enquanto
fundamentais para o processo de capacitação e educação nos serviços. Produzindo o que
eles chamam de “pedagogia da dependência". 174
Um dos caminhos para operar uma mudança significativa nas chamadas práticas
pedagógicas de dependência, como demonstra vários estudos 188 , 189 , 190 , é investir na
subjetivação da educação somadas a processo de conhecimento cognitivo, utilizando
estratégias pedagógicas capazes de promover mudanças nas subjetividades. O sentido desta
nova perspectiva em processos educacionais na saúde é justamente contribuir na
construção de subjetividades imersas na coletividade que atuam e que sejam capazes de
transformar a realidade.
O que faz com que este profissional aja nos seus espaços de cuidados de
determinada forma é sua subjetividade, adquirida com suas experiências, seus valores e sua

112
história de vida, como também a conexão intersubjetiva que estabelece com o usuário. No
entanto, apesar da subjetividade fazer parte de todo o processo educacional do individuo, é
de fácil percepção a inexistência de ferramentas pedagógicas institucionais para trabalhá-
las. Isso pode constituir um sério obstáculo ao cumprimento de diretrizes de políticas de
equidade na ponta do sistema, uma vez que os indivíduos podem assumir cognitivamente o
discurso dos direitos e do respeito à diversidade, mas não conseguem trabalhar os estigmas
e os preconceitos encarnados em suas subjetividades.

7.3.2 Dificuldade em abordar a orientação sexual

Esta categoria tem um interesse especial, na medida em que demonstra que o


profissional institui uma espécie de norma para falar da sexualidade, na qual lhe é
plenamente permitido discursar sobre comportamentos moralmente condenáveis que
implica risco, associações com infecções sexualmente transmissíveis e com transtornos
mentais, dentro do próprio espaço aberto pela entrevista da pesquisa, mas parece sofrer um
efeito de interdição de fala ao estabelecer uma relação em torno do cuidado à saúde
direcionados à população não heterossexual.
Foucault analisou que por trás da "hipótese repressiva" sobre a sexualidade,
formou-se um verdadeiro arsenal discursivo nos âmbitos morais, religiosos, jurídicos e,
sobretudo das ciências. As "sexualidades desviantes" eram o principal alvo destes
discursos, e a única prática que não precisaria ser dissecada, nem estudada era a
heterossexual, sobretudo, a do casal "legitimado" pelo matrimonio e a família, visto que
práticas fora deste modelo também eram interditadas e moralmente condenadas.
Percebemos nos discursos apresentados pelos profissionais a atualidade da
"hipótese repressiva" e dos "silêncios" sobre a sexualidade. Evidencia-se um delay entre
historicidade teórica da compreensão das sexualidades e o conhecimento de profissionais e
da sociedade sobre as mesmas.
Alguns entrevistados utilizaram a terceira pessoa para responder à questão.
Transferiram a dificuldade de abordar a questão da sexualidade para os agentes
comunitários:

E2 -...a maioria dos agentes comunitários, já me falaram que não sente


preparado pra perguntar... Eles muitas vezes a gente sente que tem

113
certo preconceito, um receio né às vezes de chegar e abordar, não sabe
como conversar, né?

E 4 - a gente não se sente a vontade pra falar com medo da invasão,


mas também porque hoje em dia tudo é processo... os próprios agentes
falam: “eu não vou pergunta se a pessoa é gay ou não”.

E 18 - Por exemplo, tem um formulário de cadastro do Ministério da


Saúde que é a ficha E-SUS e nesse cadastro individual tem a
preferência sexual do indivíduo e geralmente, estou falando pelos
meus agentes de saúde... eles não perguntam, eles chegam nessa opção
e passam(...) eles assinaram de acordo com o sexo da identidade...., se
tá como homem na identidade eles colocam como hetero... mesmo que
a pessoa tenha os trejeitos de homossexual, eles geralmente colocam
como hetero e não perguntam

Ao atribuir ao outro, supostamente sob sua coordenação, uma ação que não
encontra respaldo na Política Pública, o profissional parece não reconhecer que ele está
reiterando a ação. É o que faz o entrevistado E4 ao exemplificar a conduta do ACS:“eu
não vou pergunta se a pessoa é gay..." . Fato que ser repete no discurso do entrevistado
E18, o qual refere que o(a) ACS preenche a ficha do E-SUS equivocadamente, atribuindo a
todos(as) usuários(as) a orientação heterossexual e identidade de gênero conforme o sexo
biológico, "de acordo com o sexo da identidade", pois não tem "coragem" de abordar, mas
também não deixa em branco um item que é de participação voluntária.
Na ficha do E-SUS consta a pergunta: Deseja informar orientação
sexual/identidade de gênero?191, assim o usuário(a) pode responder sim ou não, e caso
negativo, não há necessidade de aprofundar no tema, conforme a sua vontade. A ação de
preencher o formulário com a orientação heterossexual para todos(as), sem ao menos
consultar o(a) usuário(a) reforça o despreparo profissional e reafirma a naturalidade e a
força explicativa da heteronormatividade na sociedade e nos espaços institucionais. Ao
mesmo tempo reproduz o estranhamento, a invisibilidade, o preconceito e até a violência
simbólica que estas pessoas LGBT sofrem no local onde deveriam ser acolhidas e
respeitadas.
Diferente dos enfermeiros(as), os profissionais médicos(as) apontaram a
dificuldade de abordar a sexualidade do individuo também por preconceito, tabu,
constrangimento, machismo da sociedade e medo de "ofender" o outro(a).
M6 - Acho que talvez fazer a pergunta diretamente em relação a
sexualidade é uma dificuldade... talvez eu tenha uma restrição a mais
de fazer essa pergunta diretamente aos homens porque a gente tem
uma comunidade que é bastante machista. Se você faz essa pergunta
pra um homem que não é homossexual é como se fosse uma ofensa.
114
M7 - Então, com certeza existe o temor do preconceito e quando a
gente aborda sexualidade, é um termo complexo pra população em
geral, e quando a gente suspeita que é algum homossexual ou lésbica,
a gente vê que tem um certo constrangimento acerca sobre a
sexualidade...

A homossexualidade causa uma ofensa, ou seja, atribuir ou deixar perceber que um


homem heterossexual possa ser “acusado” de homossexualidade a partir da enunciação do
médico é um elemento que pode causar constrangimento. Esse argumento só possui
sustentação quando reconhecemos o caráter moral atribuído à homossexualidade.
O que um profissional poderia perguntar sobre a sexualidade dos usuários e seus
cuidado? A formação profissional que se mantém presa nas discussões sobre aparelho
reprodutor e disfunção sexual limita a possibilidade de que o profissional perceba e considere
outros aspectos inerentes e legítimos da sexualidade do sujeito.

M 12 - Eu não costumo fazer pergunta de fato sobre a sexualidade do


paciente, não é algo que tá na minha prática médica de está
perguntando. Porque ainda tem uma certa resistência porque não sei
como é que o paciente vai responder isso. A gente as vezes não sabe o
que explorar em relação à sexualidade.

M11 -... até porque é uma coisa da sociedade brasileira né não se fala
desse tema nas escolas, nas igrejas menos ainda, mas na sociedade em
geral não se fala desse tema... ainda separa a humanidade em
masculino, feminino e mais nada só isso e parece que é pecado é tabu,
não se fala é segredo se o filho tem alguma tendência homossexual...

M 16 - ...tem umas dificuldades que estão ligadas a isso então também


talvez seja o processo de preconceito...também por exemplo a
abordagem de perguntar diretamente de qual a orientação...

Não seria verdadeira a afirmação de que o médico não questiona sobre a


sexualidade e o gênero dos(as) usuários(as). Sim, o fazem dentro da matriz heterossexual,
perguntam sobre frequência das relações, expectativa de filhos, sobre a resposta sexual.
Tudo ornado pela correspondência sexo-gênero-heterossexualidade-casamento-familia.
Esse suposto constrangimento ou desconhecimento, no seu avesso, segue legitimando a
heterossexualidade como única forma válida de expressão da sexualidade e demarcando as
margens onde a população LGBT pode transitar.
Um sistema de saúde, onde se preconiza o tratamento integral do ser humano, onde
avanços ocorreram na inclusão da orientação sexual e identidade de gênero enquanto

115
determinantes de saúde, onde a ficha do E-SUS5 possui um espaço de identificação caso
estas pessoas queiram declarar sua orientação sexual e identidade de gênero, e os
profissionais simplesmente se calam, silenciam, se constrangem, tem medo, receio de
abordar, prejudica todo o planejamento de saúde para essa população.
As conseqüências desse silêncio vão além dos problemas na relação profissional-
paciente, eles impactam a geração de dados sobre a saúde da população LGBT, na medida
em que a orientação marcada na ficha é a da aparência ou a do registro civil, impedindo
que se tenha uma estimativa mais precisa do tamanho da população LGBT que procura o
serviço e dos indicadores de situação de saúde e assim, em efeito cascata alcançam todas as
unidades e todos os territórios.
Mesmo que a classificação da sigla LGBT expresse a diversidade sexual, por
diversas determinações sócias históricas e pela organização do movimento na conquista de
direitos e cidadania, conforme discutido no capítulo 4.5 desta tese, o que parece impreciso
na compreensão dos agentes de saúde nesta amostra é o entendimento de orientação sexual,
identidade de gênero, e sexo. Ao se omitir, ter medo, receio e constrangimento de falar
sobre "sexualidade" do usuário, aqui lógico não a de qualquer usuário, mas este inserido na
população LGBT, o profissional pode estar negando a este sujeito a afirmação de sua
identidade, que inclui sim a sua sexualidade, mas também aspectos psicológicos e sociais
imprescindíveis no entendimento do humano, os quais nortearam e coordenaram os
cuidados integrais e equânimes a esta população.
Vimos com Foucault como estatuto de poder sobre os corpos e suas manifestações
sexuais foi instaurado nos diversos dispositivos que ditavam a verdade sobre o sujeito. O
controle das enunciações funcionava através da economia restritiva, dos locais onde era
permitido falar das sexualidades, a exemplo dos confessionários religiosos e das ciências
sexuais, ou proibido a exemplo das relações entre pais e filho e dos educadores. O controle
e a disciplina sobre o sexo, os lugares onde pode ser enunciado ou calado, parece se
perpetuar em nosso século. Para M11 "é uma coisa da sociedade brasileira né não se fala
desse tema nas escolas, nas igrejas menos ainda, mas na sociedade em geral não se fala
desse tema". O cenário de retrocesso que o nosso país vive, a exemplo da tentativa de

5
"Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica -registro das informações em saúde
de forma individualizada, permitindo o acompanhamento do histórico de atendimentos de cada usuário,
assim como da produção de cada profissional da Atenção Básica. Outro ponto importante é a integração dos
diversos sistemas de informação oficiais existentes na Atenção Básica, reduzindo a necessidade de registrar
informações similares em mais de um instrumento (fichas/sistemas), o que otimiza o trabalho dos
profissionais e o uso da informação para gestão e qualificação do cuidado em saúde."
116
implantar a "cura gay" e a rejeição no âmbito federal do Caderno Escola sem Homofobia,
conhecido como "kit gay", potencializa o silêncio e o tabu do tema na nossa sociedade.

7.4 As UBS e os espaços de (des)atenção à Saúde LGBT

Nesta categoria descreveremos como os espaços de saúde são percebidos pelos


profissionais no atendimento da população LGBT. Foi possível identificar, entretanto, duas
subcategorias. Na primeira dessas subcategorias encontra-se a percepção dos atores de
saúde quanto ao acolhimento da população nas USF, onde percebemos uma imprecisão
quanto ao atendimento com igualdade e o atendimento com equidade, considerando os
direitos dos usuários estabelecidos constitucionalmente e reforçados por políticas publicas
de equidade. Na segunda subcategoria estão os discursos que se referiram às razões pelas
quais o lugar da atenção básica, reconhecido como porta de entrada do SUS é pouco
procurado pela população LGBT. Já a terceira subcategoria se refere aos discursos que
apontam como local ideal para o acolhimento da população os centros de tratamento para
IST/HIV.

7.4.1 Contradições da UBS: nem igualdade, nem equidade.

Esteve muito presente nos discursos, uma noção conceitual de igualdade, e de


atendimento universal que não parece se articular com o princípio da equidade, negando as
necessidades específicas da população LGBT e a função dos programas, política e ações de
equidade para a condução a uma igualdade real.

E1 - Eu acho que é de forma geral, é até eu concordo muito com isso


na verdade, porque eu acho que todos somos iguais, independente. E
eu acho que isso se torna uma discriminação... Ah tem que ter um
Núcleo para transgênero, ou trans... Sabe, não justifica... acho que
todos somos iguais. Não consigo assimilar uma diferença.

E2 - Eu acredito que não, porque eles são pessoas normais igual a nós,
né… eu não acho que tem que fazer um grupo separado pra essas
pessoas, até porque se existe já restrição muitas vezes deles, né, de
procurar o serviço, né, por algum motivo, se fizer um grupo separado
fica uma coisa como se fosse discriminação.

E3 - Eu não vejo a comunidade LGBT diferente de nada...essas


políticas de LGBT que também vale... pra negro como vale pra
qualquer pessoa que se diz diferente eu acho que as políticas devem
existir pra mostrar que elas não são diferentes e parar de trata-las
como diferente, entendeu?... Então eu acho que as políticas tinham

117
que começar a mostrar que "oh gente, nós vamos fazer política pra
mostrar que eles são iguais" e parar de ter coisa assim direcionada pra
gay, direcionada para isso, então você está dizendo que eles são
diferentes e que a gente tem que trata-los como diferente.

E4 - Se eu já vejo aquele sujeito como diferente eu posso estar


dificultando, a gente conversa sobre isso se eu chego lá e ele é
homossexual, ela é lésbica tal e eu já enxergo isso ele como diferente
eu acho que o caminho é o contrario é enxergar como qualquer um, a
informação que eu tenho que passar para ele é a mesma informação
que eu tenho que passar pro outro né...

E 7 - é igualdade da assistência mesmo né, tem acesso a todo serviço


como qualquer outro usuário. E muitas vezes nem identificamos se
eles fazem parte desse grupo ou não

E18 -... eu sei que é um paciente ou usuário como outro qualquer, não
tem nenhuma diferença no nosso olhar, na verdade se ele vier
procurar, qualquer um desses vier procurar eu vou atender como eu
atendo qualquer outro público....

M2- Ah são iguais... Também quase não tem diferença não,


geralmente o que eles procuram é o que todos procuram...

M 8 - Porque aqui não são diferentes, são seres humanos iguais, com
as mesmas características. Não deve haver um centro de atenção
diferenciado para esse tipo de paciente, e o médico de família deve
saber medicá-lo porque a sua especialidade atende todas as pessoas
sem diferença. Eu acho que seria muito ruim se você decide separá-lo
e tratá-lo como outro tipo de pessoa, para mim não.

M 17 - Não tenho dificuldade nenhuma, porque pra mim todos os


pacientes são iguais né... Não tem essa distinção entre preferência
sexual, então a gente como profissional, tem que tratar normalmente o
paciente, visando sempre o bem estar dele e a saúde de forma integral.

