View metadata, citation and similar papers at core.ac.uk
brought to you by
CORE
provided by Repositório Institucional da UFSC
ISBN:978-85-68618-05-9
UNIVERSIDADE FEDERAL: OS CAMINHOS DA TERCEIRIZAÇÃO EM UMA
INSTITUIÇÃO SOCIAL
GABRIEL NASCIMENTO KINCZESKI1
Universidade Federal de Santa Catarina
gabriel.nk@ufsc.br
RAFAEL PEREIRA OCAMPO MORÉ2
Universidade Federal de Santa Catarina
rafael.more@ufsc.br
RESUMO
A universidade é uma instituição social à medida que se constituiu na oposição e legitimação
da sociedade, na transformação e lutas contra suas divisões. Diferentemente da organização
social que se volta à competição com seus iguais. Partindo desse pressuposto, pretende-se
analisar a inserção dos trabalhadores terceirizados em IES federais sob a ótica das questões de
identidade e pertencimento, além da precarização laboral. A metodologia adotada para
descrever e criticar o fenômeno foi o ensaio-teórico, pois se baseou nos relatos bibliográficos.
Verificou-se que os terceirizados têm dificuldade em se identificar com a universidade devido
à discriminação pelos servidores, exclusão de acessos (ex.: BU, RU), desconhecimento da
história e objetivos da universidade moderna (ensino/pesquisa/extensão). Quanto à
precarização, citam-se o descumprimento de obrigações trabalhistas, a alta rotatividade e
baixa escolaridade média (menores salários e benefícios). Como alternativas, propôs-se o
fomento à educação, com vagas de EJA e cursos pré-vestibulares; acesso a todos os ambientes
universitários; palestras de sensibilização sobre a universidade na contratação, e; investimento
na gestão e fiscalização dos contratos terceirizados. Conclui-se que essas medidas podem
gerar despesas, porém uma instituição social deve se nortear no bem-estar da sociedade.
Palavras chaves: Terceirização; precarização; identidade.
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Ao abordar o tema da terceirização de serviços em universidades federais brasileiras,
pretende-se analisar o fenômeno sob a ótica da inserção dos empregados terceirizados no
cotidiano da IES federais. Para tal, partirá de duas premissas principais: as questões de
pertencimento e identificação desses profissionais como atores ativos da instituição e a
precarização do trabalho terceirizado.
Busca-se na vocação social das universidades, voltar-se mais às pessoas contratadas
via terceirização e apontar os principais problemas enfrentados. Para assim, procurar propor
medidas ao fomento de melhores condições de trabalho, de transformação social, de
integração aos grupos sociais existentes e de promoção ao reconhecimento do passado e do
futuro a ser trilhado pelas IES brasileiras onde estão inseridas.
Com vistas à função social da universidade, há de se destacar as correntes que pregam
a existência de dois tipos de universidades: a instituição social e a organização social. Nesse
ponto, evoca-se a figura de Marilena Chauí, reconhecida pesquisadora da temática.
De acordo com Chaui (2003, p. 5), a universidade é caracterizada por ser “uma
instituição social e como tal exprime de maneira determinada a estrutura e o modo de
funcionamento da sociedade como um todo”. A instituição social universidade é uma prática
social pautada no reconhecimento e legitimação pública, autônoma, estruturada com
ordenamento, regras e valores republicanos, democráticos e laicos (CHAUI, 2013).
Assim, ALPERSTEDT et al. (2006), percebem que a responsabilidade social da
universidade não se esgota apenas na investigação e no ensino, como previa o modelo alemão
de Humboldt. Em uma concepção mais ampla, envolve tanto a valorização das comunidades,
quanto a intervenção reformista dos problemas sociais, papel reforçado principalmente em
períodos históricos de transição ou de aprofundamentos democráticos como a humanidade
tem vivenciado no início deste século.
Por outro lado, uma organização social, segundo Chaui (2003), defini suas práticas
sociais pautadas na instrumentalidade, ou seja, no conjunto de artefatos administrativos
voltados ao atingimento de um objetivo particular. É regida sob o “guarda-chuva” da gestão,
do planejamento, do controle e do êxito. Suas estratégias seguem os princípios da eficiência e
eficácia, aceitando os polos da divisão social ao não responder as contradições imposta por
essa divisão, à medida que a vitória na competição com seus iguais é o seu propósito.
Em meio às discussões sobre universidade instituição ou organização social está a
terceirização de serviços e como os trabalhadores são percebidos de acordo com essas duas
concepções.
Sob o viés de organização social, a terceirização pode ser vista como uma prestação de
serviços impessoais considerados de apoio às atividades principais da universidade,
executados por intermédio de uma empresa contratada. Já, sob o viés de instituição social,
pode-se entender como serviços essenciais realizados por trabalhadores que dividem os
mesmos espaços dos servidores efetivos e merecem o tratamento, cuidados e oportunidades
semelhantes a estes.
A principal problematização referente à crescente incorporação da terceirização na
esfera pública e nas universidades federais é a natureza precária do trabalho. Para Carvalho e
Bridi (2015, p. 101) “os terceirizados fazem parte de um estrato da classe trabalhadora que
apresenta índices elevados de precariedade em relação a outras formas de contrato”. Lima
(2010, p. 25) complementa: “[...] flexibilização e terceirização vêm juntas com a precarização
das condições de trabalho, dos contratos, da possibilidade de organizar a vida, criando novas
hierarquias e segmentando o coletivo de trabalho.”.
Os fatores de precarização defendidos por diversos autores serão mais amplamente
abordados ao longo do artigo; contudo, ciente que “o trabalho tem um papel social relevante
2
na constituição do sujeito trabalhador e na construção do seu reconhecimento social” (BRITO
et al., 2012), a possível precarização das condições laborais dos terceirizados é motivo
contundente para a investigação acadêmica.
Outra questão inerente ao processo de terceirização é a identificação desse trabalhador
com a cultura organizacional da tomadora, à medida que o vínculo empregatício está
relacionado à outra empresa “de fora” dessa relação. Para Valença e Barbosa (2002), o
indivíduo identificado com a cultura da entidade a que pertence, somará esforços para
alcançar os seus objetivos e o inverso, provoca inconsciente ou conscientemente em esforços
negativos para o atingimento dos resultados.
Na terceirização, existem duas organizações diferentes a qual o trabalhador se reporta,
podendo gerar conflito de pertencimento a culturas distintas, no caso de universidades
federais, de um lado está uma instituição publica social e de outro uma empresa com fins
lucrativos.
