ILPF Inovacao Com Integracao de Lavoura Pecuaria e Floresta 2019
ILPF Inovacao Com Integracao de Lavoura Pecuaria e Floresta 2019
ILPF Inovacao Com Integracao de Lavoura Pecuaria e Floresta 2019
ILPF
inovação com integração de
lavoura, pecuária e floresta
Davi José Bungenstab
Roberto Giolo de Almeida
Valdemir Antônio Laura
Luiz Carlos Balbino
André Dominghetti Ferreira
Editores técnicos
Embrapa
Brasília, DF
2019
Exemplares desta publicação podem ser adquiridos na
Confúcio
Dedicatória
Esta obra é dedicada ao nosso querido colega e amigo que nos deixou recentemente,
Armindo Neivo Kichel. Além de todo um legado pessoal de dedicação ao trabalho, ele
foi um dos principais entusiastas e com recursos de seus projetos financiou a produção
de uma modesta edição, com pouco mais de 80 páginas te texto, que nos trouxe até
esta, que passa de 800.
Os Editores
“Quem conheceu o Armindo, jamais dirá que não se lembra dele. Conheci-o no
início dos anos 90, em um curso de especialização oferecido pelo Procitrópicos e
pela Universidade Estadual de Londrina – Departamento de Agronomia, desde essa
época nossa amizade começou a ser construída. Assim, aprendi a admirá-lo como
colega, pelo seu conhecimento, dedicação e capacidade de trabalho. E acima de tudo,
aprendi a admirá-lo enquanto pessoa humana, pela sua alegria, apreço pela família e
atenção com os colegas. Sempre que precisei, ele nunca recusou compartilhar seus
conhecimentos e informações. Tive a honra de coordenar uma prestigiosa equipe da
Embrapa sob o tema ILPF, muitas vezes lhe demandei tarefas e muitas vezes ouvia
dele: “Balbino, vou fazer porque é você quem está me pedindo”. E sempre recebi suas
contribuições que foram importantes para o desenvolvimento desse projeto.
Em qualquer evento que participava sempre tinha uma presença marcante; muitas
vezes com opiniões firmes; porém sempre sincero e espontâneo. Animava sempre
discussões, muitas vezes polemicas e acaloradas; mas nunca omitia suas opiniões e
posicionamentos. Nas discussões técnicas, via de regra eram acompanhadas de um
cálculo matemático e sempre com uma visão prática. Muitas foram as viagens que
fizemos juntos, quer fossem para ministrar palestras e treinamentos ou para participar
de reuniões e cursos; nessas ocasiões procurávamos trocar ideias e experiências nos
intervalos e durante as refeições. As histórias e estórias ficarão na minha memória e
sempre que encontrar amigos em comum, serão relembradas com saudosismo e o
pesar da sua ausência terrena.
Segundo Platão (filósofo grego, que viveu entre 428/427 - 348/347 a.C.), o corpo
(transitório) é o veículo da Alma (permanente), dessa maneira, a Alma existia antes do
corpo, existe no corpo e continuará a existir após a extinção do corpo.
Armindo, cumpriste tua missão aqui; sou muito grato por ter convivido e bebido na
fonte do seu conhecimento; acredito na imortalidade da Alma, nos reencontraremos! ”
Balbino
“Armindo, Armindo onde você estiver, nosso grande professor, obrigado pelos
ensinamentos que nos deixou, a sua força de trabalho e facilidade de transformar
teoria em prática nos enriqueceu como profissional e como pessoa. OBRIGADO POR
TUDO. FICA COM O NOSSO SENHOR. ”
Tarcísio
“Estamos todos entristecidos pela perda irreparável de nosso prezado Armindo Neivo
Kichel, chamado pelo Supremo Arquiteto do Universo, para compor a mesa dos
trabalhos CELESTIAS, junto a ELE.
Foram anos e anos de muitos ensinamentos transmitidos pelo amigo Armindo. Tinha
o dom de transformar teoria em prática, transmitindo ao empresariado rural e a nós
profissionais das Ciências Agrárias, conhecimentos e tecnologias, adquiridos ao longo
de sua vida profissional.
Cacá
Pasto “rapado” que não cobre o pé-do-boi é pecuarista quebrado (Armindo Neivo
Kichel).
“Do Procitrópicos Cerrados à ILPF, como foi bom ter vivido esse momento com suas
tiradas e ensinamentos que ficam na lembrança. ”
Marcos Teixeira
Ramon Costa Alvarenga (Embrapa Milho e Sorgo)
Me considero um privilegiado por ter convivido com você Armindo. O aprendizado foi
grande e, agora, levo a lembrança do seu companheirismo.
Ramon
Deus convocou-o para iniciar o projeto ILPF no céu, logo seguiremos e refaremos um
time vencedor, que tive privilégio de participar na Terra.
Renato Fontaneli
Querido amigo Armindo você continua entre nós, esteja onde estiver. Todas as
atividades que envolvem ILP/ILPF sempre serão lembradas com sua imagem em
nossos corações. Com o tempo aprendemos a conviver e um mutuo respeito cresceu
entre nós. Discussões, argumentação e consenso foram nosso caminho. A certeza
de nossa amizade construída ao longo desses anos aqui na Embrapa Gado de Corte
se comprovou com a presença de seu filho, após sua partida, em meu escritório
e as palavras que deixastes a ele a meu respeito. Seu modo de ser, o poder de sua
comunicação e capacidade de trabalho serão sempre lembrados. Deus lhe abençoe e
ilumine seu caminho.
Macedo
Quem conheceu o Armindo não se esquece do seu jeito alegre, questionador, cheio de
vitalidade e intenso com a família e amigos. Com uma capacidade incrível de raciocinar
rapidamente com números e de se expressar na mesma velocidade e na quantidade
de palavras, estava sempre atualizado nas questões da pecuária e nos auxiliou e
influenciou com sua experiência adquirida no campo e na Embrapa ao longo de todos
estes anos. Para o Armindo não tinha tempo ruim para o trabalho, sempre tinha coisa
nova pra fazer, tanto é que, depois de anos de experiência, decidiu voltar aos estudos
no doutorado, quando parecia “menino novo estudando”, cheio de ideias para colocar
em prática. O tema ILPF foi com o qual mais trabalhou, desde o início de sua carreira
profissional, lá no Sul, e durante toda a sua estada conosco no Mato Grosso do Sul, e
contribuiu ativamente com as tecnologias que a Embrapa desenvolveu neste tema,
principalmente para o Cerrado brasileiro. Também, contribuiu muito na transferência de
tecnologia em ILPF para o Brasil afora, e este livro é parte desta iniciativa, participando
de inúmeras apresentações, em dias de campo, palestras, cursos, programas de rádio
e TV, que o deixaram muito conhecido. Foi assim que o conheci e onde quer que você
esteja agora, Armindo, imagino que continue intenso. E é com este “retrato escrito”
que vou me lembrar de você, meu amigo e parceiro de trabalho, Armindo!
Giolo
Nosso agradecimento curto e sincero aos colegas que nos apoiaram nessa tarefa
extensa e árdua, em especial aos que, nos reveses, nos encorajaram quando
poderiam ter simplesmente criticado.
Os editores
Apresentação
A Embrapa é uma das principais protagonistas no desenvolvimento e transferência de
tecnologias sobre sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), não apenas
no Brasil, mas no mundo todo. Os trabalhos começaram há quase quatro décadas e não
param e se intensificam. Primeiro foram os sistemas de integração Lavoura-Pecuária,
caminhando depois para sistemas com o componente arbóreo, em nível experimental,
evoluído para escala comercial, os hoje conhecidos sistemas de integração Lavoura-
Pecuária-Floresta. O desenvolvimento conceitual e tecnológico, o posicionamento e
a contribuição desses sistemas para a sustentabilidade da agropecuária, são foco dos
estudos relacionados à ILPF.
Boa leitura!
Nessas quase cinco décadas, essas discussões têm evoluído, cada vez mais baseadas
em ciência e tecnologia, além de contar com influência de agendas políticas e de
diferentes países ou blocos econômicos. O impacto da gravidade do problema afeto
aos principais setores da economia apontados como causadores do aquecimento
global varia conforme a abordagem que se adota na análise.
O fato é que todas as atividades humanas são executadas para satisfazer as necessidades
individuais, sociais e das nações. O consumo, por exemplo, em muitas formas de sua
realização é responsável por impactos ambientais relacionados à produção, utilização
e destinação de resíduos. Estudos e debates visando ao desenvolvimento de sistemas
equilibrados e saudáveis para produção de alimentos, fibras e bioenergia, almejando-
se benefícios para as pessoas e o meio ambiente, são realizados e fomentados em todo
o globo. Contudo, sua efetiva adoção em larga escala é um desafio, mas sistemas como
o ILPF representam sementes para abrir caminho rumo a um novo modelo mental
nesse cenário.
Mundialmente, o setor agrícola vem fazendo sua parte com esmero, e no Brasil não
é diferente. Pelo contrário, verifica-se um grande esforço do país como um todo e
do setor agropecuário em especial visando aumentar sua produção agropecuária de
forma cada vez mais sustentável.
O Brasil tem tido muito sucesso nessas iniciativas. Temos não apenas reduzido o
desmatamento, como também preservado áreas de vegetação natural. Aumentamos
a produtividade das lavouras e pastagens. Produzimos mais usando menos terra e
vamos muito além. O Brasil tem desenvolvido e adotado tecnologias que ao mesmo
tempo melhoram as produções agrícola, pecuária e florestal e, ainda, inovação na
disponibilização de serviços ambientais, especialmente relacionados com a fixação
biológica de nitrogênio, proteção, conservação e melhoria da qualidade do solo e da
água, sequestro de carbono, dentre outras. Entre essas tecnologias inovadoras estão
os sistemas de ILPF, com suas múltiplas vertentes em diferentes partes do país.
Pode-se dizer que esse sistema de produção já está atingindo sua maturidade em termos
de potencial de adoção, ou seja, de sua ampla aplicabilidade no campo. Naturalmente,
existem diversas modalidades e formas de concretização desses sistemas, de acordo
com as condições regionais e as diferentes necessidades e objetivos dos produtores.
A expansão dos sistemas de ILPF, em seus muitos formatos, pode ser notada em várias
regiões do Brasil e em outros países.
Este livro traz o que há de mais recente sobre os sistemas de ILPF com contribuições
de especialistas que desenvolvem e vivem cotidianamente o processo de geração de
conhecimentos e tecnologias numa perspectiva de agropecuária sustentável, resiliente
e inovadora. Este que é, acima de qualquer outro, o objetivo daqueles que decidiram
ser protagonistas em um país que pode se orgulhar da grande contribuição que faz e
fará para produzir alimentos, fibras e bioenergia sustentáveis para um mundo melhor.
Capítulo 1
Sistemas de integração: conceitos,
considerações, contribuições e desafios
Luiz Carlos Balbino
Armindo Neivo Kichel (in memoriam)
Davi José Bungenstab
Roberto Giolo de Almeida
32 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Por outro lado, o aumento inevitável dos custos de produção e um mercado mais
competitivo, têm exigido aumento na produtividade da atividade agropecuária, com
qualidade e rentabilidade, sempre sem comprometer o meio ambiente.
Cada vez mais esses desafios têm alavancado mudanças no setor e o desenvolvimento
agrícola sustentável depende da formulação de uma estratégia que considere além das
técnicas agronômicas, também os seguintes aspectos:
Para atingir tais objetivos, uma alternativa que tem se destacado é o uso de sistemas
de integração que incorporam atividades de produção agrícola, pecuária e florestal, em
dimensão espacial e/ou temporal, buscando efeitos sinérgicos entre os componentes do
agroecossistema para a sustentabilidade da unidade de produção, contemplando sua
adequação ambiental e a valorização do capital natural (Balbino et al., 2011a).
Alguns dos fundamentos básicos da sua viabilidade econômica, são: (i) otimização dos
recursos de produção imobilizados na propriedade rural, como terra e maquinários;
(ii) sinergia entre as atividades de produção vegetal e animal, levando, por exemplo, à
utilização de resíduos agrícolas, à fixação de nitrogênio pelas leguminosas, e à reciclagem
de nutrientes; (iii) diversificação de receitas, mediante a produção e a venda de grãos,
carne, leite, biocombustível, fibras e madeira; (iv) redução do custo total do sistema
agropecuário em decorrência, sobretudo, do melhor uso da infraestrutura de produção
e da menor demanda por insumos agrícolas, com redução dos custos decorrentes da
utilização dos resíduos agrícolas na alimentação animal e da oferta de pastagens de
34 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
melhor qualidade; (v) aumento da receita líquida (lucro) do sistema devido ao aumento
das receitas e à redução do custo total; (vi) maior estabilidade temporal da receita
líquida diante das externalidades; e (vii) dinamização de vários setores da economia,
principalmente a regional.
apenas cinco meses, chegando até cinco anos. O componente florestal (madeireiro e/
ou não madeireiro) pode ser utilizado por um período curto ou longo, dependendo da
espécie utilizada e sua finalidade.
Em regiões com clima e solo favoráveis à cultura de grãos, sem introdução do componente
florestal, pode-se utilizar, por exemplo, a pecuária por períodos de 6 a 18 meses, na
entressafra da lavoura, utilizando-se lavoura por dois a cinco anos. Os principais objetivos
do uso da pastagem em sistemas predominantemente agrícolas são:
• Rotação de culturas;
• Aumento da produção de palhada para o sistema de plantio direto (SPD);
• Manutenção do solo com cobertura vegetal pelo maior tempo possível;
• Reestruturação física do solo;
• Aumento do teor de matéria orgânica do solo;
• Redução de pragas, doenças e plantas daninhas.
Nas regiões onde a infraestrutura é insipiente ou ausente, com clima desfavorável e solos
marginais, de pouca tradição agrícola e com restrições para uso de lavouras de grãos,
deve-se consultar o zoneamento agrícola e limitar os cultivos a culturas mais rústicas,
como o sorgo. Nesses casos, a pecuária permanece por períodos mais prolongados. Nesses
sistemas, as lavouras de grãos têm como objetivo principal a recuperação da qualidade
química e física dos solos das pastagens degradadas ou em degradação. A produção de
grãos cobre parte dos custos da formação da pastagem, devido à receita gerada pelo
grão. A nova pastagem é implantada na sequência, aproveitando a correção da fertilidade
do solo, resultando em maior produtividade e qualidade das forrageiras, principalmente
nos períodos mais críticos do ano, que na maioria das regiões brasileiras é entre os meses
de maio e outubro.
• Renovação da área com plantio de lavoura por um ou mais anos, seguida pela
implantação da forrageira na safra ou safrinha, solteira ou em consórcio, utilizando-
-se as pastagens por seis meses ou permanecer por um ou mais anos e na sequência
retornando com lavoura;
Com a introdução dos sistemas de ILPF, além da intensificação e maior eficiência do uso
da terra, são gerados, também, outros benefícios ao ambiente, tais como: maior sequestro
de carbono, aumento da matéria orgânica do solo, redução da erosão, melhoria das
Capítulo 1
Sistemas de integração: conceitos, considerações, contribuições e desafios 37
Segundo Balbino et al. (2011c) sistemas ILPF vêm sendo adotados em todo o País,
em diferentes combinações entre seus componentes. Por exemplo, na região Sul
do Brasil estão sendo utilizadas aveia-branca, milho, soja e trigo em rotação com
pastagens anuais de inverno (aveia-preta, azevém, ervilhaca, etc.) e de verão
(milheto), ou com pastagens perenes compostas por alfafa, festuca ou pensacola
consorciadas à trevo-branco, trevo-vermelho e cornichão. No Bioma Pampa são testados
38 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
sistemas silvipastoris com Eucalyptus grandis e Pinus elliottii. No Bioma Mata Atlântica da
Região Centro-Sul do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul utilizam-se a aveia-preta
e azevém em cultivo solteiro ou consorciado com ervilhaca ou trevos, para produção de
forragem após as culturas de verão, e o cultivo de culturas de inverno de duplo propósito
(trigo, aveia-branca, triticale, centeio e cevada), para produzir forragem no outono-inverno.
No Paraná, a grevílea (Grevillea robusta) e espécies do gênero Eucalyptus e Corymbia
representam a maior parte da ocorrência de espécies florestais identificadas neste sistema.
No Bioma Cerrado e na Região Norte do Paraná pode ser utilizado o Sistema Barreirão, ou
o Sistema Santa Fé, ou Sistemas Mistos. Assim, são viabilizados os consórcios de grãos
com forrageiras tropicais (Urochloa, Panicum, Andropogon e leguminosas forrageiras),
além de milheto, aveias e sorgo, para produção de forragem no período seco e plantio
no final da estação chuvosa. Na região Central de Minas Gerais (Bioma Cerrado), arranjos
de iLPF são geralmente formados pelos consórcios de eucalipto, pastagem de capim
braquiária e milho para silagem ou grão. Já no Mato Grosso do Sul, o uso do sorgo de
corte e pastejo, em consórcio com Urochloa brizantha cv. BRS Piatã em sistemas de iLP, em
sucessão à soja, antecipa o primeiro período de pastejo, sendo indicado para utilização
pelos animais no final do período da seca. Por sua vez, no Bioma Amazônia são utilizadas
diversas espécies forrageiras e arbóreas nativas e exóticas, com sistemas ILPF realizados
nos estados do Amazonas, Acre, Amapá, Pará, Rondônia e Roraima, onde apresentam
os arranjos que integram, principalmente, os seguintes componentes: i) florestal, com
mogno africano (Khaya ivorensis), teca (Tectonia grandis L.), eucalipto (Eucaliptus urophyla)
e paricá (Schizolobium amazonicum); ii) agrícola, com milho e feijão-caupi; e, iii) forrageiro,
com Urochloa ruziziensis. E na Caatinga estão sendo propostos sistemas de ILP envolvendo
espécies de palma forrageira (Opuntia ficus indica (L.) Mill ou Nopalea cochenillifera
Salm Dyck), milho, gramíneas e leguminosas forrageiras adaptadas ao Semiárido, que
contribuem com a sustentabilidade dos sistemas de produção de leite. São indicados para
a região, como resposta às pressões por produção de alimentos, tanto para a população
humana quanto para os rebanhos bovinos, caprinos e ovinos. Os sistemas agrossilvipastoris
para caprinos e os sistemas agropastoris para o Agreste e o Sertão vêm sendo difundidos
como alternativas sustentáveis para o Semiárido. A introdução de animais em lavouras
comerciais de espécies arbóreas permanentes, favorecendo a manutenção dessas áreas
por meio do controle da vegetação herbácea e da adição de esterco, vem sendo adotada
por produtores de áreas irrigadas (exemplos: culturas de manga, goiaba, acerola e pinha)
e dependentes de chuva na região Semiárida (caju, olicuri e algaroba).
Os principais benefícios e desafios, citados por Balbino et al. (2011b) estão listados neste
trabalho, sem, todavia, estarem agrupados em ordem crescente ou decrescente de
importância ou por componente do sistema.
Sendo os sistemas integrados com florestas uma evolução da ILP, é importante tentar
entender como essa foi contextualizada por diferentes autores. Assim, a ILP é descrita
como a diversificação, rotação, consorciação e/ou sucessão das atividades de agricultura
e de pecuária dentro da propriedade rural, de forma harmônica, constituindo um
mesmo sistema, de tal maneira que haja benefícios para ambas (Alvarenga; Noce, 2005;
Kluthcouski; Yokoyama, 2003; Vilela et al., 2001). A ILP possibilita que o solo seja explorado
economicamente durante todo o ano, favorecendo o aumento na oferta de grãos, de
carne e de leite a um custo mais baixo, devido ao sinergismo entre lavoura e pastagem.
Segundo Kichel e Miranda (2001), as principais vantagens do uso da iLP são: recuperação
da fertilidade do solo; facilidade na aplicação de práticas de conservação do solo e
recuperação de pastagens com custos mais baixos; melhoria nas propriedades físicas,
químicas e biológicas do solo; controle de pragas, doenças e plantas daninhas; uso
eficiente de fertilizantes; maior eficiência na utilização de máquinas, equipamentos e
mão-de-obra; diversificação do sistema produtivo; e, aumento da produtividade do
negócio agropecuário, tornando-o sustentável em termos econômicos e agroecológicos.
Talvez o maior desafio seja dominar e gerenciar a diversidade de variáveis que atuam nesses
sistemas, há que se pensar basicamente no processo de transferência de conhecimentos e
tecnologias. O principal desafio seria o fortalecimento da ATER, por meio de parcerias com
o Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA) e a iniciativa privada. Isso envolve
contato direto com técnicos da ATER pública e privada, por meio da implantação e do
acompanhamento de unidades de referencia tecnológicas (URT) junto aos produtores
rurais (Balbino, et al., 2011c, 2011d).
Diversos fatores devem ser levados em conta nas ações de validação e transferência de
conhecimento e tecnologia, pois podem exercer grandes influências sobre a velocidade e
o nível da adoção dos sistemas integrados. Tradicionalmente, os produtores rurais herdam
a cultura dos seus antepassados, e nesta cultura está a forma de produzir. Apegam-se às
atividades na qual a família dedicou-se ao longo do tempo, tornando-se uma tradição,
passada de pai para filho e, muitas vezes, tendo dificuldade em adotar outros sistemas
de produção, os quais não tenham pleno domínio. Essa falta de tradição em sistemas
integrados também atinge técnicos, professores e pesquisadores, sendo reforçada por
uma formação profissional que muitas vezes desconhece ou aborda o sistema de forma
superficial. Outro fator podemos caracterizar como sendo o medo de mudança ou o
receio de sair da zona de conforto, que é característica do ser humano ter aversão ao risco
quando se depara com a necessidade de mudanças. Temos ainda o desconhecimento
44 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Sistemas integrados de produção tendem a ser mais complexos, pois envolvem uma série de
atividades e, em geral, demandam maiores necessidades de investimentos. Por isso, visando
a diminuir riscos de insucessos, requer que o produtor rural amplie seus conhecimentos
técnicos e mercadológicos associados a várias atividades produtivas. Entre as atividades
Capítulo 1
Sistemas de integração: conceitos, considerações, contribuições e desafios 45
contempladas pelos novos sistemas, a produção de grãos tende a apresentar maiores riscos,
tais como: climáticos, insetos-pragas e doenças, armazenamento, mercado, etc.
Visando apoiar a adoção de sistemas integrados existem, por parte dos órgãos
governamentais, carências importantes em termos de políticas públicas de incentivos à
produção, tais como: aumento de crédito; diminuição de taxas de juros; ampliação do
período de carência, garantia de preços mínimos; redução da carga fiscal sobre produtos
e insumos; e seguro agrícola amplo e eficiente. O Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA) possui Política de incentivos através de linha de financiamento
agrícola, onde os sistemas integrados podem ser contemplados, intitulado Programa
Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (ABC). O Programa ABC é uma linha de crédito
aprovada mediante a Resolução BACEN nº3.896 de 17/08/10 e é tratado em um capítulo
específico nesse livro.
A Embrapa, através de seus técnicos apoiou também a formulação da Lei no. 12.805 que
instituiu a Política Nacional de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, cujo texto pode
ser verificado na seção de anexos. A Lei foi sancionada no dia 29 de abril de 2013. Essa
Lei estende os incentivos especiais previstos pela política agrícola (Lei 8.171/91) aos
produtores que adotarem técnicas de integração entre lavoura, pecuária e silvicultura
(exploração de florestas). Entre os incentivos oferecidos pela Lei estão a prioridade na
obtenção de empréstimos de bancos oficiais, benefícios associados a programas de
infraestrutura rural e preferência na prestação de serviços oficiais de assistência técnica
e fomento.
Outro fator que deve ser levado em consideração são as barreiras fitossanitárias e tarifárias,
ou sejam, restrições no transporte e no mercado para alguns produtos gerados no sistema
entre diferentes estados da confederação.
Considerações finais
Apesar de alguns entraves iniciais à sua adoção, os sistemas de ILPF, por sua maior
complexidade de gestão, acabam por incorporar no sistema produtivo, práticas e cuidados
ambientais e sociais que são cada vez mais considerados como requisitos para agregação
de valor e garantida de mercado para produtos agropecuários.
Por sua vez, o empresário rural disposto a assumir uma postura empreendedora, deve
também buscar sua própria qualificação e montar equipes multidiscliplinares para
enfrentar o desafio da implantação de um projeto sustentável de integração, contando
sempre com o apoio das redes de pesquisa e transferência de tecnologia.
Referências
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 2
Sistemas de integração lavoura-
-pecuária-floresta e o progresso do setor
agropecuário brasileiro
Armindo Neivo Kichel (in memoriam)
Davi José Bungenstab
Ademir Hugo Zimmer
Cleber Oliveira Soares
Roberto Giolo de Almeida
50 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Com relação à pecuária, muitas áreas de pastagens têm sido estabelecidas em sucessão
ou em consórcio com culturas anuais. No caso do Brasil, especialmente nas áreas de
savana que caracterizam o bioma chamado Cerrado, a associação de pastos e cultivos
vem sendo realizada desde as décadas de 1930 e 1940, pelo plantio de forrageiras com
cultivos anuais ou após estes. O estabelecimento do capim gordura (Melinis minutiflora),
colonião (Panicum maximum), jaraguá (Hyparrhenia rufa) entre outros, era feito por
meio de sementes ou mudas nas entrelinhas ou após as culturas de milho, arroz e feijão,
especialmente, em solos mais férteis (Rocha, 1988).
Este processo foi intensificado a partir das décadas de 1960 e 1970, com a abertura
mecanizada de novas áreas nas regiões Sul, Sudeste e, principalmente, no Centro-Oeste,
onde predomina o bioma Cerrado. Nessa região, inicialmente, essas atividades foram
estimuladas por programas de crédito especiais e incentivos fiscais. Grande parte das
áreas de braquiárias no Brasil, e mais especialmente no Cerrado, foram estabelecidas
com culturas anuais após um ou mais anos de cultivo, geralmente, o arroz de sequeiro
(Kornelius et al., 1979).
Das áreas com pastagens cultivadas, mais de 80 milhões de hectares foram formados com
forrageiras do gênero Brachiaria, sendo que destes, 90% são ocupados por duas espécies:
Brachiaria brizantha e Brachiaria decumbens.
C
Figura 1. Animais em sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (A); em sistema de integração lavoura-
-pecuária com pastagem de braquiária após reforma com soja (B) e com pastagem de aveia preta na entressafra
em área de lavoura (C).
52 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Os sistemas de ILPF, com manejo adequado das culturas e pastagens, podem proporcionar
substanciais aumentos na produção, principalmente quando ocorre recuperação de
áreas degradadas ou pouco produtivas. Pela adoção destes sistemas, pode-se evitar
a abertura de novas áreas, com benefícios ambientais, como proteção da vegetação
nativa, conservação do solo e recursos hídricos, além de promover o desenvolvimento
socioeconômico regional. Com a melhoria dos processos produtivos é possível reduzir a
idade de abate dos animais, que com dietas apropriadas, reduzem a emissão de metano
por unidade de produto, contribuindo desta forma, para mitigar a emissão de gases de
efeito estufa na agropecuária. Além disso, as pastagens, o cultivo de grãos, e as florestas
contribuirão para o sequestro de CO2 atmosférico via fotossíntese e posterior incorporação
na forma de matéria orgânica ao solo.
Para avaliar a dimensão do problema, Sparovek et al. (2004) estudaram três cenários para
renovação de pastagens no Brasil, com intervalos médios entre as reformas de cinco,
Capítulo 2
Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta e o progresso do setor agropecuário brasileiro 53
dez e quinze anos, e estimaram áreas de pastagens em renovação de: vinte, dez e sete
milhões de hectares, respectivamente. De acordo com Almeida et al. (2007), somente no
Brasil tropical pecuário, estima-se uma demanda por formação/renovação de pastagens
em área correspondente a 8% das pastagens cultivadas ou cerca de nove milhões de
hectares, com uma necessidade de cerca de 90 mil a 135 mil toneladas de sementes de
forrageiras tropicas por ano.
Produtores de vanguarda, que são ainda uma minoria, têm buscado a renovação e
manutenção das pastagens com a adoção de sistemas de integração, especialmente
ILP e ILPF. Em tais sistemas, a introdução de lavouras não é eventual, mas sim um
componente estratégico de sistemas de produção de carne, leite, grãos, fibras, madeira,
energia e serviços ambientais, que interagem e se complementam. Um exemplo prático
é a utilização de pastagens em integração com lavouras, que proporcionam melhoria
significativa na cobertura vegetal e na matéria orgânica do solo, viabilizando o plantio
direto e, consequentemente, ampliando o potencial de retenção de carbono, favorecido
pela massa aérea e sistema radicular das forrageiras. Por sua vez, o carbono incorporado
ao solo na forma de matéria orgânica é protegido pelo plantio direto, pois não há
revolvimento do solo. Esta proteção é ampliada pela utilização de palhadas de gramíneas
tropicais, principalmente as braquiárias, que apresentam maior capacidade de cobertura
do solo e decomposição mais lenta (Figura 2).
Figura 2. Lavoura de milho safrinha em consorciação com braquiária para pastejo de bovinos seguido por
plantio direto de soja no Centro-Oeste brasileiro.
54 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
No caso do Brasil, com extensas áreas de pastagens para pecuária de corte comercial, a
recuperação direta das pastagens é recomendada quando o diagnóstico das condições
de solo, clima, infraestrutura, disponibilidade de mão-de-obra e recursos financeiros
do sistema não forem favoráveis à adoção de sistemas de integração. Nesse caso, todos
os custos do investimento com a recuperação terão de ser amortizados apenas pela
produção animal.
• Dar maior ênfase à seleção e avaliação de leguminosas para sistemas de ILP e ILPF,
objetivando quebrar o ciclo de pragas e doenças e aumentar a incorporação de
nitrogênio nos sistemas com consequente redução nos custos de produção. Estas
também poderão ter efeito na melhoria da dieta e na produção animal;
• Aprofundar estudos e avaliar cuidadosamente os efeitos, em sistemas de ILP e
ILPF, de culturas transgênicas BT como o milho, que visam o controle de diversas
espécies de lagartas. Essas lagartas por não atacarem o milho podem migrar para a
forrageira, causando danos sérios à mesma. Lembrando que as culturas transgênicas
como o milho BT, são produzidas pelo processo de transferência de genes de uma
bactéria (Bacillus thuringiensis) para o milho. Esses genes fazem com que a planta
produza proteínas tóxicas que causam a morte da lagarta quando esta se alimenta
da mesma;
• Selecionar cultivares de forrageiras, soja, milho e outras culturas com maior
tolerância ao sombreamento e adaptação a sistemas de produção em integração;
• Selecionar variedades e espécies de essências florestais para ampliar as opções
além do eucalipto;
• Desenvolver sistemas de cultivo que facilitem a implantação de espécies arbóreas
sobre pastagens degradadas sem a necessidade de cultivos anuais de grãos. Esta é
uma demanda para sistemas onde não é possível a lavoura, por limitações de solo
e clima, mas também pode ser um estímulo para pecuaristas que não têm interesse
em implantarem lavouras;
• Incrementar os estudos sobre pragas e doenças nos sistemas de ILP e ILPF, assim
como os riscos de aumento de algumas delas e os possíveis efeitos supressores em
determinadas rotações e combinações de cultivos;
• Incrementar os estudos de balanço de carbono e de análise de ciclo de vida de
produtos oriundos de sistemas de ILP e ILPF;
• Avaliar os efeitos na conservação e uso do solo e água e na melhoria da qualidade
do solo pelos sistemas de ILP e ILPF;
• Incrementar experimentos de longa duração de ILP e ILPF em pontos estratégicos
do Brasil, para avaliar a dinâmica do carbono e transformações na qualidade do solo;
• Aprofundar estudos de contabilidade energética e impactos ambientais em
sistemas de ILP e ILPF, assim como comparar as pegadas de carbono ou pegada
ecológica em comparação com sistemas tradicionais em uso;
• Ampliar as atividades de transferência de tecnologia e avaliação econômica dos
sistemas de ILP e ILPF, especialmente, em sistemas reais utilizados por produtores
em fazendas de diferentes regiões;
• Estabelecer zoneamento para uso de sistemas de ILP e ILPF em função do solo,
clima e infraestrutura existente.
56 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Por sua vez, ações já em andamento para recuperação das áreas de pastagens no Brasil,
trarão vários benefícios diretos e indiretos. Os programas já iniciados têm potencial para
otimizar a produção em áreas já ocupadas por atividades agrícolas, bem como estimular
novos cultivos e criações, tais como suínos e aves pelo incremento na produção de grãos.
Considerações finais
Nesse ambiente de inovação e sustentabilidade, surgem excelentes alternativas para
os produtores rurais adotarem uma postura empreendedora, transformando desafios
em oportunidades, fazendo uso dos sistemas de integração, que são opções eficientes,
devido à sua competitividade frente aos sistemas monoespecíficos ou especializados.
Consequentemente, uma vez que o pacote tecnológico básico dos sistemas de integração
já está consolidado, quanto mais cedo o produtor adotar a integração, mais rapidamente
ele se beneficiará dessa oportunidade, contribuindo assim para que a produção brasileira
seja um modelo de sustentabilidade.
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 3
Conceitos, ferramentas e iniciativas para
agricultura sustentável
Davi J. Bungenstab
Aziz Galvão da Silva Júnior
Cesare Zanasi
Cosimo Rota
60 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Aumentar a produção de alimentos para mitigar a pobreza e a fome são grandes desafios
internacionais para a agricultura no futuro próximo e fazem parte dos objetivos de
desenvolvimento sustentável da ONU (United Nations, 2015). As discussões acadêmicas
sobre os efeitos do crescimento populacional sobre a economia mundial começaram
formalmente com o trabalho de Thomas Malthus na Inglaterra do século XVIII, durante
a revolução industrial. Segundo ele, o crescimento populacional e os recursos naturais
limitados, principalmente terras aráveis, levariam à estagnação econômica (Malthus,
1826). No entanto, a tecnologia e os insumos industriais, como a mecanização e os
fertilizantes químicos, aumentaram o rendimento e liberaram uma grande quantidade de
mão-de-obra para a indústria urbana.
Interações economia-ambiente
Os princípios de conservação de massa aplicam-se também às atividades econômicas.
Qualquer processo produtivo é um processo de transformação que extrai recursos básicos
do ambiente para agregar valor ao consumo humano. Embora usando outros recursos
importantes como terra e água, a agricultura tem a grande vantagem de transformar a
luz solar “sem custo” em bens valiosos, em curtos períodos de tempo. No entanto, mais
cedo ou mais tarde, todos os materiais retornam ao ambiente, seja como restos de
insumos de produção ou como resíduos dos produtos finais. No âmbito da agricultura,
portanto, um sistema está mais próximo da sustentabilidade quando exige menos
recursos naturais, gera menos resíduos e gera maior rentabilidade por área, respeitando
os potenciais locais. Isso não pode ser obtido sem a aplicação de recursos econômicos
extras e, portanto, a remuneração por esse investimento extra é fundamental no debate
sobre sustentabilidade.
Os consumidores, ou pelo menos parte deles, podem estar cientes e dispostos a pagar por
produtos mais sustentáveis. Mas eles querem saber o quanto são sustentáveis. Ou, pelo
menos, se são de fato sustentáveis ou não. Como a maioria dos atributos relacionados
62 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Não se espera que esses sistemas sejam “a solução” para todas as situações em todos
os lugares. No entanto, eles têm provado ser uma alternativa, especialmente em áreas
agrícolas com problemas agudos ou graduais de degradação de recursos naturais, onde
a renda do produtor é comprometida e outras soluções de alta tecnologia que são caras
demais para serem adotadas.
Capítulo 3
Conceitos, Ferramentas e Iniciativas para Agricultura Sustentável 63
Esses temas possuem 58 subtemas que visam auxiliar na identificação de riscos nos
sistemas e possíveis lacunas, sendo esses as iniciativas de uma instituição em direção
à sustentabilidade. Os subtemas, no entanto, possuem 116 indicadores, cuja definição,
citada na versão 3.0 das Diretrizes SAFA, é: “… Identificar os critérios mensuráveis para o
desempenho sustentável para o subtema. Esses indicadores padrão são exemplos que podem
ser usados se nenhum outro indicador mais apropriado estiver disponível e for aplicável no
nível macro - o que significa todos os tamanhos e tipos de empresas e em todos os contextos.
Os indicadores padrão servem ao propósito de fornecer métricas padronizadas para orientar
futuras avaliações sobre sustentabilidade. Indicadores de desempenho padrão para cada
subtema facilitam a medição do progresso em direção à sustentabilidade”.
1
Disponível em http://www.fao.org/nr/sustainability/sustainabilityassessmentssafa, acessado em 5/07/2018.
Capítulo 3
Conceitos, Ferramentas e Iniciativas para Agricultura Sustentável 65
processamento e varejo de carne bovina estão cada vez mais envolvidos na compra de
produto sustentável. Sistemas de integração podem, portanto, ter um enorme impacto
na possibilidade de o Brasil aumentar sua competitividade no comércio mundial de carne
bovina. O conteúdo de sustentabilidade de commodities agrícolas é frequentemente
promovido através de sistemas de garantia. Nesse sentido o projeto SALSA implementou
um banco de dados contendo as principais normas de certificação e regulamentos
relacionados à sustentabilidade nas cadeias de carne bovina e de soja disponíveis a
nível mundial. Os usuários dos resultados do projeto SALSA puderam avaliar como o
desempenho de sustentabilidade de suas atividades estava em consonância com os
principais requisitos incluídos nos esquemas de sustentabilidade relevantes. Isto foi feito
para facilitar seu acesso a mercados globais de produtos sustentáveis, cumprindo assim
um dos principais objetivos desse projeto. Além disso, o projeto realizou uma análise
sobre o grau de inclusão das diferentes dimensões da sustentabilidade em diferentes
esquemas de certificação, conforme definido nas diretrizes do sistema SAFA. Esses e outros
resultados do projeto SALSA ofereceram apoio aos formuladores de políticas públicas, à
sociedade civil, aos órgãos de definição de normas e aos consumidores para subsidiar a
discussão sobre a implementação de uma nova estratégia de sustentabilidade.
Considerações finais
Os sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), analisados pelo sistema SAFA,
representa um excelente caso mostrando que a sustentabilidade não está relacionada a um
único protocolo ou padrão de produção, mas pode ser alcançada de diferentes maneiras,
de acordo com diferentes contextos naturais, sociais e econômicos. A complexidade
da avaliação de sustentabilidade e a interpretação dos resultados também emergiu,
mostrando limitações ainda existentes para se fazer medições quantitativas objetivas,
tornando-se necessário integrar o debate sobre a implementação da sustentabilidade com
considerações de viabilidade política, social e econômica. Há, consequentemente, espaço
para uma discussão sobre definição e certificação de sustentabilidade entre os diferentes
stakeholders, como por exemplo, o que está acontecendo nas iniciativas da Mesa Grupo
de Trabalho da Carne Sustentável (GTPS) ou da Mesa Redonda da Soja Responsável (RTRS).
A experiência brasileira com ILPF para a pecuária de corte mostra como, através da fusão
de pesquisas científicas e tecnológicas sólidas com um forte envolvimento das diferentes
partes interessadas da sociedade civil e do setor público e privado, podem ser alcançados
progressos significativos para colocar a sustentabilidade em prática. Por último, mas não
menos importante, a dimensão global de projetos como o SALSA, o sistema SAFA da FAO
e outras iniciativas internacionais, também estão reduzindo as lacunas de comunicação
entre diferentes atores e países que apoiam um debate global efetivo sobre a produção
sustentável de alimentos.
Referências
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Conceitos, Ferramentas e Iniciativas para Agricultura Sustentável 69
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Literatura recomendada
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REAP, J.; ROMAN, F.; DUNCA, S.; BRAS, B. A survey of unresolved problems in life cycle assessment. Part 1: goal
and scope and inventory. The International Journal of Life Cycle Assessment, v. 13, n. 4, p. 290-300, June 2008.
Davi J. Bungenstab
Capítulo 4
Sistemas de integração lavoura-pecuária-
-floresta e o sistema de inovação na
agricultura brasileira
Renato Roscoe
72 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
O sucesso de qualquer setor econômico depende de sua capacidade de inovar e
continuamente introduzir novas tecnologias. A agricultura brasileira moderna é um
exemplo claro disso.
Nos dias de hoje, os desafios são outros. Os membros da cadeia produtiva, em especial
os produtores têm de lidar com temas que vão desde problemas localizados, como
erosão e poluição, novas pragas e doenças, esgotamento do solo e redução da água
disponível até desafios de escala global como crescimento populacional desordenado e
urbanização, mudanças na demanda por alimentos, fibras e energia, aumento nos preços
dos combustíveis fósseis e alterações climáticas. A nova era da comunicação, onde a
conectividade torna o fluxo de informações instantâneo, fornece tanto ferramentas para
uma comercialização dependente de mercados globais quanto possibilita a vigilância da
sociedade, estreitando a distância entre fazendas e consumidores. Os produtores têm
que ser mais eficientes do que nunca. Eles têm que obter alta produtividade da terra
e do trabalho, fornecendo alimentos, fibras e energia para uma população crescente.
Simultaneamente, precisam preservar o meio ambiente, reduzir os gases de efeito de
estufa (emissões GEE) e maximizar o uso dos recursos naturais. E o que é ainda mais
complexo: os produtores têm que enfrentar todos esses desafios em um contexto de
mudanças climáticas, com possível variação das temperaturas e padrões de chuva.
O Cerrado brasileiro foi ocupado de forma mais intensa nos últimos 40 anos. No início,
as pastagens costumavam dominar todas as áreas exploradas. Gradualmente, culturas
anuais como soja, milho, arroz e algodão foram introduzidas com sucesso, expandindo-
se para áreas de solos mais férteis. O sistema de plantio direto tem melhorado o manejo
Capítulo 4
Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta e o sistema de inovação na agricultura brasileira 73
do solo, resultando em sistemas de produção muito eficientes. Por outro lado, os baixos
investimentos e o excesso de lotação animal desencadeiam a degradação dos sistemas de
pastagens com consequente redução dos rendimentos. Apesar de avanços expressivos no
sistema de produção de bovinos (genética, saúde, nutrição), a pastagem extensiva, com
baixos investimentos, está se tornando insustentável, especialmente devido a aumentos
relativos de custos, do preço da terra e exigências da legislação ambiental.
Em 1940, o Brasil era um país tipicamente rural, tendo em torno de 30% de população
urbana, ou seja, cerca de 13 milhões de pessoas residia nos centros urbanos (Brito;
Pinho, 2010). Entre 1940 e 1970, uma mudança significativa ocorreu como resultado dos
incentivos do governo para industrializar o país. Em 1970, a população rural era de apenas
45% do total, e 52 milhões de pessoas estavam nas cidades. A consequência direta da
urbanização e do crescimento populacional foi um aumento na demanda por alimentos
e sua comercialização em centros urbanos. É importante notar que, no início dos anos 70,
o Brasil era um importador líquido de alimentos e a inflação era uma grande preocupação
para o país (Barros, 2006).
Até esse ponto, a agricultura no Brasil desenvolvia-se praticamente apenas nos solos
mais férteis, expandindo-se primeiramente ao longo da costa e em solos argilosos
74 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
originalmente cobertos por florestas em Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina
e Rio Grande do Sul. Embora alguns equipamentos modernos e fertilizantes químicos
começassem a ser importados na década de 50, a modernização da agricultura não se
deu antes de 1970.
Os solos ácidos do Cerrado foram estudados e novas tecnologias para explorar esses
solos foram desenvolvidas. Este foi um momento decisivo no desenvolvimento da
agricultura no Brasil. O Cerrado, com mais de 2000 mil km2, possui condições favoráveis
de topografia, precipitação pluviométrica, temperatura e solos com boas propriedades
físicas para cultivos agrícolas. A dificuldade era dominar as técnicas para se corrigir a
acidez do solo e aumentar os teores dos nutrientes. Nesse aspecto, o desenvolvimento do
sistema de plantio direto foi extremamente importante para manter a matéria orgânica
e melhorar a fertilidade do solo (Roscoe et al., 2006). O sucesso do sistema de inovação
agrícola pode ser ilustrado pelo rápido avanço da soja em direção ao Cerrado depois de
1970 (Figura 1). Mais do que a adaptação a solos ácidos, pobres em nutrientes, a soja
também foi adaptada para baixas latitudes (Embrapa, 2004).
Capítulo 4
Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta e o sistema de inovação na agricultura brasileira 75
Figura 1. Área com plantio de soja em três diferentes regiões do Brasil (Sul,Cerrado e Norte) em diferentes décadas.
Entre os anos de 1977 e 2019 (Figura 2), a área de produção de grãos no Brasil aumentou 70%,
saindo de 37 para 63 milhões de hectares (Companhia Nacional de Abastecimento, 2019).
Concomitantemente, a produção total de grãos aumentou 413%, passando de 47 milhões
de toneladas métricas em 1977 para 241 milhões de toneladas em 2019. Se considerarmos
o rendimento médio observado em 1977 (1.258 kg ha-1), para obter o mesmo valor de 241
milhões de toneladas de grãos por ano, o setor agrícola do Brasil precisaria de 192 milhões
de ha. Isso significa que o incremento da produtividade devido aos avanços tecnológicos
poupou cerca de 130 milhões de hectares de terra nos últimos 42 anos.
Mesmo sem às vezes ter-se uma percepção formal disso, o sistema de inovação agrícola foi
um dos principais fatores para o extraordinário desenvolvimento da agricultura brasileira
nos últimos 40 anos. A questão é: o sistema está preparado para enfrentar os novos
desafios? Como os sistemas de lavoura-pecuária-floresta poderiam ajudar a enfrentar
esses desafios?
Os novos desafios
Em termos de tecnologia, o desenvolvimento do setor agrícola não foi homogêneo
em todo o país e duas realidades são encontradas no Brasil: os sistemas agropecuários
altamente desenvolvidos e os sistemas ineficientes de baixa produção. O primeiro é de
alta tecnologia, dinâmico, capitalizado, e diretamente conectado ao sistema de inovação
agrícola. Em 2006, eles compreendiam 0,5 milhões de agricultores e foram responsáveis
por 87% da produção bruta total da agricultura (Alves et al., 2012). Os 3,9 milhões
restantes de agricultores produziram apenas 13% da produção bruta total da agricultura.
Essa grande parcela teve baixa adoção de novas tecnologias e não participou da rápida
Capítulo 4
Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta e o sistema de inovação na agricultura brasileira 77
evolução do setor agrícola brasileiro nos últimos 40 anos. Incluir este grupo no sistema de
inovação não é uma tarefa fácil.
Uma vez que os novos desafios para o setor agrícola brasileiro variam de problemas locais,
como a degradação de pastagens, até questões globais, como as mudanças climáticas,
torna-se necessária uma conexão dos produtores rurais com os grandes desafios que
afetam e podem vir a afetar suas atividades.
O mundo está mudando em uma velocidade ainda não confrontada pela humanidade.
A sociedade passa por profundas transformações socioeconômicas. Conforme resumido
recentemente por Thomas Friedman, a Terra está ficando mais quente, mais “achatada”,
e lotada (Friedman, 2008). A lógica é que as mudanças climáticas mostram tendências
de aquecer nosso planeta, a revolução tecnológica e a era da comunicação aceleram a
globalização e intensificam o fluxo de informações, nivelando culturas e mercados e o
crescimento populacional aumenta significativamente a necessidade de alimentos, fibras,
energia e materiais para infraestrutura.
21%. A integração entre sistemas de produção agrícolas e pecuários pode ser utilizado para
dobrar a área de plantio de grãos no Brasil, sem demandar abertura de novas áreas nativas.
Considerações finais
Como resumido por Diamandis e Kotler (2012), as inovações tecnológicas atuais e futuras
estão posicionando a humanidade em um período de “abundância”. A incrível velocidade
do desenvolvimento tecnológico está fornecendo inovações disruptivas para todos os
setores da economia. A agricultura tem o benefício não só do desenvolvimento tecnológico
intrínseco, mas também de outros setores da economia. A revolução na biotecnologia,
com redução acentuada dos custos, aumentará seu potencial para ajudar a responder
a muitos desafios agrícolas. A convergência do avanço exponencial em tecnologias da
informação (TI), desenvolvimento de novos materiais (incluindo biogênico) e o novo
universo da nanotecnologia estão mudando dramaticamente os custos de automação
e o desenvolvimento de novos produtos. Esta convergência está afetando não apenas a
eficiência energética, mas também está fornecendo tecnologias para utilização de fontes
alternativas de energia. Maquinários e equipamentos estão ficando mais baratos e mais
independentes, economizando força de trabalho na fazenda. Sistemas de informação de
sensoriamento remoto e geográfico estão popularizarndo a agricultura de precisão e a
gestão de recursos naturais. A grande capacidade de aquisição e processamento de dados
está aumentando a compreensão do clima e aperfeiçoando a previsão meteorológica.
Estações meteorológicas automáticas colocadas em fazendas e conectadas aos celulares
dos produtores estão fornecendo informações em tempo real e ajudando-os na tomada
de decisões técnicas e comerciais.
O sistema brasileiro de inovação agrícola está inserido nesse novo ambiente e está se
preparando para converter todos esses avanços fantásticos em benefícios aos produtores.
Os sistemas de integração lavoura-pecuária-silvicultura representam uma dessas
oportunidades que não pode ser desperdiçada.
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 5
Empreendedorismo para a
sustentabilidade em sistemas de
integração lavoura-pecuária-floresta
Ronney Robson Mamede
Davi José Bungenstab
Paulo Henrique Nogueira Biscola
Camilo Carromeu
Ademar Pereira Serra
84 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O agronegócio brasileiro
É inquestionável o avanço experimentado pela economia brasileira nos últimos anos.
A combinação de fatores como o fortalecimento da democracia, controle da inflação
e crescimento econômico, criaram condições favoráveis que, associadas às riquezas
naturais, e avanços na fronteira do conhecimento, têm contribuído para que o Brasil possa,
finalmente, deixar de ser o “país do futuro” e experimentar, no presente, os resultados de
seu grande potencial produtivo.
Em matéria publicada na imprensa internacional há pouco mais de dois anos, o país era
visto como um forte candidato a tornar-se a quinta maior economia mundial, deixando
para trás países como a França e a Inglaterra (Prideaux, 2009). Atualmente já na sexta
posição, o Brasil tem no agronegócio um dos pilares de seu crescimento. Em menos de 30
anos o país saiu da condição de importador para tornar-se um dos maiores fornecedores
mundiais de alimentos.
Entre 1996 e 2006, a produção agrícola nacional cresceu 365%, totalizando o valor de
R$ 108 bilhões de Reais ao final do período (The Miracle..., 2010). Para a safra 2011/2012,
estima-se que haverá uma produção total de grãos da ordem de 165,9 milhões de
toneladas (Companhia Nacional de Abastecimento, 2012). Apesar das condições
climáticas desfavoráveis em algumas regiões do país terem causado grandes prejuízos,
estes números são ainda 1,9% maiores que os registrados na safra anterior e representam
um dos recordes nacionais de produção agrícola. Em relação à produção pecuária, o
rebanho bovino brasileiro constitui atualmente o maior rebanho comercial do mundo,
totalizando mais de 209,5 milhões de cabeças (IBGE, 2010). Na última década, as
exportações brasileiras de carne bovina aumentaram 10 vezes, colocando o país entre os
maiores exportadores mundiais do produto.
Nesse contexto, o Brasil apresenta uma série de vantagens que o colocam em posição
privilegiada. O país detém a maior área agricultável disponível em todo o mundo - cerca
de 300 milhões de hectares (The Miracle..., 2010). Além disso, a disponibilidade de água
doce, um recurso muito valioso, de forma geral, não está entre as principais preocupações
no curto e médio prazo para o Brasil (Water..., 2009). Outro aspecto importante é que o
país tem alcançado um excelente desempenho em termos de produção agropecuária,
com mínimo subsídio governamental (Agricultural policies..., 2009; The Miracle..., 2010) e
os investimentos em ciência e tecnologia têm possibilitado a implementação de técnicas
revolucionárias na agropecuária, com menor impacto ambiental e ótimos resultados.
Capítulo 5
Empreendedorismo para a sustentabilidade em sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta 85
Empreendedores rurais sabem que terão maiores chances de sucesso à medida que
ampliam seu conhecimento nas áreas em que atuam. Este conhecimento pode ser
obtido por intermédio de literatura especializada, cursos, visitas a feiras, exposições
e dias de campo, programas de rádio e televisão e, naturalmente, também por
informações disponíveis na Internet. É importante notar que, especialmente no
setor agropecuário, o conhecimento e domínio de tecnologias muitas vezes resulta
da experiência prática do produtor e da troca de experiências com pessoas que
conduzem empreendimentos semelhantes.
86 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Embora não seja fácil agregar valor a commodities, sabe-se que produtos obtidos por
meio de processos mais eficientes e menos agressivos ambientalmente tendem a ser
percebidos como de maior valor pelo mercado.
Outros fatores importantes que devem ser levados em consideração para verificação de
uma oportunidade de negócio referem-se a:
A demanda pelos produtos dos sistemas de ILP e ILPF mais usuais são constantes e
as tecnologias para implantação e condução dos mesmos já estão satisfatoriamente
estabelecidas. Além disso, existe uma tendência de se aumentar a demanda por produtos
cujo processo de produção seja ambiental e socialmente correto, sendo um bom
momento para expansão dos sistemas de produção em integração. Por excelência, os
sistemas de ILPF contemplam com racionalidade a combinação de culturas para uma
melhor distribuição da produção durante o período do empreendimento, amenizando
variações climáticas e de mercado. Além disso, o sistema reduz, por exemplo, os custos de
implantação do componente florestal e das pastagens com os cultivos anuais de grãos.
O tempo mínimo de um ciclo de ILPF seria em torno de sete anos, podendo chegar a
mais de 20, dependendo do componente arbóreo utilizado. Inclusive em sistemas apenas
silvipastoris, no geral, a produção animal apresenta índices similares e muitas vezes até
maiores que sistemas de pecuária tradicional. Além disso, o componente agrícola reduz
88 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Por ser um sistema com vários componentes, a própria adoção de um sistema de produção
em integração demanda um foco de gerenciamento claramente definido, que permita
o manejo dos diversos componentes que interagem, potencializando seus resultados
reciprocamente e reduzindo riscos para o produtor-empreendedor.
Assim como as VCS, os sistemas de ILPF, pelo efeito sinérgico dos diversos componentes
entre si, apresentam bom potencial de lucratividade com relação custo-benefício
favorável para uma grande gama de situações. O tema é também assunto específico de
um dos capítulos deste trabalho.
Pelas próprias características do sistema, usualmente, quem adota sistemas de ILPF são
produtores que visualizam a necessidade de melhorar seus sistemas de produção ou
investidores externos que querem entrar profissionalmente na atividade agrícola. Em
ambos os casos, portanto, o empreendedor tem boa afinidade com o empreendimento,
dispondo de experiência na atividade ou recursos financeiros para custear o trabalho de
técnicos especializados.
No caso de sistemas de ILPF, que por terem três componentes vegetais e pelo menos um
componente animal, são ainda mais complexos que sistemas agrícolas em monocultivo,
um planejamento meticuloso é de vital importância. Muitas vezes é mais prudente atrasar
a implantação do sistema, adiando-se, por exemplo, por um ano o plantio do componente
arbóreo para se refinar o planejamento do sistema, que correr o risco de escolher a espécie
errada ou não ter mão de obra local disponível para tratos culturais, como o combate a
plantas daninhas e formigas, por exemplo.
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 6
A posição estratégica dos sistemas de
integração no contexto da agropecuária
e do meio ambiente
Davi José Bungenstab
92 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Nesse contexto, este capítulo visa discutir a inserção dos sistemas de integração no
desenvolvimento sustentável da agropecuária no país.
De acordo com Brown (2002), mais da metade das reduções de carbono dos
trópicos poderia ser obtida pela proteção das florestas, regeneração e redução de
desmatamentos. O Brasil, com extensa área de florestas, tem um enorme potencial de
contribuição nesse aspecto, além de manter uma grande reserva de biodiversidade.
Portanto, o país tem algo valioso para ser colocado em debate, que são os serviços
ambientais relacionados com a preservação de grandes áreas de rica biodiversidade e
a redução de emissões por desmatamento.
Capítulo 6
A posição estratégica dos sistemas de integração no contexto da agropecuária e do meio ambiente 93
Com respeito a isso, um aspecto que merece mais atenção é a força que o Brasil pode ter
para participar e influenciar esses debates. A pecuária de corte tem posição de destaque
nesse contexto, especialmente pela extensão da área ocupada com pastagens.
Figura 1. Área com solo de boa fertilidade, utilizada com pastagem que apresenta sinais de baixa produtividade,
em área contígua a um cultivo comercial de milho de alto rendimento.
Além das emissões por mudanças no uso da terra, as emissões causadas diretamente pelos
animais, por seu processo digestivo e decomposição de dejetos, têm grande participação
no volume total de emissões do Brasil.
Em termos práticos, tratando dos estabelecimentos rurais em si, existem diversas ofertas
de tecnologias, máquinas e insumos como novas alternativas para o produtor. Não existe,
todavia, uma resposta direta ou uma alternativa que seja a mais indicada para todas as
Capítulo 6
A posição estratégica dos sistemas de integração no contexto da agropecuária e do meio ambiente 97
Nesses sistemas existem, obviamente, vários ganhos para o produtor, relacionados com os
efeitos sinergéticos de um componente sobre os outros dentro do sistema. É importante
ressaltar que além do benefício baseado na sinergia entre os componentes, o produtor
deve avaliar a vantagem estratégica de ser pioneiro dentro de uma atividade. Apesar
das dificuldades de se aprender realizando tentativas nem sempre bem-sucedidas, ao
iniciar cedo o uso de uma tecnologia, mesmo que em pequena escala, o produtor e sua
equipe criam um conhecimento próprio, adaptado às suas condições específicas, que é
fundamental quando se pretende expandir o sistema no futuro.
Considerações finais
O mercado voluntário de emissões aponta uma tendência de remunerar os produtores
pelo sequestro de carbono e, eventualmente, até mesmo por evitar emissões dos animais
ao se utilizar sistemas de produção comprovadamente mais eficientes. Em médio ou
longo prazo, a produção eficiente e que proporcione maior bem-estar aos animais
também poderá ser melhor remunerada por meio de certificações. Portanto, no caso de
sistemas de integração, além de todo o ganho regional com sistemas mais eficientes, esse
conhecimento agregado específico e pioneiro de cada produtor será fator estratégico de
grande valor para a sedimentação e remuneração da produção agropecuária sustentável
no Brasil.
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n. 3, p. 363-372, 2002.
Davi J. Bungenstab
Capítulo 7
Políticas de fomento à adoção de
Sistemas de Integração Lavoura, Pecuária
e Floresta no Brasil
Luiz Adriano Maia Cordeiro
Luiz Carlos Balbino
100 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Os sistemas de integração1 são estratégias de produção sustentável que integram
atividades agrícolas, pecuárias e/ou florestais, fundamentada na combinação espacial e
temporal dos componentes do sistema produtivo (Balbino et al., 2011a).
Os sistemas de integração podem ser adotados tanto por grandes quanto por pequenos
produtores rurais. No Brasil existem diversas políticas de fomento à adoção de sistemas de
integração envolvendo setores públicos, em âmbito nacional como estadual, bem como
ações da iniciativa privada. Este capítulo apresenta exemplos de políticas públicas, ações
privadas e parcerias público-privadas de fomento à adoção de sistemas de integração
entre lavoura, pecuária e/ou floresta no Brasil.
A adoção de sistemas de integração havia sido estimada por Balbino et al. (2011a) em,
aproximadamente, 2 milhões de hectares nos biomas brasileiros. Entretanto, pesquisa
recente, divulgada por Embrapa (2016), mostra que, atualmente, a área de adoção com
algum sistema integração (ILP, IPF, ILF ou ILPF) no Brasil abrange 11,5 milhões de hectares.
Os Estados que se destacam em área de adoção de sistemas de integração são: Mato Grosso do
Sul, com dois milhões de hectares; Mato Grosso, com 1,5 milhão; Rio Grande do Sul, 1,4 milhão,
que se destacou também como o Estado com maior número de propriedades participantes
de alguma das modalidades; Minas Gerais, 1,0 milhão; e, Santa Catarina, com 680 mil hectares.
No âmbito dos produtores rurais com atuação predominante na pecuária e que adotam a
estratégia, 83% utilizam o sistema de ILP (sendo 9% ILPF, 7% IPF) e entre os produtores de
grãos, 99% adotam o sistema ILP (sendo 0,4% ILPF e 0,2% ILF). Entre os produtores rurais
1
Sistemas de integração: Integração Lavoura-Pecuária (ILP) ou Sistema Agropastoril; Integração Pecuária-
Floresta (IPF) ou Sistema Silvipastoril; Integração Lavoura-Floresta (ILF) ou Sistema Silviagrícola; e, Integração
Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) ou Sistema Agrossilvipastoril (BALBINO et al., 2011a).
Capítulo 7
Políticas de fomento à adoção de Sistemas de Integração Lavoura, Pecuária e Floresta no Brasil 101
Este aumento de interesse pelos sistemas de integração demanda cada vez mais a
existência e a consolidação de políticas públicas, de parcerias, de crédito e de ações de
fomento direcionadas à expansão deste tipo de produção.
Desta forma, o País assumiu compromissos que prevêem a redução das emissões de GEE
projetadas para 2020, entre 36,1% e 38,9%, estimando assim uma redução da ordem de
1.168 e 1.259 milhões de toneladas de CO2eq2 do total das emissões estimadas para o
ano de 2020. Para tanto, foram propostas a redução do desmatamento na Amazônia e
no Cerrado, a ampliação da eficiência energética e a adoção de práticas sustentáveis na
agricultura. O setor agropecuário contribuirá com a redução de 22,5% dessas emissões
(em torno de 132,9 a 162,9 milhões de toneladas de CO2eq), por meio da adoção de
tecnologias sustentáveis (Tabela 1). Os sistemas de integração fazem parte destas
tecnologias, cuja contribuição na mitigação de GEE se daria pela expansão da área de
adoção em 4 milhões de hectares (Brasil, 2010a, 2012).
2
Dióxido de carbono equivalente: medida utilizada para comparar as emissões de vários GEE baseadas no Global
Warming Potential (ou Potencial de Aquecimento Global).
102 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Esses compromissos foram ratificados no artigo 12 da Lei que institui a Política Nacional
sobre Mudanças do Clima – PNMC (Lei no 12.187, de 29 de dezembro de 2009). Consta
nesta legislação, que o Poder Executivo estabeleceria “Planos Setoriais de Mitigação e de
Adaptação às Mudanças Climáticas visando a Consolidação de uma Economia de Baixo
Consumo de Carbono” em setores da economia, inclusive na agricultura (Brasil, 2009).
O objetivo geral do Plano ABC é promover a mitigação da emissão dos GEE na agricultura
no âmbito da PNMC, melhorando a eficiência no uso de recursos naturais, aumentando a
resiliência de sistemas produtivos e de comunidades rurais, e possibilitar a adaptação do
setor agropecuário às mudanças climáticas. O Plano ABC é composto por sete programas,
seis deles referentes às tecnologias de mitigação, e ainda um último programa com ações
de adaptação às mudanças climáticas. Em cada programa deste plano se propõe a adoção
de uma série de ações, como por exemplo, fortalecimento das organizações de assistência
técnica e extensão rural oficial, capacitação e informação, estratégias de transferência
de tecnologia, tais como dias-de-campo, palestras, seminários, workshops, implantação
de Unidades de Referência Tecnológica (URTs)3, além de campanhas de divulgação e
3
Unidade de Referência Tecnológica (URT) é um modelo físico de sistemas de produção, implantado em área
pública ou privada, visando à validação, demonstração e transferência de tecnologias geradas, adaptadas e/ou
recomendadas pelo Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA) para a região.
Capítulo 7
Políticas de fomento à adoção de Sistemas de Integração Lavoura, Pecuária e Floresta no Brasil 103
Por sua vez, Cordeiro et al. (2011) afirmam que o Plano ABC é um conjunto de ações que
promovem a “baixa” emissão de GEE pelo setor agropecuário, e não a “nula” emissão, o
que seria impossível na prática. Os autores também lembram que o Plano ABC tem por
objetivo garantir o aperfeiçoamento continuo e sustentado das práticas de manejo que
reduzam a emissão dos GEE e, adicionalmente, que aumentem a fixação atmosférica de
CO2 na vegetação e no solo dos setores da agricultura brasileira.
O Plano ABC é considerado um instrumento de política pública que traz uma visão
diferente de se fazer agricultura no Brasil e nos trópicos. Busca incentivar o investimento
em tecnologias sustentáveis com a adoção de boas práticas agrícolas e a integração de
sistemas produtivos capazes de aumentar a produção e, com isso, abastecer o mercado
interno, exportar mais, melhorar a renda e o bem-estar social e econômico do produtor
e da população, além de preservar os recursos naturais e manter o equilíbrio ambiental
com a conseqüente redução da emissão dos GEE (Confederação da Agricultura e Pecuária
do Brasil, 2012).
A importância do Plano ABC para o agronegócio brasileiro foi ratificada e ampliada na COP-
21 através da iNDC para o setor agropecuário, tornando o Plano ABC, e consequentemente
a linha de crédito do Programa ABC, o principal instrumento em busca de uma agricultura
sustentável (Machado, 2016).
Assim, após a COP-21 ocorreu a ratificação do Acordo de Paris sobre Mudança do Clima
pelo governo brasileiro, em 2016. Neste evento, o Brasil apresentou a “pretendida
Contribuição Nacionalmente Determinada” (intended Nationally Determined Contribution
– iNDC) e uma nova meta total de redução de emissões de GEE, de 37% até 2025 e 43%
até 2030. Para a agropecuária está previsto o fortalecimento das ações do Plano ABC,
como a principal estratégia para o desenvolvimento sustentável na agricultura, inclusive
por meio da recuperação adicional de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas
até 2030 e pelo incremento de 5 milhões de hectares de sistemas de Integração Lavoura,
Pecuária e Floresta até 2030 (República Federativa do Brasil, 2015). Ao ratificar o acordo, a
meta brasileira transforma-se internamente em lei e em política pública, e neste sentido,
o que eram metas pretendidas ou iNDCs passaram a denominar-se NDCs (Contribuições
Nacionalmente Determinadas).
104 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Os objetivos do Programa ABC são: reduzir as emissões de GEE oriundas das atividades
agropecuárias; reduzir o desmatamento; aumentar a produção agropecuária em bases
sustentáveis; adequar as propriedades rurais à legislação ambiental; ampliar a área de
florestas cultivadas; e, estimular a recuperação de áreas degradadas (BNDES, 2017).