M21 - Porque são pacientes iguais e a gente tem que atender todos do
mesmo jeito

Os discursos deixam claro, que não se encontra bem compreendidos por esses
profissionais, como os princípios de Universalidade, Igualdade e Equidade se articulam no
SUS. A Universalidade é um dos princípios fundamentais do Sistema Único de Saúde
(SUS) e define que todos os cidadãos brasileiros, sem qualquer tipo de discriminação, têm
direito ao acesso igualitário às ações e serviços de saúde, conforme determinado no artigo
196 da Constituição de 1988 (Brasil, 2005).
A igualdade, portanto, articula-se com a Universalidade, em sua dimensão de saúde
enquanto direito humano fundamental, a partir da qual todos são iguais sem distinção de
raça, sexo, religião. A igualdade fundamenta, portanto, o acesso universal 6 . Segundo

6
Acesso aqui entendido na complexidade e multiplicidade do conceito, indo desde a compressão do
próprio termo acesso, enquanto utilização oportuna e adequada de serviços de saúde com o fim de chegar a
118
Matta192, é a universalidade que organiza e dá sentido aos demais princípios e diretrizes do
SUS com o propósito de garantir o direito à saúde de forma descentralizada e integral. O
princípio da igualdade aparece na lei orgânica da saúde 8.080/90 como “igualdade de
assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie”. É possível notar
que alguns profissionais parecem compreender ações específicas para determinados
grupos, como um privilégio que fere a noção de igualdade. Isso fica bastante claro, por
exemplo, na fala de E1, quando diz que um espaço de atendimento para transgêneros se
constituiria uma discriminação que nega a igualdade.
É interessante notar que o termo equidade não aparece de forma explícita nem na
Constituição Federal nem na Lei Orgânica da Saúde 8080/90. Scorel (2009)193 afirma que
o princípio da equidade vai surgir no bojo das lutas pelos direitos das minorias, e, portanto,
só mais tarde seria incorporado pela reforma sanitária brasileira. Para ela o conceito de
equidade incorpora a noção de justiça à distribuição igualitária, na medida em que permite
associar igualdade e diferença nos espaços públicos. Trata-se, em última análise, de
reconhecer que os seres humanos são iguais em direitos, mas desiguais em condições
concretas de vida e necessidades.
Assim sendo, é preciso também distinguir as diferenças injustas, indesejáveis,
desnecessárias e evitáveis. No mesmo sentido Sposati (1999)194, também citado por Scorel,
dirá: “a noção de igualdade só se completa se compartida à noção de eqüidade. Não basta
um padrão universal se este não comportar o direito à diferença" (p 128). Lionço3 contribui
com esta perspectiva, e pontua a necessidade de ações focalizadas para grupos com
desigualdades históricas:

Se, por um lado, a universalidade do direito à saúde como direito de cidadania


prevê o princípio da igualdade na proposição de políticas que alcancem a
totalidade dos cidadãos, a focalização de ações e políticas específicas é um
recurso necessário, muitas vezes, para a própria efetivação da universalidade,
mediante promoção da equidade entre grupos em situação desigual (p. 12).

melhores resultados na própria saúde e acessibilidade, como os meios que fazem possível o contato com os
serviços de saúde. (Starfield, 2004)

119
Matta (2011)195 define equidade exatamente a partir de sua distinção da igualdade:
...o princípio da equidade não pressupõe a noção de igualdade, mas significa,
sim, tratar desigualmente o desigual, atentando para as necessidades coletivas e
individuais e procurando investir onde a iniquidade é maior. Isto implicaria
reconhecer a pluralidade e diversidade da condição humana em suas
necessidades e em suas potencialidades (p.249)

Travassos196 acrescenta que a equidade não pode ser avaliada apenas com relação
ao acesso, alocação de recursos e utilização de serviços, mas também considerando as
desigualdades das condições de vida, que colocariam as pessoas de maneira diferente a
fatores determinantes na produção de saúde e doenças.
Lionço e Costa197, discutindo a questão da democracia e participação social como
estratégia para equidade em saúde, levantam pontos críticos quanto a incorporação deste
último apenas como “conjunto de intenções” sem haver engajamento nem proposições
concretas do sentido de equidade na construção de políticas publicas.
O que deve orientar o sentido de equidade para as autoras é justamente a
participação social, a escuta dos segmentos sociais que foram alijados do acesso ao
cuidado integral e universal a saúde durante décadas. Citando Nogueira (2000) chamam a
atenção para os desvios de noção de equidade a partir da década de 90 onde as condições
de desigualdades sociais foram substituídas pela demanda de direitos iguais, passando
assim "de uma lógica discursiva que privilegiava a negatividade de uma condição, para
outra lógica que passa a enunciar a positividade dos direitos.”(p.50)
Esta lógica distorcida parece estar presente nas subjetividades dos profissionais
quando da persistência do discurso anunciando que, se todos são iguais no direito merecem
tratamentos iguais, excluindo desta noção positiva de direitos, justamente o que lhe é mais
caro, o reconhecimento das vulnerabilidades e desigualdades históricas que marcam
indivíduos no processo saúde/doença.
Para as autoras esta mudança de perspectiva teve como consequência certo
abandono das especificidades de determinados segmentos sociais a favor de uma visão
globalizada de direitos e na análise do Plano Pluri Anual/PPA 2004-2007 na promoção de
equidade dizem:

O PPA afirma que o estigma destinado a grupos sociais específicos é um fator


tão prejudicial quanto o fator econômico na exclusão do acesso destes
determinados segmentos aos direitos, bens e benefícios públicos e explicita que
estas condições sejam incorporadas nas políticas do Governo. (p. 52)

120
Neste sentido tanto o PPA quanto a Política Nacional de Saúde Integral da
população LGBT reconhecem a discriminação de determinados segmentos população
como aspecto crucial para ser combatido e considerado no atendimento integral e
equânime a saúde da população.

A promoção da eqüidade na saúde não deve se restringir à mera oferta de


tratamento igualitário a todos, mas deve sustentar a disposição de fornecer
orientação para que os serviços ofereçam o respeito traduzido em práticas e
atitudes, destinados a cada cidadão em suas necessidades. (p.52)

Em função do amadurecimento da discussão conceitual dentro da Saúde Coletiva


Brasileira, o conceito de equidade acabou substituindo o de igualdade, enquanto princípio
doutrinário do SUS e foi incorporada legislação sanitária brasileira em dois eixos: equidade
de oportunidade e equidade de condições.198
A fala de E3 demonstra bem como a noção de igualdade dos profissionais, exclui a
noção de iniquidades enquanto diferenças oriundas de injustiças e estigmas. Ela chega a
negar a necessidade de políticas de equidade: “Eu não vejo a comunidade LGBT diferente
de nada... eu acho que as políticas devem existir pra mostrar que elas não são diferentes e
parar de tratá-las como diferente, entendeu”.O que não é considerado nesta visão é o fato
de que o direito à saúde requer justamente a compreensão das diferenças nos determinantes
de saúde e seus marcadores sócios econômicos e que só tomando-as em consideração é que
se pode ofertar um atendimento universal, integral e equânime.
A construção discursiva que se mostra aparentemente inclusiva "são pacientes
iguais e a gente tem que atender todos do mesmo jeito" guarda em si um paradoxo
verificado na presente análise. Se todos são iguais, as necessidades de saúde da mulher
cisgênero, do homem cisgênero, da população negra e outras populações são semelhantes,
por que no momento de questionar sobre os principais agravos na população LGBT os
mesmos profissionais relacionam às IST/AIDS? É notório que se a questão fosse sobre a
saúde de outras populações a resposta seria diferente.
Paulino encontra resultados similares ao desta discussão os quais ele nomina de
discursos da “não diferença”. Indo por um viés sobre a organização e estrutura dos serviços
de saúde, diz o seguinte:

Se o serviço se organiza de forma a não acolher essas pessoas, reconhecer e atuar


nas suas diversidades, ele se estrutura a partir da “não-diferença”, negando
inclusive a integralidade que deveria ser um dos seus princípios norteadores. Em

121
termos políticos, essa estruturação apóia e é apoiada pelo discurso dos
profissionais de saúde que essa diferença não existe. Com isso, a concepção de
igualdade permite que o serviço se sustente da forma como está, pois,
aparentemente, ele está distante de preconceitos e discriminações. (p. 42)

É possível também perceber nos discursos uma espécie de forma compensatória em


negar o preconceito e a discriminação que se encontram velados no discurso de igualdade,
como eixo organizacional e acolhedor das UBS. A profissional E1 considera que se não
tratar "igual" pode ser um ato discriminatório: " porque eu acho que todos somos iguais,
independente. E eu acho que isso se torna uma discriminação... Ah tem que ter um Núcleo
para transgênero, ou trans... Sabe, não justifica...". O que o discurso da "falsa igualdade"
ou da "não diferença" traduz é a ampliação da invisibilidade destas pessoas em condição de
vulnerabilidade e a negação de suas especificidades, tal como Paulino também analisa:

Assim, as demandas das pessoas LGBT seguem silenciadas, invisíveis,


escondidas por trás de um discurso revestido de igualdade. E é essa igualdade
aparentemente tão positiva que não permite que acessemos de fato essas pessoas
nem, muito menos, que elas nos acessem e aos serviços de saúde também. (p. 58)

Em 2013, antes da ruptura democrática que se instalou no nosso país, o Ministério


da Saúde, através da Secretaria de Gestão Estratégia e Participativa (SGEP) lançou a
Políticas de Promoção da Equidade em Saúde, priorizando justamente a redução das
desigualdades sociais e reconhecendo as vulnerabilidades que são expostas diversas
populações que foram historicamente excluídas e desassistidas no contexto sócio-político.
Esta política contempla a saúde das Populações: LGBT, Negra, do Campo e da Floresta,
em Situação de Rua e Cigana.
Discutimos anteriormente como a USF se constitui em arena privilegiada para
implantação, avaliação e monitoramento de toda e qualquer política pública de equidade, e
como o modelo de atenção adotado pelo SUS, enfatiza o aspecto positivo da focalização,
devido ao abismo das desigualdades sócio históricas do país. Encontrar nos profissionais
que ocupam o lugar certificado como porta de entrada do SUS, onde preferencialmente as
políticas de equidade, proteção e promoção a saúde são implantadas, com discursos
contrários aos princípios que gerem o sistema, torna-se preocupante para o acolhimento
integral das populações com vulnerabilidades históricas e demonstra o quanto a Política
Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais precisa
ser consolidada e implementada de forma eficiente e eficaz, e não apenas como
instrumento retórico e utópico.
122
Reafirmando nossa preocupação, dentre a totalidade das entrevistas analisadas,
encontramos apenas duas que compreendem mais claramente a noção de equidade,
reconhecendo o despreparo da equipe de saúde para lidar com a diversidade da população
LGBT e a condição de que apenas o acesso físico não vai garantir o cuidado integral e de
qualidade a estas pessoas

M 3 - específica porque é um dos princípios do SUS é equidade né,


diferenças, diferentes são tratados de formas diferentes e iguais de
forma igual e nesse caso é diferente e, por outro lado a instabilidade
que nós temos do pouco preparo do pessoal de saúde, da equipe de
saúde pra lidar especificamente com questões psicológicas
relacionada a população LGBT...

M 5- levando em conta a equidade, quem precisa de mais, ter mais,


então não adianta só ta com a porta aberta e dizer que o acesso ta lá
e a pessoa, é só a pessoa ir, não é..

Por outro lado, algumas afirmações foram além desta confusão conceitual entre
igualdade, equidade e universalidade e vieram acompanhadas de outras noções que
reafirmam a marcas estigmatizadoras, tal como o depoimento de M3.

M3 - porque o serviço é pra todos né, é universal aqui não tem essa
questão de “ah porque é mendigo ou porque é alcoolista ou é usuário
de droga ou é... mora numa situação de alto risco ou é LGBT".

Em sua fala, os exemplos que sustentam a universalidade do atendimento


comparam a condição LGBT com outros grupos sociais, que a partir do processo
estigmatizante passam a carregar marcas que confundem diversidade sexual e ou
raça/etnia, com condições consideradas moralmente inferiores, tais como: mendicância,
dependência química, deficiência física. É interessante observar que os exemplos se
referem a todos os três tipos de estigmas descritos por Goffman, os de origem étnico-racial,
os de deficiências e deformidades e os de conteúdo moral. Ao mesmo tempo os exemplos
usados para a comparação são muitos daqueles sobre as quais foram pensadas as políticas
de equidade.
O discurso da universalidade e igualdade para além de negar a equidade, descortina
a marca das populações estigmatizadas, na medida que reconhece a exclusão social da
população LGBT comparando com outras "marginalizadas" , mas que no sistema de saúde
são acolhidas como "todos". A noção de exclusão é reforçada pela visão biomédica "é pra
gente olhar somente a parte de saúde do indivíduo", ou seja, para este profissional os

123
determinantes sociais de saúde e a compreensão do sujeito em sua integralidade não são
considerados.

7.4.2 Responsabilização da população LGBT pela baixa procura das UBS

Vimos na categoria sobre a formação e capacitação profissionais que assumem ou


consentem as dificuldades para abordar a orientação sexual e identidade de gênero, por
outro lado a percepção dos profissionais sobre a baixa procura da população LGBT as
Unidades de Saúde, é atribuída à própria população por vergonha, medo do preconceito,
timidez, sentimentos estes que levam estas pessoas inclusive a ocultarem sua orientação
sexual, ou seja, aqui é facultada a própria população LGBT, segundo a percepção dos
profissionais, a responsabilidade por omitir a orientação sexual e identidade de gênero e a
baixa demanda na procura dos serviços de saúde.

E1 - E pra essas pessoas já é muito mais difícil procurar, porque


muitos não falam sobre a sua orientação. Escondem da família,
escondem de várias pessoas e às vezes chega aqui com alguma
doença... Ás vezes é até difícil ela(e) contar para você o que realmente
aconteceu...

E2 - ...eles mesmos tem essa dificuldade de se abrir e contar o que


realmente está acontecendo, o que aconteceu, então muitas vezes você
tem que ir deduzindo e vai, então é muito difícil...

E9 - Eu acho que a dificuldade é o paciente mesmo, a pessoa se


declarar, né? Por exemplo, os atendimentos de DST... a gente percebe
que a pessoa fica um pouco, é... travada assim, na hora de falar, né?

E 7 - Tem usuário que não vem em consulta clínica talvez ele tenha
vergonha ainda né, de como a população aqui dentro vai reagir, os
outros usuários... então não é frequente a gente ver pessoas desse
grupo dentro da unidade no dia a dia, entendeu?!

E22 - Assim, eu acredito que seja uma população que não tem, não
compareça muito a unidade, por uma questão deles mesmo de não se
expor

M3 - não tenho muitos pacientes LGBT não, não sei se é porque o


paciente às vezes fica envergonhado de procurar o serviço de saúde...

M18 - Olha, eles não são muito afeitos a vir ao posto, pelo menos da
minha área. Mas é uma rejeição deles mesmos, e não sei bem por
que....