Em meio às polêmicas discussões sobre as faces da terceirização, aprova-se a Lei nº
13.429/17 que autoriza repassar a terceiros as atividades fins das empresas (irrestrita), até
então proibidas. Segundo (SANTOS, 2017), essa lei veladamente vai dar um cheque em
branco ao empresariado ao possibilitar uma terceirização desenfreada e sem amarras,
incluindo também o setor público. O que irá exigir ainda mais preparo das universidades para
lidar com as questões inerentes a esse processo.
O mesmo autor ainda faz um retrato da atual situação do terceirizado no Brasil: “[...]
um trabalhador invisível, abstrato, sem identidade própria em seu ambiente laboral, sem plano
de carreira, que não incorpora conhecimento técnico, que no quadro atual não tem condições
de evoluir profissionalmente e materialmente”. (SANTOS, 2017, p.57)
Considerando que o fenômeno da terceirização esta cada vez mais presente no
ambiente das universidades federais, considerando os relatos na literatura de precarização das
condições de trabalho, considerando as questões de identificação dos trabalhadores como
sujeitos das IES, questiona-se quais seriam as ações que uma universidade federal poderia
realizar para garantir os direitos sociais dos trabalhadores terceirizados e o seu
reconhecimento como parte de uma instituição social diferenciada?
2 A UNIVERSIDADE E A TERCEIRIZAÇÃO
Antes de se pensar nos rumos da universidade é preciso revisitar o contexto do seu
surgimento e as interações com a sociedade que a transformaram e influenciaram sua práxis
durante os séculos. A criação da universidade é marcada pela luta entre o poder monárquico e
papal, que reivindicavam a soberania sobre o povo. As universidades foram criadas para
disseminar o ensino da Teologia e reforçar a hegemonia da Igreja.
Nesse sentido, Oliveira (2007, p. 120) afirma que no início do século XIII, os dois
polos dominantes encaravam essas instituições “como importantes pontos de apoio político e
cultural. Em função disso, editaram leis e bulas com o objetivo de instituí-las, protegê-las e
nelas intervir tanto no ensino, como nas relações entre estudantes e mestres e entre estes e a
comunidade.”.
A partir do movimento do Renascimento e Iluminismo nos séculos XVI e XVII,
ocorre uma ruptura do status quo que predominava a época, ocorre “o enfraquecer do
teocentrismo, com o ascender do antropocentrismo; e com o domínio hegemônico de uma
nova classe – em que a burguesia se afirma, em termos econômicos e geopolíticos na
conhecida fase comercial do capitalismo” (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017, p .23).
Entretanto, para Bianchetti e Sguissardi (2017), essa mudança não refletiu em uma
libertação da tutela na qual a universidade era submetida, pois o controle apenas mudou de
3
mãos, passando naquele momento para a burguesia, que necessitava da formação de mão de
obra para geração de capital.
O modelo de universidade tutelada somente começou a mudar a partir do século XIX,
principalmente em face à fundação da Universidade de Berlim em 1810, com Guillermo de
Humboldt. Para De Paula (2002), Humboldt destacava a importância da pesquisa e do ensino
como função primordial da universidade, tendo na autonomia o requisito do trabalho
científico. Foi também no século XIX que emerge a questão social, caracterizada pelo
desencontro e a negação das promessas da burguesia (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017).
Considerando o papel social assumido a partir desse século e a intrínseca relação entre
universidade e sociedade, Sobrinho (2015, p. 583) afirma que “a universidade justifica a sua
existência ao cumprir suas responsabilidades sociais, isto é feito por meio da vivência de
valores existenciais e humanos e, por vocação e demanda, pela produção e socialização de
conhecimentos”. O autor acredita que a aprendizagem, a produção e disseminação de
conhecimentos são os alicerces da construção social, pois “contribuem para a construção das
bases de uma nação socialmente justa, culturalmente elevada, politicamente democrática e
economicamente desenvolvida” (SOBRINHO, 2015, p. 583).
A universidade se transformou e hoje sob o olhar de Burigo e Ramos (2014, p. 48),
entende-se: “como espaço institucional histórico de formação humana, de reflexão crítica, de
produção e socialização de conhecimento voltado para a construção da cidadania, numa
globalização da vida e da dignidade humana”. As a universidade sustenta e opõe a ideologia
da sociedade, como um espaço de criação, de expressão de pensamentos livres, que pode
desestabilizar o status quo.
É regida sob o tripé do ensino, da pesquisa e da extensão. Quanto ao ensino, Freire
(1979) defendia que a educação transforma realidades. Através do processo de formação e da
busca por conhecimentos, o homem se conscientiza e a consciência vai para o mundo, ele
passa a se conhecer e tende a se comprometer com a sua própria realidade, passando a ser
sujeito da sua própria ação. A conscientização crítica somente ocorre com um processo
educativo de conscientização.
Quanto a pesquisa e a extensão, Pivetta et al. (2010) enuncia que a extensão
transcende a transmissão, divulgação ou aplicação do conhecimento pelo conhecimento. A
extensão é expressa na academia através da articulação do ensino e pesquisa no cerne da
universidade e sociedade, voltada às continua procura em problematizar demandas sociais
emergentes. Boaventura Santos (2005) afirma que as atividades de extensão nas universidades
tem o objetivo do apoio solidário na resolução dos problemas da exclusão e da discriminação
sociais, dando-se voz aos grupos excluídos e discriminados.
Nessa perspectiva, Burigo (2016, p. 16) trata da indissolubilidade do ensino, pesquisa
e extensão universitária:
A pesquisa, distante do ensino e da extensão, torna-se individualizada. Por outro
lado, a extensão perde sua finalidade, se não estiver associada ao ensino e
à pesquisa. E o ensino perde a sua essência de construção e reconstrução do
conhecimento, se não estiver associado à pesquisa como campo de investigação e
à extensão como campo de socialização do saber e revitalização desse ensino e
dessa pesquisa.
A partir desse momento se propõe conhecer também as bases históricas da
terceirização. Terceirização, que segundo Giosa (2017), pode ser definida como um processo
de gestão pelo qual se repassam algumas atividades a terceiros, ficando a empresa tomadora
concentrada apenas nas tarefas essencialmente voltadas ao mercado em que atua. Para Silveira
(2013) na administração pública terceirizar licitamente é transferir a terceiros as atividades
que não constituam o objeto principal da entidade, denominadas de atividades-meio, que,
4
segundo a doutrina, são voltadas ao apoio operacional. Conceito que pode ser ampliado no
caso da lei de terceirização irrestrita ser institucionalizada.
A Terceirização surgiu nos Estados Unidos por volta de 1940, durante a Segunda
Guerra Mundial, vista a necessidade da sobrecarregada indústria bélica norte americana em
focar seus esforços na produção de armas, de forma a suprir seus exércitos e os aliados,
transferindo a outras empresas as atividades de suporte (QUEIROZ, 1998).
