Carta Aos Hebreus e Catolicas 4
Carta Aos Hebreus e Catolicas 4
Carta Aos Hebreus e Catolicas 4
As Cartas de Pedro
4
1. OBJETIVOS
• Apresentar os dois textos classificados como “Cartas de
Pedro” em suas identidades histórica, literária e teológi-
ca.
• Analisar os textos das duas Cartas de Pedro em sua forma
literária e em seu conteúdo teológico.
• Comparar as Cartas de Pedro aos outros escritos do Novo
Testamento.
• Despertar o desejo pelo conhecimento dos textos episto-
lares do Novo Testamento e de seu conteúdo teológico.
2. CONTEÚDOS
• Primeira Carta de Pedro.
• Segunda Carta de Pedro.
124 © Cartas aos Hebreus e Católicas
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
As Cartas de Pedro são parte do cânon do Novo Testamento.
Atribuídas ao apóstolo Pedro, essas cartas contêm um interessante
material a respeito do pensamento das primeiras comunidades.
Na compreensão do conjunto do Novo Testamento, as Cartas
de Pedro não são a palavra mais importante. De fato, comparando-
as com o Corpus Paulinum ou, por exemplo, com a Carta aos He-
breus, as Cartas de Pedro passam em segundo plano, pois aquelas
são mais marcantes do ponto de vista teológico e literário. Mas a
tradição da Igreja sempre considerou esses dois textos − a Primeira
Carta de Pedro e a Segunda Carta de Pedro − textos dignos de ade-
são e de compreensão. Por isso, somos convidados a estudá-las, o
que aqui fazemos.
5. CARTA DE PEDRO
Após a Carta de Tiago, o cânon do Novo Testamento apre-
senta a 1 Carta de Pedro. Assim como aquela, esta é uma espécie
de encíclica; uma carta dirigida a muitas Igrejas, podendo-se dizer
uma “carta circular”. Foi visto que a Carta de Tiago não apresen-
ta uma estrutura − ou esta não é clara. Fica difícil encontrar um
sentido lógico nessa Carta de Tiago. Na 1 Carta de Pedro, também
não há esse esquema visível, que leva ao leitor o conhecimento do
conteúdo sob um olhar na estrutura. A 1 Carta de Pedro é uma co-
leção de exortações, ditos e reflexões dedicados a quem conhece
o argumento central, que é Jesus Cristo, e o seu contexto, que é a
Escritura judaica.
Há, em 1 Pedro, certa divisão "natural", que, por sua vez,
pode ser questionada. Trata-se dos trechos 1,3;4,11, que se sepa-
ram de 4,12;5,11. Segundo muitos comentaristas, a primeira seção
seria uma espécie de "homilia batismal”, e a segunda parte seria
uma coleção de exortações parenéticas. Mas há dificuldades para
encontrar unidade na primeira parte, especialmente porque há
muitas exortações aos comportamentos adequados em situações
específicas, como com as autoridades, no matrimônio etc.
Por isso, é conveniente uma divisão mais detalhada, como a
que se segue:
Possível divisão de 1 Pedro
Endereço e Eulogia 1,1-2
Estar em Cristo [1] 1,3-12
Santidade em Cristo 1,13-23
O fiel e a Palavra 1,22-2,10
Condutas específicas 2,11-3,17
Estar em Cristo [2] 3,18-4,19
Exortações 5,1-11
Saudações finais 5,12-14
Embora não exista um plano lógico e coeso em na 1ª de Pe-
dro, os textos vão se sobrepondo e criando ideias concretas de
adesão a Jesus Cristo e de conduta. Lendo-a, parece que se ouve a
126 © Cartas aos Hebreus e Católicas
Autoria
Se a carta não é da autoria direta de Pedro, deve depender
de algum autor cristão de notável inspiração e sensibilidade. A Pri-
meira Carta de Pedro tem grande aceitação como original. Segun-
do as informações dos trechos 1,1;5,1.12, o autor é Pedro, auxilia-
do por um tal Silvano.
1,1: Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos que são estran-
geiros
5,1: Eis a exortação que dirijo aos anciãos que estão entre vós;
porque sou ancião como eles, fui testemunha dos sofrimentos de
Cristo
e serei participante com eles daquela glória que se há de manifes-
tar.
5,12: Por meio de Silvano, que estimo como a um irmão fiel,
vos escrevi essas poucas palavras.
Minha intenção é de admoestar-vos e assegurar-vos
que esta é a verdadeira graça de Deus, na qual estais firmes.