A forma como alguns profissionais parecem entender as dificuldades dos usuários


LGBT procurarem as USF revela um estereótipo de fragilidade e inferioridade emocional da
124
população LGBT, como se fosse algo psicologicamente inerente à condição, o que contribui
para reforçar o estigma. É muito significativo que não reconheçam que o próprio
preconceito e atos discriminatórios de profissionais de saúde nas relações interpessoais e
próprio sexismo institucional sejam os causadores dessas barreiras simbólicas ao acesso.
Alguns processos subjetivos de indivíduos LGBT podem contribuir para um
silenciamento sobre sua condição, tais como quando se trata, por exemplo, de pessoas que
não informam pertencimento ao segmento LGBT. Goffman35 relata que atitudes de
vergonha ou ocultação da condição, podem surgir quando o sujeito vítima do estigma
compartilha com os estigmatizadores as mesmas crenças sobre sua identidade, e assim,
incorpora em sua subjetividade as normas de condutas dos ditos normais. Isso se aproxima
bastante da noção de homofobia internalizada, já descrita na literatura mais recente, a partir
da qual o sujeito não heterossexual internaliza os valores e normas sociais e
consequentemente vive em conflito entre aceitação de sua própria homossexualidade e as
ordens estabelecidas. A recusa ou o conflito com sua condição provoca subjetivamente
medo, culpa, vergonha e avaliação negativa da auto-imagem 199 , provocando também
sofrimento e punição a si mesmo devido as características de sua identidade serem
formalmente rejeitadas pela sociedade.
Outra situação subjetiva que pode justificar esse silenciamento é quando o sujeito
estigmatizado, mesmo sem conflito interno com sua condição evita em revelá-la por
considerar que em determinadas interações sociais ou lugares, a revelação causará atitudes
discriminatórias: "o temor da discriminação vem no momento de declará-la, algumas vezes
causando obstáculos a essa declaração de sexualidade." (p. 31). Assim, ele chama de
"desacreditados" os indivíduos que não conseguem esconder sua marca estigmatizadora e de
"desacreditáveis" aqueles que não as tem aparentes, mas que sabem que sofrerão a
estigmatização assim que as revelar. No mesmo sentido, os pretensos normais,
considerando essas marcas como algo que inferioriza as identidades, também a considerarão,
independentemente da postura do estigmatizado, com razões para vergonha, medo e culpa,
ou seja, a própria interpretação encontra-se mediada pelo preconceito.
Fébole165 encontrou nas falas da população LGBT exatamente a imagem de
indivíduos "desacreditáveis". Denominou de "ocultamento" o processo que as usuárias e os
usuários permitem padrões normativos de gênero e da heteronormatividade determinarem a
conduta do atendimento em saúde e se calam. O medo da homofobia, de maus tratos e de
sofrer represálias caso a sua sexualidade seja exposta é que permeia a atitude de ocultar sua

125
identidade real diante do profissional de saúde. De acordo com a autora esta forma de agir
será prejudicial tanto no combate a homofobia institucional, quanto na manutenção
equivocada das "sexualidades desviantes":

Ocultar a sexualidade se adequando à heteronormatividade traz consequências


negativas, como apontado nos trechos, no que diz respeito: ao próprio atendimento
que não irá considerar aqueles determinantes sociais da saúde; e para a população
LGBT que continuará tendo sua sexualidade invisibilizada, negligenciada e
associada ao erro em decorrência do medo da homofobia que acompanha os
atendimentos em saúde. (p. 120)

O que demonstra de forma mais clara essa perspectiva da interpretação da baixa


procura pela unidade de saúde como já mediada pelo estigma e preconceito é o fato desses
profissionais não reconhecerem as estruturas institucionais homofóbicas nas quais é patente
a ausência de ações afirmativas para o acolhimento da população LGBT.
Entretanto, em minoria, estão aqueles que reconhecem a presença do preconceito nas
unidades, como interferindo negativamente na motivação para procurar o serviço e impondo
o constrangimento aos usuários

E 17 - … não sei, não sei bem... como que coloco isso, mas a questão
mesmo do preconceito… os meus eu nem posso dizer muita coisa,
mas existe preconceito por parte de muitos em relação a isso

E 22 - não saber como vai ser recebido e aquela questão de saber


como lidar com o preconceito de algumas pessoas.

M7 - Eu acho que sim, tem a ver com isso e acho que a população
homossexual tem receio de se expor, tem vergonha, tem medo de
sofrer por preconceito, vergonha digo, dessa… é triste né, preconceito
é muito doloroso

M15 - eles tem atendimento, os que chegam aqui tem um


atendimento, mas assim dificilmente eles abordam questões de
sexualidade... na verdade, as pessoas já chegam com a carapaça, com
medo do preconceito e sempre direciona pra uma queixa específica... ,
assim pro homem já é difícil procurar o serviço médico, homossexual
masculino pior ainda

M17 - pacientes que muitas vezes tem vergonha, que não gostam...
por achar que vá haver algum tipo de preconceito né?

Aqui é interessante também retomar a definição dos três tipos de lugares sociais,
segundo Goffman35, destinados aos indivíduos que possuem um atributo diferencial
estigmatizado. Pela análise dos discursos colhidos, as UBS, podem parecer a alguns
usuários LGBT como lugares do primeiro tipo de Goffman, que são inacessíveis, onde há
proibições claras e, ao querer frequentá-lo, “o intruso busca um disfarce”, um tipo de
126
“cooperação tácita para evitá-la”. Esse disfarce surge nos discursos dos profissionais, "o
silêncio dos pacientes" em torno de sua condição, o fato de para alguns, eles não gostarem
de falar sobre suas condições ou as estratégias em fazer de conta que estão indo para uma
consulta de rotina, quando na verdade querem sorologias para IST.
Entretanto, quanto ao tipo de lugar social, o conjunto de discursos, sobretudo
considerando aqueles tipicamente patologizantes, ou os que assumem o preconceito
existente, como influenciando ou não o atendimento, confere às UBS, como já esperado,
uma natureza de espaço do segundo tipo, caracterizado por Goffman como lugares
públicos nos quais os estigmatizados são tratados cuidadosamente, onde parece haver uma
atmosfera de proteção, como se não houvesse uma desqualificação moral, que na verdade
existe com força e perenidade.
Todos eles integram a engrenagem que mantém afastada a população LGBT dos
serviços de saúde. Os constrangimentos da população LGBT operado pelos serviços de
saúde parece estar ligados ao desejo de não receber/atender que se apresenta numa
generalização de demandas, e no argumento do desconhecimento.
O profissional de saúde parece desconhecer essa instância de dominação que opera
e desloca para o outro a responsabilidade da ausência no serviço. Nesta inter-relação entre
o especialista e o sujeito vulnerável demandante é historicamente lógico perceber onde se
encontra o poder, certamente não do lado de quem procura ajuda para falar de suas
necessidades, mas do lado de quem escuta, interroga e supostamente ignora como nos diz
Foucault10.
Foi possível, entretanto, encontrar profissionais que parecem compreender a
necessidade de alguns serviços especializados, mas nos quais essa compreensão não se
estenda à necessidade de que a própria unidade de saúde venha a se tornar um lugar de
acolhimento livre de preconceitos.

E15 - Por exemplo, eu acho que deveria como se fosse, como a gente
tem o hospital da mulher, um ponto, porque a gente tem hoje a única
demanda assim que a gente vê são CTAs né, que é o centro de
testamento que você faz os testes, o único lugar que eu vejo ele sendo
acolhidos é aí...

Os pacientes LGBT seriam assim transferidos para uma espécie de "Hospital


LGBT". Assim sendo, eles funcionariam como o terceiro tipo de lugar social dos
estigmatizados, como definido por Goffman e nomeado por ele como "lugares retirados",
127
onde os indivíduos sentem-se aceitos e não precisam ocultar suas características, mas que
ao mesmo tempo revela a exclusão a que estão submetidos. Vale destacar o fato de que os
serviços melhor preparados para a atenção à saúde da população LGBT estejam associados
à compreensão da diversidade sexual enquanto fator de risco para HIV-AIDS e outras IST,
e não por uma visão mais global de necessidades de saúde desse grupo social.
Reconhecendo as questões da sexualidade e educação sexual como substancial na
abordagem da saúde de toda população, em todas as gerações, por que estas seriam tão
enfatizadas na população LGBT? Impressiona perceber que quando esta população se
apresenta ao profissional de saúde parece estar inscrito em seu corpo "minha saúde é meu
sexo". A enfermeira E7 chega a afirmar "quando a gente trata mais em questão sexual é
que a gente consegue captar um pouco mais dessas pessoas". Quer dizer, a compreensão
das complexidades deste ser humano e suas demandas de saúde seriam possíveis somente a
partir da sua sexualidade?
Posição que provoca um reducionismo das necessidades complexas de quem é
LGBT, que inclui a sua sexualidade, mas também as questões emocionais, afetivas, sociais,
históricas e biológicas que vão muito além do desejo sexual e práticas de sexualidade.
Inserir a sexualidade do usuário como legitima pode produzir uma relação de confiança e
de pertencimento que possibilita um cuidado. O que não significa reduzir o usuário à sua
sexualidade, mas sim, enunciá-la, torná-la inteligível, valorizar suas experiências.
Retornando mais uma vez a Goffman parece ser imputado na população LGBT,
reconhecer a sexualidade e o gênero como determinantes no processo saúde-adoecimento-
cuidado é diferente de torná-lo uma "marca", uma característica que camufla e limita a
compreensão da sua humanidade e da sua saúde como todo. Uma reflexão de Goffman
ilustra bem essa tendência dos profissionais em centrar toda a abordagem de saúde LGBT
ao que eles denominam "práticas sexuais", quando as interações intersubjetivas em torno
do estigma desde os gregos até nossos dias contém as mesmas características sociológicas:
um indivíduo deixa de ser recebido normalmente nas relações sociais quotidianas, por
portar um traço que se sobrepõe a qualquer outro de seus atributos e desvia a atenção
daquele outro em interação para este aspecto estigmatizador.
Essa ideia de Goffman se articula com uma outra de Foucault, aquela dos
dispositivos normalizadores, enquanto máquinas de fazer falar e neste sentido estão às
instituições de saúde impregnadas pela racionalidade de uma ciência da sexualidade,
fundadas para um lugar de dominação do diverso, que o faz falar, o estuda, classifica-o,

128
busca moldá-lo a padrões universalizantes.

[...] a instância de dominação não se encontra do lado do que fala (pois é


ele o pressionado) mas do lado de quem escuta e cala; não do lado do que
sabe e responde, mas do que interroga e supostamente ignora. E,
finalmente, esse discurso de verdade adquire efeito, não em quem o recebe,
mas sim naquele de quem é extorquido. (Foucault, p.61)

Seguindo os pressupostos de uma análise de discurso para uma investigação


profunda da produção dos verdadeiros sentidos que as falas revelam, foi possível perceber,
a partir da categorização proposta, o quanto esses discursos revelam das estruturas
macrossociais de relação de poder que determinam as ideologias hegemônicas sobre
sexualidade no cotidiano dos profissionais da atenção básica à saúde. Tomando esses
profissionais enquanto sujeitos político-sociais compreendemos o quanto seus discursos
constroem e são construídos pela vida em sociedade e como, seguindo Pêcheux, em termos
de discursos, não há sujeitos, e sim "assujeitados ao coletivo". As falas dos profissionais
refletem, portanto, a racionalidade patologizante das ciências biomédicas em relação à
sexualidade e os estigmas mediados por valores de uma tradição jurídica e religiosa que
através dos últimos séculos criminalizou ou condenou moralmente as formas não
heteronormativas de amar e viver.
As barreiras identificadas na tese dificultam o enfrentamento das iniquidades em
saúde. É responsabilidade e dever do profissional de saúde abordar a saúde integral do ser
humano em seus aspectos biopsicossociais, que talvez estejam camuflados na "queixa
principal". O paciente, o sujeito demandante, chega aos serviços de saúde “carregado” de
suas vulnerabilidades, suas subjetividades e ainda fragilizado por sua "dor", seja ela
psicológica, física ou social, e é direito posto na constituição ser tratado conforme os
princípios de integralidade e equanimidade.

129
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Instrumentos e brinquedos são os sentidos e o espírito; atrás deles acha-se,


ainda , o ser próprio. O ser próprio procura também com os olhos dos sentidos,
escuta também com os ouvidos do espírito. [...] Atrás de teus pensamentos e
sentimentos, meu irmão, acha-se um soberano poderoso, um sábio
desconhecido — e chama-se o ser próprio. Mora no teu corpo, é o teu corpo.
(Nietzsche, 1977, p. 51).

Articular os conceitos teóricos e o entendimento da construção sócio-histórica da


sexualidade, do estigma, do preconceito e da discriminação permitiram compreender uma
dimensão da percepção dos(as) médicos(as) e enfermeiros(as) que atuam na Atenção
Básica sobre a diversidade sexual e a atenção à saúde ofertada à população LGBT no
Sistema Único de Saúde.
Percorremos o caminho desde quando as homossexualidades e transexualidades
eram expressões de criminalidade e doença, até a retirada das primeiras do status de
patologia em todos os códigos científicos, manutenção das segundas no espectro
diagnóstico da psiquiatria, onde a substituição de Transtorno de Identidade de Gênero para
Disforia de Gênero ainda pode ser aferida como resquícios do processo de patologização, e
a recente decisão histórica da OMS, ainda em trâmite, que retira as transexualidades do
código de doença mental e insere no código de condições de saúde sexual.
Por este caminho discutimos como Foucault enfatizou o papel das Scientias
Sexualis enquanto mecanismo contundente para o exercício do biopoder sobre a
sexualidade humana, a partir de uma necessidade sempre urgente de classificar, nomear e
consequentemente patologizar as "sexualidades desviantes", ou toda e qualquer
manifestação do desejo que se dissocia do modelo heterossexual.
Refletimos com Goffman sobre a formação do estigma construído nas inter-
relações sociais, onde a marca atribuída ao sujeito estigmatizado, coloca quem o
estigmatiza sempre na posição de superioridade e normalidade, a partir de diversos
marcadores sociais preconcebidos e normativos impostos socialmente, resultando numa
"identidade social deteriorada" do sujeito estigmatizado. Dos tipos de estigma todos
"carregam o mesmo traço sociológico, o individuo estigmatizado encontra-se inabilitado
para plena aceitação social, cujo foco da relação com outro recai justamente no atributo
“depreciativo” e na impossibilidade de enxergar demais características da sua
personalidade".