No Brasil, o modelo foi importado na década de 50, com a chegada das multinacionais
do ramo automobilístico (JEREMIAS; BEUREN, 1997). Todavia, a presença da terceirização
na Administração Pública brasileira ocorreu de forma mais acentuada na década de 90,
durante o governo neoliberalista de FHC, legitimada pela Reforma Gerencial de 1995 que
previa o enxugamento da máquina estatal em termos de pessoal (CASTRO JUNIOR; SILVA,
2011). Os autores salientam que “o mecanismo da terceirização ancorou-se no discurso
depreciativo do servidor público, adicionado à bandeira da modernização, qualidade e redução
do Estado” (CASTRO JUNIOR; SILVA, 2011, p. 3).
Entre as universidades federais não foi diferente. Desde os anos 90 a terceirização tem
feito parte da rotina dessas instituições. Intensificou-se ainda mais com a implantação do
Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), a partir de
2007, onde houve uma expansão de investimentos nas IES visando o incremento no número
de vagas nos cursos de graduação, criação de novos cursos e construção de novos Campi.
Todavia, o plano não previa uma proporcional ampliação nos quadros de servidores,
principalmente Técnicos Administrativos em Educação. A solução foi de recorrer à
terceirização (SILVA; PREVITALI, 2016). Nesse contexto, corrobora Manarino (2017) ao
destacar a influência do REUNI na Universidade Federal de Juiz de Fora. De 2010 a 2014 as
contratações terceirizadas aumentaram em 40%, passando de 560 para aproximadamente 790
funcionários terceirizados.
Há de se salientar, que o gestor público federal, mesmo que discricionariamente
optasse pela contratação de servidores estatutários para certos cargos, não o poderia em razão
da extinção de cargos disposta pela Lei nº 9.632/98, citam-se os serviços de manutenção,
limpeza, vigilância, conservação entre outros. E a Instrução Normativa MPDG nº 05/2017,
art. 5, § 1º, prevê a possibilidade de terceirizar esses cargos (BRASIL, 2017).
2.1 IDENTIDADE E PERTENCIMENTO DO TRABALHADOR TERCEIRIZADO
Com relação à IN 05/2017, a própria definição legal das características da
terceirização já carrega certa contradição, ao determinar à Administração que a terceirização:
“não gera vínculo empregatício entre os empregados da contratada e a Administração,
vedando-se qualquer relação entre estes que caracterize pessoalidade e subordinação direta.”
(grifo nosso) (BRASIL, 2017).
Embora, o legislador tenha demonstrado preocupação quanto ao uso dos recursos
públicos, no sentido de possíveis favorecimentos influenciados por inter-relações informais, o
fato é que o serviço é prestado por pessoas e a conotação de impessoalidade pode influenciar
a indiferença, se interpretada de forma equivocada.
A preocupação com a pessoa (trabalhador) por de trás do serviço terceirizado foi
observado por LAPA (2015, p. 29) em um estudo na Universidade Federal de Santa Catarina:
A terceirização traz em seu processo facetas que merecem um estudo mais
aprimorado, uma vez que nele estão inseridos indivíduos. Estes não devem ser
percebidos apenas como bens ou serviços descartáveis, atrelados à utilidade que
exercem para as demandas de atividades consideradas secundárias nas organizações
formais públicas ou privadas.
5
De acordo com Moccellin (2016), o fato do terceirizado não possuir vínculo
empregatício com a tomadora do serviço, gera a descaracterização da relação de emprego,
causando sofrimento, perda de direitos trabalhistas e falta de qualidade nos serviços prestados,
“é como se o empregado terceirizado simplesmente não existisse em seu ambiente de
trabalho” (MOCCELLIN, 2016, p. 263).
A autora reforça seu posicionamento quando menciona que essa “invisibilidade” pode
ser constatada pela falta de cordialidade ao deixar de cumprimentá-los, alguns recados são
esquecidos de ser repassados e a impossibilidade de frequentar certos lugares. E credita essa
indiferença ao critério de impessoalidade trazido na lei: “tudo isso decorrência do medo de
que o reconhecimento do terceirizado como pessoa no ambiente em que trabalha possa
caracterizar a pessoalidade, reconhecendo- se, assim, o vínculo de emprego com a tomadora
de seu serviço” (MOCCELLIN, 2016, p. 264).
Trabalhadores estáveis e terceirizados, apesar de dividirem os mesmos espaços, não se
sentem parte do mesmo coletivo, à medida que possuem sindicatos diferentes, realizam greves
separadas, implicando na não construção de solidariedades e estranhamentos entre as duas
categorias (LIMA, 2010). Essa segregação gera perda de identidade do terceirizado para com
a tomadora de serviço e seu grupo social.
Brito et al. (2011) observa que os trabalhadores efetivos se identificam com a
organização, diferenciam-se e são diferenciados pelos gestores em relação aos terceirizados,
desde a cor dos uniformes, uso dos espaços nos restaurantes, transportes e festas da empresa.
Nesse ponto, verificam-se várias universidades federais brasileiras que não consideram
os terceirizados como usuários dos seus restaurantes universitários, citam-se algumas, por
exemplo, a Universidade Federal de Mato Grosso: “Público alvo: universitários, servidores e
visitantes” (UFMT, 2018), Universidade Federal do Espirito Santo: “Os restaurantes
universitários da UFES atendem prioritariamente a comunidade acadêmica (estudantes e
servidores)” (UFES, 2018), Universidade Federal de Minas Gerais: “Estudantes assistidos
pela Fump, demais alunos da UFMG, professores, servidores técnicos e administrativos em
educação e menores da Cruz Vermelha” (UFMG, 2018), Universidade Federal de Uberlândia:
“Estudante / Professor / Técnico Administrativo / Comunidade Externa” (UFU,2018).
Os temporários são vistos como menos qualificados que os efetivos, ao passo que lhes
faltaram “competência” para serem admitidos diretamente pela empresa: “estabelece-se,
assim, uma divisão entre eles, como se existissem trabalhadores de primeira e de segunda
categoria, dificultando a convivência social e a identidade de classe entre o grupo,
desestruturando o coletivo no trabalho” (BRITO et al. 2011, p. 81).
Em universidades federais, essa discriminação tende a ficar mais evidente levando em
consideração os melhores salários ofertados, a via de acesso por concurso público e a pouca
quantidade de vagas de trabalho, o que acaba por selecionar os candidatos mais escolarizados
e habilitados (cursos preparatórios); logo, perpassando aí por uma questão de renda.