Do volume total de recursos de R$ 197 bilhões necessários para a execução do Plano ABC,
estima-se que R$ 157 bilhões seriam recursos disponibilizados via crédito rural (Programa
ABC e outros), para financiar as atividades necessárias ao alcance das metas físicas de cada
106 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Tabela 2. Juros de crédito rural (% ao ano) cobrados pelo Programa ABC e por outras
linhas de crédito; valores (em bilhões de reais) disponibilizados e utilizados pelo Programa
ABC; e, número de contratos fechados para financiamento pelo Programa ABC por safra
ou ano agrícola.
Valor Valor Número de
Safra ou Ano Juros a.a. Juros a.a.
Disponibilizado Utilizado Contratos
Agrícola (ABC) (demais linhas)
(ABC)1 (ABC)1 (ABC)
2010-2011 5,5% 5,75 - 9,50% 2,00 0,59 31
2011-2012 5,5% 6,75 - 9,50% 3,15 1,51 5037
2012-2013 5,0% 5,50 - 8,50% 3,40 2,86 10.117
2013-2014 5,0% 3,50 - 5,50% 4,50 2,68 10.503
2014-2015 4,5 - 5,0% 4,00 - 7,50% 4,50 3,50 14.442
2015-2016 7,5 - 8,0% 7,5 - 10,5% 3,00 1,96 6.049
2016-2017 8,0 - 8,5% 8,5 - 10,5% 2,99 1,14 2.985
2017-2018 7,5% 6,5 - 10,5% 2,13 - -
TOTAL - - 25,67 12,54 46.179
1
Bilhões de Reais
Fonte: Brasil (2010b).
Além disso, esta lei visa estimular atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação
tecnológica, assim como atividades de transferência de tecnologias voltadas para
o desenvolvimento de sistemas de produção que integrem, entre si, ecológica e
economicamente, a pecuária, a agricultura e a floresta (Brasil, 2013).
Com tudo isso, a lei visa ainda diversificar a renda do produtor rural e fomentar novos
modelos de uso da terra, conjugando a sustentabilidade do agronegócio com a preservação
ambiental, bem como difundir e estimular práticas alternativas ao uso de queimadas na
agropecuária, com vistas a mitigar seus impactos negativos nas propriedades químicas,
físicas e biológicas do solo, reduzir seus danos sobre a flora e a fauna e as emissões de GEE
(Brasil, 2013).
Por fim, a lei pretende fomentar a diversificação de sistemas de produção com inserção
de recursos florestais, visando à exploração comercial de produtos madeireiros e não
madeireiros por meio da atividade florestal, a reconstituição de corredores de vegetação
para a fauna e a proteção de matas ciliares e de reservas florestais, ampliando a capacidade
de geração de renda do produtor, além de estimular e difundir sistemas agrossilvipastoris
aliados às práticas conservacionistas e ao bem-estar animal (Brasil, 2013).
Esta legislação estabelece novas atribuições para o poder público referentes ao fomento
da adoção de sistemas de Integração Lavoura, Pecuária e/ou Floresta enquanto estratégia
de produção (Brasil, 2013). Entre elas estão: definir planos de ação regional e nacional
para expansão e aperfeiçoamento dos sistemas, com a participação das comunidades
locais; estimular a adoção da rastreabilidade e da certificação dos produtos pecuários,
agrícolas e florestais oriundos de sistemas integrados de produção; capacitar os agentes
de extensão rural, públicos, privados ou do terceiro setor, a atuarem com os aspectos
ambientais e econômicos dos processos de diversificação, rotação, consorciação e
sucessão das atividades de agricultura, pecuária e floresta; criar e fomentar linhas de
crédito rural consoantes com os objetivos e princípios da Política Nacional de Integração
Lavoura-Pecuária-Floresta e com os interesses da sociedade; estimular a produção
108 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Desta forma, essa lei se torna um importante instrumento para apoiar políticas públicas
para a ampliação da adoção de sistemas de integração em todo o território brasileiro.
Em sua execução, a Política Nacional de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta utilizará os
instrumentos da Política Agrícola, instituídos pela Lei no 8.171, de 17 de janeiro de 1991,
e da Política Nacional do Meio Ambiente, instituídos pela Lei no 6.938, de 31 de agosto
de 1981, e os financiamentos do Sistema Nacional de Crédito Rural, nos termos das Leis
nos 4.595, de 31 de dezembro de 1964, e 4.829, de 5 de novembro de 1965 (Brasil, 2013).
Outro exemplo, em que ocorreu o fomento da Integração Lavoura, Pecuária e/ou Floresta,
é a Operação Arco Verde (OAV), coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA)
e pela Casa Civil da Presidência da República, que teve como objetivos a promoção de
modelos produtivos sustentáveis nos municípios prioritários para o controle e a redução
do desmatamento na Amazônia Legal.
Outras políticas públicas são o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento
na Amazônia Legal (PPCDAm) e o Plano de Ação para Prevenção e Controle do
Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PPCerrado), envolvendo diretamente ações
destinadas à recuperação de pastagens degradadas e à adoção de sistemas de integração,
que possibilitam a diminuição na pressão por desmatamento de novas áreas.
Já no Estado de São Paulo foi criado em 2013 o programa “Integra São Paulo: Lavoura-
Pecuária-Floresta (ILPF)” que pretende recuperar mais de 300 mil hectares de áreas e
pastagens degradadas dentro de sete anos da criação do mesmo. Os financiamentos
serão obtidos por meio do Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista (FEAP), que
disponibilizará duas linhas de crédito especiais: a primeira é a linha de Subvenção para
Recuperação de Áreas Degradadas por Grandes Erosões (RADGE), com teto de R$ 10
mil por produtor, que podem ser utilizados em ações de correção de solo e controle de
voçorocas. A segunda é a linha de crédito Projeto “Integra SP”, que financiará desde o
processo de adubação e cobertura de solo até a implantação de sistemas integrados de
produção. O limite era de R$ 100 mil e passou para R$ 200 mil por produtor, com juros
de 3% ao ano e prazo de oito anos para pagamento, podendo ser estendido até 12 anos
110 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
quando o projeto incluir o cultivo de floresta, inclusa a carência de até 4 anos. A execução
conta com apoio da equipe de técnicos da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral
(CATI) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, que é responsável pela elaboração do
projeto em parceria com o produtor rural, para traçar o plano de trabalho mais adequado
para cada propriedade. Para o desenvolvimento, estão previstas instalações de 250 UDs,
tanto em fazendas pertencentes ao Estado como em propriedades rurais privadas, com
a função de demonstrar e transferir a tecnologia do Projeto. Além disso, está prevista a
capacitação de 125 técnicos da Secretaria Estadual de Agricultura, que serão responsáveis
pela implantação e por oferecer assistência técnica diretamente aos produtores rurais.
Será realizada também a capacitação e disponibilização de recursos para 4 mil produtores,
além da elaboração de 450 projetos que poderão contemplar desde a reforma da
pastagem até a adoção de sistemas integrados (São Paulo, 2013, 2017).
A COCAMAR incentiva a Integração Lavoura, Pecuária e/ou Floresta entre seus associados,
mantendo uma unidade própria para a difusão desse sistema em Iporã-PR, a 50 quilômetros
de Umuarama-PR, onde todos os anos, no mês de fevereiro, promove um dia de campo
para demonstrar os resultados dos sistemas de integração, com a integração da pecuária
com soja e também o cultivo de eucalipto. Em 2015, a cooperativa registrou mais de 60
mil hectares cultivados com integração na região da COCAMAR. Dois anos antes eram 45
mil hectares, o que indica que esta política privada tem surtido efeito (COCAMAR, 2015).
Atualmente, a Rede é composta pela Embrapa e por cinco empresas privadas parceiras:
John Deere, Syngenta, COCAMAR, Parker e a Dow Agrosciences (Embrapa, 2017). Outras
instituições poderão compor a Rede e se tornarem parceiras desta iniciativa, mediante
adesão ao Acordo Geral de Cooperação. Cada empresa pode eleger livremente as ações,
atividades e projetos que pretenda patrocinar, desde que se alinhem com a perspectiva
conceitual e às orientações estratégicas e prioridades da programação de Pesquisa &
Desenvolvimento e Transferência de Tecnologia da Embrapa.
A Rede de Fomento ILPF que é co-financiada pelas empresas privadas e pela Embrapa,
apoia uma rede com 97 URTs distribuídas em todos os biomas brasileiros e que envolve a
participação de 19 Unidades de Pesquisa da Embrapa (Embrapa, 2017).
representante de cada instituição parceira; ii) Conselho Gestor, que é o órgão de gestão tática
e operacional da Rede, composto por representantes da Embrapa e por representantes
das parceiras; e, iii) Administradora dos Recursos, que no caso é a Fundação de Apoio à
Pesquisa Científica e Tecnológica (Fundação Eliseu Alves), que exerce a administração dos
recursos financeiros por meio de Planos de Trabalho aprovados pela Rede.
Considerações Finais
Os sistemas de Integração Lavoura, Pecuária e/ou Floresta, enquanto estratégias de
produção e intensificação sustentável tem recebido grande apoio em ações de fomento
para aumento da sua adoção por produtores rurais em todas as regiões brasileiras.
Várias políticas públicas em torno deste tema foram criadas no Brasil, como o Plano ABC, o
Programa ABC, a Política Nacional de ILPF e outros programas governamentais nacionais
e estaduais.
Referências
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114 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
BRASIL. Lei no 12.187, de 29 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima e dá
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Capítulo 7
Políticas de fomento à adoção de Sistemas de Integração Lavoura, Pecuária e Floresta no Brasil 115
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 8
A Sustentabilidade na Cadeia Produtiva
da Pecuária de Corte Brasileira
Guilherme Cunha Malafaia
Denise Barros de Azevedo
Mariana de Aragão Pereira
Marcos José de Almeida Matias
118 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O processo de produção de carne tem seu início no setor de insumos, que representa as
empresas de bens e serviços na área de nutrição, manejo, genética e sanidade. Após, tem-
se os setores produtivos, que reúnem as unidades de produção fornecedoras das matérias-
primas iniciais. Os frigoríficos transformam a matéria–prima em produto acabado, sendo
os responsáveis pelo avanço do produto final em direção ao consumidor por meio da
distribuição para o segmento de varejo. A missão desse segmento é disponibilizar
o produto final, carne bovina, de forma apresentável, higiênica e em formato útil ao
consumidor. Para que este sistema funcione perfeitamente existem alguns elementos de
apoio que são essenciais, pois são responsáveis pelo fluxo financeiro e de informações.
Parte disso é fruto do ambiente institucional no qual essa cadeia se insere. Aspectos
ligados com o comércio exterior, a evolução macroeconômica, a inspeção, a legislação
e a fiscalização sanitárias, disponibilidade e confiabilidade de informações estatísticas,
legislação ambiental, mecanismos de rastreabilidade e certificação, sistemas de inovação,
entre outros, condicionam fortemente a competitividade dessa cadeia agroindustrial.
No que se refere ao abate médio anual de animais, o volume é de 43,3 milhões de cabeças,
com peso médio de carcaça de 234 quilos, rendimento de carcaça entre 51% e 55%,
especialmente para animais com sangue Nelore, que é a raça predominante no país.
Do total produzido no Brasil, 8,27 milhões de tec (80,5%) destinam-se ao mercado interno,
onde o consumo per capita gira em torno de 41 kg/ano. Este consumo fica abaixo apenas
da Argentina (67,2 kg/ano), Uruguai (60 kg/ano) e Estados Unidos (42 kg/ano). O restante
é exportado sob três formas: In Natura (71%), Industrializada (17%) e Miúdos (11%).
Conforme a Tabela 2, o Brasil, liderou o ranking das exportações de carne bovina em 2013,
sendo responsável por 21,1% do mercado mundial do produto. Os principais mercados
compradores da carne brasileira in natura são: Rússia (26%); Hong Kong (18%) e Venezuela
(13%). Já os principais destinos de exportação de carne brasileira industrializada são:
União Europeia (UE) (27,53%) e Estados Unidos (EUA) (22%). Finalmente, a maioria dos
miúdos é exportada para Hong Kong (45%), seguida da UE (19%).
Capítulo 8
A Sustentabilidade na Cadeia Produtiva da Pecuária de Corte Brasileira 121
Figura 3. Projeções para a produção (A) e consumo (B) de carne bovina em 2021 no Brasil (em mil toneladas).
Fonte: Adaptado de Dossa et al. (2011).
Já a criação de gado elite, tem como foco central a produção de matrizes e reprodutores de
alta genética para o fornecimento de animais melhoradores a rebanhos multiplicadores
e comerciais.
80% dos sistemas produtivos de carne bovina brasileira, desenvolvendo atividades de cria
a engorda, e apresenta uma alta variação de desempenho.
Tal variação é decorrente da interação entre vários fatores, como solo, clima, genótipo e
manejo animal, sanidade animal, qualidade e intensidade de utilização das pastagens,
além da gestão. Os sistemas extensivos são praticados em todo o País, sendo
predominantes mesmo nos Estados e regiões em que se desenvolvem os sistemas semi-
intensivos e intensivos.
Em algumas regiões os sistemas extensivos são absolutos (Figura 5) como, por exemplo:
Cerrados de Roraima (1) e do Amapá (2), nos campos inundáveis da ilha de Marajó (3), do
Baixo Amazonas (8) e do Maranhão (4), na Caatinga do Semi-Árido (5), no Pantanal (6) e
no sul da Campanha Gaúcha (7).
Esse destaque tem colocado a ILPF em evidência, com grande interesse pela sua adoção
por parte dos produtores rurais e, por outro lado, pelo desenvolvimento de políticas
públicas e programas de fomento governamentais.
Alguns gargalos se apresentam para que o referido sistema ganhe escala em todas as
regiões do Brasil, são eles: complexidade do sistema e desconhecimento dos seus reais
benefícios; a baixa capacitação do produtor rural e de técnicos da assistência técnica e
extensão rural (ATER) e outros atores, como os agentes financeiros; falta de mão-de-obra
especializada; falta de infraestrutura adequada; elevado investimento inicial, entre outros.
preferência de quem está adquirindo o produto ao longo da cadeia de valor, sejam eles
consumidores intermediários, institucionais ou consumidores finais (população em geral
Para tanto, a cadeia da carne bovina brasileira precisa se comunicar mais eficientemente
com seus clientes. É necessário relembrá-los que a carne pode fazer parte de uma dieta
saudável. É preciso trabalhar em inovação e na criação de novos produtos. Algumas razões
sustentam o argumento pelo qual devemos apostar em carne de qualidade: uma delas é
a concorrência.
A carne bovina possui um valor elevado quando comparado às demais proteínas animais,
podendo aumentar proporcionalmente esse valor a médio e longo prazo. Sendo assim,
para ter competitividade no mercado há necessidade de se investir em uma base de
sustentação que garanta produtos diferenciados em relação a qualidade, ao sabor e a
experiência. Vários estudos apontam que a disponibilidade de renda leva o consumidor a
escolher carne bovina.
No mercado interno, por exemplo, a ascensão econômica da classe C, que representa 54%
da população brasileira, com renda mensal familiar média de R$ 2.900, fez com que o
perfil desse consumidor mudasse rapidamente, em especial na área de alimentação. Uma
das mais significativas transformações está no aumento de 4,2% das compras de carne
bovina de primeira (Neves, 2012).
128 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
No mercado externo, especialmente nos mercados emergentes como Ásia, Oriente Médio
e Norte da África, o incremento no consumo de carne bovina deve ser de 5% em 2012,
o que significa 8,2 milhões de toneladas. Se em 1965 os países em desenvolvimento
representaram 15,4% das importações mundiais de carnes, em 2010 essa fatia chegou
a 55,4%. Cabe salientar que o aumento de renda dos países emergentes não aumenta
apenas a classe média. Aumenta também as classes A e B. Na China, o mercado premium
será de US$ 27 bilhões em 2015. No Brasil, espera-se que o mercado premium cresça 25%
nos próximos anos.
Nos mercados mundiais mais exigentes, onde o nível de renda e cultura é mais elevado,
existe o apelo de consumo para carne natural/orgânica/sustentável. O sistema produtivo
pecuário brasileiro, de forma geral, já está em sintonia com essa, visto que a maior parte
da nossa criação se dá a pasto, conforme descrito anteriormente.
Por fim, quanto aos obstáculos a serem vencidos pela cadeia da carne bovina brasileira para
os próximos anos, destacam-se: a superação das barreiras sanitárias; o desenvolvimento de
um padrão de qualidade e seu reconhecimento pelo mercado importador; a constituição
de uma cadeia melhor coordenada; a superação de limitantes de exportação tais como
quotas, tarifas e concorrência subsidiada; a colocação de produtos de maior valor;
redução do impacto ambiental, especialmente, mediante a utilização do sistema de ILPF;
e, melhoria da imagem do pecuarista perante a sociedade brasileira, particularmente, no
que diz respeito à sua associação negativa com o desmatamento e o descumprimento de
leis ambientais.
Referências
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130 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 9
Custo-benefício dos sistemas de
produção em integração
Fernando Paim Costa
Ivo Martins Cezar (in memoriam)
Geraldo Augusto de Melo Filho
Davi José Bungenstab
132 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Várias vantagens podem ser citadas em favor dos sistemas de integração lavoura-pecuária
(ILP), pecuária-floresta (IPF) e lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Muitas delas têm um caráter
social, extrapolando a porteira da fazenda, outras se restringem ao estabelecimento rural.
Os principais benefícios econômicos diretos para o produtor são:
A agregação de valor também tem sido citada como um dos benefícios dos sistemas de
integração, mas essa vantagem, usualmente, não existe de fato na maioria dos casos;
para tanto o sistema de integração precisaria envolver também, em algum grau, o
processamento dos produtos primários colhidos e sua certificação.
• Visão de curto prazo do produtor, que privilegia o monocultivo, com seus ganhos
imediatos;
• Indução pelas indústrias de equipamentos e insumos, geralmente especializadas, a
quem interessa ter uma clientela também especializada;
• Ganhos de escala propiciados pela especialização;
• Requerimento de investimentos específicos, em itens que não são usuais no sistema
tradicional;
• Necessidade dos próprios pecuaristas investirem em gado, para aproveitarem o
aumento da capacidade de suporte resultante da recuperação/renovação da pastagem;
Capítulo 9
Custo-benefício dos sistemas de produção em integração 133
Apesar dessas forças contrárias, nos últimos anos, os sistemas de integração vêm
ocupando espaços de forma acelerada. Nesse movimento, há agricultores passando a
fazer também pecuária e produção de madeira ou outros produtos florestais, bem como a
situação inversa, isto é, pecuaristas introduzindo agricultura e florestas. Diversos trabalhos
enfatizam as dificuldades enfrentadas pelos pecuaristas que querem fazer integração,
salientando razões culturais, deficiências na gerência e falta de maquinário, entre outros
fatores (Costa; Macedo, 2001; Yokoyama; Stone, 2003). No entanto, algumas referências
(Pimentel, 2004, 2005) têm afirmado o contrário, apontando as grandes dificuldades que
se apresentam ao agricultor, destacando-se a falta de linhas de crédito para construir
currais, aguadas e cercas, e mesmo para comprar gado, além da complexidade do sistema
de produção animal e da necessidade de maiores áreas quando se pretende a produção
baseada em pastagens.
Uma segunda divisão se refere à origem dos dados a analisar, que pode ser um caso real
ou um experimento. Nas avaliações de casos, a principal limitação é a insuficiência de
dados. Já os experimentos, se bem planejados, oferecem as informações necessárias
para avaliação. Cuidado especial deve ser tomado quanto à extrapolação de resultados.
A análise econômica de dados experimentais pressupõe a análise estatística, uma vez
que tratamentos que não diferem quanto a respostas físicas também não são diferentes
quanto a resultados econômicos a elas atrelados.
Ainda, vale ressaltar que as avaliações econômicas podem ser classificadas em dois tipos:
avaliações “ex-ante”, baseadas em resultados esperados, visando fornecer subsídios
às tomadas de decisão; avaliações “ex-post”, tendo como alvo casos reais, produzindo
resultados sobre eventos passados e servem para se avaliar o sucesso do empreendimento.
As análises que visam o planejamento enquadram-se no primeiro grupo, e os coeficientes
técnicos e preços usados nesse caso são encontrados na literatura que divulga resultados
de pesquisa, na experiência de informantes qualificados e em outras fontes secundárias. Já
as avaliações “ex-post” exigem dados específicos, que precisam ser coletados, registrados
e tabulados no dia a dia do sistema de produção “real” sob análise.
diretamente associados a cada uma das características citadas na seção anterior, sendo
então seguidos por recomendações gerais.
Ao se comparar dois sistemas de integração, é óbvia a escolha por aquele que apresenta
maiores ganhos no início do horizonte de planejamento, mantendo-se tudo o mais
inalterado. Essa preferência temporal é expressa por indicadores como o valor presente
líquido (VPL) e a taxa interna de retorno (TIR), entre outros. Esses dois parâmetros levam à
mesma conclusão quanto à atratividade do projeto, mas o VPL é mais simples de calcular
e menos sujeito a usos e interpretações equivocadas. Para o cálculo desses indicadores
é preciso gerar um fluxo de caixa que, dependendo da complexidade do sistema e da
relevância de cada evento de produção em particular, pode ter como unidade de tempo
o mês, a estação do ano ou o próprio ano.
136 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Ao calcular o VPL e mesmo a TIR, é conveniente fazê-lo com base no fluxo de caixa
adicional, isto é, no fluxo que retrata o processo de mudança proposto ou realizado. Este
fluxo é obtido como a diferença entre benefícios e custos adicionais (em relação ao sistema
tradicionalmente desenvolvido), seguindo os mesmos princípios da orçamentação parcial.
Cabe ainda comentar que, ao avaliar a atratividade de um dado sistema, deve-se olhar
também o perfil do fluxo de caixa, já que o projeto com maior VPL pode, apesar da
maior rentabilidade, estar comprometendo a sobrevivência do produtor. Neste caso são
necessárias simulações de opções (crédito, distribuição dos investimentos em período
mais longo etc.) que ajudem a amenizar os períodos em que a fazenda fica no “vermelho”.
No caso de se considerar o uso de financiamento, os recursos liberados pelo banco, bem
como as amortizações e os pagamentos de juros, devem entrar no fluxo de caixa. Ainda,
no último ano do fluxo de caixa, é necessário adicionar as variações no valor de ativos
como rebanho, instalações e equipamentos, devidamente depreciados até esta data. Isto
deve ser feito porque a vida útil de muitos investimentos não necessariamente coincide
com o horizonte de tempo considerado na avaliação.
A defasagem nos efeitos de certas práticas ou insumos deve ser objeto de atenção, sob
pena de se subestimar os benefícios da interação entre atividades. Por exemplo, quando o
último período do horizonte de tempo analisado inclui uma adubação de lavoura, a qual
é seguida pela implantação de pastagem, inclui-se um custo sem levar em conta a íntegra
dos benefícios correspondentes. Neste caso, poder-se-ia usar o artifício de estimar uma
grandeza para tais benefícios, e adicioná-la no último ano do fluxo de caixa. Um exemplo
desse tipo de problema pode ser encontrado em Costa e Macedo (2001).
Por fim, chama-se a atenção para dois problemas encontrados, em certo grau, nos relatos
de avaliações de sistemas de integração. O primeiro é a falta de uma melhor definição
dos indicadores econômicos usados, que carecem de clareza e precisão. Isso é necessário
porque estes indicadores estão, geralmente, associados a diversas denominações.
Lucro, por exemplo, pode ser expresso como lucro líquido, lucro normal, lucro puro
etc. Para sanar este problema, é preciso descrever como o indicador é calculado (que
componentes do custo entram no cálculo). O segundo ponto é não deixar que ocorra
a falta de correspondência entre custos e benefícios atribuídos ao novo sistema, o que
pode levar a interpretações tendenciosas. Este problema tem origem na superestimação
de benefícios, pela inclusão de números que já vinham sendo gerados pelo sistema pré-
existente, bem como na subestimação de custos, devido à omissão de itens determinados
pela adoção dos sistemas de integração.
Considerações finais
O crescimento no uso de sistemas de integração representa uma verdadeira mudança
de paradigma, na medida em que se coloca em prática o consensual discurso da
sustentabilidade. O surgimento de conceitos como “Sustainomics”, criado no âmbito da
Sociedade Internacional de Economia Ecológica para rotular uma base de conhecimentos
ao mesmo tempo transdisciplinar, integrativa, compreensiva, heurística e prática, que
visa tornar o desenvolvimento mais sustentável (Munasinghe, 2004), exemplifica essa
tendência. Nessa nova perspectiva, a tradicional preocupação com aspectos produtivos
e financeiros não é mais suficiente para garantir a sobrevivência e o crescimento dos
negócios, sendo necessário inserir indicadores de sustentabilidade como parte dos
controles ordinários e da própria contabilidade formal. Galgar esse degrau é um grande
desafio, e a Economia Ecológica (ou Economia Ambiental) apresenta-se como importante
aliada nessa busca, reconhecendo que o sistema socioeconômico baseia-se e depende
dos sistemas naturais e, de outro lado, interfere e transforma seu funcionamento.
Referências
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138 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
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PIMENTEL, M. S. Integração lavoura-pecuária: fácil é o caramba! Panorama Rural, v. 5, n. 72, p. 46-52, 2005.
Capítulo 10
Serviços Ambientais em sistemas
silvipastoris
Maria Luiza Franceschi Nicodemo
Odo Primavesi
140 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Assim, serviços ambientais naturais são os benefícios que as pessoas recebem dos
ecossistemas. Podem ser classificados em serviços de provisão (produção de alimentos,
fibras, energia e água doce), de regulação, de suporte - que são serviços necessários para
Capítulo 10
Serviços Ambientais em sistemas silvipastoris 141
a produção de outros serviços - e serviços culturais, que são benefícios não-materiais que
enriquecem a qualidade de vida e promovem o enriquecimento espiritual, recreação e
experiências estáticas (Millenium Ecosystem Assessment, 2005).
Esses processos são, em sua maioria, mediados pela atividade biológica, que depende
assim da manutenção da biodiversidade. Com a revolução verde, optou-se por transformar
a paisagem (os ecossistemas naturais clímax ou próximo a eles) em agroecossistemas
intensivos e simplificados (aproximando-os mais ou menos de características de ambientes
naturais primários), onde muitos serviços ambientais naturais ou ecossistêmicos foram
reduzidos, ou mesmo desligados, e substituídos pela intervenção humana (atualmente
chamados serviços ambientais antrópicos). Nesses sistemas, o preparo mecanizado do
solo substitui as alterações nas propriedades físicas do solo oriundas da interação entre
raízes, organismos vivos do solo e matéria orgânica que favorecem a germinação e o
desenvolvimento das sementes; a adição de fertilizantes minerais substituiu os processos
de reciclagem de nutrientes; pesticidas para controle de plantas daninhas, doenças e
pragas; a manipulação genética das cultivares substituiu o processo natural de seleção de
plantas (Altieri, 1999).
ª indica certeza de baixa a média; todas as outras tendências tem grau de certeza de médio a alto.
Símbolos: ▲ elevação; ▼ redução; ± efeito variável.
Fonte: Millenium Ecosystem Assessment (2005).
Capítulo 10
Serviços Ambientais em sistemas silvipastoris 143
Água e solo
As florestas são produtoras (recicladoras de água de chuvas) e cotransferidoras de chuvas
do litoral (produzidas sobre os mares e empurradas ao continente pelos ventos alísios)
ao interior. Diversos estudos têm mostrado a importância da manutenção das matas
para a conservação do regime de chuvas suprarregional. No caso do Brasil, um processo
muito conhecido foi popularmente denominado “Rios Voadores”, que são correntes de
ar que carregam umidade de Norte a Sul do país e são responsáveis por grande parte
da precipitação pluvial no Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil, com impacto ainda no
Uruguai, Paraguai e Argentina. Os ventos dominantes da Amazônia carregam a umidade
do mar para o interior. A cada ciclo de precipitação se cria novo ciclo de evapotranspiração
da mata, em que parte da umidade original é carregada cada vez mais para o interior do
continente, até encontrar a barreira andina, quando essa umidade é redirecionada para
o Sul. Estima-se que 70% da precipitação que atinge o Estado de São Paulo na época
das chuvas seja fruto deste processo (Fearnside, 2004). Mudanças de uso de solo, com
substituição da floresta por pastagens ou por agricultura, aumentam a perda da água por
escorrimento superficial, reduzindo não só a umidade que chega ao interior do solo, mas
também aquela que se desloca pelo continente (Fearnside, 2004; Spracklen et al., 2012).
Como consequência, poderemos observar o encurtamento perigoso do ciclo da água e o
aumento do número e extensão dos períodos secos.
radicular profundo, podem bombear água para a camada superficial do solo, em especial,
nas regiões de Cerrado, beneficiando as plantas de raízes mais superficiais (Goldstein et
al., 2008), e a manutenção de fungos e bactérias do solo.
No mundo, cerca de 2 bilhões de hectares de terra e 1,5 bilhão de pessoas são afetados
pela degradação dos solos, especialmente nos países em desenvolvimento. Estima-se que
anualmente 12 milhões de hectares, que poderiam produzir 20 milhões de toneladas de
grãos, são perdidos no processo de degradação, causado pela perda da permeabilidade,
uma vez que os macroporos de aeração e de drenagem são reduzidos por adensamento,
compactação ou eliminados por erosão, além da perda de fertilidade química e biológica.
Um cálculo aproximado, considerando as taxas de degradação atuais, indica que sobraram
apenas 60 anos de solo produtivo (“topsoil”). O solo do planeta está sendo perdido entre
10 e 40 vezes a taxa que pode ser naturalmente formado (Nair, 2014).
Foram estimados, no Brasil, prejuízos anuais da ordem de 30 milhões de dólares, por perda
de matéria orgânica e de nutrientes, queda na produtividade, perda da fertilidade do solo,
depreciação da terra, custos adicionais de tratamento da água para consumo humano,
soterramentos e inundações, eutrofização, manutenção de estradas e desassoreamento
de reservatórios, entre outros (Telles, 2010).
A introdução de árvores nos sistemas de produção pode contribuir para amenizar a situação
acima exposta. Sistemas silvipastoris na Costa Rica, Nicarágua e Colômbia reduziram a
perda de solos em quase 50% entre 2002 e 2007, passando de 80,9 a 44,1 t ha-1 ano-1 (Banco
Mundial, 2013).
a posição D, com isso, a parcela de ar que estava em B se desloca para C. O ciclo entre A,
B, C e D é chamado de célula de circulação. Uma célula de circulação é responsável pelo
movimento entre áreas aquecidas e áreas mais frias. Aqui deve ser destacado que um solo
coberto por árvores aquece muito menos que um solo limpo, nu, gerando térmica (massa
de ar quente ascendente) menos intensa, isto é, gera um vácuo ou menos sustentação nas
horas mais quentes do dia, de forma a facilitar a queda de particulados (poeira, fuligem) e
também da água retida nas nuvens, que precipita com maior facilidade. À noite ocorre o
inverso, com maior vácuo nas áreas mais frias sobre solo nu.
Sistemas silvipastoris são capazes de aumentar e manter a fertilidade do solo, por meio
do maior aporte de nitrogênio de espécies lenhosas fixadoras de N; maior disponibilidade
de nutrientes pela deposição de serapilheira; e maior absorção e ciclagem de nutrientes
das camadas mais profundas do solo (Nair, 2011). As propriedades físicas e químicas do
solo podem ser melhoradas dentro de quatro a cinco anos da implantação de sistemas
silvipastoris (Carvalho et al., 2002).
Além disso, ao alterar o balanço hídrico, esses sistemas criam condições mais favoráveis
para a vida no solo (Jose, 2009). Ao se comparar sistemas silvipastoris com pastagens
solteiras a pleno sol, observou-se que mudanças no microclima como redução das
temperaturas do ar e do solo e menor taxa de evaporação da superfície do solo
aumentaram a água disponível do solo, as atividades biológicas do solo e a mineralização
de nitrogênio. Constatou-se aceleração na decomposição da matéria orgânica e ciclagem
de nitrogênio e aumento de bactérias e invertebrados, com consequente influência na
maior agregação do solo, na maior disponibilidade de fósforo e na maior taxa de ciclagem
Capítulo 10
Serviços Ambientais em sistemas silvipastoris 147
de nutrientes (Franco et al., 2003). Esses eventos resultam em maior teor disponível de
nutrientes e maior produção de biomassa por unidade de área, resultando em menor
pegada ecológica (maior produção de forragem de qualidade e de carne por unidade
de área por ano), menor pegada de água (maior produção de carne por litro de água
utilizado no sistema de produção) e menor pegada de nitrogênio (menor gasto e perda
de nitrogênio por unidade de produto gerado), o que é altamente desejável.
Microclima
A vegetação ajuda a diminuir a variação da temperatura e da umidade do ar. Como vimos,
a evapotranspiração é importante na manutenção da umidade relativa do ar. Quando
ocorrer em escala, com geração de nebulosidade extensa, pode reduzir a temperatura do
ar por meio da redução da incidência de radiação solar, refletida pela superfície superior
das nuvens de vapor de água (albedo elevado), à semelhança do que ocorre na Amazônia,
em que os menores valores de radiação ocorrem de dezembro a fevereiro (pico do verão).
Vale ressaltar que, por outro lado, na estratosfera ocorrem nuvens de cristais de gelo,
que não refletem radiação solar, mas retêm radiação de ondas longas, caloríficas, e são
originadas sobre áreas degradadas com geração de térmicas intensas.
À medida que o ar tem menos umidade, aumenta a demanda de água da atmosfera para
o sistema vegetação-solo. As plantas respondem à menor umidade do ar aumentando a
transpiração, dentro de certos limites, e se tiverem acesso à água no solo. Dessa maneira, em
sistemas arborizados, as árvores utilizam a água que acessam em maiores profundidades
do solo para continuar transpirando. Na Amazônia ocidental, a água encontrada entre 2
m e 8 m de profundidade contribuiu com mais de ¾ da transpiração de árvores perenes
na estação seca (Jackson et al., 2000). Em sistemas silvipastoris, pode ocorrer uma situação
parecida: as árvores transferem umidade para a atmosfera, o que beneficia a produção
continuada da pastagem associada a ela, pois o capim pode manter os estômatos abertos
por mais tempo numa condição de menor ressecamento do ar. Entretanto, se o sistema
silvipastoril estiver associado a uma área onde predomina a pastagem convencional ou
a agricultura, corre o risco de exaurir mais rapidamente suas reservas de água. Com o
aumento da demanda evapotranspirativa da atmosfera, a árvore pode competir mais
intensamente com o cultivo associado pela água disponível no solo, promovendo seu
ressecamento mais rapidamente. Em especial, quando estas áreas adjacentes tiverem
amplitudes térmicas maiores, com maiores quedas da umidade relativa do ar, e gerarem
brisas e ventos, que carreiam a umidade, num processo que procura distribuir a umidade
para as áreas com maior demanda atmosférica.
Além disso, sistemas silvipastoris podem contribuir para reduzir as emissões de gases
de efeito estufa (GEEs) e os efeitos do aquecimento global e das mudanças climáticas
por meio de fixação de carbono (no solo e na biomassa aérea), aumento da eficiência
de produção, redução da emissão de metano ruminal e por causa do melhor valor
nutricional da dieta animal. Esses eventos levam à redução da pegada de carbono (p.e.
menos carbono emitido por quilograma de carne) do produto final, o que é altamente
desejável. As árvores de sistemas silvipastoris servem como instrumento para a renovação
e recuperação de pastagens e favorecem a ciclagem de nutrientes, especialmente pelo
uso de leguminosas lenhosas, auxiliando na disponibilização desses recursos para os
148 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O desmatamento e a degradação ambiental de grandes áreas pode afetar o clima local mais
que o aquecimento global (Primavesi, 2013). Pois as amplitudes térmicas podem ser de até
13ºC contra os 1ºC a 3ºC do aquecimento global, e que reduzem significativamente a umidade
relativa do ar, especialmente nas horas mais propícias para a fotossíntese e produção vegetal,
que fica assim prejudicada, pois as folhas murcham e os estômatos se fecham.
Biodiversidade
Considerações finais
Sistemas silvipastoris bem conduzidos constituem sistemas de produção agrícola que
alcançam maior eficiência no uso de recursos, com menor pegada ecológica, de água,
de nitrogênio e de carbono, para a obtenção do produto final. Portanto, tais sistemas
constituem um passo à frente no desenvolvimento de sistemas agrícolas conservacionistas,
com maior grau de sustentabilidade, e que podem contribuir para assegurar as condições
propícias para manter a vida superior e a produção de biomassa útil e de água, de maneira
eficaz, especialmente nas regiões tropicais. Isso causa um reflexo positivo sobre o planeta,
com água residente em solo permeável (alongando o ciclo da água), com estruturas
vaporizadoras e diversificadas permanentes, mantendo temperatura e umidade estáveis,
além de acumular carbono.
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Capítulo 11
Sequestro de carbono e mitigação de
emissões de gases de efeito estufa pela
adoção de sistemas integrados
Eduardo Delgado Assad
Susian Christian Martins
Luiz Adriano Maia Cordeiro
Balbino Antônio Evangelista
154 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Durante a 15ª Conferência das Partes (COP-15) o governo brasileiro divulgou o seu
compromisso voluntário de redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no país,
projetadas para 2020 entre 36,1% e 38,9%. Estimava-se naquele momento uma diminuição
em torno de um bilhão de toneladas de CO2 eqfiuivalente (t CO2 eq) até o ano de 2020.
Os acordos firmados foram contestados na época, mas estão muito aquém da capacidade
de redução de emissões da agricultura brasileira. Isto porque a avaliação potencial não
deve levar em consideração o horizonte temporal e sim a quantidade de emissões que
podem ser evitadas considerando-se o atual e futuro uso do solo no país. Como exemplo, o
Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig) da Universidade
Federal de Goiás (https://pastagem.org/index.php/pt-br) aponta que existem 48 milhões
de hectares de pastos degradados no Brasil. Tomando-se como indicador de degradação
a taxa de lotação pecuária de 0,4 unidades animal ha-1 ano-1, estima-se que a capacidade
potencial de reduzir as emissões pela recuperação de pastagens degradadas no país seja
muito maior do que o negociado em Copenhague.
São várias as práticas agrícolas que promovem a redução de emissões de GEE. Dentre
as ações propostas para a redução dessas emissões, vinculadas ao plano setorial da
agricultura, citam-se recuperação de pastagens, integração lavoura-pecuária, fixação
biológica de nitrogênio, reflorestamento, tratamento de dejetos animais, adaptação às
mudanças climáticas e ampliação da área com plantio direto.
• Adubação orgânica
• Aplicação de calcário
• Aplicação de defensivos agrícolas
• Aplicação de fertilizante nitrogenado sintético
• Consumo de energia elétrica
• Cultivo de arroz
• Dejetos de animais em pastagens
• Fermentação entérica
• Fontes secundárias (deposição atmosférica e lixiviação ou escoamento superficial)
1 Segundo Estimativas Anuais de Emissões de Gases de Efeito Estufa no Brasil (MCTI, 2016), disponível em http://
www.mct.gov.br/upd_blob/0228/228468.pdf.
156 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
• Manejo de dejetos
• Manejo de dejetos de animais (exceto animais em pastagens)
• Mudança de uso do solo
• Operações mecanizadas
• Queima de resíduos vegetais
• Resíduos das culturas
As emissões pela agricultura incluem apenas as emissões antrópicas por fontes e remoções
por sumidouros de oito GEE não controlados pelo Protocolo de Montreal. Por isso, não são
incluídos nos cálculos os gases CFCs e os HCFCs, que destroem a camada de ozônio, que já
são controlados pelo Protocolo de Montreal e, portanto, não foram incluídos no Protocolo
de Kyoto.
Capítulo 11
Sequestro de carbono e mitigação de emissões de gases de efeito estufa pela 157
adoção de sistemas integrados
Para o cálculo do CO2eq são utilizadas algumas conversões, sendo que a mais comum
é o GWP (Global Warming Potential) proposto pelo IPCC (da sigla em inglês de Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas). O Quarto Relatório de Avaliação do
IPCC (AR4)3 já examinava métricas alternativas ao GWP e o Quinto Relatório de Avaliação
do IPCC (AR5)4 aprofundou essa análise. Entre as métricas propostas e apresentadas no
AR4 está o Global Temperature Potential (GTP). No inventário nacional brasileiro, o cálculo
deve ser realizado em unidades de massa de cada gás de efeito estufa utilizando a métrica
do GWP-100 do AR4, seguindo as diretrizes da Convenção-Quadro das Nações Unidas
sobre Mudança do Clima (UNFCCC), conforme Tabela 1. Entretanto no Terceiro Inventário
Nacional, as emissões são calculadas em GWP e GTP e comparadas.
2
Disponível em: http://disc.sci.gsfc.nasa.gov/datareleases/images/oco-2_global_image.png.
3
Disponível em: http://www.ipcc.ch/publications_and_data/ar4/wg1/en/ch2s2-10-2.html.
4
Disponível em: www.ipcc.ch/report/ar5/wg1/#.UtRjZfRDvX0.
158 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
* “a” é um indicador de pureza do gás. Essas classificações seguem a Norma ANSl/ASHRAE 34-2010 (Substitui a
Norma ANSl/ASHRAE 34-2007). Inclui Adendos do ANSI/ASHRAE. NORMA ASHRAE: Designação e classificação
de segurança de gás refrigerante.
O PAG é calculado sobre um intervalo de tempo específico, o qual deve ser declarado
juntamente com o valor de PAG. Como exemplo, o PAG do CH4 em 100 anos é 25
vezes maior do que o PAG do CO2, ou seja, uma tonelada de metano tem um poder de
aquecimento 25 vezes maior do que o de uma tonelada de CO2. Interessante observar que
o PAG do óxido nitroso é 310, todavia, a partir de 2015, pelas indicações do relatório do
IPCC AR4 (Figura 2), a relação adotada será de 25 para o CH4 e de 298 para o N2O.
Capítulo 11
Sequestro de carbono e mitigação de emissões de gases de efeito estufa pela 159
adoção de sistemas integrados
O Quarto Relatório de Avaliação do IPCC (IPCC AR4) define o conceito de forçante radiativa (FR)
como a diferença em irradiância líquida na tropopausa (zona atmosférica limite entre a troposfera
e a estratosfera), em unidades de W m-2, entre um estado de referência e um estado perturbado.
A perturbação ocorre pela ação de um agente forçante enquanto as temperaturas de superfície e
da troposfera são mantidas fixas, mas permitindo-se que a estratosfera atinja o equilíbrio radiativo
(Forster et al., 2007). O relaxamento da temperatura estratosférica é importante em processos que
modificam o perfil de temperatura nessa camada da atmosfera (e.g. FR devido à redução de ozônio
estratosférico) (Haywood & Boucher, 2000). Por exemplo, uma forçante negativa indica um maior
fluxo de energia deixando o sistema terrestre na tropopausa em um estado perturbado devido a
um agente climático, comparado ao estado de referência. Com isso, tal agente representaria um
efeito líquido de resfriamento sobre o clima, enquanto um agente com FR positiva indica um efeito
de aquecimento climático. A escolha de um estado de referência pode ser subjetiva, sendo que
alguns autores definem a era pré-industrial, ou então o ano de 1750, como tal estado (e.g. IPCC,
AR4). Uma caracterização climática da era pré-industrial depende, no entanto, de um conjunto de
hipóteses e considerações para sua modelagem e, necessariamente, essa escolha carrega certo
grau de arbitrariedade. Outra opção é considerar a completa ausência do agente forçante como
estado de referência, e.g. atmosfera sem aerossóis quando se avalia a FR de aerossóis (Forster
et al., 2007) ou ainda alguma definição de um nível “natural” ou não perturbado para o agente
forçante (Forster et. al., 2007). Avaliações da FR feitas com definições diferentes sobre o estado de
referência resultam em valores diversos para a mesma forçante. Portanto, qualquer comparação
entre estimativas da FR deve esclarecer se a mesma referência foi utilizada.
Tabela 2. Gases responsáveis pelo efeito estufa e suas respectivas fontes de emissão.
GEE Fontes de Emissão
Mudança no uso do solo e desmatamento
CO2
Queima de combustíveis fósseis
Mudança no uso do solo e desmatamento
Agropecuária (fermentação entérica, manejo de dejetos de animais, cultivo de arroz irrigado, queima
CH4
de resíduos agrícolas)
Tratamento de resíduos (lixo e esgoto industrial e doméstico)
Agropecuária (principalmente associado ao manejo de dejetos de animais, solos agrícolas, queima de
NO2 resíduos agrícolas)
Mudança no uso do solo e desmatamento
GEE Indireto*
Agropecuária (queima de cana-de-açúcar na colheita)
CO
Queimadas em mudança no uso do solo e desmatamento
Agropecuária (queima de resíduos de cana-de-açúcar e algodão)
NOx
Queimadas em mudança no uso do solo e desmatamento
* Gases que influenciam as reações químicas na troposfera, e que provocam indiretamente aquecimento da
atmosfera
160 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Com a morte das plantas, tem-se a formação dos resíduos vegetais (serrapilheira em
áreas de floresta, liteira em áreas de pastagem ou palhada de culturas após a colheita).
Com o passar do tempo, sofrem um processo de fragmentação por macrorganismos e,
posteriormente, a decomposição por microrganismos do solo. Dessa forma, se o material
não for protegido da ação biológica dos organismos do solo, ou se essa ação não for lenta,
a maior parte dele retornará em pouco tempo para a atmosfera na forma de CO2.
5
O carbono orgânico total (COT) é o principal constituinte do solo, correspondendo a, aproximadamente, 58%
da matéria orgânica do solo (MOS), que, por sua vez, resulta do processamento e da decomposição parcial dos
resíduos vegetais ou dos materiais orgânicos (biomassa) existentes no ambiente (Cordeiro et al., 2011).
162 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Dessa forma, os sistemas de produção que utilizam ILPF com preparo mínimo ou sem
preparo do solo e com manutenção de palhada passam da condição de fonte de CO2
rumo à atmosfera para a condição de dreno ou assimilação de CO2 para o solo (Figura 4)
Foto: Breno Lobato
Figura 4. Sistema de integração lavoura-pecuária-floresta com alta eficiência de remoção de carbono da atmosfera.
Em 2009, o país se comprometeu a reduzir suas emissões de GEE de 36,1% a 38,9% (cerca
de 1 bilhão de toneladas de CO2 eq) em relação ao que emitiria em 2020. Nesse contexto,
a meta para o setor agropecuário é reduzir de 133,9 a 162,9 milhões t CO2 eq até 2020 por
meio da adoção de diversas técnicas agropecuárias mitigadoras de GEE.
O alto teor de matéria orgânica (MO) na superfície do solo é um dos principais benefícios
dos sistemas integrados, quando associados às práticas de manejo e conservação do solo.
Isto porque essas práticas melhoram as condições físicas, químicas e biológicas do solo,
enquanto o cultivo de monocultura sob o sistema convencional por alguns anos ocasiona
a perda de MO e, consequentemente, compromete a qualidade do solo.
6
O Guia do IPCC prevê a contabilização, para fins de inventário, das emissões e remoções antrópicas de gases
de efeito estufa. As estimativas de emissões brutas de gases de efeito estufa não consideram a remoção de CO2
pelas mudanças de uso do solo, isto é, a quantidade de gases de carbono fixados pelo crescimento da vegetação.
Quando há desconto das remoções, as estimativas são de emissões liquidas (emissões menos remoções).
164 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 5. Dinâmica da matéria orgânica do solo na camada de 0-20 cm em dois sistemas de cultivo em experimento
de longa duração.
Fonte: Adaptado de Souza et al. (1997).
Os sistemas integrados mais complexos, como ILP, ILPF e SAFs, podem gerar valores de
redução de emissão ainda maiores devido à fixação adicional de carbono na biomassa
florestal e no solo. Com a adoção dos sistemas de integração, considerando-se valor
médio de 1,5 t C ha-1 em dez anos a partir de 2014 (valor inferior ao indicado por Alves
et al., 2008) e considerando-se uma taxa de conversão anual de 400 mil hectares de
pastagens degradadas (2,4 milhões de hectares até 2020) em ILP ou ILPF, pode-se atingir
15,3 milhões de t CO2eq. Se for considerada toda a conversão prevista na agricultura ABC,
Capítulo 11
Sequestro de carbono e mitigação de emissões de gases de efeito estufa pela 165
adoção de sistemas integrados
A situação atual indica que 61% dos contratos do plano ABC são para recuperação
de pastagens, 23% para atividades de plantio direto, 7% para ILPF e 6% para florestas
plantadas (Análise..., 2014). Considerando-se que em um intervalo de dez anos seria
possível atingir o valor médio da diferença entre o estoque de C em pastagens degradadas
e em sistemas integrados ou recuperados, e que 42 milhões de hectares de pastagens
degradadas poderiam ser recuperados e outros 15 milhões transformados em sistemas
integrados, seria possível evitar emissões de 143 milhões de t CO2 eq/ano. Assim, apenas
com a recuperação de pastagens e uso dos sistemas de ILP e ILPF é possível propor metas
de mitigação mais ousadas, que ultrapassam aquelas preconizadas pelo Plano ABC.
Para este tipo de contabilidade é fundamental abater as emissões diretas dos bovinos,
utilizando-se os fatores de emissão definidos por Lessa et al. (2014).
Considerações finais
Apesar de ainda ser o maior emissor de GEE no Brasil, o setor agropecuário apresenta
potencial de redução em vários subsetores e processos. No setor de pecuária bovina, por
exemplo, os sistemas integrados e as estratégias de manejo de pastagens apresentam
grande potencial de redução de emissões e sequestro de GEE. Além disso, tais sistemas
podem potencializar a competitividade do setor diante das exigências de mercados
internacionais, valorizando a terra e os animais produzidos em sistemas de baixa emissão,
bem como, podem alavancar a intensificação produtiva na pecuária.
166 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Diante disso, pode-se admitir que a agricultura brasileira, via sistemas de integração,
deixará de ser uma das principais responsáveis pela emissão de GEE e, em um futuro
próximo, passará a ser considerada como uma eficaz mitigadora desses gases, além de
aumentar a capacidade de produção desses sistemas.
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Capítulo 11
Sequestro de carbono e mitigação de emissões de gases de efeito estufa pela 167
adoção de sistemas integrados
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Rodrigo Alva
Capítulo 12
Marcas-conceito e a proposta de uma
Plataforma de Pecuária de Baixo Carbono
Fabiana Villa Alves
Roberto Giolo de Almeida
Valdemir Antônio Laura
Rodrigo da Costa Gomes
Davi José Bungenstab
170 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Neste contexto, este capítulo apresenta uma iniciativa brasileira, liderada pela Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa, que vai além da simples contabilização
de carbono, denominada “Carne Carbono Neutro”, inserida na “Plataforma Pecuária de
Baixo Carbono”. Esta última envolve, entre outras iniciativas, a construção de marcas-
conceito voltadas a diferentes produtos pecuários que tiveram suas emissões reduzidas
Capítulo 12
Marcas-conceito e a proposta de uma Plataforma de Pecuária de Baixo Carbono 171
Em 2016, dentro de uma ótica de Plataforma de Pecuária de Baixo Carbono que envolvesse
diferentes sistemas e tecnologias de produção e seguindo as premissas de mensuração,
relato e validação aplicada ao CCN, foi criada a marca-conceito Carne Baixo Carbono (CBC)
(Figura 2).
172 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A principal diferença entre ambas é que, nesta última, não é prevista a presença de árvores
e o sequestro de carbono contabilizado é o que ocorre no solo por meio da intensificação
das pastagens, principalmente, pelo uso de sistemas em Integração Lavoura-Pecuária.
Assim, nas diretrizes que embasam o protocolo de certificação voluntária para uso da
marca CBC, são aceitos sistemas pecuários que não neutralizam totalmente as emissões
dos animais, mas que mitigam parte dessas.
Sua principal finalidade é garantir ao consumidor que os bovinos que deram origem
ao produto (carne) tiveram suas emissões de metano entérico compensadas durante o
processo de produção pelo crescimento das árvores presentes no sistema. Além disso,
garantir alto grau de bem-estar animal, obtido pela presença de árvores em quantidade
suficiente para fornecimento de sombra e, consequentemente, conforto térmico.
Considera-se, assim, que os sistemas em integração habilitados a produzirem CCN são os
do tipo integração pecuária-floresta (IPF), ou silvipastoril, e sistema de integração lavoura-
pecuária-floresta (ILPF), ou agrossilvipastoril.
Para o planejamento das áreas a serem certificadas, recomenda-se que sigam (ou tenham
seguido) as diretrizes estabelecidas pelo Plano Agricultura de Baixa Emissão de Carbono/
Plano ABC (Brasil, 2012). Outras instruções para a implantação dos sistemas são contidas
em Castro e Paciullo (2006), Porfírio-da-Silva et al. (2009) e Serra et al. (2012).
Ressalta-se que, apesar do CCN focar exclusivamente a neutralização dos GEE emitidos
pelos animais, os sistemas IPF e ILPF apresentam potencial para virem a ser enquadrados
no âmbito do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e/ou remunerados pela
prestação de serviços ambientais, por meio da contribuição do componente arbóreo na
remoção de CO2 atmosférico, dentre outros.
Além disso, apesar de não ser o foco específico do CCN (mas sim do CBC conforme discutido
adiante), a certificação por terceira parte, caso de todas as marcas-conceito da plataforma,
garante que as pastagens sejam monitoradas quanto ao seu manejo adequado, durante o
processo produtivo da carne, visto que manejos inadequados podem acarretar processo
de degradação da pastagem, fato este que inviabilizaria a obtenção do selo. Informações
técnicas a respeito do uso e manejo correto de forrageiras em sistemas de IPF/ILPF podem
ser encontradas em Almeida et al. (2012), Fontaneli et al. (2012), Costa e Queiroz (2013) e
Paciullo et al. (2015).
174 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
pode-se utilizar a forrageira para produção de silagem e/ou feno, atentando-se para as
devidas reposições de nutrientes no sistema.
Ainda que o CCN traga consigo os benefícios diretos e indiretos atrelados aos sistemas
IPF/ILPF (como mitigação de GEE, aumento da biodiversidade, maior bem-estar animal,
uso mais eficiente dos recursos naturais), de grande apelo mercadológico, por se tratar de
produto alimentício (carne), foi dada atenção, em suas diretrizes, à qualidade intrínseca do
produto final. Além de serem considerados para fins de certificação animais que passaram
as fases de cria-recria-terminação (ciclo completo) ou recria-terminação nos sistemas
IPF/ILPF, os mesmos devem atender a requisitos que contemplam recomendações
pré-determinadas quanto ao seu manejo e nutrição. Serão aceitas carcaças de fêmeas
e machos castrados que apresentem, na ocasião do abate, maturidade 0, 2 e 4 dentes
(referente à troca dos dentes incisivos de leite por definitivos) e acabamento mediano
(3 a 6 mm de espessura de gordura) ou uniforme (6 a 10 mm de espessura de gordura),
de acordo com o Sistema Brasileiro de Tipificação de Carcaças Bovinas. Animais inteiros
poderão participar do programa desde que abatidos com maturidade 0 ou 2 dentes e com
acabamento exigido no programa. Os animais poderão receber suplementação mineral,
proteica, proteico-energética e/ou energética (semiconfinamento), em quantidades pré-
estabelecidas. Na fase de recria, por exemplo, recomenda-se o uso de suplementação
mineral, proteica (1 a 2 g/kg de peso vivo) ou proteico-energética (3 a 5 g/kg de peso vivo).
Na fase de terminação, qualquer dos tipos citados pode ser utilizado, porém recomenda-
se o uso de suplementação energética ou semiconfinamento (6 a 12 g/kg de peso vivo)
para facilitar o alcance do grau de acabamento de carcaça desejado. O limite máximo de
fornecimento de suplemento deve ser de até 20 g/kg de peso vivo, de forma a forragem
tenha participação significativa na dieta ingerida, por se tratar de carne do tipo “grass-fed
beef”. Demais detalhes sobre os procedimentos de suplementação podem ser obtidos em
Medeiros e Gomes (2012).
Por fim, pode-se dizer que a marca-conceito CCN não prejudica ou substitui outras marcas,
certificações ou sistemas de produção, mas é exclusiva para sistemas em integração com
árvores, sendo sua concessão restrita à área nos quais os animais permaneceram durante
seu ciclo de vida.
Considerações finais
Com o desenvolvimento dos sistemas integrados ao longo de décadas, o Brasil abriu
portas para o enfretamento de uma demanda atual e oferece resposta a uma preocupação
mundial. As recentes iniciativas de materialização do conhecimento e das práticas geradas
em marcas-conceito não só representam uma contribuição ao debate global na temática
de mudanças climáticas, mas também uma inovação no seu sentido pleno. Ao traduzir as
marcas conceito em produtos acessíveis aos consumidores, tais como a Carne Carbono
Neutro, Bezerro Carbono Neutro ou Couro Carbono Neutro, a Embrapa e seus parceiros
dão sentido de mercado a estas iniciativas e tornam tangíveis os conceitos de pecuária
sustentável. Neste sentido, a Plataforma Pecuária de Baixo Carbono vem consolidar e
fortalecer as iniciativas de sustentabilidade no setor pecuário brasileiro.
178 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
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Capítulo 12
Marcas-conceito e a proposta de uma Plataforma de Pecuária de Baixo Carbono 179
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Capítulo 13
Fundamentos e benefícios do sistema
de integração lavoura-pecuária-floresta
para os recursos hídricos
Lineu Neiva Rodrigues
Fernando Falco Pruski
182 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
A Organização das Nações Unidas projeta que até 2050 ocorrerá um aumento de 70%
na demanda mundial por alimentos e de 55% na de água (WWAP, 2014). A produção
de alimentos deverá ter como premissa básica o uso sustentável dos recursos naturais,
especialmente solo e água.
Atender as demandas atuais e futuras por alimento, entretanto, irá requerer um rápido
aumento da produtividade, que precisa ser feito sem danos adicionais ao ambiente. Para
que isso possa acontecer é fundamental que os princípios de sustentabilidade sejam
parte central de qualquer política agrícola, para promover incentivos e disponibilizar
as condições para o uso sustentável dos recursos naturais (Agricultural Sustainability,
2004). Nesse contexto, é necessário melhorar a eficiência de uso da água e energia, o que
demanda melhor uso e aplicação dos avanços na ciência, na engenharia e nas tecnologias
de solo, planta e irrigação.
Produzir de forma sustentável não é uma tarefa simples. Faz-se necessário reduzir o
crescimento horizontal (aumento do uso dos recursos naturais) e aumentar o crescimento
vertical (aumentar a eficiência). As tomadas de decisão no ambiente agrícola estão
cada vez mais complexas. A agricultura será cada vez mais pressionada na direção da
multifuncionalidade, principalmente, na produção de alimentos, fibras e energia.
A busca por uma agricultura sustentável tem levado os profissionais da área a repensar
as técnicas de manejo e os aspectos econômicos das operações agrícolas adotadas. Neste
contexto, o sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) se apresenta como uma
grande oportunidade para se produzir com sustentabilidade. Embora seja uma prática
antiga, pouco se conhece a respeito dos seus benefícios para os recursos hídricos.
A cobertura vegetal é a defesa natural contra a erosão. Quanto mais protegida pela
cobertura vegetal estiver a superfície do solo contra a ação da chuva, menor será
a propensão de ocorrência de erosão. Além de aumentar a quantidade de água
interceptada, a vegetação amortece a energia de impacto das gotas de chuva, reduzindo
a destruição dos agregados, a obstrução dos poros e o selamento superficial do solo. A
cobertura vegetal na superfície também reduz a velocidade do escoamento superficial,
pelo aumento da rugosidade hidráulica do seu percurso.
Uma área com sistema de ILPF, por apresentar uma cobertura vegetal mais densa e
permanente, é naturalmente mais protegida que uma área com pastagem degradada.
A área foliar e a cobertura morta atuam na dissipação da energia cinética (Figura 1),
protegendo o solo contra o impacto das gotas de chuva, reduzindo a ocorrência do
selamento.
Os benefícios da ILPF para os recursos hídricos são evidentes, entretanto ainda não
foram adequadamente quantificados. Para um melhor entendimento desses benefícios
é importante compreender como ocorre a circulação da água no sistema solo-planta-
atmosfera, fenômeno conhecido como ciclo hidrológico.
184 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A ILPF melhora a cobertura e a estrutura física do solo, criando, também, canais biológicos
que favorecem o movimento da água no solo, aumentando a infiltração e reduzindo a
escoamento superficial, o que contribui para aumentar a recarga do lençol freático.
Esse é o principal propósito de qualquer sistema conservacionista, pois é o escoamento
subterrâneo que mantêm as vazões nos rios durante o período de estiagem. Assim sendo,
o aumento da infiltração da água no solo e a consequente redução do escoamento
superficial, além de reduzir o processo erosivo, promove a redução do risco de ocorrência
de enchentes e aumenta a disponibilidade de água em períodos mais secos.
Capítulo 13
Fundamentos e benefícios do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta para 185
os recursos hídricos
Processos hidrológicos
Para melhor entendimento de como a ILPF pode impactar de forma positiva o sistema
hídrico local é fundamental ter-se um entendimento claro do comportamento dos
processos hidrológicos, de como ocorre a circulação da água no sistema e de como os
processos podem ser impactados.
Precipitação pluvial
No planejamento conservacionista o que se busca é fazer com que a maior parte da
água precipitada infiltre no solo, aumentando a recarga dos aquíferos. A precipitação
pluvial é a principal fonte de entrada
Foto: Ozanival Dario Dantas da Silva e Lineu Neiva Rodrigues
Meier e Mannering, citados por Derpsch et al. (1991), estimaram que a energia cinética das
gotas de chuva que caem sobre um hectare de terra em um ano corresponde à energia
liberada por cerca de 50 toneladas de dinamite. Em uma área com pouca cobertura
vegetal o impacto da chuva ocorre diretamente na superfície do solo. Praticamente não
há dissipação da energia cinética das gotas de chuva, uma vez que a cobertura do solo é
muito reduzida.
Em uma área com sistema de ILPF, as gotas de chuva, antes de atingirem o solo, atingem a
cobertura vegetal. Isto reduz a velocidade de queda da gota e o seu tamanho, reduzindo
a energia cinética, o selamento superficial e a ação de desprendimento de partículas, que
dão origem ao processo erosivo. A infiltração, por sua vez, se mantém em taxas elevadas,
o que favorece a recarga dos aquíferos.
Evaporação
A evaporação é um fenômeno puramente físico em que a água em seu estado líquido passa
para o estado gasoso. Levando-se em consideração o efeito nos processos hidrológicos,
o importante é a redução da umidade do solo, uma vez que esta redução melhoras a
capacidade de armazenamento e de infiltração de água no solo.
Transpiração
A transpiração é a transferência de água na forma de vapor da planta para a atmosfera.
Trata-se de uma retirada benéfica de água do sistema, uma vez que, quando associada
à cultura de interesse, contribui para o aumento da produção, sendo o seu efeito nos
processos hidrológicos similar àquele associado à evaporação.
188 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O sistema de ILPF, por apresentar uma cobertura vegetal usualmente mais densa, inclusive
pela presença do componente florestal, apresenta taxas de transpiração mais elevadas
quando comparadas a uma pastagem degradada. Na transpiração, a água se movimenta
do solo para a planta, reduzindo a água disponível no solo, até mesmo em camadas mais
profundas. Essa retirada de água do solo aumenta a capacidade de armazenamento e
de infiltração. Desta forma, nas chuvas subsequentes, no sistema de ILPF, o escoamento
superficial será menor e a recarga do lençol freático maior, contribuindo para o aumento
do escoamento de base e para a regularização e redução da amplitude das vazões nos rios.
Em relação às vazões mínimas, existem dois efeitos que atuam em sentidos opostos,
o aumento da infiltração da água no solo e o aumento da evapotranspiração, sendo
que o sistema de ILPF pode gerar tanto aumento como redução das vazões mínimas,
dependendo do efeito predominante, se é o aumento da infiltração ou o aumento da
evapotranspiração. Esta predominância está diretamente ligada a diversos fatores, como,
por exemplo, a posição do lençol freático.
Infiltração
O processo de infiltração consiste na passagem da água em estado líquido pela superfície
do solo. Ela é responsável pela recarga dos aquíferos, que irá contribui para a vazão dos
cursos d’água. Quanto maior a taxa de infiltração, menor é o escoamento superficial. A
taxa de infiltração é máxima no início da chuva e diminui com o passar do tempo e com o
aumento da água armazenada no solo.
Em áreas com pastagem degradada a compactação do solo é maior, bem como a sua
suscetibilidade ao processo de selamento superficial. Consequentemente, a infiltração é
menor, sendo menor também a recarga dos aquíferos e, consequentemente, a contribuição
da área para o aumento da disponibilidade hídrica nos períodos de estiagem.
Em áreas com sistema de ILPF, como a recarga é maior, aumenta o escoamento subterrâneo,
também conhecido como escoamento de base, que é lento. Isto é, mesmo em bacias
hidrográficas pequenas, a água da chuva fica no sistema por meses, sendo disponibilizada
durante o período de estiagem e com melhor qualidade do que a água que chega aos
mananciais hídricos pelo escoamento superficial.
Armazenamento superficial
Quando a intensidade de precipitação é maior do que a taxa de infiltração da água no
solo, a água começa a ficar retida nas depressões e nas irregularidades do terreno e a
empoçar na superfície do solo, iniciando, então, a fase de armazenamento da água na
superfície, chamado de armazenamento superficial (Figura 7).
Capítulo 13
Fundamentos e benefícios do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta para 189
os recursos hídricos
A rugosidade da superfície do solo determina a quantidade de água que pode ser mantida
como lâmina armazenada superficialmente. O aumento da rugosidade superficial do solo,
especialmente pela existência de cobertura vegetal, aumenta o armazenamento de água
na superfície e, consequentemente, o volume total de água infiltrado, tanto pela redução
do escoamento superficial quanto pelo aumento da deposição de sedimentos, com
consequência positiva para a recarga dos aquíferos.
Escoamento superficial
O escoamento de água sobre a superfície do solo está diretamente associado à erosão
hídrica, que é capaz de desagregar e transportar sedimentos, compostos químicos,
matéria orgânica, sementes e agrotóxicos, sendo capaz de causar prejuízos diretos à
produção agropecuária e a poluição dos cursos d’água. Foto: Lineu Neiva Rodrigues
O primeiro agente cisalhante, isto é, aquele que acontece devido ao impacto das gotas
de chuva (Figura 9), está diretamente associado à energia cinética da precipitação e,
portanto, à massa, ao tamanho e à velocidade das gotas e ao total precipitado.
Nas áreas agrícolas desprovidas de vegetação, ou com pouca cobertura vegetal, a maior
parte da desagregação do solo ocorre pelo impacto das gotas das chuvas, sendo que
a quantidade de solo desestruturado aumenta com a intensidade da precipitação, a
velocidade e o tamanho das gotas. Outra forma de desprendimento de partículas é o
escoamento superficial, que ocorre quando este supera a tensão crítica de cisalhamento
do solo.
