Regma Dos Santos
Regma Dos Santos
Regma Dos Santos
A música “Folhetim” de Chico Buarque de Holanda pode ser lida/ouvida como um marco
dos tempos modernos. Relações efêmeras, que prometem prazer barato, meias verdades,
exaltação das vaidades, podem se esvair como fumaça na manhã seguinte.
Ao pretendermos estudar a crônica, não há senão outra descrição mais aplicada a esta
que não a de efemeridade. Ligada ao folhetim, num espaço do jornal que é feito para durar
apenas um dia, a crônica tal como a conhecemos hoje nem sempre ganha status de livro, o que a
permitiria existir além do seu tempo radical. Mas, interessa-nos, neste texto, observar as
ambigüidades deste termo e as várias concepções a ela atribuída nas diferentes áreas de
conhecimento.
Recorrendo a mais comum das fontes, que é o dicionário encontra-se a seguinte definição
de crônica:
{Do latim chronica} 1- Narração histórica, ou registro de fatos comuns,
fatos por ordem cronológica; 2 - Genealogia de família nobre; 3- Pequeno
conto de enredo indeterminado; 4 - Texto jornalístico redigido de forma
livre e pessoal, e que tem como temas fatos ou idéias da atualidade, de
teor artístico, político, esportivo, etc, ou simplesmente relativos à vida
cotidiana; 5 - Seção ou coluna de revista ou de jornal consagrada a um
assunto especializado: crônica política, crônica teatral. 6 - O conjunto das
notícias ou rumores relativos a determinados assuntos; 7 - Biografia, em
geral escandalosa, de uma pessoa. (FERREIRA, 1986, p. 502-3)
A separação entre sujeito e objeto, alma e corpo, espírito e matéria, sentimento e razão,
qualidade e quantidade, existência e essência, história e cotidiano, é, pois, o resultado de uma
prática que afeta o mundo contemporâneo, e tem reflexos não somente na forma como
compreendemos o mundo, mas também como agimos nele.
Ao separamo-nos do que vivemos objetivamente, deixamos de pensar nas marcas ali
presentes de nossa subjetividade. Assim também é a história, desvinculá-la do cotidiano, é torná-
la violentamente estéril.
Nesse sentido, volta a tona a idéia de que a concepção do termo crônica é complexo e
múltiplo, exigindo esforços de percepção que contemplem essas características.
Procurando abrir ainda mais o leque conceitual sobre a crônica, encontramos, devido à
sua pluralidade estudos de diversas áreas do conhecimento, e que apresentaremos aqui. Estudos
nas áreas de história literária, crítica literária, comunicação social, lingüistíca, ciências sociais,
história, serão elencados aqui com o objetivo de problematizar os pressupostos dos quais partem,
e como podemos, a partir dessas referências, abordar especificamente como tratar a crônica na
pesquisa histórica.
I
A crônica em suas múltiplas faces
Os estudiosos das diversas áreas que pesquisam a crônica usam, como referência
corrente, a dissertação de Wellington Pereira (1994) Crônica - A arte do útil ao fútil,
transformada posteriormente em livro. O autor apresenta a tese que a crônica é um gênero
independente, não podendo ser enxergada a partir de modelos literários ou jornalísticos.
Pereira parte do conceito da palavra crônica esboçado por críticos literários como
Massaud Moisés, Afrânio Coutinho, Arrigucci Jr., Vitor Manuel de Aguiar e Silva, com o intuito
de perceber a pluraridade dos discursos na crônica. Essa pluralidade é revelada na própria
“origem” da crônica que habita o jornal impresso, na relação direta que mantêm com o folhetim.
