Os Primeiros Cemitérios Da Vila De São Bento
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Os Primeiros Cemitérios Da Vila De São Bento - Henrique Fendrich
OS PRIMEIROS CEMITÉRIOS
DA VILA DE SÃO BENTO
OS PRIMEIROS CEMITÉRIOS
DA VILA DE SÃO BENTO
Henrique Fendrich
Copyright © 2023, by Henrique Fendrich.
Grafia atualizado segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.
Impressão
Clube de Autores
Escrito em setembro de 2023.
Um provérbio atribuído aos mexicanos diz que cada pessoa morre três vezes: a primeira, quando o coração para e cessam as funções vitais; a segunda, quando o corpo é sepultado; a terceira, quando seu nome é pronunciado pela última vez. Nada se pode fazer contra as duas primeiras mortes, mas a última pode ser adiada.
Sumário
Os primeiros cemitérios da vila de São Bento, p. 9.
Lista de sepultamentos no cemitério católico da vila de São Bento (1879-1900), p. 91.
Lista de sepultamentos no cemitério protestante (evangélico) da vila de São Bento (1889-1899), p. 129.
Lista de sepultamentos no cemitério da vila de São Bento (católico ou protestante) de janeiro a agosto de 1901, p.
132.
Referências, p. 134.
Os primeiros cemitérios da vila de São Bento (1879-1901)
A atual cidade de São Bento do Sul/SC, inicialmente uma extensão da Colônia Dona Francisca (atual Joinville/SC), começou a se organizar a partir de 1873, quando um grupo de imigrantes excedentes da colônia ori-ginária subiu a serra e iniciou a derrubada de matas para a formação de uma nova povoação. Nos primeiros tempos, esses imigrantes precisaram lidar com todo tipo de privação, uma vez que a colônia ainda não dispunha de assistência médica, escolar e religiosa. De diversas maneiras, foi preciso
improvisar
para que problemas cotidianos na vida desses imigrantes pudessem ser resolvidos a contento.
José Zipperer, ele mesmo um imigrante, relatou na obra São Bento no passado
(1951) muitas das agruras a que estiveram sujeitos os pioneiros na colonização da cidade. Essas dificuldades diziam respeito, também, ao modo como deveriam ser sepultadas as primeiras pessoas a falecer na colônia. Inicialmente, houve imigrantes que não chegaram sequer a pisar em São Bento, mas faleceram ainda na casa de recepção ou no hospital de Joinville, logo depois da imigração. Ficker (1973) faz uma lista dessas pessoas, a maioria delas crianças pequenas, mas também alguns adultos como Karl Becker, Marianna Ringwelski, Gustav König, Jacob Eichendorf, Theresia König e Cecília Zipperer.
Em relação aos que morreram mesmo na colônia São Bento, Zipperer alude, de início, à morte de seu irmão Francisco (Franz) Zipperer, ocorrida quando a família ainda morava no rancho destinado à recepção dos imigrantes, na atual Praça Jardim dos Imigrantes. Enquanto preparavam o lote a eles destinados e construíam uma casa para viver, os imigrantes de São Bento permaneciam nesse rancho. Vítima de febre maligna
, Francisco ali faleceu depois de pou-9
cos dias de enfermidade. Contava com apenas 17 anos.
Consternada, a família Zipperer fez o velório no próprio rancho e realizou o enterro no lote que haviam adquirido para residir. Não havia nenhum cemitério na colônia e os mortos tinham que ser sepultados nos lotes de cada família.
A morte de Francisco aconteceu aos 21.02.1874, conforme documentação oficial da Colônia Dona Francisca citada por Ficker (1973). Antes dele, menciona-se apenas a morte de Johann Wilke, aos 17.02.1874, que não era um colono de São Bento, mas um auxiliar do engenheiro August Heeren. Embora fosse apenas um filho solteiro e menor de idade, Francisco Zipperer foi o primeiro imigrante a falecer na colônia. Curiosamente, porém, o próprio irmão José Zipperer, em outro momento de suas memórias, menciona uma outra morte como aquela que teria levado ao primeiro sepultamento realizado em São Bento.
De fato, Zipperer sustenta que estava entre os que trabalhavam na abertura da Estrada Dona Francisca quando apareceram as senhoras Bendlin e Hackbarth, morado-ras da Estrada Wunderwald, e comunicaram que o marido da primeira havia falecido. Era o imigrante Karl Wilhelm Bendlin. Além da dor pela perda, a viúva estava aflita por não ter encontrado homem algum que a auxiliasse no enterro do marido, o qual já havia falecido há três dias e permanecia deitado em seu leito, já exalando um mau cheiro.