Capítulo 13
Fundamentos e benefícios do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta para 191
os recursos hídricos
No caso da erosão, de maneira geral, o maior benefício da ILPF é manter uma cobertura
adequada do solo por mais tempo, contribuindo da seguinte forma:
É importante saber como os recursos naturais, principalmente solo e água, são beneficiados
por esse sistema. Em relação aos recursos hídricos, é sabido e foi demonstrado que ele
afeta vários dos componentes do ciclo hidrológico da água. A melhoria das condições
físicas, químicas e biológicas do solo, favorece a movimentação e a retenção da água. O
aumento da quantidade de matéria orgânica influencia várias características do solo e
melhora também sua capacidade de retenção de água.
Outro benefício da floresta é que ela ameniza o clima local, reduz a temperatura, alterando
as condições de evapotranspiração. É evidente que a magnitude dessa alteração depende
de vários fatores, como, por exemplo, o tipo de árvore, a sua orientação e disposição, o
espaçamento, etc.
Considerações finais
A principal contribuição dos sistemas de integração para o sistema hídrico é manter
a superfície do solo com melhor cobertura vegetal por períodos de tempo maiores,
contribuindo para a recarga dos aquíferos, reduzindo o escoamento superficial e
aumentando a infiltração da água no solo.
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Rodrigo Alva
Capítulo 14
Dinâmica da água em sistemas de
integração lavoura-pecuária-floresta*
Marcus Giese Roberto Giolo de Almeida
Sarah Glatzle Manuel Claudio Motta Macedo
Folkard Asch Mariana Pereira
* Tradução livre da língua inglesa para a língua portuguesa realizada por Davi J. Bungenstab com consentimento
dos autores. Para acesso ao texto original em ingês, favor contatar os editores.
196 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Os sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) oferecem opções promissoras
de uso da terra para enfrentar os desafios previstos para sistemas de produção agrícola
do futuro, mais especificamente a crescente demanda por produção de alimentos
e uma gestão sustentável do uso da terra. No entanto, para se chegar a uma visão
abrangente de como os sistemas de ILPF se comportam ecologicamente e em um
contexto socioeconômico, precisamos de estudos de campo com análises aprofundadas.
Um aspecto importante que até agora tem recebido pouca atenção, é a forma como os
sistemas de uso da terra com ILPF afetam a dinâmica da água no solo. Preencher essa
lacuna de conhecimento parece ambicioso, pois esses sistemas aparecem em múltiplas
características, combinando diferentes componentes de lavouras, árvores, forrageiras e
animais em diversos ambientes e sob gerenciamento que apresenta diversas variações.
No entanto, para avançar na busca de opções de implementação dos sistemas de ILPF
com intensificação sustentável, precisamos aumentar nosso conhecimento sobre como
os recursos hídricos são afetados. Utilizando estudos de campo realizados em sistemas
de ILPF estabelecidos em Campo Grande (MS), este capítulo aborda alguns desafios
relacionados à análise da dinâmica da água em sistema de ILPF.
Os sistemas integrados de uso da terra têm sido frequentemente projetados não somente
para diversificar, mas também para aumentar a produtividade agrícola. Comparados à
monocultura, esses sistemas são conhecidos por seu potencial de melhorar a resiliência,
ou seja, a adaptação ou resistência a situações extremas e com menor impacto ambiental e
na produção. Por esse motivo, atualmente os sistemas de integração são frequentemente
discutidos como uma opção para a intensificação sustentável no contexto de segurança
alimentar e estabilidade ambiental (Moraes et al. 2013, Lemaire et al. 2014).
A água é um dos recursos mais importantes para seres humanos, animais e plantas. Mas
sua disponibilidade reduzida em muitos sistemas de uso da terra em todo o mundo, tanto
em termos de quantidade quanto de qualidade, está ameaçando cada vez mais nossos
sistemas agroecológicos. Como base para decisões futuras, precisamos melhorar nosso
entendimento sobre o desempenho de nossos sistemas de produção em relação ao uso
da água. É necessário admitir que ainda existem lacunas consideráveis de conhecimento
sobre sistemas integrados e seu balanço hídrico.
Por um lado, essa falta de informações precisas pode ser devida a interações relativamente
complexas dos componentes de ILPF que afetam a dinâmica da água, o que torna difícil seu
estudo. Isso exige uma abordagem abrangente de medição e uma análise cuidadosamente
realizada. Por outro lado, muitos sistemas integrados foram estabelecidos em áreas que
recebem chuvas suficientes para apoiar o crescimento da vegetação. Assim, a água
nem sempre é considerada um recurso limitante em sistemas de ILPF em comparação
com outros fatores, como nutrientes, temperatura, luz ou competição biológica entre
as espécies utilizadas. No entanto, nos últimos anos, as mudanças climáticas estão
desafiando cada vez mais nossos sistemas de produção agrícola de várias maneiras e,
também, os sistemas de ILPF precisam atender às demandas da agricultura adaptada
ao clima,chamada “climate smart agriculture”, que poderia ser traduzida como uma
agricultura inteligente.
Capítulo 14
Dinâmica da água em sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta 197
Devido à ocorrência mais frequente de períodos de seca mais extensos, mesmo durante
a estação chuvosa, os chamados veranicos, a falta de água é um sério desafio relacionado
às mudanças climáticas. Por esse motivo, os produtores estão muito interessados em
aprender mais sobre a resiliência dos sistemas de ILPF contra as secas e como as opções de
gestão para economia de água podem ser aplicadas para reagir a essas crises. É importante
também lembrar que não apenas a escassez de água está se tornando cada vez mais um
desafio para a agricultura. Eventos de inundação após chuvas de alta intensidade podem
ter um poder destrutivo ainda mais forte que uma seca severa.
Por isso, muitos fatores precisam ser considerados ao estudar-se a dinâmica da água de
um sistema de produção agrícola. Alguns deles são bastante evidentes, como o padrão
climático local ou regional, que certamente é o fator dominante. O padrão de chuva
local, que é a principal via de entrada de água nos sistemas, é composto pela distribuição
anual e a intensidade dos eventos individuais de chuva. O fator climático precipitação
é complementado pela temperatura do ar, radiação solar e dinâmica do vento, que
afetam substancialmente as perdas de água para a atmosfera. As propriedades do solo,
como por exemplo, tipo de solo, textura e topografia, são outros componentes naturais
não-biológicos importantes. Em combinação com as práticas de cultivo, esses fatores
desempenham um papel essencial tanto para a capacidade de retenção de água no
solo quanto para os fluxos de água no solo. Esses fluxos podem ser laterais (escoamento
superficial, interfluxo) ou verticais (percolação, drenagem e evapotranspiração).
Além desses fatores, a gestão é um dos fatores mais importantes a ser considerado na
análise da dinâmica da água; a seleção de culturas e animais a serem combinados em
sistemas de ILPF afeta grandemente os fluxos de matéria e, consequentemente, os
processos ecológicos, incluindo as vias da água. A densidade de árvores e as práticas
silviculturais como desramas e desbastes, a adubação e a intensidade de pastejo
dos animais, bem como a duração do sistema, afetarão a dinâmica da água direta e
indiretamente. Por exemplo, a altura das árvores e a densidade de seu plantio influenciam
na quantidade de radiação solar recebida pelas plantas do sub-bosque e pela superfície
do solo. Consequentemente, o sombreamento reduzirá a entrada de energia e alterará o
microclima sob o dossel, o que certamente afetará o crescimento das plantas e a captação
de água. Características morfológicas variáveis das copas das árvores também funcionam
como uma superfície adicional de interceptação e potencialmente de redistribuição das
chuvas. A pecuária adiciona outro fator substancial a ser considerado para a dinâmica
da água no local. A redução da biomassa do capim, a redistribuição de nutrientes e o
impacto mecânico do pisoteio do gado ou outros herbívoros afetam quase todos os
processos ecológicos com potencial impacto na dinâmica da água. Como os sistemas
de ILPF são encontrados nos mais variados tipos de combinações de espécies, práticas
de manejo e ambientes naturais, é fácil imaginar a complexidade crescente com a qual
estamos lidando no contexto da dinâmica da água.
Figura 1. A) Foto da configuração do campo experimental onde foi realizada a amostragem; B) Desenho
esquemático do campo experimental com destaque para os pontos amostrais.
C
Figura 5. (A) Detalhe da sonda de perfil instalada no solo
e com gaiola protetora de pisoteio; (B) Detalhe da sonda
Figura 7. Leitura de umidade do solo com na fileira de árvores; (C) Alocação das sondas em pontos
medidor HH2 portátil conectado à sonda de equidistantes entre as fileiras de árvores.
perfil na área experimental.
202 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Resultados
Clima: o clima no período do estudo mostrou distribuição característica das chuvas em
uma savana tropical do hemisfério Sul, com as maiores quantidades entre novembro e
maio e uma estação seca de junho a outubro (Figura 8A). A quantidade total de chuva
recebida durante o ano foi de 1550 mm e a temperatura média foi de 24 °C.
A B
C D
Figura 8. (A) Temperatura em °C e chuva em mm; (B) Radiação fotossinteticamente ativa (RFA) em µmol m-1 s-1;
(C) Umidade do solo em cm-3 100cm-3, ponto de murcha permanente PWP; (D) Biomassa total de capim acima do
solo em g m-2, a linha verde representa a estação chuvosa e a linha amarela a estação seca.
Fotos: Mariana Pereira
A B C
Figura 9. Ilustração do sombreamento feito pelas árvores no sistema de ILPF estudado. (A) na estação de
transição (setembro de 2015); (B) estação de chuvosa (novembro de 2015) e (C) estação seca (julho de 2016).
204 Fotos: Mariana Pereira
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A B
Figura 10. Ilustração da produção de biomassa no sistema de ILPF estudado. (A) na estação de chuvosa (janeiro
de 2016) e (B) estação seca (julho de 2016).
Discussão
Como esperado, os teores de água no solo do sistema de ILPF mostrou uma dinâmica sazonal
distinta induzida pelas estações seca e chuvosa. A interceptação do dossel das árvores
não afetou a distribuição das chuvas no gradiente entre as fileiras de árvores. Embora as
posições centrais entre as fileiras de árvores recebessem mais radiação durante o verão
e tivessem muito mais biomassa verde para possíveis perdas de água por transpiração,
os teores de água no solo nesses pontos foram os mais altos do gradiente e os pontos
de murcha nunca foram atingidos, nem durante a estação seca, no inverno. Para o verão
chuvoso, a umidade do solo e a entrada de radiação foram positivamente relacionadas e,
consequentemente, o sombreamento não parece ter um efeito pronunciado na umidade
crítica do solo no sistema de ILPF estudado. No entanto, como o conteúdo de água no
solo estava muito acima dos pontos de murcha durante o verão, a RFA parece dominante
na limitação do crescimento das plantas forrageiras ao longo do gradiente entre as fileiras
de árvores. No entanto, outras influências, como competição biológica e dinâmica de
nutrientes, podem interagir com a disponibilidade de água e luz. O menor teor de água
da camada superficial do solo medido nas posições de amostragem próximas às fileiras de
árvores poderia, portanto, ser provavelmente atribuído ao aumento da captação de água
pelas árvores. Durante o inverno seco, as diferenças no teor de água no solo ao longo
do gradiente foram menos distintas, situando-se em torno de 10% abaixo dos valores de
verão. Como consequência, o teor de água no solo próximo às fileiras de árvores estava
se aproximando do ponto de murcha, indicando sérias condições de estresse hídrico
para as plantas enraizadas na camada superficial do solo, em especial, as forrageiras. Essa
condição parcial de estresse hídrico durante a estação seca pode ser um indicador de
esgotamento crítico de recursos e vulnerabilidade durante períodos de estiagem.
É importante ter em conta que uma tarefa da pesquisa agrícola aplicada é fornecer
dados sólidos e confiáveis que possam ser usados para tirar conclusões para a prática do
agricultor. Os resultados podem também contribuir para enfrentar os desafios decorrentes
das mudanças climáticas e podem ser usados no contexto de uma gestão aprimorada
Capítulo 14
Dinâmica da água em sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta 205
A demanda é alta por indicadores que sejam fáceis de medir, sem a necessidade de se
usar equipamentos sofisticados e caros. São recomendados indicadores que possam ser
usados como referência para uma determinada condição ou um ponto de inflexão de
sistemas de ILPF. Ou seja, os pontos nos quais os agricultores devem tomar as medidas
apropriadas para melhorar ou manter o rendimento e/ou a sustentabilidade de seu
sistema. No que diz respeito à sustentabilidade, vale a pena relacionar a ecodinâmica de
diferentes sistemas de uso da terra com os ecossistemas naturais, como a vegetação do
Cerrado. Nesse sentido, comparar a dinâmica da água e outras funções do ecossistema
entre os diferentes sistemas de uso da terra e ecossistemas naturais irá fornecer
informações valiosas sobre os parâmetros-chave alterados pelos seres humanos. Por sua
vez, isso nos ajudará a avaliar e definir indicadores e, consequentemente, ajustar nossas
metas em direção à sustentabilidade.
Conclusões
A dinâmica da água dos sistemas de ILPF é afetada por interações complexas de
componentes únicos e, portanto, precisa ser examinada com cuidado durante os estudos
ecológicos. O sistema de ILPF estudado mostrou sazonalidade distinta induzida pela
estação seca e chuvosa. O gradiente entre as fileiras de árvores apresentou maior teor de
água no solo, biomassa e radiação, no verão e nas posições centrais. O sombreamento
resultou em fortes variações sazonais e diferenças ao longo do gradiente na entrada de
luz que, surpreendentemente, não estavam relacionadas à dinâmica da água no solo, mas
pareciam limitar o crescimento da vegetação do sub-bosque. As posições de amostragem
próximas às fileiras de árvores estavam se aproximando do ponto de murcha durante
a estação seca, provavelmente, devido ao aumento da captação de água pelas árvores.
Essa condição parcial de estresse hídrico durante a estação seca pode ser um indicador
de esgotamento crítico de recursos e vulnerabilidade durante períodos de estiagem.
No entanto, são necessárias análises mais aprofundadas para se obter uma imagem
abrangente da dinâmica da água de sistemas de ILPF, a fim de preencher lacunas de
conhecimento na avaliação da intensificação sustentável.
Referências
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Lemaire G, Franzluebbers A, Faccio Carvalho PC, Dedieu B (2014) Integrated crop–livestock systems: Strategies
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Foto: Nivaldo Karvatte Junior
Capítulo 15
Bem-estar animal e ambiência na ILPF
Fabiana Villa Alves
Vanderley Porfírio-da-Silva
Nivaldo Karvatte Junior
208 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Em muitas regiões de clima tropical, bovinos de corte e de leite são mantidos em pastagens
durante todo o ano. A exposição a intensa incidência de radiação solar direta submete
estes animais a situações termicamente estressantes, com impactos negativos na saúde,
bem-estar e produtividade (Van Laer et al., 2015; Vizzotto et al., 2015).
Assim, este capítulo examina e tenta elucidar a definição de dois conceitos-chave para o
entendimento dos benefícios dos sistemas em integração lavoura-pecuária-floresta sobre
os animais: bem-estar animal e ambiência.
que nele se encontra incluído, inclusive o ser humano, ou seja, é o “ambiente em que vive o
animal” (Broom; Molento, 2003; Silva, 2000; Silva, 2008; Silva; Vieira, 2010).
Para fins didáticos, em sistemas de produção animal, a ambiência pode ser dividida em
térmica, lumínica, acústica e aérea, e todas podem ser consideradas fatores importantes
para que se atinja o máximo de produtividade que o potencial genético que cada espécie,
raça ou animal pode expressar.
Bem-Estar Animal
A ideia de bem-estar animal é muito mais antiga que a sua pesquisa como um campo
de trabalho científico. Hoje, existem diferentes concepções do termo, aplicáveis a
todos os tipos de animais, dos silvestres aos cativos, passando pelos de companhia
e experimentação. Sua importância pode ser observada pela preocupação de vários
organismos internacionais, como a Food and Agriculture Organization (FAO) e World
Organization for Animal Health (OIE), em definir e incorporar o termo às suas agendas de
prioridades. Em países mais avançados neste entendimento, como os europeus, o conceito
assume conotação, sobretudo, de “bem público”, com intervenções públicas normativas e
concessão de benefícios sob forma de subsídios, como o contido na PAC (Política Agrícola
Comunitária da União Europeia).
Para se entender melhor o conceito, três aspectos básicos devem ser considerados:
1) O bem-estar é uma característica do animal e não algo que pode ser fornecido
pelo homem;
2) O bem-estar é um conceito momentâneo, não estático, e pode variar em uma
escala compreendida entre “muito ruim” a “muito bom”;
3) O bem-estar pode ser medido cientificamente.
Hughes (1976), em uma das primeiras tentativas de definir cientificamente o termo bem-
estar, refere-se a um “estado” onde o animal está em harmonia com a natureza ou com o seu
ambiente. Posteriormente, Duncan e Dawkins (1983), na tentativa de ampliar a descrição
e facilitar sua aplicação, referem-se ao bem-estar animal como a presença de completa
210 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Atualmente, três são os principais motivos que impulsionam a adoção de práticas que
elevem o bem-estar animal nos sistemas de produção: (1) questões éticas, morais e
religiosas, ligadas ao respeito aos animais; (2) questões técnico-comerciais, ligadas ao
efeito potencial sobre a produção e qualidade dos alimentos, e; (3) questões comerciais,
principalmente imposição de barreiras não-tarifárias por mercados específicos. Todos têm
relevância e não devem ser considerados contraditórios.
Broom (1991) sintetiza que bem-estar animal é o estado do animal frente às suas tentativas
de se adaptar às variáveis do ambiente em que se encontra. Em se tratando de animais
de produção, como bovinos, suínos, aves e peixes, pode-se dizer que as maiores e mais
importantes influências vêm dos sistemas de produção. Assim, as tentativas dos animais
de se adaptarem ao ambiente (não somente físico, como estrutural, microclimático e
social), também são capazes de desencadear modificações fisiológicas, neuro-hormonais,
imunitárias e comportamentais, que, somadas, culminam em maior ou menor adaptação
dos animais ao meio circunstante, com prejuízo ao seu bem-estar (Figura 1).
Capítulo 15
Bem-estar animal e ambiência na ILPF 211
Assim, quando um animal é exposto ao calor ou frio excessivo, uma das primeiras reações
é a ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, que envolve mudanças em todo o
sistema endócrino, atuando também na regulação do metabolismo. Desse modo, quando
a temperatura ambiente se encontra acima da temperatura crítica superior (estresse por
calor, Figura 5. A’ – D’), os animais entram em estado de hipertermia. Neste ponto, iniciam
as trocas térmicas com o ambiente (resfriamento), por meio de processos sensíveis de
arrefecimento (condução, convecção e radiação), que correspondem a 75 % das perdas
de calor (termólise). É comum observar, neste caso, alteração do comportamento e busca
por áreas sombreadas (Figura 6). Além disso, os animais aumentam o consumo de água e
diminuem o consumo de alimentos, na tentativa de diminuição da carga calórica corporal
e dissipação do calor excedente (Navarini et al., 2009; Schütz et al., 2010; Karvatte Junior
et al., 2016; Lopes et al., 2016).
214 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Cabe ressaltar que, embora algumas raças mais adaptadas apresentem alta capacidade de
manter a homeotermia, os principais mecanismos de perda de calor (condução, convecção
e radiação) dependem da diferença de temperatura entre o animal e o ambiente (Figura
4). Assim, quanto maior for este gradiente, mais rápido será o fluxo de calor. Por outro
lado, quando a temperatura ambiente atinge temperaturas superiores à do animal, os
processos de perda calórica restringem-se às perdas evaporativas, de menor eficiência.
Figura 7. Influência do componente arbóreo na transferência de radiação solar. Comparação da superfície sem
árvores (menor rugosidade) e com árvores (maior rugosidade), em termos de: (A) e (B) recepção e reflexão de
radiação direta de ondas curtas (S); (C) e (D) fluxos de ventos; (E) e (F) emissão de radiação direta de onda longa
(OL). Em função da altura e do arranjo do componente arbóreo, o fator de visão do céu (FVC) obtida de um ponto
médio entre duas árvores será sempre menor do que em superfície sem árvores
Fonte: Adaptado de Porfírio-da-Silva et al. (2004).
Existem poucas informações sobre a quantidade ideal de área de sombra para bovinos
nos trópicos. Os valores indicados na literatura variam de 1,8 m² até 10,0 m² por animal.
Entretanto, assumindo-se que um bovino deitado ocupa aproximadamente 1,8 m2,
valores próximos a 1,8 m2 seriam inadequados para ambientes tropicais porque os
animais ficariam muito próximos uns dos outros. Por outro lado, valores de 5,6 m2 e 9,6
m2 por animal garantiriam espaço entorno dos animais de, respectivamente, 0,5 e 1m2,
evitando agrupamento excessivo e garantindo boa circulação de ar entre os mesmos
(Alves, Nicodemo & Porfírio-da-Silva, 2015). Schültz et al. (2010), estudando a influência
do tamanho da sombra sobre o comportamento e fisiologia de vacas leiteiras a pasto,
observaram que com acesso a 9,6 m² de sombra por animal, as vacas gastaram 50 %
do tempo exercendo suas atividades diárias neste local e apresentaram 70 % menos
interações agressivas em comparação com aquelas que tiveram acesso a 2,4 m² de sombra
por animal (24% do tempo).
estar e conforto térmico dos mesmos (Zhang et al., 2015; Karvatte Junior et al., 2016). De
fato, esta fração da radiação, denominada de radiação fotossinteticamente ativa (RFA),
corresponde ao fluxo de fótons na faixa de 400 a 700 nm do espectro solar, e é a principal
responsável pelo balanço da umidade relativa e temperatura do ar (Promis et al., 2009;
Wall et al., 2010; Zhang et al., 2015).
Considerações finais
A inserção de árvores em sistemas pecuários melhora as condições microclimáticas e
ambientais (proteção contra altas temperaturas, geadas, ventos frios, granizo, tempestades.
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 16
Princípios da pecuária leiteira em
sistemas de ILPF
Roberta Aparecida Carnevalli
Admar Junior Coleti
Hélio Tonini
Aline Barros da Silva
Carolina Della Giustina
Jorge Lulu
226 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Dentre as várias opções disponíveis adaptadas à região, deve-se dar preferência àquelas
com domínio tecnológico, como por exemplo: conhecimento sobre tecnologia da semente;
métodos de produção de mudas; indicativos do melhor espaçamento de plantio, fertilização
e periodicidade de aplicação de desramas, desbastes e corte final. A disponibilidade de
sementes melhoradas ou clones de alta produtividade deve ser verificada.
Optar por árvores de rápido crescimento também implica em obter os benefícios de sua
presença no sistema em um menor período. As árvores de rápido crescimento aumentam
a expectativa de sucesso econômico da ILPF, pois respondem melhor às expectativas de
retorno econômico e diminuem o risco de perdas de árvores por danos causados pelos
animais. Quanto mais alta for a taxa de crescimento, mais cedo os animais podem ser
introduzidos no sistema.
Além do adequado arranjo espacial das árvores na área, as espécies agrícolas e forrageiras
escolhidas devem ser bem adaptadas ao ecossistema da região onde será implantado
o sistema. Também devem ser bem-sucedidas quando inseridas em conjunto com o
componente arbóreo, apresentando boa adaptação aos níveis de luz encontrados abaixo
do extrato arbóreo, como também ao solo (pH, fertilidade, textura, drenagem) e ao
manejo (Viana et al., 2010).
brizantha cv. BRS Piatã), na região de Sinop/MT, em um sistema de ILPF, as plantas a pleno
sol (ILP) produziram 74,5 e 130% a mais que as plantas sombreadas (ILPF), respectivamente,
para o espaçamento entrelinhas de 0,45 e 0,90 m da cultura do milho e renques espaçados
de 14 m. Os resultados corroboram com aqueles obtidos por Macedo et al. (2006), que
trabalharam na região de Paracatu/MG, com o consórcio de milho com clones de eucalipto
de 2 anos de idade, em dois locais de avaliação dentro do entre renque (1,8 e 2,7 m; e 4,5
e 5,4 m) e verificaram diminuição da produtividade de grãos dos consórcios de milho com
eucalipto nos dois locais de avaliação, quando comparados com o monocultivo de milho.
Figura 3. Cultivo de milho consorciado com braquiária entre renques de eucalipto no Brasil Central.
A silagem, quando utilizada dentro das técnicas e padrões recomendados e pelo fato
de conservar os princípios nutritivos do material ensilado, garante o fornecimento aos
animais de alimento de boa qualidade durante todo o período crítico de estiagem.
Em consequência, os custos de produção são minimizados e se mantêm os índices
produtivos e reprodutivos, principalmente na exploração de bovinos leiteiros (Dias et al.,
2001). Apesar de o milho ter sido sempre a forrageira de maior utilização no processo
de ensilagem. Entretanto, o sorgo tem se mostrado como boa opção em substituição ao
milho, especialmente, em regiões com irregularidade hídrica. Nestas regiões, o sorgo tem
sido mais explorado, devido à maior resistência a veranicos, maior produção por área e
menor exigência quanto à fertilidade do solo, em relação ao milho.
O milho e o sorgo são culturas mais adaptadas ao processo de ensilagem, por sua facilidade
de cultivo, altos rendimentos e, especialmente, pela qualidade da silagem produzida sem
o uso de aditivos ou pré murchamento (Demarchi et al., 1995).
Vacas cruzadas com zebuínos são mais tolerantes as variações climáticas (Azevedo et al.,
2005). O problema principal das raças leiteiras de origem europeia está na adaptação
ao clima tropical, decorrente da alta capacidade produtiva, proporcionando alterações
fisiológicas e comportamentais, provocados pelo estresse pelo calor (Silva et al., 2002).
A maior adaptação dos zebuínos às condições de temperatura elevada está na sua
capacidade de dissipação de calor por meio da sudorese de forma mais efetiva, pois
possuem maior número de glândulas sudoríparas ou maior volume de secreção, pêlos
mais curtos e maior superfície em relação à massa corporal, apresentando assim, um
mecanismo termo regulatório mais eficiente que os taurinos (Pereira et al., 2008).
Por outro lado, os animais conseguem identificar locais sombreados que oferecem uma
maior proteção contra a radiação solar, a fim de amenizarem o estresse calórico ao qual se
encontram (Schutz et al., 2009).
Figura 4. Precipitação (mm/dia) e Temperaturas máxima, média e mínima (ºC) de Sinop/MT no período de 2013
a 2018.
Fonte: Agritempo (2018).
234 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 6. Novilhas leiteiras em ócio e pastejo em sistemas pastoril sem árvores no Brasil Central.
Capítulo 16
Princípios da pecuária leiteira em sistemas de ILPF 235
Considerações Finais
O caminho para a sustentabilidade de produção em pequenas propriedades, como é o caso
usual da pecuária leiteira, é a diversificação. Entretanto, é necessário que a diversificação
não traga a perda de foco da atividade fim da propriedade e traga benefícios ao sistema
como um todo. No caso da pecuária leiteira, a associação com árvores (frutíferas ou
madeireiras); agricultura (para produção de grãos e silagem) para uso na propriedade ou
236 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
comercialização, com utilização dos resíduos, são exemplos de como as atividades podem
ser aditivas.
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Capítulo 17
Produção de ovinos de corte em sistemas
integrados
José Alexandre Agiova da Costa Paulo Roberto de Lima Meirelles
Cristiano Magalhães Pariz Gelson Luis Dias Feijó
Marcílio Nílton Lopes da Frota André Michel de Castilhos
Fernando Alvarenga Reis João Batista Catto
Ciniro Costa Carlos Alexandre Costa Crusciol
Raimundo Bezerra de Araújo Neto Geraldo Magela Cortes Carvalho
Marcos Lopes Teixeira Neto
242 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Uma alternativa estudada, que serve como comparação de desempenho entre os sistemas é
o semi-confinamento em pastos de braquiária formados convencionalmente, para a engorda
durante a estação seca. Os pastos são previamente vedados ao pastejo ovino de forma que
diminua a sobrevivência das larvas infestantes de vermes, principalmente de Haemoncus
contortus. Este sistema é de fácil uso na propriedade rural, pois não implica uso de sistemas
integrados e também não limitando o uso para outros fins, desde que no período de
terminação haja oferta suficiente de forragem, com grande disponibilidade de folhas.
A terminação em confinamento, que exige uma estrutura mais complexa e onerosa, deve ser
reservada aos animais de maior potencial de ganho de peso, pois a alternativa tem maior custo
de produção quando comparada à produção a pasto (SILVA, 2015). Esse último sistema pode
utilizar como volumoso silagens produzidas com as lavouras de sorgo ou milho consorciadas
com guandu (Cajanus cajan) (Quintino et al., 2013), como se vê na Figura 1.
Fotos: Sergio G. E.Villafuerte, Andrei P. Neves e José Alexandre A. Costa.
A B
C
Figura 1. Produção de silagem destinada à terminação de cordeiros. (A) Semeadura de lavoura de milho
consorciada com guandu e capim-piatã em segunda safra (março). (B e C) Lavoura em desenvolvimento.
Capítulo 17
Produção de ovinos de corte em sistemas integrados 245
Os cordeiros utilizados nos estudos são do grupo genético pantaneiro descritos por Vargas
Junior et al. (2011) e Costa et al. (2013), filhos de ovelhas de cria mantidas em braquiária
(capim-marandu) o ano todo, suplementadas durante o periparto (terço final da gestação
à desmama). As ovelhas entram em estação de monta nas águas (meados de outubro a
dezembro) por 45 dias, a estação de parição ocorre entre meados de março e abril e a
desmama aos 70-80 dias entre maio e junho, quando os cordeiros desmamados entram
nos sistemas de terminação, o que coincide no Brasil Central com o período seco. O pasto
é formado em ILP (em safrinha pós-soja ou em consorcio com lavoura de milho ou sorgo).
A terminação dura de 60 a 70 dias, com os animais alcançando peso final em torno de 30-
32 kg. Neste sistema não ocorre recria, somente as borregas selecionadas para compor o
plantel são recriadas, entrando em estação de monta no outono do ano seguinte ao do
nascimento, acima dos 12 meses seguindo uma estação reprodutiva convencional.
A intensificação na produção é possível utilizando-se três partos em dois anos, sendo que
a ovelha pantaneira, sem estacionalidade produtiva, que falha em uma estação de monta
passa à estação subsequente, com descarte daquelas que não emprenham na segunda
exposição. As borregas são recriadas em pastos formados em ILP e são desafiadas aos 8
meses, passando a integrar o sistema intensificado (mais detalhes estão em Reis et al.,
2015). Os cordeiros são terminados precocemente para a venda.
Médias seguidas de letras distintas na linha são diferentes pelo teste Tukey-Kramer (P<0,05).
Os machos obtiveram ganho médio diário 22 g superior às fêmeas e o peso final foi superior
em 1,6 kg. Entre os sistemas em confinamento, os cordeiros sob dieta ad libitum tiveram o
ganho médio diário superior em 39 g e o peso final superior em 3 kg.
Nos sistemas de terminação a pasto foram utilizados os capins piatã e paiaguás, a quantidade
média de lâminas foliares disponíveis aos cordeiros durante o período de pastejo foi superior
para ILP em relação ao Pasto Vedado, sendo de 1,0 t MS.ha-1 e 1,8 t MS.ha-1 e de 0,9 t MS.ha-1 e
1,1 t MS.ha-1, respectivamente em 2013 e 2014. A produtividade maior em folhas no sistema
de ILP foi consequência da maior disponibilização de nutrientes ao pasto pela implantação
da lavoura, mas também porque o capim-paiguás produz mais folhas no período seco
(EMBRAPA, 2013).
C D
Figura 2. Sistemas integrados de produção de ovinos. (A) Suplementação com silagem a pasto; (B) Capim-
paiaguás de safrinha pós-soja; (C) Cordeiros em semi-confinamento em capim-piatã vedado; (D) Confinamento
com volumoso de silagem de sorgo e capim-piatã.
Médias com letras diferentes na coluna diferem pelo teste de Tukey-Kramer (P<0,05).
Fonte: Neves et al. (2015 b).
A B
C D
Tabela 3. Número de ovos por grama de fezes (OPG) de cordeiros durante o período de
terminação. Núcleo Centro-Oeste, Terenos/MS, 2014.
OPG médio
Tratamentos
Desmame Terminação
ILP 3,15 ± 0,15 0,35 ± 0,19
Pasto Vedado 3,40 ± 0,14 0,66 ± 0,18
Confinamento 2,89 ± 0,17 0,31 ± 0,19
Confinamento ad libitum 3,04 ± 0,14 0,61 ± 0,18
O sistema ILP fica 8 meses sem pastejo e o sistema Pasto Vedado em torno de 5 meses,
tempo que se mostra satisfatório para diminuir as infestações durante a terminação no
período seco.
As avaliações das carcaças dos cordeiros em 2013 (Batista et al., 2015) mostram resultados
satisfatórios para os cordeiros terminados. Os resultados estão na Tabela 4.
O desenvolvimento muscular comparado pela área de olho de lombo não diferiu entre os
sistemas sendo o valor médio 10,09 cm2. A espessura de gordura subcutânea, importante
variável na conservação frigorífica da carne, foi inferior no Pasto Vedado (P<0,05) 1,25 mm
em relação aos demais, com valor médio de 1,73 mm.
250 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Médias seguidas de letras distintas na linha apresentam diferença estatística pelo teste t (P<0,05).
Fonte: Adaptado de Batista et al. (2015).
*CONF= Confinamento
Capítulo 17
Produção de ovinos de corte em sistemas integrados 251
Por outro lado, em que pese o menor desempenho dos cordeiros no sistema Pasto
Vedado, o menor investimento e os menores custos de produção para a terminação neste
sistema, manutenção e depreciação das pastagens (cercas, água e pasto), tornam-no
uma alternativa de uso nas propriedades rurais em que não se faz integração lavoura-
pecuária. Neste sistema a área necessária para a terminação dos cordeiros é pequena,
permanece vedada ao pastejo ovino por quarto ou cinco meses, sendo utilizada com
outras espécies de animais domésticos (bovinos, equinos, muares) até três a dois meses
antes da terminação de cordeiros, com o intuito de acumular forragem.
A B
C
Figura 4. Sistemas de terminação de cordeiros. (A) Cordeiros em pastagem de capim-marandu durante o dia;
(B) Cordeiros suplementados com silagem de milho+concentrado durante a noite; (C) Carcaças produzidas no
inverno/primavera. Botucatu, São Paulo.
Tal sistema tem possibilitado a recuperação de áreas degradadas, a redução dos custos
de produção e o uso intensivo da área durante todo o ano (PARIZ et al., 2017a). Como
inovação, também se tem utilizado o consórcio tríplice entre milho + capim-marandu
(Urochloa brizantha cv. Marandu) + guandu, visando a produção de silagem e melhoria
nas características físicas e químicas do solo (Figura 5).
Fotos: Cristiano Magalhães Pariz
A B C
Figura 5. Consórcio tríplice de milho. (A) Milho+capim-marandu na linha e guandu na entrelinha em
espaçamento de 0,45 m para ensilagem. (B) Raízes profundas do guandu contribuindo na descompactação do
solo. (C) Cordeiros em pastejo durante o inverno/primavera. Botucatu, São Paulo.
Capítulo 17
Produção de ovinos de corte em sistemas integrados 253
* M, CM, CP e CB: milho para ensilagem colhido na altura de 0,45 m, capim-marandu, capim-piatã e capim-
braquiarinha, respectivamente.
**Médias seguidas de letras distintas, diferem entre si pelo teste LSD ao nível de 5% de significância.
Fonte: Pariz et al. (2016; 2017b).
(Tabela 7). Além disso, em condições de pluviosidade nula na transição do inverno para
a primavera, verificou-se incidência de fotossensibilização hepatógena nos cordeiros
alocados nas pastagens dependentes apenas da rebrotação do capim-braquiarinha,
principalmente na presença de forragem senescente em decomposição.
* M, CM, CP, CB, AA e PV: milho para ensilagem colhido na altura de 0,45 m, capim-marandu (consórcio),
capim-piatã (consórcio), capim-braquiarinha (rebrotação), sobressemeadura de aveia-amarela e peso vivo,
respectivamente.
** Médias seguidas de letras distintas, diferem entre si pelo teste LSD ao nível de 5% de significância.
Fonte: Pariz et al. (2017a).
As maiores taxas de lotação foram obtidas em anos agrícolas com melhores condições
climáticas no inverno/primavera (temperaturas mais elevadas, ausência de geadas e maior
precipitação pluvial), o que aumentou a disponibilidade de forragem. Porém, mesmo em
anos agrícolas sob condições climáticas menos favoráveis no inverno/primavera, as taxas
de lotação ficaram bem acima das que se verificam em sistemas exclusivos de pastagens
com ovinos na região Sudeste do Brasil (abaixo de 5 cabeças/ha), em função da escassez
de forragem. Vale ressaltar que utilizando cordeiros de raças mais especializadas para a
produção de carne, com maior potencial genético, como por exemplo Texel e Dorper,
é possível se obter ganho de peso diário na faixa de 230-250 gramas por dia em semi-
confinamento nessa modalidade de sistema integrado de produção agropecuária,
com peso vivo de abate e rendimento de carcaça em torno de 40-42 kg e 48-49%,
respectivamente, proporcionando melhor qualidade de carcaça (LONGHINI, 2016), sendo
esses resultados mais expressivos que os relatados na Tabela 7 obtidos com cordeiros da
raça Santa Inês. Isso é importante, pois atualmente, os Frigoríficos Comerciais localizados
na região Sudeste, têm dado preferência para carcaças mais pesadas de cordeiros (acima
de 18 kg) e com melhor acabamento de gordura subcutânea, em função da realização de
cortes especiais nas carcaças (pernil, paleta, costela, carré francês, carré curto, picanha,
lombo, filé-mignon e pescoço) (Figura 8).
256 Fotos: Cristiano Magalhães Pariz
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A B C
Figura 8. Carcaça de cordeiro produzida em sistemas integrados de produção agropecuária (A) em
semiconfinamento. (B) Cortes especiais da carcaça de cordeiro realizados em frigorífico comercial. (C) Picanha
de cordeiro com excelente acabamento de gordura subcutânea. Botucatu, São Paulo.
Destaca-se também, que mesmo em um solo com 60% de argila, a resistência mecânica à
penetração de raízes nas profundidades de 0,00-0,40 m foi maior após a colheita do milho
para ensilagem em relação ao pós-pastejo pelos cordeiros. Isso demonstra que, as raízes
do capim-marandu ou capim-piatã pastejados por cordeiros no inverno/primavera são
capazes de reduzir a compactação do solo exercida pelo intenso tráfego de maquinários
na área devido ao processo de ensilagem da cultura do milho (Figura 9). Tal resultado
valida uma alternativa de utilização da área para produtores de silagem de milho, os quais
geralmente mantêm o solo em pousio na entressafra, por relevante possibilidade de
insucesso de culturas graníferas nessa época do ano (safrinha), em função de condições
climáticas adversas (baixas temperaturas e ausência de chuvas). Além disso, esses
produtores realizam constantes arações e gradagens após a colheita para ensilagem,
em função da compactação exercida por esse processo de colheita, o que atualmente é
considerado uma prática que não atende aos preceitos conservacionistas do solo.
Na região sudoeste do Estado de São Paulo, dois modelos de sistema silvipastoril composto
por clones de eucalipto (Eucalyptus grandis × E. urophylla) em espaçamento de 12 m × 1
m (SSP I – linha simples) ou 12 m × 2 m × 2 m (SSP II – linha dupla), pastagem de capim-
braquiarinha e ovinos foram avaliados (GONZÁLEZ, 2014). Os resultados indicaram que
ambos os modelos são economicamente viáveis, apresentando valor presente líquido
(VPL) de R$ 85.032,45 (R$ 2.834,42/ha) e R$ 69.521,20 (R$ 2.317,37/ha) e taxa interna de
retorno (TIR) de 21,00 e 19,18%, para os modelos SSP I e SSP II, respectivamente, em um
módulo de 30 hectares. Considerando o VPL, o SSP I é mais rentável que a monocultura
do eucalipto (produção manual ou mecanizada), seguido do SSP II e da ovinocultura
exclusiva, no qual o VPL foi de apenas R$ 2.618,25 (R$ 87,28/ha), caracterizando-se uma
atividade pouco rentável. Além disso, a ovinocultura exclusiva apresenta até 45% de
probabilidade de obter VPL negativo.
Capítulo 17
Produção de ovinos de corte em sistemas integrados 257
A análise de sensibilidade, variando-se o custo da terra, indicou que para ambos os modelos
de sistema silvipastoril, a atividade seria inviável para valores de aproximadamente R$
1.000,00/ha/ano (GONZÁLEZ, 2014). Na região desse estudo (sudoeste do Estado de São
Paulo), em áreas com algum grau de degradação, principalmente pastagens degradadas
e relevo acidentado, é possível encontrar terras com valores de aproximadamente R$
450,00/ha/ano. Porém, tais áreas são passíveis de recuperação utilizando-se os sistemas
integrados de produção agropecuária aliado à ovinocultura de corte, tornando-se
uma opção interessante, principalmente em pequenas propriedades rurais. Destaca-se
também que a disposição do eucalipto (12 m × 1 m ou 12 m × 2 m × 2 m) e o manejo da
desrama (com e sem) não influenciaram o comportamento ingestivo de ovelhas nesse
sistema silvipastoril (BRITO et al., 2012).
A B
Figura 10. Manejo em pastejo alternado em capim-massai implantado em consórcio com milho. (A) Cordeiros
Santa Inês em pré-pastejo; (B) em pastejo. Município de Uruçui-PI.
Considerações finais
A ovinocultura de corte encontra-se em expansão no território nacional e o
desenvolvimento de sistemas integrados de produção agropecuária específicos para
ovinos permite ver com clareza o potencial da atividade no Brasil.
Referências
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Capítulo 17
Produção de ovinos de corte em sistemas integrados 261
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 18
Geotecnologias aplicadas em sistemas de
produção integrada e apoio a políticas
públicas
Ricardo Guimarães Andrade Daniel de Castro Victoria
Édson Luis Bolfe Sandra Furlan Nogueira
Luiz Eduardo Vicente
Mateus Batistella
Célia Regina Grego
264 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Os sistemas ILPF, em suas diferentes modalidades, já são uma realidade em 11,5 milhões
de hectares no Brasil . Destaque para Mato Grosso do Sul (2 milhões), Mato Grosso
(1,5 milhão) e Rio Grande do Sul (1,4 milhão). Esses sistemas de uso da terra auxiliam a
recuperação de áreas degradadas, geram serviços ecossistêmicos e garantem maior
renda ao produtor.
Sensoriamento remoto
O sensoriamento remoto é definido como a ciência de obter informações sobre um objeto,
área ou fenômeno por meio da análise de dados obtidos por um aparelho que não esteja
em contato com o objeto, área ou fenômeno sob investigação (Lillesand et al., 2004). Os
objetos de interesse na superfície são: vegetação natural, culturas agrícolas, pastagens,
florestas plantadas, solos, formações rochosas, corpos d’água, entre outros, tecnicamente
denominados de alvos (Figura 1). Portanto, a utilização de sensores remotos com diversas
resoluções espectrais, temporais e espaciais, permite caracterizar diferentes alvos em
sistemas de ILPF.
Figura 1. Esquema ilustrativo de registro, processamento e classificação básica de uso e cobertura da terra
a partir de imagens ópticas (imagens fusionadas para alta resolução espacial CBERS 2B/Landsat 5 TM na
composição colorida 543). No destaque, são apresentados os alvos: 1 - lavoura, 2 - pecuária, 3 - floresta, 4 - solo
exposto e 5 - corpo d’água.
266 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Perspectivas futuras
A detecção qualitativa (identificação do alvo) é estudada desde a década de 1960 pelo
sensoriamento remoto. Entretanto, apenas recentemente a estimativa quantitativa
(determinação da abundância e presença relativa) de alvos da superfície terrestre tem sido
uma das principais aplicações na tomada de decisões econômicas e de gerenciamento
ambiental. Para isso, são desenvolvidas relações funcionais entre as características
biofísicas dos alvos e os dados coletados remotamente.
A B
Figura 3. Uso de series temporais de imagens Spot-Vegetation na identificação e classificação de uso e cobertura
das terras no Estado de São Paulo. (A) Visualização da classificação efetuada; (B) Comportamento espectro-
-temporal observado para cada “Endmember”.
Fonte: Adaptado de Vicente et al. (2012).
No que tange às imagens de alta resolução espacial, estas têm se mostrado de grande
aplicação quando há interesse na obtenção de informações que são imperceptíveis ou
não identificadas por meio das imagens de média resolução espacial. Assim, imagens de
alta resolução espacial possibilitam identificar e monitorar pequenos objetos ou alvos
de superfície, por exemplo, monitorar o desenvolvimento das árvores em sistemas de
integração Pecuária-Floresta (Figura 4).
268 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
B
Figura 4. Imagens GeoEye-1 de 9 de outubro de 2010 de áreas de implantação de sistemas integrados da
Fazenda Experimental da Embrapa Gado de Corte, Campo Grande, MS.
Capítulo 18
Geotecnologias aplicadas em sistemas de produção integrada e apoio a políticas públicas 269
Por ter custo mais baixo que o monitoramento local, o sensoriamento remoto é uma
excelente ferramenta para auxiliar na tomada de decisão visando a melhoria dos sistemas
produtivos locais. A Embrapa vem desempenhando importante papel na pesquisa e
no desenvolvimento de projetos relacionados à aplicação de geotecnologias visando a
sustentabilidade da pecuária brasileira.
Diversas aplicações de SIGs na agricultura são encontradas, seja em escala global, nacional,
regional ou local, principalmente quando aliadas ao uso de dados de sensoriamento
remoto. Os SIGs são imprescindíveis para a realização de avaliações de cobertura vegetal
e de uso das terras, bem como sobre a alteração dessa cobertura ao longo do tempo, que
resulta em estudos de monitoramento da cobertura vegetal.
A geoestatística parte da hipótese de que amostras mais próximas, dentro de uma mesma
mancha, são mais parecidas que as mais distantes. Essa pressuposição não é assumida
pela estatística clássica, que pressupõe independência, o que, na maioria dos casos, não
ocorre nos estudos envolvendo as ciências da natureza. A geoestatística é, portanto, uma
ferramenta de grande contribuição para a geotecnologia e, em sistemas de ILPF, permite
a interpretação da distribuição espacial dos dados com forte impacto sobre os resultados
e a tomada de decisão.
da demanda de água, energia e biomassa, bem como associar essas informações com
análises de fertilidade do solo, compactação, clima, relevo, entre outros, visando melhor
compreensão dos processos biofísicos envolvidos no sistema de ILP.
A B
Figura 6. (A) NDVI (Normalized Difference Vegetation Index: Índice de Vegetação por Diferença Normalizada);
(B) índice de área foliar (IAF, em m2 m-2) para área de implantação de um sistema de integração lavoura-pecuária
localizado na Fazenda Experimental da Embrapa Gado de Corte, Campo Grande, MS.
272 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 7. (A) Temperatura da superfície (K); (B) evapotranspiração real diária (ET, em mm dia-1) para área de
implantação de um sistema de integração lavoura-pecuária localizado na Fazenda Experimental da Embrapa
Gado de Corte, Campo Grande, MS.
O Programa Agricultura de Baixo Carbono (ABC) tem por meta induzir a recuperação de
15 milhões de hectares de pastagens degradadas em todo o País. Para tanto, a adoção
de sistema de integração lavoura-pecuária (ILP) e lavoura-pecuária-floresta (ILPF) são
alternativas promissoras que visam a fixação de carbono no solo pelo grande aporte de
resíduos vegetais que produz. A implementação, por exemplo, de sistema ILP em pelo
menos 4 milhões de hectares, possibilitará reduzir as emissões de 18 a 28 milhões de t CO2
eq. ou mais apenas nesse caso específico.
Andrade et al. (2016) analisou três cenários condicionais para estipular o valor de Slope
que determina a existência de indicativos de degradação das pastagens: (i) na primeira
condição foi considerado que quando Slope era menor que -0,001 havia algum indicativo
de degradação (A: Cenário muito otimista). Já na segunda condição (B: Cenário otimista)
considerou-se que as pastagens apresentavam algum indicativo de degradação quando
o coeficiente de inclinação (Slope) era menor que 0,001, ou seja, nesse valor está incluído
o intervalo de Slope que corresponde a condição de estabilidade da vegetação que varia
no intervalo de -0,001 a 0,001 (Liu et al., 2010). Pois, supõe-se que parte das pastagens
no bioma Cerrado pode estar em condições estabilizadas dentro de alguma condição
de degradação. E, para a terceira condição (C: Cenário realista) considerou-se como
degradado quando Slope era menor que +0,005. Nesse cenário, adicionou-se o intervalo
de estabilidade da vegetação por supor que a maior parte das pastagens pode estar em
condições estabilizadas dentro de alguma condição de degradação.
No cenário mais otimista (Figura 8), as pastagens consideradas com algum grau de
degradação correspondem a cerca de 12,5 milhões de hectares, ou 24% do total das
pastagens cultivadas no Cerrado.
274 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 8. Pastagens plantadas com e sem indicativos de processos degradação no bioma Cerrado. (A) Condição
1: Slope < -0,001. Dados disponibilizados no Sistema de Observação e Monitoramento da Agricultura no Brasil
(SOMABRASIL): http://mapas.cnpm.embrapa.br/somabrasil/webgis.html
Fonte: Adaptado de Andrade et al. (2016).
No segundo cenário condicional (Figura 9), classificado de otimista, essa área sobe para
cerca de 18,4 milhões de hectares – 35%, um valor ainda menor do que aqueles estimados
até então por estudos sobre o tema. Estima-se que se forem recuperadas de 12,5 a 18,4
milhões de hectares de pastagens é possível um acréscimo potencial na produção de
carne bovina de 2,4 a 3,6 milhões de toneladas por ano.
Capítulo 18
Geotecnologias aplicadas em sistemas de produção integrada e apoio a políticas públicas 275
Figura 9. Pastagens plantadas com e sem indicativos de processos degradação no bioma Cerrado. (B) Condição 2: Slope <
+0,001. Nesse cenário, adicionou-se o intervalo de estabilidade da vegetação por supor que a maior parte das pastagens
pode estar estável dentro de alguma condição de degradação. Dados disponibilizados no Sistema de Observação e
Monitoramento da Agricultura no Brasil (SOMABRASIL): http://mapas.cnpm.embrapa.br/somabrasil/webgis.html.
Fonte: Adaptado de Andrade et al. (2016).
No que diz respeito ao cenário condicional considerado mais realista (Figura 10), foram
identificados em torno de 32 milhões de hectares de pastagens degradadas, ou 60% das
pastagens plantadas no Cerrado. Vale ressaltar que o bioma Cerrado abrange praticamente
todo o Estado de Goiás e que há presença significativa de outros biomas nos Estados de Mato
Grosso, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais e a área de pastagem plantada degradada pode ser
ainda bem maior. Porém, cerca de 80% da área de pastagens degradadas no bioma Cerrado
estão concentradas no território desses quatro Estados. Tal mapeamento pode auxiliar, por
exemplo, no direcionamento de recursos e na orientação de iniciativas de recuperação em
regiões prioritárias envolvendo, por exemplo os sistemas ILPF dentro do Programa ABC.
276 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
No entanto, vale destacar que o processo de degradação das pastagens pode apresentar
características diferentes em cada bioma. No Cerrado é caracterizada, por exemplo, pela perda
de produtividade em função da pouca oferta de água e de nutrientes. No bioma Amazônia,
as razões têm maior relação com outros fatores, como a competição da forrageira com as
plantas invasoras. Neste caso, é necessário desenvolver e aplicar técnicas diferenciadas
de mapeamento. Assim, conclui-se que, diante das dimensões do território brasileiro e das
diferenças regionais, o desafio é chegar a números mais precisos e dizer onde estão essas
pastagens que se encontram comprometidas e subutilizadas. O uso de geotecnologias, como
o sensoriamento remoto aplicado em diferentes escalas, é a estratégia adequada para traçar
um mapa das condições das pastagens para um país do tamanho do Brasil.
Figura 10. Pastagens plantadas com e sem indicativos de processos degradação no bioma Cerrado. (C) Condição
3: Slope < +0,005. Nesse cenário, supõe-se que uma ligeira melhora no vigor não seria o suficiente para sustentar a
tendência de melhoria da cobertura vegetal. Dados disponibilizados no Sistema de Observação e Monitoramento da
Agricultura no Brasil (SOMABRASIL): http://mapas.cnpm.embrapa.br/somabrasil/webgis.html.
Fonte: Adaptado de Andrade et al. (2016).
Capítulo 18
Geotecnologias aplicadas em sistemas de produção integrada e apoio a políticas públicas 277
Considerações finais
As geotecnologias são, basicamente, um produto da união entre sensoriamento remoto,
sistemas de informações geográficas, sistemas de posicionamento global por satélites,
programação computacional e geoestatística. As imagens orbitais provenientes dos
mais diversos sensores remotos, por meio das diversas resoluções espectrais, temporais
e espaciais, têm-se apresentado como relevantes fontes de informações. Essas imagens
garantem possibilidades de aplicação na caracterização das áreas de sistemas integrados,
no monitoramento, no espaço e no tempo, das alterações no uso e na cobertura das terras
e, especialmente, na correlação de parâmetros biofísicos, como índices de área foliar,
biomassa e carbono.
Por outro lado, apesar das inúmeras iniciativas no Brasil e da vasta aplicabilidade das
geotecnologias, a informação geoespacial ainda é subutilizada no setor agropecuário.
Este capítulo buscou ressaltar o potencial de aplicação das geotecnologias em sistemas
ILPF, assim como no apoio a políticas públicas.
278 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
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Capítulo 18
Geotecnologias aplicadas em sistemas de produção integrada e apoio a políticas públicas 279
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 19
Planejamento de sistemas de Integração
Lavoura-Pecuária-Floresta
Paulo Henrique Nogueira Biscola
Camilo Carromeu
Ademar Pereira Serra
Ronney Robson Mamede
Davi José Bungenstab
282 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
É importante ter-se em mente que da mesma forma que para se construir uma casa,
pilotar um avião, realizar uma longa viagem, transplantar um órgão do corpo humano,
para se implementar um novo sistema de produção agropecuário, é necessário um
plano bem definido, na forma de um projeto, com um planejamento detalhado de todas
as etapas do processo.
Ferramentas de planejamento
O primeiro passo no processo de implementação de sistemas de integração lavoura-
pecuária-floresta (ILPF) é realizar um diagnóstico da situação atual do negócio,
considerando a região onde se encontra o estabelecimento rural e o perfil do produtor.
Capítulo 19
Planejamento de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta 283
As respostas a essas perguntas irão dar uma visão completa de como devem ser conduzidas
as ações para implantação do sistema. Esse é um método interativo e simplificado que
facilita o planejamento do que deve ser feito. As respostas a essas perguntas distribuem
as tarefas entre quem irá executá-las, registra onde serão executadas, qual o momento,
a forma correta e os materiais necessários para sua execução, bem como o custo para
realizar as ações. Além disso, por formalizar o planejamento, esse método auxilia no
acompanhamento do que cada um está fazendo e, consequentemente, permite a
avaliação dos resultados.
Para se utilizar essa ferramenta, basta montar um quadro com as sete perguntas nas
colunas e as ações a serem executadas nas linhas. Especialmente quando se utiliza uma
planilha eletrônica, esse quadro pode ser expandido gradualmente inserindo-se novas
linhas conforme ações maiores são fragmentadas em tarefas mais detalhadas.
Como exemplo prático de uso desse método, foi elaborado um modelo de planejamento
dos primeiros e mais importantes passos para implantação real de um sistema de ILPF
com eucalipto (Tabela 1). Por isso, no modelo foram colocadas apenas as colunas: “o quê?”,
“quando”, “por quê?” e “como?”. As colunas com as perguntas “quem?”, “onde?” e “quanto
custa?” foram deixadas como motivação e apoio inicial para utilização efetiva dessa
ferramenta de planejamento pelos interessados. Um arquivo do MS-Word com o quadro
aqui apresentado pode ser baixado em www.ilpf.cnpgc.embrapa.br.
É importante salientar que este modelo é um exemplo baseado em um caso real, mas
apenas com os passos principais para implantação do sistema. No momento de planejar
suas ações, recomenda-se um maior detalhamento de cada uma delas, adequando-as à
realidade de cada estabelecimento rural e recursos disponíveis no local.
Depois do planejamento detalhado, cada ação deve ser acompanhada pelo responsável
designado. Para tal, o modelo aqui disponibilizado, bem como o que será apresentado na
próxima seção, são ferramentas de apoio muito úteis na organização e visualização das
ações necessárias. Naturalmente, existem vários outros métodos, inclusive mais complexos,
para se realizar essa tarefa. O importante é que o empreendedor-agropecuarista tenha
condições de monitorar, controlar e intervir quando necessário para garantir a correta
realização das atividades e consequentemente o sucesso de seu empreendimento. Como
em qualquer outro negócio, o sucesso do sistema de ILPF dependerá em grande parte do
planejamento bem feito e do comprometimento dos interessados.
Tabela 1. Modelo de planejamento para implantação de sistema de ILPF com eucalipto.
O quê? Quando? Por que? Como?
Para evitar problemas com a implantação de Diagnóstico do estabelecimento rural inserido em seu
Verificação da aptidão da área Antes do início da implantação do
culturas anuais e destinação dos produtos do contexto regional, utilizando orientação de técnicos
para implantação do sistema sistema
sistema especializados
De um talhão homogêneo devem ser retiradas 10
subamostras de solo nas profundidades de 0 a 20 cm e de
Para monitorar a fertilidade do solo e para 20 a 40 cm, as quais devem ser homogeneizadas formando
Coleta de amostras de solo e Antes do preparo inicial do solo e
definição das recomendações de correção, uma amostra de aproximadamente 400 gramas, que deve
análise química e física depois anualmente.
adubação de manutenção e reposição ser encaminhada para um laboratório de análise de solo
e depois os resultados interpretados por engenheiro
agrônomo ou técnico agrícola
No preparo inicial do solo e depois Para correção da acidez do solo e fornecimento Corretivos de solo aplicados e incorporados de 0 a 20 cm,
Calagem e Gessagem
quando necessário de Cálcio e Magnésio para as culturas utilizando-se grade pesada ou arado
Caminhando na área à procura de formigueiros ativos, bem
Pelo menos dois meses antes do como ao seu redor no mínimo a 100 metros de bordadura.
Monitoramento e controle de Para evitar danos às culturas anuais e
plantio e depois durante todo o Quando encontrados dever ser aplicado inseticida à base
formigas cortadeiras especialmente ao eucalipto
ciclo de produção de Fipronil em pó ou iscas formicidas granuladas se a
estação do ano for propícia
A definição do cultivo anual, bem como os tratos culturais
Para proporcionar retorno econômico em curto dependerão de recomendações técnicas específicas para
Ano 0 (novembro) a Ano 1 (março).
prazo reduzindo os custos de implantação do cada região e propriedade que poderão ser feitas por
Cultivo da cultura de verão Ano 1 (novembro) a Ano 2 (março).
sistema de ILPF. técnicos especializados.
(exemplo: Soja) Ano 5 (novembro) a Ano 6 (março).
Porque a soja é uma leguminosa que favorece a Recomenda-se que os detalhes do cultivo específicos para
Ano 9 (novembro) a Ano 10 (março).
fixação de Nitrogênio atmosférico no solo. a área sejam inseridos neste quadro. Eventualmente um
quadro adicional pode ser criado para a cultura.
Entre as espécies arbóreas disponíveis para
Escolha adequada das mudas dos clones. Irrigação no dia
os sistemas de ILPF, o clone (escolhido
de plantio e periodicamente a cada 6 dias até o pegamento
pelo produtor) de eucalipto apresenta as
das mudas. Caso haja perda acima de 5% das mudas, será
vantagens de ter ciclo rápido, sua madeira
Plantio de eucalipto Ano 1 (janeiro). realizado replantio
ser adequada para (aptidão do clone), com
Recomenda-se que os detalhes do plantio específicos para
mercado assegurado na região e haver também
a área sejam inseridos neste quadro. Eventualmente um
disponibilidade de mudas em quantidade
quadro adicional pode ser criado para a cultura.
suficiente na região.
Continua...
Planejamento de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta
Capítulo 19
285
286
Tabela 1. Continuação.
O quê? Quando? Por que? Como?
Ano 1: a implantação da cultura de outono/inverno deve
O cultivo da braquiária com milho ou sorgo
ser realizada com sistema de plantio direto sempre que
ajuda a conservar o solo pela cobertura vegetal,
possível. Recomenda-se ensilar o sorgo ou milho.
Ano 1 (fevereiro a agosto) melhora a condição do solo com fertilizantes
Implantação do Sistema Santa Fé Ano 2 em diante: pode-se repetir as ações do ano 1,
Ano 2 (fevereiro a agosto) residuais e ciclagem de nutrientes e ainda
(Milho ou Sorgo em consorciação observando-se o detalhe de que forrageira deve ser
Ano 6 (fevereiro a agosto) proporciona retorno econômico com a renda
com braquiária) escolhida com base em sua tolerância a sombreamento
Ano (fevereiro a agosto) obtida com os grãos.
Recomenda-se que os detalhes de plantio específicos para
A partir do ano 2 a forrageira fica estabelecida
a área sejam inseridos neste quadro. Eventualmente um
para o componente pecuário
quadro adicional pode ser criado para a cultura.
Eliminação de plantas daninhas para evitar-se a Coroamento das plantas de eucalipto com capinas manuais
Tratos culturais no eucalipto Ano 2 (agosto).
mato-competição; ou herbicidas ao redor das árvores.
Adubação de cobertura para suprir as A adubação de cobertura é realizada aos 90 dias e após um
Tratos culturais no eucalipto Ano 2 (agosto).
necessidades nutricionais das plantas; ano de plantio.
Ano Altura Desrama para favorecer o crescimento da planta
Ano 2 0a2m e a qualidade da madeira bem como para A desrama inicial é feita quando o diâmetro do caule a 1,30 m
Tratos culturais no eucalipto
Ano 3 2a4m evitar danos pelos animais quando os mesmos de altura atinge mais que 6 cm.
Ano 4 4a6m entrarem no sistema
Os bezerros, pelo menor porte causam menos Para que os animais entrem no sistema é necessário
danos às árvores jovens e além disso, essa que as árvores estejam com mais de 6 cm de diâmetro
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O Diagrama ou Gráfico de Gantt foi criado em 1917, pelo engenheiro industrial Henry
Laurence Gantt, com o objetivo de auxiliar o exército e a marinha dos Estados Unidos no
controle de serviços de guerra. Mais tarde, os diagramas passaram a ser utilizados para
sequenciar as atividades de linhas de produção industrial. Nesta técnica, o cronograma
de atividades é apresentado na forma de um conjunto de barras horizontais em uma
linha de tempo. Com isso, é possível acompanhar visualmente a realização das tarefas no
cronograma e as relações de dependência entre as atividades do processo.
Esse diagrama tem a grande vantagem de permitir uma visualização rápida de como está
o andamento das atividades em relação ao planejado, permitindo, consequentemente,
uma melhor organização logística do projeto. O diagrama facilita a visualização de
atividades que devem ocorrer ao mesmo tempo ou logo em sequência, evidenciando as
que demandam o mesmo recurso.
Por exemplo, se o produtor tem apenas um trator para irrigar as mudas de eucalipto
recém-plantadas e para fazer a pulverização de inseticidas na área de lavoura de grãos, ele
deve dar mais atenção a esse detalhe e resolver um possível problema logístico, pois essas
duas atividades podem ocorrer simultaneamente e realizar qualquer uma delas, mesmo
que com apenas um pequeno atraso, pode causar grandes prejuízos.
Podem ser encontrados no mercado, diversos softwares de gestão de projetos que utilizam
Gráficos de Gantt. Inclusive algumas versões de fácil utilização podem ser baixados da
internet, sem custos, e instalados para uso em um computador pessoal. Neste exemplo
foi utilizado o “GanttProject”, disponível gratuitamente em: http://www.ganttproject.biz/.
Trata-se de um software livre e de código aberto que possui uma interface bastante
intuitiva. Para ilustrar como a ferramenta pode ser utilizada na implantação de sistemas
de ILPF, cada atividade mapeada e descrita no quadro anterior foi inserida no Diagrama
de Gantt com seu período de sua execução (Figura 1).
Figura 1. Ilustração da tela de interface visual do software GanttProject para um projeto de ILPF com eucalipto.
Dentro do conjunto de atividades a serem executadas, existem várias tarefas que devem ser
realizadas ao mesmo tempo. O Diagrama de Gantt auxilia no planejamento e na execução
destas ações uma vez que permite visualizar o período de sua execução ao longo do tempo.
Outra vantagem desse gráfico, é que o mesmo apresenta sempre uma barra vertical
vermelha cortando as atividades na coluna relativa ao dia atual. Dessa forma, as tarefas
em atraso são facilmente identificadas. Na figura 2 é mostrada esta funcionalidade
considerando, para o exemplo, que a data atual seja 15 de janeiro de 2014.
Figura 2. Exemplo da visualização do Gráfico de Gantt para um projeto de ILPF com a barra vertical indicando
o dia atual.
Capítulo 19
Planejamento de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta 289
Depois de baixar o arquivo, clique duas vezes sobre ele para que seja aberto
automaticamente no GanttProject. Na interface do sistema as atividades são mostradas
em uma coluna do lado esquerdo e o gráfico de Gantt é mostrado do lado direito. As
atividades disponíveis no exemplo são as seguintes:
1
Para obtê-lo, basta acessar o endereço: www.ilpf.cnpgc.embrapa.br.
290 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
No caso de se continuar a usar esse mesmo gráfico, para se criar uma nova atividade há
um botão com o símbolo de um relógio, disponível na barra superior da interface do
GanttProject (Figura 4). Após clicar sobre o relógio, uma tarefa com um nome genérico e
sem período definido aparece na coluna de tarefas.
No caso de se desejar excluir uma atividade qualquer, basta selecioná-la e utilizar o botão
com o símbolo de um “X” também disponível na interface principal do programa, como
ilustrado na Figura 4.
Capítulo 19
Planejamento de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta 291
Figura 4. Ilustrações indicativas dos botões da interface do GanttProject para criar e excluir tarefas.
Para alterar o nome e o período de uma atividade existente no exemplo dado ou em outro
arquivo que o usuário esteja utilizando, basta clicar duas vezes sobre a linha da atividade.
Isto fará com que o programa mostre um formulário com as propriedades da atividade.
Por meio deste formulário
é possível alterar diversas
informações para adequar
o exemplo à sua realidade.
Conforme mostrado na
Figura 5, o sistema oferece
a possibilidade de alterar
o nome da atividade,
o período em que será
realizada, a sua prioridade
e a visualização da barra
desta atividade no gráfico
de Gantt (forma e cor).