130
No entanto além das marcas identitárias "deterioradas" era necessário também a
compreensão das vulnerabilidades históricas acometidas a esta população. É assim que
com Parker compreendemos o papel fundamental do estigma também enquanto
determinante da desigualdade social, se constituindo como elemento de poder e
dominação, onde de forma essencialmente discriminatória, determinados grupos são
excluídos ou valorizados, envolvendo o processo de rotulagem e estereotipagem,
desencadeado por diversos mecanismos.
Esses referenciais foram centrais no presente trabalho no sentido de que
constituíram o pano de fundo da interpretação dos resultados da investigação discursiva
que se propunha a cumprir os objetivos propostos. No que se refere à percepção dos
profissionais de saúde sobre diversidade sexual, o que pudemos constatar foi que passadas
quatro décadas da análise de Foucault e de outros tantos estudos teóricos posteriores sobre
a ordem compulsória da heteronormatividade e seus impactos na saúde, a força da
Scientias Sexualis guiada pelo modelo biomédico ainda persiste nas subjetividades dos
profissionais a cerca de sua visão sobre a saúde da população LGBT.
Quanto ao impacto dessa percepção biomédica da diversidade sobre o
reconhecimento das demandas, ficou evidente que quando pessoas lésbicas, gays,
bissexuais, travestis e transexuais procuram atenção nas unidades básicas de saúde são
vistas quase que exclusivamente pela perspectiva das patologias relacionadas à sua
sexualidade. A resposta a demanda do principal problema de saúde que acomete esta
população, foi massiva e categórica: IST/AIDS, sendo que alguns profissionais afirmaram
que só é possível compreender esta população através do enfoque nas doenças sexualmente
transmissíveis, mesmo que algum interdito também disciplinar ao discurso possa ter
operado para que não tenham surgido discursos afirmando que a própria diversidade sexual
seja uma doença.
Outra evidência do poder das Scientias Sexualis no subjetivo dos atores
entrevistados evidencia-se pela quase invariável definição desta população como "grupo de
risco", em grande parte pela associação da condição LGBT com outros comportamentos
moralmente condenáveis, tais como alcoolismo, dependências químicas e promiscuidade
sexual. No mesmo sentido, encontra-se a tendência à generalização da vinculação da
condição LGBT com transtornos mentais. Como já discutido, ainda que existam estudos
demonstrando que os sofrimentos decorrentes da discriminação contribuem para esse tipo
de transtornos na população LGBT, a transposição de dados de natureza coletiva para uma

131
relação intersubjetiva em torno do cuidado, constitui um processo de estereotipagem típico
da estigmatização.
Com Goffman e Parker, pudemos compreender também como o foco nas doenças
transmissíveis, nos transtornos mentais, nos comportamentos "condenáveis", recai
justamente nos atributos depreciativos desta população, como marcas de suas "identidades
sociais deterioradas", noções que inviabilizam o olhar sobre um ser humano integral com
suas características biopsicossociais, suas queixas, sua humanidade e suas subjetividades.
Ainda sobre a compreensão das demandas, alguns conteúdos categorizados
chamaram especialmente a atenção. Entre eles, destacamos as propostas de
desenvolvimento de locais próprios para atender a população LGBT, mas não de forma
relacionada a alguma necessidade específica, como é o caso dos ambulatórios de
transexualidade, e sim como forma de tirar da unidade básica o atendimento a essa
população. Na mesma linha encontra-se a eleição dos Centros de DST/AIDS como lugar
ideal para o cuidado a esses pacientes.
Outro efeito detectado sobre a compreensão das demandas foram as inferências
que demonstraram que muitos profissionais põem sobre os pacientes a responsabilidade
pela baixa procura às UBS, tomando as situações de ocultação da condição, medo e
vergonha como próprios à condição LGBT e não como conseqüência do sexismo
relacional e institucional. Dados que ratificam a existência do estigma, preconceito e
discriminação, sofridos por esta população nos lugares onde deveria ser preconizado o
atendimento acolhedor, equânime, integral e humanizado.
Merece também destaque na compreensão das demandas, o baixo registro da
orientação sexual nos prontuários de atendimento, e mesmo na condução das consultas,
relatados por alguns profissionais, que referiram grande dificuldade em abordar a
sexualidade do paciente. Isso nos leva a refletir com Foucault sobre o paradoxo do "fazer
falar" versus a interdição da fala. Ou seja, quando delimitado por um ambiente próprio à
Scientia Sexualis, os profissionais caracterizam morbidades, identificam transtornos,
relacionam comportamentos a riscos, entretanto, quando estabelecido propriamente uma
relação interpessoal, estabelece-se uma espécie de tabu que interdita que silencia e os
próprios profissionais reconhecem as origens religiosas e morais dessa interdição. A
dificuldade dos profissionais em abordar a orientação sexual dos usuários demonstrou que
o tabu de falar de sexualidade ainda em nossos tempos e outras formações subjetivas que
abrange preconceito e religiosidade, obstaculiza o entendimento do profissional quanto à

132
orientação sexual e identidade de gênero como conceitos incorporados na análise da
determinação social da saúde.
No entanto, encontramos vozes dissonantes nestes discursos, classificada aqui em
categoria singular, onde é reconhecido o quanto é limitante e prejudicial ao atendimento
integral a estas pessoas focar a atenção a sua saúde apenas nas IST/AIDS, reconhecendo
que as razões dos possíveis transtornos emocionais são de natureza multifatorial, que
envolve violência, preconceito, rejeição familiar, homofobia internalizada, e que a baixa
procura desta população aos postos de saúde é de responsabilidade da própria estrutura
organizacional dos espaços de saúde influenciado pelo biopoder, pela heteronormatividade
e pela homofobia institucionalizada. Isso nos dá esperanças de que seja possível encontrar
também nas unidades de saúde, profissionais que se encontram mais sensibilizados e
informados sobre a questão, o que pode vir a transformá-los em multiplicadores de
processos formadores.
Finalmente, em relação ao terceiro objetivo específico definido, buscávamos
compreender a percepção dos profissionais quanto à sua formação e preparo para o
atendimento à população LGBT, e consequentemente o efeito das diretrizes da
PNSIPLGBT nas práticas cotidianas de atenção. O resultado apresentado é bem
desanimador, revelando diversas "ausências" de capacitações, de formação acadêmica e de
entendimento das especificidades das demandas. O desconhecimento da política pela quase
totalidade dos profissionais entrevistados revela-se também como um diagnóstico da baixa
implementação na ponta do sistema das ações previstas na política, valendo ressaltar que a
coleta de dados foi realizada entre 2014 e 2016, ou seja, entre 3 e 5 anos após sua
publicação.
Apesar de uma visão maior sobre o Estado da Arte da implantação da política no
Brasil, só será possível com a conclusão do estudo multicêntrico maior ao qual a presente
tese está vinculada, foi possível notar que nas unidades dos municípios e regiões aqui
estudados não há qualquer ação específica, nem qualquer tipo de capacitação profissional.
A quase totalidade dos profissionais entrevistados desconhecia a política e jamais
receberam qualquer tipo de formação específica.
O presente estudo apresenta alguns limites que merecem menção. Primeiro, pelo
fato de que foi realizado em poucas cidades de apenas duas regiões do país, e será
necessário ampliá-lo a um número maior de cidades e regiões, para que se possa ter um
panorama mais claro sobre como os aspectos levantados neste estudo variam nos diversos

133
contextos e no SUS como um todo. Segundo, porque estando o estudo vinculado a uma
pesquisa multicêntrica direcionada a investigar o acesso e qualidade dos serviços de saúde
a população LGBT no SUS, o roteiro de entrevista semi-estruturada precisava responder
também outras demandas da pesquisa, o que não tornou possível operacionalizar o
aprofundamento de alguns aspectos.
Entretanto, acredito que os resultados aqui obtidos, demonstrando o quanto o
estigma persiste e opera “encarnados” nas subjetividades dos indivíduos conforme
contextos e vivencias socio-históricas diversas, além de responderem aos meus objetivos,
poderão contribuir no planejamento de estratégias de formação profissional. Dessa forma,
como perspectiva futura, será preciso, além de avançar no diagnóstico do problema do
acesso e da qualidade de atenção à saúde da população LGBT, investir urgentemente em
uma formação profissional que ultrapasse a dimensão puramente normativa e cognitiva do
conhecimento de direitos ou de diretrizes de políticas. A meu ver essas abordagens são
incapazes de produzir a transformação dos aspectos encarnados nas subjetividades os
quais são as responsáveis pelas condutas discriminatórias, conscientes ou não.
Retomo então ao principio dessa tese, quando em minha apresentação descrevi o
processo motivacional que levou ao recorte do meu objeto, reafirmando o sentido de
alteridade que permeava minhas ações tanto na enfermagem, como nas artes cênicas. Esse
olhar do outro, na completude de sua dignidade. E, assim deposito aqui minha crença na
arte em geral e mais especificamente no teatro como ferramentas revolucionárias de
sensibilização das pessoas no respeito à diversidade, considerando-os como instrumentos
pedagógicos na perspectiva da arte-educação e, portanto, como base para a formação
continuada de profissionais.
Sendo corpo e a voz ferramentas indispensáveis ao fazer teatral, é preciso que essas
estratégias tomem o corpo como terreno fértil, criativo, território de liberdade, mas o
reconheça como instrumento de controle sócio-politico imposto pelo biopoder, sendo
importante mobiliza-lo permitindo uma abertura impar para alteridade, para conhecer-se e
reconhercer-se no outro, no eu e na vida... e assim produzir processos formativos que
mobilizem estigmas, preconceitos e padrões normativos responsáveis pela incompreensão
da legitimidade de todas as formas de viver e amar no universo humano.
Ao tempo em que a presente tese estava sendo finalizado, o Brasil enfrentava uma
das maiores ameaças à sua jovem democracia e aos direitos conquistados com tanto suor,
sangue e lágrimas, através dos últimos 30 anos. A possibilidade de vitória de uma

134
candidatura com perfil claramente fascista, calcada no obscurantismo, na violência e na
incitação ao ódio contra o diferente, aponta uma perspectiva sombria, onde o próprio SUS
torna-se alvo de extermínio, e a homofobia poderá vir a ser legitimada, normativamente,
pelo próprio Estado.
Mas estou certa, de que após algum tempo, quando eu reler a conclusão desse
trabalho, tudo não terá passado de uma ameaça que serviu para nos alertar. Alertar esta
tribo humana, que sabe enxergar beleza na diversidade, que é capaz de amar na diferença, e
que põe seus esforços na promoção da igualdade de direitos e na equidade, o quanto é
imperioso que iniciemos uma nova experiência de formação profissional e de educação
popular. Assim será! Oxalá! Epa Babá!

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148
ANEXOS
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
Você está sendo convidado(a) a participar da pesquisa intitulada: Análise do
acesso e da qualidade da atenção Integral à saúde da população LGBT no SUS, a ser
realizada pelo Núcleo de Estudos em Saúde Pública/NESP/CEAM/UnB, em rede de
parceiros com a FIOCRUZ/PE, as Universidades Federais da Paraíba, Piauí, Uberlândia,
Universidade de São Paulo, Universidades Estaduais de Maringá e do Rio de Janeiro,
financiada pelo Departamento de Apoio à Gestão Participativa (DAGEP) da Secretaria de
Gestão estratégica e Participativa (SGEP) do Ministério da Saúde (MS).
O objetivo da pesquisa é analisar o acesso e a qualidade da atenção integral à
saúde da população LGBT no Sistema Único de Saúde (SUS).
Você receberá todos os esclarecimentos necessários antes e no decorrer deste
procedimento e lhe asseguramos que seu nome não aparecerá sendo mantido o mais
rigoroso sigilo através da omissão total de quaisquer informações que permitam identificá-
lo(a).
A sua participação será através de uma entrevista semiestruturada que será
gravada e posteriormente transcrita. O procedimento tem um tempo estimado para sua
realização previsto em 30 minutos.
Informamos que você pode se recusar a responder (ou participar de qualquer
procedimento) qualquer questão que lhe traga constrangimento, podendo desistir em
qualquer momento, sem nenhum prejuízo para você. Sua participação é voluntária, isto é,
não há pagamento por sua colaboração.
Os resultados da pesquisa serão divulgados no Ministério da Saúde (MS) e na
Universidade de Brasília (UnB) e demais instituições parceiras, podendo ser publicados
posteriormente. Os dados e materiais utilizados ficarão sobre a guarda da pesquisadora
responsável.
Se você tiver qualquer dúvida em relação a esta pesquisa, por favor entrar em
contato com o NESP/UnB em horário comercial, no período de 8:00 às 12:00 e de 14:00 às
18:00, ou ainda com a Profa. Dra. Maria Fátima de Sousa, na Universidade de Brasília – no
Núcleo de Estudos em Saúde Pública – NESP/UnB, pelo telefone (61) 3340-6863, no
horário das 8 às 12 e das 14 às 18h.

________________________________
_______________________________
Nome do participante / assinatura Nome pesquisador
/ assinatura

____________, ___ de __________de _________


APÊNDICES
ANÁLISE DO ACESSO E DA QUALIDADE DA ATENÇÃO INTEGRAL À
SAÚDE DA POPULAÇÃ O LGBT NO SUS
ESTAÇÃO MINAS GERAIS

ENTREVISTAS INDIVIDUAIS SEMIESTRUTURADAS

DADOS DO(A) ENTREVISTADO(A):


Idade:
Função/Cargo:
Há quanto tempo exerce essa função na Unidade?
Já exerceu essa atividade em outra UBSF?
Em caso positivo, por quanto tempo?
Tempo de Formado:
Instituição de Formação (Graduação):
Possui Residência ou Especialização?
Em caso positivo, em que área?

Data: Hora início: Hora encerramento:


Nome do/a Entrevistador(a):

Inicialmente o pesquisador deverá contar um pouco sobre a pesquisa e de seus


objetivos. E deverá falar do processo de escolha desta unidade básica de saúde.

PERGUNTAS:

Bloco A: Papel da Unidade de Saúde da Família na rede de atenção à saúde no seu


município

1A. Em sua opinião, qual o papel da USF na rede de atenção à saúde do seu município?
2A.A nossa pesquisa trabalha com dois conceitos: acesso e qualidade. Em sua opinião,
o que seria o acesso? E a qualidade?
3A. Você acredita que existam grupos populacionais da área de abrangência da USF que
você atua que tenham dificuldade para acesso a esse serviço de saúde?
3A.1. Se sim: Quais são esses grupos e quais dificuldades eles encontram?
3A.2. Se não: Por quê?
Bloco B: A Unidade de Saúde da Família e o atendimento à população LGBT
(acesso)

1B. Existe na área de abrangência da USF em que você atua, algum(a) paciente da
população LGBT?
2B. Como você soube que ele(a) era LGBT? [Interrogar sucintamente sobre histórias
da(s) experiência(as) com outros profissionais (da equipe ou não)].
3B. Em algum momento de sua atuação nessa USF, você atendeu a alguém da
população LGBT?

Se sim:
3B.1. Me conte como foram(oi) esse(s) atendimento(s).
3B.2. Você sentiu que estava preparado(a) para esse atendimento?
3B.3. Quais foram as facilidades encontradas por você ao conduzir esse atendimento?
3B.4. Quais foram as dificuldades encontradas por você ao conduzir esse atendimento?
3B.5. Após o atendimento deste (a) houve vinculação desse (a) paciente à USF? Se sim,
como você percebeu que esse vínculo foi estabelecido?
3B.6 Quais são as principais demandas de saúde da população LGBT em sua equipe?
Se não:
3B.7 Por que você acha que nenhum paciente da população LGBT procurou a USF?
3B.8 Você considera que esteja preparado para atender a pacientes dessa população?
Por quê?

4B. Quais facilidades você acredita que encontraria ao conduzir esse(s) atendimento(s)?
5B. Quais dificuldades você acredita que encontraria ao conduzir esse(s)
atendimento(s)?
6B. Em sua opinião, quais as condições de saúde da população de Lésbicas, Gays,
Bissexuais, Travestis e Transexuais atualmente?
7B. Em sua opinião, quais doenças e/ou agravos mais acometem essa população
atualmente? Por quê?
8B. Como estão organizadas as ações e serviços de saúde dirigidos à população LGBT
na rede de atenção à saúde na cidade do Recife?
9B. Se o(a) entrevistado(a) considerar que não há as ações e serviços de saúde dirigidos
à população LGBT, interrogar como ele(a) acredita que esses serviços de saúde devem
ser dirigidos na USF e na rede de atenção à saúde do município.
10B. O que você acredita que deva ser de responsabilidade da USF no cuidado em
saúde a essa população?
11B. Como você percebe a relação dos(as) ACS de sua equipe com a população LGBT?
12B. Os Agentes Comunitários de Saúde trazem para a Unidade Básica demandas
vindas da população LGBT?
12B.1. Se sim, quais?
12B.2. Se não, por que você acredita que eles não trazem essas demandas?
13B. Em sua opinião, os(as) ACS estão preparados(as) para identificar/atender às
demandas dessa população? Por quê?
14B. Em sua opinião, os(as) demais membros da equipe estão preparados(as) para
atender às demandas dessa população? Por quê?