Identidade e trabalho tem uma relação intrínseca na natureza humana, pois “através do
trabalho, o ser do homem se distingue do ser dos animais e do ser das coisas: o sujeito
humano passa a poder se assumir como sujeito em contraposição ao objeto.” (KONDER,
1996, p. 11).
Machado (2003) estabelece a existência da identidade pessoal e a social. Enquanto, a
identidade pessoal está relacionada a uma constituição individual do conceito de si, no
contexto social e organizacional, perpassa por um processo de construção e trocas: “ela
orienta a ação dos indivíduos e é dinamicamente construída por meio de interações sociais,
identificações e afiliações” (MACHADO, 2003, p. 63). Silva, Hall e Woodward (2000)
reforçam a ideia de construção da identidade, ou seja, é mutável, se transforma com o tempo
tanto pelos símbolos quanto fruto de interações.
6
De acordo com QUINTINO (2008), o sentimento de identidade se materializa
mediante a sensação de pertencimento, a identidade não é descoberta e sim vivenciada e
construída, a partir do empenho, da avaliação e crítica da identidade no seu ser e no seu fazer
ser. Rego e Souto (2004) afirmam que bem-estar psicológico dos indivíduos depende da
satisfação de necessidades sociais, de significado, de identidade, de apoio e de pertencimento.
Os trabalhadores que se sentem identificados e pertencentes a uma organização demonstram
em troca lealdade e comprometimento.
Freire (1979) defendia que a primeira condição para um ato comprometido é a
capacidade de ação e reflexão do homem, consciente que está no mundo e saber-se nele. Ele
se identifica com sua própria ação, objetiva o tempo, temporaliza-se, faz-se homem-história.
Nesse sentido, QUINTINO (2008, p. 61), que acredita que a relação “engessada” de trabalho
do terceirizado, extremamente fiscalizado, sem a possibilidade de opinar, refletir, dialogar no
seu ambiente de trabalho é “incompatível com o surgimento de um trabalho comprometido,
consequentemente, com a gênese de um pertencimento, de uma identidade com a
instituição.”.
A identificação, o pertencimento e o comprometimento de um funcionário com a sua
organização são fundamentais para o atingimento dos objetivos de ambos nessa relação. A
identidade organizacional é essencialmente constituída pela transmissão dos sistemas interrelacionados de crenças e símbolos verbais e visuais, das suas memórias e sua historia.
(RIBEIRO; BARBOSA, 2007).
Para Santos (2014) a narrativa da historia institucional evidencia suas raízes e seus
princípios, é o fio condutor que liga o passado, presente e o futuro, dando coerência às suas
ações em uma perspectiva temporal. A história e a memória organizacional são verdadeiros
elementos de legitimação, possibilita singularidade frente aos diferentes públicos que podem,
assim, identificar-se. Revisitar as origens “[...] não apenas recupera seu legado, mas coloca
em evidência e legitima discursivamente seus feitos, seus atos, suas decisões, reforçando sua
existência por meio de uma comunicação afirmativa que ressalta sua função social”
(SANTOS, 2014, p. 63).
Quando, a organização é uma universidade pública, a identificação dos seus
trabalhadores com o seu passado, presente e os seus objetivos futuros, se torna ainda mais
importante devido a todo o contexto histórico e o papel de transformação da sociedade,
principalmente em países como o Brasil que enfrenta sérios problemas de desigualdades
sociais.
2.2 PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO TERCEIRIZADO
Em termos da precarização, a literatura elenca uma série de motivos quando compara
os terceirizados aos efetivos: a remuneração é menor em 27,1%; a jornada se estende em 3
horas a mais semanalmente; morrem mais de acidente de trabalho em pelo menos três setores
(energia elétrica, petróleo e construção civil); as empresas terceirizadas abrigam as
populações mais vulneráveis do mercado de trabalho (mulheres, negros, jovens,
migrantes/imigrantes), não pelo caráter social, mas em razão da situação mais desfavorável,
que força a submeterem a certas condições (ALVES, 2017)
Rodrigues (2016), analisando os dados da terceirização no Instituto Federal de São
Paulo, evidenciou que há uma concentração de trabalhadores nas faixas etárias entre 20 e 30
anos, mas também entre a de 51 a 55 anos. Quanto à escolaridade dos terceirizados, a maioria
possui ensino médio completo, porém funções ligadas à limpeza concentram os funcionários
com escolaridade mais baixa, entre o ensino fundamental incompleto e completo; com
remuneração até dois salários mínimos. O autor destaca ainda as principais falas dos fiscais de
contratos terceirizados em relação à gestão da prestadora com seus funcionários:
7
Negligente, há atrasos de salário e benefícios, há alta rotatividade. Não existe
seleção, falta competência para vários funcionários. É distante, com pouca
participação, percebo a intenção somente de redução de custos pelas empresas. A
empresa não dá o apoio necessário ao funcionário. O funcionário terceirizado tem
dificuldade de esclarecer dúvidas com seu RH (RODRIGUES, 2016, p. 80).
Monteiro et al. (2004), em um levantamento do perfil de empregados terceirizados de
um hospital universitário identificou que 8% da população estudada não frequentou a escola e
64% tinha escolaridade entre a 1ª e a 7ª série fundamental, além de cerca de 44% destes
trabalhadores são funcionários da empresa há menos de um ano.
As altas de taxas de rotatividade também são apontadas nos estudos. De acordo com
Alves (2017) a permanência no trabalho é de 5,8 anos para os trabalhadores diretos, enquanto,
os terceiros são de 2,6 anos. Carvalho e Bridi (2015) constaram que 63,9% dos trabalhadores
amostrados já trabalharam em mais de uma empresa terceirizada, ou seja, uma realidade
duradoura em suas vidas.
No setor público a rotatividade tem uma peculiaridade, pois os contratos de serviços
não podem se estender além de cinco anos pela Lei nº 8.666/93, então é comum que eles
sejam demitidos ao final do prazo ou sejam recontratados por outra empresa e permaneçam no
mesmo local. Para Carvalho e Bridi (2015) se já não bastasse a rotatividade inerente à
terceirização, o sistema de licitação pelo menor preço da administração pública fomenta a
garantia de que os terceirizados dificilmente almejarão mais direitos e melhores
remunerações, à medida que vencer uma licitação significa, via de regra, um aperto nos custos
da mão de obra.
A alta rotatividade e o processo de flexibilização das relações de trabalho tem sido
responsável pela geração do medo do desemprego, sentimento de insegurança e fragmentação
dos vínculos indivíduo-organização (BRITO et al., 2011). O grande número de
desempregados no Brasil incentiva os baixos salários e a perda de direitos trabalhistas. Os
empresários se beneficiam da lei da oferta e da procura e os governos praticam reformas
trabalhistas para incrementar a geração de empregos.