Também é possível inserir
informações adicionais na
forma de texto puro no
campo “Editar Notas”.
Figura 5. Edição das propriedades de uma atividade em projeto de
implantação de sistema de integração.
Além disso, com esse programa é também possível vincular relações de dependência
entre atividades. Quando se vincula duas atividades, uma atividade só pode ter início após
a finalização de sua antecessora no relacionamento. Para criar a relação de dependência,
selecionam-se duas atividades e clica-se sobre o botão com o símbolo de uma corrente,
conforme mostrado na Figura 6. No modelo disponibilizado, há diversas atividades
com relação de dependência, que estão indicadas visualmente por uma seta ligando a
antecessora à sucessora.
292 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 6. Ilustração da ferramenta para criação de relação de dependência entre duas atividades em projeto de
implantação de sistema de integração.
Figura 7. Ilustração da alocação de pessoas e suas funções em atividade de projeto de implantação de sistema
de integração.
Considerações finais
Portanto, a definição clara e por escrito dos objetivos do sistema, do seu escopo e suas
características principais, bem como o uso de ferramentas para formalização e descrição
detalhada de cada passo do planejamento, aliada ainda à utilização de softwares específicos
para gestão de projetos, faz com que o processo passe a ser mapeado formalmente e sua
execução seja feita de forma metódica e documentada, otimizando o uso de recursos e
de tempo aplicados ao projeto e contribuindo para o sucesso do empreendimento como
um todo.
Davi J. Bungenstab
Capítulo 20
Sistemas de produção em integração:
alternativa para recuperação de pastagens degradadas
Manuel Claudio Motta Macedo
Alexandre Romeiro de Araújo
296 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Exploração racional e ambientalmente correta de recursos naturais, sustentabilidade
da produção e mecanismos de desenvolvimento limpo (MDL) são temas cada vez mais
discutidos no desenvolvimento agropecuário do Brasil. O País tem experimentado um
grande desenvolvimento tecnológico e produtivo no agronegócio, ampliando suas
exportações e a renda dos produtores.
Os solos ocupados por pastagens em geral são marginais quando comparados àqueles
usados pela agricultura de grãos. Estes apresentam problemas de fertilidade natural,
acidez, topografia, pedregosidade ou limitações de drenagem (Adamoli et al., 1986). Os
solos de melhor aptidão agrícola são ocupados pelas lavouras anuais de grãos ou as de
grande valor industrial para a produção de biocombustíveis, fibras, resinas, açúcar, etc.
No Brasil, antes da introdução das pastagens cultivadas na região dos Cerrados a lotação
animal era de 0,3-0,4 animal/ha e os bovinos só atingiam a idade de abate após os 48 a 50
meses (Arruda, 1994). No início da década de 1970 teve início a introdução de espécies do
gênero Brachiaria, notadamente a espécie Brachiaria decumbens. Esta espécie adaptou-
se muito bem ao bioma Cerrado, de solos ácidos e de baixa fertilidade natural. A lotação
inicial média proporcionada passou a ser de 0,9 a 1,0 animal/ha e o ganho de peso animal
também aumentou em média, de 2 a 3 vezes. Esta maior produtividade resultou em um
grande impulso na exploração da pecuária de corte no Brasil e ampliou consideravelmente
a fronteira agrícola.
do volume total vendido entre as diversas espécies, inclusive na exportação para outros
países da América Latina. Sua expansão se deve pela maior resistência à cigarrinha-das-
pastagens e por proporcionar melhor desempenho animal. No Cerrado, as braquiárias
continuam ocupando a maior área plantada, com cerca de 85% do total e as forrageiras
do gênero Panicum ao redor de 12% (Macedo, 2005).
Esses problemas têm sido mitigados pela utilização de tecnologias importantes como o
sistema de plantio direto (SPD), que contempla não só o preparo mínimo do solo, mas
também a prática de rotação de culturas, e os sistemas de integração lavoura-pecuária
(ILP) e lavoura-pecuária-floresta (ILPF).
A utilização do SPD é uma tecnologia crescente, que em 2003 na região dos Cerrados,
já representava mais de 40% dos sistemas de plantio (Duarte et al., 2007). Acredita-se
que esse percentual já tenha ultrapassado os 65% em 2008/2009. O grande avanço se
deu pelas vantagens comparativas entre o SPD e os sistemas tradicionais, em termos
agronômicos, econômicos e ambientais. Em um relato sobre a evolução do SPD do início
da década de 1970 até o início da década de 1990, Puríssimo (1997), observou que foram
várias as dificuldades encontradas, desde a falta de equipamentos até a alta dependência
do controle químico das plantas daninhas.
Figura 1. Produção animal (kgPV/animal/ano) em pastagens de Brachiaria decumbens nas savanas de Carimagua,
Colômbia.
Fonte: Dados coletados por Lascano et al. (1989, 1995), durante 16 anos. 0 = anos com ataque de cigarrinha das
pastagens.
Capítulo 20
Sistemas de produção em integração: alternativa para recuperação de pastagens degradadas 299
Por outro lado, exemplos que ilustram a queda do vigor e da produtividade das
pastagens, em direção à degradação, são dados pelos resultados obtidos por
Cardoso (1987, comunicação pessoal) e Bianchin (1991). No primeiro caso (Figura 2), foram
utilizadas lotações fixas de 1,5 e 2,5 cabeças/ha, de novilhas nelore de 18 a 24 meses
de idade, por cinco anos consecutivos em um Oxisol argiloso (Latossolo Vermelho
distroférrico), em Campo Grande, MS, Brasil, em Brachiaria decumbens cv. Basilisk,
sem adubação de manutenção. No segundo exemplo (Figura 3), foram utilizadas
lotações fixas de 1,4 e 1,8 UA/ha, de bezerros Nelore desmamados, por seis anos
consecutivos em um Oxisol argiloso (Latossolo Vermelho distrófico), também em
Campo Grande, MS, Brasil, em pastagens de Brachiaria brizantha cv. Marandu sem
adubação de manutenção. Enquanto no primeiro caso os animais eram destinados
à reprodução, no segundo, os animais eram recriados para posterior engorda. A
produção animal, (kg PV/ha), em Brachiaria brizantha, nas estações de seca e chuvosa,
durante três ciclos de dois anos, pode ser observada na Figura 4 e acompanhou a
queda na disponibilidade da forrageira. A partir da segunda seca, a lotação mais
leve ultrapassa a produção da lotação mais elevada, mostrando, didaticamente, a
necessidade de ajuste para manter a capacidade de suporte da forrageira.
Figura 2. Evolução da disponibilidade da matéria seca Figura 3. Evolução da disponibilidade da matéria seca
total (t/ha) em pastagem de Brachiaria decumbens em total (t/ha) em pastagem de Brachiaria brizantha em
Campo Grande, MS, Brasil, sob lotação animal fixa. Campo Grande, MS, Brasil, sob lotação animal fixa.
Fonte: Adaptado de Cardoso (1987, comunicação Fonte: Adaptado de Bianchi (1991).
pessoal).
300 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 4. Evolução da produção animal (kg PV/ha) por bezerros Nelore desmamados, recriados em pastagem de
Brachiaria brizantha cv. Marandu, em Campo Grande, MS, Brasil, sob lotação animal fixa, em três ciclos pecuários
de dois anos.
Fonte: Adaptado de Bianchin (1991).
Segundo outros resultados obtidos na mesma região por Euclides et al. (1994a), a
disponibilidade de matéria seca total de espécies como Brachiaria decumbens e Brachiaria
brizantha deveriam ser mantidas ao redor de 3,0 t/ha ao longo do tempo para permitir
uma oferta adequada de forragem verde, principalmente de lâminas foliares, a fim de
atender adequadamente a dieta animal.
Os trabalhos de Cardoso (1987, dados não publicados) e Bianchin (1991) tiveram como
objetivo, entre outros, o de medir a capacidade de suporte da forrageira sob lotação
animal fixa, sem ajustes na lotação e sem reposição de nutrientes, e ficou comprovado
que nessas condições a capacidade de suporte não é sustentável. Os gráficos aqui
apresentados são como fotografias, em pequena escala, do panorama real existente em
milhões de hectares de pastagens cultivadas que não recebem reposição de nutrientes
ou ajustes no manejo animal.
desde que o potencial produtivo não seja limitado por problemas de clima, solo ou
manejo animal inadequado. Depois, nota-se uma queda natural da produtividade com o
tempo. Esta queda pode ser mais intensa, rápida e constante, até atingir um determinado
ponto de equilíbrio, caso não seja aplicada uma ação de manejo visando a manutenção da
produção. Este estado de equilíbrio geralmente é atingido com índices de produção que
mal pagam os custos de manutenção dos animais, levando os criadores à descapitalização
e até mesmo à saída do negócio agropecuário.
Sugere-se que antes do início do processo de degradação seja introduzida uma ação de
manejo que vise a manutenção da produtividade. Isso pode ser feito pelo manejo animal,
especialmente pelo ajuste da lotação e alteração do manejo da pastagem, ou por meio de
práticas culturais, como a calagem, gessagem e adubação.
O final do processo culminaria com a ruptura dos recursos naturais, representado pela
degradação do solo com alterações em sua estrutura, evidenciadas pela compactação
e a consequente diminuição das taxas de infiltração e capacidade de retenção de água,
causando erosão e assoreamento de nascentes, lagos e rios. Neste ponto a recuperação
da área torna-se muito mais onerosa que nos estágios anteriores.
302 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
3) Manejo e práticas culturais como uso de fogo como rotina, métodos, épocas e
excesso de roçadas, ausência ou uso inadequado de adubação de manutenção;
Por outro lado, pastagens no estádio inicial de degradação, onde apenas se observa
perda de vigor e produtividade, podem ser recuperadas por meio de simples
aplicação superficial de fertilizantes, corretivos e/ou escarificação e subsolagem.
No caso dos solos sob vegetação de Cerrados, ácidos e de baixa fertilidade, alguns
nutrientes desempenham papel fundamental na sustentabilidade da produção. Um
dos nutrientes mais importantes é o fósforo. Pesquisas efetuadas na Embrapa Gado de
Corte têm demonstrado que em grande parte dos casos, os baixos teores iniciais de P
ou a queda destes, após algum tempo de exploração, afetam diretamente a produção.
Uma vez corrigido o P, com a aplicação simultânea de outros nutrientes essenciais,
o nitrogênio passa a exercer papel fundamental na sustentabilidade da produção
(Cadish et al. 1993; Macedo, 1997).
A renovação indireta de pastagens, por sua vez, pode ser entendida como aquela efetuada
através de práticas mecânicas, químicas e culturais, utilizando-se de uma pastagem anual
(milheto, aveia) ou de uma lavoura anual de grãos (milho, soja, arroz) por certo período de
tempo, a fim de substituir a espécie forrageira existente por outra de melhor valor nutritivo ou
com diferentes características que as da espécie em degradação.
A ILP e ILPF, são alternativas que se enquadram tanto na recuperação indireta, como na
renovação indireta de pastagens, como apresentado na Figura 7. No entanto, é preciso ter-
se em mente que sua implantação deve respeitar os limites dos estádios de degradação
das pastagens, sendo mais eficiente e de sucesso, quando instaladas nas fases de perda
de vigor e ou manutenção, e no início da degradação das pastagens.
feito por uma cultura anual de grãos deve ser estabelecido com cautela, observando-se
as exigências nutricionais da cultura e sua adaptação e potencial de produção no local,
principalmente se for área pioneira no cultivo de grãos.
No entanto, recentemente tem crescido uma alternativa diferenciada e muito eficiente, porém
mais complexa, de manutenção da produtividade e de recuperação/renovação indireta de
pastagens que é a ILP, onde a introdução de lavouras não é eventual, mas parte integrante de
um sistema de produção de grãos e de produção animal que interage e se completa biológica
e economicamente. Salientando que a introdução desse sistema deve ser baseada em
diagnóstico detalhado do estabelecimento rural e sua região, para certificar-se de sua aptidão
para o sistema.
Este sistema permite o uso mais eficiente dos insumos, máquinas e mão-de-obra na
propriedade agrícola, além de diversificar a produção e o fluxo de caixa dos produtores.
Evidentemente que alguns requisitos são necessários para implementar o sistema, tais como,
máquinas e implementos agrícolas mais diversificados, infraestrutura de estradas e armazéns,
mão-de-obra qualificada, domínio da tecnologia de lavouras anuais e pecuária, além de
308 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Por outro lado, a ILP já é praticada há anos em muitos países. A utilização de resíduos de
culturas na alimentação dos animais ou o pastejo das restevas de lavouras também são
práticas frequentes em uso em várias regiões do Brasil, sobretudo no sul do País. Do ponto
de vista das propriedades físicas e químicas do solo, nesses sistemas há uma melhoria na
fertilidade pela ciclagem dos nutrientes e eficiência no uso de fertilizantes, em função das
diferentes necessidades das culturas em rotação. As melhorias nas propriedades físicas são
por exemplo aumento da estabilidade dos agregados, diminuição da densidade aparente, da
compactação, e no aumento da taxa de infiltração de água.
Figura 9. Porcentagem de estabilidade de agregados em água (> 2 mm) em diferentes sistemas de produção e
de manejo em Latossolo, textura média, Uberlândia, MG.
Fonte: Vilela et al. (2001).
É importante ressaltar que esse projeto foi implantado em uma área de pastagens
degradadas de Brachiaria decumbens, que foram recuperadas ou renovadas por
meio de diferentes tratamentos com adubação, calagem e tratos mecânicos;
renovação com troca de espécies, Brachiaria brizantha e Panicum maximum, com
plantio de soja ou milho, etc. de acordo com os diferentes tratamentos. Uma área de
vegetação natural e uma área de pastagem degradada estão sendo mantidas como
testemunhas para comparações.
Figura 10. Dinâmica dos teores de fósforo do solo (Mehlich-1) na camada de 0 a 20 cm, em sistemas convencionais
e de integração lavoura-pecuária em um Latossolo Vermelho Distrófico em Campo Grande, MS.
Fonte: Macedo (2005).
Figura 12. Distribuição dos agregados da camada de 0 a 5 cm, agrupados em 3 classes de tamanho para os
sistemas de lavouras em preparo convencional (L-PC); lavouras em plantio direto (L-PD); rotação soja por 1 ano -
pastagem (B. brizantha) por 3 anos (S1P3); pastagem permanente (B. decumbens) (PP).
Fonte: Salton (2005).
Em outro experimento de longa duração sobre SILPs, que está sendo realizado na
Embrapa Cerrados, Planaltina, DF (Vilela et al., 2001), Marchão et al., (2007) efetuou
estudos sobre as propriedades físicas do solo, estoque de carbono e a macrofauna, para
avaliar a qualidade do solo dos SILPs comparados a sistemas tradicionais e contínuos de
lavoura e pastagem, incluindo métodos de preparo de solo e SPD, com dois níveis de
adubação de manutenção. Uma área de vegetação nativa foi tomada como referência.
O autor constatou que os SILPs alteram alguns atributos físico-hídricos do solo,
causando incremento na resistência à penetração e na densidade do solo pelo pisoteio
dos animais durante a fase de pastagem na rotação, mas estes não foram fatores
limitantes para a produção dos cultivos anuais subsequentes. Os SILPs contribuem
para aumentar o armazenamento de água e a porosidade do solo, sobretudo no SPD.
Os sistemas de uso e preparo do solo influenciaram nos estoques de carbono e de
nitrogênio, sobretudo no SPD, mas não se observou efeito de nível de fertilização. Em
relação à macrofauna do solo, os SILPs baseados em SPD e na rotação com pastagens
consorciadas com leguminosas, apresentaram maior densidade e biodiversidade de
espécies, oferecendo melhores condições para a sustentabilidade da qualidade do
solo. Dentre as comunidades favorecidas pelo uso de SILPs destacam-se os gêneros
Oligochaeta (minhocas) e Coleoptera (besouros coprófagos) que têm papel chave na
estruturação do solo. A avaliação da macrofauna mostrou ser um bom indicador de
qualidade do solo (Tabela 3).
Capítulo 20
Sistemas de produção em integração: alternativa para recuperação de pastagens degradadas 313
Com relação à interação entre atributos físicos e químicos do solo com a densidade
e riqueza da macrofauna, Lourente et al. (2007) observaram em área de fazenda no
Mato Grosso do Sul, que já utiliza SILPs e SPD há vários anos, que não houve correlação
entre densidade de indivíduos e atributos físicos do solo, mas esta mostrou-se
influenciada por algumas propriedades químicas. Dentre estas correlações positivas
destacam-se as existentes entre os teores de P no solo (Mehlich-1), minhocas e larvas
de coleópteros com os teores de matéria orgânica.
PCSA: pasto contínuo sem adubação de manutenção; PCCA: pasto contínuo com adubação de manutenção;
PCAL: pasto contínuo com adubação e leguminosas; L4-P4: 4 anos de lavoura, seguidos de 4 anos de pastagem;
L1-P3: 1 ano de lavoura seguido de 3 anos de pastagem implantada com milho; PD: pastagem degradada.
Fonte: Macedo; Zimmer (2007).
Considerações finais
A nova tendência dos SILPs é a incorporação de árvores nos sistemas, configurando o que
se chama de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Trabalhos iniciais
na Embrapa Gado de Leite, efetuados por Carvalho et al. (1997), onde o objetivo era
ajustar forrageiras tropicais que melhor se adaptassem ao sombreamento, em sistemas
silvipastoris, têm evoluído para sistemas agrossilvipastoris, onde o arranjo das linhas de
árvores já leva em consideração o espaço necessário para o plantio de culturas e seus
tratos culturais (Soares et al., 2009).
Finalmente, são poucos os dados estatísticos sobre áreas utilizadas com SILPs, por isso não
se tem a dimensão correta de sua extensão. Estima-se, todavia, que cerca de 5% da área de
culturas anuais brasileiras já pratiquem, em algum grau, essa tecnologia. Exemplos práticos
da aplicação desses sistemas podem ser encontrados e visitados em diferentes regiões do
país, como em Maracaju-MS, Rio Verde-GO, Campo Mourão-PR, Rondonópolis-MT, Luis
Eduardo Magalhães-BA, Uberlândia-MG, Pedro Afonso-TO e Assis-SP.
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Flavio J. Wruck
Capítulo 21
Produção da lavoura em sistemas de ILPF
Flávio Jesus Wruck
Maurel Behling
Anderson Lange
320 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A ILP é recomendada para áreas com aptidão para lavoura e pecuária com a ressalva de
que nem toda área apta para pecuária o será para lavoura, mas que toda área apta para
lavoura também o será para pecuária. No campo, são encontradas três grandes derivações
da estratégia ILP, em diferentes arranjos, que se destacam: i. ILP-Reforma ou renovação de
pastagem; ii. ILP-“Boi” safrinha ou “Boi” de 3ª safra, e; ILP-Rotação lavoura-pecuária.
ILP-Rotação lavoura-pecuária
A ILP-Rotação lavoura-pecuária acontece mais frequentemente em fazendas que,
sistematicamente, adotam a rotação entre pastagem e lavoura com objetivo de intensificar
o uso da terra e se beneficiar do sinergismo entre as duas atividades. Nesses casos, a
propriedade é dividida em partes e, durante determinados períodos preestabelecidos,
as áreas de lavoura podem ser utilizadas como áreas de pecuária e vice-versa. Esta
derivação da ILP é recomendada para regiões lavoureiras, tornando indispensável para
aquelas com solos de textura arenosa (10 a 25% de argila) que almejam produzir grãos
de forma economicamente viável, tais como oeste dos Estados da Bahia e de São Paulo
e Sul do Mato Grosso do Sul. O sistema “São Matheus” (Salton et al., 2013), desenvolvido
pela Embrapa, é um exemplo típico da ILP-Rotação lavoura-pecuária e uma excelente
ferramenta tecnológica para exploração sustentável de solos arenosos.
A ILP, na forma de rotação lavoura-pecuária, pode ser alocada na propriedade rural sob
diferentes arranjos. Dentre os mais utilizados, estão a rotação formada por dois anos de
lavoura seguidos por dois anos de pecuária cuja proporção, em área, equivale a 50% de
lavoura e 50% de pecuária na safra (Figura 3) e aquela formada por três anos de lavoura
seguidos por dois anos de pecuária cuja proporção, em área, equivale a 60% de lavoura e
40% de pecuária na safra (Figura 4).
Capítulo 21
Produção da lavoura em sistemas de ILPF 323
Figura 3. Esquema da ILP na forma de rotação tetra anual entre lavoura e pecuária com áreas iguais na
safra, sendo que o número após o componente, significa o ano da sequência de ocupação da terra por esse
componente dentro de um ciclo de rotação quadrianual.
Figura 4. Esquema da ILP na forma de rotação penta anual entre lavoura e pecuária com 60% da área ocupada
com lavoura e 40% com pecuária na safra, sendo que o número após o componente, significa o ano da sequência
de ocupação da terra por esse componente dentro de um ciclo de rotação penta anual.
* número de anos ocupados pelo componente dentro de um ciclo de rotação penta anual.
324 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A ILF é indicada para áreas mecanizáveis onde as espécies florestais utilizadas, como por
exemplo a seringueira (Figura 5) ou jabuticabeira, não permitem a entrada dos animais
de grande porte (bovinos, bubalinos e/ou equinos), devido aos danos que estes podem
causar ao sistema de produção dos produtos utilizados pela indústria de beneficiamento
vegetal (borracha, frutos, etc.). Nestes casos é muito importante observar o espaçamento
entre as árvores que permita a passagem de luz para o sub-bosque.
Fotos: Flávio Jesus Wruck
8m
m
2.5
Figura 6. Pastagem em degradação renovada com ILPF na Fazenda Gamada, Nova Canaã do Norte, MT.
A lavoura proporciona uma maior flexibilidade técnica e econômica dentro dos sistemas
ILPF, pois pode, quando associada à pecuária, variar em pouquíssimo tempo (cerca de
quatro meses) o tamanho da sua área dentro do sistema. Assim, sob condições econômicas
favoráveis, sua participação dentro do sistema pode ser ampliada ou, reduzida, caso o
ambiente econômico se torne desfavorável. Além da variação na área, existem outros
aspectos muito importantes dessa flexibilidade, tais como:
• Diferentes ciclos dentro da mesma espécie, tanto para safra quanto para safrinha;
• Possibilidade de uma mesma espécie para diferentes finalidades (sorgo para pastejo
ou para silagem ou granífero, milho granífero ou para silagem, entre outras);
• Existência, para a mesma espécie lavoureira, de materiais convencionais e
transgênicos (soja, milho, arroz, entre outros)
Outra característica importante da lavoura é seu grande potencial mitigador dos efeitos
antrópicos indesejados no sistema. Como casos relevantes, citam-se a presença de grande
quantidade de nematóides em uma determinada área que pode ser reduzida por culturas
graníferas mitigadoras (exemplo do Pratylenchus brachyurus x Crotalaria ocrholeuca). Outro
caso ocorre em solos compactados onde pode ser utilizado o nabo forrageiro (Raphanus
sativus L.), geralmente na safrinha, solteiro ou consorciado com braquiária (normalmente
B. ruziziensis), para pastejo de bovinos e descompactação do solo. Por fim, outro caso
clássico é a utilização de espécies graníferas leguminosas na safra (soja, feijoeiro-comum,
entre outros) ou safrinha (feijão-caupi, crotalárias, entre outras) para aporte de nitrogênio
em solos pobres e/ou exauridos deste nutriente.
Por fim, a lavoura se caracteriza por ser a componente referência para correção, adubação
e dimensionamento dos sistemas ILPF. Na maioria das vezes, as espécies agrícolas são
mais exigentes em relação à correção e a adubação do solo. Assim, as áreas dos sistemas
ILPF são corrigidas e adubadas de acordo com as demandas da lavoura que, por sua
vez, fornece adubos residuais aos demais componentes. Evidentemente adubações
pontuais devem ser ajustadas para o componente florestal. Além disso, a infraestrutura
utilizada na lavoura, notadamente as dimensões dos pulverizadores e das colheitadeiras,
é considerada imprescindível no dimensionamento dos sistemas integrados que contém
o componente florestal (ILF ou ILPF).
Por fim, dois princípios que devem nortear a seleção das culturas agrícolas dentro
dos sistemas ILPF: o primeiro é o diagnóstico dos fatores de produção e o segundo
é o caráter dinâmico das culturas agrícolas ao longo do tempo. Assim, as opções do
componente lavoura permitem um número elevadíssimo de configurações dos sistemas
ILPF que, por sua vez, são dinâmicas ao longo do tempo.
O segundo princípio norteador da seleção das culturas agrícolas dentro dos sistemas ILPF
é seu caráter dinâmico ao longo do tempo. Em função do menor ciclo, quando comparado
aos demais componentes, a lavoura pode ser alterada de um ano agrícola para outro
ou, até mesmo, dentro do mesmo ano agrícola quando, ainda na safra, pode alterar a
safrinha planejada para uma determinada área. Essas alterações devem ser balizadas
pelas condições técnicas (agronômicas) e econômicas. No primeiro caso, por exemplo,
a alteração pode ser motivada pelo lançamento de uma cultivar ou variedade ou híbrido
melhorado para determinada espécie agrícola. Outro exemplo pode vir das previsões
climatológicas de um determinado ano agrícola onde o mesmo pode ser influenciado
pelos fenômenos “El nino” ou “La nina”, condições que alterarão a distribuição pluviométrica
de uma determinada região e, por conseguinte, afetarão diretamente a seleção das
opções agrícolas naquele ano agrícola para aquele local. No segundo caso (aspectos
econômicos), o gestor do projeto ILPF deve ficar atendo às oportunidades e nichos de
mercado, como por exemplo o pagamento adicional e vantajoso pela soja convencional
em algumas regiões produtoras; do preço pago, em determinados anos agrícolas, pelo
feijão-safrinha produzido no Mato Grosso; das excelentes opções econômicas de safrinha,
tais como girassol e milho-pipoca, na Chapada dos Parecis mato-grossense, entre outros.
• Em áreas com um ciclo pluviométrico mais estendido, como Norte do Mato Grosso
e quase toda região Norte do Brasil, pode ser uma opção para safrinha;
• Permite, com facilidade mediana, a formação de consórcio com forrageiras,
constituindo uma excelente ferramenta para a entrada do componente pecuária
no sistema, e;
• Produz uma considerável quantidade de resíduos culturais de decomposição lenta
que propicia uma boa cobertura morta de solo.
• Apesar das características favoráveis, por outro lado, o arroz de terras altas apresenta
outras que precisam ser muito bem manejadas para viabilizá-la dentro dos sistemas
ILPF:
• Baixa concentração da enzima redutase do nitrato até por volta dos 30 dias após sua
emergência (30 DAE) necessitando, neste período, de uma maior disponibilidade
de nitrogênio na forma reduzida no solo;
• Sistema radicular fasciculado e pouco agressivo, sendo muito sensível aos atributos
físicos do solo, tais como densidade, porosidade e resistência à penetração;
• Como consequência, são raras as condições do meio que viabilizam agro-
-economicamente a utilização do sistema de plantio direto na cultura do arroz de
terras altas;
• Em sistema de rotação ou sucessão, é extremamente exigente em relação à cultura
precedente, sendo desaconselhável a utilização do próprio arroz, milho, sorgo,
capim-Sudão, entre outros;
• É precedente desaconselhável para outras gramíneas agrícolas no sistema de
rotação ou sucessão de culturas;
• Muito sensível à competição com plantas daninhas que, aliado a um portfólio limitado
de herbicidas pós-emergentes seletivos à cultura, torna difícil o manejo das mesmas
quando integradas com o componente florestal nos seus dois primeiros anos depois
da implantação, e;
• Mercado comprador nem sempre favorável e extremamente dependente da
produção do arroz irrigado no Sul do Brasil.
Trabalhos recentes e observações empíricas dentro de áreas sob ILPF apontam que as
condições físicas de solo favoráveis ao plantio direto do arroz de terras altas são:
• Teor de matéria orgânica superior á 2%, sendo desejável ser superior á 3%;
• Saturação por bases entre 40 e 50% com pH em água entre 5,0 e 5,7.
Por fim, devem ser consideradas as culturas precedentes e quantidade de palhada para o
plantio direto do arroz de terras altas. Os bons resultados agronômicos do arroz de terras altas
em plantio direto dentro da ILPF foram obtidos quando a cultura na safra imediatamente
anterior ao arroz foi a cultura da soja precedida, por sua vez, de braquiária (ou como pasto
de safra ou como pasto de safrinha) no mínimo nos três anos anteriores (Figura 8).
Foto: Flávio Jesus Wruck
Figura 8. Arroz de terras altas (BRS Sertaneja) cultivada no sistema de plantio direto, dentro da ILPF e no seu
4o ano agrícola do sistema, precedida por dois anos de pastagem (capim-Marandú) e um da sucessão soja /
consórcio sorgo com capim-Marandú - Fazenda Dona Isabina, Santa Carmem - MT, 2009.
Capítulo 21
Produção da lavoura em sistemas de ILPF 333
Com relação à palhada para o plantio direto do arroz, diferentes forrageiras e/ou consórcios
foram e continuam sendo testados nos sistemas ILPF:
Por fim, com relação ao manejo fitotécnico do arroz de terras altas dentro da ILPF cabe
destacar:
Soja
A soja é a cultura agrícola mais utilizada na ILPF, pois apresenta uma série de características
relevantes para o sistema:
Por outro lado, a soja apresenta características desfavoráveis aos sistemas ILPF que
precisam ser muito bem manejadas para viabilizá-la dentro dos mesmos:
Por fim, devem ser consideradas as culturas precedentes e quantidade de cobertura morta
(palhada) para o plantio direto da soja. Bons resultados agronômicos da soja em plantio
direto dentro da ILPF foram obtidos sob diferentes coberturas mortas, caracterizando sua
menor exigência quanto à cultura e/ou consórcio precedentes. Com relação à quantidade
de cobertura morta, os melhores resultados foram obtidos entre 4 e 5 toneladas de MS ha-1,
semelhante ao ocorrido para o arroz de terras altas. Acima disto, ocorriam problemas sérios
na operação de plantio e abaixo não havia cobertura suficiente para o controle efetivo de
plantas daninhas na fase inicial da cultura. Ainda, alguns cuidados devem ser tomados:
Figura 9. Soja cultivada em SPD sob palhada de braquiária integrada com Khaya ivorensis (mógno africano)
dentro do 2º ano da ILPF - Fazenda Dona Isabina, Santa Carmem - MT, 2013.
O plantio convencional da soja não é usual dentro da ILPF. Ocorre na reforma ou renovação de
pastagens onde o solo está compactado e/ou apresenta irregularidades impeditivas na sua
topografia ou em áreas velhas com solos extremamente compactados, tornando o preparo
do mesmo indispensável. Nestes casos, valem as mesmas recomendações mitigadoras dos
efeitos negativos do preparo de solo elencadas para o arroz de terras altas.
336 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Milho
O milho é, depois da soja, a cultura agrícola mais utilizada nos sistemas ILPF, pois apresenta
características importantes para o sistema:
• Pode ser cultivado para diferentes finalidades como forragem, silagem e grãos
podendo, numa safra frustrada de grãos, servir para silagem ou mesmo forragem
quando presente o componente pecuário;
• Apresenta excelente resposta a adubação, especialmente a nitrogenada;
• Representa uma ótima opção de safrinha com materiais apropriados para qualquer
fase da janela de semeadura da mesma;
• Apresenta grande facilidade no consórcio com forrageiras, facilitando e, na maioria
das vezes, custeando a inserção da forrageira dentro do sistema ILPF, e;
• Produz quantidade elevada de resíduos culturais.
• Apesar da maioria das características da cultura do milho ser favoráveis ao ILPF, têm
algumas outras que precisam ser muito bem manejadas para viabilizá-la:
• Os materiais de alta tecnologia são exigentes quanto ás condições químicas do solo,
notadamente em relação á disponibilidade de nitrogênio e potássio, seguindo-se
cálcio, magnésio e fósforo;
• Apresenta exigência elevada quanto à radiação solar, podendo tornar-se inviável para
regiões sob alta incidência de nuvens na fase fisiológica do enchimento de grãos, e;
• É precedente desaconselhável para outras gramíneas agrícolas no sistema de
rotação ou sucessão de culturas, notadamente para o arroz de terras altas.
Por fim, com relação ao manejo fitotécnico do milho dentro da ILPF, cabe ressaltar:
gestor do projeto ILPF buscar o mais adequado para cada situação. Na medida
do possível, é salutar utilizar mais de um material e, ainda, testar anualmente, em
pequena escala, os novos lançamentos do mercado. Quando se vai consorciar
milho com uma forrageira, predomina a utilização de materiais mais rústicos e
tolerantes à competição por água e nutrientes e que possua altura da inserção
da 1ª espiga mais alta. Dentro da ILPF, predomina a utilização de materiais de
ciclo médio e precoce na safrinha, consorciado com a forrageira, para viabilizar
agronomicamente o pastejo dos animais após a colheita dos grãos. O uso de
materiais transgênicos ou convencionais é outra dúvida recorrente dentro dos
projetos ILPF. Neste caso, como se trata de sementes muito mais caras, a análise
do tipo de cultivo (safra, safrinha, solteiro ou consorciado), época da semeadura
dentro da “janela” ideal de plantio e a expectativa futura de preço do mercado
local definirão a viabilidade da utilização dos materiais transgênicos;
Figura 10. Consórcio de milho com capim-Piatã, em SPD, dentro 6º ano da ILPF na sucessão da soja - Fazenda
Dona Isabina, Santa Carmem - MT, 2011.
Capítulo 21
Produção da lavoura em sistemas de ILPF 339
Sorgo
No cultivo de safrinha, o sorgo é uma das culturas agrícolas mais utilizadas nos sistemas
ILPF por apresentar características importantes para o sistema:
Figura 11. Sorgo granífero consorciado com BRS Marandú visando silagem.
340 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Por outro lado, o sorgo possui algumas características culturais que precisam ser muito
bem manejadas para viabilizá-lo dentro dos sistemas ILPF:
Milheto
O milheto é uma das alternativas mais utilizadas no cultivo de safrinha dentro da ILPF por
apresentar características importantes para o sistema, tais como:
• Apresenta baixa produção de palhada (que pode ser ampliada, se consorciado com
forrageiras, tal como a B. ruziziensis);
• Apresenta degradação muito rápida da palhada.
Capítulo 21
Produção da lavoura em sistemas de ILPF 341
Feijão caupi
Apontado como uma das alternativas promissoras de leguminosa forrageira para solos
de textura média e argilosa, o feijão-caupi cultivado na safrinha dentro da ILPF apresenta
características relevantes para o sistema, tais como:
Figura 13. Consórcio de feijão-caupi com B. ruziziensis, no SPD, dentro do 1º ano agrícola da ILPF na sucessão da
soja - Fazenda Gravataí, Itiquira - MT, 2015.
Por outro lado, o feijjão-caupi possui algumas características culturais que demandam ser
muito bem manejadas para viabilizá-lo dentro dos sistemas ILPF, são elas:
• Quando utilizado solteiro para forragem, pode provocar timpanismo nos animais,
além de deixar baixa produção de palhada. Esses fatos exigem seu consórcio com
forrageiras gramíneas, tais como a B. ruziziensis ou B. brizantha Cv Paiaguás;
• Quando utilizado para grãos, a tecnologia do consórcio com forrageiras gramíneas
ainda não está consolidada sendo, por isso, desaconselhável;
• Pode se tornar uma “ponte verde” para nematóides dentro dos sistemas integrados,
notadamente o Pratylenchus brachyurus, sendo desaconselhável seu cultivo na
safrinha em áreas com solos infestados por esse fitopatógeno;
• Elevado custo das sementes, fato que encarece sua implantação. Esse fato pode
ser contornando quando são utilizadas sementes produzidas na própria fazenda
(sementes crioulas).
Crotalaria ochroleuca
A Crotalária ochroleuca também é apontada como uma das alternativas promissoras de
leguminosa forrageira para solos de textura média e argilosa cultivada na safrinha dentro
da ILPF por apresentar as seguintes características relevantes para o sistema:
• Pode ser utilizada como forrageira (uso principal) e também produzir grãos em
mesmo cultivo, constituindo uma excelente fonte de proteínas de alta palatabilidade
para os animais;
• Apresenta um sistema radicular pivotante e agressivo, agindo na descompactação
do solo e melhorando as condições físicas do mesmo;
• É muito menos exigente em relações às condições edafoclimáticas quando
comparada ao milho, sendo, por isso, recomendada para fechamento da semeadura
na safrinha;
• É um excelente precedente para a maioria das culturas, notadamente para o arroz
de terras altas;
• Quando utilizada como leguminosa forrageira, apresenta facilidade de ser
consorciada com outras forrageiras (Figura 14);
• Apresenta grande facilidade na dessecação e boa ciclagem de nutrientes;
• Apresenta fator de reprodução para nematoides extremamente baixo, notadamente
para o Pratylenchus brachyurus,, sendo uma excelente alternativa de safrinha para
áreas com solos infestados por esse fitopatógeno.
Figura 14. Consórcio de C. ocrholeuca com B. ruziziensis, no SPD, dentro do 6ª ano agrícola da iLPF na sucessão
da soja - Fazenda Dona Isabina, Santa Carmem - MT, 2011.
Por outro lado, a Crotalária ochroleuca possui algumas características culturais que
necessitam ser muito bem manejadas para viabilizá-la dentro dos sistemas ILPF:
• Quando utilizada solteira para forragem, pode provocar timpanismo nos animais,
além de deixar uma quantidade limitada de palhada para plantio direto. Esses fatos
exigem seu consórcio com forrageiras gramíneas, tais como a B. ruziziensis ou B.
brizantha Cv Paiaguás;
344 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
• Elevado custo das sementes, fato que encarece sua implantação. Esse fato pode
ser contornando quando utilizado sementes produzidas na própria fazenda
(sementes crioulas).
Nabo forrageiro
O nabo forrageiro (Raphanus sativus L.) é outra cultura apontada como promissora no
cultivo de safrinha para solos de textura média e argilosa dentro da ILPF por apresentar
características relevantes ao sistema, tais como:
• É uma planta crucífera muito vigorosa e com um sistema radicular que descompacta
o solo, permitindo um preparo biológico do mesmo na sucessão de culturas dentro
do sistema integrado;
• Apresenta elevada capacidade de reciclagem de nutrientes, principalmente
nitrogênio e fósforo, tornando-se uma espécie importante na rotação de culturas
como arroz de terras altas, algodão, feijão, milho e soja;
• É tolerante à seca e à geada, sendo uma opção de cultivo de safrinha para a maior
parte do território brasileiro ou, ainda, uma excelente opção para substituir o milho
no fechamento da semeadura de safrinha nas regiões produtoras dessa granífera;
• Produz entre 20 t ha-1 a 35 t ha-1 de massa verde (3,5 t ha-1 a 8 t ha-1 de massa seca),
desenvolvendo-se razoavelmente bem em solos fracos com problemas de acidez,
além de ser bastante resistente a doenças e pragas;
• Dentro da ILPF sua finalidade principal é a produção de forragem, mas também
pode produzir grãos (0,5 t ha-1 a 1,5 t ha-1) em mesmo cultivo, constituindo uma
fonte de proteínas de boa palatabilidade para os animais;
• Apresenta grande facilidade na dessecação e é um excelente precedente para a
maioria das culturas, notadamente para o arroz de terras altas;
• Apresenta facilidade de ser consorciado com outras forrageiras (Figura 15).
Por outro lado, o nabo-forrageiro possui algumas características culturais que necessitam
ser muito bem manejadas para viabilizá-lo dentro dos sistemas ILPF:
Considerações finais
Diante de tantas opções agrícolas que podem ser inseridas nos diversos modelos
de ILPF que contemplam a componente lavoura nos mais diversificados arranjos é
importante almejar um sistema equilibrado para a propriedade rural lembrando que,
muito provavelmente, cada talhão uniforme da mesma contemplará um sistema ILPF que
melhor se ajuste a ele. Assim, é fundamental que com o passar do tempo, a propriedade
inteira esteja integrada por uma rede de sistemas ILPF, de forma que em cada talhão da
propriedade obtenha-se a otimização dos seus fatores de produção.
Referências
SALTON, J. C.; KICHEL, A. N.; ARANTES, M.; KRUKER, J. M.; ZIMMER, A. H.; MERCANTE, F. M.; ALMEIDA, R. G. de.
Sistema São Mateus: Sistema de integração lavoura-pecuária para a região do Bolsão Sul-Mato-Grossense.
Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2013. 6 p. (Embrapa Agropecuária Oeste. Comunicado técnico, 186).
Ademar P. Serra
Capítulo 22
Fundamentos técnicos para implantação
de sistemas de integração lavoura-
-pecuária-floresta com eucalipto
Ademar Pereira Serra
Davi José Bungenstab
Roberto Giolo de Almeida
Valdemir Antônio Laura
André Dominghetti Ferreira
348 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Os sistemas de ILPF são naturalmente mais complexos que lavouras de grãos, sendo
a duração do ciclo dependente principalmente do componente arbóreo. Por isso, é
fundamental que o sistema seja implantado corretamente, para se evitar problemas
de manejo no futuro, que muitas vezes são irreparáveis. A atenção a diversos detalhes
no planejamento, bem como cuidados na definição de cada passo da implantação dos
diferentes componentes do sistema podem fazer a diferença entre o fracasso e o sucesso
da atividade.
Especialmente na região dos Cerrados, ocorrem solos com propriedades químicas pouco
favoráveis à implantação de culturas sem aplicação prévia de corretivos, pois esses solos,
em sua maioria, contêm altos teores de alumínio (Al) trocável e acidez ativa elevada (baixo
pH). Além desses dois fatores, usualmente, existem problemas de baixos teores de fósforo
(P) disponível e de bases trocáveis como cálcio (Ca), magnésio (Mg) e potássio (K).
Capítulo 22
Fundamentos técnicos para implantação de sistemas de integração 349
lavoura-pecuária-floresta com eucalipto
Para que os sistemas de produção vegetal e animal sejam conduzidos de forma integrada
e sustentável, é necessário que seja realizada amostragem e análise de solo para eventual
correção química com corretivos e fertilizantes. A correção de acidez do solo é usualmente
realizada com a aplicação de calcário e gesso agrícola (correção da acidez trocável), que
são os corretivos de solo mais amplamente utilizados no Brasil.
Definidas as quantidades de calcário e/ou gesso agrícola e de adubo que serão aplicadas
na área de plantio, o próximo passo é a distribuição uniforme desse corretivo no solo e a
incorporação do mesmo por meio de grade pesada ou arado (Figura 1).
Figura 1. Grade pesada para incorporação de calcário na área total onde será implantado o sistema de ILPF.
O preparo do solo para implantação do sistema de ILPF pode ser realizado pelo sistema
convencional com a utilização de arados, subsoladores e/ou grades. Esses equipamentos
são primordiais, especialmente, na implantação do sistema em áreas mais degradadas,
para mais rápida incorporação dos corretivos e bem como para facilitar o plantio das
culturas (Figuras 1, 2 e 3). Em sistemas com histórico de cultivos recentes, é possível o uso
de plantio direto (Figura 5), que deve ser priorizado sempre que possível.
350 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 2. Preparo do solo com grade niveladora no espaço entre as linhas de eucalipto.
Foto: Ademar P. Serra
Figura 3. Vista panorâmica das linhas marcadas para o plantio do eucalipto antes do plantio da cultura anual.
Capítulo 22
Fundamentos técnicos para implantação de sistemas de integração 351
lavoura-pecuária-floresta com eucalipto
Com a marcação das linhas, o preparo do solo com grades intermediárias e grades
niveladoras fica restrito às entrelinhas do eucalipto (Figura 2 e 3). Recomenda-se que
a marcação das linhas de árvores seja realizada com estacas para orientar o operador
de máquinas no momento do preparo do solo e plantio (Figura 4). Além deste modelo
sugerido, existem outras possibilidades tais como o plantio das mudas de eucalipto
antes do preparo do solo para o plantio da cultura anual. Na segunda safra da cultura
anual de verão, bem como nos futuros plantios de grãos, é recomendado, sempre
que possível, o sistema de plantio direto na palha da cultura de cobertura. Uma outra
alternativa seria o plantio direto da cultura de verão já no primeiro ano de abertura do
plantio, com a recuperação em primeiro momento do pasto degradado e plantio direto
sobre a palhada (Figura 5). O plantio direto (Figura 6) apresenta diversas vantagens como
maior conservação do solo, melhorando as propriedades físicas, químicas e biológicas,
favorecendo inclusive a fixação de carbono. Fotos: Ademar P. Serra
A B
Figura 5. (A) Recuperação de pasto degradado em solo arenoso e (B) Plantio direto de soja sob a palhada de
Brachiaria ruziziensis.
352 Foto: Ademar P. Serra
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A competição com plantas invasoras pode causar atraso no crescimento das árvores, dessa
forma, o manejo de plantas daninhas precisa ser planejado com antecedência. Na área de
implantação do sistema é necessário realizar uma avaliação de plantas daninhas para que
se definam os herbicidas que deverão ser utilizados, bem como seja feita a programação
das aplicações dos mesmos.
Figura 7. Efeito da aplicação do herbicida Glifosato em soja transgênica e faixas para plantio de eucalipto,
aplicado 20 dias antes do plantio das mudas.
Capítulo 22
Fundamentos técnicos para implantação de sistemas de integração 353
lavoura-pecuária-floresta com eucalipto
Esse modelo de implantação tem como principal vantagem o estabelecimento das mudas
de eucalipto no período da seca, para que ocorra um melhor aproveitamento de água
e nutrientes no período das águas. Isso levará também a uma menor competição das
árvores com as plantas daninhas, graças ao crescimento mais acelerado do eucalipto no
período chuvoso. Entretanto, esse sistema apresenta um custo maior de implantação
devido à necessidade de irrigação e utilização de gel para reter a umidade junto às mudas
de árvores no momento do plantio.
Figura 9. Preparo do sulco com adubação fosfatada e de plantio para o eucalipto em linha simples.
Aproximadamente aos 90 dias e aos 12 meses após o plantio das mudas, são realizadas
a primeira e segunda adubação de cobertura, respectivamente, para completar o
suprimento de nutrientes, especialmente de nitrogênio, potássio e micronutrientes.
No momento do plantio, se não houver logo imediatamente uma boa chuva (mais de 30
mm) ou se o solo não estiver com umidade acima da capacidade de campo, é aconselhável
que se faça uma irrigação das mudas ainda no dia do plantio, com aproximadamente 2
litros de água por muda, para que o “pegamento” seja satisfatório (Figura 11).
Além do combate a formigas e cupins na área total antes do plantio, é necessário que
se faça tratamento prévio das mudas com inseticida a base de Fipronil, minimizando as
perdas no início do desenvolvimento das mudas.
As disposições de árvores em fileiras simples, duplas ou triplas (Figura 14) são as mais
utilizadas, sendo possível, também, a utilização de um número maior de fileiras por
renque de árvores em função da finalidade principal do sistema.
Fotos: Ademar P. Serra
A B C
Figura 14. (A) fileira simples, (B) fileira dupla e (C) fileira tripla de árvores de eucalipto com três meses do plantio
em sistema de ILPF.
358 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Quando herbicidas não seletivos são utilizados, é necessário que se utilize mecanismos
para evitar a deriva dos mesmos. Além de se proteger as mudas, o uso do acessório
conhecido por chapéu de Napoleão na ponta da lança de pulverização costuma ser uma
boa opção para evitar-se a deriva. Há disponível no mercado o herbicidas pré-emergente
com princípio ativo Oxifluorfem, sendo esse seletivo para o eucalipto.
Em sistemas de ILPF, via de regra, as práticas para instalação da cultura anual, como época
de plantio, espaçamento, população de plantas, adubação e tratos culturais seguem as
recomendações técnicas para cada região.
A B
Figura 17. Cultura de soja em sistema de ILPF em implantação, com eucalipto recém plantado em fileira simples
e (B) Colheita da soja em sistema de ILPF em implantação com produtividade média de 49 sacos por hectare.
Fotos: Ademar P. Serra
A B
Figura 18. (A) Cultura da soja em sistema de ILPF segundo ano, com árvores de eucalipto com 12 meses e (B)
soja em estágio R8, com produtividade média de 61 sacos por hectare.
O milheto (Pennisetum glaucum) é uma das espécies vegetais mais utilizadas para
cobertura do solo na região do Cerrado (Figuras 19 e 20). Essa espécie é semeada no
outono, após a colheita da soja, ou no início da primavera, para formar palhada para a
próxima semeadura da soja.
Capítulo 22
Fundamentos técnicos para implantação de sistemas de integração 361
lavoura-pecuária-floresta com eucalipto
Além do milheto, há outras boas opções para cobertura do solo como Brachiaria sp., que
podem ser cultivadas isoladamente ou em consórcio com Crotalaria sp. ou feijão guandu
(Cajanus cajan) cuja cultivar atualmente mais indicada é a Mandarim (Figuras 21). Essas
espécies vêm proporcionando bom resultado na produção de palhada e permanência
desta sobre a superfície do solo.
Fotos: Davi J. Bungenstab
Figura 21. Feijão guandu (Cajanus cajan) para cobertura do solo em sistema de ILPF.
362 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 22. Brachiaria brizantha cv. Paiaguas semeada após a colheita da soja sem adubação de plantio.
Para o controle, no período de seca, podem ser utilizadas iscas granuladas formicidas,
havendo um bom resultado com esse tratamento de menor impacto ambiental. Porém,
esse manejo não é viável durante a estação chuvosa, quando é recomendável o uso de
inseticidas em pó, aplicados diretamente nos olheiros ativos dos formigueiros.
Controle de incêndios
É de extrema importância que sejam feitos aceiros margeando a área de implantação do
sistema de ILPF para evitar entrada de fogo na área (Figura 23), que pode causar grandes
prejuízos ao sistema.
Figura 23. Queimada por entrada de fogo acidental em sistema de ILPF com dois anos de implantação.
364 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Desramas e desbastes
A desrama, ou poda, que é a retirada dos galhos e ramos inferiores das árvores, precisa
ser realizada antes da entrada de animais no sistema, pois os mesmos podem danificar as
árvores e com isso prejudicar a qualidade da madeira.
Considerações finais
Os passos aqui apresentados proporcionam o direcionamento inicial para a implantação
de um sistema de ILPF com árvores de eucalipto. Boa parte das recomendações com
relação ao manejo, especialmente do componente arbóreo, valem também para
sistemas silvipastoris, onde não há o cultivo de grãos. Da mesma forma, muitas das
recomendações feitas para o eucalipto devem ser seguidas também quando se utiliza
outra espécie arbórea.
Capítulo 23
Manejo de Plantas Daninhas e
Forrageiras em Sistemas de Integração
Lavoura-Pecuária-Floresta
Alexandre Magno Brighenti Fausto de Souza Sobrinho
Marcelo Dias Muller Leonardo Henrique Ferreira Calsavara
Carlos Eugênio Martins Andréia Ferreira Machado
Wadson Sebastião Duarte da Rocha
Paulino José Melo Andrade
368 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
De acordo com o Portal da Integração Lavoura-Pecuária (2008), existem alguns objetivos
específicos contemplados no desenvolvimento da iLPF especialmente relacionados com
os aspectos de cultivo:
Vantagens da iLPF
A implantação de sistemas de iLPF possibilita ao agricultor alcançar rendimentos
satisfatórios de madeira e grãos, concomitantemente à recuperação ou renovação da
pastagem, de forma mais rápida e econômica. Além disso, as pastagens utilizam-se dos
nutrientes residuais da lavoura, com sistemas radiculares capazes de explorar maiores
profundidades e volumes de solo. Essa tecnologia também possibilita e favorece a
sucessão/rotação de culturas anuais e forrageiras, proporcionando os benefícios já
conhecidos e desejados.
As forrageiras tropicais não são intensamente atacadas por insetos e doenças comuns às
plantas cultivadas, quebrando o ciclo de vida dessas pragas. O uso da iLPF tem auxiliado
na superação desses problemas advindos da agricultura tradicional como insetos-pragas,
Capítulo 23
Manejo de Plantas Daninhas e Forrageiras em Sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta 369
doenças (Kluthcouski et al., 2000), nematóides (Vilela et al., 1999) e plantas daninhas
(Cobbuci et al., 2001). Esse fato possibilita a utilização de menores quantidades de produtos
fitossanitários (Oliveira et al., 2001), reduzindo enormemente os custos de produção.
A palha da braquiária tem contribuído para diminuição da intensidade de ataque de
doenças como o mofo-branco e podridões radiculares causadas por Rhizoctonia solani e
Fusarium solani f.sp. phaseoli na cultura do feijoeiro (Kluthcouski et al., 2000). Existe ainda
a opção em utilizar a gramínea forrageira como fonte de biomassa seca, ou palhada, para
cobertura do solo, imprescindível para a implantação da semeadura direta (Vilela et al.,
2003). A palhada sobre o solo exerce efeitos físico e químico sobre as plantas daninhas,
proporcionando redução considerável da emergência e do estabelecimento dessas
espécies, principalmente as infestantes de inverno (Cobbuci et al., 2001).
Ao se determinar a área a ser utilizada para implantação da espécie florestal e dos cultivos
anuais mais forrageiras, há necessidade prévia de combate às formigas cortadeiras, tanto
na área em questão quanto nas áreas adjacentes. Também, a correção da acidez e a
descompactação do solo devem ser realizadas previamente. De preferência, a aplicação do
calcário deve ser efetuada seis meses a um ano antes da implantação das culturas anuais.
As aplicações dos herbicidas são mais comumente realizadas por meio de pulverizadores
de barra tratorizados (Figura 2A) ou mesmo pulverizadores manuais utilizados em áreas
menores ou com acentuado declive (Figura 2B).
Fotos: Alexandre Magnos Brighenti
A B
Figura 2. Pulverizador de barra tratorizado (A) e pulverizador manual (B).
Capítulo 23
Manejo de Plantas Daninhas e Forrageiras em Sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta 371
Semeadura direta
No sistema de semeadura direta, faz-se a dessecação pré-semeadura, conforme as opções
de herbicidas descritas na Tabela 1.
A B
Figura 3. Matraca (A) e semeadora de plantio direto de uma linha de tração animal (B).
No caso do milho, uma das combinações mais utilizadas é a mistura de atrazine mais
nicosulfuron (Freitas et al., 2005; Jakelaitis et al., 2005, 2006). O herbicida atrazine tem
como função o controle das espécies daninhas de folhas largas e o nicosulfuron, aplicado
em subdose (4 g i.a. ha-1), se encarrega da supressão temporária das plantas de braquiária
(Figura 5A). No final, ao se colher o milho, há o restabelecimento da pastagem. Essa
supressão se faz importante pois, caso contrário, a braquiária pode interferir sobre o
crescimento e o desenvolvimento do milho e, consequentemente prejudicar a sua
produtividade (Figura 5C).
C D
Figura 5. Controle de plantas daninhas e supressão do crescimento da braquiária com a aplicação de atrazine
mais nicosulfuron na cultura do milho (A) e tepraloxydim na cultura do feijão (B) e as testemunhas sem aplicação
na cultura do milho (C) e do feijoeiro (D).
Outra cultura que vem sendo pesquisada nos sistemas de iLPF é o girassol. Ao se
utilizar genótipos convencionais, como por exemplo, o híbrido Aguará 4, a aplicação de
subdoses de herbicidas graminicidas, em pós-emergência, é vantajosa para o sucesso
do consórcio, evitando a competição da gramínea forrageira com a cultura. A aplicação
é feita normalmente no estádio fenológico V4-V6 do girassol e as plantas de braquiária
com 2 a 3 perfilhos, com altura média de 15 a 20 cm. Nesse caso, o fluazifop-p-butyl
(12,5 e 25,0 g i.a. ha-1) é um graminicida potencial na supressão da B. ruziziensis (Figuras
6 e 7, respectivamente) (Brighenti et al., 2011). Essa prática proporciona a redução
no crescimento inicial da espécie forrageira sem causar a morte das plantas e assim
permitindo a recuperação posterior da pastagem.
374 Fotos: Alexandre Magnos Brighenti
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A B
Figura 6. Supressão do crescimento da Brachiaria ruziziensis aos 14 DAA (dias após a aplicação do herbicida) (A)
e recuperação das plantas aos 48 DAA (B), em função da dose de 12,5 g i.a. ha-1 de fluazifop-p-butyl.
Fotos: Alexandre Magnos Brighenti
A B
Figura 7. Supressão do crescimento da Brachiaria ruziziensis aos 14 DAA (dias após a aplicação do herbicida) (A)
e recuperação das plantas aos 48 DAA (B), em função da dose de 25,0 g i.a. ha-1 de fluazifop-p-butyl.
As doses aplicadas deste herbicida são bastante seletivas para a cultura do girassol, cujas
plantas não apresentam nenhum sintoma de injúria.
Figura 9. Produtividade de grãos da cultura do milho (kg ha-1) em função da aplicação das doses do equivalente
ácido do herbicida glyphosate em dessecação pré-semeadura.
376 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 10. Produtividade de matéria fresca de plantas de milho (kg ha-1) em função da aplicação das doses do
equivalente ácido do herbicida glyphosate em dessecação pré-semeadura.
Figura 11. Produtividade de matéria fresca de plantas de grama Estrela-Africana aos 30 dias após a colheita do
milho em função da aplicação de doses do herbicida glyphosate.
Capítulo 23
Manejo de Plantas Daninhas e Forrageiras em Sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta 377
Considerações Finais
Atualmente, o manejo de plantas daninhas e forrageiras em sistemas consorciados
como os de iLPF é bastante complexo. Com a expansão desse sistema, caso não sejam
envidados esforços em se pesquisar formas mais adequadas de manejo correto de
espécies infestantes e forrageiras, corre-se o risco de haver prejuízos consideráveis ao
consórcio. A prática de aplicação de subdosagens de herbicidas é uma tecnologia viável
no sentido de retardar o crescimento da espécie forrageira, evitar a competição com a
cultura produtora de grãos e garantir a recuperação posterior da pastagem. Além do
que, novas espécies florestais, culturas anuais e forrageiras tem sido consideradas como
potenciais e com possibilidade de inserção nos diferentes sistemas de iLPF. Esse fato
estimula os pesquisadores em desenvolver práticas inovadoras no manejo de plantas
daninhas e forrageiras, que sejam de fácil adoção pelos produtores rurais e capazes de
manter a sustentabilidade, a continuidade e a expansão dessa tecnologia.
Referências:
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378 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 24
Forrageiras em sistemas de produção de
bovinos em integração
Roberto Giolo de Almeida
Rodrigo Amorim Barbosa
Ademir Hugo Zimmer
Armindo Neivo Kichel (in memoriam)
380 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A ILP, com uso de lavouras para renovação e/ou recuperação de pastagens, é uma tecnologia
bem estabelecida (Kluthcouski et al., 2003), entretanto, o uso do componente florestal em
sistemas pecuários ainda não é expressivo. Apesar de vários estudos mostrarem os benefícios
da inclusão de árvores em pastagens, como melhoria nas características microclimáticas, na
qualidade do solo, no bem-estar animal, na qualidade da forragem e na mitigação de gases
de efeito estufa, além da melhoria na beleza cênica da paisagem, ainda são limitadas as
informações sobre o manejo das forrageiras em sistemas de ILPF.
Por isso, neste capítulo, serão abordadas algumas alternativas de uso de forrageiras em
sistemas de integração.
ano do plantio das árvores tende a ser mais efetivo do que em sistemas com árvores já
desenvolvidas e com maior sombreamento.
O manejo de forrageiras em ILPF deve ser mais criterioso, ou seja, deve-se evitar a todo custo
manter a altura de pastejo abaixo do recomendado para a forrageira em questão, para permitir
maior acúmulo de reservas e favorecer a rebrotação.
Quanto às forrageiras leguminosas, de modo geral, elas tendem a ser menos tolerantes
ao sombreamento do que as gramíneas. Essas espécies têm baixa persistência em
períodos de sombreamento maiores que dois anos. Dentre as medianamente tolerantes
encontram-se: calopogônio (Calopogonium mucunoides), centrosema (Centrosema
pubescens) e puerária ou kudzu-tropical (Pueraria phaseoloides). O amendoim forrageiro
(Arachis pintoi) é considerado como tolerante ao sombreamento, entretanto, apresenta
lento processo de estabelecimento, enquanto os estilosantes (Stylosanthes sp.) e o siratro
(Macroptilium atropurpureum) são considerados de baixa tolerância ao sombreamento.
Portanto, recomenda-se que as leguminosas sejam utilizadas na fase inicial do sistema
de ILPF, mesmo que em monocultivo, visando melhoria da fertilidade do solo, ou em
consórcio com gramíneas, visando a melhoria na qualidade da dieta do rebanho.
O uso de forrageiras anuais como o milheto e o sorgo de corte e pastejo também é comum
na recuperação de pastagens degradadas. Essas forrageiras anuais podem ser semeadas
em monocultivo ou em consórcio com gramíneas forrageiras perenes, geralmente, as dos
gêneros Panicum e Brachiaria, tanto no verão como em semeaduras tardias (safrinha).
As forrageiras anuais possibilitam a disponibilidade de pasto em 30 a 60 dias antes das
gramíneas forrageiras perenes e maior produtividade de carne durante o ciclo da cultura,
podendo-se amortizar parcialmente os custos variáveis da recuperação, porém, em menor
proporção do que com as lavouras de grãos.
Na década de 1990, foi desenvolvida a tecnologia denominada “Sistema Santa Fé” com
uso de gramíneas forrageiras tropicais em consórcio com culturas anuais, em sistema
de plantio direto ou convencional. Essa tecnologia foi desenvolvida com o objetivo de
produzir forragem na entressafra e/ou palhada para o sistema plantio direto no ano agrícola
subsequente. Entretanto, a mesma pode ser utilizada também na recuperação/renovação de
pastagens. Tais sistemas são mais intensivos e especializados, tendo usualmente, a lavoura
como objetivo principal, e demandando também forrageiras mais produtivas, como as do
gênero Panicum. Todavia, gramíneas desse gênero são mais suscetíveis a erros de manejo.
Por isso, geralmente, os produtores preferem forrageiras do gênero Brachiaria, devido à
sua maior facilidade de manejo, tais como: limites mais amplos de altura de pastejo, maior
capacidade de rebrotação e de cobertura do solo, além de menor formação de touceiras e
maior facilidade de dessecação. Para manter o sistema em condições ótimas, é importante
utilizar taxas de semeadura mais elevadas e combinações de alta intensidade e frequência
de pastejo, visando aumentar a densidade populacional de perfilhos, modificando a
estrutura das touceiras e favorecendo uma maior cobertura do solo.
Estudos realizados na Embrapa Gado de Corte, com várias gramíneas forrageiras perenes em
consórcio com as culturas do milho e do sorgo, implantadas na safra e na safrinha para produção
de grãos, têm demonstrado que os capins Piatã e Massai apresentam menor competição com
estas culturas, enquanto o capim-mombaça apresenta maior competitividade, necessitando
do uso de herbicidas em subdosagem (Kichel et al., 2009). Estes consórcios também podem
ser utilizados para produção de silagem, principalmente na safra, entretanto, nestas condições,
como o corte é antecipado e mais drástico, o período para restabelecimento do capim para
pastejo é maior do que após a colheita dos grãos da cultura. Estratégias de colheita da
forragem em maior altura, bem como o uso de maiores doses de adubação, devido à maior
extração de nutrientes para silagem, são fundamentais para um melhor estabelecimento da
forrageira em sequência.
De acordo com Macedo (2009), sistemas de ILP que utilizam ciclos de três anos de
pastagem seguidos de um ano de lavoura ou de quatro anos de pastagem seguidos de
quatro anos de lavoura, apresentam maior produção animal, com o adicional da produção
de grãos, além dos efeitos positivos na qualidade do solo, demonstrando maior eficiência
econômica do que sistemas pecuários extensivos ou que fazem uso de adubação de
manutenção e/ou de leguminosas.
Para regiões com solos arenosos e distribuição irregular das chuvas, foi desenvolvida a
tecnologia denominada “Sistema São Mateus”, que visa a recuperação da pastagem para
permitir condições adequadas de plantio direto para a introdução de lavouras em rotação
com a pastagem (Salton et al., 2013).
A orientação das fileiras de árvores deve seguir o nível do terreno, para favorecer a
conservação do solo e da água e, no caso de terrenos com terraceamento, as fileiras de
árvores devem ser implantadas no terço inferior dos terraços. Entretanto, em terrenos
planos a suavemente ondulados, a orientação das fileiras de árvores deve seguir o
sentido Leste-Oeste, que permite maior incidência luminosa no sub-bosque. No caso da
necessidade de orientação das fileiras de árvores no sentido Norte-Sul, recomendam-se
espaçamentos mais amplos entre fileiras de árvores.
Durante o primeiro ano do estabelecimento das árvores, deve-se deixar uma faixa sem
vegetação, de um metro para cada lado da fileira de árvores, por meio de capina manual,
mecânica ou química. Na execução dessas ações, deve-se ter cuidado com a proteção das
árvores, para evitar injúrias. Na fase inicial de desenvolvimento, o efeito das árvores sobre
as culturas e forrageiras é pequeno.
A escolha de plantas forrageiras para uso nestes sistemas está focada na sua capacidade
de adaptação às condições de sombreamento que podem modificar sua morfofisiologia.
A baixa luminosidade promove alterações morfológicas no dossel forrageiro que
permitem aumentar a interceptação de luz com menor índice de área foliar (IAF), por meio
do aumento da área foliar específica (Paciullo et al., 2007).
Ao obsevar os valores relativos de produção animal por área, percebe-se que com o
passar do tempo, ocorre uma diminuição na produção nos sistemas de ILPF, em relação
ao sistema de ILP, devido ao aumento do sombreamento imposto pelo crescimento das
árvores. No sistema ILPF1, a queda foi de 89% para 61% e, no sistema ILPF2, com maior
densidade de árvores, de 85% para 31%.
Tabela 1. Ganho médio diário (GMD), ganho de peso vivo por áera (GPV) e taxa de lotação
(TL) com recria de fêmeas Nelore em três sistemas de integração, Campo Grande, MS.
Sistema GMD (g/ha) GPV (kg/ha) TL (UA/ha)
novembro/2010 a maio/2011 (3º ano -a)
ILP (5 árvores/ha) 493 132 (100) 1,7
ILPF 22x2m (227 árvores/ha) 449 118 (89) 1,8
ILPF 14x2m (357 árvores/ha) 406 112 (85) 1,8
junho/2011 a julho/2012 (4º ano - b)
ILP (5 árvores/ha) 385 537 (100) 1,5
ILPF 22x2m (227 árvores/ha) 367 459 (85) 1,3
ILPF 14x2m (357 árvores/ha) 385 334 (62) 1,0
dezembro/2013 a agosto /2014 (5º ano - c)
ILP (5 árvores/ha) 521 266 (100) 1,5
ILPF 22x2m (227 árvores/ha) 568 231 (87) 1,3
ILPF 14x2m (357 árvores/ha) 585 168 (63) 1,0
setembro/2014 a fevereiro/2015 (6º ano - d)
ILP (5 árvores/ha) 375 445 (100) 2,7
ILPF 22x2m (227 árvores/ha) 388 370 (83) 2,2
ILPF 14x2m (357 árvores/ha) 442 240 (54) 1,3
maio/2015 a abril/2016 (7º ano - e)
ILP (5 árvores/ha) 412 376 (100) 1,9
ILPF 22x2m (227 árvores/ha) 510 228 (61) 1,1
ILPF 14x2m (357 árvores/ha) 541 118 (31) 0,7
Fonte: Adaptado de Oliveira et al. (2012a; 2014b)... (2018c)... (2017d)... (2018e), Barros (2018), Gamarra (2017) e
Pereira (2017).