Reportando-se ao século XIX, o autor elege como objeto de estudo as crônicas de
Machado de Assis, com o objetivo de demonstrar que a crônica no espaço jornalístico consegue
ultrapassar os limites da referência jornalística:
Machado de Assis sempre procurou fugir, em suas crônicas, das armadilhas retóricas
do jornalismo de sua época. Na relação com o texto jornalístico Machado reforça a
seguinte idéia: não basta ter um autor e um leitor, mas se faz necessário demonstrar
as contradiçõe histórico-sociais embutidas em cada nota de jornal.(PEREIRA, 1994,
p. 60)
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Pereira considera que não se pode deixar de observar que os textos do cronista
Machado de Assis não estão fora do lugar. Na realidade Machado se aproveita dos desníveis de
idéias para refletir sobre a organização social do Brasil no século XIX.
Para Pereira, Machado transforma a crônica num elemento de reflexão, elevando o
repertório cultural dos jornais, criticando o vazio filosófico e cultural da sociedade brasileira que
ainda se embevecia com a linguagem prolixa dos bacharéis. Machado buscou a maturidade
estética da crônica, livrando-a da sombra do folhetim e de suas pretensões romanescas.
Encontramos nessa análise uma importante questão levantada por W. Pereira quando
afirma que a crônica está sempre sendo estudada como algo inerente ao texto jornalístico.
Segundo ele “na maioria das vezes, as crônicas - de quaisquer autores - são lidas apenas como
matéria jornalística, que precisa alcançar o estatuto de livro para se ‘libertar’ da linguagem dos
jornais.”(PEREIRA, 1994, p.98)
Nas considerações de Pereira, as crônicas de Machado de Assis não apenas renovam o
aspecto lingüístico dos jornais, como também constroem informações que ultrapassam os limites
do jornalismo opinativo.
Ao referir-se à crônica no jornalismo brasileiro contemporâneo, W. Pereira elege como
objeto de estudo a produção de Carlos Drummond de Andrade. O objetivo desta análise é
mostrar o cronista do século XX como um narrador que pensa o espaço de veiculação das
informações, sistematizando-as através da utilização de recursos lingüísticos que são exteriores ao
universo da linguagem jornalística.
Para Pereira, Drummond é antes de tudo um leitor do espaço jornalístico, sendo
considerado o cronista do jornalismo do século XX por excelência. Utilizando-se da poesia,
Drummond conceitua a prática jornalística: “O poético torna opaca as transformações do texto
jornalístico, empresta-lhe diversos significados que redundam no prazer estético do
leitor/decodificador e em várias formas de se relacionar com o fato.”(PEREIRA, 1994, p. 129)
W. Pereira considera que Machado de Assis amplia os significados das crônicas partindo
de uma leitura dos enunciados do jornal no século XIX. O cronista contemporâneo Carlos
Drummond de Andrade parte de uma leitura do espaço que a crônica ocupa no jornal,
verificando os diversos campos semânticos da informação o que permite estabelecer uma nova
ordem conceitual, tornando o enunciado jornalístico portador de um conteúdo estético.
Nas conclusões finais do livro Wellington Pereira define a crônica no espaço jornalístico:
“como uma narrativa estética que tem independência estética e pode inscrever várias lingüagens
em seu espaço gráfico, não se limitando apenas aos preceitos da literatura ou do
jornalismo.”(PEREIRA, 1994, p.150)
Outro livro bastante interessante no qual a crônica é, também, objeto de reflexão foi
escrito por Beatriz Resende: Lima Barreto e o Rio de Janeiro em fragmento (1993).
Procurando romper com os cânones Resende escolhe os textos que só recentemente vem
merecendo tratamento crítico, ou seja, as crônicas jornalísticas e os escritos de intimidade de
Lima Barreto. Nesses textos, o autor apresenta uma visão ampla da cidade e de seus
representantes sociais: presidentes, ditadores, deputados e senadores, militares, honestos ou
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desonestos doutores, moças, funcionários públicos, meninas do subúrbio, poetas, músicos,
aposentados, donas de casa, vagabundos, bêbados, loucos.(RESENDE, 1993, p.25-6).
Interessada pelos temas da modernidade e cidadania e sua representação literária na
criação de Lima Barreto, a autora parte do contexto e das idéias presentes no Rio de Janeiro da
Primeira República.