Bauman (2005, p.11) explica esse mecanismo ao analisar o impacto do medo na
sociedade moderna, quando menciona que o “posterior crescimento da sensação de
insegurança, com a “corrosão do caráter” que a insegurança e a flexibilidade no local de
trabalho têm provocado na sociedade” provoca o colapso do Estado de bem-estar social. As
relações de trabalho são frágeis na modernidade liquida, causando o medo da perda do
emprego e “Essa característica líquida do medo faz com que ele seja explorado política e
comercialmente”.
Nessa perspectiva, não são poucos os casos de descumprimento dos direitos
trabalhistas dos terceirizados por parte das suas empresas; todavia, devido à fragilidade da
relação empregatícia e o medo do desemprego, além do desconhecimento da CLT e de outras
leis do trabalho; acabam sendo tolerados pelos funcionários.
A prova é o elevado número de ações na justiça do trabalho contra as empresas de
prestação de serviços (ABDALA, 2008). O que reflete na própria tomadora do serviço que
acaba respondendo subsidiariamente. Dentre as quais se encontram as universidades federais,
cujo tamanho e complexidade demandam um grande volume de contratações terceirizadas.
Entre 2010 e 2014 houve um aumento de 3.000% no número de ações trabalhistas movidas a
Universidade Federal de Juiz de Fora (MANARINO, 2017).
As principais causas das reclamatórias judiciais são: o adicional e a disponibilização
de férias; o pagamento de décimo terceiro salário, do vale transporte e alimentação, dos
vencimentos mensais, do recolhimento do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e
da contribuição previdenciária (INSS), além de atrasos na quitação dessas verbas. Somam-se
ainda as questões de saúde e proteção como os adicionais de insalubridade e periculosidade e
8
a disponibilização de equipamentos de segurança individual (EPI) obrigatórios (SILVA;
PREVITALI, 2016).
3 METODOLOGIA
Para a construção dessa pesquisa se aplicou a metodologia do ensaio teórico-científico.
De acordo com Severino (2007), um ensaio se trata de um estudo lógico e reflexivo,
caracterizado pela argumentação, interpretação dos fatos e julgamentos do autor e que não
exige uma forte instrumentalização documental para alcançar seus resultados.
Quanto aos objetivos, pode estar interessado em prover uma opinião; apresentar uma
solução alternativa a um problema polêmico; criticar uma atitude de ação social, política ou
econômica; comentar sobre uma minoria ideológica, discutir um acontecimento que não se
pode corrigir ou demonstrar vieses não percebidos aparentemente (CARMO-NETO, 1992).
Apresenta ainda caráter descritivo e bibliográfico, por descrever as características dos
fenômenos estudados através dos relatos e das abordagens realizadas na literatura correlata.
(MARCONI E LAKATOS, (2011)
Em suma, este ensaio procurou realizar uma análise reflexiva sobre a realidade da
terceirização em universidades publicas federais, com enfoque nas condições vividas pelos
seus trabalhadores. Descrevendo, interpretando e buscando alternativas para os problemas
levantados, com base nas informações trazidas em artigos, dissertações e teses científicas.
A limitação se encontra na essência teórica do ensaio, uma vez que ao se partir de uma
generalização, pode não representar integralmente a realidade de todas as universidades.
4 POLÍTICAS DA UNIVERSIDADE FRENTE À TERCEIRIZAÇÃO
Primeiramente, cabe ressaltar que a terceirização não pode ser vista apenas sob uma
perspectiva negativa. Independente das questões apontadas até então, sabe-se que o Brasil
possui números expressivos de desempregados. Em abril de 2018 a taxa de desocupação
chegou a 12,9% ou 13.4 milhões desempregados (IBGE,2018).
Então, para muitos trabalhadores a inserção no mercado formal de renda ocorre através
da terceirização. Afirmativa constatada pelos resultados do IBGE (2017), onde segundo
pesquisa, foram empregadas 9,8 milhões de pessoas por contratação intermediária, da qual
inclui os terceirizados, ou 18,9% do total de empregos gerados em 2015.
As estatísticas de empregos gerados com a terceirização são relevantes principalmente
quando se revela que majoritariamente são compostos por pessoas com menores
oportunidades de escolarização. O que implica em uma maior dificuldade de acesso ao
mercado e ao trabalho em órgãos públicos onde a prática do concurso público tende a
selecionar os mais instruídos.
Entretanto, reconhecer que a terceirização ocupa um grande número de brasileiros não
significa fechar os olhos aos problemas enfrentados. Dada essas considerações iniciais e
partindo do ponto da escolarização, fica evidente que uma instituição social sabedora da
discrepância de formação dos seus funcionários efetivos e terceirizados (MONTEIRO et al.
2004; ALVES, 2017; RODRIGUES, 2016), não reflita em alguma ação na seara educacional.
Para enfrentar essa problemática, com ciência das estruturas das universidades
federais, propõe-se a promoção ou disponibilização de vagas aos terceirizados em projetos de
extensão no campo do Ensino de Jovens e Adultos (EJA) e de cursos preparatórios para o
vestibular e ENEM. Esses cursos poderiam ser coordenados por professores e ministrados por
alunos de licenciatura, mestrandos ou doutorandos de diversas áreas, como parte da sua
formação acadêmica. No campo da pesquisa, poderiam ser estimulados mais estudos sobre a
identificação do perfil socioeconômico, cultural e instrução desses trabalhadores; com vistas a
estimular novas políticas institucionais.
9
A educação é responsável pelo processo de transformação social, onde o homem se
conscientiza criticamente do seu papel no mundo e se faz sujeito nele (FREIRE, 1979;
QUINTINO, 2008). Então não há lugar melhor que a universidade, com todo seu histórico de
luta contra a opressão e divisões sociais e, ainda mais no Brasil, que possui intensas
fragilidades no ensino fundamental; para incentivar essas pessoas à conclusão dos seus
estudos e oportunizar melhores chances para ingresso ao nível superior público e a pósgraduação (elitizados).
Com melhores níveis de escolarização é possível almejar melhores salários ou novas e
distintas oportunidades de emprego, já que a pesquisa revelou que a terceirização é uma
realidade permanente para muitas pessoas, passando por várias empresas de serviços ao longo
da vida (ALVES, 2017; CARVALHO; BRIDI, 2015). Com aumento da escolaridade dos
trabalhadores, o empresariado é forçado a contratar candidatos mais qualificados, ao contrario
do que acontece hoje onde se prioriza a mão de obra barata para otimizar os lucros.
