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ALENCAR, A. de; MEIRA, C.; Leal, I. Tradução literária: a vertigem do próximo. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2011. 222 p. Andréia Guerini (Professora doutora, PGET/UFSC) andreia.guerini@gmail.com Nicoletta Cherobin (Doutoranda PGET/UFSC) nicoletta_chero@hotmail.com T radução Literária: a vertigem do próximo apresenta 17 trabalhos de diferentes autores que fortalece a ideia de que a tradução é paradoxalmente necessária e impossível. A força desse livro é representada pela heterogeneidade dos textos que o compõe, isto é, pela multiplicidade de relatos sobre tradução, em geral, e sobre tradução literária, em particular. O artigo de abertura, de Maria Angélica Deângeli, levanta a questão do bilinguismo e da tradução da obra Amour bilingue, do marroquino Abdelkebir Khatibi, na qual “a língua aparece como o espaço do entre-dois, o intervalo do gozo entre o idioma materno (a língua árabe) e a língua supostamente estrangeira (o francês). Para o autor, trata-se de descrever e teorizar uma situação da/na língua que (lhe) revela sua identidade de escritor” (p. 12). Ângela Maria Dias (UFF), por sua vez, comenta o versátil trabalho do artista plástico Nuno Ramos a partir da imagem da Torre de Babel de Derrida, pois, conforme justifica a autora “O belo texto de Derrida, ao trabalhar o relato bíblico da Torre de Babel para pensar a tradutibilidade do texto sagrado como promessa de reconciliação das línguas, em seu ‘deixarse traduzir como intraduzível’ sugere um caminho de interpretação da caudalosa e diversificada produção de Ramos” (p. 28), cuja peculiaridade é a capacidade de representar o diálogo entre as linguagens em sua multiplicidade de códigos e escritas. Marcelo Jacques de Moraes, em “Viver entre línguas: língua, lugar/tradução da experiência”, propõe uma reflexão sobre a “formulação da experiência da língua nos termos de uma oposição entre língua como meio, como veículo, e língua como lugar [...] para pensar o lugar da literatura e da tradução neste mundo de línguas em contato que é cada vez mais insistentemente o de nossa contemporaneidade” (p. 40), pois, como diz o autor do artigo, GUERINI, CHEROBIN. Tradução Literária: a vertigem do próximo Belas Infiéis, v. 1, n. 1, p. 233-235, 2012. 233 233 “vivemos entre línguas e é nesse lugar, entre elas, que se infiltra toda a experiência do mundo” (p. 49). Em seguida, Marie-Hélène Catherine Torres faz uma atenta análise das traduções e retraduções em francês de romances brasileiros, enfatiza a importância do paratexto, ao usar as traduções francesas de Dom Casmurro e aponta principalmente para os limites dos discursos de acompanhamento nas traduções. Mayara Guimarães traz à tona a discussão sobre escritor/tradutor, ilustrada pela experiência de Clarice Lispector como tradutora e também como “teórica da tradução” e da importância do processo tradutório para um escritor, pois muitas vezes funciona como instrumento de autoanálise e reflexão sobre o próprio trabalho. Em “A letra no passaporte: fronteiras e passagens”, Stefania Chiarelli aborda a tradução pelo viés da intersemiótica, analisando duas obras, o documentário: Um passaporte húngaro, de Sandra Kogut, e a hisória em quadrinho The arrival, de Shaun Tan, obras que, segundo a autora, “resignificam a expressão do verbo [traducere]” (p. 81) A tradução e a criação em Borges, de Adolfo Bioy Casares, são os temas do artigo de 234 Walter Carlos Costa, que mostra como Casares compõe o enorme livro sobre Borges e como a tradução ali aparece. O autor examina ainda “alguns exemplos em que a discussão sobre tradução permite a Borges entender melhor o funcionamento do texto literário” (p. 91). Márcio Seligmann-Silva, por sua vez, coloca em relação dois importantes tradutores e teóricos da linguagem: Haroldo de Campos e Vilém Flusser e analisa como ambos pensaram a tradução e a relação entre as culturas (p. 104). Outras reflexões emergem do ensaio sobre a poética de José Lezama Lima e Herberto Helder, pois, por meio das obras desses dois grandes autores, a autora, Izabela Leal, analisa a problematização da identidade cultural de Cuba e Portugal. Esse paralelismo resulta em uma celebração da necessidade de traduzir as culturas. Já Berthold Zilly mostra a força da escrita de Sarmiento, em especial de Facundo, e de como nessa obra o autor “se dedica a procedimentos intelectuais muito próximos aos do tradutor, mediando entre línguas e culturas” (p. 135). Uma proposta de tradução de alguns versos de Verlaine pela escritora portuguesa, Luiza Neto Jorge, dá origem ao artigo de Jorge Fernandes Da Silveira. Tânia Sarmento-Pantoja trata da narrativa pós-ditatorial no contexto brasileiro e as suas realizações, além de uma reflexão sobre a figura do produtor do texto. E “O rato que rima”, artigo de Marcelo Diniz, apresenta a figura de Clément Marot, poeta e tradutor francês GUERINI, CHEROBIN. Tradução Literária: a vertigem do próximo Belas Infiéis, v. 1, n. 1, p. 233-235, 2012. do século XVI, conhecido pelo experimentalismo contemporâneo, além de propor/analisar algumas epístolas e traduções do autor no final do texto. Caio Meira, em “Edmond Jabès e a tradução da forma”, levanta questões sobre a tarefa do tradutor, por meio da obra poética de Edmond Jabès, conhecida para “ser concebida a partir do mesmo abismo da passagem entre línguas ou da ‘diferença entre línguas’ que Blanchot considera ser o lugar por excelência da tradução” (p. 191). Como restituir em outra língua um efeito particular e típico de um idioma é o dilema enfrentado nesse ensaio. Ernani Chaves propõe, em seguida, uma tradução de La Traduction: le pour et le contre, anotações escritas à mão no final da década de 1930 por Walter Benjamin. O livro é concluído com uma tradução de Ana de Alencar da obra Crise do Verso, de Stéphane Mallarmé, com notas da tradutora. O autor francês descreve e celebra nos detalhes as várias formas e características dos versos que acompanham a história literária, por meio de numerosas referências às línguas. O livro acaba com um anexo composto de notas sobre a operação de tradução em poesia, ótimas sugestões para qualquer tradutor. Após essa breve descrição dos textos que compõem esse livro, podemos dizer que pela 235 riqueza de abordagens teóricas, críticas e práticas, o leitor encontra nesse material um 235 excelente e útil leque de questões que permeiam as discussões no âmbito da tradução. GUERINI, CHEROBIN. Tradução Literária: a vertigem do próximo Belas Infiéis, v. 1, n. 1, p. 233-235, 2012.