386 Fotos: Davi J. Bungenstab
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 1. Experimento de sistema de ILPF com pastagem de capim-piatã com duas alturas de pastejo, eucalipto
em linhas simples com espaçamentos de 14 e 22 metros entre linhas.
Considerações finais
As principais forrageiras cultivadas no Brasil podem ser utilizadas em sistemas de ILPF,
embora não tenham sido selecionadas para esta finalidade específica. Além disso, os
fundamentos do comportamento de forrageiras sob condições de sombreamento
são bem conhecidos, mas estudos de longa duração sobre as interações com outros
componentes em sistemas de ILPF são ainda limitados.
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Capítulo 24
Forrageiras em sistemas de produção de bovinos em integração 387
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 25
Manejo de pastagens tropicais em
sistemas silvipastoris
Domingos Sávio Campos Paciullo
Carlos Augusto de Miranda Gomide
390 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
O Brasil possui condições privilegiadas para a produção animal a pasto, tendo em vista
fatores como alto potencial de produção e grande diversidade de espécies forrageiras,
extensa área territorial com possibilidade de uso para agropecuária e clima relativamente
favorável em boa parte do ano, na maioria das regiões do país. A despeito do progressivo
aumento dos níveis de produtividade de sistemas de produção de bovinos, em algumas
regiões do país, nota-se, ainda hoje, baixa eficiência produtiva de animais em regime de
pastejo. Diferentes fatores concorrem para este panorama, entre eles a degradação das
pastagens, resultado de práticas de manejo inadequadas, o baixo potencial genético dos
animais e o baixo nível de adoção de tecnologias comprovadamente eficazes, as quais
poderiam elevar os índices de produtividade dos sistemas pecuários.
Em SSP devemos considerar que a radiação disponível para o pasto diminui com o passar
dos anos. Neste sentido, é necessário associar, no momento da escolha da espécie, as
características de bons potenciais produtivo e qualitativo à tolerância da forrageira ao
sombreamento. Dentre as espécies de gramíneas que possuem tolerância mediana ao
sombreamento estão algumas das forrageiras mais utilizadas para formação de pastagem
no Brasil e em outras regiões tropicais e subtropicais, como Brachiaria spp. e Panicum
maximum. Gramíneas tais como B. decumbens cv. Basilisk, B. brizantha cvs. Marandu,
Xaraés e Piatã, B. ruziziensis, P. maximum cvs. Tanzânia, Massai e Vencedor apresentaram
relativa tolerância ao sombreamento moderado, sendo potencialmente adequadas para
SSP (Soares et al., 2009; Paciullo et al., 2011c; Santos et al., 2012).
Método de pastejo
Quanto ao método de pastejo, se destacam dois mais importantes: lotação contínua e
lotação rotacionada. No método de lotação contínua os animais permanecem por longos
períodos na mesma unidade de manejo, enquanto que na lotação rotacionada os animais
são periodicamente trocados de piquetes, permanecendo no mesmo piquete por um
período de tempo que varia, normalmente, entre um e sete dias. Embora o manejo de lotação
rotacionada não deva ser visto como sinônimo de intensificação do uso de pastagens, esse
método permite o controle direto dos intervalos entre desfolhas da forrageira. Aqui vale
ressaltar que a potencialização da produção forrageira nem sempre representa a melhor
estratégia sob pastejo. Assim, o prolongamento do período de descanso em gramíneas
tropicais, com alta taxa de acúmulo de forragem, traz sérios prejuízos para a estrutura do
dossel e para a eficiência de uso do pasto. Também a interrupção precoce da rebrotação, ou
seja, o uso de períodos de descanso ou intervalos de desfolhas muito curtos, compromete a
produção de forragem, pois não permite que as altas taxas de crescimento se traduzam em
acúmulo de forragem, além de contribuir para o esgotamento das plantas e representar um
risco potencial para persistência do pasto. Por isso, o uso do pasto no momento correto é
ponto fundamental para garantir adequada estrutura para o pastejo, com claras vantagens
em termos de produção por área.
Pandey et al. (2011) relataram respostas positivas de três gramíneas forrageiras (P. maximum,
Pennisetum purpureum e Brachiaria mutica) ao fertilizante nitrogenado aplicado até a dose
de 120 kgN /ha/ano. Entretanto, foi constatado que a eficiência de resposta ao N aplicado foi
inversamente proporcional à percentagem de sombreamento imposta ao pasto.
Para B. decumbens também foi verificada maior resposta à adubação (90 kg/ha de N e
K2O por ano) em condições de radiação plena, quando comparada às condições de
sombra (Paciullo et al., 2012). Na ausência de adubação, a taxa de acúmulo nas condições
de sol pleno e sombreamento moderado foram semelhantes, mas quando se efetuou a
396 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
fertilização, o acúmulo obtido no sol pleno foi maior que aquele em sombra moderada
(Tabela 2). No sombreamento intenso (redução de 70% em relação à radiação plena)
não houve resposta ao adubo em termos de acúmulo de forragem. Concluiu-se que a
intensidade de resposta da gramínea ao fertilizante depende do grau de sombreamento
no sistema silvipastoril.
Figura 2. Valores de ganho de peso corporal de novilhas leiteiras (kg/ha), durante as épocas chuvosas (novembro
a março) de sete anos experimentais, em pastagens de B. decumbens em monocultivo (BRA) ou em sistema
silvipastoril (SSP).
O critério do número fixo de dias para definição do intervalo de desfolha tem sido
contestado, embora seja o mais fácil do ponto de vista prático. Em função das condições
398 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O critério do número de folhas vivas por perfilho, avaliado por alguns autores (Gomide,
2001; Candido et al., 2005), poderia se revestir de importância para orientação do manejo
de pastagens em SSP. Sabe-se que a taxa de aparecimento de folhas e sua vida útil se
modificam muito pouco com o sombreamento, desde que esse seja moderado (Paciullo et
al., 2008; Lopes et al., 2011). Como resultado, temos relvados com número mais ou menos
constante de folhas vivas, independentemente da gramínea estar ou não em sistema
silvipastoril. Enfatiza-se que essas condições são esperadas para pastos cultivados em
ambientes com reduções apenas moderada da radiação fotossinteticamente ativa. Essa
redução pode ser caracterizada por uma diminuição da ordem de 25 a 35% da RFA plena,
ou seja, o pasto deverá receber pelo menos entre 65 e 75% da RFA plena. Com as taxas
de alongamento de colmo estimuladas pela diminuição da RFA, no sub-bosque, tem-se
que relvados sombreados alcançam maiores alturas que aqueles a sol pleno, mantendo o
mesmo número de folhas vivas por perfilho. Este fato resulta em maior distanciamento dos
pontos de inserção das folhas no colmo (internódios mais longos) e menor densidade de
forragem. Da mesma forma, as maiores taxas de alongamento de folhas e o período mais
ou menos constante de alongamento de folhas produzem lâminas foliares mais longas,
embora de menor espessura. Portanto, condições de menor RFA incidente favorecem a
produção de relvados com plantas mais altas, com folhas mais longas e mais espaçadas
no perfilho e colmos mais finos, o que pode acarretar tombamento excessivo das plantas
pelo pisoteio, levando à redução da eficiência de pastejo.
Por exemplo, um relvado de B. decumbens pode manter cinco folhas vivas por perfilho com
altura média de 25-30 cm, no sol pleno (Paciullo et al., 2008), enquanto que em condições de
sombreamento a mesma gramínea manteria cinco folhas vivas por perfilho com altura que
poderia alcançar 50 cm ou até mais, dependendo do grau de redução da RFA.
Em ambientes onde o pasto está submetido a uma baixa RFA incidente, normalmente
menor que 65% da RFA plena, por influência das árvores, uma questão deve ser
considerada: a forte redução na densidade populacional de perfilhos. Neste caso, muitos
relvados cultivados à sombra poderão não alcançar o nível de interceptação de 95%
da radiação incidente, mesmo com períodos longos de rebrotação. Por outro lado, em
condições menos drásticas de sombreamento, pode ser possível o alcance de 95% de
interceptação luminosa, ainda que haja uma redução na população de perfilhos e na
densidade de forragem do pasto. Uma alternativa seria a avaliação de percentuais de
interceptação menores que 95%, mesmo reconhecendo-se que esse seria o ideal para a
maioria das gramíneas manejadas em monocultivo.
Portanto, o uso das alturas já pré-definidas para forrageiras cultivadas a sol pleno parece
não ser a estratégia ideal para relvados mantidos à sombra, tendo em vista as modificações
morfofisiológicas resultantes do sombreamento, discutidas em tópicos anteriores
deste trabalho. Observações práticas, em ambientes silvipastoris, têm sugerido que as
alturas mais adequadas de entrada e saída dos animais do piquete parecem estar acima
daquelas recomendadas para pastos em monocultivo. É importante lembrar que pastos
sombreados frequentemente apresentam menores teores de compostos de reserva na
base da planta, menores índices de área foliar e meristemas apicais mais susceptíveis à
remoção pelo pastejo, tendo em vista a maior altura das plantas. Por isso, pastejos severos
e frequentes devem ser evitados, pois podem comprometer a persistência do pasto.
entre 500 e 600 g/novilha/dia, durante a época chuvosa e entre 200 e 300 g/novilha/dia,
durante a época seca do ano, totalizando ganhos médios de 300 kg/ha/ano (Paciullo et
al., 2009, 2011a). As produções de leite no SSP variaram entre 10,5 e 12,4 kg/vaca/dia, sem
suplementação concentrada (Paciullo et al., 2014).
Além do arranjo espacial, outro aspecto importante se refere ao manejo destas árvores
depois de estabelecidas. Considerando-se que o crescimento das árvores promove uma
dinâmica temporal no sombreamento imposto ao sub-bosque, é possível inferir que o
limite máximo de sombreamento tolerável pela gramínea será ultrapassado em algum
momento, dependendo da densidade de plantio e do arranjo espacial adotado. De forma
geral, em espaçamentos mais amplos há maior incidência de luminosidade no sob-
bosque. Além disso, a idade altera o padrão de distribuição da luminosidade para o sub-
bosque, apesar de se manter a tendência de maior luminosidade para o sub-bosque nos
espaçamentos mais amplos.
Sendo assim, tendo em vista o caráter de longo prazo desse tipo de sistema, enfatiza-se
que é imperativo o controle do sombreamento. Este controle se dá basicamente por meio
de dois tipos de manejo: a desrama e o desbaste. A desrama artificial consiste na remoção
de galhos vivos da árvore com o objetivo de aumentar a qualidade do produto final,
obtendo-se madeira limpa e sem defeitos. A desrama ainda tem a finalidade de favorecer
o crescimento e as características dendrométricas das árvores, bem como, aumentar a
luminosidade nas entrelinhas de árvores, favorecendo o crescimento do pasto. Neste
sentido, estima-se que a desrama pode proporcionar um aumento entre 30 e 40% de
luminosidade para o sub-bosque.
Capítulo 25
Manejo de pastagens tropicais em sistemas silvipastoris 401
O desbaste, por sua vez, consiste na remoção de árvores selecionadas dentro do sistema.
Esta técnica é empregada na silvicultura tradicional, com o objetivo de melhorar as
características físicas e de forma das árvores de melhor qualidade para produção de
madeira de alto valor agregado. Mas além do objetivo meramente silvicultural, há o
benefício associado que é o aumento de luminosidade incidente no sub-bosque.
Considerações finais
Os sistemas silvipastoris são dinâmicos e apresentam uma séria de interações complexas
entre o pasto, o animal e a árvore. O manejo da pastagem neste tipo de sistema requer
conhecimentos específicos sobre os efeitos das árvores no pasto, especialmente quando
se considera a competição por radiação fotossinteticamente ativa entre as árvores e o
pasto. As espécies forrageiras devem apresentar bom potencial produtivo e relativa
tolerância ao sombreamento. Sabe-se que algumas espécies de gramíneas são adequadas
para sistemas silvipastoris, com destaque para as do gênero Brachiaria spp. No manejo,
deve ser preconizado o pastejo de lotação rotacionada, pelas vantagens de uniformização
e possibilidade de maior intensificação. Deve-se buscar boa produtividade animal, mas
nunca se esquecer da persistência do pasto, o que está relacionado à adequada reposição
de fertilizantes ao solo, ao uso de pressão de pastejo adequada à capacidade de suporte
do pasto e aos aspectos do manejo do pastejo, especificamente relacionados com a
frequência e intensidade do mesmo.
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Capítulo 25
Manejo de pastagens tropicais em sistemas silvipastoris 403
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Capítulo 26
Manejo de pastagens subtropicais e
temperadas para a integração floresta-
pecuária
Alexandre Costa Varella João Carlos De Saibro
Raquel Santiago Barro Melissa Batista Maia
Laíse da Silveira Pontes
Jamir Luís Silva Da Silva
Vanderley Porfirio-da-Silva
406 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
O sul do Brasil é uma das regiões de maior potencial para a exploração de sistemas
de integração floresta-pecuária (IPF). A atividade pecuária nesta região conta com
aproximadamente 27,63 milhões de bovinos e 5,19 milhões de ovinos (IBGE, 2006). Grande
parte deste rebanho é criado em pastagens nativas, melhoradas e cultivadas, totalizando
aproximadamente 15,68 milhões de hectares na região sul (IBGE, 2006), raramente
arborizadas, e onde se encontram as maiores oportunidades para os sistemas IPF.
Esta “zona fria” do Brasil está situada na região do extremo sul do País, entre os paralelos
24º S e 33º S, compreendendo os Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e
região centro-sul do Estado do Paraná, ocupando uma área total de aproximadamente
512.004 km2. O clima é classificado como subtropical frio com ocorrência de geadas no
inverno e verões quentes, porém apresentando microrregiões de elevada altitude onde o
clima é tipicamente temperado. As temperaturas médias anuais variam de 12 a 20 ºC com
as estações bem definidas e as precipitações médias anuais variam de 1250 a 2000 mm
bem distribuídas durante o ano. Nesta região, cultivam-se espécies agrícolas, forrageiras e
florestais de clima temperado e tropical. Contudo, a adaptação às geadas é um dos fatores
mais importantes na escolha de espécies forrageiras e arbóreas para os sistemas IPF. Além
disso, como o clima varia em cada estação anualmente, conhecimentos específicos sobre
o estabelecimento e manejo da pastagem são exigidos dos técnicos e produtores para o
sucesso de empreendimentos de IPF.
Assim, para o sucesso de um sistema IPF, boas práticas de manejo são fundamentais,
buscando equilibrar a exploração dos recursos disponíveis entre seus componentes, tais
como: (i) escolha de espécies forrageiras adaptadas ao sombreamento; (ii) adequado
estabelecimento da pastagem e das árvores; (iii) correto manejo da pastagem e do pastejo
ao longo do tempo e (iv) manejo da copa das árvores (ambiente luminoso) ao longo
do ciclo produtivo. O manejo da pastagem, particularmente, em regiões temperadas e
subtropicais frias, onde o ângulo de inclinação solar e o fotoperíodo são menores durante
a estação fria, produzindo alterações específicas nos padrões de incidência da radiação
solar, combinadas à ocorrência de geadas e ou estiagem, é determinante para o sucesso
de um sistema IPF.
Por outro lado, os processos fisiológicos mais importantes das plantas, e que são
influenciados pela disponibilidade de radiação e/ou água no solo, são a fotossíntese e a
respiração foliar. O balanço líquido de carbono resultante destes processos fisiológicos
determinará o crescimento individual de plantas forrageiras, sua capacidade de rebrote,
persistência e, conjuntamente, a produtividade da pastagem no sistema IPF. Assim,
o conhecimento dos fundamentos fisiológicos de forrageiras submetidas ao estresse
luminoso e/ou hídrico, aplicados ao manejo de pastagens, é determinante do sucesso de
um sistema IPF.
408 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 1. Curva da resposta fotossintética média de espécies forrageiras tropicais (C4) e temperadas (C3) em
função da irradiação.
Fonte: Adaptado de Gardner et al. (1985).
Tabela 1. Tempo necessário de sol para folhas de Dactylis glomerata atingir fotossíntese
máxima após diferentes tempos de exposição ao sombreamento. Os números em
vermelho representam % da fotossíntese máxima alcançada.
Tempo de exposição à sombra Tempo de exposição ao pleno sol após sombreamento (minutos)
(minutos) 1 2 10
30 84 86 94
60 67 79 89
180 55 67 75
Nível de significância (p<0,001) - - -
Erro padrão das medidas 1,5 1,6 1,3
capacidade em alterar suas características foliares (e.g. ângulo foliar, área foliar específica) de
parte aérea (e.g. comprimento de entrenós) ou de estrutura da população (e.g. densidade
de plantas), para lidar com a heterogeneidade do ambiente luminoso em sistemas IPF.
Portanto, o desempenho destas espécies também dependerá da habilidade delas em
tolerar ou superar a barreira imposta pelo sombreamento (Figura 2).
A percepção da baixa razão V/VD pelas espécies com estratégias de escape ao sombreamento
desencadeia uma série de respostas, conhecidas como “síndrome de escape ao
sombreamento” (SAS ou ‘shade avoidance syndrome’), conforme reportam Smith e Whitelam
(1997). De acordo com Gommers et al. (2013), espécies intolerantes ao sombreamento
exibem esta síndrome através de mudanças nas suas características morfogenéticas, as
quais permitem o posicionamento das folhas nas camadas superiores do dossel forrageiro.
A principal mudança é uma forte alocação de carbono para o alongamento do colmo, de
modo a escapar da condição de sombreamento. Para exemplificar, Paciullo et al. (2011)
observaram um forte estiolamento de plantas de Brachiaria decumbens e B. ruziziensis
sob condições de estresse luminoso. Além disso, tal mudança ocorre em detrimento do
desenvolvimento de novos perfilhos e, por consequência, de raízes e de folhas, afetando
negativamente a produtividade das espécies forrageiras (Soares et al., 2009).
412 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 3. Diferentes estratégias para lidar com o sombreamento: estratégia de escape, comum em consórcios
entre espécies herbáceas e tolerância à sombra (e.g. foto à esquerda de Márcia Silveira e à direita de Laíse da S.
Pontes).
Fonte: Adaptado de Gommers et al. (2013).
pastagem após um pastejo, por exemplo. Contudo, a alta AFE pode ter consequências
negativas para plantas crescendo em condições de radiação reduzida, pois uma grande
quantia de área foliar (principal área fotossintética) é produzida com baixo custo, tornando
estas folhas mais sensíveis à desfolha pelos herbívoros em razão do maior valor nutritivo.
Portanto, a prioridade de algumas espécies tolerantes ao sombreamento pode não ser a
maximização do crescimento em condições de baixa luminosidade, mas sim de investir
em tecidos que promovam mecanismos de defesa pela planta (e.g. aumento no conteúdo
de parede celular), como observado com a alfafa (Medicago sativa) e reportado por Lin et
al. (2001), reduzindo a qualidade (Varella et al., 2001) e a probabilidade de desfolha, ou em
estoques de reserva.
Tais estudos apontam a necessidade de uma utilização menos intensiva dos recursos
ambientais relacionados ao componente arbóreo e ao manejo do componente animal,
particularmente, a intensidade de pastejo, para conciliar maior produtividade total com o
cuidado ambiental.
Por estas razões, além da produtividade individual dos componentes é necessário estudar
a dinâmica dos processos químicos, físicos e biológicos do sistema e considerá-los sempre
com uma visão sistêmica. Além disso, o entendimento dos processos predominantes nos
sistemas agropecuários integrados permite a obtenção de sistemas IPF sustentáveis ao
longo do tempo e com maior produtividade total. Isto está relacionado diretamente à
escolha das espécies componentes do sistema (e também de sua gerência pelo manejo).
Portanto, há que se utilizar genótipos forrageiros adaptados às condições edafo-climáticas
locais e ao sombreamento moderado.
Nas regiões com déficit hídrico, a produção de forragem sob sombra pode inclusive ser
maior do que a pleno sol. Neste caso, a magnitude das respostas da pastagem à luz solar,
em função da densidade arbórea ou do sombreamento, pode ser influenciada pela maior
disponibilidade de água no solo (Ludwig et al., 2001; Barro et al., 2010). A Tabela 2 resume
os principais resultados de pesquisa obtidos com estes grupos metabólicos forrageiros na
Região Subtropical do Brasil e que podem orientar a escolha de espécies forrageiros para
um sistema IPF:
416
Tabela 2. Sumário dos resultados obtidos com plantas forrageiras na região do subtrópico brasileiro.
Melhora/
Níveis de Sombra Rendimentos
Rota Estação de piora do valor Autores
Característica Espécie sombra natural / relativos
metabólica crescimento nutritivo com (referências)
estudados artificial (ao pleno sol)
sombreamento
24 e 56% Natural 52 e 50% n.a. Barro et al. 2008 b
Axonopus catharinensis 17 e 33% Natural 79 e 47% melhora Soares et al., 2009
40 a 50%* Natural 74% n.a. Pontes et al., 2012
40 a 50%* Natural 25,50% n.a. Pontes et al.,2012
Cynodon sp. (cv.Tifton 85) 24 e 56% Natural 61 e 51% n.a. Barro et al, 2008 b
17 e 33% Natural 48 e 24% melhora Soares et al., 2009
melhora ou não
17 e 33% Natural 86 e 36% Soares et al., 2009
Brachiaria brizantha cv Marandu altera
40 a 50%* Natural 45% n.a. Pontes et al., 2012
Brachiaria decumbens cv. Basilisk 17 e 33% Natural 48 e 24% n.a. Soares et al., 2009
Brachiaria decumbens 25, 50 e 80% Artificial 85, 44 e 22,7% n.a. Schreiner, 1987
Digitaria decumbens 25, 50 e 80% Artificial 88, 60 e 25% n.a. Schreiner, 1987
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Perene C4 Verão
17 e 33% Natural 54 e 9% melhora Soares et al., 2009
Panicum maximum cv. Aruana
40 a 50%* Natural 57,20% n.a. Pontes et al., 2012
17 e 33% Natural 61 e 0% n.a. Soares et al., 2009
Panicum maximum cv. Tanzânia
n.a. Natural 25% n.a. Lucas, 2004
17 e 33% Natural 47 e 15% n.a. Soares et al., 2009
Panicum maximum cv. Mombaça
n.a. Natural 22% n.a. Lucas, 2004
17 e 33% Natural 87 e 26% n.a. Soares et al., 2009
Paspalum notatum cv. Pensacola Natural 54,10% n.a. Pontes et al., 2012
25, 50 e 80% Artificial 93, 5; 55 e 13% n.a. Schreiner, 1987
Paspalum notatum 50 e 80% Artificial 112 e 81,1% melhora Barro et al., 2012
Paspalum dilatatum 50 e 80% Artificial 117 e 81,8% melhora Barro et al., 2012
Paspalum regnelii 50 e 80% Artificial 118 e 99,8% melhora Barro et al., 2012
Continua...
Tabela 2. Continuação.
Melhora/
Níveis de Sombra Rendimentos
Rota Estação de piora do valor Autores
Característica Espécie sombra natural / relativos
metabólica crescimento nutritivo com (referências)
estudados artificial (ao pleno sol)
sombreamento
97,8; 70,12 e
Hemarthria altissima 25, 50 e 80% Artificial n.a. Schreiner, 1987
22,5%
17 e 33% Natural 66 e 5% n.a. Soares et al., 2009
Hemarthria altissima cv. Flórida 40 a 50%* Natural 7,10% n.a. Pontes et al., 2012
Perene C4 Verão
24 e 56% Natural 58 e 43% n.a. Barro et al., 2008 b
30 e 60% Natural 43 e 22% melhora Kirchner et al., 2010
Lolium multiflorum 24 e 56% Natural 46 e 36% melhora Barro et al.,2008
33 e 58% Artificial 87 e 84 n.a. Saibro, 1992*
30 e 60% Natural 38 e 13 % melhora Kirchner et al., 2010
Avena sativa melhora ou não
24 e 56% Natural 75 e 42% Barro et al., 2008
altera
30 e 60% Natural 43 e 8% piora Kirchner et al., 2010
Avena strigosa
24 e 56% Natural 75 e 42% Sem diferença Barro et al., 2008
Moraes et al, 2007;
Holcus lanatus 50 e 80% Artificial 234 e 223%* n.a.
Anual C3 Inverno Varella et al., 2008
Moraes et al, 2007;
Bromus auleticus 50 e 80% Artificial 737 e 605%* n.a.
Varella et al., 2008
Moraes et al, 2007;
Bromus catharticus 50 e 80% Artificial 205 e 159%* n.a.
Varella et al., 2008
Triticum aestivum-duplo proposito 30 e 60% Natural 46 e 25% piora Kirchner et al., 2010
Vicia villosa 30 e 60% Natural 48 e 27% Sem diferença Kirchner et al., 2010
Arachis Pintoi
50 e 80% Artificial 93,5 e 60,2% piora Barro et al., 2013
(ecótipo híbrido AGK 12787 vs NC 1579)
Perene C3 Verão
Arachis pintoi cv. Alqueire 17 e 33% Natural 37 e 18% n.a. Soares et. al, 2009
Arachis pintoi cv. Amarillo 17 e 33% Artificial 59 e 23% n.a. Soares et. al, 2009
Manejo de pastagens subtropicais e temperadas para a integração floresta-pecuária
Capítulo 26
Trifolium repens cv. Zapicán 24 e 56% Natural 25,7 e 39,8% piora Saibro et al., 2008
Anual C3 Inverno
Lotus corniculatus cv. São Gabriel 24 e 56% Natural 27,4 e 25,2 piora Saibro et al., 2008
Uma das principais discussões científicas em relação ao valor nutritivo da forragem tem
sido a dinâmica do nitrogênio na planta sombreada, em comparação com o pleno sol.
Muitas hipóteses têm sido levantadas no sentido de explicar os efeitos positivos do
sombreamento sobre o conteúdo de nitrogênio em gramíneas. Em geral, o aumento de N
sob sombra é atribuído à maior mineralização da matéria orgânica, devido principalmente
às condições térmicas e ao status hídrico do solo que favorecem a ação de microrganismos
nitrificadores, além da redução na produção de biomassa em função do estresse luminoso,
fato que resultaria em maior concentração de N na planta (Wilson et al., 1990).
O estado da arte em pesquisa com sistemas IPF já apontam subsídios suficientes para
indicar as espécies forrageiras e seu potencial produtivo para diferentes intensidades de
sombreamento. Contudo, a integração em longo prazo, só é possível sob uma condição
moderada de sombreamento (>50%) e, se o manejo do pastoreio for conduzido de forma
equilibrada. Desta forma, o manejo sustentável dos componentes forrageiro, pecuário e
arbóreo, além de promover mais benefícios ambientais, oportunizam maior produtividade
total ao sistema integrado de produção.
maiores do que o consumo animal, tem-se a possibilidade de obter bom ganho médio
diário, atingindo possivelmente as características de carcaça desejáveis do ponto de
vista comercial.
Por outro lado, decisões de manejo da pastagem em sistemas IPF devem considerar o
comportamento fisiológico e morfogenético das forrageiras e suas respostas ao estresse
luminoso principalmente (Varella et al., 2012). Quanto mais intensas as interações entre
estresses de origens diferentes ocorrendo simultaneamente (e.g. falta de água, luz e
nutrientes), mais complexas se tornam as respostas das forrageiras e, consequentemente,
também as estratégias para interferir e potencializar a produção da pastagem nestes
sistemas. Assim, a quantidade e a velocidade de translocação das reservas resultantes da
fotossíntese, as alterações nas características morfo-fisiológicas das plantas, as modificações
na composição química (valor nutritivo) e na densidade de plantas forrageiras a sombra
influenciam diretamente as decisões de como melhor manejar a pastagem nos sistemas
IPF. Para garantir produtividade, qualidade e persistência, é importante reconhecer
que as forrageiras que crescem em um sistema IPF estão normalmente expostas a uma
condição restrita de radiação e, portanto, acumulam uma quantidade menor de reservas
(carbohidratos e nitrogênio) durante o seu período de crescimento. Por isso, o manejo da
pastagem deve ser quase sempre mais conservador nestes sistemas do que em pastagens
que crescem a pleno sol.
Estudos realizados no sul do Brasil já determinaram o manejo do pastejo que pode otimizar
o desempenho animal em sistemas de IPF. Por exemplo, Silva (1998) estudou o efeito de
três intensidades de pastejo (6%, 9% e 13,3% kg de massa seca/100 kg de PV/dia) e duas
densidades arbóreas de Eucalyptus saligna (1666 e 833 árvores/ha) sobre a produção de
novilhos (Figura 4) e da pastagem consorciada de azevém anual (Lolium multiflorum L.)
e trevo vesiculoso (Trifolium vesiculosum Savi) cv. Yuchi, sobressemeados em pastagem
420 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
nativa. Neste estudo, o ganho por animal foi ascendente com o acréscimo na oferta de
forragem, evidenciando possivelmente que a condição da pastagem esteve acima da
capacidade de ingestão dos animais. Já o ganho animal por área foi baixo nos níveis
menores de oferta de forragem, devido ao reduzido desempenho individual dos animais.
Também, com níveis de oferta de forragem acima de 12% do peso vivo, o ganho por
hectare foi reduzido, devido à baixa lotação animal utilizada nestas condições.
A B
Figura 4. Relação entre o ganho médio diário (—) e o ganho por área (-----) com a oferta de forragem na
densidade de 1.666 árvores/ha (A) e na densidade de 833 árvores/ha (B), em sistema silvipastoril com eucalipto
e pastagem constituída de azevém anual e trevo vesiculoso. EEA/UFRGS, Eldorado do Sul, RS
Fonte: Silva (1998).
A amplitude ótima de pastejo neste e em outros estudos tem sido reportada entre 9,5 e
12 % do peso vivo, nas condições ecoclimáticas do RS, em pastagens nativas e exóticas,
desenvolvidas a pleno sol (Moraes et al., 1995; Maraschin, 1998). Em sistemas IPF, estas
foram as primeiras informações obtidas no Brasil e evidenciaram que os níveis de oferta
de forragem que permitiram otimizar os ganhos por área e por animal, em pastagens
melhoradas sob árvores, estiveram entre 9 e 11,5% do peso vivo. Também Castilhos et al.
(2009), no norte do RS, observaram elevado desempenho de novilhos (ganho por cabeça
e por hectare) em pastagens de verão formadas com Panicum maximum cv. Gatton, cv.
Aruna ou Digitaria diversinervis, sob duas densidades arbóreas de acácia negra, aos 6 anos
de idade, manejando ofertas de forragem de 12 % do peso vivo.
(IL), índice de área foliar (IAF) e altura do dossel podem ser distintas daquelas obtidas
a pleno sol (Baldissera, 2014). Desta forma, para determinar uma estrutura de pasto
mais eficiente ao manejo com herbívoros em sistemas IPF, é preciso identificar como as
diferenças de natureza morfológica interagem, particularmente, nesses ambientes com
grande variabilidade microclimática. Assim, pesquisas ainda necessitam ser desenvolvidas
para determinar o nível de IL, sob diferentes níveis de sombra, que condiciona a melhor
estrutura de dossel (IAF ótimo, maior acúmulo de folhas, menores perdas por senescência
e maior armazenamento de reservas) na sombra.
Os modelos de IPF têm por objetivo melhorar a produção por unidade de área, respeitando
sempre os princípios do rendimento contínuo, da manutenção do potencial produtivo
dos recursos naturais renováveis e em benefício das condições sócio-econômicas dos
produtores. No entanto, dentro de uma visão sistêmica, os componentes pastagem e
animal demandam importante atenção nestes sistemas, pois o balanço entre benefícios e
prejuízos depende do conhecimento aplicado da adequada carga animal ou da intensidade
de pastejo relativo à capacidade de suporte das pastagens e do comportamento em
pastejo (Saibro, 2001).
Considerações finais
A partir dos conhecimentos adquiridos pela pesquisa científica e pela extensão rural ao
longo das últimas três décadas, e reportadas neste capítulo, torna-se possível listar um
conjunto de práticas básicas de manejo da pastagem e do pastejo em sistemas de IPF para
o clima subtropical e temperado do sul do Brasil, tais como:
(i) O momento inicial do pastejo deve ser realizado somente após o máximo acúmulo de
reservas nas plantas forrageiras. Isso geralmente acontece após o momento de máxima
expansão foliar por área de solo na pastagem, ou seja, após atingir o índice de área foliar
crítico (IAF crítico). Um bom indicativo para este o momento é quando as folhas mais
inferiores (ou perfilhos ou brotações) estiverem totalmente sombreadas pelas camadas
superiores da pastagem e começarem a apresentar os primeiros sinais de senescência
(amarelecimento dos tecidos foliares). Mesmo no sistema de pastejo contínuo em um
Capítulo 26
Manejo de pastagens subtropicais e temperadas para a integração floresta-pecuária 423
sistema IPF, este momento do pastejo deve ser aguardado para, então, usar-se carga
animal mais leve do que aquelas recomendadas para as pastagens à pleno sol, ou seja,
aplicando uma oferta de forragem de 10-12% do peso vivo;
(ii) O resíduo pós pastejo (altura do dossel forrageiro após a desfolha pelos animais) deve
ser mantido acima de 20 cm de altura para as espécies forrageiras de inverno e do campo
nativo melhorado, de forma a proteger os locais de armazenamento de reservas e permitir
uma área foliar fotossintética residual suficiente para uma boa velocidade do rebrote. Para
forrageiras tropicais, o critério de altura do pastejo deve ser observado individualmente,
já que há variação na localização das estruturas de armazenamento de reservas e das
gemas de crescimento, responsáveis pelo rebrote da pastagem. Assim, é fundamental
evitar condições de sobrepastejo (baixo resíduo pós pastejo) em sistemas IPF, situação
comumente observada em propriedades rurais, e que podem facilmente comprometer
o rebrote, crescimento e persistência de plantas forrageiras que crescem sob condições
restritivas de luminosidade;
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Alex M. Melotto
Capítulo 27
Espécies florestais em sistemas de
produção em integração
Alex Marcel Melotto
Valdemir Antônio Laura
Davi José Bungenstab
André Dominghetti Ferreira
430 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Sistemas de integração
Diversas regiões do globo apresentam bom potencial para aplicação de sistemas
agroflorestais (SAFs), que combinam a produção de árvores com outras culturas,
bem como os sistemas silvipastoris (SSPs), onde se integra a criação de animais com a
produção florestal. Ambos os sistemas fazem parte do conceito abrangente de sistemas
de produção agrícola em integração, sendo que os princípios e as tecnologias aplicadas
aos mesmos são perfeitamente aplicáveis aos sistemas mais complexos de integração
lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Os SAFs e SSPs têm grande variedade de aplicações,
servindo tanto para a recuperação de pastagens em solos de baixa fertilidade para criação
extensiva de bovinos de corte até para a produção de forrageiras de inverno em bacias
leiteiras de alta produtividade. Outras formas de uso são, por exemplo, a formação de
cercas vivas, banco de proteínas e sombreamento para os animais em qualquer tipo de
estabelecimento rural.
A silvicultura no Brasil
O Setor Florestal ocupa lugar de destaque entre os segmentos econômicos estabelecidos
no Brasil. O país ocupa atualmente a sexta posição mundial em área de florestas plantadas,
que em 2007, somava 5,6 milhões de hectares visando a produção de Produtos Florestais
Madeireiros (PFM) e outros 6,5 milhões de hectares plantados para a produção de Produtos
Florestais Não-Madeireiros (PFNM). Estas áreas com florestas plantadas representam a
principal fonte de suprimento de matéria-prima para importantes segmentos da indústria
florestal, tais como a celulose e papel, móveis, a carvão vegetal para siderurgia, alimentos
e borracha natural.
Visando atender tais demandas, estudos com espécies florestais nativas plantadas em
pastagem vêm sendo conduzidos desde 2004 e já apontaram espécies do Centro-Oeste
com potencial para uso em sistemas silvipastoris, tais como canafístula, chico magro e
ipês (Melotto et al., 2007).
Assim como a escolha das espécies, as formas de implantação de SSPs e SAFs, especialmente
relacionadas com o componente florestal e sua disposição na área e manejo, devem ser
feitas de acordo com os objetivos do sistema. Por exemplo, no caso de exploração de
madeira, a distribuição das árvores pode afetar grandemente a qualidade da mesma.
Para se aumentar o crescimento em diâmetro de árvores selecionadas, a competição
entre árvores próximas deve ser reduzida à medida que as mesmas crescem. Quando a
introdução das árvores é feita durante a renovação das pastagens, ou em áreas ocupadas
anteriormente com agricultura, o plantio das mudas de árvores pode ser inicialmente
associado com culturas anuais, retardando-se a semeadura das forrageiras por um ou dois
anos, reduzindo-se assim, o custo com a proteção das árvores.
Os tipos mais comuns de distribuição das árvores no sistema estão aqui brevemente
descritos, sendo que variações e combinações dos mesmos podem ocorrer de acordo
com as condições locais de implantação e os objetivos do sistema.
Como não existe uma regra geral para orientação na escolha das espécies adequadas para
o uso em sistemas silvipastoris, é fundamental considerar as peculiaridades regionais e
as modalidades de SSPs e SAFs da região. Além do produto madeireiro, as espécies
usualmente disponíveis podem ainda fornecer subprodutos, como frutos, sementes,
tanino e outros, que podem ser comercializados no mercado local, ou servir de matéria-
prima para produtos de exportação, como cosméticos e medicamentos. Adicionalmente,
há a possibilidade de fornecerem benefícios ambientais e sociais à comunidade. Levando-
se em consideração esses aspectos, aqui estão relacionadas e brevemente descritas
algumas espécies florestais nativas e exóticas, com potencial para utilização em sistemas
silvipastoris no Brasil, apresentando opções para uma escolha mais precisa, aumentando
as chances de sucesso do sistema. Naturalmente, esta é uma lista com as espécies mais
populares, usualmente disponíveis. O fato de outras espécies não estarem aqui listadas
não as exclui do rol de possibilidades. O importante é o produtor buscar sempre a espécie
mais adequada para sua condição e seus objetivos.
Espécies nativas
Canafístula (Peltophorum dubium (Sprengel) Taubert)
Também conhecida por acácia-amarela ou cambuí, pode atingir até 20 m de altura e 90
cm de diâmetro à altura do peito (DAP). Sofre danos por geada, apresentando posterior
recuperação, como já visto na região Sul de Mato Grosso do Sul (Amambaí) onde plantios
comerciais localizados em regiões próximas a cursos d´água sofreram danos e consequente
redução de crescimento pela queima por geadas. Mesmo com seu crescimento retilíneo,
requer podas para eliminar galhos e aumentar a altura comercial, chamada de fuste, que
é a parte do tronco situada entre o solo e as primeiras ramificações.
Em plantios puros, comercialmente conduzidos, o corte pode ser feito nove anos após o
plantio, com incremento médio anual de 25 m³/hectare/ano, totalizando 225 m³ ao final
434 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
do primeiro ciclo, sendo esta madeira utilizada para movelaria, vigas e madeiramento
interno e externo de residências. Em sistemas silvipastoris, com menor número de plantas
por hectare, o corte será retardado, no entanto, o valor final da madeira será maior.
No Mato Grosso do Sul já existem mais de 100 hectares de canafístula plantados em solos
arenosos e com espaçamentos de até 2500 árvores por hectare (Figura 1). Os plantios foram
realizados exclusivamente em áreas onde havia pastagem degradada. Foram utilizadas
práticas de cultivo mínimo e de conservação do solo, tendo sido necessária a realização
das adubações de base. Observa-se que estas práticas se assemelham àquelas realizadas
na renovação de pastagens, sendo este momento muito favorável à implantação das
árvores na pastagem para composição de sistemas integrados com pecuária e floresta.
Foto: Alex M. Melotto
Esta espécie pode ser utilizada tanto em plantios puros quanto em sistemas silvipastoris,
pois a planta apresenta crescimento rápido, atingindo os quatro metros de altura e cinco
centímetros de DAP aos dez meses de idade, permitindo a entrada de ovinos na área neste
período, uma vez que a canafístula não é palatável para esses animais e não há registros
de ramoneio ou danos ao tronco.
Sua copa pouco densa, seu crescimento retilíneo juntamente com as desramas e os
desbastes planejados permitem que haja bom desenvolvimento de braquiária sob sua
copa, podendo o sistema silvipastoril ser mantido até o momento do corte, com pastejo
de gado bovino a partir do 15º mês após o plantio.
Rosenthal, 2002), ou por mudas (Figura 2), que podem ser encontradas facilmente devido
à grande produção de sementes nas matrizes, fácil germinação e rápido desenvolvimento
em viveiros comerciais.
Em um sistema silvipastoril com Brachiaria humidicola no Pará, o Paricá atingiu, aos cinco
anos de idade, altura total de 18 m, altura comercial de 13 m e DAP de 0,18 m, confirmando
ser espécie altamente indicada para SSPs (Lima et al., 2003; Souza et al., 2005; Maneschy
et al., 2009). Para tanto, recomenda-se utilizar densidades de até 700 árvores por hectare
(espaçamento 4 m x 4 m), com entrada dos animais em torno de 15 meses após o plantio,
desbastes ao 7º e 11º anos e corte final com 15 anos, sendo o preço da madeira estimado,
atualmente, em torno de R$ 60,00/m³.
436 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Azevedo et al. (2009) enfatizam uma combinação promissora para SSPs entre Schizolobium
amazonicum e Brachiaria brizantha cv. Marandu, tanto do ponto de vista florestal (bom
crescimento da espécie) quanto pastoril (alta produtividade e qualidade da forrageira), com
densidades de 600 árvores por hectare e pastejo iniciando-se no segundo ano da implantação.
Há, no entanto, uma restrição aos plantios de cedro, por ser suscetível à broca do ponteiro
(Hypsiphylla grandella), que é de difícil controle e causa danos que resultam na perda da qualidade
da madeira. Para uso em SSPs, recomenda-se que consórcios sejam feitos com espécies com
potencial repelente de insetos, ou que não permitam a eclosão de ovos da mariposa, como é o
caso do cedro australiano (Toona ciliata), ambas com grande potencial madeireiro.
Sua madeira é durável e muito pesada, compacta, resistente a fungos e cupins, própria
para construção de estruturas externas como estacas, postes, mourões, obras hidráulicas,
dormentes, bem como para construção civil e naval (Almeida et al., 1998). O crescimento
do baru é de lento a moderado, apresenta boa resposta às adubações com fósforo e
nitrogênio, atingindo sobrevivência acima de 80% em campo. Suas folhas, com boa rebrota
após o ramoneio, são forragem para o gado e seus frutos são utilizados na alimentação
humana, in natura ou torrados (Carvalho, 1994; Alvarenga; Jorge, 2008) (Figura 5).
438 Foto: Davi J. Bungestab
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Tal demanda por frutos para consumo humano tem impulsionado o extrativismo,
trazendo a necessidade de implantação de áreas para a produção de frutos. Estas podem
ser estabelecidas em pastagens com sistemas SSPs. Todavia, no momento da colheita, a
área deve ser isolada dos animais, evitando assim o consumo dos frutos. Dessa forma,
ressalta-se o uso múltiplo da espécie, característica muito desejada no componente
florestal do sistema.
A atual demanda por frutos é suprida por árvores isoladas de baru que foram poupadas
no desmatamento devido ao robusto e profundo sistema radicular que dificultava seu
tombamento. Por isso, diversas árvores são ainda encontradas em pastagens, proporcionando
também sombra aos animais em uma forma muito simples de sistema silvipastoril.
Sob sua copa, normalmente não há pastagem, fato que, por vezes é atribuído à presença de
aleloquímicos nas raízes ou folhas. No entanto, a presença de poucas árvores fornecendo
um recurso tão necessário aos animais provoca o superpovoamento embaixo de suas
copas, com consequente pisoteio e eliminação da forrageira.
polpa rica em calorias, potássio e fósforo. Vários estudos têm sido realizados para o
melhoramento genético do Cumbaru, tanto para os parâmetros de crescimento quanto
de qualidade de suas folhas como forrageira, o que trará em breve grandes avanços e
novas possibilidades de uso da espécie.
Portanto, o baru tem posição extremamente favorável para uso em SSPs, tanto pelas melhorias
trazidas à pastagem quanto pela possibilidade de comércio de suas sementes, que possuem
alto valor de mercado e boa aceitação “in natura” ou torradas (Nepomuceno, 2006).
A madeira do louro-pardo é de leve a moderadamente densa, com 0,43 a 0,78 g/cm3 a 15%
de umidade, com massa específica de 0,65 g/cm3, apresentando elevada trabalhabilidade
com bom acabamento final (Melo; Paes, 2006). Possui alta resistência aos organismos
xilófagos, especialmente cupins (Paes et al., 2007) e baixa permeabilidade às soluções
preservantes, em tratamentos sob pressão. Sua secagem exige cuidados, pois facilmente
ocorrem rachaduras de superfície e de topo de tora. Podem ser obtidas peças envergadas
tendo, também, boa resistência à flexão e boa estabilidade para usos interiores.
Espécies Exóticas
Eucalipto
De forma geral, as florestas de eucalipto são de longa tradição em todo o Brasil, sendo
alvo de mais de 40 anos de estudos. Hoje existe conhecimento técnico de manejo e
melhoramento genético avançado, permitindo ao produtor o acesso fácil à mudas de
ótima qualidade, preço acessível e uma gama de espécies para os diversos fins desejados.
Estes fatores o colocam em posição de destaque como essência florestal e como
componente importante dos sistemas silvipastoris.
Os SSPs com eucalipto podem, por exemplo, ter por finalidade o fornecimento de madeira
sólida para fabricação de móveis que, apesar de ser um uso mais nobre da madeira e
por isso ter melhores preços, ainda é pouco explorado no Brasil. Para esse fim, deve-se
buscar mudas de espécies que forneçam madeira adequada, como o Corymbia citriodora
(anteriormente conhecido como Eucalyptus citriodora), o Eucaliptus urophyla e o eucalipto
híbrido chamado urograndis (E. urophylla + E. grandis) (Figura 6).
440 Foto: Davi J. Bungestab
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Em sistemas de integração, seja qual for o arranjo, a área e/ou o sistema utilizado, se não
houver uma demanda direta de compradores, sugerem-se materiais que possibilitem
a multiplicidade de usos. Deve-se então dar preferência a espécies que possam ser
utilizadas e comercializadas nos mais diversos mercados, tais como madeira serrada,
postes para tratamento, vigas, tábuas. Sempre que possível, deve-se priorizar usos mais
nobres, que agreguem maior valor ao produto gerado no SSP ou ILPF, especialmente pelo
fato de que tais sistemas possuem uma densidade de plantas/hectare reduzida (entre 200
e 600 árvores/ha).
Figura 8. Sistema silvipastoril experimental em Roda de Nelder com eucalipto (densidade de 150 a 1.300 plantas
por hectare) e capim-piatã em Ribas do Rio Pardo, MS.
442 Foto: Alex Marcel Melotto
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 9. Sistema Silvipastoril experimental em Roda de Nelder com eucalipto (densidade de 150 a 1.300 plantas
por hectare) e capim-massai em Ribas do Rio Pardo, MS.
Com relação ao conforto térmico animal, nas densidades entre 400 e 600 árvores por
hectare, observou-se temperaturas maiores durante a madrugada e menores durante a
tarde, amenizando, portanto, os extremos climáticos. Em média, a umidade relativa na
área sombreada foi 15% maior em comparação à área aberta, beneficiando os animais e
a forrageira.
Para essa espécie, prefere-se a formação de áreas com plantio em faixas com linhas
duplas ou triplas, evitando-se a utilização de árvores isoladas. Esta postura visa evitar a
alta conicidade e a formação de ramos laterais vigorosos nas árvores isoladas devido à
ausência de competição por luz, o que resulta em perdas de quantidade e qualidade da
madeira no processamento, seja pelo descarte de costaneiras ou pela presença de nós de
grandes proporções.
É uma espécie de crescimento rápido, sua madeira possui densidade de 450 kg/m³ (Lamb;
Borschmann, 1998), tendo propriedades físico-mecânicas de grande valor para a indústria
moveleira, de laminados e construção civil, possuindo características intermediárias
entre o mogno e o cedro rosa, em termos de qualidade e utilizações. Além disso pode ser
empregado na construção de mobílias de luxo e embarcações, ornamentos de interior,
instrumentos musicais, caixas e engradados, entre outros usos. Relata-se, também, a
extração de taninos e de componentes utilizados na produção de inseticidas, essência
para a indústria de perfumaria, cosméticos e medicamentos.
444 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
É considerada uma espécie intermediária, com boa tolerância ao sol pleno, e também
ao sombreamento, porém, para se obter elevados índices de crescimento, as plantas
requerem altos níveis de radiação. Em relação ao frio, as plantas desta espécie toleram
apenas geadas leves e de curta duração (Bristow et al., 2005).
Foi descrito por Thaman et al. (2000) como uma espécie multipropósito indicada para
sistemas agroflorestais pela qualidade de sua madeira, bem como pela capacidade de
atingir até 35 metros na maturidade, o que não traz prejuízos à forragem abaixo de sua
copa, sendo também indicada para quebra-ventos. Lamb e Borschmann (1998) citam que
o cedro australiano pode ser beneficiado pelo plantio consorciado com outras essências
florestais, diminuindo o ataque de pragas.
Cardoso (2004) indica o cedro australiano também para sistemas agroflorestais como
agente sombreante para o café. É bem aceito pelos produtores pela fácil condução, alta
rusticidade da espécie e baixa competição com o café por água e nutrientes. Apresenta
bom desenvolvimento e desempenha importante papel na adição de produção de
madeira ao sistema.
No Brasil Central, plantios de cedro australiano têm sido conduzidos desde 2005 em
Campo Grande-MS (Figura 10). O desenvolvimento tem sido satisfatório, apresentando
altura de cinco metros e DAP de oito centímetros no segundo ano, além da copa pouco
densa e crescimento extremamente retilíneo, proporcionando incremento volumétrico
em torno de 15 m³/ha/ano. Estes dados mostram o potencial de uso desta espécie em
SSPs, em especial pela ausência da competição com a forrageira.
Foto: Alex Marcel Melotto
Figura 10. Plantio de cedro australiano em Campo Grande, MS em consórcio com abacaxi.
Capítulo 27
Espécies florestais em sistemas de produção em integração 445
Para uso em SSPs e ILPF, indica-se o plantio em faixas com linhas duplas ou triplas
espaçadas pelo menos 15 m entre si, com desbastes programados visando redução da
competição entre plantas e melhoria da qualidade da madeira. Como a planta prefere
solos férteis, esta condição pode acelerar seu crescimento inicial, podendo o produtor
conduzir agricultura no ano de implantação e, já no segundo ano, formar a pastagem
entre as faixas.
Figura 10. Desrama em árvore de Acácia mangium com posterior aplicação de calda bordalesa visando proteção
contra fungos.
446 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O poder calorífico da espécie (4.900 kcal/kg) favorece seu uso para produção de energia,
sendo seu uso quatro vezes mais eficiente do que a madeira de espécies nativas,
tradicionalmente usadas em olarias e fornos no Amazonas (Azevedo et al., 2002).
Souza et al. (2004) verificaram incremento anual de 45 m³/ha/ano para plantios puros de
acácia mangium, na região amazônica, afirmando que esta espécie pode ser empregada
em programas de reflorestamento, substituindo a extração de espécies nativas.
Sua capacidade de fixar nitrogênio a torna uma opção de elevado potencial para cultivos
consorciados, tanto com culturas perenes como com cultivos anuais, pois as plantas
ao seu redor poderão se beneficiar do nutriente. A associação com cultivos ocorre,
principalmente, nos primeiros três anos de desenvolvimento, onde a árvore, por sua
vez, aproveita parcialmente a fertilização dos cultivos. Deve-se atentar para o fato desta
espécie apresentar potencial forrageiro, com probabilidade do gado alimentar-se de
suas folhas, em especial na estação seca. Além disso, nos esquemas de plantio onde as
árvores permaneçam excessivamente expostas ao vento poderá haver elevada incidência
de árvores danificadas, pois sua copa é densa e apresenta bifurcações, tornando-as mais
suscetíveis a rachaduras e quedas (Figura 12).
para florescer até mesmo em solos secos e pobres em nutrientes. É uma espécie que não
tolera geadas e locais encharcados e salinos (Neves et al., 1996).
A madeira do nim é dura, relativamente pesada (0,56 – 0,85 g/cm³), muito utilizada na
confecção de carretas, ferramentas e implementos agrícolas, pois apresenta resistência ao
ataque de cupins e ao apodrecimento. Seu cerne é rico em tanino e sais inorgânicos de
cálcio, potássio e ferro. O manejo adequado do estande em floresta pura pode propiciar
rendimentos de madeira de alta qualidade de até 15 m³/ha/ano até o quarto ano de idade
e 40 m3/ha/ano aos dez anos (Neves et al., 2003). Por ser durável e resistente, é utilizada
também na fabricação de postes para cercas, casas e móveis finos, sendo os postes de
nim especialmente importantes nos países em desenvolvimento (Vietmeyer, 1992; Neves
et al., 2003).
A madeira do nim indiano apresentou poder calorífico de 4.088 kcal/kg, com rendimento
em carvão de 38,20%, teor de cinzas de 2,11% e porcentagem de carbono de 81,82%, o que
revela a qualidade desta espécie também como material energético (Araújo et al., 2000).
Quanto aos produtos da árvore, a aplicação do óleo de nim a 0,6% no solo é uma boa
alternativa ao uso de inseticidas químicos para controle de pupas das moscas Lucilia
cuprina, Chrysomya megacephala, Cochliomyia hominivorax e Musca domestica (Deleito;
Borja, 2008).
Figura 13. Plantio de nim em forma de barreira quebra vento para confinamento no Centro-Oeste brasileiro.
Figura 14. Plantio de teca (Tectona grandis L.f.) na região de Cuiabá, MT.
Capítulo 27
Espécies florestais em sistemas de produção em integração 449
A teca é uma espécie nativa das florestas tropicais situadas entre 10°N e 25°N no
subcontinente índico e no Sudeste asiático. Possui alta adaptabilidade aos mais diversos
ambientes, com dispersão vertical entre 0 e 1.300 m acima do nível do mar, ocorrendo em
áreas com precipitação anual de 1.100 a 2.500 mm e temperaturas extremas de 2°C a 42°C,
porém não resiste a geadas (Lamprecht, 1990 in Lima et al., 2009).
Considerada uma planta de fácil cultivo, a T. grandis é pouco sujeita às pragas e doenças,
sua árvore adulta atinge entre 25 e 35 m de altura e aproximadamente 1 m de DAP e perde
as folhas durante a estação seca. A teca produz madeira de excelente qualidade, valorizada
pela beleza, resistência e durabilidade. Tem grande procura no mercado mundial, podendo
alcançar preços até três vezes superiores aos do mogno (Swietenia macrophylla, sendo
utilizada na produção de móveis, decoração, esquadrias de alto padrão e embarcações.
Na Ásia, o seu ciclo de rotação é variável de 60 a 100 anos. Períodos de estiagem acima dos
3 meses, solos rasos e de baixa fertilidade suprimem o crescimento da espécie. No Brasil,
a espécie vem sendo plantada há mais de 15 anos, especialmente na região Norte, onde
os plantios são bem sucedidos devido, principalmente, aos índices pluviométricos acima
dos 1.400 mm/ano, bem distribuídos.
Figura 15. Plantio de teca (Tectona grandis L.f.) em sistema agrossilvipastoril no Mato Grosso.
450 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Recentemente o uso de SSPs com teca foi beneficiado pela abertura de mercado para a
madeira de teca jovem, que é colhida entre o 5º e 9º ano após o plantio. Essa colheita é
feita por desbaste de parte das árvores da povoação (Figura 16), favorecendo a entrada de
luz no sistemas e consequentemente permitindo o melhor desenvolvimento da forrageira
para pastagem.
Foto: Alex Marcel Melotto
Considerações finais
O uso de sistemas silvipastoris está em evidência no Brasil. Várias pesquisas têm sido
conduzidas e os produtores rurais têm demonstrado interesse em sua implantação. As
grandes empresas de base florestal também investem na implantação de SSPs, alavancando
ainda mais a atividade. No entanto, apesar do grande potencial que a atividade apresenta,
o produtor deve lembrar que cada região e até mesmo cada estabelecimento rural,
apresenta características específicas que exigem um modelo de implantação adaptado
às suas necessidades. É importante que cada empreendedor avalie as características
de seu local e região e busque informações detalhadas, troque experiências e faça um
planejamento criterioso, desenvolvendo um modelo que produza resultados técnicos,
econômicos, sociais e ambientais positivos.
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Andrá D. Ferreira
Capítulo 28
Manejo das árvores e propriedades
da madeira em sistema de ILPF com
eucalipto
André Dominghetti Ferreira
Ademar Pereira Serra
Alex Marcel Melotto
Davi José Bungenstab
Valdemir Antônio Laura
456 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
por exemplo, o objetivo for produzir postes e palanques de eucalipto que serão tratados
quimicamente para aumentar sua resistência e consequentemente durabilidade, deve-
-se fazer contato com empresas da região que compram madeira para esse fim. Essas
empresas irão fornecer informações importantes quanto à viabilidade de colheita e
transporte, especialmente, devido à distância do estabelecimento rural e a quantidade
de madeira que será produzida. Além disso, os potenciais compradores da madeira irão
indicar, também, espécies preferidas e características desejadas ou não para o produto. Por
exemplo, se o objetivo do sistema é produzir eucalipto para postes tratados, ao contrário
do que se preconiza com madeira nativa, são mais desejáveis troncos com cerne mais fino.
Ou seja, as árvores com maior proporção de alburno do que de cerne, resultam em postes
tratados de melhor qualidade, pois há uma melhor absorção do produto químico usado
no tratamento, conferindo mais durabilidade à madeira (Figuras 1 e 2).
Fotos: Davi J. Bungenstab
O desbaste, que assim como a desrama, será discutido com detalhes neste capítulo,
também é uma prática de manejo muito importante para melhorar a qualidade da
madeira em sistemas de integração. Ele pode ser definido como a retirada de árvores da
área com o objetivo de manter a qualidade de um ou mais componentes do sistema,
mantendo a produtividade do mesmo ao longo do tempo de crescimento das árvores,
obtendo-se assim, troncos de melhor qualidade, com diâmetros elevados de fuste no
final do ciclo de produção e ainda produtividade satisfatória do componente forrageiro e
agrícola (Figura 3).
Fotos:: Davi J. Bungenstab
A C
Figura 4. Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta com eucaliptos em linha simples (A), linha dupla (B)
e linha tripla (C).
Além disso, a quantidade e disposição das árvores não deve comprometer a produtividade
de nenhum dos sistemas de produção na integração, uma vez que o cultivo de espécies
agrícolas e/ou forrageiras será realizado nas entrelinhas do componente florestal (Figura 5).
Fotos: Davi José Bungenstab
A B C
Figura 5. Cultivo de milheto (A,B) e feijão guandú (C) nas entrelinhas de eucalipto.
Desta forma, baseando-se em estudos recentes realizados pela Embrapa, recomenda-se que
a distância entre as linhas ou renques de eucalipto seja de pelo menos 14 metros, evitando
interações prejudiciais a qualquer elemento do sistema. Na definição do espaçamento
Capítulo 28
Manejo das árvores e propriedades da madeira em sistema de ILPF com eucalipto 461
entre renques deve-se sempre observar a dimensão dos equipamentos agrícolas a serem
utilizados nestas áreas.
De acordo com Porfírio-da-Silva et al. (2008), os sistemas de integração que têm como
objetivo principal a produção de madeira, podem reduzir a distância entre os renques de
árvores ou aumentar o número de linhas em cada renque. Já em sistemas onde se preconiza
a atividade agrícola e/ou a pecuária, deve-se utilizar maiores distâncias entre os renques e/
ou menor número de linhas em cada renque (Tabela 2). Deve-se ressaltar também, que em
ambos os casos, os desbastes se tornam necessários se a finalidade de uso da madeira for
para serraria.
Em sistemas integrados que visam a produção de madeira para serraria, a árvore deve ser
conduzida por períodos mais longos, o que exigiria uma implantação com menor número
de árvores por área. Entretanto, com o objetivo de gerar renda em períodos intermediários
entre o plantio e o corte final do componente florestal, é possível o plantio de um sistema
com maior número inicial de árvores para possibilitar o corte de parte destas (desbaste)
durante o desenvolvimento do ciclo. Essa estratégia gera fluxo de caixa com a venda de
madeira para lenha ou carvão e reduz a densidade das árvores no sistema, favorecendo a
produção de madeira de maior diâmetro (Tabela 2). De acordo com Oliveira et al. (2009), a
partir do terceiro ano após o plantio, há uma relação direta entre a área útil e o diâmetro à
altura do peito (DAP), ou seja, o aumento da área útil proporciona árvores de maior diâmetro
que fornecem, consequentemente madeira de menor conicidade e maior valor de mercado.
De qualquer forma, o espaçamento das árvores pode ser facilmente alterado pelos
desbastes (Figura 6), mesmo sob o risco de se eliminar árvores que poderiam apresentar
alta rentabilidade. Em regiões onde a pecuária é a atividade principal, deve-se primar pela
formação das pastagens e quando a competição exercida pelas árvores for excessiva,
a retirada de algumas plantas da linha, ou mesmo de linhas inteiras, é uma estratégia
importante para manutenção de densidades que não prejudiquem o desenvolvimento
da forrageira e o cultivo de lavouras.
Foto: : Ademar Pereira Serra
Segundo Simões (1989), há diversos critérios para a seleção das árvores que devem ser
desbastadas. Entre eles, os mais importantes são:
Capítulo 28
Manejo das árvores e propriedades da madeira em sistema de ILPF com eucalipto 463
Nas florestas plantadas em sistemas de integração, podem ser utilizados dois tipos de
desbaste: o sistemático e o seletivo.
O desbaste sistemático deve ser aplicado em áreas onde as árvores ainda não se
diferenciaram em classes de copas ou em áreas não desbastadas anteriormente. Ele
consiste na retirada das plantas sem prévia avaliação e localizadas em posições espaciais
pré-definidas. Por exemplo, pode-se retirar todas as plantas das linhas externas quando o
sistema conta com linhas triplas, ou retirar plantas alternadamente em uma linha simples.
Em plantios onde as árvores não são uniformes, essa técnica, por não ser seletiva, tem a
desvantagem de acarretar a retirada de indivíduos superiores.
Figura 7. Árvores de eucalipto candidatas ao desbaste por serem menos desejáveis para serraria devido a
tortuosidades.
464 Fotos: Autor
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 8. Árvores de eucalipto candidatas ao desbaste por serem menos desejáveis para serraria devido a
bifurcações.
Neste tipo de desbaste, geralmente são feitos dois cortes com intensidade aproximada
de 30% cada (no quinto e décimo ano após o plantio, por exemplo), restando ao final
do ciclo (12 a 14 anos), em torno de 40% de árvores com características desejáveis
para serraria.
Figura 9. Desrama com uso de serra manual (A) e com uso de podador motorizado (B).
Esta técnica tem por objetivo evitar o desenvolvimento dos “nós da madeira”, que
são regiões de galhos incorporados ao tronco em função do crescimento da árvore.
As Figuras 10 e 11 mostram, respectivamente, troncos de eucalipto com e sem nós
que diminuem o valor comercial da madeira. Além disso, essa prática reduz os danos
causados às árvores pelos animais, que muitas vezes desenvolvem o hábito de morder
e arrancar os galhos ao seu alcance, chamado de ramoneio.
Figura 10. Troncos de eucalipto em sistema de ILPF com defeito (“nó”), gerado pelo manejo errôneo da desrama.
466 Fotos: Davi J. Bungenstab
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 11. Troncos de eucalipto em sistema de ILPF sem defeitos graças à desrama feita corretamente.
Logo após a primeira desrama, as árvores deverão estar com no mínimo 1,8 m de fuste
livre, evitando o ramoneio e consequente danos às árvores (Figura 12).
Fotos: Alex Marcel Melotto e Davi J. Bungenstab
A B
Figura 12. Árvores desramadas após 18 meses do plantio (A) e árvores ainda jovens, antes da desrama (B).
As desramas subsequentes deverão ser realizadas até obter-se um fuste com quatro
a oito metros livres de galhos (Figura 13), sendo esta operação necessária apenas em
árvores com potencial para produção de madeira serrada e/ou laminada (Oliveira Neto;
Paiva, 2010).
Capítulo 28
Manejo das árvores e propriedades da madeira em sistema de ILPF com eucalipto 467
A B
Figura 14. Estrutura de galpão (A) e parede (B) feitas com madeira de eucalipto.
Forma do fuste
A forma do fuste varia de acordo com a espécie e também entre indivíduos da mesma
espécie. As condições edafoclimáticas, densidade de plantio, o manejo silvicultural
(desbastes e desramas), a idade e a posição do indivíduo frente à concorrência das
árvores vizinhas são fatores que exercem influência sobre esta característica. Neste
contexto, problemas com a forma do fuste podem se manifestar como uma redução do
diâmetro do caule com o aumento da altura, conhecida como “afilamento”, ou problemas
de tortuosidades e bifurcação do tronco. Para a produção de madeira serrada com o
máximo aproveitamento do fuste, espera-se que a espécie plantada apresente baixo
índice de afilamento, elevada retidão e baixo número de árvores bifurcadas. As árvores
que apresentam esses problemas podem ser eliminadas por meio de desbastes.
É importante salientar que as tensões de crescimento não são exclusivas dos eucaliptos, e
sim de todas as folhosas arbóreas, porém, sua intensidade é maior em algumas espécies.
Sendo assim, o potencial de uso de cada madeira depende de suas características
intrínsecas, que podem ser avaliadas por amostragem (Ponce, 1997).
Figura 15. Rachaduras em tábuas e toras de eucalipto provocadas pela tensão de crescimento e/ou processo
de secagem inadequado.
470 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Considerações finais
Não existe um modelo único de manejo do componente florestal em sistemas de
integração que possa ser implantado em qualquer estabelecimento rural. O modelo de
manejo das árvores deve ser definido quando se planeja a implantação do sistema. Ele
deve fazer parte de um conjunto de atividades que visem um produto final bem definido.