A discriminação também é sustentada pela desinformação. Foi trazido que os
funcionários ou servidores efetivos mantêm certo distanciamento dos terceirizados a fim de
afastar as hipóteses de impessoalidade previstas em lei (MOCCELLIN, 2016). Sugere-se
nesse caso que seja considerado nos programas de capacitação dos servidores, cursos de
acolhimento e tratamento e que também se abordem os aspectos legais envolvidos na
terceirização. Permitindo aos servidores quebrar certos mitos e possibilitando uma interação
com os terceirizados da mesma forma que interagem entre si.
Sabe-se que os trabalhadores terceirizados carregam consigo sentimentos de
inferiorizarão e preconceitos, adquiridos de experiências passadas e da própria cultura da
sociedade (BRITO et al., 2011). Assim, o acolhimento por parte da tomadora dos serviços é
crucial na adaptação e nos processo de identificação e pertencimento desses funcionários.
Fazer parte dos grupos sociais estabelecidos, das rodas de conversas, das festas dentro e fora
da instituição, permite-os se sentirem em pé de igualdade com os demais e reduzem as
barreiras e estranhamentos.
A construção da identidade e pertencimento em uma universidade não se restringe
apenas aos aspectos relacionais. Deve-se discutir conjuntamente a necessidade de se
disponibilizar o acesso aos espaços que os servidores públicos e toda a comunidade possuem.
De uma maneira mais descentralizada, pode-se citar a livre utilização das cozinhas e
copas dos setores, dos banheiros, dos estacionamentos dos centros de ensino e departamentos
administrativos. No contexto mais amplo, liberar o uso das bibliotecas universitárias (BU) e
dos empréstimos de livros, permitir entrada nos restaurantes universitários (RU) e possíveis
priorizações nos hospitais universitários (HU), tais quais os funcionários estatutários.
Como algumas dessas medidas podem implicar em aumento de custos à universidade e
a proporcional redução às empresas prestadoras, cabe a discussão sobre a reformulação das
licitações e contratos no sentido de prever a compensação. Na planilha de formação de preço
dos contratos terceirizados com dedicação exclusiva (funcionário fica somente na tomadora),
o percentual de lucro dos empresários é calculado sobre todos esses custos (alimentação,
saúde, uniforme), logo a ausência de uma compensação geraria em lucro dobrado.
Ainda sobre os problemas de identidade e pertencimento, propõe-se a formulação de
palestras iniciais oferecidas antes do início das atividades dos terceirizados, objetivando a
sensibilização e divulgação da história das universidades; da importante função social que
representa com o ensino, pesquisa e extensão; das estruturas e funcionamento da instituição.
Em contratações com grande volume de pessoas, haveria a possibilidade de ministrar as
palestras de forma presencial. As demais poderiam ser fornecidas no formato de um vídeo
institucional.
Quando se conhece o passado, os valores, a missão e a visão da universidade pública,
seja um funcionário efetivo ou temporário, ele tende a se comprometer, a empregar seus
10
esforços na qualidade do seu serviço que refletirá naqueles prestados à sociedade (RIBEIRO;
BARBOSA, 2007; SANTOS, 2014). A construção de uma identidade, dos sentimentos de
pertencimentos, da ação comprometida; reduz a taxa de rotatividade, pois o inverso leva a um
funcionário não realizado, que não executa suas atividades a contento e resulta na sua
“substituição”, em um ciclo continuo.
Em relação à precarização do trabalho terceirizado, muitos fatores possuem raízes
mais profundas na economia e na legislação brasileira, sendo de pouca gerência por parte da
universidade. Contudo, vislumbram-se iniciativas administrativas que podem reduzir as
condições laborais deficitárias; portanto, exigem um responsável investimento institucional.
Nesse sentido, a gestão e fiscalização de contratos tem uma função social primordial,
que será evidenciada em seguida, A gestão envolve as funções da administração em planejar,
coordenar, controlar e avaliar uma contratação.
Na etapa de planejamento ocorre a elaboração do termo de referência (TR), esse
documento vai antever todas a normas que regerão uma futura prestação de serviços, como os
as sanções (advertências, multas, rescisão) as empresas que descumprem obrigações
trabalhistas; bem como as medidas de contingência para essas hipóteses, como é o caso das
garantias contratuais, conta vinculada e pagamento por fato gerador. A conta vinculada é uma
conta aberta pela administração para resguardar valores de 13º salários, férias, FGTS e verbas
rescisórias; no pagamento por fato gerador a empresa só recebe os montantes integrais se
comprovar a quitação das suas obrigações trabalhistas (BRASIL, 2018).
Na etapa de coordenação deverão ser selecionadas as prestadoras inidôneas, cujo
histórico não apresente litígios na justiça do trabalho ou notificações na receita federal,
previdência social, caixa econômica (FGTS). De certa forma, ao selecionar empresas que
cumprem com seus deveres, as que não o fazem tendem a desaparecer. A coordenação
também direciona as tarefas de controle, representadas principalmente pela fiscalização de
contratos.
A fiscalização se desdobra tanto na verificação da execução de serviços com
qualidade, quanto no fiel cumprimento dos direitos trabalhistas dos terceirizados. Esta última
função, conforme destaca Viana, Delgado e Amorim (2011) coaduna com a efetivação dos
preceitos constitucionais que consagram a dignidade da pessoa humana e a valorização social
do trabalho.
As universidades federais possuem o poder do interesse público e o poder econômicocontratual, permitindo-lhe aplicar sanções e retenções de pagamento. Essa “vantagem” deve
ser levada como um princípio basilar das atividades de fiscalização, as quais exigem
responsabilidade e dedicação na proteção do trabalhador, que é o partícipe mais frágil no
modelo de terceirização.
Todavia, a realidade da administração pública em termos de fiscalização de contratos
terceirizados é deficiente, a tal ponto que Almeida (2009, p.53) considera a fiscalização
contratual o “Calcanhar de Aquiles da execução dos contratos administrativos”. Nas
universidades federais a situação não é diferente. Pesquisas apontam para a falta de
treinamento dos servidores designados como fiscais; falta de normatização e padronização de
procedimentos internos e; fiscais com dupla função: atribuições normais inerentes ao cargo de
carreira, mais as tarefas de fiscalização (MEDEIROS, 2014; LAPA, 2015).
Nesse ponto, sugere-se a criação de setores ou estruturas nas universidades que sejam
voltadas especificamente à gestão e fiscalização de contratos. Onde sejam elaboradas e
implantadas políticas voltadas aos programas de capacitação dos servidores; à criação de
manuais internos; à composição de equipes multidisciplinares para executar as atividades,
haja vista que a complexidade da legislação trabalhista é uma dificuldade enfrentada; ao
desenvolvimento de softwares e bancos de dados para o controle da situação de cada
terceirizado.