Bloco C: A organização e qualidade da atenção à saúde da população LGBT


(qualidade)
[Agora vamos avaliar a forma e a qualidade das ações e serviços ofertados à população
LGBT pelas equipes Saúde da Família.]
1C. Como você avalia a forma (organização) das ações e serviços ofertados à
população LGBT na sua USF?
2C. Como você avalia a qualidade das ações e serviços ofertados à população LGBT na
sua USF?
3C. Em sua opinião o que pode ser feito para melhorar a forma (organização) e a
qualidade das ações e serviços ofertados à população LGBT na sua USF?
4C. Como você avalia a forma (organização) das ações e serviços ofertados à
população LGBT pelo sistema municipal de saúde?
5C. Como você avalia a qualidade das ações e serviços ofertados à população LGBT
pelo sistema municipal de saúde?
6C. Em sua opinião o que pode ser feito para melhorar a forma (organização) e a
qualidade das ações e serviços ofertados à população LGBT no sistema de saúde
municipal de saúde?
7C. Você identifica, na rede de saúde de seu município, outros pontos de atenção à
saúde da população LGBT?
7C.1. Se sim, quais?
7C.2 Como você observa que tem sido a relação entre as USF com os demais pontos da
rede de atenção integral à saúde da população LGBT?
7C.3 Se não, quais pontos você acha que deveriam existir para prestar atenção em saúde
a essa população?
8C. Em sua opinião, o cuidado em saúde integral a essa população deva ser prestado na
USF ou em um ambulatório específico para atender às suas demandas? Por quê?

Bloco D: A política de saúde integral LGBT


1D. Você conhece a Política Nacional de Saúde Integral para a População LGBT?
[Caso não, pule para questão 6D].
2D. Se conhece, qual a sua opinião a respeito dela?
3D. Você acredita que essa política atende às demandas dessa população? Por quê?
4D. Como você avalia a institucionalização da Política Nacional de Atenção Integral à
Saúde da população LGBT em sua USF?

5D. Como avalia a institucionalização da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde


da população LGBT em seu município?

6D. Na sua opinião deve existir uma política específica de saúde integral para a
população LGBT?
7D. Em algum momento de sua formação você recebeu capacitação/informação sobre a
atenção em saúde para a população LGBT?

7D. Se sim, conte-me sobre essa experiência.

8D. Você participou de alguma capacitação sobre saúde da população LGBT pela
Secretaria Municipal de Saúde? Quando?

Bloco E: Outros

1E. Existe algo relacionado ao tema dessa pesquisa/entrevista que eu não tenha
perguntado e que você gostaria de falar a respeito?

2E. Como foi para você, participar desta entrevista?

3E. Alguma sugestão para melhorar a entrevista?


TABELA DE CATEGORIZAÇÃO

Categoria Codificação do Sujeito / Unidade de Registro

E1 - tem o núcleo de DST/AIDS que trabalha isso de maneira geral. Igual estou te
falando, a gente não tem a secretaria específica para essa população, porque eu
também acho que não justifica, eu acho que são todos homens e mulheres
independente, assim então eu acho que a prioridade é DST e AIDS...

E2 - Agora os jovens, né, que são… nesse grupo ai que você tá falando, muitas vezes
eles procuram a vigilância epidemiológica por alguma questão sexual mesmo, com
algum tipo de doença que eles adquiriram, então é uma porta que é mais aberta é
essa pra eles.

E2 - ...a parte física eu acredito que tá saudável, agora pode ser que a parte
psicológica tenha que ser trabalhada algumas vezes, porque as vezes são pessoas
que sofrem vários tipos de discriminação, de violência né, então essa parte a gente
não trabalha com eles que é a parte da saúde mental deles.

E3 - ...como é que trataríamos isso, porque se uma pessoa chega ao ponto de querer
marcar uma prevenção, então ela realmente já está com o psicológico dela um
problema né então vai ser eu aqui dentro que darei conta então dessa referencia pra
essa população que não tem?

E4 - então a gente se coloca na posição de que eu tô aberto, se me procurar, eu


atendo, se não me procurar... teve um rapaz mesmo, que ele é travesti e um dia tava
na reunião de hipertenso, ele levanta a voz, ai foi que eu falei, vamos lá fazer o teste
rápido de HIV...

E5 - Na faculdade eu fiz há onze anos atrás não sei se hoje é assim, mas tinha uma
diferença no grupo quando eles falavam de... Doenças sexualmente transmissíveis
colocavam gays né... Como assim homossexuais como grupos de risco...

E7- Mesmo que em pequena a quantidade, mas


tem (demanda da pop LGBT), às vezes nós criamos alguns vínculos, dependendo do
tipo de atendimento né, quando a gente oferece teste rápido HIV e Sífilis

E7 - mas no meio da abordagem, por exemplo, pra fazer


o teste de HIV e Sífilis, a gente faz uma abordagem da uma conversada e numa
conversa e outra, a gente identifica que a pessoa esta inserida nesse grupo...
E7 - ...facilidades (no atendimento a pop LGBT) porque assim
a gente sempre tem recebido atualizações né, a lista de abordagem sindrômica, com
o tratar da questão com psicólogo... já teve muitas reuniões com os psicólogos do
"CAAV" né, geralmente nossas atividades são mais voltados para doenças
sexualmente transmissíveis, é o que a gente consegue abranger mais esse grupo, mas
que uma hipertensão, com diabetes que é pouco frequentado por esse grupo, só se
tem alguém que a gente não sabe, mas assim, quando a gente trata mais em questão
sexual é que a gente consegue captar um pouco mais dessas pessoas. A gente vê mais
Patologização da esta população nos grupos ou em atividades especificas pra doenças sexualmente
Condição transmissíveis...

E7 - Os principais agravos que tem são as doenças sexualmente transmissíveis


mesmo né, toda vez que eu atendia era focado a esse assunto, eles se preocupam
muito com essa questão e é o que eles mais procuram também né, prevenção, a
camisinha, é o que eles mais procuram aqui na unidade ... A principal demanda é
essa, é a sexual, atividade sexual, educação sexual, é o que eles mais procuram né...

E7 - A gente tem assim... organizados não, a gente tem... chega alguém (LGBT) , a
gente vê as demandas, vê o que é CAPS, o que é CRASE, o que é CAAIDS né, que é
o antigo DST AIDS né, onde se concentra toda essa questão de sexualidade, de HIV,
de tratamento, tudo é pelo CAAIDS, e a gente manda pra lá...

E7 - ...nunca foi discutido entre os enfermeiros, os profissionais do município à


respeito disso especificamente, a gente discute isso quando a gente vai discutir sobre
hepatite, sobre Sífilis, sobre HIV, mas não tem uma reunião especifica pra falar
disso, pra falar desse publico alvo entendeu?!

E9 - Assim, não tem nada diferente do atendimento que a gente faz com a população
em geral né... uma busca na vigilância epidemiológica, alguma queixa de... que seja
relacionada a DST, você faz o aconselhamento normalmente...

E9 - Eu acho que a dificuldade é o paciente mesmo, a pessoa se declarar,né? Por


exemplo, os atendimentos de DST, a gente percebe que a pessoa fica um pouco,
é...,travada assim, na hora de falar, né?

E9 - Eu acho que deve ter alguma política né, voltada pra eles, da questão da
integralidade pra não tá focando também só na questão da DST, porque se, é... a
gente acaba associando, né?

E9 - Olha, pelas vezes que eu já atendi a maior parte da demanda é de atendimentos


da vigilância epidemiológica, relacionadas a doenças sexualmente transmissíveis...
Eu acho que eles estão mais expostos, são mais vulneráveis as doenças sexualmente
transmissíveis...
E10 – (sobre atendimento a pop LGBT) Ah, eu acho que sim é muito tranquilo,
converso com eles de boa... Eu falo que o DST AIDS em si dá muita coisa pra
gente... Você tem que aprender a lidar com você mesmo, com seus conceitos com
suas convicções e mudar uma série de questões né... Então eu nunca fui de
preconceito... mas o fato de trabalhar muito tempo com isso , com DST AIDS...

E10 - Demandas de saúde, como eu atendo uma área bem especifica então assim o
que eu vejo muito neles é a questão da DST... Mas o que eu vejo muito é a questão
do DST, a questão da prevenção, eles são muito descuidados, não usa preservativo,
tem mais de um parceiro né, e nem é porque são profissionais do sexo não...

E10 - Eu faço pronto socorro, então talvez seja mais importante...é quem vai morrer
muito, tem muito homossexual. Por que se expõe mais a risco...

E11 - Eu acredito que seria a questão das doenças sexualmente transmissíveis seria
um ponto para tá reforçando também, talvez entraria a questão também de álcool e
drogas que eu acho que poderia também acredito que tá relacionado dentro desse
grupo ai...

E11 - bom, doença sexualmente transmissíveis porque émuitas vezes em algumas


situações, alguns deles não utilizam a pratica do sexo seguro, com o uso de
preservativo, ai já entraria uma exposição maior as doenças sexualmente
transmissíveis, a questão de álcool e drogas geralmente assim, que a gente percebe,
que nessa população o uso de álcool e de outras drogas também é um pouco maior...

E11 - geralmente é isso que a gente colocou a questão da saúde sexual e reprodutiva
no caso dessa população, que o básico é isso mesmo, né... mas o principal mesmo é
saúde sexual.

E13 – as doenças que acometem o publico LGBT..são as DSTs, a gente tem...HPV, e


a gente tem sífilis e o HIV, então assim, claro que tem as outras DSTs geral, mas
para o grupo LGBT são estas...

E 14 - Eles procuram não só da minha área... Em relação aos testes rápidos de HIV e
sífilis ou mesmo teste de sangue... O que a gente vê é... As vezes é mais por conta da
parte sexual, tem a preocupação com as doenças sexualmente transmissíveis, então,
as vezes, procuram nesse sentido... quando há procura na livre demanda é mais nessa
preocupação é mais nessa preocupação de ter esse controle de uma doença
infectocontagiosa.

E14 - A gente vincula muito, como eu falei, com a questão de doenças sexualmente
transmissíveis ou infectocontagiosas que estão mais ligadas com a vigilância
epidemiológica...

E14 - O que eu vejo direcionado é dessa parte sexual, prevenção de doença,


orientação, fornecimento de preservativo. Então, talvez, peque por isso, por ter só
essa visão dessa questão e não como um todo.
E15 - ...também a questão dos DSTs que é presente, não é uma prevalência tão
diferente da população geral, mas a gente acredita que tem uma prevalência maior de
DST

E17 - eu acho que, pra eles eu acredito que eles estejam bem, porque não procuram a
unidade. Procuram aqui pra fazer o teste rápido, é a demanda que a gente tem pra
bater... As doenças ou agravos mais acometem a essa população atualmente... IST

E17 - talvez não saiba bem como abordar essa população visto que... a maior procura
é voltada pra parte de DST, teste rápido pra HIV e demandas em cima de IST. Difícil
mente procura aqui pra uma avaliação de rotina, fazer uma consulta mesmo.

E18 - Eu acho que as DST, as doenças sexualmente transmissíveis né... Por questão
mesmo da falta de prevenção, acho que eles são mais vulneráveis apesar de eles
terem o acesso os meios de evitar como a camisinha né, os métodos de barreira. Não
sei se por conta de drogas ou alguma coisa assim que tire um pouco a questão do
bom senso na hora de ter a relação, eu acho que eles ainda são mais acometidos por
isso...

E19 - olha, eu acho que as hepatites, ne? hepatite, também o HIV ne, pode ta
presente ne, que desde quando você não se protege.. inclusive sifilis tem aumentado,
ne, não sei nessa populacao, mas como sifilis tem aumentado de forma geral, pode
ser que também nessa população...então mais as questões das sorologias, ne, das
hepatites, ne, do HIV, da, é, da sifilis, HIV, das hepatites, eu acho que simda maneira
geral sao essas demandas... as ISTs...

E20 - Ah sim, da LGBT em si. São poucos os casos que chegam aqui, a maioria
deles vem mais justamente (...) essa questão, alguma doença sexualmente
transmissível, por exemplo, o último que veio aqui se eu não me engano veio com
uma ferida na boca, na minha avaliação eu achei que poderia ser herpes, passei...
entendeu? coisinhas pequenas assim. Nada muito grave. A saúde da população em
geral é ruim, mas a do público LGBT são pontuais... Principais agravos são as DST

E21 - E no caso dos homossexuais, as doenças sexualmente transmissíveis como


HIV né, pela forma do sexo né, acho que tem que ser mais trabalhado nisso, o uso do
preservativo...

M1 - A maioria das vezes eles solicitam muito sorologias. Vem para fazer exames de
rotina e perguntam se no meio disso tem como a gente solicitar sorologias de DST...

M2 - Assim diretamente não, a gente tem muita é... A preocupação com... Das
doenças sexualmente transmissíveis a gente faz acompanhamento...
M2 - Tudo, de precaução de uso de preservativo, não se expor né, não só pelas
doenças sexualmente transmissíveis também pelos riscos né, que eles correm eles ...
O uso de drogas o uso de bebida alcoólica as saídas noturnas né...

M2 - a gente preocupa com o uso de drogas e álcool, do tabaco né, então sempre essa
população tá envolvida também... então a gente tem a preocupação realmente na
doença da pessoa, mas não assim explicitamente nessa parte (LGBT)a gente só vai
ver isso mais eu acredito com os psicólogos né, você vai ver essa parte diferenciada,
mas o médico não, não é uma pessoa como um ser orgânico ...

M3 - porque o serviço é pra todos né, é universal aqui não tem essa questão de “ah
porque é mendigo ou porque é alcoolista ou é usuário de droga ou é... mora numa
situação de alto risco ou é LGBT”

M4 - De demanda é geralmente doenças sexualmente transmissíveis... e consultas


gerais não tem…

M5 - da população, dos homens gays, é tem muito, tem muita infecção sexualmente
transmissível... o homem, homossexual, eu vejo ainda maisinfecção sexualmente
transmissível, tem a relação, a questão é biológica da região anal ser mais
vascularizada eu acho que tem a questão de que como muitas pessoas têm é
dificuldade pra procurar o serviço de saúde eu acho que por preconceito...eu acho
que as vezes ficam com várias infecções la e acabam uma levando a outro e levando
a outra e ai aquele grupo no final das contas todo mundo tem e ai no final das contas
todo mundo tem, é eu acho que tem essa questão, a gente ve homossexuais
com infecção sexualmente transmissível que chega aqui com quadro evolutivo mais
progressivo assim, por quê você esperou tanto pra vir aqui...