Esse produto deve atender às demandas de mercado para trazer o retorno esperado para
o produtor-empreendedor. Com o favorecimento do setor de processamento, o sistema
trará também benefícios socioeconômicos para a região.
Desta forma, os procedimentos básicos de manejo aqui apresentados devem ser ajustados
e adequados para as particularidades e necessidades de cada empreendimento. As
atividades e intervenções específicas dependerão da observação e análise in loco de cada
sistema, que são dinâmicos e demandam adaptações ao longo do tempo. A definição dos
processos e os ajustes devem ser orientados tanto por fatores ambientais, como clima,
quanto por fatores econômicos e estratégicos, tais como fluxo de caixa e oportunidades
de mercado. O importante é que o produtor tenha um bom planejamento inicial que
contemple uma análise de risco. Sempre que necessário, um profissional capacitado
deve ser consultado para auxiliar nas decisões quanto ao momento exato e ao grau da
intervenção no sistema para garantir um bom manejo e um bom produto final.
Referências
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Capítulo 28
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 29
O componente arbóreo e suas interações
no sistema de integração lavoura-pecuaria-
-floresta
Renato Luiz Grisi Macedo Fernanda de Carvalho
Regis Pereira Venturin Erick Martins Nieri
Maria Celuta Machado Viana
Nelson Venturin
474 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Os sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (iLPF) se destacam como uma
proposta dinâmica de manejo integrado e sustentável do solo, com objetivos de produzir
economicamente em uma mesma área, madeira, grãos e carne ou leite.
Gontijo Neto et al. (2013) realçam que um dos principais fatores para o sucesso de um
cultivo consorciado se baseia na complementação entre as espécies envolvidas, uma vez
que, durante parte de seu ciclo existe uma competição/interação pelos fatores de produção
(luz, água e nutrientes), o que vai interferir no resultado obtido ao final do ciclo da cultura
anual. Dessa maneira é importante caracterizar as espécies que irão compor o sistema.
Macedo et al. (2010) apresentam sólida discussão sobre as principais interações e potencial
de utilização de consórcios de eucalipto com arroz, soja, milho, feijão, mandioca, mamona
e com várias espécies leguminosas. Macedo et al. (2014) realçam que as lavouras anuais
consorciadas com eucalipto podem amortizar os custos de formação e/ou recuperação
de pastagens degradadas e mesmo da implantação de árvores na área. Porém, a escolha
vai depender de fatores, tais como: a adaptação às condições ambientais (clima, solo,
manejo), características da propriedade (tradição de cultivo, nível tecnológico, assistência
técnica, infraestrutura e logística), mercado para os produtos e adaptação das espécies
ao cultivo consorciado, pois a maioria das culturas é altamente exigente em luz e não
toleram sombreamento.
Nos sistemas de produção com eucalipto, as atividades agrícolas, pecuária e florestal precisam
ser planejadas desde o momento do estabelecimento, levando em consideração que são
atividades que, isoladamente, apresentam características de manejo distintas. Quando
observadas estas características, são possíveis ajustes de manejo temporais e espaciais, os
quais permitirão que o sistema seja conduzido de forma sustentável e produtiva.
Macedo et al. (2008) evidenciam as principais características dos eucaliptos que justificam
a sua utilização em sistemas iLPF, as quais são apresentadas a seguir:
Dessa forma, os povoamentos de eucalipto que visam produtos para celulose, escoras de
minas, produção de carvão e postes são plantados em espaçamentos menores, enquanto
os plantios para madeira serrada são feitos em espaçamentos mais amplos ou com
desbastes realizados de forma precoce, visando aproveitar o rápido crescimento inicial
das plantas. Outra estratégia para a produção de madeira para serraria é a utilização de
sistemas agrossilvipastoris ou iLPF e silvipastorisque podem viabilizar a produção de
madeiras de maiores diâmetros, um produto com maior valor comercial que demanda
um período de tempo mais longo.
Nos sistemas de iLPF a interação entre os componentes já define uma limitação de densidade
de plantio. Assim, na definição do espaçamento, o número de plantas desejável é aquele
que as espécies florestais não ocupem rapidamente o sítio, inviabilizando outras atividades
desenvolvidas e que propiciem a qualidade do produto madeireiro desejado sem, contudo,
que estejam em número insuficiente para produzir o volume de madeira almejado.
Nestes sistemas, à medida que as árvores crescem ocorre redução na radiação que
incide sob o sub-bosque causando sombreamento do componente lavoura e/ou pasto,
influenciando na produção do sistema como um todo. Portanto, a definição do arranjo
espacial do eucalipto (ou outra espécie) para compor um sistema de iLPF é de fundamental
importância uma vez que o sombreamento pode restringir a penetração de luz no sub-
bosque, interferindo na incidência da radiação fotossinteticamente ativa, refletindo na
fotossíntese (Paciullo et al., 2011) e especialmente sobre as características de crescimento
da própria floresta.
Uma tentativa de equacionar essa relação entre número de plantas na área e o espaço/
tempo disponível as outras atividades é o aumento da densidade de plantio das espécies
arbóreas em faixas o que, todaviapode acarretar perda de qualidade no produto florestal
caso não haja um manejo adequado. Assim, uma das premissas dos sistemas de iLPF, que
é a agregação de valores ao produto florestal final, pode ficar comprometido.
478 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Nos sistemas iLPF onde a floresta tem um reduzido número de indivíduos, a qualidade do
produto final deve ser vista com grande cuidado uma vez que este componente muitas
vezes agrega a maior parte do faturamento pretendido pelo sistema de exploração.
Schneider e Schneider (2008) associa a definição de qualidade da madeira de uma
espécie qualquer a três fatores que são a forma do tronco, as dimensões das árvores e
as qualidades físico-mecânicas da madeira. Dentre estes fatores, a dimensão do tronco é
especialmente ligada à densidade populacional final e arranjo espacial de plantio.
Em um ensaio com clones de eucalipto avaliado aos 48 meses de idade, as maiores alturas
foram obtidas nos arranjos com linha dupla, com exceção ao clone GG 100. O eucalipto
plantado no arranjo (2x2) + 9 m apresentou menor DAP para todos os clones (Tabela 1).
Estes números demonstram a competição entre plantas já nesta idade, especialmente nos
arranjos de fileiras duplas.
Capítulo 29
O componente arbóreo e suas interações no sistema de integração lavoura-pecuaria-floresta 479
Tabela 1. Valores médios de altura de planta, diâmetro a altura do peito (DAP), volume
por planta e por hectare de clones de eucalipto em diferentes espaçamentos no sistema
de iLPF aos 48 meses.
Desempenho Silvicultural do Eucalipto
Arranjos
Altura (m) DAP (cm) Volume/pl (m³) Volume/ha (m³)
Clone GG100
(3 x 2)+20 m 22,76 a1 17,16 a 0,22 a 97,25 c
Clone I144
(3 x 2)+20 m 22,72 a 17,40 a 0,23 a 101,93 c
VM 58
(3 x 2)+20 m 21,34 a 17,96 a 0,23 a 101,44 c
Observa-se na Tabela 1, que os espaçamentos com maiores áreas úteis por planta já
proporcionaram maiores médias de volume por planta para todos os clones. O maior
volume por planta foi observado no arranjo (3x2) + 20 m e 9x 2 m respectivamente,
não havendo diferença entre estes arranjos. Quanto menor a área útil por planta, maior
quantidade de plantas por hectare, e consequentemente maior o volume de madeira por
hectare. Deste modo, o maior rendimento de madeira foi observado no arranjo (2 x 2) + 9
m, seguido pelo 9 x 2 m e o (3 x 2) + 20 m.
Souza (2004) relata que quanto menor o espaçamento utilizado, maiores serão a produção
de madeira fina, a densidade de árvores, o percentual de falhas, a área basal e o volume
por hectare e maior será o custo de implantação da floresta. Em contrapartida, menores
serão os valores de DAP, volume por árvore e menor também será a idade de corte ou de
desbaste porque ocorrerá estagnação precoce.
A B
Figura 2. Incremento médio anual (A) e corrente anual (B) em volume de madeira (m ha ) no tempo em meses,
3 -1
* Não incluso o volume de toco. Médias seguidas por letras minúsculas distintas diferem na coluna, pelo teste
Scott-Knott, a 1% de significância.
Para compor o sistema iLPF as lavouras e forrageiras devem ser produtivas, parcialmente
tolerantes ao sombreamento e adaptadas às condições edafoclimáticas do local de
implantação. Isto se torna mais relevante em se tratando de áreas de cerrado, com
características particulares de solos ácidos de baixa fertilidade e estação seca bem
definida e prolongada.
As culturas de milho, feijão, arroz, sorgo, soja e milheto têm sido utilizadas nos sistemas
de iLPF, pois consorciam bem tanto com o eucalipto quanto com as gramíneas forrageiras
(Paciullo et al., 2011; Viana et al., 2012) (Figura 3). No entanto, o milho é particularmente
interessante para a formação de sistemas consorciados devido à simplicidade de condução
e amplitude de utilização diante de diversidades climáticas, sendo o seu sistema de
produção bem difundido entre os produtores.
Capítulo 29
O componente arbóreo e suas interações no sistema de integração lavoura-pecuaria-floresta 483
A B
Figura 3. Milho (A) e sorgo (B) consorciado com B. decumbens e eucalipto plantado no espaçamento (3x2)+20 m.
EPAMIG/Prudente de Morais. Março 2010.
O milho se destaca em virtude do rápido crescimento inicial e porte alto, o que facilita
a competição com os outros componentes e a colheita mecanizada. Por outro lado, a
existência de herbicidas graminicidas seletivos ao milho melhora o controle de plantas
daninhas, facilitando os tratos culturais. Além do mais, esse cereal apresenta inúmeras
aplicações na propriedade agrícola, quer seja na alimentação animal na forma de grãos
ou de forragem verde ou conservada (silagem), quer seja na alimentação humana ou na
geração de receita mediante a comercialização da produção excedente. Soma-se a isto a
existência de um grande número de cultivares comerciais adaptados às diferentes regiões
do Brasil, possibilitando o cultivo deste cereal de norte a sul do país. Em locais onde o
clima favorece o plantio de milho, este cereal tem sido recomendado para compor o
sistema, pois consorcia bem tanto com o eucalipto quanto com as gramíneas forrageiras
(Gontijo Neto et al., 2013).
Figura 4. Formação do pasto de B. decumbens após a colheita do milho grão. EPAMIG/Prudente de Morais, 2010.
No sistema iLPF, além de garantir a produção animal, as forrageiras perenes (capins) atuam
como recicladoras de nutrientes após a cultura anual; na estruturação física e aporte de
matéria orgânica no solo e na produção de palhada para o plantio direto. Além de contribuir
no manejo de plantas daninhas e doenças preservando a produtividade da cultura anual,
na redução dos custos de produção e na geração de receitas mensais ou anuais, até a
maturação do componente florestal.
adaptação aos solos de baixa fertilidade e ácidos, típicos da região de cerrado, com razoável
produção de forragem e capacidade de suporte. No entanto esta espécie é altamente
susceptível a cigarrinha das pastagens. Existem outras espécies de braquiárias que são mais
tolerantes a esta praga e que apresentam características culturais e nutricionais semelhantes
ou até melhores, como é o caso da Brachiaria brizantha que ainda possui variações de acordo
com a cultivar (Marandu, MG4, Xaraés, Piatã) e a Brachiaria ruziziensis
Em trabalho conduzido na região central de Minas Gerais onde o sistema de iLPF foi utilizado
na recuperação de uma área de 10 ha de pasto degradado,três clones de eucalipto (GG100,
I144 e VM 58) foram plantados emarranjo com linhas duplas: (3 x 2) + 20 m, (2 x 2) + 9 m e em
linha simples: 9 x 2m . As espécies escolhidas para compor o sistema foram o milho cultivado
nos primeiros três primeiros anos consorciado com o pasto de Urocloa decumbens
Para obter o espaçamento de 10x4m é necessário realizar um desbaste 50% dos indivíduos
entre o 3° e 4° ano, de modo a tornar o arranjo inicial de ((3(3x2m) + 7x2m) em ((3(3x4m) +
7x4m), ou seja, deve-se realizar o desbaste sistemático das colunas de plantio, removendo
a segunda, quarta, sexta e as demais colunas de forma sucessiva (Figura 6). A realização
do desbaste favorece o desempenho silvicultural da espécie florestal por disponibilizar
maior área para cada indivíduo, além de amortizar os custos com o emprego da técnica e
antecipar receitas para o produtor rural.
Capítulo 29
O componente arbóreo e suas interações no sistema de integração lavoura-pecuaria-floresta 489
O segundo e último desbaste, visa retirar mais 50% da população remanescente, de modo
sistemático, retirando a primeira linha inteira e terceira linha inteira do arranjo, obtendo-
se espaçamento final de 10x4m (Figura 7). Observa-se que as árvores remanescentes
deste desbaste apresentam fustes mais cilíndricos e retilíneos, decorrentes da competição
exercida, ao longo do tempo pelas linhas de árvores retiradas (primeira e terceira linha).
Este desbaste deve ocorrer quando iniciar a competição intraespecífica dos indivíduos
(estimada entre o 7° e 8° ano de plantio) possibilitando assim a retomada em incremento
pelos mesmos.
490 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 7. Representação da realização do segundo desbaste sistemático para chegar ao espaçamento de 10x4m.
Dessa forma, ao final do ciclo do componente florestal desse modelo tem-se madeira
nobre e com qualidade agregando valor e o tornando viável para os produtores rurais.
Considerações finais
O sistema de integração lavoura-pecuária-floresta proporciona, além de diversificação de
atividades, uma oportunidade de obtenção de produtos florestais de alto valor agregado
que seria de difícil obtenção em outros sistemas de cultivo e uma alternativa para
transformar áreas degradadas em áreas produtivas.
De maneira geral, esse sistema necessita ser avaliado como um todo, com consciência de
que em alguns aspectos individuais pode haver uma redução de ganhos, compensada por
outro componente num futuro pré-determinado. Nesse aspecto o componente florestal,
de retorno mais longo e maior volume, deve ser explorado de forma a agregar o maior
valor possível. Vale ressaltar a necessidade de estudos com diferentes espécies florestais
em arranjos com forragens tolerantes ao sombreamento.
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 30
Influência do arranjo espacial das aleias de
eucalipto em sistema silvipastoril no acúmulo
de biomassa e propriedades bromatológicas
da Urochloa brizantha cv Xaraés
Flávia Araújo Matos Silvia Correa Santos
Natália Andressa Salles Elaine Reis Pinheiro Lourente
494 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A área de cultivo de 200 ha tem como componente arbóreo o Eucalyptus urograndis (clone
H13) e Eucalyptus grancam (clone 1277) implantados em julho de 2010, com disposição
em renques constituídos por linhas triplas em espaçamento de 3 m x 2 m, sendo a largura
das aleias variável devido ao desnível do terreno.
Capítulo 30
Influência do arranjo espacial das aleias de eucalipto em sistema silvipastoril no acúmulo de 495
biomassa e propriedades bromatológicas da Urochloa brizantha cv Xaraés
Oito meses após o plantio dos eucaliptos, em março de 2011, foi realizada a semeadura da
forrageira U. brizantha cv. Xaraés a lanço entre aleias. A partir de julho de 2011 iniciou-se o
pastejo dos bovinos. Os componentes arbóreos apresentavam altura média de 15,0 e 13,5
m para os clones 1277e H13 respectivamente, quando foram iniciadas as análises.
A forrageira foi adubada com 100 kg ha-1 de superfosfato triplo, 50 kg ha-1 de cloreto de
potássio (KCl) e 20 kg ha-1 de FTE BR 12 na semeadura, e 110 kg ha-1 de ureia em cobertura
no 25º dia após a emergência. No início da estação das águas 2012/2013 foram aplicados
150 kg ha-1 de sulfato de amônio em cobertura.
Foram selecionados quatro diferentes espaçamentos entre aleias de árvores para cada
clone, (16 m, 20 m, 25 m e 30 m) para o clone 1277 e (14 m, 18 m, 21 m e 24 m) para o clone
H13 (Figura 1), respectivamente. A escolha dos espaçamentos foi limitada de acordo com
os espaçamentos já existentes, provocados pelo terraceamento.
Figura 1. Sistema Silvipastoril com o clone 1277 a esquerda e o clone H13 a direita, em Ivinhema-MS, dezembro
de 2013.
Em cada espaçamento foram locadas quatro parcelas a título de repetições e dentro de
cada uma, quatro linhas de coleta paralelas às aleias. As linhas de coleta foram locadas
a 1,5 m das aleias e aproximadamente 35% da distância paralela aos renques (Figura 2).
496 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 2. Arranjo espacial das aleias de Eucalyptus urograndis (clone H13) e E. grancam (clone 1277) e pontos de
coleta (1,5 m e 35% de distância das árvores) de Urochloa brizantha cv. Xaraés, no sistema silvipastoril, instalado
na Fazenda São Paulo, município de Ivinhema-MS.
Figura 3. Acúmulo de biomassa (kg.ha-1) de plantas de Urochloa brizantha cv. Xaraés cultivadas em quatro
diferentes espaçamentos entre árvores de Eucalyptus grancam e urograndis em duas épocas (E1: janeiro e E2:
julho). * Significativo a p<0,05.
Capítulo 30
Influência do arranjo espacial das aleias de eucalipto em sistema silvipastoril no acúmulo de 497
biomassa e propriedades bromatológicas da Urochloa brizantha cv Xaraés
Em relação às duas épocas avaliadas, o acúmulo de biomassa seca da forrageira foi 61%
superior no verão sob o clone 1277 e 55% sob o H13. Esse resultado já era esperado, pois
segundo Euclides et al. (2008), as gramíneas do gênero Urochloa sp. chegam a acumular
de 77 a 90% da produção total de biomassa seca no verão em relação ao inverno.
Figura 4. A esquerda está o clone H13 com copas mais densas, e a direita o clone 1277 apresentando uma maior
transparência de copa, em Ivinhema-MS, dezembro de 2013.
Figura 5. Porcentagem de Proteína Bruta (PB) de plantas de Urochloa brizantha cv. Xaraés cultivadas em quatro
diferentes espaçamentos entre árvores de Eucalyptus grancam e E. urograndis em duas épocas (E1: janeiro e E2:
julho). * Significativo a p<0,05.
Observou-se um valor médio de 7% superior nos valores de proteína bruta nas plantas
sob a copa das árvores do clone H13 em relação ao 1277, no verão. Entretanto, no inverno
essa diferença foi de apenas 2%. O teor de proteína bruta, geralmente, aumenta em
plantas sombreadas (Garcez Neto, 2010), essa tendência é maior em gramíneas do que em
leguminosas (Lin et al., 2001). A sombra pode ter efeito positivo sobre a disponibilidade
de nitrogênio no solo, e as principais hipóteses são creditadas às boas condições de
mineralização da matéria orgânica proporcionada pelas condições térmicas e hídricas
do ambiente com maiores densidades de árvores (Kirchner et al., 2010). Segundo Ribaski
et al. (1998) a redução da fotossíntese em áreas mais adensadas eleva ao aumento na
eficiência de conversão da energia solar em energia química, aumentando os teores de
clorofila, do N e ao incremento da área foliar, que são fatores que contribuem diretamente
para o aumento da proteína bruta.
Figura 6. Porcentagem de Digestibilidade in vitro de Matéria Orgânica (DIVMO) de plantas de Urochloa brizantha
cv. Xaraés cultivadas em quatro diferentes espaçamentos entre árvores de Eucalyptus grancam e urograndis em
duas épocas (E1: janeiro e E2: julho). * Significativo a p<0,05.
Figura 7. Porcentagem de Fibra Detergente Neutro (FDN) de plantas de Urochloa brizantha cv. Xaraés cultivadas
em quatro diferentes espaçamentos entre árvores de Eucalyptus grancam e urograndis em duas épocas (E1:
janeiro e E2: julho). * Significativo a p<0,05.
Figura 7. Porcentagem de fibra detergente ácido (FDA) de plantas de Urochloa brizantha cv. Xaraés cultivadas
em quatro diferentes espaçamentos entre árvores de Eucalyptus grancam e urograndis em duas épocas (E1:
janeiro e E2: julho). * Significativo a p<0,05.
Capítulo 30
Influência do arranjo espacial das aleias de eucalipto em sistema silvipastoril no acúmulo de 501
biomassa e propriedades bromatológicas da Urochloa brizantha cv Xaraés
Considerações finais
A sombra reduz o estresse térmico e auxilia no ganho produtivo dos animais, mas a
preocupação do produtor sempre recai sobre a perda da disponibilidade da pastagem,
e isto ocorrerá somente se o sombreamento for excessivo. Maiores espaçamentos entre
aleias garantiram incrementos na produção e qualidade da forrageira, entretanto em
todas as distâncias estudadas pode ocorrer cultivo consorciado, pois os valores obtidos
são considerados ideais.
Em relação aos clones utilizados, o H13 com uma copa mais densa contribuiu para uma
maior qualidade nutricional, e o 1277 apresentou um maior acúmulo de biomassa seca.
Para efeitos práticos o produtor pode optar por qualquer um dos clones de eucalipto, pois
ambos foram vantajosos em consórcio com o capim Xaraés.
Para a escolha do espaçamento ideal das faixas entre as árvores, além de levar em
consideração a densidade da copa e seu efeito sobre a forrageira, também é importante
o produtor verificar os maquinários e insumos que irá utilizar nesta área. Assim, a
distância entre as aleias torna-se de extrema importância para um manejo mais eficiente,
aplicável a qualquer tamanho de propriedade. E quando bem implantado, o sistema
silvipastoril proporciona uma fonte de alternativa de renda segura ao produtor. Os
resultados apresentados podem contribuir para um planejamento mais adequado e
seguro. O desenvolvimento harmonioso de todos os componentes vegetais do sistema,
proporcionará ao animal os benefícios deste consórcio, com pasto de qualidade e
ambiente confortável.
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Omar Daniel
Capítulo 31
Sustentabilidade econômica de sistemas
silvipastoris com eucalipto focados na
produção de madeira sólida
Omar Daniel (in memoriam)
Rafael Pelloso de Carvalho
Débora Menani Heid
Flávia Araújo Matos
504 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Divididos em três grandes grupos, segundo a sua natureza do consórcio, os SAF são
considerados sistemas sustentáveis de uso da terra que podem integrar componentes
lenhosos, produção agrícola e animal, constituindo de acordo com a composição, os
sistemas silvipastoris, agrissilvipastoris e agrissilviculturais. Determinadas práticas
dessas modalidades de SAF também têm sido tratadas, respectivamente, como como
iPF (integração Pecuária-Floresta), iLPF (integração Lavoura-Pecuária-Floresta) e iLF
(integração Lavoura-Floresta).
A resposta à primeira questão não é difícil, pois apesar de várias espécies florestais
contarem com suficiente aporte de informações para seus sistemas de produção, como
a seringueira, a teca, o pinus e outras, é o eucalipto que apresenta maior volume de
resultados de pesquisas, além de ter mercado para variadas aplicações de sua madeira
e adaptar-se diversas condições edafoclimáticas. Do ponto de vista econômico, já temos
comprovado que SAF agrissilvipastoril com eucalipto em região de cerrado pode atingir
taxa interna de retorno de mais de 23% e razão benefício/custo de 1,8 (Daniel, 2010).
a) Valor presente líquido (VPL) – é a diferença do valor presente das receitas menos
o valor presente dos custos, ou seja: VPL=∑nj=0Rj(1+i)-j - ∑nj=0Cj(1+i)-j, sendo Rj = valor
atual das receitas; Cj = valor atual dos custos; i = taxa de juros; j = período em que
as receitas ou os custos ocorrem; e n = número de períodos ou duração do projeto;
A taxa de desconto (i), ou seja, a taxa de juros aplicada sobre os critérios foi de 12%.
506 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Para elaboração do fluxo de caixa, tanto para o eucalipto solteiro, quanto para a pecuária
de corte, os dados das Tabelas 1 a 4 foram computados anualmente.
Os resultados dos critérios adotados indicam que a pecuária de corte extensiva está se
descapitalizando ao longo do tempo, tendo em vista o valor negativo do VPL para esta
atividade (Tabela 5). Observa-se uma taxa de retorno do investimento prevista (4,3%)
mais baixa do que até mesmo um dos investimentos com a rentabilidade mais baixa do
momento, a poupança.
Tabela 1. Composição dos custos de implantação de um ha de eucalipto por operação, considerando as atividades mecanizadas,
manuais e a aplicação de insumos, espaçamento 3 x 2 m (1667 plantas por ha).
Mecanizado Manual Insumo CUSTO
Operação
hM/ha R$/hM R$/ha hH/ha R$/hH R$/ha Especificação Qte/ha R$/Un R$/ha R$/ha
Projeto e topografia 20,00
Constr. estradas e aceiros 0,64 69,00 44,16 44,16
0,08 170,00 13,60 13,60
Gradagem pesada 0,50 44,00 22,00 22,00
1º combate a formigas 7,50 4,00 30,00 Formicida gran. (kg) 6,00 7,50 45,00 75,00
Alinhamento/balizamento 10,80 4,00 43,20 43,20
Mistura de corretivos 1,17 4,00 4,68 Fosf. nat. (kg) 400,00 0,70 280,00 284,68
Distribuição corretivos 0,25 16,80 4,20 4,20
Gradagem bedding 0,25 44,00 11,00 11,00
Coveamento 13,00 4,00 52,00 52,00
Distribuição de adubos na cova 0,09 16,80 1,51 5,00 4,00 20,00 NPK(6-30-6) (kg) 250,00 0,90 225,00 246,51
KCl 165,00 1,20 198,00 198,00
Distribuição de cupinicida cova 5,00 4,00 20,00 Cupinicida (kg) 2,50 7,50 18,75 38,75
Mistura adubo/cupinicida 1,50 4,00 6,00 6,00
Aplicação herb pré-emergente 70,00 Herbicida 200,00 270,00
2º combate a formigas 1,50 4,00 6,00 Formicida gran. (kg) 0,50 7,50 3,75 9,75
Reforma de aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
Transporte de mudas 0,15 15,70 2,36 0,60 4,00 2,40 4,76
Distribuição de mudas 7,00 4,00 28,00 28,00
Plantio 16,00 4,00 64,00 Mudas 1667,00 0,40 666,80 730,80
3º combate a formigas 0,94 4,00 3,76 Formicida gran. (kg) 0,50 7,50 3,75 7,51
Replantio 6,00 4,00 24,00 Mudas 167,00 0,40 66,80 90,80
Irrigação 0,30 16,80 30,00 5,00 4,00 20,00 50,00
madeira sólida
Sustentabilidade econômica de sistemas silvipastoris com eucalipto focados na produção de
Capítulo 31
(ano 0)
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
1ª Manutenção
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
CUSTO (R$/ha) 62,21 27,20 609,00 698,41
Aplicação de herbicida pós-emergente 35,00 Herbicida 7,00 42,00
1ª desrama (até 4,00 m) 40,00 4,00 160,00 160,00
Adubo 150 g/planta 24meses 0,27 16,80 4,54 1,60 4,00 6,40 NPK(18-00-18) (kg) 250,00 0,90 225,00 235,94
(ano 1)
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
2ª Manutenção
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
(ano 2)
3ª Man.
CUSTO (R$/ha) 13,60 8,00 15,00 36,60
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
Combate a formigas 2,00 4,00 4,51 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 19,51
(ano 3)
4ª Man.
CUSTO (R$/ha) 13,60 4,51 15,00 33,11
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
Combate a formigas 2,00 4,00 4,51 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 19,51
(ano 4)
5ª Man.
CUSTO (R$/ha) 13,60 4,51 15,00 33,11
Continua...
Tabela 2. Continuação.
(ano 5)
6ª Man.
CUSTO (R$/ha) 13,60 8,00 15,00 36,60
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
(ano 6)
7ª Man.
CUSTO (R$/ha) 13,60 8,00 15,00 36,60
CUSTO DE MANUTENÇÃO (R$/ha) 183,34 234,62 931,00 1348,96
CUSTO DE IMPLANTAÇÃO E MANUTENÇÃO (R$/ha) 395,77 558,66 2638,85 3613,28
Tabela 3. Composição dos custos de formação, manutenção e infraestrutura de um ha de pasto (braquiária) por operação, considerando
as atividades mecanizadas, manuais e a aplicação de insumos.
Mecanizado Manual Insumo CUSTO
Operação
hM/ha R$/hM R$/ha hH/ha R$/hH R$/ha Especificação Qte/ha R$/Un R$/ha R$/ha
Formação de pastagem (ano 0)
1ª gradagem aradora 0,99 53,00 52,47 52,47
2ª gradagem aradora 0,83 53,00 43,99 43,99
Gradagem de nivelamento 0,50 53,00 26,50 26,50
Semeadura e adubação 0,50 16,80 8,40 Super simples (kg) 100,00 0,70 70,00 78,40
Fosfato natural (kg) 400,00 0,69 276,00 276,00
Semente (kg) 7,00 20,00 140,00 140,00
Gradagem de incorporação 0,5 53,00 26,50 26,50
CUSTO (R$/ha) 157,86 0,00 486,00 643,86
madeira sólida
Sustentabilidade econômica de sistemas silvipastoris com eucalipto focados na produção de
Capítulo 31
Continua...
509
510
Tabela 3. Continuação.
** cálculos baseados em piquetes de 25 ha e cerca de dois fios (4 km); hM – hora de máquina; hH – hora de mão-de-obra.
Capítulo 31
Sustentabilidade econômica de sistemas silvipastoris com eucalipto focados na produção de 511
madeira sólida
** periodicidade bianual.
Tabela 5. Critérios de análise de investimento adotados, a uma taxa de juros de 12%, para
eucalipto (horizonte de 7 anos) e pecuária de corte em sistema de produção tradicional
com entradas e saídas bianuais (horizonte de 13 anos).
Sistema de produção VPL (R$/ha) TIR (%) BC
Eucalipto 719,26 26,8 2,05
Pecuária de corte -2.806,66 4,3 0,83
Por outro lado, os plantios homogêneos de eucalipto superam várias vezes o retorno do
investimento em pecuária de corte, apresentando TIR de 26,8%, VPL positivo e R$ 2,00 de
retorno a cada real investido.
Havendo mercado para colocação da madeira, cultivar eucalipto é, sem dúvida, melhor
negócio do que pecuária de corte. Esse fato é facilmente percebido nos municípios
próximos às indústrias de papel e celulose, como é o caso do polo industrial de Três Lagoas
e região, onde grandes extensões de pastagens degradadas ou em estágio de degradação
têm sido convertidas para a eucaliptocultura.
Para superar esses problemas, têm sido divulgados com vigor os sistemas agroflorestais.
Nelas podemos destacar como grandes vantagens:
a) O produtor pode manter sua atividade tradicional, ou seja, não precisa deixar de
ser pecuarista ou silvicultor;
Como já discutimos anteriormente, por recomendarmos estes sistemas para foco prioritário
em produção de madeira sólida, não faremos apresentações de sistemas silvipastoris
exclusivos para outros usos da madeira, como energia ou celulose por exemplo.
A pastagem é semeada nas entrelinhas das árvores, evitando-se todavia, no primeiro ano,
a invasão das gramíneas nos espaços de um metro nas laterais das linhas das árvores. O
eucalipto é sensível à competição especialmente com as braquiárias.
O ciclo do sistema, baseado na rotação das árvores é de 12 anos, enquanto a rotação dos
animais é bianual, utilizando-se bovinos de 18 meses, entrando com 5 @ e saindo com 15
@. A forrageira considerada é a braquiária. Os dois sistemas apresentados a seguir servem
de exemplo para debater a viabilidade da integração, existindo inúmeras possibilidades de
consórcio que o investidor deverá avaliar antes de tomar iniciativa de entrar nessa atividade.
Para elaboração do fluxo de caixa, considerando o sistema como um todo, ou seja, eucalipto
e bovinos, esses dados e mais os das Tabelas 6 e 7 foram computados anualmente. A
receita prevista, em um ciclo de 12 anos, foi de R$ 43.200,00 e os custos R$ 25.592,86,
resultando em um saldo acumulado de R$ 17.607,14 / ha.
514 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Pode-se identificar nos custos expostos na Tabela 7, as operações de desrama. Ela tem a
finalidade de elevar o valor da madeira sólida, por reduzir a presença dos nós mortos. Se
não houver interesse nos resultados dessa técnica, esta pode facilmente ser eliminada dos
custos de manutenção do eucalipto.
Os resultados dos critérios adotados indicam que o sistema silvipastoril adotado (250
árvores por ha e sistema rotacionado para a pecuária de corte, em horizonte de 12 anos),
permite retorno financeiro superior à pecuária convencional, embora não supere o cultivo
do eucalipto em plantio homogêneo. O VPL para esta atividade foi positivo (VPL = R$
1.831,01), com taxa de retorno do investimento prevista (TIR = 15,5%) superior aos 12%
utilizados como taxa de juros e mais de três vezes maior do que aquela de 4,3% obtida para
a pecuária extensiva. A razão benefício/custo (B/C) também foi superior, atingindo 1,12.
Estes resultados são suficientes para darem ao sistema silvipastoril, mesmo com baixa
densidade de árvores de eucalipto, vantagem em relação ao sistema tradicional de
pecuária de corte. É preciso lembrar, no entanto, que o montante do investimento a ser
feito nesse sistema também é várias vezes superior que na pecuária tradicional.
A seguir serão apresentadas situações com diferenças ainda mais favoráveis ao sistema
silvipastoril, em contraponto à pecuária convencional e também superiores ao cultivo
homogêneo de eucalipto.
Tabela 6. Composição dos custos de implantação de um ha de eucalipto por operação, em sistema silvipastoril, considerando as
atividades mecanizadas, manuais e a aplicação de insumos, em espaçamento 10 x 4 m (250 plantas por ha).
Mecanizado Manual Insumo CUSTO
Operação
hM/ha R$/hM R$/ha hH/ha R$/hH R$/ha Especificação Qte/ha R$/Un R$/ha R$/ha
Projeto e topografia 18,95
Constr. estradas e aceiros 0,64 69,00 44,16 44,16
0,08 170,00 13,60 13,60
Gradagem Rome 0,50 44,00 22,00 22,00
1º combate a formigas 7,50 4,00 30,00 Formicida gran. (kg) 6,00 7,50 45,00 75,00
Alinhamento/balizamento 1,78 4,00 7,12 7,12
Mistura de corretivos 1,17 4,00 4,68 Fosf. nat. (kg) 400,00 0,70 280,00 284,68
Distribuição corretivos 0,25 16,80 4,20 4,20
Gradagem bedding 0,25 44,00 11,00 11,00
Coveamento 2,14 4,00 8,56 8,56
Distribuição de adubos na cova 0,09 16,80 1,51 0,83 4,00 3,32 NPK(6-30-6) (kg) 38,00 0,90 34,20 39,03
KCl 25,00 1,20 30,00 30,00
Distribuição de cupinicida cova 0,83 4,00 3,32 Cupinicida (kg) 2,50 7,50 18,75 22,07
Mistura adubo/cupinicida 1,50 4,00 6,00 6,00
Aplicação herb pré-emergente 35,00 Goal 66,00 101,00
2º combate a formigas 1,50 4,00 6,00 Formicida gran. (kg) 0,50 7,50 3,75 9,75
Reforma de aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
Transporte de mudas 0,15 15,70 2,36 0,60 4,00 2,40 4,76
Distribuição de mudas 1,25 4,00 5,00 5,00
Plantio 2,76 4,00 11,04 Mudas 250,00 0,40 100,00 111,04
3º combate a formigas 0,94 4,00 3,76 Formicida gran. (kg) 0,50 7,50 3,75 7,51
Replantio 1,00 4,00 4,00 Mudas 25,00 0,40 10,00 14,00
Irrigação 0,30 16,80 5,04 0,75 4,00 3,00 8,04
madeira sólida
Sustentabilidade econômica de sistemas silvipastoris com eucalipto focados na produção de
Capítulo 31
(ano 0)
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
1ª Manutenção
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr. (kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
CUSTO (R$/ha) 53,14 10,76 108,40 172,30
Aplicação de herbicida pós-emergente 35,00 0,00 4,00 0,00 Herbicida 7,00 42,00
1ª desrama (até 4,00 m) 6,00 4,00 24,00 24,00
Adubo 150 g/planta 24 meses 0,09 16,80 1,51 0,23 4,00 0,92 NPK(18-00-18) (kg) 38,00 0,90 34,20 36,63
(ano 1)
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
2ª Manutenção
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr. (kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
(ano 2)
3ª Man.
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr. (kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
CUSTO (R$/ha) 48,60 124,00 22,00 194,60
3ª desrama (até 8,00 m) 29,00 4,00 116,00 116,00
conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
(ano 3)
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr. (kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
4ª Man.
CUSTO (R$/ha) 13,60 124,00 15,00 152,60
Continua...
Tabela 7. Continuação.
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
(anos 4 a 11)
5ª à 11ª Man.
CUSTOS ANUAIS (R$/ha) 13,60 8,00 15,00 36,60
B
Figura 2. (A) Sistema silvipastoril com eucalipto (híbridos: urograndis – I 244, esquerda; (B): grancam – I 1277,
direita) e gado de corte, de alta densidade arbórea [espaçamento variado de 16 a 27 m (entre aleias) x 3 x 1,85 m
(entre linhas e plantas)], gramínea Urochloa brizantha, com dois anos de idade, Fazenda São Paulo, Ivinhema-MS
Capítulo 31
Sustentabilidade econômica de sistemas silvipastoris com eucalipto focados na produção de 519
madeira sólida
Estes são colheitas que se realizarão aproximadamente aos quatro e aos oito anos de idade
(períodos que devem ser definidos por meio de inventário florestal), com algumas finalidades
principais: a) retirar indivíduos para dar espaço ao crescimento das árvores remanescentes;
b) antecipar receita antes do corte final; c) evitar mortalidade por competição; d) permitir
melhor desenvolvimento da forrageira nas proximidades das árvores.
Além disso, pode-se observar na Tabela 9 os custos das desramas, lembrando que estes
variam bastante para cada região.
Para elaboração do fluxo de caixa, considerando o sistema como um todo, ou seja, eucalipto
e bovinos, esses dados e mais os das Tabelas 8 e 9 foram computados anualmente. A
receita prevista, em um ciclo de 12 anos, foi de R$ 80.746,10 e os custos R$ 26.268,06,
resultando em um saldo acumulado de R$ 54.478,04 / ha.
Os critérios adotados indicam que a composição com 755 árvores por ha e sistema
rotacionado para a pecuária de corte, em horizonte de 12 anos, permite retorno financeiro
superior à pecuária convencional, ao plantio homogêneo de eucalipto e ao sistema
silvipastoril de baixa densidade arbórea (250 árvores).
O VPL para esta atividade foi positivo (VPL = R$ 14.241,58), com taxa de retorno do
investimento prevista (TIR = 29,3%), mais do que o dobro dos 12% utilizados como taxa
de juros, 6,8 vezes maior do que aquela de 4,3% obtida para a pecuária extensiva e o
dobro da TIR obtida no sistema silvipastoril de baixa densidade previamente analisado. A
razão benefício/custo (B/C) também foi superior, atingindo 1,86.
Este sistema silvipastoril com 755 árvores por hectare apresenta alta viabilidade econômica,
possibilitando manter a atividade pecuária, incluindo a atividade florestal, em uma união
que eleva a rentabilidade de cada unidade de área várias vezes, quando comparado aos
sistemas tradicionais de plantio de eucalipto e criação de bovinos de corte. Assim como
no sistema silvipastoril de baixa densidade arbórea, é preciso lembrar que o investimento
a ser feito também é mais elevado.
520
Tabela 8. Composição dos custos de implantação de um ha de eucalipto por operação, em sistema silvipastoril, considerando as
atividades mecanizadas, manuais e a aplicação de insumos, em espaçamento 16 x 3 x 2 m (755 plantas por ha) e dois desbastes
previstos para 4 e 8 anos.
Mecanizado Manual Insumo CUSTO
Operação
hM/ha R$/hM R$/ha hH/ha R$/hH R$/ha Especificação Qte/ha R$/Un R$/ha R$/ha
Projeto e topografia 30,75
Constr. estradas e aceiros 0,64 69,00 44,16 44,16
0,08 170,00 13,60 13,60
Gradagem pesada 0,50 44,00 22,00 22,00
1º combate a formigas 7,50 4,00 30,00 Formicida gran. (kg) 6,00 7,50 45,00 75,00
Alinhamento/balizamento 4,90 4,00 19,60 19,60
Mistura de corretivos 1,17 4,00 4,68 Fosf. nat. (kg) 400,00 0,70 280,00 284,68
Distribuição corretivos 0,25 16,80 4,20 4,20
Gradagem Bedding 0,25 44,00 11,00 11,00
Coveamento 6,50 4,00 26,00 26,00
Distribuição de adubos na cova 0,27 16,80 4,54 2,50 4,00 10,00 NPK(6-30-6) (kg) 115,00 0,90 103,50 118,04
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
(ano 0)
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
1ª Manutenção
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
CUSTO (R$/ha) 53,14 10,76 108,40 172,30
Aplicação de herbicida pós-emergente 35,00 0,00 4,00 0,00 Herbicida 7,00 42,00
1ª desrama (até 4,00 m) 6,00 4,00 24,00 24,00
Adubo 150 g/planta 24 meses 0,09 16,80 1,51 0,23 4,00 0,92 NPK(18-00-18) (kg) 38,00 0,90 34,20 36,63
(ano 1)
Conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
2ª Manutenção
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
CUSTO (R$/ha) 50,11 32,92 56,20 139,23
Aplicação de herbicida pós-emergente 35,00 0,00 4,00 0,00 Herbicida 7,00 42,00
2ª desrama (até 6,00 m) 29,00 4,00 116,00 116,00
conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
(ano 2)
3ª Man.
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
CUSTO (R$/ha) 48,60 124,00 22,00 194,60
3ª desrama (até 8,00 m) 29,00 4,00 116,00 116,00
conservação de estradas e aceiros 0,08 170,00 13,60 13,60
(ano 3)
Combate a formigas 2,00 4,00 8,00 Formicida gr.(kg) 2,00 7,50 15,00 23,00
4ª Man.
CUSTO (R$/ha) 13,60 124,00 15,00 152,60
madeira sólida
Sustentabilidade econômica de sistemas silvipastoris com eucalipto focados na produção de
Capítulo 31
Continua...
521
522
Tabela 9. Continuação.
(anos 4 a 11)
5ª à 11ª Man.
CUSTO DE MANUTENÇÃO (R$/ha) 274,25 355,68 321,60 951,53
CUSTO DE IMPLANTAÇÃO E MANUTENÇÃO (R$/ha) 426,72 453,88 913,05 1793,65
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Capítulo 31
Sustentabilidade econômica de sistemas silvipastoris com eucalipto focados na produção de 523
madeira sólida
Comentários finais
A pecuária extensiva tem se descapitalizado gradativamente, em função dos baixos preços
da carne pagos ao produtor, dos elevados custos de produção e da baixa capacidade de
suporte das pastagens, particularmente no bioma Cerrado.
Ao mesmo tempo que traz o equilíbrio financeiro ao produtor, também traz consigo
a manutenção de postos de trabalho na zona rural, a valorização da remuneração dos
trabalhadores do campo, a redução do êxodo rural provocado pelo monocultivo,
melhorias na conservação ambiental de solos e águas, a possibilidade de formação de
novos polos industriais consumidores de madeira e muitos outros benefícios.
Referências
DANIEL, O. Viabilidade econômica de um sistema agrissilvipastoril para a mesorregião sudoeste de Mato Grosso
do Sul. Cadernos de Agroecologia, v. 5, n. 1, p. 1-5, 2010.
HEID, D. M.; DANIEL, O.; PADOVAN, M. P.; VITORINO, A. C. T.; FREITAS, M. E. Atributos físicos e teor de matéria
orgânica de sistemas agroflorestais biodiversos em um Neossolo Quartzarênico. In: CONGRESSO BRASILEIRO
DE SISTEMAS DE PRODUÇÃO, 4., 2010, São Luiz, MA. Resumos... São Luiz: Sociedade Brasileira de Sistemas de
Produção, 2010. p. 1-5.
PEZARICO, C.; VITORINO, A. C. T.; MERCANTE, F. M. Indicadores de qualidade do solo em sistemas agroflorestais.
Revista de Ciências Agrárias, v. 56, n. 1, p. 40-47, jan./mar. 2013.
PEZZONI, T.; VITORINO, A. C. T.; DANIEL, O.; LEMPP, B. Influência de Pterodon emarginatus Vogel sobre atributos
físicos e químicos do solo e valor nutritivo de Brachiaria decumbens Stapt em sistema silvipastoril. Cerne, v. 18,
n. 2, p. 293-301, abr./jun. 2012.
SILVA, M. L.; FONTES, A. A. Discussão sobre os critérios de avaliação econômica: valor presente líquido (VPL), valor
anual equivalente (VAE) e valor esperado da terra (VET). Revista Árvore, v. 29, n. 6, p. 931-936, nov./dez. 2005.
Davi J. Bungenstab
Capítulo 32
Benefícios da sombra em sistemas em
integração lavoura-pecuária-floresta nos
trópicos
Fabiana Villa Alves
Nivaldo Karvatte Junior
526 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Com aproximadamente dois terços do rebanho localizado em zona intertropical (Figura
1) e sistemas de produção quase que exclusivamente a pasto (FERRAZ E FELICIO, 2010), o
Brasil é um dos maiores produtores e exportadores de carne bovina no mundo.
De acordo Giro et al. (2019), animais com acesso à sombra natural se beneficiam do
ambiente mais ameno, com maior conforto térmico, além de favorecer o uso racional
dos recursos naturais. Em estudo avaliando o efeito da sombra no comportamento de
bovinos de corte, tais autores observaram, animais produzidos em sistema em integração
lavoura-pecuária-floresta, buscaram preferencialmente a sombra, enquanto houve uma
redução de 23% na frequência de procura por água. Neste mesmo sentido, Souza et al.
(2019) observaram que, embora submetidas a estresse moderado, novilhas Girolando
em pastagens sombreadas com eucalipto apresentaram temperaturas internas corporais
mais baixas, maior período de pastejo diurno e menor tempo de consumo de água.
De fato, para Oliveira et al. (2017), a presença de sombra natural em sistemas de produção
a pasto oferece melhores condições de conforto aos animais. Ao comparar o microclima
e conforto térmico de sistemas em integração lavoura-pecuária-floresta, com diferentes
densidades de árvores, os autores observaram uma redução de 3,4 unidades no Índice
de Temperatura de Globo Negro e Umidade (ITGU) no sistema com maior densidade de
árvores (ITGU = 77), comparado a condição de sol pleno (ITGU=80,4).
528 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 3. Estimativa da variação da intensidade da radiação solar que atinge a superfície terrestre na faixa
intertropical do Hemisfério Sul no nível do mar, considerando um valor m = secΨ para a massa atmosférica,
ausência de nuvens e coeficiente de turbidez atmosférica t = 0,1. Fonte: Silva, 2006.
Assim, a zona intertropical, ilustrada na Figura 1, é aquela que apresenta maior intensidade
de radiação solar, pois o sol se posiciona no zênite, isto é, perpendicularmente sobre
a superfície terrestre, em alguma época do ano (SILVA, 2006). No Brasil, apesar dos
diferentes tipos climáticos e características ambientais do território, a irradiação solar é
Capítulo 32
Benefícios da sombra em sistemas em integração lavoura-pecuária-floresta nos trópicos 529
alta e bastante uniforme durante todo o ano. Valores máximos de até 6,5 kWh/m2/dia são
encontrados para o semiárido nordestino, Norte de Minas Gerais, Nordeste de Goiás e Sul
de Tocantins, e mínimos de 4,5 kWh/m2/dia, para as regiões costeiras dos estados mais
ao Sul do país (Norte de Santa Catarina, Paraná e Sul de São Paulo) (MARTINS et al., 2008).
A região central do Brasil, também denominada “Brasil pecuário”, é a que recebe maior
incidência de radiação solar. Em determinadas épocas do ano são registrados valores
superiores a 1.000 Wm-2, com comprimento de ondas (curtas) que variam em torno de
250-2.500 nm durante os meses de verão (solstício), reduzindo consideravelmente (800
Wm-2 ou menos) no restante do ano (SILVA, 2006; AGGARWAL e UPADHYAY, 2013).
Durante as estações secas, particularmente entre os meses de julho e setembro, quando
a precipitação é baixa e o número de dias com céu claro, com poucas nuvens, alto, a
ação dos efeitos climáticos é ainda maior (MARTINS et al., 2007). Esta condição pode ser
considerada uma grande vantagem em termos do crescimento de árvores e pastagens,
porém diminui o conforto térmico de animais criados a céu aberto, sendo necessários
abrigos, naturais ou artificiais, como medida de proteção contra a radiação solar excessiva
(SILVA, 2006; GLASER, 2008).
Desse modo, ao modificarem a superfície onde estão instalados pela presença de árvores,
os sistemas silvipastoris ou agrossilvipastoris alteram a transferência de radiação solar
por meio do sombreamento (restringindo a incidência de radiação) e da reflexão de
radiação pelas copas das árvores (PORFÍRIO da SILVA et al., 2004). A presença de árvores
desempenha papel importante no fluxo de calor latente e sensível diurno, devido ao
aproveitamento de uma fração da radiação solar que incide no sub-bosque (Figura 4).
Esta fração, denominada de radiação fotossinteticamente ativa (RFA), corresponde ao
fluxo de fótons na faixa de 400 a 700 nm do espectro solar, e é responsável pelo controle
da umidade relativa e temperatura do ar no local sombreado.
Figura 4. Foto ilustrativa da interceptação de radiação solar pela copa das árvores em um sistema de integração
lavoura-pecuária-floresta com eucaliptos. Fonte: Nivaldo Karvatte Junior.
530 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 5. Influência dos renques arbóreos na transferência de radiação. Comparação da superfície com e sem
renques paralelos para: a) recepção de radiação direta de ondas curtas (S), em que α é o ângulo entre a normal
do plano de superfície e a direção da fração de radiação que a atinge e β é o ângulo de elevação do sol acima
do horizonte; b) emissão de radiação direta de ondas longas (OL), em que a FVC é a visada da abóbada celeste,
variável em função da altura e distância entre dois renques, e; c) reflexão de S. Fonte: adaptado de Porfírio da
Silva et al., 2004.
A B
Figura 6. Influência da presença de árvores em pastagem na alteração do gradiente térmico em um raio de até
50m da copa, mesmo no pleno sol (A) e na projeção da sombra (B). Fonte: Abreu e Labaki (2010), Gurgel et al. (2012).
532 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Em condições de sombra excessiva, a luz solar filtrada através dos dosséis das árvores
é enriquecida em infravermelho, resultando em formação de ilhas de calor, podendo
comprometer o bem-estar animal (WENG et al., 2004; LEUZINGER et al., 2010). Resultados
preliminares obtidos com o uso da termografia por infravermelho em sistemas
agroflorestais (Figura 7) revelam diferenças de 1,0 a 4,2°C de temperatura e de 3,5 a 12,7
pontos percentuais na umidade entre as superfícies das copas das árvores e da pastagem
(KARVATTE JUNIOR, 2018). Segundo o autor, situações com maiores temperaturas e
umidades da superfície da pastagem representam a menor condutância estomática e
atividade de evapotranspiração da forrageira em função do maior estresse hídrico ao
nível do solo, resultando na emissão de uma parcela de radiação (infravermelha) para o
ambiente de produção.
Capítulo 32
Benefícios da sombra em sistemas em integração lavoura-pecuária-floresta nos trópicos 533
A B
Figura 7. Temperatura (A) e umidade (B) determinadas por termografia, em sistemas em integração lavoura-
pecuária-floresta. Foto: Nivaldo Karvatte Junior.
Neste aspecto, a espécie, dimensão da árvore, formato geométrico de sua copa e o ângulo
de incidência do sol, entre outros, são fatores que determinarão a quantidade e qualidade
da sombra produzida, bem como os seus benefícios (Figura 8).
Figura 8. Projeções de sombra de espécies arbóreas com copas de diferentes formatos geométricos, em que H =
altura total; Ht = altura do tronco; Hc = altura da copa; r = raio. Fonte: adaptado de Silva, 2006.
Tais considerações são muito relevantes, e pouco abordadas em outros estudos, pelo fato
de que maiores ou menores latitudes locais, bem como a época do ano (primavera, verão,
outono e inverno) e horário do dia, interferem no modo como a radiação solar atinge a
superfície terrestre.
A gama de espécies arbóreas com potencial de utilização para sombra em sistemas pecuários
no Brasil é ampla, embora, para sistemas em integração, características de crescimento
e conformação de copa compatíveis com a integração, devam ser cuidadosamente
observadas, principalmente quando o enfoque é na ambiência animal (CASTRO et al.,
2008). Rápido crescimento, capacidade de adaptação às condições de solo e clima das
diferentes regiões tradicionalmente pecuárias, e possibilidade de diversificação de renda na
propriedade, devido ao seu múltiplo uso, faz com que as espécies arbóreas mais utilizadas
no Brasil em sistemas em integração sejam dos gêneros Eucalyptus e Corymbia.
Figura 10. Animais nelore em sistema de integração lavoura-pecuária-floresta com eucalipto e capim-piatã,
após 40 meses de implantação.
536 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Quando o acesso à sombra não for disponível, os animais preferem os horários de menor
radiação, pastejando até 63,7% do tempo destinado a este comportamento durante as
9h00 e 13h00 e entre 15h00 e 17h00 (FERREIRA, 2010; DOMICIANO et al., 2016). Lopes
et al. (2016), ao avaliar o comportamento de novilhas leiteiras em sistemas silvipastoris
com diferentes densidades e arranjos espaciais de árvores, observaram que os animais
que permaneceram expostos ao sol, apresentaram maior porcentagem do tempo
caminhando (3,2 %) e pastejando (10,8 %) em comparação aos animais inseridos em
sistema silvipastoril (caminhando 1,3 %; pastejando 6,5 %). Estes resultados sugerem que
em sistemas sem sombra, animais menos adaptados ao calor caminham por mais tempo
em busca de locais com maior conforto térmico. Giro et al. (2019) observaram que bovinos
Canchim apresentaram melhor aproveitamento das atividades de pastejo em sistemas
em integração lavoura-pecuária-floresta, com redução de até 23% no consumo de água,
em relação ao sistema sem árvores. Domiciano et al. (2016) observaram que o tempo
dedicado a ruminação foi de 3,6% no sol e 20% na sombra. Ao analisar a posição utilizada
para tal comportamento, os animais permaneceram em pé durante 0,9% do tempo ao sol,
e 2,7% à sombra, enquanto deitados, o tempo gasto foi de 3,5% ao sol e 16,5% à sombra.
Também em sistemas de integração com eucalipto, Souza et al. (2010) verificaram que
novilhas aneloradas permaneceram, em média, 47% do tempo disponível sob a sombra
das árvores.
Reflexos do maior conforto térmico no desempenho animal foram observados por Luz
(2017), ao avaliar novilhos Nelore mantidos em sistemas em integração com e sem árvores
(integração lavoura-pecuária/ILP e integração lavoura-pecuária-floresta/ILPF com maior
e menor adensamento) Os animais mantidos em ILPF apresentaram maior ganho médio
diário (0,484 vs 0,394 kg.dia-1), peso vivo final (455,23 vs. 443,18 kg), peso de carcaça
quente (258,66 vs. 255, 16 kg) e rendimento de carcaça (57,48 vs. 56,82%), comparado ao
sistema ILP.
Considerações finais
Os sistemas em integração, com presença do componente arbóreo (agrossilvipastoris
e silvipastoris), constituem alternativas viáveis do ponto de vista técnico, ambiental
e socioeconômico aos modelos tradicionais de produção pecuária, com melhoria da
capacidade produtiva da terra e otimização da utilização dos recursos disponíveis.
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 33
Escolha de animais e formação de lotes de
bovinos para sistemas de integração
Luis Armando Zago Machado
Elton Bock Correa
Fernando Miranda de Vargas Junior
Gelson Luis Dias Feijó
544 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
A integração lavoura-pecuária (ILP) constitui sistemas intensivos com algum grau de
interação entre os cultivos anuais e perenes (destinados à produção de grãos, fibras
ou energia) e a pecuária (principalmente a bovinocultura). Embora sendo atividades
complementares, a pecuária deve ser tão competitiva quanto à agricultura, de tal forma
que compense a ocupação de áreas com grande potencial de produção, preço elevado
e solos férteis. Os resíduos de fertilizantes e corretivos deixados no solo nos ciclos com
agricultura têm um custo e, ao serem parcialmente perdidos durante a ocupação da área
com pastagens, devem ser pagos pela atividade pecuária.
As pastagens têm funções nos sistemas ILP que vão além da produção animal, como
a prestação de serviços ambientais, por exemplo (Carvalho et al., 2009). A rotação de
pastagem com culturas anuais tem sido uma forma econômica de reduzir problemas
fitossanitários com nematoides (Carneiro et al., 2006), doenças como o mofo-branco
(Görgen et al., 2009) e com plantas daninhas (Gazziero et al., 2014). Com isso, muitos
agricultores estão entrando na atividade pecuária, mas a falta de conhecimentos básicos
tem limitado o resultado desse sistema. Um deles é a identificação de animais que
respondam à boa qualidade nutricional das pastagens. As escolhas feitas na aquisição
do gado podem determinar o lucro que o produtor irá obter com recria e engorda destes
animais (Ferreira et al., 2004).
Com base na aparência dos animais, o produtor necessita identificar e escolher aqueles
que apresentem potencial de ganho de peso e que irão produzir carcaças com a qualidade
exigida pelo mercado consumidor.
Neste capítulo serão discutidos alguns critérios para a escolha de bovinos para os sistemas
de integração lavoura-pecuária (ILP).
da pecuária de leite ou de corte que teria maiores ganhos quando utilizada em ILP.
Essas escolhas transcendem aspectos técnicos, pois algumas vezes dependem da
aptidão da propriedade e/ou desejo do produtor e, contra isso, não há argumentos.
Independentemente das possibilidades, vantagens e desvantagens do uso da pecuária
de leite em ILP, a partir desse ponto o foco passa a ser a pecuária de corte em ILP.
Solo com potencial agrícola é um pré-requisito para a implantação da ILP. Este tipo de terra
apresenta elevado valor comercial e, consequentemente, a pecuária desenvolvida neste
sistema deve apresentar lucratividade compatível com a lavoura. As fases mais lucrativas
na pecuária de corte são a recria e a engorda, que podem ser fundidas na ILP, dada à
grande disponibilidade de pasto de boa qualidade e de resíduos agrícolas que podem ser
utilizados na formulação de rações. Nesse sistema é possível obter elevado desempenho
por unidade animal e por unidade de área, resultando na produção de animais passíveis
de obter melhores remunerações, como aqueles inseridos em programas de apoio à
produção de animais jovens (novilho precoce) e nos diferentes protocolos de bonificação
vigentes nos frigoríficos.
Outra razão que dificulta a indicação do uso da fase de cria em sistemas de ILP é o aspecto
temporal, ou seja, a vaca, durante a fase produtiva, precisa permanecer na propriedade o
ano inteiro, isso dificulta a liberação de áreas para a fase de lavoura.
Em alguns casos especiais a cria pode fazer parte de sistemas mais extensivos contendo
partes da propriedade com ILP, porém as pastagens mais novas (reformadas) devem ser
priorizadas para as categorias com maior resposta à melhoria da qualidade da pastagem,
como recria e engorda de animais. Além disso, com a intensificação da pecuária de
corte, há redução da idade de abate e as fases de recria e engorda são condensadas,
sendo eliminadas as demais categorias (24 a 36 meses, ou mais). Com isso, há aumento
na demanda por bezerros de boa qualidade. Em regiões em que o preço da reposição
é muito elevado, a rentabilidade das fases de recria e engorda pode ser comprometida.
Nessa situação especial, a cria pode ser justificada em sistemas contendo ILP.
Mesmo com as restrições elencadas, há dois enfoques que podem justificar o uso da fase
de cria em ILP: a qualidade (via genética) e/ou o mercado (pelo custo da reposição). A cria
pode estar focada no melhoramento genético do rebanho, visando à produção intensiva
de bezerros, permitindo a seleção de vacas que repitam cria, que desmamem bezerros
mais pesados e que proporcionem algum ganho de qualidade. Nesse caso, os resultados
são esperados de médio a longo prazo. Já quando focada no mercado, visa-se resultados
a curto prazo, comercializando as categorias mais valorizadas e adquirindo outras com
baixo valor. Nesse caso a proporção de animais na cria, recria e engorda varia em função
546 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Uma vez definido o tipo de pecuária a ser explorada em ILP é necessário definir o tipo de
animal a ser utilizado.
Fatores como categoria, raça, tipo, idade, condição corporal, qualidade zootécnica e
estado sanitário tem grande influência no desempenho dos lotes e, portanto, devem ser
consideradas no momento da compra.
A B C
Figura 1. Deposição de cordura na altura do corte transversal sobre a 12ª costela de uma novilha (A), um novilho
(B) e um animal inteiro (C) recriados em confinamento e abatidos aos 14 meses.
As novilhas são mais precoces que os machos no acabamento (Peixoto, 1993), por isso são
aceitas para o abate com menor peso, no mínimo 12@ de carcaça (Figura 2). Apesar delas
apresentarem ganhos de peso ligeiramente inferiores aos dos machos e, geralmente,
o preço da arroba ser um pouco inferior, as novilhas vem sendo muito utilizadas nos
sistemas ILP por apresentar menor período de acabamento e, por isso, possibilitam rápido
giro de capital. As bezerras são adquiridas no momento da desmama, com cerca de 7 a
8 meses e atingem peso de abate próximo aos 24 meses de idade, permanecendo na
propriedade de 12 a 18 meses.
Capítulo 33
Escolha de animais e formação de lotes de bovinos para sistemas de integração 547
A recria e a engorda de bovinos machos é outra possibilidade, porém a fase de recria é mais
longa, sendo exigido peso mínimo para o abate de 15 @ de carcaça e bom acabamento,
com idade que se enquadre como novilho precoce. A deposição de gordura pode ser
crítica em bovinos jovens, inteiros e/ou cruzados com raças de maior porte, como as
continentais que são mais tardias. Para os animais que não estiverem terminados ou que
estiverem com peso insuficiente para abate dentro do prazo previsto no planejamento de
rotação, normalmente no final do verão, pode ser necessário suplementá-los ou confiná-
los, para que atinjam melhores condições de comercialização, isso aumentará o custo de
produção que pode não ser compensado pelos preços que esses animais atingem na hora
da venda. Sem estas práticas o sistema pode ficar comprometido pelo excesso de lotação
em períodos com menor disponibilidade de pasto, havendo superpastejo e queda do
desempenho dos animais. Essa situação contribui para degradação do solo, o que pode
comprometer a produtividade das culturas utilizadas após a pastagem.
A terminação dos animais pode ser afetado pelo manejo. Animais inteiros apresentam
melhor desempenho e maior rendimento de carcaça que castrados (acima de 10% em
ganho de peso e cerca de uma @ a mais) (Porto et al., 2000; Restle et al., 2000; Turini et al.,
2015). Assim, os bovinos inteiros necessitam de uma dieta mais rica em energia na fase de
acabamento, implicando em aumento no desembolso com suplementos (concentrado
ou sal proteico-energético). Avaliando animais F1 Nelore x Charolês em pastagem de
Brachiaria decumbens com o uso de suplemento, Ítavo et al. (2008) obtiveram maior
548 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
ganho médio diário e maior lucratividade com animais inteiros em relação aos castrados.
A castração, porém, resultou em carcaças com maior espessura de gordura e animais
com carne com coloração vermelha menos escura em relação aos animais inteiros. A
gordura contribui para que a temperatura da carne baixe mais lentamente o que reduz
a possibilidade de escurecimento (Embrapa, 1997) e completo rigor mortis do músculo e
beneficiando a maciez da carne (Costa et al., 2012). De acordo com Alves Neto (2016), dos
bovinos inteiros terminados a pasto em 2015, 70% tiveram cobertura de gordura ausente.
Para que isto não ocorra, os machos inteiros devem ser abatidos antes dos 24 meses, o
que reduz a sodomia e garante uma boa qualidade da carne (Coutinho Filho et al., 2006).
Uma prática bastante difundida entre os pecuaristas é castração, que permite antecipar a
terminação de bovinos machos. Independentemente da época em que for realizada, do
nascimento aos 18 meses, a castração favorece a deposição de gordura e o acabamento
de carcaça (Porto et al., 2000; Turini et al, 2015; Dias et al., 2016) (Figura 3). Em geral, os
animais castrados produzem carcaças com maior espessura de gordura e carne com
melhor apresentação (Figura 1), que são características valorizadas pelo mercado (Ítavo et
al., 2008; Abbá et al., 2012; Silva et al., 2014). Animais com essas características apresentam
maior facilidade de comercialização e melhores preços. Além disso, o custo com a
terminação é menor, já que a quantidade de suplementos oferecida a pasto ou o tempo
de confinamento para o acabamento dos animais podem ser diminuídos.
A B
Figura 3. Bovinos machos ½ sangue Nelore e Charolês, inteiro (A) ou castrado (B), prontos para o abate aos
22 meses.
Capítulo 33
Escolha de animais e formação de lotes de bovinos para sistemas de integração 549
Optar por animais inteiros pode ser interessante nos cruzamentos com raças britânicas, já
que esses tem facilidade para acumular gordura. O uso de animais inteiros pode ser viável
quando há disponibilidade de suplementos energéticos a baixo custo e quando não há
restrições na comercialização de gado gordo. Faz-se essa ressalva, pois, nos últimos anos,
a maioria dos frigoríficos voltou a pagar valores menores pela carcaça de animais inteiros.
Em função disso, o produtor deve fazer contas para ver se é interessante usar animais
inteiros em sistemas de ILP. A decisão pela terminação de bovinos inteiros, portanto,
também depende do mercado. Se o frigorífico comprador impuser restrições a este tipo
de animal, aplicando descontos no valor pago pela arroba, os ganhos em desempenho
obtidos no campo, representados pelo maior peso de carcaça, são trocados pelos
descontos no preço da arroba.
Se o sistema de produção não permitir o abate dos bovinos inteiros até por volta dos
dois anos de idade é imperioso que os bovinos sejam castrados, pois a diminuição na
qualidade das carcaças e da carne de animais inteiros pode acarretar em prejuízos ao
produtor e comprometer a eficiência do sistema ILP.
Raças
As raças de gado de corte podem ser divididas, segundo Ferraz e Eler (2000), em quatro
grupos (Figura 4):
2) Não zebuínas adaptadas aos trópicos – São animais com alto grau de
adaptabilidade ao clima tropical, fertilidade e boa qualidade de carcaça e carne.
Destacam-se as raças Senepol, Bonsmara e Caracu. Nesse grupo se enquadram
algumas raças compostas, principalmente, pela considerável capacidade de uso
de touros em monta natural nas condições tropicais, como a Brangus, Braford e
Canchin.