11
As boas práticas de fiscalização permitem a verificação das condições de saúde,
higiene e proteção no trabalho: uniformes, EPI, questões de insalubridade/periculosidade,
jornada de trabalho; e a condições financeiras: salários condizentes com as convenções
coletivas, pagamento do INSS, FGTS, alimentação, transporte, 13º salário, férias, horas-extras
entre outros. No instante da repactuação (reajuste) dos contratos, a planilha de custos da mão
de obra pode ser confrontada eventuais erros ou fraudes detectadas.
Por fim, na avaliação todos os passos anteriores devem ser revistos para que os
problemas a as empresas que não cumprirem com suas obrigações, em especial as
relacionadas aos trabalhadores, sejam eliminadas para os próximos planejamentos.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalhador terceirizado é elo mais fraco do vínculo entre as universidades públicas
e empresas, por isso essas instituições sociais, com todo seu histórico, sua missão social e seu
aparato estrutural não pode considerar essas pessoas como meros instrumentos descartáveis da
prestação de um serviço contratado. Muito menos deve se abster de zelar pelo bem estar desse
sujeito perante a sociedade e do sujeito que trabalha para universidade e em prol dela.
Buscou-se nesse estudo, levantar os principais problemas que os trabalhadores
terceirizados enfrentam na sua prática, em especial os que laboram em universidades públicas
federais, e procurar soluções aplicáveis dentro das limitações legais e estruturais dessas
instituições.
Verificou-se que há possibilidades de melhorias na vida dessas pessoas, sobretudo
com o fomento da educação, combate a discriminações e exclusões, na construção de
identidades e na proteção da dignidade humana e do trabalho que os mecanismos de gestão e
fiscalização de contratos proporcionam.
Algumas dessas propostas podem resultar em algumas despesas adicionais, porém são
irrelevantes em comparação ao orçamento das universidades públicas federais. Contudo,
diferentemente de uma organização social, a redução de custos não pode ser o norteador de
todas as políticas institucionais e sim o combate às desigualdades e ao desenvolvimento
social.
6 REFERÊNCIAS
ABDALA, Vantuil. Terceirização: normatização, questionamentos. Terceirização:
normatização, questionamentos. Rev. TST, Brasília, vol. 74, n. 4, out/dez 2008.
ALMEIDA, Carlos Eellington Leite. Fiscalização contratual:“Calcanhar de Aquiles” da
execução dos contratos administrativos. República Federativa do Brasil, p. 53, 2009.
ALPERSTEDT, Graziela Dias; MARTIGNAGO, Graciella; FIATES, Gabriela Gonçalves
Silveira. O processo de adaptação estratégica em uma instituição de ensino superior sob a
ótica da Teoria Institucional. Revista de Ciências da Administração, v. 8, n. 15, p. 114,
2006.
ALVES, Giovanni. Terceirização: o futuro do trabalho no Brasil. TRABALHO,
EDUCAÇÃO E SAÚDE, v. 15, n. 3, 2017.
BAUMAN, Zygmunt. Identidade: entrevista a Benedetto Vecchi. Zahar, 2005.
12
BIANCHETTI, Lucídio; SGUISSARDI, Valdemar. Da universidade à commoditycidade:
ou de como e quando, se a educação/formação é sacrificada no altar do mercado, o futuro da
universidade se situaria em algum lugar do passado. Campinas: Mercado de Letras, 2017.
BRASIL – PORTAL DE COMPRAS GOVERNAMENTAIS. Nova Instrução Normativa
de Serviços. Brasilia, 2018. Disponível em:<
https://www.comprasgovernamentais.gov.br/index.php/in-servico-faq#P31> Acesso em: 28
mai. 2018.
BRASIL. Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento,
Desenvolvimento e Gestão. Instrução Normativa n. 05, de 30 de maio de 2017. Dispõe
sobre as regras e diretrizes do procedimento de contratação de serviços sob o regime de
execução indireta no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e
fundacional. Brasília, 30 de maio de 2017.
BRITO, Valéria da Glória PEREIRA; VENTOLA, Adriana Marra; CARRIERI, Alexandre
De Pádua. Práticas discursivas de trabalhadores terceirizados e construções sociais da
identidade de exclusão. Revista de Ciências da Administração, v. 14, n. 32, 2012.
BÚRIGO, Carla Cristina Dutra. Uversidade pública federal brasileira: democraticamente
massificada. REXE-Revista de Estudios y Experiencias en Educación, v. 1, n. 1, p. 105124, 2016.
BÚRIGO, Carla Cristina Dutra; SILVEIRA, Cléia Normandina Ramos. O processo de gestão
de desenvolvimento do espaço público na universidade: uma prática educativa e
social. Revista Gestão Universitária na América Latina-GUAL, v. 7, n. 3, 2014.
CARMO-NETO, Dionísio. Metodologia científica para principiantes. Salvador:
Universitária Americana, 1992.
CARVALHO, Lucas Vinicius; BRIDI, Maria Aparecida. Trabalho e desigualdade: a
terceirização e seus efeitos sobre os trabalhadores. Revista da ABET, 2015.
CASTRO JÚNIOR, R.C. SILVA, P.F.C. terceirização e precarização laboral: Análise das
relações de trabalho e das reformas no aparelho estatal brasileiro no governo FHC (19952002). V Jornada de Internacional de Políticas Públicas, São Luís – MA, 2011.
CHAUÍ, Marilena. A universidade pública sob nova perspectiva. Revista brasileira de
educação, v. 24, p. 5-15, 2003.
DIAS SOBRINHO, José. The fractured university: knowledge and social
responsibility. Avaliação: Revista da Avaliação da Educação Superior (Campinas), v. 20,
n. 3, p. 581-601, 2015.
FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 12 Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
GIOSA, Lívio Antonio. Terceirização: Uma abordagem Estratégica. São Paulo: Ed. Pioneira,
1997.
IBGE- INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTATÍSTICA. Aspectos das relações de trabalho e
sindicalização (2015). Rio de Janeiro: IBGE, 2017.
13
IBGE- INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTATÍSTICA. Pesquisa nacional por amostra de
domicílios CONTÍNUA. Rio de Janeiro: IBGE, 2018.
JEREMIAS, Cristiane; BEUREN, Ilse Maria. O papel da controladoria frente ao processo
decisório da terceirização. In: Anais do IV Congresso Brasileiro de Gestão Estratégica de
Custos. Belo Horizonte – MG, 1997.