Num outro momento, Beatriz Resende afirma que os cronistas entram na literatura
ocidental na Idade Média com o objetivo de registrar pela escrita a memória dos tempos. Mas
esclarece: “A crônica de que tratamos aqui, é a que ressurge no século XVIII, indissociavelmente
ligada à imprensa, seu veículo de divulgação e, portanto, em uma relação direta com o
público.”(RESENDE, 1993, p.58)
Utilizando como referência teórica as reflexões que Walter Benjamin desenvolve em seus
textos O Narrador e no livro Origem do Drama Barroco Alemão, Beatriz Resende propõe ser
a crônica uma expressão alegórica , que se opõe ao símbolo e se despe de elementos puramente
edificantes e enigmáticos, transformando-se em escrita a ser compreendida, como Benjamin se
refere à dimensão profana da escrita alfabética que se opõe ao valor sagrado dos hieróglifos.
A alegoria, desta forma, aparece como ruptura entre os gêneros. Nas palavras da autora:
Identificamos, pois, a crônica como representação literária do fragmentário, do
ambíguo, do efêmero; como espécie que ao utilizar-se de sua própria maneira de ser
alegórica apresenta o presente - que ao ser narrado já é passado - como
ruína.(RESENDE, 1993, p.60).
Em outro momento, Beatriz Resende apresenta o confronto sempre inevitável entre Lima
Barreto e Machado de Assis, que o antecede na construção de uma narrativa da cidade:
“Parece-nos, porém, que a obra de Lima Barreto significa antes uma ruptura consciente e
necessária com a prática literária de Machado de Assis, do que um elo entre este e o momento
seguinte.”(RESENDE, 1993, p.84)
Como seu objetivo é investigar a questão da cidadania nas crônicas de Lima Barreto, a
autora enfatiza o conflito entre a produção de suas crônicas e o universo empresarial dos jornais.
A crônica é o espaço de emissão de opinião de Lima Barreto que se refere ao cidadão comum,
nos bondes, nos cafés, nas esquinas, trocando idéias.
Os aspectos literários das crônicas de Lima Barreto são apresentados por Beatriz
Resende como o uso da ironia; da linguagem que rejeita o ornamental, mas que desenvolve um
estilo peculiar; pela introdução de elementos ficcionais e recursos narrativos; pelo humor e pelas
metáforas, pela redundância, pelo enigma.
Ao representar a cidade, Lima Barreto o faz de forma bastante apaixonada, revestindo de
metáforas a dimensão erótica de seu discurso. A tese da autora pretende inscrever Lima Barreto
na tradição da modernidade brasileira, já que em seu tempo convivem o velho e o novo, e a
desconfiança num projeto de progresso a qualquer custo. Beatriz Resende afirma:
4
ser usada publicamente, e outra, popular e cotidiana. Daí a importância da
opção por uma dicção próxima do modelo popular do folhetim nos contos
e romances de Lima Barreto, dicção que se acentua nas crônicas,
buscando aproximar-se dos leitores. (RESENDE, 1993, p.116).
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Nesse sentido, Chinellato considera a crônica um gênero brasileiro por excelência.
Tomando as análises de Massaud Moisés, a autora considera que a crônica se afasta do sentido
que lhe atribuíram os franceses, encontrando sua naturalização e cidadania no Rio de Janeiro.
Sobre outros aspectos a autora considera ainda:
Da economia de espaço, como matéria jornalística, resulta a concisão da crônica;
dos coloquialismos e chistes da linguagem oral decorre a simplicidade dialógica entre
o leitor e o cronista, flagrando um instante particular, irrisório ou inusitado. No seu
valor literário e jornalístico cruzam-se as seis funções da linguagem, sobretudo a
poética e a emotiva, urdindo o circunstancial, o dialógico, o lírico, o reflexivo e o
humorístico. (CHINELLATO, 1996, p.85).