M5 - mas populacao trans eu acho que pensando assim né, no geral, quais são as
principais demandas é infecção sexualmente transmissível, reposição hormonal, é, é,
eu acho que essa questão de estarem todas profissionais do sexo...eu acho que a
pessoa pode escolher ser profissional do sexo mas assim é meio uma coisa fadada e
eu sinto que ela não não é ela em sua plenitudenao é ela que escolhe... os homens
gays é muita infeção sexualmente transmissíveltambém tem muita HIV aqui, a gente
tem muito HIV, muita sifilis, muita hepatite, muita coisa, então seria mais ou menos
isso

M7 - a gente solicita exames periódicos pra identificação de DST, HIV, e a gente


discute sobre a importância de vínculos fortes nos relacionamentos, isso protege
muito, então conceito de família é algo que a gente se preocupa e trabalha, sempre,
em qualquer circunstância né, a importância de relacionamentos afetivos que sejam
construtivos, que sejam relacionamentos favoráveis à uma felicidade, a um prazer,
então, relacionamentos que evitam conflitos, confrontos, um relacionamento mais
sólidos, enfim, na perspectiva na construção dos laços familiares fortes, essa é a
minha ideia. (impõe o padrão do relacionamento heteronormativo)
M7 - ...assim posso identificar particularmente de demandas dessa população foram
situações de conflito familiar relacionados… por exemplo, a gente atendeu aqui, o
que lembro 3 mulheres lésbicas elas tiveram conflitos sérios relacionados à
agressividade do relacionamento das parceiras, problemas sérios mesmo. De
violência doméstica mesmo, inclusive mandei elas com risco de suicídio, situação
muito séria, a gente chamou a atenção, pediu ajuda, levou pra psiquiatria e conversou
bastante...prescreveu um anti depressivo, fizemos uma abordagem terapêutica
breve(relaciona a demanda da pop LGBT a violência conjugal)

M7 - Para o masculino as DST’S, pro masculino a prevalência é um pouco mais alta,


coisa de 20 e 26%, olhei os dados esses dias, por volta de 10,5%, população geral
0,4% algo assim, e por incrível que pareça a gente tem a mesma experiência né,
voltam muito pro uretrite, síndrome do corrimento uretral, desconfortos relacionados
à DST’s e HIV, é isso que mais os traz...

M7 - e nas mulheres lésbicas, transtornos mentais, principalmente transtornos


ansiosos e transtorno depressivo também, mais o ansioso do que o depressivo, que
acho que também não seja tão diferente da mulher né, eu brinco que mulher ansiosa
campeonato vicioso...
(machismo= associa ansiedade comportamento natural feminino)

M7 - muitas vezes as pessoas atendem homossexual, foi sexta feira, ele chorou
muito, estava muito sofrido, sofria preconceito no ambiente do trabalho e ele sofria
por ser um cristão religioso, e tava vivendo um conflito em os princípios religiosos e
os princípios que ele adotou...

M7 - agora de modo geral pra principais demandas, tem a ver por exemplo com DST
e HIV, aqui na unidade, especifica, o que tô dizendo especifica...

M8 - mas tem que conhecer neles os fatores de risco para muitas doenças, entende?
Inclusive para o suicídio, que é um fator de risco. Nós devemos ver como um fator
de risco, não como uma doença e temos que fazer atividades especifica para eles. E
devemos fazer coisas para evitar que aconteça mais, a diversão sexual é livre,
democrática, então não temos que parar e estimular tão pouco...

M8 - Eu só fiz um curso para aprender a tratar as doenças das lésbicas, as doenças


em homens homossexuais, a transexualidade e sua especialidade. A transexualidade
é quase uma emergência que o indivíduo tem que acompanhar atentamente o seu
corpo...

M7 - agora de modo geral pra principais demandas, tem a ver, por exemplo, com
DST e HIV ,aqui na unidade, especifica, o que to dizendo especifica...

M8 - Pois se caem em um transtorno emocional ou de conduta, porque não são


aceitos na sociedade, então temos que tomar outro grupos de medidas. Se a sua
sexualidade não é reconhecida, não é aceita, então terão que interferir. Mas não
tenho tido casos de morte.
M8 - Essa população, atualmente é... pode colocar o alcoolismo como uma doença.
O alcoolismo... E tenho associado a depressão... Essas são as duas doenças tenho
acompanhado, a depressão e o alcoolismo. Temos uma paciente que é lésbica e tem
mostrado um comportamento de agressividade com a família, parece igual, é a
aceitação e a agressividade.

M9 - DST logo de cara, DST´s... Os agravos que mais acometem esta população... É
muito com relação à questão de saúde sexual e reprodutiva... eu vejo não outras, O
CEDAP eles recebem muito público da população LGBT...

M9 -Quando a gente tava lá falando de IST´s, sempre IST por que? porque sempre
vai acontecer já que a gente sabe que tem muita, muitas IST que estão relacionadas
às praticas né?

M10 - Bom realmente, esse tipo de pessoa tem que ter uma orientação realmente,
clara, porque pela estatística eles têm mais índice de doenças de transmissões
sexuais...

M10 - A questão de transtorno de personalidade desde criança... muitas pessoas hoje


em dia em situações que não sabem enfrentar, por exemplo algum tipo de problema
ou situação… porque desde criança as famílias são muito disfuncionais. O estresse, a
questão do trabalho influi realmente na educação dos filhos, então, é assim muito
difícil, mas eu acho que influi realmente a parte psicológica em que os pais
realmente tem que ter um acompanhamento com os filhos para evitar depois quando
sejam mais grandes eles tenham problemas de serem muito fechados, não falem, ou
que sejam muito violentos. O meio familiar independente da escola é a primeira
escola das pessoas todos realmente temos que ter isso em conta. E… e é assim, eu
acho que influi muito. Então... É a minha opinião… que eu acho que eles também
podem ter esse tipo de questões, esses tipos de doenças. Eu acho...

M11 -...era um homem, um gay homossexual masculino e daí ele precisava...só que
tinha esse tabu das doenças sexualmente transmissíveis e como eu ia atender ele aqui
então ele preferiu procurar a agente de saúde que ele já conhecia que tinha mais
liberdade praconversar e depois veio...e tinha dificuldade pra falar e em nenhum
momento durante a consulta ele disse sobre a orientação sexual nem nada, nem
detalhes sobre, precisava mesmo de acompanhamento psicológico.

M11 - ai eu fico imaginando e outras situações que ele tivesse algo, porque essa
pessoa ela é cem por cento saudável, sadia, bem esclarecida em outras razões né...a
sexualidade eu acho que ele ainda precisava de um pouquinho de apoio psicológico e
familiar também, mas eu imagino se digamos tivesse um cancro sifilítico, que é
alguma coisa mais notável teria sido mais difícil pra ele procurar ajuda.
M11 - mas a questão psicológica e a saúde mental ai sim a gente pode ver diferença
sim, a população LGBT por ser mais reprimida pelo conservadorismo tende um
pouco mais a depressão a tristeza a esse tipo de coisa né, e daí não tem estatísticas
que eu possa te falar tantos por cento um gráfico sobre isso...

M13 - atendemos com frequência... na sala de DST...os profissionais têm um perfil


vamos dizer uma vocação...então são todos os auxiliares de enfermagem, técnicos de
enfermagem que ficam lá... que devem ter pessoas que não tem perfil né por, por
preconceito, por resistência então geralmente fica lá os que têm mais perfil... a
pessoa tem o preconceito mas consegue agir com profissionalismo né, isso dá pra
observar pontualmente a pessoa atendeu, depois faz um comentário, faz uma queixa,
mas a pessoa não deixou de ter, de ser atendida.

M13 - o assunto sexo é sempre bombástico... tabu... infelizmente a procura aqui é


mais ligada ao serviço da DST, claro tem pessoas de várias idades no grupo de
hipertensão, de tabagismo que sabidamente os mais velhos não são muito abertos
mais alguns mais jovens são, que falam da sua opção sexual mas ainda é na maioria
mais jovens e ligada aos assuntos de DST.

M13 - é a parte que eu tenho dificuldade tudo é bombástico relacionado à sexo então
tudo relacionado à homossexualismo é mais bombástico, mas é os números da saúde
em geral no Brasil mostram esse o jovem homossexual a.... os múltiplos parceiros
levando a doenças venéreas, tem ainda tem. Houve no início da AIDS na década de
80 depois deu uma equilibrada e agora de novo as estatísticas estão falando, da nossa
vivência aqui confirma isso e as situações de ansiedade e depressão, claro eles ligam
emocionalmente estão sempre com mais conflitos né, os seus já naturais do conflito é
mente corpo né e depois ter que enfrentar a resistência social né, então isso está mais
nesse grupo...

M13 - o assunto da tuberculose que é mais dramático ainda tem, acontece isso.
geralmente associação de AIDS com tuberculose que é muito, potencialmente muito
grave, já tínhamos experiências disso aqui.

M14 - Seria as DST's... Quando você subentende que esse tipo de população poderia
vir a ter um comportamento de risco né, então seria HIV seria sífilis né, as doenças
que estaria relacionadas ao comportamento promiscuo... não diria a você de risco
mas o comportamento promiscuo que não seria a mesma coisa ne... Mas é o
comportamento de risco da pessoa que estaria abarcando o risco, você ta entendendo
o que quero dizer? ... tem o comportamento de risco, ter comportamento de risco é
ter vários parceiros sexuais, é não usar preservativo então o paciente vai ter aquelas
doenças ne vinculadas ao comportamento sexual de risco, ne que são as doenças
sexualmente transmissíveis...

M14 - Não no momento não, só aquela coisa que eu te falei que os pacientes
normalmente homossexuais quando chegam aqui na unidade eles na maioria eles
pedem muito exames sorológicos de HIV...
M14 - ...Uma coisa que eu tinha percebido em um comportamento era assim quando
eu via uma paciente assim... eu oferecia muito né, os exames... ai depois eu pensei ,
poxa será que essa associação certa ta fazendo isso? Será que to sendo queimada
referindo coisas daquele paciente? Então eu reduzi mais isso entendeu? De já chegar
e já..ó eu posso solicitar exame de sangue, sorologia eu já colocava assim né,
hemograma, sorologia ai eu vou ta solicitando pro senhor, ai eu falava eu já passava
assim né, era meio direcionada né, pro paciente, mas depois eu falei assim "não,
deixa o paciente né" se ele achar que quer fazer ele vai fazer, porque eu vou ter que
ficar me metendo né?! Ele sabe o que quer, nesse sentido ai. Ai reduzi mais isso, o
paciente chega, vê o que tem, escuta isso é um exame normal, o paciente traz a
demanda e eu oferece, ah tem que fazer sorologia exame de HIV ... e se outras coisas
também? Ai eu falei... eu estou me policiando mais nesse sentido.

M14 - só o comportamento de risco que eu falei né, que da de oferecer sorologia,


essas coisa tá, mais acesso nesse sentido ne, eu perguntava demais inclusive, oferecia
demais ao paciente ne, ai eu falei poxa eu acho que to muito tendenciosa, nao posso
ser assim, então eu deixo a minha demanda pro paciente ne... o grupo LGBT tem
uma demanda de doenças mais características dentro daquele grupo considerando
como fosse considerado como um grupo de risco né..

M16 - Muitos transexuais e travestis muitas vezes vão trabalhar como profissional do
sexo e ai a exposição a doenças sexualmente transmissíveis a violência ela vai ser
ainda maior do que a violência do cotidiano da rua, por exemplo... eu vejo de forma
geral eu diria isso pra você assim as pessoas que estão mais vulneráveis a questões
de saúde mental do que a população em geral...

M16 - o que eu consigo enxergar a priori que poderia ser um problema de saúde mais
comum, seria o que eu te falei seria o sofrimento psíquico por preconceito,
discriminação né que a questão não é da opção não é da orientação, é da ocupação na
verdade né...então se a pessoa independente da orientação tem como ocupação o
trabalho do sexo ela vai esta exposta aos determinados riscos que pessoas de uma
forma geral

M16 - um adolescente que na verdade nunca veio aqui que é um paciente... mas avó
é acompanhada aqui com a gente sempre com atenção, sempre toma remédio sempre
muito triste etc e a situação que existe na verdade o filho dela é usuário de substancia
e não aceita que o neto é homossexual e esse pai não aceita e ai isso gera um conflito
familiar porque esse pai bate no adolescente agride verbalmente rola briga na família
e ai descompensa fica chateada e traz a demanda pra cá...

M17 - ...eles tem até uma condição de saúde boa, agora tem muitos casos de doenças
sexualmente transmissíveis, tem alguns casos também de prostituição que a gente
tem até uma paciente aqui que a gente acompanha, que já tem HIV, sífilis e
tuberculose...Demanda, é mais nessa questão que tem muitos casos de DST mesmo.
Boa parte com andamento por conta de DST's. Dessa população específica né... O de
violência também sexual também tem... porque é uma população que tem maior
risco de contrair DST's né? Tem uns casos de prostituição também, de violência
sexual, uso de drogas né...

E1 - E pra essas pessoas já é muito mais difícil procurar, porque muitos não falam
sobre a sua orientação. Escondem da família, escondem de várias pessoas e às vezes
chega aqui com alguma doença, às até mesmo sexualmente transmissível que é...Ás
vezes é até difícil ela(e) contar para você o que realmente aconteceu para você
procurar tratar o parceiro essas coisas, ou a parceira. Então assim, isso já para ele (a)
é difícil...
E2 -...eles mesmos tem essa dificuldade de se abrir e contar o que realmente está
acontecendo, o que aconteceu, então muitas vezes você tem que ir deduzindo e vai,
então é muito difícil...

E3 - Agora quanto a eles, do lado de lá, eu vejo um preconceito muito maior por
eles... com mais preconceito... mas eu vejo muito preconceito velado nelas, elas com
preconceito. Elas acham que todo mundo tem preconceito com elas...

Responsabilização da
população LGBT pela E3 - E é um pouco complicado porque elas são muito tímidas, apesar da gente tentar,
baixa procura as UBS/ eles são, alguns são muito difíceis acesso, elas não querem fazer um planejamento
Inferiorização dos familiar, elas não querem fazer um preventivo, né ? Eu achei por mais que eu
estigmatizados tentasse e tal, convidasse, abordar, elas ainda se sentem tímidas...

E4 - eu fiz em duas que a mulheres de quarenta e tantos anos que me falaram que
nunca foram ao ginecologista, que nunca fizeram um preventivo, é como se elas se
recusassem a tocar neste assunto, a lidar com isso, com esse problema de toda
mulher...que na mulher heterossexual ela não tem problema de falar...

E4 - eu acho que sim, eu acho (as condições de saúde) que é fragilizada... desses
obstáculos ou que elas mesmos se impõe ou que talvez encontraram...

E7- tem usuário que não vem em


consulta clinica, talvez ele tenha vergonha ainda né, de como a população aqui
dentro vai reagir, os outros usuários... então não é frequente a gente ver
pessoas desse grupo dentro da unidade no dia a dia, entendeu?!

E9 - Eu acho que a dificuldade é o paciente mesmo, a pessoa se declarar, né? Por


exemplo, os atendimentos de DST... a gente percebe que a pessoa fica um pouco, é...
travada assim, na hora de falar, né?

E18 - Porque assim, é uma população também que é um pouco mais retraída, vamos
dizer assim. Se eles não querem compartilhar essa história com ninguém... :...por
isso que muitos também são mais retraídos e não conversam, preferem não conversar
com a gente diretamente...

M1 - mas eu acho que o atrativo para esse grupo da população, não tem, então acho
que eles ficam um pouco mais recuados em chegar, né.

M2 - e ai a gente tenta orientar, educar e no momento que a gente fala sério né ...a
gente tem que ter muito tempo pra conversar porque eu noto são pessoas mais
fechadas né... por medo né, de ser discriminada eu imagino que por isso

M3 - não tenho muitos pacientes LGBT não, não sei se é porque o paciente às vezes
fica envergonhado de procurar o serviço de saúde...