Introdução da 1 Pedro––––––––––––––––––––––––––––––––––
Texto da 1 Pedro 1,1-9
1 Pedro, apóstolo de Jesus Cristo,
aos eleitos que são estrangeiros
e estão espalhados no Ponto, Galácia, Capadócia,
128 © Cartas aos Hebreus e Católicas
Ásia e Bitínia
2 eleitos segundo a presciência de Deus Pai,
e santificados pelo Espírito, para obedecer a Jesus Cristo
e receber a sua parte da aspersão do seu sangue.
A graça e a paz vos sejam dadas em abundância.
3 Bendito seja Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo!
Na sua grande misericórdia
ele nos fez renascer pela ressurreição
de Jesus Cristo dentre os mortos,
para uma viva esperança,
4 para uma herança incorruptível, incontaminável
e imarcescível, reservada para vós nos céus;
5 para vós que sois guardados pelo poder de Deus,
por causa da vossa fé, para a salvação que está pronta
para se manifestar nos últimos tempos.
6 É isto o que constitui a vossa alegria,
apesar das aflições passageiras
a vos serem causadas ainda por diversas provações,
7 para que a prova a que é submetida a vossa fé
(mais preciosa que o ouro perecível,
o qual, entretanto, não deixamos de provar ao fogo)
redunde para vosso louvor, para vossa honra
e para vossa glória, quando Jesus Cristo se manifestar.
8 Este Jesus vós o amais, sem o terdes visto; credes nele,
sem o verdes ainda, e isto é para vós
a fonte de uma alegria inefável e gloriosa,
9 porque vós estais certos de obter,
como preço de vossa fé, a salvação de vossas almas.
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O texto da 1 Pedro
Já foi apresentada uma possível divisão da 1 Pedro. Segue,
na caixa de texto, outra divisão, estabelecida com base na leitura
do texto e de seus relacionamentos internos.
O Espírito: 1,10-12
A 1 Pedro afirma que a revelação vivida pelos fiéis em Cristo
foi antes buscada, anunciada e esperada pelos profetas. O Espírito
Santo, enviado do céu (vers. 12), é o revelador, sendo que a revela-
ção, isto é, o conhecimento de Deus, é dada por ele.
Contudo, ainda não é possível falar da ideia da Terceira Pes-
soa da Santíssima Trindade. Quando o texto fala de Espírito Santo,
está falando do próprio Deus, sem considerar a doutrina trinitária
que será elaborada muito tempo depois.
A Palavra: 1,22-2,3
A obediência à verdade, que certamente é a adesão a Jesus
Cristo e à sua Palavra, leva o fiel ao amor sem falsidade. Todos os
que foram chamados ao seguimento do Senhor devem olhar para
Ele e encontrar o sentido e a fonte da vida, como a erva ou a flor
encontra sua fonte na terra.
A Palavra anunciada transforma o fiel que a ouve. Ele deve
rejeitar o mal, a mentira e a hipocrisia, bem como tudo o que des-
trói a graça. Deve somente desejar a graça para manter a salva-
ção.
O sacerdócio: 2,4-10
Este é um momento importante da 1 Pedro. O autor da carta
exorta os seus leitores ou ouvintes a aproximarem-se de Jesus Cris-
to (vers. 4), o sujeito lógico do argumento, embora seja nomeado
somente no final do quinto versículo. Ele é identificado como a
“pedra viva”, subtendida “pedra angular”, rejeitada pelos constru-
tores (vers. 4). O texto sugere Lucas (20,17), que, por sua vez, é
uma citação do Salmo 118 (117,22). A pedra angular é o funda-
mento da construção; aqui, na 1 Pedro, ela é "pedra viva". Tocado
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Informação complementar––––––––––––––––––––––––––––––
É notável que o cristianismo primitivo se reconhecia como herdeiro direto do
judaísmo e como sua continuação. Até o cristianismo que se desenvolvia em
ambiente pagão tinha um forte conteúdo judaico, pois, ali, estavam os profetas,
as promessas e a revelação do Cristo. Demorou para o cristianismo cortar sua
dependência com o judaísmo − o que é bom e ruim: ruim no sentido de limitar
muito o desenvolvimento da Igreja e bom no sentido de dar-lhe uma identidade
ligada às promessas e à Aliança.
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Informação complementar––––––––––––––––––––––––––––––
As questões de gênero sempre são complicadas de ler e compreender, mais ain-
da de expor para ouvintes e leitores do século 21, que estão “bem esclarecidos”
e que não têm ranços de machismo. Além disso, as “leitoras” são, geralmente,
mais numerosas do que os “leitores”, o que causa certo embaraço em algumas
indicações bíblicas, tais como “vós, mulheres, sujeitai-vos aos vossos maridos“.