A ausência de homens é explicada justamente pelos trabalhos de abertura da Estrada Dona Francisca, então o único meio de ganho dos imigrantes, os quais precisavam quitar os lotes que haviam adquirido da Companhia Colonizadora. Zipperer informa que foram mais de 20 quilômetros que a viúva Bendlin teve que percorrer até chegar aon-de os homens estavam, e o caminho até lá era todo feito de picadas, as quais mal permitiam o trânsito de pedestres.
O engenheiro Alberto Kröhne, que comandava os trabalhos naquele trecho da Estrada, incumbiu José Zippe-10
rer de acompanhar as duas mulheres de volta até a vila e de pedir à direção da Colônia as tábuas necessárias para fazer um caixão e enterrar o morto tão logo fosse possível. Então Zipperer voltou à cidade com as mulheres, passou na casa de seu pai Antônio Zipperer, onde arrumou ferramentas, e começou a montar um caixão, coisa que nunca havia feito.
O caixão foi feito de tábuas rachadas, com três centímetros de grossura, e que não estavam secas. Não havia ainda tábuas serradas naquele tempo. O resultado foi um caixão pesadíssimo, que Zipperer e as duas mulheres precisaram carregar por mais de sete quilômetros, atraves-sando a mata em uma picada para tropas de mulas. Eles pararam para descansar umas cem vezes
, como lembrou Zipperer, e chegaram ao seu destino depois da meia-noite.
Ali, um filho pequeno de Bendlin e um vizinho doentio
velavam o corpo de Karl Wilhelm Bendlin, que, depois de quatro dias, já havia começado a se decompor.
Uma cova já havia sido aberta pela própria viúva, a dez passos da casa da família, que era ainda uma simples palhoça. Uma fogueira era mantida acesa e seu clarão dava à cena um aspecto espetacularmente lúgubre
. Diz Zipperer que ninguém pôde ou quis ajudá-lo com o morto, pois o cheiro que ele exalava era insuportável. Para tentar disfarçar o cheiro, ele conta que deu fortes baforadas em seu cachim-bo. Encostou então o caixão ao lado do morto e fez com que ele rolasse para dentro dele. O caixão, que já era bem pesado quando vazio, tornou-se impossível de carregar com um corpo dentro. Foi preciso amarrar uma corda de taqua-ra ao caixão. Zipperer puxava e as mulheres empurravam.
Só assim o caixão foi arrastado até o lugar da cova, onde foi enfim baixado e fez-se uma sepultura para o morto.
Essa história singularíssima faz com que, ainda ho-je, Karl Wilhelm Bendin seja referenciado como o primeiro imigrante falecido em São Bento
, que é como consta na inscrição de um monumento em sua memória, erigido no 11
local exato do seu túmulo, à atual Rua Augusto Hackbarth.
Entretanto, atualmente já se sabe que, mesmo que não seja considerada a morte do jovem e solteiro Francisco Zipperer, houve outras mortes de imigrantes em São Bento antes da morte de Bendlin, embora possivelmente não tão dramá-ticas, se bem que ninguém tenha deixado escritas as circunstâncias exatas em que elas aconteceram.
Registro da cena de sepultamento de Karl Wilhelm Bendlin, disponível nas memórias de José Zipperer (1951).
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Inauguração de um monumento, em 1948, no túmulo de Karl Wilhelm Bendlin, um dos primeiros imigrantes falecidos em São Bento. O túmulo ficava no próprio lote da família.
Até onde se tem registro, o primeiro imigrante adulto falecido em São Bento foi Michael Witt, imigrante da Prússia Ocidental falecido com 56 anos aos 11.03.1874.
A morte de Bendlin é estimada em setembro ou outubro de 1874 (HENKELS, 2003). Witt aparece na lista dos 70 imigrantes pioneiros de São Bento. Por coincidência, tanto Witt quanto Bendlin professavam a fé luterana e eram moradores na Estrada Wunderwald. Não há nenhum relato conhecido sobre a morte de Witt, mas seguramente seu corpo foi igualmente sepultado no próprio lote que a família havia adquirido na expectativa de viver melhores dias.
José Zipperer, após ter conseguido realizar o enterro de Bendlin, passou a ser conhecido como fabricante de caixões, e inclusive foi contratado pela direção da Colônia para fazer exatamente isso de maneira oficial
, já que, invariavelmente, morreriam pessoas em São Bento e não se desejaria que suas famílias passassem por apuros como os Bendlin. Por muito tempo, na falta de tábuas serradas, esses caixões continuaram a ser feitos com tábuas de pinho, ra-13
chadas. Zipperer afirma que muitos dos seus companheiros dormem o sono eterno
e repousam na última morada
em caixões construído por