M4 - eu vejo aqui, por exemplo, na unidade nova, quando tem, principalmente o gay,
com relação ao pessoal que fica aguardando, às vezes fica um pouco constrangido
M7 - Eu acho que sim, tem a ver com isso e acho que a população homossexual tem
receio de se expor, tem vergonha, tem medo de sofrer por preconceito, vergonha
digo, dessa… é triste né, preconceito é muito doloroso

M11 - ele teve vergonha e vir no começo porque ele precisava essa pessoa né, que
era um homem, um gay homossexual masculino e daí ele precisava só que tinha esse
tabu das doenças sexualmente transmissíveis

M12 - Não. Porque se eu for olhar todos os agentes comunitários daqui eu acredito
que muitos ainda tem bastante preconceito, de não saber lidar , e não só o
preconceito, mas não saber como se portar. Por exemplo: às vezes tem até o respeito
pelo paciente, mas não consegue entender o que é um transexual, o que é um travesti,
o que é o gay, o que é a lésbica, o que é bissexual. Não conseguem fazer essa
diferença, não consegue ter esse entendimento. Mas respeita. Entendeu? Por
exemplo, se eu fosse falar das minhas agentes comunitárias seria esse. Elas
conseguem ter o respeito que o paciente merece, respeitando a diferença, mas sem
entender exatamente aquele paciente.

M12 - Eu acho que ainda existe preconceito, muito, nos atendimentos. Falta
entendimento dessas questões. A gente às vezes não sabe o que explorar em relação
à sexualidade. Por exemplo, eu mesmo não sei quando que eu vou me atentar à
questão da sexualidade do paciente, ou se é necessário que eu realmente durante a
consulta questione sobre a sexualidade dele. Entendeu?!

M15 - eles têm atendimento, os que chegam aqui têm um atendimento, mas assim
dificilmente eles abordam questões de sexualidade... na verdade, as pessoas já
chegam com a carapaça, com medo do preconceito e sempre direciona pra uma
queixa específica... , assim pro homem já é difícil procurar o serviço médico,
homossexual masculino pior ainda
M17 - pacientes que muitas vezes tem vergonha, que não gostam... por achar que vá
haver algum tipo de preconceito né?... , que eles sabem que existe preconceito né,
inclusive da população, e deles mesmos né, de terem vergonha de se assumir muitas
vezes.

M18 - E eles têm essa orientação de não ter muita facilidade de vir... Eu não sei se
é... Mas é uma rejeição deles mesmos, e não sei bem o que...

M18 - É... o que eu noto às vezes, que esse tipo de população quando se sente é...
estigmatizada reage com agressividade, entendeu? Então, talvez isso... não sei se
todos tem preparo para nesse momento da agressividade saber se controlar, né, e agir
de uma maneira amadurecida. Tem pessoas que também reagem àquela
agressividade, isso também afasta aquele paciente do posto.

E16 - Claro, a gente precisa reparar o que a gente tem feito cruel ao longo de todos
esses anos... Massacrando essa população, marginalizando ela dos guetos... E não lhe
dando espaço, porque essas pessoas elas podem, eu faço até a piada do estigma do
travesti, travesti só serve para ser prostituta ou cabeleireira né?... ser profissional do
sexo, mas se você for pensar por outro lado, o que a pessoa me disse né, é tão
fechado o preconceito é tão grande, que o único meio de trabalho, o único meio de
fazer alguma coisa é nesse domínio né... Único meio de sociabilidade, único lugar
que você é aceita, o lugar onde você tem um valor, por mais que esse valor seja
quantificado por dinheiro né, essa questão bem relação corpo e tudo, mas é o lugar
onde é valorizada... Né...é até paradoxal você pensar que a rua é acolhedora...Por
mais violento, é pra elas o lugar mais seguro.
Vulnerabilidade,
exclusão e violência a
população LGBT
assumidas pelo
profissional de saúde E21 - Esta desassistida (pop LGBT) pela saúde falta de estratégias para chegar nessa
população, que eu falei tem estratégia para a população de rua, estratégia para as
profissionais de sexo, eu acho que investimos pouco em estratégias pra esta
população... a gente acolhe muito bem, a gente dá acesso e qualidade, mas está
carente de estratégias pra trazer mais essa população...

E21 - Pelo pouco que já atendi aqui...a gente não tem muitos pacientes né, é uma
população que tem dificuldade de acessar unidade, mas o pouco que a gente
conseguiu né chegar, alcançar, atender, percebe a fala de alguns a dificuldade de
acesso ao serviço por preconceito...

E16 – Uma mulher trans, ela sempre vai ser...vai sofrer os olhares, né, um homem
trans sempre vai sofrer os olhares né... É tão difícil falar isso sabia, porque falar isso
é cair no estigma das doenças sexualmente transmissíveis... Ela chegou na recepção,
né, identidade de gênero feminino, cabelão, corpão, aquela coisa... as unidade de
saúde o mais chato de tudo isso é que caí no estigma é que Andressa estava vindo
fazer um tratamento pra sífilis...
E 11 - que tenha mais condições teoricamente mais favoráveis ou que as vezes mais
procura o serviço, seria os gays, os homossexuais e as lésbicas, eu acho que teria
uma condição pouco menos satisfatória de saúde da população de travestis, que eu
acho que tem uma dificuldade maior de tá acesso ao serviço, procurar atendimento,
por conta do estigma, por conta de vários outros fatores, eu acho que nesse ponto aí
as vezes acaba dificultando um pouquinho e a população isso acaba refletindo na
saúde deles

E21 - foi atendido pela médica que verbalizou essa vontade de fazer preventivo e que
teve dificuldade em algumas unidades pelo preconceito (risadinha) foi maltratado
algumas vezes

E13 - ...a responsabilidade está na capacitação, no acolhimento desse público a gente


vai vencendo barreiras e preconceitos, como eu te falei isso muitas vezes é intrínseco
até para o profissional né, então a gente, o que eu observei quando eu vim pra cá que
ouvi dos colegas ‘’eu não consigo trabalhar com esse público, não consigo trabalhar
nessa área’’,
entendeu?

E7 - que na verdade estamos abarrotados com outras demandas que não é desculpa,
mas a gente está abarrotado com hipertensos, diabetes, gestantes, criança, cartão de
vacina, coisa, que a gente acaba se esquecendo um pouquinho desses grupos que
também deveriam ser prioritários...

E7 - muito bom, apesar de acreditar de... se a gente for olhar os recursos do


município, eles colocarem profissional pra fazer só isso, é quase impossível,
porque a gente tem tanta coisa tão simples que a gente não conseguiu alcançar

E20 - porque ele tinha sido recentemente espancado, no local de trabalho dele e ele
estava com algumas lesões no corpo, ele veio atrás de uma pomada para passar,
pra cicatrizar, mas assim, perguntei a ele o que foi, o que tinha sido aquilo, ele me
disse que tinha sido assaltado, só que ai depois eu fiquei sabendo pelo agente
comunitário que na verdade ele tinha sido vítima de um preconceito mesmo. Um
monte de rapaz pegou ele, por conta da orientação dele, tinha espancado ele.
E16 -... a gente já teve vários casos aqui, que eu posso citar um, que é emblemático,
de mulher trans que veio né... e a gente tem aqui na unidade várias pessoas com
várias, diferenças religiosas... Ele, Ela se apresentou com nome social, mas ela
estava lógico com documento de identidade com nome de nascença, com nome
masculino e uma das técnicas de enfermagem que inclusive não trabalha mais aqui,
fazia questão de chamar lá pelo nome de homem, entendeu?... Pra que as pessoas
ficam de “Tchchchu” conversando que é o que sempre acontece, entendeu, fazendo
chacota, fazendo piada...

M5 - eu acho que a população trans também tem muita dificuldade de acesso, é


impressionante a pessoa se chama, chega narecepção, meu nome é Alessandra e
fazem questão de pegar a identidade e chamar de Alex, ne assim, então existe assim,
de chamar de ele, não chamar de ela ne?

M5 - populacao trans é, mulher trans ne, que ai homens trans, eu não tenho muitas
informações, mas e acho também que é pouco agravo, mas assim, mulher trans ai
tem a questão do hormônio que vai fazendo de qualquer jeito bota solucione de
qualquer jeito, um processo super doloroso é como infecção sexualmente
transmissível também eu acho que tem a questão da invisibilidade da população trans
de não conseguir outros tipos de emprego e ai todo mundo é profissional do sexo
e ai voce nao vai no serviço de saúde e você é profissional do sexo e você vai
pegando mais infeccões
M5 - os profissionais a gente assim continua é com essa heteronormativa que assim,
de que todo mundo é hetero e pensando de forma biomédica varias vezes apenas, é
não pensa, não aprende a fazer a pergunta do jeito certo, quando a pessoa responde
você não sabe o que fazer com aquilo ali e acho que com os ACS tem, isso também,
acho que tem mais preconceito também ne...

M7 - Os homens em geral são mais fechados nas questões sexuais e não respondem
com tanta facilidade assim e talvez eu tenha uma restrição a mais de fazer essa
pergunta diretamente aos homens porque a gente tem uma comunidade que é
bastante machista. Se você faz essa pergunta pra um homem que não é homossexual
é como se fosse uma ofensa.

M 8 -vejo que há pessoas acessíveis aos travestis mas também há os homofóbicos,


que são pessoas que tem menos inteligência... há uma abertura que é muito
importante nesse sentido, muito importante. Quando aceitamos os pacientes
alcoólicos, eles maltratam muito os pacientes alcoólicos e drogados são rechaçadse a
sua sexualidade não é uma doença, então temos que tratá-los bem.

M12 - Então quando ela chega aqui, geralmente ela fala muito alto. Todo mundo
brinca com ela. A gente dá os limites que tem que ser estabelecia pra todo mundo.
Não é porque ela é travesti que ela vai poder fazer o que ela quiser aqui. A gente vai
tratar bem. Vai ser empático com ela., que é o que acontece aqui. Todo mundo
brinca. Todo mundo se diverte com ela, mas ao mesmo tempo limitando o
comportamento dela dentro da unidade

M11 -... até porque é uma coisa da sociedade brasileira né não se fala desse tema nas
escolas, nas igrejas menos ainda, mas na sociedade em geral não se fala desse tema,
desses temas e como eu falei no começo o estado de Goiás é um estado mais voltado
pro meio rural, mesmo aqui a capital, quem tem oportunidade de vir aqui no fim de
semana o povo vai tudo embora pra zona rural, pro campo, o centro da cidade fica
vazio e, então é uma sociedade mais tradicional mais conservadora é uma população
mais difícil ainda de entender esse tipo de coisa, ainda separa a humanidade em
masculino, feminino e mais nada só isso e parece que é pecado é tabu, não se fala é
segredo se o filho tem alguma tendência homossexual ou alguma conduta que o pai
reprova ainda eu não digo 100%, mas tô dizendo coisa que acontece é... É coisa
ainda rejeitada pela família, as pessoas sentem vergonha, acredito que no Brasil
inteiro, mas nesse meio que é mais tendência que é mais pro meio rural eu acho que
é mais forte ainda, o conservadorismo a religião e tudo.

M15 – existem...só que eles são invisíveis, exceto pelos transexuais que eles se
portam e você consegue identificá-los e eles se identificam enquanto trans, os gays,
as lésbicas não...

E2 - Então, só que é uma pergunta que a maioria dos agentes comunitários, já me


falaram que não sente preparado pra perguntar. Como a maioria dos agentes
comunitários eles têm uma escolaridade mais baixa. Muitos eu acredito que ainda
vivem a… pouca informação. Eles muitas vezes a gente sente que tem certo
preconceito, um receio né às vezes de chegar e abordar, não sabe como conversar,
né? Então eu acredito que… muitos agentes comunitários não estão preparados...

E3 - Então, a nossa médica é cubana. Eles tem uma cultura bem assim diferente da
Despreparo dos nossa, é, então ela eu acredito que se tiver que atender, ela atende, mas ela não tem
profissionais uma abertura, um conhecimento muito amplo sobre o assunto, né? E o agente... e o
meu técnico, eu acredito que assim... ele é meio tímido, eu acho que ele não teria
muito… ele não teria essa facilidade no atendimento.

E4 - Não, sem duvidas que não. Porque naverdade a gente tenta facilitar o acesso ao
máximo, mas eu acho que muitas vezes a questão da sexualidadeas pessoas se
sentem tímidas, tanto da pessoa abordar, mesmo que a gente saiba, por exemplo, tem
duas mulheres que mora por aqui, ninguém quer invadir a privacidade...mas assim,
eu acho que a gente não quer muito invadir e a gente sente que está invadindo e por
medo de invadir, “olha eu sei que você vem aqui um dia que a gente faz um dia pra
homossexuais” a gente não se sente a vontade pra falar com medo da invasão, mas
também porque hoje em dia tudo é processo, então a gente se coloca mais na posição
que se vier eu atendo, eu não tenho ido atrás, e eu acho que é de uma opinião geral,
sabe?
E 4 - ... os próprios agentes falam: “eu não vou pergunta se a pessoa é gay ou
não”.Falam, da mesma maneira que eu não vou perguntar se na casa usa
drogas,mesmo que eu sei que usa, eu não vou perguntar se usa álcool, se é
alcoólatra, porque eu, as vezes eu sei que o homem usa, é alcoólatra mas eu não vou
perguntar, então eles se sentem assim, e não só na questão da homossexualidade,
mas nessas outras também, tem temas que são muito delicados.

E 4 ... por medo mesmo, eu sei lá como a pessoa vai agir, e tal, eu não sei se a
família sabe... então muitas vezes nesse formulário que a gente já usa, foi uma das
questões que colocaram ... “Neusa eu não vou perguntar isso na casa de ninguém”

E 5 -Só que é uma população delicada, delicada, a gente temdificuldade sim para
abordar, por causa disso tudo que eu falei , muitos sabem mas a família não aceita,
ou não sabe, né? Então para a gente não é muito fácil não, é complicado,até a
abordagem mesmo, muitas vezes a gente até nota, a gente percebe, mas ainda um
tema tão assim, complicado, que a gente mesmo tem receio,se eu abordar a pessoa
vai se ofender, vai ficar chateado ou ela vai gostar? Como é que ela vai se sentir? Se
eu disser que estou percebendo, né? Que eu to notando, ou que eu sei por que alguém
já falou, seja uma mulher que vive com outra mulher, ou um homem que vive com
outro homem, a gente tem muito receio, ainda é um tema muito delicado para a
gente.
E7 - Dificuldades, eu particularmente não tenho assim, de
lidar com uma pessoa que esta inserida nesse grupo, e facilidades porque assim
a gente sempre tem recebido atualizações né, a lista de abordagem sindrômica,
como tratar da questão com o psicólogo, nós já teve muitas reuniões com os
psicólogos do "CAAV" né, geralmente nossas atividades são mais
voltados para Doenças Sexualmente Transmissíveis, é o que a gente consegue
abranger mais esse grupo, mas que uma Hipertensão, com Diabetes que é pouco
frequentado por esse grupo, só se tem alguém que a gente não sabe, mas assim,
quando a gente trata mais da questão sexual é que a gente consegue captar um pouco
mais dessas pessoas. Então a gente já tem um preparo, o município vem capacitando
né, as abordagens, as discussões, então assim, ao longo do tempo vão quebrando esse
bloqueio, e também depende muito do usuário, tem usuário que não vem em consulta
clinica talvez ele tenha vergonha ainda né, de como a população aqui
dentro vai reagir, os outros usuários... então não é frequente a gente ver
pessoas desse grupo dentro da unidade no dia a dia, entendeu?! A gente vê mais
nos grupos ou em atividades especificas pra Doenças Sexualmente Transmissíveis.