Embora isso tudo possa ser real, não se deve esquecer a situação vital em que
o texto foi produzido. Em função disso, ele deve ser lido como foi escrito, pois
forçar o texto a dizer algo que não deseja é errado do ponto de vista da inter-
pretação. A 1 Pedro depende da cultura de seu tempo e dos condicionamentos
sociais que lhe são conhecidos. O cristianismo soube enfrentar os desafios da
sociedade de seu tempo não se opondo frontalmente, mas superando com uma
ética de compaixão, de fraternidade e de compromisso. Isto é de se notar, clara-
mente, na história, embora não seja claro nos textos bíblicos.
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munitária, expressa pelo “não pagueis o mal por mal” (3,9) e ou-
tras atitudes de abertura são uma novidade em uma sociedade
marcada pela vingança.
A perícope incorpora o Salmo 34(35),13-17 como texto exor-
tativo à moral pessoal em função da vida feliz. Isto dá abertura
para o texto seguinte, que olha os perseguidos.
A perseguição: 3,13-17
A perseguição é uma constante no cristianismo nascente; se
não de modo ostensivo, então de modo não ostensivo − mas cons-
tante.
No pensamento da 1 Pedro, a perseguição não deve causar
medo aos fiéis, pois a adesão a Cristo, o Senhor (vers. 15) dá força e
dá coragem. Aqui se encontra uma frase que se tornou axioma do
cristianismo diante das contradições: “[...] estando sempre pron-
tos a dar razão da vossa esperança a todo aquele que vos pede”
(vers. 15). Razão da esperança é um sentimento, mas, seguramen-
te, uma certeza interior de futuro. Há aqui uma nota de escatolo-
gia não explícita, mas presente: o futuro do fiel está relacionado à
sua posição, sua "esperança" neste mundo.
O texto continua com exortações à mansidão, ao respeito, à
boa consciência e ao comportamento, tudo em função de Cristo.
Para concluir, a perícope apresenta um motivo que parece lógico:
é preferível sofrer por praticar o bem a sofrer por praticar o mal.
A ressurreição: 3,18-22
Novamente, o foco da atenção muda: passa de exortações
éticas para uma exposição doutrinal. O assunto é a ressurreição de
Cristo. A 1 Pedro recorda que ele “morreu uma vez pelos pecados,
o justo pelos injustos, a fim de vos conduzir a Deus” (vers. 18).
Isto tem a ver com a perseguição, que fora abordada na perícope
anterior.
138 © Cartas aos Hebreus e Católicas
A parusia: 4,7-11
Finalmente, o tema da parusia de modo claro e significativo.
Nos tempos da 1 Pedro, o final da história é algo quase iminente: o
fim de todas as coisas está próximo (vers. 7). O interessante é que
a proximidade da parusia impõe compromissos éticos, e não sen-
timentos ou atitudes desligados do mundo circundante. Os fiéis
6. CARTA DE PEDRO
Índole da carta
A Segunda Carta de Pedro começa com uma saudação so-
lene indicando sua autoria e insistindo na índole da experiência
direta com Jesus Cristo: Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus.
Àqueles que, pela justiça do nosso Deus e do Salvador Jesus Cristo,
alcançaram por partilha uma fé tão preciosa como a nossa, graça
e paz vos sejam dadas em abundância por um profundo conheci-
mento de Deus e de Jesus, nosso Senhor! (1,1-2).
Características
Há uma relação intensa entre a 2 Pedro e a Carta de Judas.
Isto foi notado muitas vezes e demonstra uma dependência direta:
a Carta de Judas parece ter sido composta com base na 2 Pedro.
Pode-se ver tal dependência em um quadro sinótico:
O texto da 2 Pedro
Não há um plano claro na composição da 2 Pedro. Os temas
vão se sucedendo sem muita lógica ou sequência às vezes. Propõe-
se o seguinte esquema fundamental:
A profecia: 1,18-21
O texto lembra a palavra profética resgatando a imagem dos
profetas do Antigo Testamento. Ela é como luz na escuridão (vers.
19). Na sequência, o texto faz uma consideração, que será um
axioma cristão relativo à revelação e à inspiração:
Antes de tudo, sabei que nenhuma profecia da Escritura é de in-
terpretação pessoal. Porque jamais uma profecia foi proferida por
efeito de uma vontade humana. Homens inspirados pelo Espírito
Santo falaram da parte de Deus (vers. 20-21).