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A autora dedica dois capítulos de seu trabalho à crônica. Borelli a localiza no espaço do
jornal chamado no século XIX de folhetim. Esclarece que o termo folhetim diz respeito, de forma
genérica, ao espaço no jornal ou revista de uma sessão de variedades, Borelli acrescenta que a
crônica, ou o romance-folhetim são alternativas de preenchimento desse espaço.
Não permanecendo como forma de expressão significativa no campo literário, o folhetim
migra para outros meios, como para o rádio, na forma de radionovelas; para os gibis, na forma de
quadrinhos; e se fixa na televisão no espaço das telenovelas e minisséries. Mas esclarece: “A
crônica e os cronistas permanecem fiéis ao gênero sem nunca terem deixado de comparecer,
ocupando durante mais de um século, seu espaço no jornalismo brasileiro.”(BORELLI, 1996,
p.62).
Ao considerar os questionamentos sobre a crônica como equivocados, a autora assim os
cita: “a crônica é texto literário, ou comentário jornalístico? É cultura ou indústria? É literatura
popular? É produto da cultura de massa? Guarda referências eruditas?” (BORELLI, 1996,
p.62)
No capítulo Crônicas, cronistas, narradores, narrativas, a autora referencia-se em
Walter Benjamin considera o cronista moderno como narrador da história escrita, que restaura o
passado no presente. A partir de sua própria experiência, o narrador retira o sentido factual e
imaginário da narrativa. Por outro lado, o ouvinte incorpora, por meio de troca reciproca, a
experiência das coisas narradas. Nas palavras de Borelli: “O objetivo é ensinar, orientar práticas,
doar conselhos. O narrador, personagem sábio e conhecedor deste e de outros mundos, oferece
aos ouvintes a experiência enraizada na tradição, cotidiano e na memória coletiva de um
povo.”(BORELLI, 1996, p. 63)
Nesse sentido, a crônica é para a autora, forma de memória escrita, que fica impressa e
arquivada. Por este raciocínio, o cronista é também historiador, já que interpreta e recria com
certa imaginação, um fato e o narra.
O ato de escrever crônicas é, concomitantemente, um ato de lembrar. Faz-se de
novo do cronista historiador e do historiador cronista. São lembranças pessoais e
familiares, resultantes da articulação entre memória coletiva e memória
individual.(BORELLI, 1996, p.69)
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permanência, duração, acontecimentos ordenados em seqüência cronológica.
(BORELLI, 1996, p.78).
Outra questão apontada por Borelli refere-se à obrigação de cronicar, de criar algo novo
num curto espaço de tempo, o que remete à discussão sobre a relação entre imprensa e literatura.
A crônica apresenta-se, pois, no limite entre os valores subjetivos do discurso poético e a
eficiência, a rapidez do desenvolvimento tecnológico da indústria cultural. Pondera ainda a
autora:
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No livro Literatura como Missão Sevcenko aponta para o reconhecimento da
importância da linguagem no centro de toda a atividade humana, mas afirma também, ser esse um
de seus principais limites.
Ao enfatizar a importância do discurso, partindo da referência de M.Foucault, Sevecenko
afirma: “A palavra organizada em discurso incorpora em si, desse modo, toda sorte de hierarquia
e enquadramentos de valor intrínsecos às estruturas sociais de que emanam.”(SEVCENKO,
1985, p.20).
Sevcenko interessa-se, especialmente, pela produção discursiva da literatura moderna.
Afirmando a interdependência entre os estudos literários e as ciências sociais, esse autor
preocupa-se com as exigências metodológicas desse tipo de pesquisa: “que se preserve toda a
riqueza estética comunicativa do texto literário, cuidando igualmente para que a produção
discursiva não perca o conjunto de significados condensados na sua dimensão social.”