A B
C D
E F
Figura 4. Garrotes das raças: Nelore (A) e de seus cruzamentos com Red Angus (B), Simental (C), Charolês (D),
Hereford (E) e Holandês (F).
As raças indianas, como a Nelore, são as mais adaptadas ao ambiente tropical e apresentam
bom desempenho com forrageiras de pior qualidade. Já as raças europeias apresentam
maior ganho de peso e conversão alimentar quando o alimento possui melhor valor
nutricional, porém são menos adaptadas ao clima quente e mais sensíveis aos parasitas.
Raças especializadas para a produção de carne são mais eficientes para esse propósito
que as destinadas à produção de leite ou dupla aptidão.
O gado de origem leiteira, mestiços das raças Holandesa ou Gir, embora possa ser
utilizado para corte, não são os mais indicado para sistemas intensivos, tendo em vista que
produzem carcaças com menor rendimento, apresentam dificuldades na distribuição do
acabamento e tem cobertura de carne deficiente, sendo penalizado na comercialização.
Tipo
O tipo pode ser definido como o somatório das características morfológicas externas. O
tipo e a conformação referem-se ao tamanho do esqueleto do animal, considerando-se o
comprimento, a altura e a largura do corpo. A conformação permite classificar os animais
em longilíneos, medilíneos e brevilíneos (compactos) (Figura 5).
Devem ser refugados animais dos tipos extremos, ou seja, ou excessivamente compactos
ou longilíneos. Nas grandes produções extensivas e nos leilões de gado, não são raros bois
com membros muito desenvolvidos e pouca musculatura (tardios para o acabamento e
conversão alimentar ruim) e animais muito curtos, que apesar de chegarem ao ponto
de abate rapidamente, costumam apresentar baixo peso e são pouco eficientes na
transformação de pasto em ganho de peso.
552 Fotos: Luís Armando Zago Machado
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Idade e desenvolvimento
Os animais mais jovens em fase de crescimento, antes da puberdade, são mais eficientes
e geralmente apresentam ganho de peso elevado porque estão depositando músculo
nesta fase que chega ser 2,5 vezes menos exigente em calorias do que depositar o mesmo
equivalente em tecido gordo. A principal justificativa desta diferença é que o tecido
muscular apresenta em média 75% de água e o tecido gordo 25%, sendo este último
maior concentrador de energia por quilo, demandando mais energia para depósito da
mesma quantidade em peso. Esta diferença é acelerada após a puberdade quando o
animal começa a deposita mais gordura proporcionalmente que músculo (Owens et al.,
1993). No momento que o animal atinge a puberdade há desaceleração do ganho de peso,
diminuindo o ritmo de desenvolvimento do tecido ósseo e muscular, intensificando-se a
deposição de gordura. Raças que atingem a puberdade mais cedo produzem carcaças
menores, porém são mais precoces no acabamento (Bridi, 2010).
Muitos pecuaristas tradicionais preferem comprar “era”, ou seja, entre dois animais com
o mesmo peso, tendem a comprar os mais velhos. Isto porque animais jovens são mais
exigentes em proteína e nem sempre os produtores estão preparados para atender a
necessidade desta categoria.
Deficiência na ossatura (ossos finos) pode indicar que o animal passou por severa restrição
alimentar em alguma fase de sua vida, podendo resultar em menor desempenho num
Capítulo 33
Escolha de animais e formação de lotes de bovinos para sistemas de integração 553
A idade dos bovinos pode ser estimada com alguma segurança a partir do número de
dentes incisivos (Figura 6).
Figura 7. Evolução do preço do Kg unitário de bezerros e bois gordos no período de 2000 a 2018 (preços em
US$) (Cepea, 2018).
Figura 8. Relação de troca na reposição de bois gordos por bezerros (recria) ou por bois magros (engorda)
período de 1995 a 2014 (Anualpec, 2015).
Capítulo 33
Escolha de animais e formação de lotes de bovinos para sistemas de integração 555
Como princípio, a reposição deve ser feita logo após a venda dos animais gordos, mas
devido às particularidades do mercado de bezerros, o produtor pode adotar estratégias na
aquisição de animais com melhor qualidade e/ou a preços mais atraentes. Normalmente, a
disponibilidade de bezerros é maior no final do verão (Figura 9), quando os criadores estão
fazendo a desmama e precisam reduzir a carga animal em suas pastagens, prevendo a
estação seca. Nesta época, a possibilidade de escolha é maior e o preço da arroba não está
tão valorizado quanto na entressafra. Numa análise do mercado de bezerros, Christofari et
al. (2009) detectaram que os bezerros comercializados na primavera custaram 14% mais
do que aqueles comercializados no outono, nos anos de 2004, 2005 e 2006.
Se o sistema for apenas de engorda, devem ser adquiridos animais com boa estrutura.
Estes animais necessitam colocar acabamento, porém é uma fase mais cara do que a
recria, exigindo mais gastos com energia para a formação de gordura.
A B
Figura 10. Garrote curto (A) e comprido (B).
Fotos: Luís Armando Zago Machado
A B
Figura 11. Garrote pouco (A) e muito (B) profundo.
Fotos: Elton Bock Corrêa
A B
Condição corporal
A condição corporal refere-se à aparência do animal, é o reflexo do seu estado nutricional e
sanitário, podendo variar numa escala de valores de um (muito magro) a cinco (completamente
gordo). Este fator deve ser considerado pelo produtor no momento da compra e na formação
de lotes. A aquisição de animais magros pode ser vantajosa quando se trata de gado adulto,
dependendo do valor pago pelo lote. No caso de bezerros, um escore baixo às vezes não é
interessante, tendo em vista que o potencial de ganho de peso pode ter sido comprometido
e isto se refletirá negativamente no seu desempenho durante a estação seguinte (Figura 14).
Estado sanitário
No momento da comercialização todos os animais devem atender aos padrões exigidos
pelo sistema de controle sanitário, sendo vacinados contra aftosa, raiva e brucelose. Em
Mato Grosso do Sul, embora a Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal
(IAGRO) não exija vacinação contra clostridioses (carbúnculo), esta deve ser realizada
preventivamente, já que a doença pode estar presente em todas as propriedades e o
animal infectado aparece morto, não havendo tempo para realização do tratamento.
Num lote animais pode haver alguns que, notoriamente, tiveram prejuízo no seu
desenvolvimento, seja por estarem mais magros que o restante ou pelo tamanho que não
condiz com a idade. Pode se estar relacionado a desnutrição ou a problema sanitário, às
vezes, crônico, que pode ou não apresentar risco de contágio. Quando possível, animais
com desenvolvimento comprometido ou com estado corporal muito inferior ao restante
do lote devem ser refugados no momento da compra, caso contrário, deverão ser isolados
do restante para observação. Um médico veterinário poderá diagnosticar o problema,
determinar o tratamento ou o destino destes animais.
Sobre o manejo sanitário dos animais, a Embrapa disponibiliza uma ferramenta gratuita
para os produtores rurais: o Calendário de Manejos Reprodutivo, Sanitário e Zootécnico .
Outros fatores
O tratamento recebido pelos bezerros durante a fase de cria pode influenciar no
seu desempenho durante a recria e a engorda. Bezerros mais pesados na desmama
apresentam maior capacidade de ganho de peso e atingirão peso de abate mais cedo.
Animais tratados com calma, sem gritos e atropelos no pasto e no mangueiro irão se
adaptar mais facilmente ao sistema de produção intensivo, com cercas eletrificadas, com
suplementação e alta concentração de animais. Com isto, o período de adaptação será
menor, reduzindo-se o estresse e os riscos com acidentes. Embora esta característica
normalmente não possa ser considerada num leilão, ela poderá valer para a compra
fidelizada, direto do produtor de bezerros.
O agrupamento por sexo é necessário porque durante o cio das vacas e novilhas há disputa
entre os machos, mesmo que castrados, prejudicando seu desempenho. A separação dos
animais por grupamento genético (raça) visa facilitar o manejo, a alimentação do rebanho
e homogeneidade do lote (Figura 15), principalmente na fase de acabamento. Animais de
origem zebuína e taurina (europeu) tendem a formar grupos distintos, o que dificulta sua
condução, já que os primeiros são mais ágeis.
Os animais maiores e mais velhos tendem a ser mais competitivos durante a alimentação
o que prejudica o desempenho dos mais jovens. Com formação de grupos homogêneos,
fica mais fácil atender as necessidades de cada categoria e, em alguns momentos, dar
tratamento diferenciado para cada lote.
Fotos: Luís Armando Zago Machado
A B
Figura 15. Lote de bovinos heterogêneos (A) e homogêneos (B).
560 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Em alguns casos o método de pastoreio pode ser alterado visando facilitar o agrupamento.
No pastoreio rotacionado há a tendência da formação de lotes maiores e menos uniformes.
Em algumas situações o pastoreio contínuo poderá ser utilizado visando à formação de
lotes menores e homogêneos, ex: separação de animais Nelore, cruzamento industrial e
mestiços de origem leiteira.
Animais com baixo desempenho não são adequados aos sistemas integrados, mas podem
ser úteis em sistemas tradicionais, com pecuária extensiva. Tão logo estes animais forem
identificados, deve ser feito seu descarte, pois eles podem comprometer o resultado do
lote, além de serem candidatos à terminação em confinamento, aumentando o prejuízo
já que não têm potencial para responder a uma tecnologia de produção tão intensiva e
de custo elevado.
O peso exigido varia entre os frigoríficos e com o sexo dos animais. Para fêmeas são
exigidas, no mínimo, carcaças de 12@, e para os machos 15@ e não mais que 22@. Esta
exigência visa à padronização dos cortes para comercialização da carne. Animais com peso
Capítulo 33
Escolha de animais e formação de lotes de bovinos para sistemas de integração 561
superior ou inferior têm seu preço penalizado, dependendo dos critérios estabelecidos
por cada frigorífico.
Figura 16. Padrão de acabamento de carcaças bovinas conforme MAPA nº 612, de 05 de outubro de 1989.
O produtor deve enviar para o abate animais que maximizem todas as possíveis bonificações
dos diferentes programas ou protocolos de valorização da carcaça bovina pecuária que
estão disponibilizados pelos diferentes frigoríficos. A Figura 17 contém um resumo dos
diferentes produtos que podem ser conseguidos quando são usados os critérios idade
e acabamento como forma de bonificação. O produto de melhor qualidade é aquele
que é obtido no encontro dos dois eixos, ou seja, um animal jovem e bem acabado. Esse
produto é interessante sob diferentes óticas da cadeia produtiva. Por exemplo, atende aos
mercados consumidores mais exigentes, pela excelente qualidade da carne produzida;
gera ganhos econômicos, pois proporciona aceleração do ciclo produtivo; e melhora a
sustentabilidade da pecuária, pois proporciona menor produção de gases de efeito estufa
por unidade de produto.
Figura 17. Esquema de valorização de carcaças bovinas baseado em dois critérios: a maturidade e o acabamento
das carcaças.
Considerações finais
A aparência geral de um bovino é o principal fator a ser considerado na compra, já que as
características morfológicas dos animais têm relação com seu desempenho.
Os conhecimentos utilizados na pecuária tradicional são úteis, mas devem ser ponderados
na integração lavoura-pecuária, já que nem todos se aplicam a um sistema de produção
intensivo.
Quanto mais jovem é o animal, maior é o seu potencial de ganho de peso, sendo esta a
categoria que deve ser preconizada na integração lavoura-pecuária.
Se a aquisição de animais com boa qualidade tem sido uma limitação para a expansão da
integração lavoura-pecuária, parcerias entre agricultores e pecuaristas poderão viabilizar
esses sistemas.
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 34
Suplementação de bovinos de corte na
integração lavoura-pecuária-floresta
Sergio Raposo de Medeiros
Rodrigo da Costa Gomes
Luiz Orcírio Fialho de Oliveira
568 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 1. Animais em suplementação no período seco em pastagem com boa disponibilidade forrageira.
A maior disponibilidade e qualidade das pastagens em sistemas de integração podem
ser potencializadas pela suplementação. Quando a qualidade da forragem é elevada, a
suplementação alimentar, principalmente a proteinada, pode ser dispensada (Ver item
sobre “Pasto Safrinha”). Muitas vezes, nessas situações, a suplementação com alimentos
energéticos (Figura 2), como o milho moído fino, pode ser interessante, porém, o custo baixo
do suplemento nesse caso é fator crucial, pois provavelmente irá ocorrer substituição do
pasto pelo suplemento. Seja na opção de não suplementar ou usar alimentos energéticos,
previamente deve ser feito um estudo criterioso de viabilidade destas opções.
Capítulo 34
Suplementação de bovinos de corte na integração lavoura-pecuária-floresta 569
2) É fundamental que haja boa massa de forragem para que a suplementação na seca
tenha o efeito positivo desejado. Por isso, recomenda-se a vedação das pastagens
antes do período seco para maximizar o acúmulo de forragem. Entende-se por
570 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 3. Suplementação de sal mineral com ureia indevidamente feita, pela baixa disponibilidade de forragem.
Para melhor aproveitamento, a ureia deve ser associada a uma fonte de enxofre, de
maneira que seja atendida a relação de 10 a 15 partes de nitrogênio para 1 parte de
enxofre. De forma prática, para cada 100 kg de ureia pode-se adicionar 4 kg de flor de
enxofre ou 15 kg de sulfato de amônio. Na Tabela 2, são apresentadas duas formulações
de sal mineral com ureia, sendo uma com o sulfato de amônio e outra com flor de enxofre.
Tabela 2. Exemplos de formulações de sal mineral com ureia, tendo como base o sal
mineral tradicional.
Ingrediente Formulação 1 Formulação 2
Sulfato de Amonio (%) 3 -
Flor de Enxofre (%) - 1
Ureia (%) 30 30
Sal Mineral (%) 67 69
Total 100 100
Em caso de eventual intoxicação com ureia, existe tratamento eficaz se o problema for
diagnosticado a tempo. O antídoto mais comum é o vinagre ou solução de ácido acético a
5%. Por ser um procedimento terapêutico, deve ser conduzido por profissional habilitado.
Todavia, o tratamento só será possível se aplicado logo que surgirem os primeiros sintomas,
o que normalmente é difícil de ser observado. Em função da dificuldade operacional e do
pequeno espaço de tempo entre os sintomas e a morte do animal, é fundamental focar
o máximo empenho nas medidas preventivas acima listadas, que são bastante eficazes.
O proteinado tem maior custo que o sal com ureia, porém como também é fornecido
em baixa quantidade por animal (1 a 2 g kg-1 de PV), essa suplementação torna-se mais
facilmente viável do ponto de vista econômico. O espaço linear de cocho recomendado
para o fornecimento do proteinado é de 12 a 15 cm por animal.
O abastecimento do cocho com o proteinado deve ser realizado com a maior frequência
possível, dentro das possibilidades de cada estabelecimento. A frequência ideal é
determinada por circunstâncias locais, como custo e disponibilidade de mão-de-obra,
distância dos pastos e padrão de consumo dos animais. Todavia, não se recomenda
intervalos maiores que uma semana para o abastecimento dos cochos. De fato, um
dos maiores desafios do uso do proteinado é garantir que o consumo fique próximo ao
planejado. Algumas vezes ocorre que o mesmo proteinado sendo oferecido na mesma
fazenda, em pastos similares e para lotes similares, apresenta variações de consumo. Por
isso, monitorar o consumo é altamente recomendável, tanto para determinar a frequência
de abastecimento dos cochos, de forma a atingir o consumo planejado, quanto para se
saber exatamente o custo financeiro da suplementação.
Quando o consumo do proteinado estiver baixo, a melhor opção é a redução dos teores de
cloreto de sódio (sal comum ou sal branco) da mistura. Não sendo isso possível, como no
caso de produtos comerciais já misturados, pode-se tentar o aumento de disponibilidade
de cocho ou diluir a mistura com milho moído ou outro ingrediente a base de grãos.
Todavia, essa última opção pode ter resultados de aumento de consumo bastante
variáveis. Por isso, a inclusão deve ser feita gradativamente e em pequenas quantidades
(2% a 3% da mistura, por exemplo) e o monitoramento do consumo e do comportamento
dos animais deve ser intensificado.
essa é uma estratégia extrema e deve ser usada apenas quando outras ações não derem
resultado. Neste caso, é também vital assegurar o espaço no cocho de mais de 12-15 cm
lineares para cada animal. Outro ponto muito importante é que não se deve deixar de
fornecer o suplemento por períodos maiores que um dia, sendo esta recomendação ainda
mais crítica se estiver sendo usando algum aditivo alimentar misturado ao proteinado.
Ração de semiconfinamento
Entre as opções de suplementações mais utilizadas, a ração de semiconfinamento é a
alternativa de maior risco econômico, devido ao alto consumo e ao ganho de peso dos
animais em níveis satisfatórios ser menos garantido que o de outras alternativas de
suplementação. Todavia, o semi-confinamento pode ser uma opção interessante para
adiantar a terminação dos animais em pasto, sem necessitar de estrutura de confinamento
e produção de volumoso (Figura 5).
Fotos: Davi J. Bungenstab
O ganho de peso dos bovinos de corte com esse tipo de suplementação varia de 700
a 1.000 g cab-1 dia para um consumo com base na matéria seca, de 1% do peso vivo. O
espaço linear mínimo de cocho recomendado é de 50-60 cm por animal, sendo bem maior
que o das outras suplementações, para permitir que todos os animais do lote tenham
acesso ao concentrado ao mesmo tempo. Nesse tipo de suplementação, é fundamental
que sejam observados os seguintes pontos:
que a ideal, tendo como resultado o melhor desempenho de cada animal. Com
isso obtém-se o abate de animais mais pesados em menos tempo. O inverso, que
seria superpastejar a área, com lotações maiores que a ideal, além de reduzir o
desempenho individual, compromete a longevidade da pastagem e, por isso, não
é recomendado.
• Em função do exposto no item anterior e dos ganhos de peso previstos, os animais
que melhor se enquadram na prática do semiconfinamento são animais que
necessitam apenas cerca de 40 a 50 kg para atingirem o peso mínimo de abate.
Portanto, machos com mais de 400 kg e fêmeas acima de 300 kg seriam candidatos
ao semiconfinamento, desde que uma análise de viabilidade financeira recomende
a prática. A planilha BCSS, desenvolvida pela Embrapa Gado de Corte, pode ajudar
nessa avaliação1.
1
A planilha pode ser obtida no endereço eletrônico www.ilpf.cnpgc.embrapa.br.
Capítulo 34
Suplementação de bovinos de corte na integração lavoura-pecuária-floresta 577
Nesse caso, quando são comparadas pastagens com maior ou menor disponibilidade
de forrageira, utilizando-se níveis semelhantes de fornecimento do suplemento e
mesma taxa de lotação, naturalmente a pressão de pastejo sobre a pastagem com maior
disponibilidade forrageira é menor. Essa condição permite uma maior seleção das partes
mais nutritivas das plantas pelos animais e, portanto, melhor desempenho. Assim, no
caso da faixa usual de desempenho obtido com proteinado, o resultado com pastagem
em sistema de integração tem maior probabilidade de ficar próximo aos maiores ganhos.
Por outro lado, como as pastagens têm melhor qualidade, as diferenças de ganho entre
animais não suplementados e suplementados são menores.
Outro ponto relevante, é que os sistemas de ILP podem permitir uma alta lotação
animal por curtos períodos, aumentando o número de animais a serem suplementados,
favorecendo a economia de escala. Há casos de suplementação de 700 a 1.000 animais
em módulos de 100 hectares. Nestas situações, as recomendações de disponibilidade
de cocho já citadas são ainda mais importantes para permitir o consumo almejado de
suplemento por todos os animais.
Por ter um período fixo, e de curta duração, deve ser utilizado estrategicamente, devendo-
se considerar o destino dos animais quando da retirada da área – geralmente em meados
de setembro a fim de disponibilizá-la para as práticas da agricultura (dessecagem, preparo
de solo e plantio, por exemplo).
O primeiro pastejo (prazo máximo de 60 dias) permite ganhos que podem ir de 700 a
900 g cabeça-1 dia, perdendo gradativamente o desempenho à medida que diminui a
oferta e piora a qualidade da forragem. Uma alternativa de manejo que pode melhorar os
resultados, é a divisão da área em módulos e o seu uso escalonado em conformidade com
o plantio, de forma a fazer um “pastejo de ponta” do capim para os animais que se deseja
maior desempenho.
Nesses dados, pode-se notar uma grande variação no conteúdo de proteína, de gordura
e de matéria mineral. Inclusive, pode-se notar uma grande proporção de resíduo mineral
(cinzas) no Resíduo de Soja 2 (quase 50% do peso). O valor energético deste resíduo,
evidentemente, é muito baixo e, por menor que seja o valor para sua aquisição, seu custo
por unidade de energia é muito alto. Fica claro, portanto, que no caso da compra de
resíduos, é imprescindível fazer a análise química antes de adquiri-los.
Ainda com relação ao valor nutritivo dos resíduos, é preciso ter cuidado com sua variação
em função de sua origem. Mesmo que existam valores-padrão para um resíduo identificado
580 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
pelo mesmo nome daquele que se quer usar, há grandes chances de que estes sejam
diferentes. Essa diferença pode ser simplesmente porque os resíduos variam em função
do local em que são produzidos, e, especialmente, porque diferentes produtos podem
receber o mesmo nome e vice-versa. Como exemplo, no caso dos resíduos listados na
Tabela 5, quando recebidos no laboratório, os nomes atribuídos pelos solicitantes foram:
“resíduo de soja”, “quirera de soja” e “baginha de soja”.
Outra questão problemática quanto aos resíduos é que, da mesma forma que não há padrão
para o conteúdo de nutrientes, não existe padrão também para sua granulometria. Isso
dificulta sua secagem, pois se a regulagem do secador for feita para os grãos maiores, a parte
mais fina pode acabar tostada, reduzindo seu valor nutritivo. De maneira inversa, caso seja
feita a regulagem para não queimar o “fino”, as partículas maiores do resíduo ficam úmidas.
Por essa razão e pelo baixo valor comercial, muitas vezes o resíduo não é secado. Todavia, a
umidade acima de 15% facilita o desenvolvimento de microrganismos. No caso de fungos,
pode haver a produção de micotoxinas e algumas delas podem causar grandes prejuízos,
mesmo em quantidades muito pequenas. Os principais efeitos das micotoxinas são: queda
no desempenho e eficiência produtiva, problemas reprodutivos, redução na resistência
imunológica e indução a danos patológicos no fígado e outros órgãos. Frequentemente,
o prejuízo causado pela ação das micotoxinas passa despercebido, pois ocorre sem sinais
clínicos, causando apenas uma “quebra” no ganho de peso, que nem sempre é identificada
ou devidamente relacionada com presença de micotoxinas na suplementação.
Existem kits comerciais para diagnóstico de micotoxinas, porém, como estas ocorrem de
forma concentrada, mesmo que seja feita uma amostragem cuidadosa, é possível que um
lote de resíduo ruim seja dado como bom e que um lote bom seja rejeitado, dependendo
de onde caírem os pontos de amostragem. Portanto, a prevenção é a melhor opção.
O armazenamento apenas de ingredientes com baixa umidade (< 10%), feito em locais
protegidos de insetos e ácaros, favorece sua conservação. O aumento do teor de umidade
e ataque de pragas, além do maior risco de contaminação, causa perda de valor nutritivo.
O uso de ácidos orgânicos, especialmente os ácidos propiônico e acético, podem ajudar
a manter a qualidade nutricional do alimento, pois eles inibem o desenvolvimento de
microrganismos. A quantidade de ácidos orgânicos a ser usada depende da umidade
e do tempo de armazenagem do produto. Para materiais já contaminados, medidas de
descontaminação são pouco práticas.
O pastejo de restos culturais dispensa investimentos com fenação e evita custos com
estocagem e distribuição, deixando ainda uma grande parte dos restos culturais na área,
Capítulo 34
Suplementação de bovinos de corte na integração lavoura-pecuária-floresta 581
Também no caso do milho, observa-se que, em termos de matéria seca, existe uma relação
de quase 1:1 entre a produção do grão e da palha (Russel et al., 1993). Assim, uma lavoura
com rendimento de 5 t ha-1 de grãos produzirá cerca de 5 t/ha de palha. Em condições
ideais, essa quantidade teria capacidade de suporte de 3 UA durante um mês (Figura 7).
582 Fotos: Davi J. Bungenstab e Rodrigo da Costa Gomes
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 7. Animais em pastejo sobre restos culturais de milho, com detalhes da palhada.
Quanto aos hábitos de pastejo, os animais demonstram preferências por restos culturais
do milho na seguinte ordem: 1) Grãos; 2) Palha da espiga; 3) Colmo; 4) Sabugo; 5) Folhas.
Portanto, percebe-se que não existe uma ordem por conteúdo de proteína ou valor
energético, mas provavelmente por uma combinação de valor nutritivo e facilidade
de consumo.
Capítulo 34
Suplementação de bovinos de corte na integração lavoura-pecuária-floresta 583
O grau de aproveitamento dos restos culturais do milho é tanto maior quanto maior
a taxa de lotação. Fernandez-Rivera e Klopfenstein (1989), por exemplo, encontraram
um aumento de quase 30% no aproveitamento dos resíduos pós-colheita de milho
pastejados por novilhos durante 50 dias alterando a lotação de 1,54 para 2,47 cabeças
ha-1. Todavia, esse maior aproveitamento dos resíduos pós-colheita resulta em menores
ganhos. Isso ficou bem demonstrado no trabalho de Russel et al. (1993), onde vacas
de corte prenhes foram mantidas por 55 dias em resíduos pós-colheita de milho e
suplementadas com soja em grãos na quantidade de 0,91 kg cab-1 dia. O experimento
comparou lotações de 3,4 UA/ha; 1,7 UA ha-1 e 0,9 UA ha-1. Os resultados de ganho de
peso foram, respectivamente: -0,060 kg cab-1 dia, -0,010 kg cab-1 dia, e 0,410 kg cab-1 dia. O
melhor desempenho com menores lotações é explicado por uma maior possibilidade de
seleção dos resíduos pós-colheita pelos animais. As digestibilidades dos resíduos ingeridos
pelos animais na lotação mais alta e na mais baixa foram de 53% e 62% respectivamente,
ou seja, um aumento de quase dez pontos percentuais.
Em experimento com suplementação de 0,5 kg cab-1 dia de farelo de soja por 90 dias para
vacas prenhes pastejando resíduo pós-colheita de sorgo, Ward (1978) obteve ganhos de
peso de 230 g cab-1 dia, mostrando que a combinação das duas suplementações pode dar
resultados satisfatórios, com a possibilidade, inclusive, de liberação estratégica de áreas
de pastagens para recuperação.
Como exemplo de resultados muito úteis, tem-se o retorno do investimento para cada
Real investido e o ganho de peso que representa o ponto de equilíbrio da suplementação,
ou seja, o ganho de peso necessário para pagar todas as despesas com a suplementação.
Além disso, o planejamento deve ser estudado com antecedência, de forma a permitir
a previsão e reserva de recursos financeiros, recursos forrageiros, aquisição antecipada
de insumos, preparação adequada das estruturas de campo e do operacional (máquinas,
equipamentos e mão de obra).
O ideal é que sejam estabelecidos períodos, a fim de que sejam estabelecidos os critérios
de prioridades e de utilização de cada tipo de suplementação, em conformidade com as
oportunidades ou dificuldades das interações entre os recursos forrageiros, as demandas
dos animais e os recursos financeiros (fluxo de caixa) e operacionais.
Capítulo 34
Suplementação de bovinos de corte na integração lavoura-pecuária-floresta 585
Considerações finais
Existem diversas oportunidades de aumento de eficiência de produção com o uso de
suplementação de bovinos em sistemas de integração, especialmente utilizando-se
resíduos de grãos e pastejo de resíduos pós-colheita. Para o melhor aproveitamento
dessas oportunidades, ficam algumas sugestões simples, práticas e eficazes:
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 35
Controle parasitário de bovinos de corte em
sistemas de integração
Paulo Henrique Duarte Cançado
João Batista Catto
Cleber Oliveira Soares
Paula de Almeida Barbosa Miranda
Taciany Ferreira de Souza
Eliane Mattos Piranda
588 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Com a expansão da utilização dos sistemas de ILP e ILPF, vêm a necessidade de se
adaptar o conhecimento e as tecnologias existentes para aplicação nestes sistemas. Neste
sentido, a integração com lavoura e/ou floresta introduzem componentes que podem
afetar a epidemiologia das parasitoses dos bovinos de corte criados nestes sistemas. O
componente “lavoura” provoca uma quebra do ciclo dos parasitas que contaminam as
pastagens, tornando-as, em teoria, livres de parasitas após os processos de plantio e
colheita da lavoura. Por outro lado, o componente florestal proporciona proteção contra a
radiação solar o que pode favorecer a sobrevivência dos parasitas no sistema iLPF. Apesar
destes novos componentes, é possível adaptar as tecnologias já existentes para os sistemas
integrados. Neste capítulo serão discutidos, portanto, os mecanismos já consolidados de
controle dos parasitas e formas de adaptá-los para esses sistemas.
Cada espécie (tipo ou grupo) de parasita possui suas próprias características morfológicas (físicas),
alimentares e de ciclo-de-vida, que são importantes para que o seu controle seja efetivo. Somente
com o conhecimento destas características é possível traçar programas de manejo eficientes.
Capítulo 35
Controle parasitário de bovinos de corte em sistemas de integração 589
Uma característica importante do ciclo-de-vida dos parasitas é que, a maioria deles, passa parte
de sua vida no hospedeiro (fase parasitária) e parte no ambiente (fase não parasitária). Deste
modo, é possível usar técnicas de controle direcionadas para cada uma destas fases.
Na Tabela 1 estão apresentados os principais parasitas dos bovinos e algumas de suas características
biológicas, bem como medidas importantes para seu manejo e controle em sistemas de ILP e ILPF.
Ectoparasitas
Moscas
As moscas que parasitam bovinos podem ser hematófagas (se alimentam de sangue) ou
causadoras de miíases (berne/bicheiras). As moscas hematófagas são parasitas quando
adultas, já as moscas de bicheiras fazem o parasitismo quando ainda são larvas. Na Figura 1
está ilustrado o ciclo-de-vida básico das moscas hematófagas e como elas se relacionam com
os bovinos e com o ambiente.
depois procura um local protegido para repousar. Essa espécie utiliza matéria orgânica
preferencialmente em estado de fermentação para se reproduzir (Tabela 1).
Todas as moscas citadas possuem etapas de vida que dependem dos animais (bovinos)
para sobreviver, entretanto, elas passam boa parte de suas vidas no ambiente, onde
sofrem a influência dos fatores ambientais, que algumas vezes podem ser alterados para
interromper seu ciclo.
Carrapatos
O carrapato do boi, Rhipicephalus (Boophilus) microplus, é um dos parasitas que causam
mais prejuízos ao produtor, principalmente se no rebanho houver animais de raças
europeias. Os animais de origem europeia são menos resistentes aos carrapatos e às
doenças que eles transmitem. Esta espécie de carrapato tem o ciclo-de-vida monoxeno,
ou seja, parasita um único bovino durante seu ciclo. Outra característica é que as larvas
deste carrapato sobem nos bovinos, alimentam-se e se desenvolvem até a fase adulta em
21 dias (Figura 2). Após estarem alimentadas, as fêmeas ingurgitadas (cheias de sangue)
caem na pastagem, onde colocam seus ovos. A média do período que o carrapato
permanece no ambiente pode variar de 45 a 120 dias, dependendo das condições
ambientais. As condições de temperatura e umidade relativa no microambiente podem
aumentar ou diminuir a sobrevivência dos carrapatos nas pastagens.
592 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Endoparasitas
Helmintos (vermes)
Os helmintos intestinais, também chamados de vermes, possuem ciclos de vida variáveis,
dependendo da espécie, e seus ciclos podem ser simples ou complexos. Os ciclos
biológicos simples (ciclos diretos) envolvem os bovinos e o ambiente (Figura 3). Os ciclos
biológicos complexos envolvem o ambiente, os bovinos e outros seres vivos que são
utilizados como hospedeiros intermediários. Os hospedeiros intermediários podem ser
insetos, ácaros, minhocas, caramujos e até animais vertebrados. Assim como os carrapatos,
os helmintos dos bovinos são responsáveis por perdas significativas no ganho de peso,
interferindo negativamente no desempenho do rebanho, pela redução de ganhos de
peso e, consequentemente, aumento na idade ao abate.
Capítulo 35
Controle parasitário de bovinos de corte em sistemas de integração 593
No caso dos sistemas de ILP e de ILPF, a integração da pecuária com culturas anuais
vai interferir drasticamente no micro-ambiente, afetando a população de hospedeiros
intermediários, com redução na população de helmintos na pastagem.
Coccídios (Eimeriose)
O principal parasita de bovinos que pertence a este grupo é Eimeria bovis. Os coccídios
são parasitas microscópicos que multiplicam-se dentro das células intestinais dos animais
e acabam por destruí-las. A redução no número de células prejudica a absorção dos
nutrientes levando à redução no ganho de peso. Em casos graves, pode levar bezerros
à morte. Estes parasitas possuem em seu ciclo de vida, etapas que ocorrem fora dos
animais. Por isso, da mesma forma que para os helmintos, as alterações no ambiente
proporcionadas pela integração com culturas e as técnicas de manejo utilizadas nos
sistemas de ILP e de ILPF, vão influenciar drasticamente o desenvolvimento dos Coccídios.
Uma característica fundamental para o controle desses parasitas é que todos eles são
transmitidos pelo carrapato-do-boi [Rhipicephalus (Boophilus) microplus], assim, as
técnicas de controle aplicadas para o carrapato acabam por controlar a TPB.
Com a pastagem preparada e limpa, o principal cuidado é manter a área livre dos parasitos.
Assim, é muito importante tratar os animais jovens, bezerros desmamados até animais de
18 meses (sobreano), antes de introduzi-los nesta área (tratamento tático). O tratamento
anti-helmíntico e carrapaticida apenas dos animais jovens, mais afetados, vai garantir um
ambiente mais saudável para o rebanho e evitar a seleção de resistência.
Capítulo 35
Controle parasitário de bovinos de corte em sistemas de integração 595
Figura 4. Sugestão de cronograma de controle tático (T) / estratégico (E) de parasitas de bovinos de corte
em sistemas de integração. Os bovinos são introduzidos na pastagem de 15 a 18 meses (A) após o plantio do
eucalipto ou de 1 a 2 meses após a colheita da lavoura (B)
Apesar de simples, o tratamento preventivo dos parasitas deve ser acompanhado por
médicos veterinários que vão ajudar na escolha do melhor produto e nas dosagens
que deverão ser aplicadas. A escolha do produto adequado é um dos pontos-chave
para o sucesso no controle parasitário. O uso inadequado de produtos químicos
pode levar à resistência dos parasitas, gerando grandes prejuízos para o produtor e
596 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
toda a região. Por isso, é fundamental escolher o produto certo e aplicar da forma
recomendada pelo fabricante.
1
Para mais informações visite: http://carrapatos.cnpgc.embrapa.br/.
Capítulo 35
Controle parasitário de bovinos de corte em sistemas de integração 597
Essa diversidade ajuda no controle de parasitas, como por exemplo, pelas aves que se
alimentam de carrapatos. Esses mecanismos devem ser observados com uma visão ampla
do sistema. A variedade de espécies presentes deixa todo o sistema de criação mais
equilibrado, os insetos competem entre si por alimentos, o número de besouros
que se alimentam de fezes (coprófagos) aumenta e, desta forma, aumentam as chances
de que as infestações por parasitas sejam menos intensas.
Capítulo 36
Transferência de Tecnologia: Desafios e
Oportunidades para Adoção de ILPF na
Amazônia Brasileira Legal
Rachael Devorah Garrett
Juliana Dias Bernardes Gil
Judson Ferreira Valentim
600 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Nos últimos 30 anos, o crescimento populacional, a urbanização e o crescimento da renda
nos países em desenvolvimento têm fortemente impulsionado o consumo global de
carne e produtos lácteos. Entre 1980 e 2014, o consumo global de carne aumentou 132%
(180 milhões de toneladas) e o consumo de leite 62% (288 milhões de toneladas) (FAO,
2017). Este aumento na demanda por produtos pecuários causou impactos ambientais
e socioeconômicos profundos no Brasil, onde a área alocada para pastagem e para a
produção de alimento animal tem crescido exponencialmente.
Como resultado da crescente demanda por terras na Amazônia e no Cerrado, esses biomas
experimentaram altas taxas de desmatamento. Embora as taxas de desmatamento
tenham diminuído substancialmente após 2006, a mudança contínua da cobertura do
solo, bem como as emissões de gases de efeito estufa (GEE) de animais e insumos agrícolas
fez com que a agricultura brasileira se tornasse a maior fonte nacional de emissões de GEE.
Em 2015, mudanças na cobertura da terra e agropecuária representaram 46% e 22% das
emissões totais de GEE no Brasil, respectivamente (SEEG Brasil, 2017).
As projeções indicam que entre 2015 e 2025, a produção de carne no mundo deverá crescer
15% (Perspectivas..., 2016). Embora a previsão seja de que a maior parte do crescimento
da produção virá da intensificação, haverá pressão para expansão de pastagens em áreas
com vegetação nativa, particularmente na América Latina (Alexandratos; Bruinsma, 2012).
Para evitar a expansão das áreas de pastagens nessas regiões, será necessário melhorar
ainda mais a produtividade de pastagens existentes.
futura de carne, grãos, madeira, fibras e biocombustíveis até o ano 2040, eliminando
assim a necessidade de conversão de ecossistemas naturais (Strassburg et al., 2014).
A intensificação sustentável dos 100 milhões de hectares de pastagens cultivadas
existentes no país representa uma oportunidade-chave para o Brasil aumentar sua
produção agropecuária e, ao mesmo tempo, preservar as florestas e pastagens nativas
remanescentes.
área desmatada estava ocupada com vegetação secundária (Projeto TerraClass, 2014).
A degradação de áreas agrícolas e de pastagens é particularmente problemática para
pequenos agricultores que vivem em assentamentos na Amazônia, pois necessitam de
recursos para investir na recuperação do solo ou expansão das pastagens evitando assim
o desmatamento de áreas adicionais de florestas (Vosti et al., 2002).
Desde a década de 90, o uso de sistemas ILPF parece estar aumentando e diversas
mudanças políticas recentes têm contribuído para o crescimento contínuo desses
sistemas na Amazônia Legal:
• No final dos anos 2000, a Embrapa criou um novo portfólio de pesquisa sobre
ILPF e estabeleceu uma nova unidade de pesquisa sobre o tema (Embrapa
Agrossilvipastoril) no estado de Mato Grosso, na região de transição entre os
biomas do Cerrado e Amazônia. A unidade concentra pesquisas sobre tecnologias
de agricultura de baixo carbono e integração de sistemas e atrai pesquisadores
de vários outros centros de pesquisa da Embrapa (mandioca, milho, silvicultura,
frutas tropicais, soja, etc.), facilitando a comunicação e promovendo o trabalho
multidisciplinar entre especialistas.
• Finalmente, em 2013, o Brasil promulgou a Política Nacional de Integração Lavoura-
Pecuária-Floresta (Lei nº 12.805/2013), conforme abordado no Capítulo 01 desta
publicação. O objetivo é fomentar a recuperação de áreas degradadas, aumentar
a produtividade e a qualidade dos alimentos, melhorar a renda dos agricultores e
mitigar as pressões do desmatamento.
Muitas das barreiras à adoção de sistemas ILPF e muitos dos vetores da especialização
são universais, aplicando-se a agricultores de outros países que operam em um ambiente
cada vez mais globalizado. Outras barreiras relacionadas a infraestrutura, mercado e
políticas são mais exclusivas do Brasil (Garrett et al., 2017a). A compreensão das complexas
interações entre essas barreiras é essencial para a elaboração de políticas efetivas para
incentivar a adoção dos sistemas ILPF.
Nota: CC representa rotação de culturas, CP representa rotação de culturas com o objetivo de recuperar pastagem.
Fonte: IBGE (2006).
604 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Sistemas ILPF têm potencial para viabilizar investimentos de longo e médio prazo,
como a produção de madeira e a recuperação de pastagens, fornecendo também
receitas imediatas das culturas anuais. O reflorestamento também pode ser usado para
compensar os custos associados ao cumprimento do passivo ambiental legal. Contudo, o
longo período de retorno associado a esses investimentos implica em riscos relacionados
a condições do mercado futuro e da cadeia de suprimentos.
Tabela 2. Benefícios e potenciais desvantangens associadas à adoção de sistemas
integrados versus sistemas especializados de produção.
Característica Benefícios potenciais Desvantagens potenciais
• Maior e melhor distribuição da
•
Maior demanda por mão-de-obra, demanda de mão-de-obra ao longo
• Custo mais alto
particularmente para trabalho do ano, promovendo a inserção social
• R edução das oportunidades de lazer
qualificado • Mais oportunidades para o aumento
na qualificação da mão-de-obra
• R edução do risco intra e interanual
das variações do mercado, biológicas • Maior complexidade de gestão
• M
aior diversidade de fontes de renda
e climáticas • R edução das economias de escala
• Aumento das economias de escopo
• R
etorno econômico em diferentes • Produção da lavoura pode subsidiar a
• Aumento dos custos e riscos
horizontes temporais renovação da pastagem
Capítulo 36
Transferência de Tecnologia: Desafios e Oportunidades para Adoção de ILPF na 605
Amazônia Brasileira Legal
A tradição agrícola dos migrantes muitas vezes tem papel importante no processo de
tomada de decisão do produtor. Produtores de ascendência alemã ou italiana normalmente
detêm conhecimento sobre a produção de feijão, milho, arroz e, de forma crescente, de soja,
pequenos animais e gado de leite (Waibel, 1950; Azevedo, 1961; Jordan, 1962). Produtores
japoneses tendem a cultivar culturas de alto valor, como tomate, amendoim e café no estado
de São Paulo, além de pimenta-do-reino e frutas na Amazônia (Sims, 1972; Yamada; Osaqui,
2006). Ao longo dos séculos, os agricultores tradicionais em todo Brasil desenvolveram
sistemas agrícolas diversificados e adaptados localmente, manejando-os com práticas
inovadoras que frequentemente contribuem tanto para a segurança alimentar quanto para
a conservação da agrobiodiversidade (Altieri, 2004). Ao mesmo tempo, em todo o continente
americano, os imigrantes portugueses e espanhóis continuaram a tradição de criar gado de
seus países de origem (Bishko, 1952). Essas longas histórias culturais envolvem gerações de
melhoramento e de completo domínio de sistemas específicos, desenvolvimento de capital
social para compartilhar informações e organização de cooperativas para comprar insumos
e vender produtos. Esses fatores criam fortes incentivos para os agricultores manterem as
mesmas práticas, pelo menos até que vejam seus vizinhos fazerem a transição para novos
sistemas de produção. Em certa medida, isso também se aplica a situações em que os
agricultores migram para novas regiões, como a Amazônia Legal - embora nesses casos
a necessidade de restabelecer redes sociais e adaptar práticas agrícolas em um ambiente
novo influenciem o grau de resistência à adoção de novas estratégias de produção.
crédito disponibilizadopelo governo no ano agrícola 2015/2016 havia sido acessado pelos
agricultores) e sua execução concentra-se nas regiões Centro-Oeste e Sul, como mostrado
na Tabela 3 (Observatório ABC, 2016a). Desde que o Programa foi lançado em 2010, até
2016, Mato Grosso recebeu a maior parte do crédito entre os Estados da Amazônia Legal
(44,58%), equivalente a R$ 1,37 bilhões (Observatório ABC, 2016b).
Embora tenha aumentado nos últimos anos, a parcela de crédito do Programa ABC usado
especificamente para sistemas ILPF permanece bem abaixo das parcelas destinadas às
outras práticas; como recuperação de pastagens e plantio direto. Pesquisas de campo
indicam que os agricultores têm uma receptividade positiva às taxas de juros e ao período
de carência associados à maioria dos empréstimos disponibilizados através do Programa
ABC, mas entendem que as exigências ambientais e burocráticas inviabilizam o acesso a
esses empréstimos. Especialistas concordam que a capacidade dos agentes de fomento
bancário de elaborar e analisar pedidos de crédito do Programa ABC é frequentemente
comprometida pela carência de informações sobre regras de elegibilidade das propriedades
(Gil et al., 2015). Também há preocupação de que o período de carência para financiamentos
de sistemas ILPF (15 anos) não seja suficiente, devido ao tempo de crescimento das árvores,
especialmente quando se trata de espécies de madeira nativa para as quais ainda não há
indicadores técnicos robustos de silvicultura e desempenho econômico.
Pesquisas de campo realizadas em 2013 mostraram que somente uma pequena parcela
dos produtores amostrados com sistemas ILPF em Mato Grosso haviam feito uso do crédito
disponibilizado pelo Programa ABC (Gil et al., 2015). Apenas 17% dos participantes da
pesquisa solicitaram empréstimos dessa linha de crédito e só 5,9% foram contemplados.
Menos de 10% dos agricultores que implementaram sistemas ILPF obtiveram crédito do
Programa ABC (Gil et al., 2015), sendo aque a maioria de suas propriedades tinha porte
médio ou grande. No Mato Grosso, a adoção de sistemas ILPF não é necessariamente
maior nos municípios onde os desembolsos do Programa ABC são mais altos (Gil et al.,
2016), sugerindo que a adoção de sistemas ILPF seria apenas parcialmente vinculada aos
incentivos fornecidos pelo Programa ABC.
Outros fatores institucionais que restringem a adoção de sistemas ILPF na Amazônia Legal
incluem deficiências nos mercados de terras e de seguros. A má definição de direitos
de posse da terra limita o acesso de alguns produtores ao crédito rural e contribui para
aumentar os incentivos para o desmatamento de florestas nativas como estratégia
para garantir a posse da terra (Garrett et al., 2013b; Assunção et al., 2016). Entre 2012
e 2016, o desmatamento na Amazônia Legal aumentou 75% (de 4.571 km2 para 7.989
km2) (Tollefson, 2016). A falta de seguro agrícola contra eventos climáticos e econômicos
extremos também desincentiva investimentos em sistemas ILPF devido ao longo período
de retorno econômico.
Figura 1. Produção de soja e rebanho bovino por estado e bioma no Brasil em 2013.
Fonte: IBGE (2013).
O desenho atual dos sistemas ILPF nem sempre está alinhado com os tipos de sistemas
de integração que os agricultores provavelmente adotarão. Portanto, a identificação de
problemas prioritários e de alternativas para sua solução devem contemplar a participação
dos produtores ao longo de todo o processo de pesquisa e validação agronômica e
econômica dos sistemas ILPF. Este é um fator-chave para aumentar a probabilidade de
adoção mais ampla de sistemas ILPF. É preciso coletar dados de uma ampla gama de
arranjos de uso da terra que já ocorrem em fazendas e então utilizá-los para retroalimentar
o processo de priorização de problemas a serem resolvidos e o desenho de experimentos
futuros. Os esforços de pesquisa devem também considerar as tradições agrícolas dos
agricultores, o tamanho das propriedades e a distância das redes de infraestrutura das
cadeias de suprimentos. Isso é importante, uma vez que os custos e benefícios percebidos
612 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
pelos produtores e os custos reais de diferentes arranjos de uso da terra, rotações e misturas
de espécies irão variar de acordo com esses atributos. O aumento da produtividade
regional pode ser conseguido pela integração entre fazendas vizinhas, por meio da
venda ou troca de produtos agrícolas, resíduos agrícolas e de áreas de pastagens para o
gado, tirando vantagem do crescente número de contratos de parceria que vêm sendo
estabelecidos entre os agricultores e pecuaristas em algumas regiões (Cohn et al., 2016).
Esse pode ser um modelo de integração particularmente adequado para propriedades
de tamanho médio, as quais carecem de economias de escala e vantagens relacionadas
a mão-de-obra.
O Programa ABC também pode ser melhorado para apoiar a ampliação da capacidade das
instituições financeiras, a fim de agilizar e assegurar maio efetividade aos processos de
análise, aprovação e monitoramento de projetos de financiamento atuais e potenciais. A
manutenção de empregos fixos para consultores treinados, visando apoiar os agricultores
na elaboração e tramitação dos pedidos de empréstimo, teria impacto positivo na
ampliação ao acesso ao crédito do Programa ABC e no crescimento da adoção de sistems
ILPF na Amazônia Legal. Também é essencial reduzir a burocracia e acelerar o processo
de análise e aprovação das propostas de financiamento por parte dos bancos oficiais
responsáveis pelo desembolso do crédito do Programa ABC. Além disso, o programa terá
de oferecer juros mais baixos para os pequenos agricultores, a fim de torná-lo competitivo
em relação aos empréstimos disponíveis através do PRONAF - Programa de Fortalecimento
da Agricultura Familiar. Formas inovadoras de lidar com a falta de regularização fundiária
que acarreta incerteza da posse da terra (como a renúncia à exigência de título como
garantia, a exemplo do que acontece com pequenos proprietários) e a integração de
seguros para financiamentos com grandes investimentos iniciais merecem consideração.
Novos programas de incentivos ou políticas públicas devem ser desenvolvidos, tais como
subsídios para sistemas mais intensivos (Cohn et al., 2014), incentivos fiscais para os
produtores que adotam sistemas ILPF, e investimentos de longo prazo em infraestrutura da
cadeia de suprimentos em regiões onde atualmente há baixa capacidade para processar
ou transportar mercadorias. Por fim, novos mecanismos de valoração da cadeia de
produtiva da região precisam ser desenvolvidos para incentivar os produtores a aproveitar
as preferências por produtos agrícolas sustentáveis em mercados de consumo distantes.
Esses incentivos poderiam ser concedidos por meio do desenvolvimento de programas
de certificação para sistemas de ILPF que atendam a metas ambientais adicionais além
do desmatamento evitado. O imperativo para todos esses programas é a necessidade
de vincular quaisquer incentivos positivos à produção, com regulamentos e fiscalização
rigorosos sobre a conservação e preservação da floresta nativa. Caso contrário, esforços
para melhorar a produtividade e rentabilidade dos sistemas agropecuários poderão ter
repercussões indesejáveis sobre as áreas remanescentes de vegetação nativa nos biomas
Amazônia e Cerrado, e acabar incentivando produtores a desmatar novas áreas.
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Capítulo 36
Transferência de Tecnologia: Desafios e Oportunidades para Adoção de ILPF na 613
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Capítulo 36
Transferência de Tecnologia: Desafios e Oportunidades para Adoção de ILPF na 615
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Gladys B. Martinez
Capítulo 37
Integração lavoura pecuária floresta na
região Norte do Brasil
Gladys Beatriz Martínez
Célia Maria Braga Calandrini de Azevedo
Arystides Resende Silva
Frederico José Evangelista Botelho
Tadário Kamel de Oliveira
Vicente de Paulo Campos Godinho
618 Título do Livro
Quanto aos animais utilizados para integração na região Norte, se destacaram os bovinos
de corte e leite e um sistema com ovinos (Veiga et al., 2001). Os trabalhos desenvolvidos
com sistemas silvipastoris, mais conhecidos na década de 80 com a nomenclatura de
Sistemas Agroflorestais-SAFs, mesmo os mais promissores, não garantiram a continuidade
e evolução do processo, considerando que sua adoção por produtores rurais ocorreu sem
muita expressão.
Apesar das questões ambientais legais, os sistemas ILPF que têm sido estudados na
Região Norte integram, principalmente, espécies florestais nativas, pela familiaridade
que os produtores têm com algumas delas, por seus benefícios ao ambiente, conforto
térmico e pelos produtos madeireiros e não madeireiros que podem gerar. Dentre elas
destaca-se: mogno (Swietenia macrophylla King/Meliaceae), bordão de velho (Samanea
tubulosa (Benth.) Barneby & J.W. Grimes/ Fabaceae), mulateiro (Calycophyllum spruceanum
(Benth.) Hook. F. ex K. Schum./Rubiaceae), cedro-doce (Bombacopsis quinata (Jacq.)
Dugand/Malvaceae), taxi-branco (Tachigali vulgaris L.F. Gomes da Silva & H.C. Lima),
paricá (Schizolobium parahyba Schizolobium parahyba var. amazonicum (Huber ex Ducke)
Barneby/ Fabaceae), cumaru (Dipteryx odorata (Aubl.) Willd. /Fabaceae), castanha- -do-
brasil (Bertholletia excelsa H.B.K. /Lecythidaceae), e andiroba (Carapa guianensis Aubl Aubl./
Meliaceae). Dentre as espécies exóticas, destaca-se o eucalipto (Eucalyptus sp./Myrtaceae)
cultivado em escala comercial por ser uma espécie de conhecimento consolidado no
622 Título do Livro
Figura 4. Sistema de Integração pecuária-floresta (IPF) com eucalipto na Fazenda Moguigaçu – Paragominas/PA .
Capítulo 37
Integração lavoura pecuária floresta na região Norte do Brasil 623
Há que se destacar também a espécie arbórea nativa mais cultivada no país, o paricá.
Caiu no gosto dos produtores em razão do rápido crescimento se comparado a outras
espécies nativas e pelo valor comercial da madeira para a produção de laminados.
Essa expansão está associada também às diversas possibilidades de uso da madeira,
bem como por ser uma alternativa regional para suprir a demanda de matéria-prima
com madeira proveniente de florestas plantadas, como também para recuperação de
áreas alteradas. Em um estudo realizado na região de Paragominas, a produção do
paricá apresentou bom desenvolvimento silvicultural, sendo indicado para cultivo para
sistemas de integração Lavoura-Pecuária-Floresta, sem prejuízo ao seu crescimento e
produção (Silva; Sales, 2018).
Outra espécie que tem despertado o interesse dos produtores, mas utilizada em menor
proporção, é o mogno africano. Sua madeira é de alta qualidade e apresenta excelente
valor de comercialização da madeira serrada e de suas sementes. Seu crescimento é
intermediário em relação ao eucalipto, sendo uma espécie promissora para uso em
sistemas ILPF, pelo seu rápido desenvolvimento e pelo valor comercial da madeira (Silva
et al., 2016a; Sales et al., 2017). Como exemplo de sistema integrado com esta espécie,
a Fazenda São João localizada no município de Brasil Novo-PA possui uma área de 100
hectares com ILPF, alternando as fases de agricultura e pecuária durante o ano nos
sistemas consorciados com a pastagens (Figura 5).
Figura 5. Sistema de Integração pecuária-floresta (IPF) com mogno africano na Fazenda São João – Brasil Novo/PA .
Uma espécie nativa, mas de crescimento lento, o cumaru apresenta madeira de ótima
qualidade para serraria, mas com colheita a longo prazo, cerca de 25 anos, porém a
comercialização de suas sementes para obtenção de óleo essencial, a cumarina, tem
bom valor econômico e sua colheita é realizada a partir do quarto ano de idade. Por sua
baixa velocidade de crescimento, essa espécie requer no mínimo três anos após plantio
para o ingresso de animais jovens no sistema para evitar danos às árvores. Em geral, o
cumaru vem sendo utilizado por produtores familiares, igualmente ao mogno africano,
624 Título do Livro
Considerações finais
A região Norte sofre fortes pressões devido a interesses econômicos e ambientais diversos,
como a exploração de recursos naturais e a expansão da agropecuária. Entretanto,
observa-se uma tendência à relativa homogeneização no uso das tecnologias que
envolvem os sistemas de integração para a recuperação de áreas alteradas e esse processo
é mais evidente nas regiões de fronteira agrícola relativamente consolidada. Assim, a
adoção de tecnologia para recuperar áreas alteradas, elevar a produtividade e reduzir os
custos vem sendo essencial para contrapor à expansão desordenada da fronteira agrícola,
considerando que os custos financeiros para o uso das tecnologias disponíveis são altos,
enquanto o retorno econômico desses investimentos depende de fatores que, em geral,
apresentam variações sazonais e regionais.
Neste sentido, a ILPF e suas variações são modelos que podem contribuir sobremaneira
com este processo, por incluir atividades economicamente importantes para a região
Norte do país, além de possibilitar a melhoria dos índices produtivos da pecuária,
principalmente por ser uma solução para os problemas relacionados com o alto grau
de pastagens degradadas, promover a expansão sustentável da atividade agrícola, e
o uso de floresta plantada como alternativa para a redução do passivo ambiental e do
desmatamento. Por isso, essa tecnologia proporciona aumento de produção associado à
preservação ambiental, e gera muitos benefícios para o homem, tanto rural como urbano.
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Paulo C. C. Fernandes
Capítulo 38
Integração lavoura-pecuária-floresta na
região Norte: avaliações de carbono do solo
na Fazenda Vitória em Paragominas, Pará
Paulo Campos Christo Fernandes
Siglea Sanna de Freitas Chaves
Lucieta Guerreiro Martorano
628 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Na última década ocorreram mudanças positivas no sistema de produção pecuário na
Amazônia brasileira, fortemente estimuladas por pressões globais e empenho de ações
integradas entre gestores, pesquisadores e empreendedores comprometidos com o uso
racional dos recursos naturais para promover o fortalecimento da cadeia agropecuária.
Ressalta-se ainda que no contexto de Política Global do Clima, o Brasil assumiu metas
voluntárias na COP 15 de redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE), sendo que
o controle do desmatamento ilegal é uma das metas mais desafiadora na região amazônica.
O projeto ILPF iniciou as atividades no ano de 2007 na região Norte, sendo que em 2008
ocorreu o lançamento da Rede de Pesquisa na cidade de Paragominas, no estado do Pará.
Durante a fase inicial do projeto ILPF, as ações consistiram em adaptar e desenvolver
diferentes combinações de sistemas de produção integrados, principalmente, para
Capítulo 38
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Norte: avaliações de carbono do solo na 629
Fazenda Vitória em Paragominas, Pará
Este fato ocasionou sérios problemas ambientais que desencadeou uma crise econômica
no município em meados da década de 2000, onde houve embargo da venda de carne,
fechamento de serrarias ilegais suspensão de créditos para produtores investirem na
produção. Para regularizar a economia do setor agropecuário da região, em 2007, os
Governos Federal, Estadual e Municipal juntamente com os produtores rurais do Polo
Paragominas iniciaram uma série de ajustes nos sistemas de produção agropecuários.
Desde então, os setores econômicos de Paragominas passaram por transformações,
sendo incentivadas pela demanda externa. O setor produtivo e instituições de ensino e
630 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A produção de arroz, milho e soja em Paragominas foi iniciada durante a década de 1990,
porém somente a partir da década de 2000, com a abertura da fronteira agrícola houve
expansão da produção de grãos passando essa atividade a ser uma das principais bases da
economia municipal. O Polo Agrícola de Paragominas oferece condições edafoclimáticas
favoráveis para a produção de grãos (El-Husny et al., 1998), para pastagem produtiva
e para o desenvolvimento da silvicultura, incluindo nos arranjos espécies nativas da
Amazônia como o paricá (Tourne et al, 2016). Tais fatores contribuíram na escolha para
instalação da Unidade de Referência Tecnológica (URT) do Projeto ILPF em Paragominas.
Outro fator relevante foi a localização do município no polo de maior produção de grãos
do Pará e também por ser apontado como referência em iniciativas inovadoras no cenário
da produção agropecuária no Estado.
A formação da Fazenda Vitória deu início no ano de 1969, coincidindo com a fase inicial do
processo de construção o município de Paragominas. Os primeiros sistemas de produção
instalados na unidade produtiva foram pastagens destinadas a pecuária extensiva de
corte, porém ao longo do processo de ocupação da área foram estabelecidos diferentes
usos do solo, conforme histórico descrito na Tabela 1. Vale destacar que durante a década
de 1990 foram realizadas diversas pesquisas científicas nessa fazenda, com abordagem
nos temas sobre a dinâmica do carbono no solo, assim como caracterização da fauna e da
flora da região (Camargo et al., 1999).
O sistema ILPF foi estabelecido em uma área de 20 ha (Tabela 2). O experimento com
sistema ILPF foi implantado na Fazenda Vitória no ano de 2009 (Figuras 4 e 5). Para a
formação da área experimental foram selecionadas diferentes espécies de essências
florestais (Tabela 2), dispostas em faixas espaçadas a cada 20 m. Entre as faixas de árvores
foi manejado cultivo de milho em sucessão com pastagem até o ano de 2012, a partir de
2013 permaneceu apenas pastagem em integração com a silvicultura, conforme descrito
no histórico de uso da área (Tabela 1).
632 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Esse histórico identifica a Fazenda Vitória como importante área experimental na região
Norte, pois possui um longo histórico de parceria com a Embrapa Amazônia Oriental, na
geração de informações científicas sobre sistemas agropecuários (Figura 3).
Figura 3. Cronossequência de ocupação das áreas. Fazenda Vitória em Paragominas, PA. Fonte: Chaves (2014).
Figura 4. Sistema integração lavoura-pecuária floresta conduzido na Fazenda Vitória (Paragominas, PA) no ano
de 2011.
634 Foto: Paulo Fernandes
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 5. Sistema integração pecuária floresta conduzido na Fazenda Vitória (Paragominas, PA) no ano de 2013.
Coleta de solo
Foram analisadas amostras de solo coletadas em anos distintos, pois a mesma área passou
por diferentes formas de manejo do solo, compondo uma cronossequência, conforme
histórico descrito na Tabela 1. Assim sendo, os sistemas de produção avaliados foram:
• Pastagem em sistema ILPF (ILPF): pastagem formada por Brachiaria brizantha cv.
Piatã entre faixas de plantio de Schizolobium amazonicum (paricá) e Khaya ivorensis
(mogno africano). As amostras de solo foram coletadas no ano de 2013 por Chaves
(2014).
• Pastagem degradada (PD): pastagem homogênea formada por Brachiaria
humidicola, com a finalidade de criação extensiva de gado de corte. As amostras de
solo foram coletadas no ano de 1993 por Camargo (1997).
• Floresta secundária (FS): floresta secundária em processo de regeneração desde
1977, utilizada como área de referência. As amostras de solo foram coletadas no
ano de 2013 por Chaves (2014).
As coletas de solos, para avaliação do teor de carbono total e da densidade do solo foram
feitas nas camadas 0-10 e 10-20 cm, com três repetições para cada profundidade. Analisou-
se o teor de carbono do solo em analisador elementar Carlo Erba e a densidade do solo
segundo Embrapa (1997). O cálculo do estoque de carbono, que corresponde ao produto
do teor de carbono (g kg-1) pela densidade (g cm-3) e pela profundidade da camada, foi
ajustado de acordo com a área de referência (FS), conforme Ellert e Bettany (1995).
Resultados da pesquisa
A condução do sistema ILPF na URT da Fazenda Vitória promoveu melhorias nas
propriedades químicas e físicas no solo da área de produção. Identificou-se que a média
do estoque de carbono nas pastagens melhoradas (ILPF) foi de 41,7 Mg ha-1, enquanto na
pastagem em processo de degradação (PD) foi de 32,64 Mg ha-1, constatando diferença
significativa entre os resultados
(Figura 6). Na área de floresta A
secundária (FS), utilizada como A
referência, foi observado o estoque
de 45,1 Mg ha-1, sendo semelhante a C
ILPF. Infere-se que o manejo da área
interfere diretamente na dinâmica do
carbono no solo, pois foi observado
que após 22 anos de condução
pastagem, em vias de degradação,
ocorreu perda de aproximadamente
12 Mg C ha-1, quando comparado FS PD ILPF
ao resultado identificado na área de
floresta nativa (CHAVES, 2014).
Figura 6. Estoque de carbono no solo (Mg ha-1) na camada
A densidade do solo (DS) também 0-30 cm nas áreas de estudo da Fazenda Vitória (Paragominas,
apresentou alteração de acordo PA). FS: Floresta Secundária em 2013; PD: Pastagem Degradada
em 1992; ILPF: Sistema Integração Lavoura-pecuária-floresta
com o manejo aplicado na área. Na em 2013.
camada 0-10 cm, a DS sob floresta Fonte: Chaves (2014).
foi de 0,96 g cm-3, sendo semelhante
ao valor encontrado na mesma
profundidade da área ILPF (1,04 g
cm-3), sendo que ambas diferiram
da pastagem degradada (1,2 g cm-
3
), conforme Figura 7. De maneira
geral, as maiores variações da
densidade do solo, entre as áreas
de estudo, foram identificadas na
camada superficial devido a maior
incorporação de matéria orgânica, FS PD ILPF
característica comum em Latossolos
argilosos da região (Figura 8).
Figura 7. Densidade do solo no intervalo de 0-30cm nas áreas
de estudo da Fazenda Vitória (Paragominas, PA). FS: Floresta
Secundária em 2013; PD: Pastagem Degradada em 1992; ILPF:
Sistema Integração Lavoura-pecuária-floresta em 2013.
Fonte: Chaves (2014).
636 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 8. Teor matéria orgânica nas áreas de estudo da Fazenda Vitória (Paragominas, PA). As camadas de solo
avaliadas, com seus respectivos teores de MOS, são representadas por fotografias do solo seco e macerado,
refletindo suas cores reais.
É importante ressaltar que entre os anos de 2010 a 2012, fez-se sucessão de milho e
forrageira em sistema plantio direto, fator que favoreceu maior acúmulo de matéria
orgânica na área do sistema ILPF. O desenvolvimento do plantio direto é capaz de
aumentar o teor de carbono no solo, favorecendo o aporte de matéria orgânica na área a
cada ciclo de produção, por isso é considerada uma técnica agrícola sustentável, quando
comparadas a manejos convencionais (Bayer et al, 2000). Além disso, a palhada é capaz
de aumentar o estoque de carbono no solo, minimizando as perdas ocasionadas pelas
práticas de cultivo.
Ainda neste período, as áreas PP e PM permaneceram sem pastejo direto, sendo que o
capim foi convertido em feno na estação seca e comercializado para alimentar animais
exportados vivos em navios. Resultados positivos também foram encontrados no
desenvolvimento do componente florestal implantado em sistema ILPF, conduzido na
fazenda Vitória, assim como na produção de milho no segundo ano de condução do
sistema, segundo pesquisa realizada por Silva et al. (2011).
Vale ressaltar que para obter sucesso na produção do sistema, é necessário que haja um
planejamento correto do sistema a ser implantado na propriedade rural, em sintonia com
o perfil empreendedor e das condições edafoclimáticas da região.
Figura 9. Sistema de integração lavoura-pecuária-floresta com pastagem e paricá com cinco anos de
implantação. Fazenda Vitória (Paragominas, PA) em 2013.
638 Foto: Paulo Fernandes
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 10. Sistema de integração lavoura-pecuária-floresta mostrando floresta secundária, cultura de milho
intercalada com mogno africano e pastagem de capim Mombaça recuperada por plantios sucessivos de grãos
na Fazenda Vitória (Paragominas, PA) em 2011.
Foto: Paulo Fernandes
Figura 11. Pastagem de capim Mombaça recuperada por plantios sucessivos de grãos. Fazenda Vitória
(Paragominas, PA) em 2009.