O passado: 2,4-10
A carta cita, de modo não claro, um episódio do Livro dos
Jubileus , no qual se encontra a queda dos anjos. Cita, aliás, alguns
personagens do Antigo Testamento como modelos de adesão à
vontade de Deus: Noé (vers. 5) e Ló (vers. 7). Eles são apresenta-
dos como cumpridores da vontade soberana de Deus, ao passo
que os seus contemporâneos não foram fiéis a Ele.
A perícope evidencia que, entre os ímpios, existe um justo,
um homem de Deus. Os fiéis são chamados a ser justos em meio a
uma geração corrompida.
O castigo: 2,11-22
Tem-se aqui uma longa perícope com um tema de fundo co-
mum: o castigo. Este vem em função dos vícios e dos erros cometi-
dos por quem se arvora no direito de julgar até os anjos, criaturas
que estão em Deus. A 2 Pedro cita o episódio de Balaão em Núme-
ros 22, que deveria amaldiçoar o Povo de Israel, mas foi contido
pelo animal que montava.
Nos versículos de 17 a 22, a descrição dos infiéis continua
com cores bem fortes. São comparados às fontes secas de água;
vivem nas coisas fúteis, dissolutos, imersos nas paixões da carne.
Buscam a liberdade, mas se mantêm na escravidão.
A 2 Pedro descreve a situação dos fiéis que, depois de conhe-
cer e aceitar Jesus Cristo, deixam o caminho da vida pelas paixões
que os controlam. No versículo 21, há a afirmação: “melhor fora
não terem conhecido o caminho da justiça do que, depois de tê-lo
conhecido, tornarem atrás, abandonando a lei santa que lhes foi
ensinada”. Seguem-se imagens grotescas, metáforas de queda, de
desvio do caminho da salvação e de ida para caminhos de perdi-
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© As Cartas de Pedro 149
7. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
1) Quais são os temas principais da Primeira Carta de Pe-
dro?
2) Quais são os temas principais da Segunda Carta de Pe-
dro?
3) Essas duas cartas podem tranquilamente ser atribuídas
ao apóstolo Pedro?
4) Qual é a importância do tema "memória" na argumenta-
ção da Segunda Carta de Pedro?
5) Comente o tema dos falsos profetas e as consequências
de sua mensagem conforme a Segunda Carta de Pedro.
6) Em quais pontos a Segunda Carta de Pedro corresponde
à Carta de Judas?
7) Como entender a imagem dos "presbíteros", presente
na Primeira Carta de Pedro?
8) A Primeira Carta de Pedro apresenta o argumento do so-
frimento conforme Jesus Cristo em certa altura do texto.
Qual é a argumentação a respeito?
9) Comente os temas "obediência à verdade", "sacerdócio"
e "vida nova", presentes na Primeira Carta de Pedro.
10) Qual é a compreensão da autoria da Primeira Carta de
Pedro?
8. CONSIDERAÇÕES
Embora atribuídas a Pedro, as duas cartas que recebem seu
nome devem ser de escritores diferentes. Seguramente, não são
do apóstolo Pedro. Talvez a 1 Pedro pudesse ter influências ou,
até mesmo, uma autoria indireta do apóstolo. Mas é impossível
afirmar ou negar. O que sobressai da leitura das duas cartas são as
diferenças que possuem e as situações concretas que refletem.
A 1 Pedro apresenta-se como um conjunto de exortações pa-
renéticas baseadas no querigma cristológico. A 2 Pedro é um es-
crito doutrinal com enfoque na fidelidade à doutrina e à coerência
na vida cristã.
152 © Cartas aos Hebreus e Católicas
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BORNKAMM, G. Bíblia, Novo Testamento. Introdução aos seus escritos no quadro da
história do cristianismo primitivo. Tradução de João Rezende Costa. 3. ed. São Paulo:
Teológica, Paulus, 2003.
SCHLOSSER, J. A primeira epístola de Pedro. In: MARGUERAT, D. (Org.). Novo Testamento:
história, escritura e teologia. Tradução de Margarida Oliva. São Paulo: Loyola, 2009.
SCHLOSSER, J. A segunda epístola de Pedro. In: MARGUERAT, D. (Org.). Novo Testamento:
história, escritura e teologia. Tradução de Margarida Oliva. São Paulo: Loyola, 2009.
TRIMAILLE, M. As epístolas católicas. In: CARREZ, M. et al. As cartas de Paulo, Tiago,
Pedro e Judas. Tradução de Benôni Lemos. São Paulo: Paulinas, 1987. (Coleção: Biblioteca
de Ciências Bíblicas)
TUNÎ, J. O.; ALEGRE, X. Escritos joaninos e cartas católicas. 2. ed. São Paulo: Ave Maria,
2007.