(SEVCENKO, 1985, p.21)
Estabelecendo as peculiaridades do estudo da literatura numa pesquisa historiográfica,
Sevcenko enfatiza que a enquanto a historiografia procura o ser das estruturas sociais, a literatura,
por outro lado, revela uma expectativa do vir a ser. A partir de Aristóteles, Sevcenko diferencia o
historiador do escritor, ponderando: “Ocupa-se, portanto, o historiador da realidade, enquanto
que o escritor é atraído pela possibilidade. Eis aí, pois, uma diferença crucial, a ser devidamente
considerada pelo historiador que se serve do material literário.” (SEVCENKO, 1985, p.21).
Citando Roland Barthes, Sevcenko situa o escritor diante da história encarando-a como o
“advento de uma opção necessária entre várias morais da linguagem; ela o obriga a significar a
literatura”. (BARTHES apud SEVCENKO, 1985, p.21).
Para Sevcenko a literatura é o testemunho dos homens que foram vencidos pelo fato, é a
história que não ocorreu, os planos que não foram concretizados, mais ainda, podemos
complementar, também aqueles que se realizaram. Ao estudar as duas primeiras décadas deste
século, esse historiador retrata as nítidas intenções sociais na produção literária ligadas ao
realismo.
Destacando as obras de Lima Barreto e Euclides da Cunha, Sevcenko, através da
imprensa periódica – jornais, magazines, crônicas, biografias e opúsculos, apresenta como cada
um desses autores sintetizaram as alternativas possíveis pelas quais lutaram. Os chamados
homens de letras transformam-se em escritores-cidadãos revelando uma postura de
engajamento político.
Sevcenko sentencia que com relação às décadas em torno da transição do século XIX
para o século XX, pode-se observar mudanças drásticas na vida brasileira em seus mais diversos
setores:
Mudanças que foram registradas pela literatura, mas sobretudo mudanças que se
transformaram em literatura. Os fenômenos históricos se reproduziram no campo das
letras, insinuando modos originais de observar, sentir, compreender, nomear e
exprimir.(SEVCENKO, 1985, p.237).
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Sevcenko enfatiza que os textos artísticos são um termômetro da mudança de sensibilidade
e mentalidade de uma determinada sociedade, reconhecendo e reafirmando a importância do
estudo da literatura pelos historiadores.
Em outro livro mais recente Orfeu Extático na Metrópole(1992) Sevcenko dá
continuidade ao exercício de observar e elaborar o conhecimento histórico através da literatura.
Seu objetivo é estudar a urbanização de São Paulo e, através desse processo, compreender as
alterações culturais e sociais do início do século naquela cidade. De acordo com Maria Odila da
Silva Dias que escreve o prefácio:
este livro procura reconstruir diferentes aspectos da ruptura com o mundo da ordem
estabelecida do século passado, e interpretar em múltiplas temporalidades e diversos
níveis de experiência as dimensões do fenômeno da urbanização através de um
esforço amplo de crítica da vida cotidiana e da cultura, tanto em relação às
experiências criativas com a forma na poesia, no cinema, nas artes plásticas, quanto
no próprio modo de a publicidade jogar com a fe b r e d o novo e do
moderno.(DIAS, 1992, p.XVIII).
Mas Sevcenko não resume sua fonte documental às crônicas sociais, mas também às
colunas esportivas, aos artigos de fundo, aos editoriais, não mostrando, necessariamente, a
diferenciação entre esses estilos, e práticas de escrita que s encontram num mesmo suporte que é
o jornal, mas que, como sabemos, guardam também especificidades.
Na realidade, Sevcenko aponta a interpenetração desses diversos estilos, como na
referência: “A continuação desse editorial em forma de crônica e ainda mais reveladora,
particularmente no seu irônico movimento conclusivo.” (SEVCENKO, 1992, p.60)
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Esse livro de Sevcenko é uma importante referência metodológica ao historiador
interessado na utilização da fonte jornalística já que partindo de uma preocupação temática, o
autor recorre aos mais diversos espaços do jornal, permitindo realçar sua dimensão literária ao
enfatizá-la.