KONDER, Leandro. A derrota da Dialética: a recepção das ideias de Marx no Brasil até o
começo dos anos 30. São Paulo: Cortez, 1996.
LAPA, J. R. C. S. Desafios e perspectivas na gestão do contrato de prestação de serviços
terceirizados de limpeza na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Dissertação
(Mestrado Profissional em Administração Universitária) - Universidade Federal de Santa
Catarina. Florianópolis, 2015. 196 p.
LIMA, Jacob Carlos. A terceirização e os trabalhadores: revisitando algumas
questões. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, v. 13, n. 1, p. 17-26, 2010.
MACHADO, Hilka Vier. A identidade e o contexto organizacional: perspectivas de
análise. Revista de Administração Contemporânea, v. 7, n. SPE, p. 51-73, 2003.
MANARINO, Michelle Peon. Gestão e fiscalização de contratos de terceirização de mão de
obra: o caso da universidade federal de juiz de fora em um estudo de caso. Dissertação
(Mestrado Profissional em Gestão e Avaliação da Educação Pública) - Universidade Federal
de Juiz de Fora. Juiz de Fora MG, 2017. 83 p.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2011.
MEDEIROS, Maria do Carmo Araújo de. A percepção da fiscalização dos contratos de mão
de obra terceirizada pelos agentes envolvidos nesse processo no âmbito da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte: uma análise sob o modelo do principal-agente. Dissertação
(Mestrado Profissional em Gestão Pública) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
2014.108 p.
MOCCELLIN, Luisa Da Rosa. Quem ganha (e quem perde) com a terceirização? Revista
Justiça & Sociedade, v. 1, n. 1, p. 259-277.
MONTEIRO, Maria Inês; CHILLIDA, Manuela de Santana Pi; BARGAS, Eliete
Boaventura. Educação continuada em um serviço terceirizado de limpeza de um hospital
universitário. Revista Latino-Americana de Enfermagem, vol.12, n.3, 2004.
OLIVEIRA, Terezinha. Origin and memory of medieval universities the preservation of an
educational institution. Varia Historia, v. 23, n. 37, p. 113-129, 2007.
PAULA, Maria de Fátima Costa de. Políticas de avaliação da educação superior e trabalho
docente: a autonomia universitária em questão. Universidade e Sociedade/Sindicato
Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, São Paulo, v. 21, n. 49, p. 5161, 2012.
14
PIVETTA, H. M. Foletto, BACKES, D. Stein; CARPES, A.; BATTISTEL, A. L. Holanda
Tavares; MARCHIORI, M. Ensino, pesquisa e extensão universitária: em busca de uma
integração efetiva. Linhas Críticas, v. 16, n. 31, 2010.
QUEIROZ, C. A. R. S. Manual de Terceirização: Como encontrar os caminhos para a
competitividade, com flexibilidade empresarial e atendimento do mercado, ganhando da
concorrência e satisfazendo os anseios e interesses dos consumidores. São Paulo: STS
Publicações e Serviços LTDA, 1998.
QUINTINO, Carleno Alcides Amorim et al. Trabalhadores terceirizados na UFPR litoral:
desafios no processo da gestão. Dissertação (Mestrado Profissional em Administração
Universitária) - Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2015.
REGO, Arménio; SOUTO, Solange. Comprometimento organizacional em organizações
autentizóticas: um estudo luso-brasileiro. RAE-Revista de Administração de Empresas, v.
44, n. 3, 2004.
RIBEIRO, Ana Paula Goulart; BARBOSA, Marialva. Memória, relatos autobiográficos e
identidade institucional. Comunicação & Sociedade, v. 28, n. 47, p. 99-114, 2007.
RODRIGUES, Rodrigo Favoreto. O funcionário terceirizado: a gestão de pessoas no âmbito
da MPE terceirizada. Um estudo de caso das contratadas pelo IFSP. Dissertação (Programa
de Mestrado em Administração) - Campo Limpo Paulista, SP: FACCAMP, 2016.
SANTOS, Boaventura. Souza. A Universidade no Século XXI: para uma reforma
democrática e emancipatória da Universidade. São Paulo: Cortez, 2005.
SANTOS, Enoque Ribeiro dos. A nova lei da terceirização: Lei n. 13.429/2017: um cheque
em branco ao empresariado. Revista eletrônica: acórdãos, sentenças, ementas, artigos e
informações, Porto Alegre, RS, v. 13, n. 204, jun.2017.
SANTOS, Larissa Conceição. História e legitimação organizacional: reflexões acerca das
narrativas histórico-organizacionais. Organicom, v. 11, n. 20, p. 61-72, 2014.
SILVA, Ricardo Margonari; PREVITALI; Fabiane Santana. A Terceirização no Setor Público
Brasileiro: Um estudo acerca da terceirização na Universidade Federal de Uberlândia e seus
impactos na qualidade do ensino. Jornada do HISTEDBR, n. 11. Cascavel – PR, Out, 2013.
SILVA, Tomaz Tadeu da; HALL, Stuart; WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença:
uma introdução teórica e conceitual. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos
culturais. Rio de Janeiro: Vozes, 2000.
SILVEIRA, Artur Barbosa. Terceirização no serviço público: responsabilidade subsidiária da
união por dívidas trabalhistas. Publicações da Escola da AGU, v. 1, n. 28, 2013.
VALENÇA, Myrian Constantino de Almeida; BARBOSA, Allan Claudius Queiroz. A
terceirização e seus impactos: um estudo em grandes organizações de Minas Gerais. Revista
de Administração Contemporânea, v. 6, n. 1, p. 163-185, 2002.
15
VIANA, Marcio Túlio; DELGADO, Gabriela Neves; AMORIM, Helder Santos.
Terceirização – Aspectos gerais. A última Decisão do STF e a Súmula 331 do TST. Novos
enfoques. Revista TST. Brasília, V. 77, n. 1. Jan./Mar.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. Forma de acesso aos restaurantes
universitários. Disponível em:<http://www.fump.ufmg.br/conteudo.aspx?pagina=186>.
Acesso em: 29 jun. 2018.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA. Restaurantes Universitários.
Disponível em: <http://www.proae.ufu.br/servicos/restaurantes-universitarios>. Acesso em 29
jun. 2018.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO. Como funciona o RU? Disponível
em: <http://www.ru.ufes.br/como-funciona-o-ru>. Acesso em: 29 jun. 2018.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO MATO GROSSO. Restaurantes Universitários (RU).
Disponível em: <http://www.ufmt.br/cartaservicos/index.php?option=com_ content&view
=article&id=127&catid=8&Itemid=326&lang=pt-br>. Acesso em 29 jun. 2018.
16