E 7 - Eu não posso dizer que é 100% preparada, acho que é a cabeça de cada um é
diferente né... alguns tem muita mais facilidade, é livre de preconceito, outros já têm
a questão da religião... de repente a gente muda como é a pessoa né... que tem que
separar as coisas, então assim, a gente faz de tudo pra que todo mundo acolha a todos
independente de suas escolhas, mas nem sempre a gente consegue, tem alguns
profissionais que ainda não se adaptaram, que ainda são muito preconceituosos...
porém a gente tem dentro da unidade população desse grupo, profissionais que
também fazem parte da população LGBT, então assim, a gente nunca teve problema
com isso assim, algo assim visível, alguma situação que aconteceu... nunca houve, de
recusa de atendimento, ou de constrangimento, graças a Deus até o tempo que eu to
aqui nunca teve nada.
E 11 - Olha assim, às vezes eu confesso para você que por exemplo, nesse primeiro
momento eu acho que quando a gente começa atender nesse caso da criança mesmo,
a gente fica meio assim, no primeiro momento é um impacto, né, mas assim, a gente
sempre tenta colocar da forma normal e comum, no nosso dia-a-dia mesmo, ne então
sempre levar nessa questão do atendimento normal...

E 11 -Eu acho que é isso que a gente está colocando, porque quando a gente fala
dessa questão, a gente sabe, nem todo mundo tem a formação em saúde aqueles que
têmas vezes acaba tem a questão também religiosa, tem o fator também da opinião
que ele já vem formado daquilo ali sobre a sexualidade, então tudo isso ai acho que
acaba interferindo, ah ainda mais que também nem todo mundo é profissional de
saúde então passou por essa formação, então eu acho que também ser levado a uma
formação nesse sentido para atender essa população.

E12 - É mais difícil, mas têm alguns casos específicos, eu me lembro, por exemplo,
de duas pacientes que elas vêm e geralmente elas vem com as parceiras delas
entendeu, e fazem né, e fazem anualmente elas fazem, uma começou ano passado e
outra já tem um tempo maior, então ela chega com a parceira dela e faz prevenção,
mas não tem um contingente muito amplo disso entendeu, e mesmo porque às vezes
vêm individualmente e eu não vou perguntar se ela é ou se não lésbica ou se não é
né, é geral...

E 13 Assim a gente faz muito... a gerência que coordena esse serviço ela tem essa
preocupação de fazer os cursos com a gente e deixar a gente um pouco a par desse
tratamento diferenciado, assim diferenciado não... quando você dá um tratamento
diferenciado você pode discriminar também esses pacientes, então assim preparar a
equipe para tratar bem esses pacientes, eu percebo que hoje não é qualquer
profissional que consegue desenvolver um trabalho nessa área, porque também tem
essa questão dos valores pessoais, questões intrínsecas do profissional, talvez ele não
consiga manter isso, eu acho assim que a gente poderia enquanto profissional que
trabalha em ações públicas, a gente poderia ter mais cursos...ter mais preparação
mesmo pra poder sustentar, e como a gente tem a questão da Estratégia de Saúde da
Família, que esse paciente chega fisicamente na estratégia, acaba que a gente tem
que ter um serviço muita bem estruturado pra gente poder capacitar os
profissionais... eu percebo é o seguinte a gente tem profissionais novos que estão
chegando, mas a maioria dos nossos profissionais eles já são arraigados de outro
contexto de trabalho que ele não consegue às vezes ter essa abertura para tratar o
paciente da forma como hoje preconiza, então assim a minha preocupação é mais
nesse sentido, deveria ter mais capacitações para preparar ou o serviço, o nosso
serviço, capacitar as equipes ou então capacitar logo todos os profissionais que estão
envolvidos... os profissionais ainda não estão bem treinados e capacitados para isso

E14 - É que eu acho que seja uma coisa meio delicada de se tocar, talvez numa
entrevista ou abordagem do próprio agente nas visitas. Como colocar isso sem a
pessoa se sentir ofendida para aí a gente ver o que eles esperariam do serviço.
Entrevista, sugestão no atendimento...
De repente a gente acha que não é legal discriminar ou tratar diferente, mas a gente
não sabe qual a opinião deles.

E15 - Mas tem coisas especificas que deveria ter uma rede de apoio, entendeu? A
questão do nome social, é... a gente meio confuso as vezes para onde levar essas
pessoas para fazer a troca, para ter direito a um nome social.
essa questão da rede de apoio que a gente fica meio perdida, entendeu?
Porque eu não sei ate que ponto também a unidade, nem os profissionais têm ciência
de tudo que eles precisariam, entendeu, não sei se tem esse entendimento de tudo que
eles precisariam.

M2 - LGBT...então essa população ela é vista como todos enviados, então não é pra
fazer nenhuma discriminação é pra gente olhar somente a parte de saúde do
indivíduo o que ele ta precisando em termos de saúde... Porque é o modo da gente
atender as pessoas é assim, a gente não faz discriminação nem dessa população, nem
pra negro, nem pra deficiente nós tratamos todos como ser humano que precisa ser
bem atendido.

M3 - Não, nem todos profissionais são sensíveis a esta questão... Ah, porque vai da
vivência, vai da forma... Da sua criação ...Os conceitos que cada um tem né, então eu
acho que isso ai é muito pessoal assim às vezes tem pessoas que tem um pouco mais
de... Até preconceito e tem gente que já tem mais liberdade e tal eu nunca, graças a
Deus eu nunca tive preconceito já tive colegas e tal e... E não tenho problema
nenhum, mas, é eu acho que dá pra ver... não tem diferença sabe? É, é em termos de
tratamento de nada, acho que é tranquilo assim, não vejo nada diferente assim... Não
é que você concorde com a prática né, mas você tem tolerância né, você tem que
tolerar e mesmo que você não seja a favor, mas você não pode jamais discriminar,
ter preconceito porque quem somos nós né, não cabe a um pra julgar o outro...

M5 - Não, completamente despreparada,existe um completo despreparo e


invisibilidade sobre o tema e assim, quando você vai ver o que ta escrito assim em
texto biomédico, a relação de mulher com mulher tem uma, tem uma possibilidade
de transmissão de infecção sexualmente transmissível baixa... então é...eu não sei,
você ta me perguntando ai, eu falei meu Deus eu vou falar o que as duas tem que
botar camisinha feminina? (risos)... nao... era esse discurso que a gente tava tendo,
tem alguns profissionais que mesmo depois ela ne, fala que tem uma relação
homossexual, é oferecem o preservativo, mas assim a pessoa não vai utilizar ne?
M5 - Nunca indiquei (condutas para pop LGBT) e nunca parei pra pensar se isso é o
mais adequado ou não, eu acho que é medo de você falar uma coisa absurda assim,
não, assim eu converso muito com outras colegas e outros colegas e ai vai rolando
uma conversa muito com Cintia também ne, assim a enfermeira, sobre esses foras
que a gente da e acho que a facilidade é essa, na verdade é muito difícil porque a
gente não aprendeu nada sobre isso na graduação, eu fiz residência de saúde da
família e ainda assim não se tocou no assunto

M 5 - Se a pessoa(profissional) não ta interessada assim, não se mostra, não esta


sensível, não tem nada que facilite, na verdade não tem nada. As dificuldades é são
muitas assim, a pessoa não ser chamada pelo nome social é muito ruim e ficar
chamando atenção de colega o tempo inteiro também não é legal... nao, ninguem ta...
nem os demais profissionais

M6 - ... pessoalmente eu não acho que faculdade forma, especialmente pra esse tipo
de público, mas eu acho que (...)Acho que talvez fazer a pergunta diretamente em
relação a sexualidade é uma dificuldade, porque, por exemplo, quando a gente vai
fazer o rastreamento de antecedentes ginecológicos obstétricos (...) é, esse aí eu sinto
mais facilidade quando é diretamente a uma mulher. Eu pessoalmente, enquanto
médica. Então eu falo: Qual foi a primeira relação sexual? Quantos parceiros já teve?
Qual é o parceiro? Parceiro homem ou mulher? Qual é o tipo de rastreamento que
você faz, preventivos? Algum método contraceptivo? Não usa? Enfim, essas
perguntas são mais simples. Eu tenha uma impressão que as mulheres são mais
abertas e que eu também sou mais aberta pra fazer essas perguntas pras mulheres. Os
homens em geral são mais fechados nas questões sexuais e não respondem com tanta
facilidade assim e talvez eu tenha uma restrição a mais de fazer essa pergunta
diretamente aos homens porque a gente tem uma comunidade que é bastante
machista. Se você faz essa pergunta pra um homem que não é homossexual é como
se fosse uma ofensa. Eu suponho que os profissionais de saúde não estejam
preparados... por causa da nossa cultura, mas não tenho nada especificamente pra
falar sobre isso.
(Sobre ACS) Eu não acho, não só especificamente em relação a essa população, os
agentes comunitários de saúde têm uma dificuldade de acolher as demandas desses
pacientes e como se portar e como se perguntar, como, como se comunicar
adequadamente, questões que tornam os valores fundamentais deles assim, eu vejo
muito... Então suponho os valores que esses já demonstraram e por essa dificuldade
de comunicação em outras questões de saúde que levam, que não exista um elemento
de preparação.

M7 - Então, com certeza existe o temor do preconceito e quando a gente aborda


sexualidade, é um termo complexo pra população em geral, e quando a gente
suspeita que é algum homossexual ou lésbica, a gente vê que tem um certo
constrangimento acerca sobre a sexualidade e a gente vai ate um limite que sente o
conforto da pessoa em falar, a gente como sempre, como eu faço uma assistência em
saúde na perspectiva psicossocial e espiritual, eu sempre abordo sexualidade... tem
quantos parceiros, se usa camisinha e de maneira geral a gente fala de prevenção e
promoção e proteção... mas a gente sente sim que há um receio e depois de adquirir
uma confiança, a gente estabelece um vínculo e eles entendem que falar sobre
homossexualidade...

M11 -Na demanda de forma geral eu acho que sim, na patologia que ele vem
digamos que procura por não sei, por dizer alguma coisa por uma pneumonia ele é
bem atendido na da pneumonia, tem o atendimento adequado, mas buscando apoio
psicológico ou a questão dos transgêneros também que optam por tratamento
hormonal tem um pouco mais de dificuldade, primeiro porque nós da atenção básica
pelo menos eu né, não tive uma capacitação nessa área, então não sei bem lidar com
isso não sei, não tenho bem o conhecimento suficiente pra começar a lidar com essa
questão da transsexualidade, então falta um pouco de capacitação nessa área
também, então na atenção básica essa parte fica a desejar... Na minha opinião né
pelo o que eu tenho visto até agora é um pouco... ... a instabilidade que nós temos do
pouco preparo do pessoal de saúde, da equipe de saúde pra lidar especificamente
com questões psicológicas relacionada a população LGBT, tem essa necessidade
ainda, mas tem disponibilidade por parte também... da equipe de saúde né...

M 12 - Eu não costumo fazer pergunta de fato sobre a sexualidade do paciente, não é


algo que tá na minha prática médica de está perguntando. Porque ainda tem uma
certa resistência porque não sei como é que o paciente vai responder isso. Querendo
ou não existe preconceito e quando a gente faz esse tipo de pergunta aí é que eles
ficam muito desconfortáveis. Não é algo que eu costume fazer. Mas essas pacientes
já chegaram trazendo pra mim que eram lésbicas. Então, eu sou lésbica.

M 12 - Porque se eu for olhar todos os agentes comunitários daqui eu acredito que


muitos ainda têm bastante preconceito, de não saber lidar, e não só o preconceito,
mas não saber como se portar. Por exemplo: às vezes tem até o respeito pelo
paciente, mas não consegue entender o que é um transexual, o que é um travesti, o
que é o gay, o que é a lésbica, o que é bissexual. Não conseguem fazer essa
diferença, não consegue ter esse entendimento. Mas respeita. Entendeu? Por
exemplo, se eu fosse falar das minhas agentes comunitárias seria assim: Elas
conseguem ter o respeito que o paciente merece, respeitando a diferença, mas sem
entender exatamente aquele paciente.

M 12 -Eu acho que ainda existe preconceito, muito, nos atendimentos. Falta
entendimento dessas questões. A gente às vezes não sabe o que explorar em relação
à sexualidade. Por exemplo, eu mesmo não sei quando que eu vou me atentar à
questão da sexualidade do paciente, ou se é necessário que eu realmente durante a
consulta questione sobre a sexualidade dele. Entendeu?!

M 12 - Nem o preparo suficiente pra lidar, mas essa questão do preparo mesmo.
Quando você tem essa questãodo ambulatório especifico você pode juntar
especialidades que de certa forma dar vazão as demandas que podem surgir pra essa
população... Mas por exemplo, eu acredito que essa travesti que a gente atende ela
faz uso cavalares de hormônios. Então assim, eu tenho que encaminhar ela pra algum
lugar.

M 16 -...tem determinados problemas de saúde que são mais comuns então talvez eu
deveria estar mais atento, eu não sei te dizer entende? Eu tenho algumas ideias que
são aquelas que eu te disse, mas de repente num processo de estudo de treinamento
então eu posso descobrir que determinada coisa eu posso estar mais atento, pra mim
é uma coisa a priori que é muito básica que eu devo tá mais atento ao conforto
daquela pessoa a pessoa se sentir mais confortável... tem umas dificuldades que estão
ligadas a isso então também talvez seja o processo de preconceito...também por
exemplo a abordagem de perguntar diretamente de qual a orientação... eu não sei a
orientação não sei qual a orientação que os serviços e movimento dão em relação a
isso tipo "ah o ideal que você pergunte é ideal que você pergunte" não sei se eu
pergunto, se é por constrangimento se é por não saber se é a melhor forma, então eu
acho que essa dificuldade que decorre por falta de debate no treinamento sobre isso
entendeu? Eu vou meio que tentando perceber

M 17 - Isso, eu me sinto confortável eu diria de fazer o atendimento de conversar


tranquilo, mas não sei se precisamente preparado então, por exemplo, se perguntar o
homem homossexual tem relação anal, pronto, isso traz que tipo de risco a mais pra
ele? Eu não sei falar entendeu? Ou uma mulher lésbica que vai fazer preventivo ou
não vai fazer preventivo ai a minha vida já complica(risada)...eu consigo lidar com
mais tranquilidade por exemplo mas "ah você é lésbica mas tem que fazer o
preventivo" eu vou colocar aquilo "como é pra você , você já fez já teve
penetração?...Como é que vamos fazer?...Ah nunca tive penetração na vida e não
quero fazer, existe risco?" Olha existe um risco ele é diminuído mas existe tal
taltaltaltaltal da pra você fazer e a pessoa decide não fazer e a gente não faz
entendeu? Ou se decidir fazer, mas, por exemplo,você disser que eu sei exatamente
como eu deveria proceder diante de uma situação como essa, uma mulher lésbica que
nunca teve uma relação heterossexual, portanto necessariamente não vai transmitir
nada, enfim, ou seja, eu já não sei muito bem qual é a duvida (risada)

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