Em nossa pesquisa sobre Lycídio Paes i procuramos aprender com outras áreas do
conhecimento observar o objeto, tomando o necessário cuidado para não perdê-lo num infinito
de referências que tendem a diluí-lo. Desta forma, utilizamos a Semiótica da Cultura para analisar
nosso objeto de pesquisa, que são as crônicas publicadas em jornais mineiros pelo cronista
Lycídio Paes.
Walter Benjamin chamava atenção para o fato de que o jornal é o suporte em que
linguagem e escrita, incisivamente, encontram-se:
essa dimensão mágica, se se quiser - da linguagem e da escrita não se desenvolve
isolada da outra dimensão, a semiótica. Todos os elementos miméticos da linguagem
constituem uma intenção fundada, isto é, eles só podem vir a luz sobre um
fundamento que lhes é estranho, e esse fundamento não é outro que a dimensão
semiótica e comunicativa da linguagem. (BENJAMIN, 1985:12)
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citados são consagrados pela crítica especializada e apresentam um trânsito profícuo pela
literatura.
Borelli em sua opção paradigmática não aceita realmente os cânones e propõe estudar um
cronista contemporâneo, não necessariamente apreciado pela crítica, mas potencialmente um
grande sucesso de mercado. Buscando rever essa relação entre mercado e produção cultural
Borelli opõe-se a limites simplificadores.
Em nossa pesquisa não se trata de um caso, nem de outro. Na verdade Lycídio Paes não
é um escritor ou cronista famoso, nem fez sucesso no mercado editorial. Ao partir dos diversos
estudos até aqui apontados, podemos considerar que a crônica não é somente plural na sua
constituição, ou no seu “escrever-se”, mas também nas análises que dela se fazem.
Compreendemos, por fim que as diversas leituras aqui apresentadas, formam uma espécie de
tapeçaria sob a qual se apresenta a crônica, objeto de diversas e ricas interpretações sobre a
sociedade contemporânea, permitindo compreender a feliz articulação entre história e cotidiano,
entre o efêmero e o duradouro.
Referências Bibliográficas:
BAITELLO Jr., Norval. O Animal que parou os relógios. São Paulo: Annablume, 1997
BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas . Magia e Técnica, arte e política. Vol.1,Trad.
Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1985.
BORELLI, Silvia Helena Simões. Ação, suspense, emoção. São Paulo: Educ/Fapesp, !996
CHINELLATO, Thaís Montenegro . Crônica e Ideologia - contribuições para leituras possíveis.
São Paulo: Tese de Doutorado,USP, Curso de Lingüística e Semiótica, 1996.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª ed.,
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
MORIN, Edgar. O método. Vol. IV. Trad. Emílio Campos Lima. Lisboa: Europa-América,
1992
PEREIRA, Wellington, Crônica: arte do útil ou do fútil.( ensaio sobre a crônica no
jornalismo impresso).João Pessoa: Idéia, 1994.
RESENDE, Beatriz. Lima Barreto e o Rio de Janeiro em Fragmentos.Rio de Janeiro:
Ed.UFRJ/ Campinas: Ed. Unicamp, 1993.
SANTOS, Regma Maria dos. Memórias de um plumitivo: impressões cotidianas e história nas
crônicas de Lycídio Paes.
SEVCENKO, Nicolau. Literatura como missão. São Paulo: Brasiliense, 1985.
___. Orfeu Extático na Metrópole. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
i
Sobre esse autor organizamos o livro “Brevidades – crônicas de Lycídio Paes, publicado pela EDUC/Oficina
do Livro de São Paulo e ainda o livro “Memórias de um plumitivo: impressões cotidianas e história nas
crônicas de Lycídio Paes.”Uberlândia: Asppectus/FUNAPE, 2005.
ii
De acordo com Norval Baitello Jr., o texto da cultura se constrói “na operação interativa entre seus
componentes subtextuais, no diálogo entre signos e dos signos com seu próprio percurso histórico”. (
BAITELLO JR.1997, p. 42)
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