Capítulo 38
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Norte: avaliações de carbono do solo na 639
Fazenda Vitória em Paragominas, Pará
Figura 13. Pastagem com baixa produtividade e plantas invasoras na Fazenda Vitória (Paragominas, PA) em
2008.
640 Foto: Paulo Fernandes
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 14. Semeadura de Brachiaria ruziziensis sobre lavoura de milho na Fazenda Vitória (Paragominas, PA)
em 2008.
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José H. A. Rangel
Capítulo 39
Integração lavoura pecuária floresta na
região Nordeste do Brasil
José Henrique de Albuquerque Rangel
Salete Alves de Moraes Samuel Figueiredo de Souza
André Júlio do Amaral
José Carlos Machado Pimentel
644 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
A região Nordeste do Brasil compreende 1,56 milhão de km2, dos quais o Semiárido ocupa
0,98 milhão, sendo o 0,58 milhão restante ocupado pela Zona da Mata e áreas costeiras.
Em 2006 existiam no Nordeste 30,5 milhões de hectares ocupados com pastagens,
sendo 16 milhões de hectares com pastagens naturais e 14,5 milhões com pastagens
cultivadas (IBGE, 2006). Do total de pastagens cultivadas, 12,3 milhões de hectares
eram de pastagens em boas condições e apenas 2,2 milhões de pastagens degradadas
(IBGE, 2006). No entanto, aplicando-se para a região a mesma estimativa feita por Kichel
et al. (2011) para o Brasil, o quantitativo de pastagens nordestinas com algum grau de
degradação seria de 11,6 milhões de hectares. Considerando-se ainda, que a maior parte
do Semiárido é ocupada pela Caatinga (Silva et al., 2010) essa composição florística deve
ter sido considerada pelo IBGE (2006) como “matas/florestas naturais” ou “áreas ocupadas
com essências florestais também usadas para pastejo”, e não como pastagens. Essa
categoria de florestas representava no Nordeste 19 milhões de hectares, em 2006. Dessa
forma, entende-se que os 16 milhões de hectares com pastagens nativas estão em sua
maioria localizados em locais aonde a caatinga foi removida, enquanto que as cultivadas
estão nas zonas mais húmidas representadas pelo agreste e a mata.
ILPF no Semiárido
As pesquisas para o Semiárido têm como foco o manejo racional da vegetação nativa
da caatinga e o desenvolvimento de modelos produtivos. O estudo de espécies nativas
como maniçoba (Manihot pseudoglaziovii Pax & hofman), mandioca (Manihot sculenta
Crantz), pornunça (Manihot sp), mamãozinho-de-veado (Jacarta corumbensis O. Kuntz),
postumeira (Gonphrena elegans Mart. Var. elegans), mandacaru sem espinho (Cereus
hildemanianus K Schum), camaratuba (Cratylia argentea desv. Kuntze), umbuzeiro
Capítulo 39
Integração lavoura pecuária floresta na região Nordeste do Brasil 645
(Spondia tuberosa Arr. Cam.), mororo (Bauhinia sp), sabiá (Mimosa caesalpinifolia Bentha),
visam seus aproveitamentos em sistemas isolados ou em consorcio com outras forrageiras
herbáceas e arbóreas (Voltolini et al., 2010). Além das forrageiras nativas, espécies exóticas
fazem parte dos estudos. Entre essas espécies as mais estudadas estão as diversas espécies
de capim Buffel (Cenchrus spp.), urocloa (Urochloa masambicensis), palmas forrageiras
(Opuncia ficus-indica (L.) Mill. e Nopalea cochenillifera Salm-Dick), leucena (Leucaena
leucochephala (Lam)), gliricidia (Gliricidia sepium (Jacq)), algaroba (Prosopis juliflora (SW)
D.C.). Quanto aos modelos produtivos o foco tem sido a integração dos elementos nativos
ou exóticos adaptados, dando origem a modelos capazes de aumentar a sustentabilidade
dos sistemas produtivos (Araujo Filho; Carvalho, 2001; Voltolini et al., 2010).
Sistema CBL
O Sistema CBL – Produção de grandes ou pequenos ruminantes, utilizando a vegetação
natural da caatinga (C), no período chuvoso, associada à área de capim-Buffel (B), com
piquetes de um leque de opções forrageiras (L), especialmente leguminosas (Voltolini et
al., 2010). Garrotes criados nesse sistema podem atingir 14-15 arrobas aos 24-30 meses.
Em termos de quilogramas de bezerros desmamados por hectare por ano, o sistema
propicia um aumento de 1.000% em relação ao sistema tradicional.
Cabrito Ecológico
Caprinos de raças ou ecotipos nativos criados semi-extensivamente com pastejo em
áreas de caatinga e capim-Buffel, com suplementação nos períodos críticos do ano
usando resíduos agrícolas ou agroindustriais. A base alimentar das matrizes é o pastejo
e o ramoneio em áreas de caatinga, complementados com pastos diferidos, forragem
para reserva estratégica, palhadas e outros restos culturais, concentrados e coprodutos
agroindustriais isentos ou com baixo teor de agroquímicos (Voltolini et al., 2010).
Sistema Sipro
É o Sistema Integrado de Produção Experimental – Simulação de propriedade com quatro
componentes ou subsistemas: agricultura dependente de chuva (11,57 ha), agricultura
com irrigação de salvação (1,5 ha), pecuária baseada na exploração da caatinga e produção
florestal (4,13 ha) (Voltolini et al., 2010).
Sistema agrosilvipastoril
Sistema integrado abrangendo três parcelas de igual dimensão: área destinada à produção
agrícola, área destinada à atividade pastoril e área destinada à produção madeireira
(Araújo Filho; Carvalho, 2001). As variáveis de desempenho de cordeiros nesse sistema
foram significativamente maiores do que as obtidas em sistema tradicional de criação
(Tabela 1) (Carvalho, 2003).
646 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
As pesquisas com ILPF para as Zonas da Mata e agreste estão em sua maioria baseadas
no uso da gliricídia ou da leucena como componente arbóreo em consórcio com
lavouras, gramíneas e palma forrageira. Tais consórcios podem ser de maneira alternada
entre a lavoura e a gramínea, com a palma e a gliricídia durante todo o tempo, ou com
a lavoura apenas nos primeiros anos de implantação do sistema. Especificamente para
a condição das áreas costeiras o consórcio da gliricídia com o coqueiro tem mostrado
resultados bastante promissores (Rangel et al., 2011). Neste caso, o coqueiro entra como
o componente arbóreo e a gliricídia, mantida em regime de poda e pastejo, como o
componente pecuário (Figura 1).
Foto: José H.A. Rangel
tratamentos fertilizados com nitrogênio. Maiores tempos para ócio foram verificados
no tratamento consorciado e nos isolados com fertilização nitrogenada, do que no
tratamento isolado sem fertilização nitrogenada.
Médias seguidas da mesma letra na linha não diferem estatisticamente por Tukey (p< 0,05)
O desempenho produtivo dos animais nesse ensaio foi analisado para as estações
das aguas e seca na média de quatro anos (2008 a 2011). O ganho de peso individual
dos animais cresceu linearmente com o aumento das doses de nitrogênio alcançando
produções máximas de 3,1; 1,9 e 5,0 arrobas na dose de 240 kg N ha-1, respectivamente
para águas, seca e total. Para esses mesmos períodos o ganho individual dos animais no
tratamento consorciado foi de 3,4; 2,9 e 6,3 arrobas, respectivamente, para águas, seca
e total (Tabela 4). Considerando que as cargas animais eram ajustadas de acordo com a
disponibilidade de forragem em cada tratamento, os maiores ganhos nos tratamentos
fertilizados com nitrogênio foram computados para uma melhor qualidade nutricional
da forragem, principalmente em teores de proteína bruta. No tratamento consorciado,
além de um maior teor de proteína bruta da gramínea, favorecido pela transferência do
nitrogênio biologicamente fixado pela Gliricídia, o consumo de folhas e ramos finos da
leguminosa, com média de 18% de proteína bruta, enriqueceu substancialmente a dieta
animal (Araujo, 2014).
Continua...
Capítulo 39
Integração lavoura pecuária floresta na região Nordeste do Brasil 649
Tabela 4. Continuação.
Médias seguidas da mesma letra na linha não diferem estatisticamente por Tukey (p< 0,05)
Adaptado de Araujo (2014).
Em relação ao ganho de peso por área para a média do mesmo período, ocorreu aumento
de peso até a dose de 160 kg de nitrogênio na estação das águas (Tabela 5), o que não
diferiu significativamente ao sistema consorciado. Na estação seca os ganhos voltaram
a aumentar até a dose máxima aplicada de nitrogênio (240 kg de N ha-1), enquanto
no tratamento consorciado o ganho foi significativamente maior e igual ao dobro do
observado para a dose máxima de nitrogênio. Fato a ser ressaltado nesses dados é o
potencial desse sistema de consorciação com a Gliricidia de manter uma regularidade de
ganho de peso dos animais durante todo ano independente das condições de suficiência
ou déficit hídrico no solo.
Tabela 5. Ganho de peso por hectare de bovinos nas águas e na seca em um sistema de
monocultivo de Brachiaria brizantha cv. Marandu fertilizada com 0, 80, 160 e 240 kg N ha-1
ano, ou em um sistema de Integração/Pecuária/Floresta (IPF) com a Gliricidia sepium sem
fertilização nitrogenada. Médias de quatro anos (2008 a 2011).
Estação das Águas Estação Seca Total Ano
Tratamento Ganho kg Ganho @ Ganho kg Ganho @ Ganho kg Ganho @
cabeça ha-1 cabeça ha-1 cabeça ha-1 cabeça ha-1 cabeça ha-1 cabeça ha-1
0N 204c 6,8 c 86d 2,9d 290d 9,7d
80 N 339b 11,3b 107c 3,6c 446c 14,9c
160 N 388ª 12,9ª 115c 3,8c 503b 16,7b
240 N 350b 11,7b 147b 4,9b 497b 16,6b
IPF 381ª 12,7ª 304a 10,2a 685a 22,9a
Média 332 11,1 152 5,1 484 16,2
Médias seguidas da mesma letra na linha não diferem estatisticamente por Tukey (p< 0,05)
Esses sistemas já têm suas eficiências comprovadas, mas necessitam de maiores esforços
para suas difusões e adoção.
Considerações finais
Os sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta possuem aplicabilidade para
diferentes condições de clima, solo, topografia, tamanho da propriedade, modelo da
empresa agrícola, condição social dos atores e sistema agropecuários da região Nordeste.
Referências
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Davi J. Bungenstab
Capítulo 40
Casos de sucesso com sistemas de ILP e
ILPF na região do MATOPIBA
Marcos Lopes Teixeira Neto Talmir Quinzeiro Neto
Raimundo Bezerra de Araújo Neto José Mário Ferro Frazão
Geraldo Magela Cortes Carvalho Cláudio França Barbosa
Diógenes Manoel Pedroza de Azevedo Elisandra Solange Oliveira Bortolon
Marcílio Nilton Lopes da Frota
Joaquim Bezerra Costa
654 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
A região do MATOPIBA é assim chamada por ser uma região agrícola de confluência
de quatro Estados brasileiros, abrangindo 31 microrregiões e 337 municípios. São eles,
Maranhão (33%), Tocantins (38%), Piauí (11%) e Bahia (18%). Compreende uma área total
de 73 milhões de hectares, dos quais 91% no bioma Cerrado, 7,3% no bioma Amazônia e
1,6% no bioma Caatinga (Figura 1). A atividade agropecuária da região responde por 8,8%
da produção de grãos no Brasil, com a predominância da soja (Tabela 1), destacando-se
também a pecuária bovina e as florestas plantadas com o eucalipto.
Continua...
Capítulo 40
Casos de sucesso com sistemas de ILP e ILPF na região do MATOPIBA 655
Tabela 1. Continuação.
Milho 1ª MATOPIBA
Regiões Soja - ha Algodão ha Feijão ha % Brasil
safra- ha ha
Oriental Tocantins-TO 308.865 32.007 5.027 6.771 352.670 0,9
MATOPIBA: 2.696.932 429.551 324.774 172.476 3.623.733 8,8
Brasil: 29.452.600 6.422.800 1.076.900 4.323.800 41.323.80 100
A partir de 2004, a Embrapa vem desenvolvendo alternativas para esse modelo, propondo
a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Uma iniciativa importante é o trabalho em
parceria com produtores, criando-se Unidades de Referência Tecnológica (URTs) que
transformam algumas propriedades rurais em referência no sistema, como relatado nos
casos de sucesso a seguir.
O sistema de produção até 2004 caracterizava-se por preparo do solo com grade e apenas
uma pequena parcela com plantio direto na palhada de milheto, com infestação de
plantas daninhas na entressafra. Só havia atividade agrícola nos seis meses do ano (Figura
2). A área cultivada era de 5.950 ha com predominância da soja e um pouco de milho e
arroz, existindo apenas cerca de 100 cabeças bovinos para consumo da fazenda, os quais
eram criados em uma área marginal. A produtividade da soja era de aproximadamente
2.800 kg ha-1 e do milho de 8.000 kg ha-1.
Fotos: Marcos Teixeira
Com o sistema de ILP consolidado na Fazenda Santa Luzia, a semeadura direta da soja
na palhada da braquiária também apresentou rendimentos superiores à da palhada do
milheto, como se observa na Tabela 2, variando a produtividade da soja de 3.426 a 3.780 kg
ha-1 e média de 3.582 kg ha-1 em oito safras. Resultados sempre superiores ao rendimento
da soja na palhada de milheto que em algumas safras com ocorrência de veranicos foi de
3.120 kg ha-1. Houve ganho de produtividade de até 462 kg ha-1 quando utilizada a palhada
de braquiária e de 762 kg ha-1 em relação à safra de 2004. Isso evidencia o benefício da
cobertura de solo pela palhada das braquiárias, tendo em vista que ela proporcionou uma
cobertura uniforme sobre a área até a colheita da soja, o que não acontece com a palhada
do milheto, que tem rápida decomposição nas condições dos cerrados nordestinos.
Capítulo 40
Casos de sucesso com sistemas de ILP e ILPF na região do MATOPIBA 657
Figura 3. Sistema Agropastoril validado na URT da fazenda Santa Luzia em São Raimundo das Mangabeiras - MA.
2005 a 2013.
mostra a Figura 4. Todavia, está previsto manter-se até 12 ou 14 anos as árvores de maior
porte para avaliação, de uso como postes ou madeira para serraria.
Tabela 3. Área plantada e rendimentos da soja e milho intercalados com eucalipto na URT
de ILPF na Fazenda Santa Luzia em São Raimundo Mangabeiras, MA.
Rendimento soja Rendimento milho Rendimento
Ano Area (ha)
(kg ha-1) (kg ha-1) eucalipto (m³ / ha)
2009 04 2760 - -
2010 04 2862 - -
2011 04 - 5280 -
2015 04 - - 129 a 220
Média - 2808 5280 129 a 220
Fotos: Marcos Teixeira
Figura 4. Sistema Agrosilvipastoril validado na URT da fazenda Santa Luzia em São Raimundo das Mangabeiras
- MA. 2005 a 2013.
Figura 6. Produção de feno na Fazenda Santa Luzia em São Raimundo Mangabeiras, MA.
A fazenda se tornou, após dez safras, referência em ILP e ILPF na região, adotando
uma estratégia de produção com um plano de rotação e de ocupação intensiva de sua
área. Assim, no período das chuvas, realiza-se a 1ª safra com soja e milho+forrageiras,
ficando o restante da área com pastagem permanente, eucalipto, Acacia mangium e a
área de preservação permanente (APP). Após a colheita da soja, faz-se a safrinha com
milho+forrageiras na área da primeira janela de plantio; sorgo granífero e feijão comum
ou feijão-caupi na área da segunda janela de plantio e milheto e B. ruziziensis em
sobressemeadura na fase R5 da soja (vagens entre 50% e 75% de granação) da última
janela de plantio, completando o uso da área na entressafra com terminação de bois na
pastagem oriunda do consórcio, além do eucalipto, A. mangium.
diferentes daquelas nas quais estavam acostumados a produzir. A partir dessa constatação,
os conceitos sobre produção e sustentabilidade tiveram de ser revistos, sob pena de se
inviabilizar a atividade agrícola por eles desenvolvida. Isso foi percebido já a partir do
segundo ano de cultivo de áreas recém-abertas, como as localizadas no município de
Brejo, região Leste do Maranhão.
A partir da segunda safra de soja foi observada uma redução na produtividade, mesmo
com a utilização de técnicas recomendadas, tais como calagem e adubação, quando o
esperado seria um incremento. Com a detecção da queda na produtividade, os produtores
da região realizaram intensa troca de experiências e voltaram suas atenções para os níveis
de matéria orgânica presentes nos solos da região, que eram muito baixos. O principal
problema havia sido detectado, mas não era conhecido um meio eficaz de reposição de
matéria orgânica no solo para a região.
A palhada de milheto foi a primeira experiência feita pelos produtores, como forma de
repor a matéria orgânica do solo, no entanto, essa técnica mostrou-se insuficiente para
que a produtividade da soja voltasse a um nível considerado aceitável. Nesse momento,
houve uma demanda dos produtores pelo apoio da Embrapa, buscando técnicas que
contribuíssem de forma mais eficiente para reposição da matéria orgânica do solo. O
primeiro contato foi feito com a equipe da Embrapa Meio-Norte, quando foi apresentado
aos produtores um modelo de produção baseado na integração de lavoura-pecuária (ILP).
O Sr. Vítor Barbosa, proprietário da Fazenda Barbosa, aceitou firmar parceria com a
Embrapa para que em sua propriedade fosse implantado o sistema e, a partir de então, a
Embrapa realizaria a Transferência de Tecnologia em sistema de ILP, tornando a Fazenda
Barbosa uma Unidade de Referência Tecnológica (URT) do sistema ILP para a região.
Essa parceria teve início no ano de 2010, em uma área implantada de 10 ha, sendo
testados inicialmente sistemas de milho+capim (milho híbrido BRS + B. ruziziensis; milho
+ capim Piatã; milho variedade sertanejo + B. brizanta) e arroz + braquiária (BRS Monarca
+ B. ruziziensis). A experiência com arroz não foi bem sucedida, no entanto, na área com
milho os resultados de produtividade foram bastante expressivos quando comparados à
média de produtividade da própria Fazenda Barbosa e de outras da região.
Com a implantação do sistema de ILP, o foco do produtor era produzir palhada para
melhoria do teor de matéria orgânica do solo e obter melhores resultados de produtividade
na cultura da soja. Porém, com a formação do pasto após a colheita do milho, os gestores
da fazenda atentaram para um provável sucesso também na pecuária, e introduziram o
componente animal no sistema.
No ano de 2011, após constatar que o sistema poderia render bons frutos na região, houve
uma efetivação do sistema ILP na Fazenda Barbosa. Nesse ano, foi implantado o Sistema
ILP em mais 48 ha em rotação com a soja, seguido do uso da pastagem com bovinos na
entressafra. Dessa vez sendo utilizado somente o consórcio de milho + capim (milho + B.
ruziziensis, milho + capim Xaraés e milho + capim Massai).
nesse ano o produtor formou uma área de pasto onde colocou animais para engorda e
ainda conseguiu produzir palhada para plantio da soja na próxima safra a um custo zero.
Fotos: Luís Fernando Devicari
Figura 8. Área de capim no sistema ILP com gado pastejando na Fazenda Barbosa no município de Brejo, MA.
Com maior domínio da técnica no Sistema ILP, em 2012 foram implantados mais 55 ha de
ILP na Fazenda Barbosa. Assim como no ano anterior, foi utilizado o consórcio de milho
+ capim (milho + B. ruziziensis, milho + tanzânia, milho + piatã e milho + massai). Nesse
ano, a produção de milho no sistema, que foi de 3.720 kg ha-1, já pagou os custos do
sistema. Com esses resultados, o sistema de ILP passou a ser prioridade para a prática da
agropecuária na Fazenda Barbosa.
Nos anos subsequentes, 2013 e 2014, o sistema foi implantado em uma área de 80 ha,
totalizando 160 ha nesses dois anos. Em 2013, foi feito consórcio de milho + B. ruziziensis
e milho + piatã. A produtividade do milho foi de 4.980 kg ha-1, enquanto o custo foi de
3.900 kg ha-1. Já no ano de 2014, além do consorcio de milho + capim, foi realizado um
consórcio triplo com milho + capim + guandu. Nesse ano a produtividade do milho na
área com o sistema de ILP foi de 7.260 kg ha-1 a um custo de .4980 kg ha-1, mostrando que
o sistema vem melhorando a produtividade ano a ano.
Para a cultura da soja, plantada em sistema de plantio direto na área de ILP do ano anterior,
tem sido observada ao longo desses anos uma produtividade média superior a 720 kg ha-1
a mais na área de ILP quando comparada às demais áreas da propriedade.
No entanto, de acordo com o proprietário, a área de ILP ainda não foi ampliada para os
níveis desejados. A meta é que pelo menos 25% da área plantada seja com o sistema ILP,
onde 3/4 é soja e 1/4 é milho em consórcio com forrageiras.
Fotos: Luís Fernando Devicari
Figura 9. Área de soja plantada em sistema de plantio direto na palhada do capim na Fazenda Barbosa no
município de Brejo, MA.
Capítulo 40
Casos de sucesso com sistemas de ILP e ILPF na região do MATOPIBA 663
Na região também há alguns gargalos que ainda devem ser superados, tais como: a
produtividade do milho abaixo do ideal, devido à baixa altitude; variação de duração do
período chuvoso e distribuição irregular das chuvas, que não permitem uma previsão
segura sobre a produção de matéria seca de forragem da pastagem, dificultando o
dimensionamento do rebanho; a colheita da soja que coincide com a colheita do milho e a
fazenda ainda não tem a infraestrutura necessária para colheita, secagem e armazenagem
das duas culturas na mesma época. Isso leva ao adiamento da colheita do milho para além
da época ideal. Além disso, a cultura do milho ainda não apresenta uma comercialização
ágil e segura como a da soja na região.
Com isso, no ano de 1999, o Sr. Reginaldo Vieira de Sousa, produtor rural e proprietário da
Fazenda Baixa das Coivaras, decidiu cultivar milho em sua propriedade. Para a implantação
do sistema, foi feita a reabertura de uma área de capoeira onde em seguida foi utilizada
grade aradora, com o objetivo de preparar o solo para o plantio. Após esse procedimento
observou-se desfragmentação do solo, tornando-o susceptível às intempéries. Foi
realizado plantio em uma área de 38 hectares com correção prévia do solo com 3 toneladas
de calcário por hectare (PRNT de 70%) seguida por 250 kg de NPK (08-30-15) no plantio
e adubação de cobertura de 100 kg ha-1 de ureia. Vale ressaltar que no ano em questão
houve uma pluviosidade acima da média histórica no município.
Nesse mesmo ano, após uma chuva intensa de cerca de 60 mm, o produtor observou que
grande parte do adubo aplicado e parte do solo agricultável foram carreados da área.
A chuva causou danos ao solo desprotegido, apesar do relevo considerado suave, de
aproximadamente 3% de declividade, e, como resultado, a produtividade esperada de
4.800 kg ha-1 ficou em apenas 3.000 kg ha-1.
Foi então que o produtor buscou técnicas que pudessem evitar e/ou minimizar as perdas
e reduzir danos ao solo, como os ocorridos. Durante a sua participação em um dia de
campo promovido pela Embrapa, ele conheceu o sistema de plantio Direto (SPD) e no
ano seguinte, foi pioneiro no município de Fortuna ao adotar os procedimentos para a
produção de milho em sua propriedade. Nessa primeira experiência foi utilizada palhada
664 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
de arroz, que, apesar de não apresentar uma boa qualidade para plantio direto, era o que
o Sr. Reginaldo Vieira dispunha. No ano seguinte, o plantio do milho já foi realizado em
SPD, juntamente com a semente de Brachiaria brizantha adotando o Sistema Santa Fé
(consórcio anual de milho com forrageiras), preconizado pela Embrapa.
Com a utilização deste sistema, foi observado que mesmo em anos de precipitações
pluviais acima da média histórica, houve uma redução da lixiviação do solo e da perda
dos adubos utilizados. Isso provavelmente ocorreu devido ao aumento da cobertura e da
elevação do teor de matéria orgânica do solo, minimizando a erosão e ainda apresentando
vantagens como a recuperação e diversificação da microbiota do solo, abrangendo
também os insetos e pássaros. A partir da adoção desse sistema, também tornou-se
possível iniciar o trabalho com as máquinas em períodos mais curtos após as chuvas, o
que não acontecia quando era praticado o sistema convencional, devido aos elevados
teores de argila do solo da propriedade. Outro ponto positivo, e muito importante, foi
a produtividade alcançada, até 4.800 kg ha-1, utilizando-se as mesmas quantidades de
insumos por hectare que foram usadas no sistema de plantio convencional.
Fotos: Reginaldo Vieira
Figura 10. Área do Sistema ILP com milho plantado na palhada do capim dessecado na Fazenda Baixa das
Coivaras em Fortuna, MA.
Figura 11. Formação da área de pasto no Sistema ILP após a colheita do milho na Fazenda Baixa das Coivaras
em Fortuna, MA.
Capítulo 40
Casos de sucesso com sistemas de ILP e ILPF na região do MATOPIBA 665
Entre os anos de 2010 e 2014, a taxa de lotação média da área na qual se adotou o sistema
ILP foi de quatro cabeças ha-1 (cerca de 3 UA ha-1), com um ganho de peso em torno de 10
kg de carcaça anima-1l mês. Nesse mesmo período, houve incremento na produtividade
do milho, tendo sido registrada safra com produtividade superior a 7.200 kg ha-1.
A Fazenda Baixa das Coivaras atualmente tem cerca de 100 hectares incorporados ao
sistema de ILP e a perspectiva é de que essa área seja ampliada. Pode-se dizer que hoje
a propriedade se encontra dentro do contexto da orientado para a sustentabilidade. A
ILP adotada na fazenda tem-se mostrado economicamente viável com a verticalização da
produção. Ambientalmente correta, pela restauração da microbiota do solo e mitigação
da emissão de CO2. Contribui também socialmente com a produção de mais alimentos e
geração de emprego e renda no campo e na cidade.
A Fazenda Baixa das Coivaras atualmente é uma das fazendas modelo no estado do
Maranhão na adoção e prática do Sistema ILP. O produtor Reginaldo Vieira tem sido um
parceiro da Embrapa na difusão do referido sistema, tendo sido realizados dias de campo
na sua propriedade, atraindo produtores da região para conhecer o seu caso de sucesso. O
produtor também vem divulgando o Sistema ILP em palestras e outros eventos realizados
a nível estadual e nacional. Segundo ele, a sua propriedade está sempre de portas abertas
para receber produtores e técnicos do setor agropecuário e se tornou uma das principais
Unidades de Referência Tecnológica do Estado do Maranhão para difundir amplamente
o sistema ILP.
* iLP – I: iLP sob plantio direto e rotação de culturas com: braquiária (2009-10)/soja-sorgo safrinha (2010-11)/
soja-milho safrinha (2011-12)/ soja-milho safrinha (2012-13)/soja-braquiária (2013-14); iLP – II: iLP sob plantio
direto e rotação de culturas com: braquiária (2009-10)/soja-sorgo safrinha (2010-11)/soja-milho safrinha (2011-
12)/ soja-milho silagem (2012-13)/soja-braquiária (2013-14).
Capítulo 40
Casos de sucesso com sistemas de ILP e ILPF na região do MATOPIBA 667
Figura 14. Imagens dos sistemas de produção sob ILP e ILF da Fazenda Brejinho em Pedro Afonso, TO.
668 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Conclusão
Os sistemas ILP e ILPF, desenvolvidos e validados nas URTs das fazendas de referência
acima apresentadas, levaram os produtores parceiros a adotarem o sistema como uma
estratégia de exploração da fazenda, por mostrar viabilidade produtiva, econômica,
social, com maior oferta de empregos e ambiental, com acréscimo de matéria orgânica e
da atividade biológica do solo, além de sequestro de carbono. Essas tecnologias ajudam a
manter o solo produtivo hoje e para gerações futuras, além de possibilitarem o aumento
da produção sem a necessidade de abertura de novas áreas, com potencial, inclusive, para
reduzir o desmatamento.
Referências
IBGE. GCEA-PI. Levantamento sistemático da produção agrícola: área colhida e ou a colher de grãos (ha).
Teresina, mar. 2014.
MIRANDA, E. E. (Coord.). Caracterização territorial estratégica do MATOPIBA: VERSÃO 2.3. Campinas: Embrapa-
GITE, fev. 2015. Disponível em: <https://www.embrapa.br/gite/projetos/matopiba/150211_MATOPIBA_v3.0_
website.pdf>. Acesso em: 25 maio 2015.
Ramon C. Alvarenga
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na
região Central de Minas Gerais, Brasil
Ramon Costa Alvarenga Miguel Marques Gontijo Neto
Maria Celuta Machado Viana Emerson Borghi
Érika Regina de Oliveira Carvalho Álvaro Vilela de Resende
Walfrido Machado Albernaz Monica Matoso Campanha
Regis Pereira Venturin Thomaz Correa e Castro da Costa
Ivenio Rubens de Oliveira
670 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
A região Central de Minas Gerais (Figura 1) situa-se em uma faixa de transição entre os
biomas Mata Atlântica ao Sul e Cerrado na parte Centro-Norte, com significativos contrastes
edafoclimáticos. Especialmente a parte do Cerrado convive com dois problemas de clima
que são determinantes para o rendimento das lavouras e da pecuária: o de veranico com
duração prolongada (20 a 30 dias) e período de ocorrência em janeiro/fevereiro e o de
outono/inverno muito seco. Apesar de importante bacia leiteira e de pecuária de corte, a
maioria das pastagens apresentam-se degradadas sobre solos quimicamente esgotados.
Figura 1. Mapa da região Central de Minas Gerais e Microrregião de Sete Lagoas, MG, 2019. Elaboração: Ivenio
Rubens de Oliveira.
Mas, na região, a maioria dos produtores de grãos ou silagem adota um baixo nível
tecnológico, o que resulta em baixa produtividade, afetando diretamente a oferta de
forragens nos períodos críticos. Esta situação agrava-se porque nos últimos anos agrícolas
ocorreu uma distribuição irregular das chuvas e a maioria dos produtores rurais perdeu
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 671
suas colheitas de milho devido à veranicos que ocorreram entre novembro e fevereiro,
com maior severidade aqueles que ocorreram em janeiro.
Neste contexto, a experiência regional com sistemas ILP ou ILPF mostra serem eles
estratégias sustentáveis para alcançar a estabilidade da produção. Eles possibilitam a
exploração do solo durante o ano todo, alternando na mesma área lavouras e pastagem
ou lavoura, pastagem e árvores, respectivamente. Como resultado haverá a produção
de grãos, de forragens conservadas e de pastagens de boa qualidade além de produtos
madeireiros das árvores.
Outro ponto que merece destaque é que os princípios de manejo e conservação do solo
e da água devem ser priorizados em detrimento da orientação Leste-Oeste das linhas de
árvores. Ou seja, fazer conservação do solo e da água, plantios e cultivos em nível ao invés
de simplesmente alinhar as árvores no sentido Leste-Oeste, sob a alegação de favorecer a
entrada de luz nas faixas entre as árvores. O posicionamento do alinhamento Leste-Oeste
no sentido do declive favorece a erosão. Caso queira maior luminosidade nestas faixas, a
técnica correta é aumentar o espaçamento entre linhas de árvores e até entre árvores nas
linhas, conforme já sugerido, e promover a desrama e desbastes.
672 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
1) Soja;
2) Milho consorciado com capim braquiária (Urochloa brizantha cv. Marandu);
3) Sorgo forrageiro consorciado com capim tanzânia (Metathirsum maximum cv.
tanzânia);
4) Pastagem de capim tanzânia.
Em cada mês de julho nos primeiros anos do sistema, um lote de 45 animais anelorados
com peso médio de 160 kg de peso vivo (PV), chegaram à URT e pastejaram as quatro
glebas. Em julho do ano seguinte, com aproximadamente 360 kg de PV, seguiram para
terminação em confinamento. Depois de 100 dias foram abatidos com peso vivo médio
de 540 kg e rendimento de carcaça de 54%. A partir de 2013, até a presente data, tem
sido selecionados animais machos provenientes de IATF de cruzamento F1 aberdeen x
nelore (AxN) e nelore (N). Estes entram no sistema com peso médio de 200 kg, iniciam o
confinamento com 380-400 kg de PV e aproximadamente com 110 dias são abatidos. Os
cruzados (AxN) com 620 kg de PV e os nelore com 550 kg de PV e rendimento de carcaça
de 57 e 55%, respectivamente. No período das águas (entre setembro e março) os animais
permanecem pastejando apenas na gleba de pastagem (Figura 2) que é subdividida com
cerca elétrica, em cinco piquetes, em um sistema rotacionado com sete dias de ocupação
e 28 de descanso. Essa gleba recebe fertilização anual de 200 kg ha-1 de nitrogênio,
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 673
parcelados em até três vezes. As glebas onde serão cultivadas as lavouras são dessecadas
no mês de outubro e novo plantio é realizado em novembro.
Resultados obtidos na URT (Tabela 1) demonstram que houve um aumento relativo das
produtividades das culturas embora, muitas vezes, o veranico tenha causado danos.
O sorgo é a última cultura a ser semeada, por vezes, em dezembro. Em 2012/2013 o
sorgo para silagem foi semeado em meados de novembro e produziu 52 t ha-1 apesar
das condições climáticas desfavoráveis em função de dois períodos de veranico. Este
comportamento mostra a capacidade do sorgo em produzir bem em condições de déficit
hídrico temporário. Esta deficiência hídrica inicialmente causou maior prejuízo à soja,
enquanto que o milho e o sorgo produziram satisfatoriamente, apesar dos veranicos.
Com oito anos de implantação do sistema ILP, o solo já estava adequadamente corrigido
e observava-se bom crescimento de raízes em profundidade. Em lavouras de milho
da região, o sistema radicular concentra-se nos primeiros 30 cm de profundidade e se
estende até 60 cm. Já no sistema ILP pode ser observada melhor distribuição das raízes de
milho até um metro de profundidade, com maior concentração até 50 cm.
Embora a região não tenha tradição no cultivo da soja, tal leguminosa se mostra
importante em um sistema de rotação de culturas, devido à possibilidade de mudanças
no tipo de herbicidas utilizados e na quebra do ciclo de pragas e doenças que são
diferentes entre leguminosas e gramíneas. Aquelas de ciclo mais curto e hábito de
crescimento indeterminado tem apresentado melhor desempenho, sendo capazes
de superar o veranico, emitindo nova florada e proporcionando boas produtividades
(Figura 3), lembrando que são cultivadas em Sistema de Plantio Direto (SPD) na palhada
da pastagem dessecada.
674 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Umidade de grãos = 13%; MS silagem = 35%; a) NA = Não avaliado b) @/ha considerando a área de 5,5 ha do
piquete de pastagem no verão - apenas suplementação mineral; c) @ totais produzidas no confinamento; d) a
partir deste ano os animais receberam suplementação proteica a pasto de 0,08%PV; e) estande de sorgo inferior
a 50% do recomendado e; f ) produtividade de grãos de feijão semeado em janeiro de 2016.
Fotos: Ramon C. Alvarenga
Figura 3. Lavoura de soja (a) sobre palhada de pasto dessecado de M. maximum cv mombaça e (b) antes da
colheita na Unidade de Referência Tecnológica (URT) na Embrapa Milho e Sorgo. Sete Lagoas, MG, 2019.
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 675
Uma alternativa ao cultivo da soja é a cultura do feijão, que continuaria a fazer o mesmo
papel na rotação. Outro ponto, é que a soja é um importante ingrediente das rações para
os animais e tem alto custo na região. Nestes 14 anos de soja no sistema ILP, concluiu-se
que a soja é boa alternativa pelo papel que desempenha na rotação e pela oferta de grãos
a custo mais baixo do que sua aquisição no mercado local.
Quanto ao milho para produção de grãos ou silagem e o sorgo para silagem, ambos têm
alta demanda na região. O milho oferece mais flexibilidade ao produtor, que pode decidir
pela ensilagem ou produção de grãos. O sorgo tem três vantagens, especialmente em
regiões com problemas de veranico: a sua maior capacidade de tolerar déficit hídrico, a
sua capacidade de perfilhamento que compensa parcialmente os casos de baixo estande
e, sua capacidade de rebrota, possibilitando uma segunda colheita de aproximadamente
50% da obtida na primeira. Na região, como em qualquer outro local apto a essas culturas,
o produtor pode usar a estratégia de adotar as duas culturas. Em ano bom de chuvas
ele vai colher bem tanto o milho quanto o sorgo. Caso o ano seja ruim de chuvas e/ou
com veranico acentuado, o sorgo produz melhor que o milho e pode produzir a forragem
necessária para alimentar seu rebanho. A produção de silagem usualmente se mostra
como o negócio mais atrativo, devido ao preço resultante da alta demanda e da escassez
de pastagem no período seco. Além disto, quando se produz silagem, há o ganho de um
mês na utilização da pastagem devido à antecipação da colheita.
Figura 4. Sistema de integração lavoura-pecuária-floresta no segundo ano após implantação. Epamig, Prudente
de Morais, MG.
Após dois anos de plantio de milho utilizando o sistema ILPF o pasto foi recuperado,
prevalecendo o sistema silvipastoril, composto pelo capim-braquiária e o eucalipto.
Devido ao sombreamento causado pelo eucalipto ao longo do seu desenvolvimento,
o pasto apresentou redução na produtividade e na densidade de perfilhos. Aos sete
anos de implantação do sistema foi observado redução média de 66,62% na produção
de forragem no arranjo de (2 x2 )+ 9 m em relação ao (3 x 2) + 20 m. (Tabela 2). Este
resultado pode ser explicado pelo maior sombreamento causado pela proximidade entre
as linhas de eucalipto no arranjo mais adensado, contribuindo par a redução na produção
de foragem. Outros fatores tais como a competição por água e nutrientes também
podem ser considerados limitantes para o desenvolvimento da forrageira no sub-bosque,
em sistemas já estabelecidos. Nos arranjos mais adensados também foi observado solo
descoberto e o aumento da incidência de plantas daninhas.
Tabela 2. Produção acumulada de matéria seca (kg ha-1) de Urochloa decumbens sob
diferentes arranjos e clones de eucalipto, no sexto ano do sistema agrossilvipastoril.
Clones de eucalipto
Arranjos
GG100 I144
(3 x 2)+20 m 6881,86 Aa 5998,75 Ab
(2 x 2)+9 m 2466,91 Ba 1832,43 Bab
9x2m 3101,69 Ba 2199,29 Bb
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 677
Contrário do esperado aos sete anos de idade, não se percebe grande diferença em
diâmetro de plantas apesar da grande diferença populacional do trabalho (434 a 909
plantas por hectare). Nota-se por esses dados que o crescimento das plantas de eucalipto,
mesmo em espaçamentos maiores como o (3x2)+20 m, foi limitado pelo espaçamento
duplo (Tabela 3). Assim fica claro que quando se visa a produção de madeira mais grossa a
influência do arranjo de plantio duplo é bastante significativo. Nesses casos, um desbaste
deve ser previsto no planejamento do sistema de produção.
Tabela 3. Altura, diâmetro (DAP), volume por planta e por hectare de clones de eucalipto
em diferentes espaçamentos no sistema de ILPF, aos sete anos.
Desempenho Silvicultural do Eucalipto
Arranjos
Altura (m) DAP (cm) Volume/pl (m³) Volume/ha (m³)
Clone GG100
(3 x 2)+20 m 26,46 20,01 0,37 162,35
(2 x 2)+9 m 24,13 16,76 0,24 217,35
9x2m 26,63 19,36 0,35 194,47
Clone I144
(3 x 2)+20 m 25,58 21,00 0,40 173,50
(2 x 2)+9 m 25,24 18,03 0,29 261,45
9x2m 25,35 19,65 0,35 193,47
VM 58
(3 x 2)+20 m 22,69 20,72 0,34 148,65
(2 x 2)+9 m 21,42 17,19 0,22 202,61
9x2m 22,62 19,83 0,31 173,73
678 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Comparativamente entre os clones pode-se inferir que o clone I144 se adapta melhor aos
espaçamentos menores com linhas duplas, pois apresentou maiores médias em diâmetro
e altura. Já o clone VM58 mostrou-se mais indicado para espaçamentos amplos com linhas
simples, cuja finalidade é a produção de madeira para serraria, já que nessas condições
apresentou maiores diâmetros, ainda que com alturas de plantas inferiores.
Figura 5. Área experimental com os sistemas silvipastoris e de pastagem solteira implantados na URT ILPF da
Embrapa Milho e Sorgo.
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 679
Em cada sistema, no ano de implantação do eucalipto e nas duas safras seguintes, foram
semeados nas faixas, entre os renques, milho consorciado com cultivares de capins
braquiária. Para a semeadura do milho consorciado com os capins, nas faixas entre os
renques de eucalipto e em área a pleno sol, foi utilizada uma semeadora-adubadora para
plantio direto, com três linhas espaçadas em 0,70 m, sendo respeitada a distância de 1
m entre a primeira linha de semeadura do milho/capim e o renque de eucalipto, com
regulagem para um estande final de 68.000 plantas ha-1.
Tabela 4. Eficiências produtivas de grãos (EPGR), de forragem total (EPF) nos sistemas de
integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e ao pleno sol (PS) nos anos 0 – 2011/2102, 1 –
2012/2013 e 2 – 2013/2014, em Sete Lagoas-MG (1). Moreira et al., 2018.
Eficiências Anos
Sistemas
produtivas 0 1 2
EPF ILPF 101,64aA 74,86bB 51,77bC
(%) PS 100 aA 100 aA 100 aA
EPGR ILPF 99,85 aA 75,86 bB 43,39 bC
(%) PS 100 aA 100 aA 100 aA
Médias seguidas por letras distintas, maiúscula na linha e minúscula na coluna, diferem pelo teste de Tukey
(1)
(p<0,05).
(p<0,05). *sistemas silvipastoris: implantado em 2009 com 333 árv. ha-1 (SSP1), em 2009 com 166 árv. ha-1
(SSP2), em 2011 com 333 árv. ha-1 (SSP3) e em 2011 com 166 árv. ha-1 (SSP4) e pastagens à pleno sol (PS).
Continua...
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 681
Tabela 6. Continuação.
Biomassa da forragem disponível - BFOR (kg ha-1)
Primavera Verão Outono Primavera
Cortes**
Com exceção ao 7º corte para SSPs, no quinto ano de implantação (SSP3 e SSP4), a
densidade de árvores entre os sistemas implantados em um mesmo ano (SSP1 x SSP2 e
SSP3 x SSP4) não influenciou a disponibilidade de forragem. Este resultado indica que o
desbaste de 50% das árvores no quarto ano de implantação não ocasionou a esperada
redução da pressão de competição exercida pelo eucalipto sobre a forrageira (Tabela 6).
Assim, percebe-se que o desbaste poderia ter ocorrido mais cedo do que o ocorrido ou
de forma mais rigorosa.
Figura 6. Foto aérea de área da Fazenda Lagoa dos Currais implantada em 2013 no sistema IPF composto por
renques (12 x 3m) de eucalipto em pastagem de braquiária.
A URT Lagoa dos Currais visa obter, em âmbito de fazenda, informações de desempenho
técnico e econômico na intensificação de sistemas em módulos de produção comercial,
e agregar iniciativas de desenvolvimento agropecuário envolvendo capacitação para
produtores, técnicos e consultores, além de ações educativas voltadas à formação de
profissionais de ciências agrárias.
Marandu+Sorgo Silageiro
Forrageiras Marandu Marandu Marandu+Sorgo Silageiro BRS 658
BRS 658
Saturação
de bases V=40% V=60% V=70% V=70% x 1,5
pretendida
Continua...
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 683
Tabela 7. Continuação.
Gesso agrícola
aplicado 1,1 1,1 1,1 2,0
(t/ha)
Fósforo
aplicado a lanço
– corretiva 84/42 170/85 170/85 170/85
(kg/ha 10-50-
00/P2O5)
Potássio
aplicado a lanço
– corretiva - - 80/48 131/79
(kg/ha 00-00-
60/K2O)
Micronutrientes
aplicados
a lanço – - - - 51
corretiva
(kgha FTE BR12)
Fósforo
aplicado sulco
- - 112/56 138/69
(kg/ha 10-50-
00/P2O5)
Nitrogênio
implantação
(kg/ha N 8 17 17+11 17+14
corretiva + N
sulco)
Nitrogênio
cobertura (kg/ - 87/40 140/64 140/64
ha ureia/N)
Atualmente, a URT ILPF Lagoa dos Currais está consolidada como um ambiente de troca
de experiências entre pesquisadores, assistência técnica, produtores e estudantes. Com a
possibilidade de validação de avanços científicos aplicados à produção em escala comercial,
em uma propriedade privada, a URT funcionará como uma vitrine tecnológica a campo.
Nas áreas recuperadas (Figura 7) foi aplicado adubo orgânico à base de cama de
aviário compostada. Nas pastagens degradadas, infestadas de formigas e cupins, e
com deficiência de cobertura vegetal, foi realizada a incorporação de cama de aviário
e a de corretivos, calcário, gesso e superfosfato simples, de acordo com recomendação
baseada em análise de solo, realizada em todas as glebas, nas camadas de 0-20 cm e
20-40 cm de profundidade.
Capítulo 41
Integração lavoura-pecuária-floresta na região Central de Minas Gerais, Brasil 685
Nas glebas destinadas à ILPF e IPF realizou-se a subsolagem logo abaixo dos terraços, onde
foram plantadas, em dezembro de 2013, duas fileiras paralelas de eucalipto urograndis,
no espaçamento 2x3 m, com faixa de 50 m entre renques. Na gleba IPF o plantio do capim
ocorreu em março de 2014, juntamente com a incorporação do superfosfato simples e do
adubo orgânico. O consórcio de milho-braquiária, na gleba com ILPF, foi implantado na
safra 2014/2015.
Considerações finais
São nítidos os ganhos ambientais e econômicos demonstrados com os investimentos
no sistema produtivo, que refletem na capacidade de retenção de água nas áreas
revegetadas com o capim, pela produção de grãos e forragens. Isto também é perceptível
no crescimento da floresta de eucalipto, que passa a ser uma alternativa de renda para as
propriedades, funcionando também como fonte de madeira para as demandas internas
da propriedade, melhora o microclima para o rebanho e melhora o fluxo de caixa e a
gestão do negócio.
Referências
MOREIRA, ELWIRA DAPHINN SILVA; GONTIJO NETO, MIGUEL MARQUES ; LANA, ÂNGELA MARIA QUINTÃO ;
BORGHI, EMERSON ; SANTOS, CLAUDINEI ALVES DOS ; ALVARENGA, RAMON COSTA; VIANA, MARIA CELUTA
MACHADO. Production efficiency and agronomic attributes of corn in an integrated crop-livestock-forestry
system. PESQUISA AGROPECUARIA BRASILEIRA, v. 53, p. 419-426, 2018
Davi J. Bungenstab
Capítulo 42
Casos de sucesso na implantação de
sistema de integração lavoura-pecuária-
floresta em propriedades leiteiras de
base familiar na Zona da Mata e do
Campo das Vertentes de Minas Gerais
Carlos Eugênio Martins Mirton José Frota Morenz
Marcelo Dias Müller Fausto de Souza Sobrinho
Wadson Sebastião Duarte da Rocha Paulino José Melo Andrade
Leonardo Henrique Ferreira Calsavara Sérgio Rustichelli Teixeira
Weliton Coelho de Andrade Domingos Sávio Campos Paciullo
Alexandre Magno Brighenti dos Santos Andréia Ferreira Machado
688 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Apesar da importância das pastagens para os sistemas de produção de leite no Brasil,
estas, normalmente, ocupam as piores áreas quando comparadas às áreas ocupadas pela
agricultura. Os solos de melhor aptidão agrícola são ocupados pelas lavouras anuais de
grãos ou as de grande valor industrial para a produção de biocombustíveis, fibras, resinas
e açúcar. Dados obtidos de trabalhos de pesquisa de campo realizados nos estados de
Goiás e Minas Gerais revelam que a maioria dos produtores não considera a pastagem
como cultura (Bressan et. al, 1999).
Uma alternativa para o produtor está em incorporar tais áreas aos sistemas de produção,
de forma planejada. Isso significa aumentar não só a oferta de alimentos nobres, como
leite, carne e cereais, mas produzir múltiplos produtos de florestas plantadas, como
madeira, energia, fibra e biodiesel. Neste sentido, os sistemas de integração lavoura-
pecuária-floresta (ILPF) ganham destaque como uma alternativa de produção sustentável
para a agricultura familiar em áreas montanhosas, na medida em que proporcionam a
otimização do uso do solo com ganhos ambientais, aumento da produtividade e da renda
no meio rural.
Apesar de todo o potencial de inserção da pecuária leiteira nos sistemas de produção integrada,
ainda há muitos pontos a serem esclarecidos. Dentre os principais desafios, destacam-se:
Assim, aqui estão descritos dois casos de sucesso em execução ambos no estado de Minas
Gerais. Um é no Sítio do Valão, localizado no município de Mar de Espanha, na Zona da
Mata e outro na Chácara das Gabirobas, no município de Coronel Xavier Chaves.
Metodologia
Nas duas propriedades rurais em que o sistema de integração lavoura-pecuária-floresta foi
implantado, as práticas agrícolas implementadas foram discutidas entre os profissionais
de assistência técnica e extensão rural da Emater/MG, os pesquisadores da Embrapa Gado
de Leite e os empresários rurais proprietários das unidades produtivas em estudo. Para
tanto foram seguidos os seguintes passos:
Figura 1. Divisão da propriedade (Sítio do valão) em glebas e indicação do modelo a ser utilizado para cada
situação, de acordo com o seu potencial.
Fonte: Google Earth.
produtividade de silagem, a primeira grande vantagem foi a redução na área necessária para
encher os silos. Com isso, parte do milho cultivado, a princípio para produção de silagem,
foi colhido como grão. Este, por sua vez, foi utilizado para a formulação do concentrado,
produzido na propriedade, reduzindo o custo da ração. Como a produtividade do milho
foi alta (aproximadamente 9.000 kg/ha), foi possível comercializar parte da produção,
agregando mais renda à propriedade.
Em relação ao feijão, cultura tradicional do Sítio Valão, segundo relatos dos produtores,
não houve aumento na produtividade. É importante mencionar que o sistema de ILP
foi sugerido de modo a se alterar o mínimo possível o manejo utilizado na propriedade.
A manutenção do cultivo do feijão nas áreas é uma prova disto. Embora não contribua
efetivamente com a atividade leiteira, fazia parte das atividades da propriedade e sempre
gerou renda adicional. Ressalta-se também, que o cultivo do feijão no Sítio Valão ocorre
na safrinha, onde as condições de clima, especialmente a precipitação pluviométrica, são
muito variáveis e afetam negativamente o desenvolvimento da cultura. Em função disso,
não era esperado incremento na produtividade do feijão pelo emprego da ILP.
692 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Tabela 1. Rendimento de milho para silagem e grãos, feijão e pastagem nas safras 2007/08,
2008/09 e 2009/10 obtidas no sistema de ILP no Sítio Valão (Mar de Espanha/MG).
Milho silagem Milho grão Feijão Pastagem (t/ha de
Safra
(t/ha) (kg/ha) (kg/ha) forragem verde)
2007/2008 55 9.360 1.200 52,5
2008/2009 60 9.060 1.080 60
2009/2010 50 9.000 1.200 45
* Estimativa de produção.
Outro efeito positivo percebido logo no início da adoção da ILP foi a produção de
forragem do pasto recém-formado. Após a colheita do milho para a silagem, a pastagem
implantada apresentou alta taxa de crescimento, proporcionando forragem de boa
qualidade e quantidade (Tabela 1).
O que anteriormente era uma área degradada e com pouca cobertura vegetal, infestada
por plantas daninhas que não contribuíam com a alimentação dos animais, passou a
ser fonte de alimento em época de escassez (inverno). Aproximadamente 50 dias após
a colheita da silagem a área começou a ser pastejada, retardando a necessidade de
fornecimento de volumoso no cocho como fonte exclusiva de forragem. No início da
época chuvosa posterior, em função do maior vigor das plantas, a rebrota do pasto foi
adiantada, permitindo também a redução da suplementação volumosa no cocho.
Figura 2. Piquete de Brachiaria brizantha (cv. Marandu), formado no sistema de ILP, pastejado por vacas leiteiras
no Sítio Valão (Mar de Espanha, MG).
Fonte: Embrapa Gado de Leite.
Em função dos resultados obtidos, esta área de 3 ha, normalmente cultivada com milho
para silagem, foi deixada como pasto no período de safra. Entre outubro de 2008 e março
de 2009, foram mantidas aproximadamente 21 vacas, em sistema de pastejo rotacionado,
com média de produção de leite de 20 kg vaca-1 dia, proporcionando produtividade
média de 140 kg ha-1 dia (Figura 3).
Figura 3. Número de vacas, produção média e produtividade de leite no período de outubro de 2008 a março
de 2009, obtidas em piquetes de B. brizantha (cv. Marandu) implantados no sistema de ILP no Sítio Valão (Mar
de Espanha/MG).
694 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Ainda na safra de 2008/09 uma área de aproximadamente 1,5 ha com pastagem degradada
próxima ao curral foi incluída no sistema, visando substituir a silagem que seria produzida
na área de 3 ha deixada com pasto e também recuperar esta área de pastagem. Decidiu-
se incluir o componente arbóreo visando tanto o sombreamento para os animais como
também alternativa de renda futura para os produtores. Adotou-se, assim, o sistema de
integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), com o plantio consorciado do milho para
silagem, braquiária e eucalipto. O arranjo espacial adotado foi o de 21,0 x (3,0 x 2,0), sendo
duas fileiras de árvores, com espaçamento entre plantas de 3,0 x 2,0 metros e 21 metros
entre as faixas, totalizando uma densidade de 416 árvores por hectare. Foram utilizadas
mudas de Eucalyptus grandis propagadas por sementes. Nas áreas entre as faixas de
árvores foi feito o cultivo em consórcio do milho e a Brachiaria brizantha (cv.Marandu). Seis
meses após o plantio do consórcio, e dois meses após a colheita do milho para silagem,
os animais tiveram acesso ao pasto recém-formado. Para isso foi necessária a proteção
das linhas de eucalipto por meio de cerca eletrificada. Em um primeiro momento foram
utilizadas novilhas, para evitar-se danos às árvores que já estavam com aproximadamente
3 m de altura. Nessa área foi realizado o cultivo de milho x braquiária durante quatro anos,
com produtividades de silagem de milho variando de 35 a 60 t/ha/ano, sendo este valor
máximo no primeiro ano. No quarto ano foi realizado o corte raso das árvores, com uma
produção de 55 esteres de madeira, comercializada para produção de toretes, além de
300 estacas que foram utilizadas para a produção de mourões tratados no sistema de
substituição de seiva na própria fazenda (Figura 4).
Figura 4. Detalhes da primeira área implantada com o sistema ILPF no Sítio Valão (Mar de Espanha, MG). No
quarto ano foi feito o corte raso das árvores para o aproveitamento da madeira para comercialização e produção
de mourões. Fonte: Embrapa Gado de Leite.
Ainda na safra de 2008/09 novas áreas foram inseridas no sistema de ILP. Em uma destas
áreas, considerada a melhor da propriedade e normalmente cultivada na safra e na safrinha
com milho para silagem, foi realizado novo teste para comprovação da capacidade de
suporte. A forrageira implantada foi a B. ruziziensis (cv. Comum), cuja finalidade inicial era
o fornecimento de forragem no inverno e de palhada para o plantio direto subsequente.
Capítulo 42
Casos de sucesso na implantação de sistema de integração lavoura-pecuária-floresta em 695
propriedades leiteiras de base familiar na Zona da Mata e do Campo das Vertentes de Minas Gerais
Parte da área (0,6 ha) foi dividida em 13 piquetes e explorada com quatro vacas, com
média de produção de leite de 18 kg vaca-1 dia, aproximadamente (Figura 5).
Figura 5. Piquetes de Brachiaria ruziziensis, formados no sistema de ILP, no Sítio Valão (Mar de Espanha, MG).
Fonte: Embrapa Gado de Leite.
É importante salientar que as vacas que pastejavam a área de B.ruziziensis não recebiam
silagem de milho e somente 2 kg vaca-1 dia de concentrado, além da forragem consumida
na pastagem. As vacas que pastejavam a área de B.brizantha, por sua vez, recebiam 10 kg
vaca-1 dia de silagem de milho e 4 kg vaca-1 dia de concentrado.
A partir de 2010, nova área de ILP, de aproximadamente quatro hectares, foi implantada
com o consórcio milho + B.brizantha (cv. Marandu). Após o corte do milho para a silagem,
em metade da área, a pastagem de capim-Marandu foi incorporada à área de B. ruziziensis,
totalizando 2,6 hectares. Esta área foi dividida em 17 piquetes, de modo que cada piquete
fosse pastejado por um dia, com descanso de 16 dias. Estes 17 piquetes mantiveram 16
vacas, com uma taxa de lotação superior a cinco vacas ha-1 (Figura 6). Com a redução do
volume de chuvas, no início da época seca, as vacas estão recebem 10 kg vaca-1 dia de
silagem de milho e 4 kg vaca-1 dia de concentrado, com produtividade média de leite
de 21 kg vaca-1 dia. Esses resultados evidenciam que a pastagem bem manejada é capaz
de manter animais com altas produtividades de leite para a região e o tipo de sistema,
gerando substancial redução nos custos.
696 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Na safra 2009/2010 foi também implantada uma nova área de ILPF, mais acidentada,
mas com o mesmo arranjo, em aproximadamente cinco hectares, utilizando-se o cultivo
em consórcio do milho e a Brachiaria brizantha (cv.Marandu) nas áreas entre as faixas de
árvores (Figura 7). Nessa oportunidade foram utilizadas mudas clonais de um híbrido de
eucalipto (urograndis). Na sequência, safra 2010/2011, foi implantada uma área adjacente
de mesmo tamanho com o sistema silvipastoril.
Figura 7. Implantação do sistema ILPF em duas áreas sequenciais. À esquerda a área implantada na safra
2009/2010. À direita a área implantada em 2010/2011. Fonte: Embrapa Gado de Leite.
A produção florestal para as demais áreas foi estimada com base em dados dendrométricos
obtidos em campo, com o auxílio do software SisEucalipto, desenvolvido pela Embrapa
Florestas para a estimativa da produção de madeira e seus multiprodutos. Foi feita uma
projeção da produção de madeira considerando-se um horizonte de 12 anos, com previsão
de dois desbastes seletivos (50%) aos 4 e 8 anos antes do corte final. Os resultados estão
apresentados na Tabela 2.
Capítulo 42
Casos de sucesso na implantação de sistema de integração lavoura-pecuária-floresta em 697
propriedades leiteiras de base familiar na Zona da Mata e do Campo das Vertentes de Minas Gerais
Vale salientar que nestes oito anos de trabalho em parceria com a Emater/MG e os
proprietários do Sítio do Valão, foi possível incrementar a produção diária de leite da
fazenda de 700 para 1.200 litros.
Figura 8. Sítio Valão, antes (esquerda) e após (direita) a implantação da estratégia iLPF.
Fonte: Google Earth.
Figura 9. Divisão em glebas da Chácara das Gabirobas em Coronel Xavier Chaves/MG e indicação do modelo a
ser utilizado para cada situação, de acordo com o seu potencial.
Fonte: Google Earth.
No ano zero, as despesas totais foram de R$2.128,27 ha-1 distribuídas como mostrado na
Figura 10.
Capítulo 42
Casos de sucesso na implantação de sistema de integração lavoura-pecuária-floresta em 699
propriedades leiteiras de base familiar na Zona da Mata e do Campo das Vertentes de Minas Gerais
Figura 11. Animais em sistema de integração eucalipto x braquiária na Chácara das Gabirobas em Coronel
Xavier Chaves/MG.
Fonte: Embrapa Gado de Leite.
700 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
O estoque de madeira em pé foi projetado da mesma forma que no caso anterior (Sítio do
Valão) sendo os dados apresentados na Tabela 3 a seguir:
Tabela 3. Estimativa da produção florestal com eucalipto no sistema de integração
lavoura-pecuária-floresta com plantio na safra 2009/2010 na Chácara das Gabirobas em
Coronel Xavier Chaves/MG
Ano da colheita
Tipo de madeira
Ano 4 Ano 8 Ano 12
Lenha/mourões (peças) 492 410 170
Toretes (st/ha) 10 75 40
Madeira para serraria (st/ha) 0 45 180
É importante ressaltar que estas projeções, em função de produtos, são apenas indicativas.
O mercado oferece outras alternativas que também podem ser exploradas pelo produtor.
No caso da Chácara das Gabirobas, por exemplo, há uma área de plantio de eucalipto que
foi desbastada e formado um sistema silvipastoril. O desbaste consistiu na retirada de três
linhas a cada cinco, de forma que o espaçamento final ficou em 10 x 1,5 metros. Após isto,
foi implantada pastagem de braquiária entre as linhas remanescentes de eucalipto (Figura
12). Nesta área, após o sexto ano, foi realizado um desbaste para retirada de madeira para
uso na construção de um curral (Figura 13).
Em outro caso, em uma propriedade vizinha que também adota o sistema, foi realizado
em 2015, um desbaste de 30 árvores em um sistema silvipastoril, com idade de 5 anos,
para produção de mourões rachados. Foram produzidos 520 mourões a um custo total de
produção de R$ 3,80/mourão já tratado. Considerando-se um preço médio de mercado de
R$ 10,00/mourão, a receita teórica seria de R$ 6,20/mourão. Esta receita naturalmente não
foi efetivada, uma vez que os mesmos foram usados na própria fazenda. Vale salientar que
a parte de baixo da planta, possibilitou a obtenção de quatro a cinco mourões rachados
por torete de 1,90 m.
Figura 12. Sistema silvipastoril formado após desbaste de plantio puro de eucalipto na Chácara das Gabirobas
em Coronel Xavier Chaves/MG.
Fonte: Embrapa Gado de Leite.
Capítulo 42
Casos de sucesso na implantação de sistema de integração lavoura-pecuária-floresta em 701
propriedades leiteiras de base familiar na Zona da Mata e do Campo das Vertentes de Minas Gerais
Figura 13. Curral construído com madeira proveniente do sistema silvipastoril na Chácara das Gabirobas em
Coronel Xavier Chaves/MG.
Fonte: Embrapa Gado de Leite.
A B
C D E
Figura 14. Antes da implantação do sistema ILPF (A); Trinta e oito meses após implantação (B); milho cultivado
concomitantemente com o eucalipto e braquiária (C); pós colheita da silagem, pastagem de braquiária
recuperação com o milho (D) e animais em sistema integração-lavoura-pecuária-floresta (E), na Chácara das
Gabirobas no município de Coronel Xavier Chaves, Campo das Vertentes de Minas Gerais.
Fonte: Embrapa Gado de Leite.
702 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Vale salientar que nos seis anos de trabalho em parceria com a Emater/MG e o proprietário
da Chácara das Gabirobas foi possível obter um incremento de produtividade diária de
leite de 100 para 800 litros.
Figura 15. Aspecto da Chácara das Gabirobas antes (A) e após (B) a implantação da estratégia ILPF.
Fonte: Google Earth.
Considerações finais
A implantação das Unidades de Referências Tecnológicas (URT’s) relacionadas ao sistema
de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) nas Regiões da Zona da Mata e do Campo
das Vertentes de Minas Gerais, tem se mostrado uma tecnologia sustentável gerando
diversos benefícios entre os quais se pode mencionar os seguintes aspectos:
Ambiental: o plantio direto sem revolvimento do solo desde que com cobertura vegetal
suficiente, para formação de uma boa palhada, tem reduzido consideravelmente a perda
do solo e água, promovendo melhorias em sua fertilidade natural e reduzindo problemas
relacionados ao assoreamento de mananciais.
Político: com o desenvolvimento e aumento da área plantada com sistemas ILPF, bem
como com os resultados positivos gerados, motivou-se o poder público, especialmente
no município de Coronel Xavier Chaves, a promover investimentos no setor agrícola,
com a aquisição de máquinas para plantio direto, que viabilizarão a implantação de
mais áreas com sistemas integrados de produção animal e vegetal. Destaca-se ainda o
crescente interesse dos proprietários rurais destas regiões e do Estado de Minas Gerais
na contratação de projetos relacionados ao Programa de Agricultura de Baixa Emissão
de Carbono (Programa ABC) e do Programa Nacional de Agricultura Familiar (PRONAF),
Capítulo 42
Casos de sucesso na implantação de sistema de integração lavoura-pecuária-floresta em 703
propriedades leiteiras de base familiar na Zona da Mata e do Campo das Vertentes de Minas Gerais
Agradecimentos
Os autores agradecem aos Senhores Carlos Machado, Sérgio Machado e Vicente de
Paula Machado, proprietários do Sítio do Valão, e ao Senhor Vanderlei dos Reis Souza
proprietário da Chácara das Gabirobas, por possibilitarem a implantação de Unidades
de Referências Tecnológicas em suas propriedades, promovendo a divulgação e a
transferência de tecnologias com grande potencial de agregação de valor e renda para o
setor agropecuário na região.
Referências
BRESSAN, M; VERNEQUE, R. S.; MOREIRA, P.; JONES, A. S. Tecnologias utilizadas pelos produtores de leite de Goiás
e suas relações com questões de sustentabilidade e competitividade do segmento de produção. In: SIMPÓSIO
SUSTENTABILIDADE DA PECUÁRIA DE LEITE NO BRASIL, 1999, Goiânia. Anais... Juiz de Fora: Embrapa Gado de
Leite; Goiânia: Serrana, 1999. p. 21-44.
CALSAVARA, L. H. F.; MULLER, M. D.; MARTINS, C. E.; ROCHA, W. S. D.; SOUZA SOBRINHO, F.; BRIGHENTI, A. M.
Desempenho econômico e produtivo da lavoura de milho em sistema iLPF. In: CONGRESSO NACIONAL DE MILHO
E SORGO, 29., 2012, Águas de Lindóia. Diversidade e inovações na era dos transgênicos: resumos expandidos.
Campinas: Instituto Agronômico; Sete Lagoas: Associação Brasileira de Milho e Sorgo, 2012. v. 1, p. 3374-3379.
COMISSÃO DE FERTILIDADE DO SOLO DO ESTADO DE MINAS GERAIS – CFSEMG. Recomendações para o uso
de corretivos e fertilizantes em Minas Gerais: 5a Aproximação. Antonio Carlos Ribeiro, Paulo Tácito Gontijo
Guimarães, Vitor Hugo Alvarez V.( Eds.) Viçosa, MG: 1999. 359p.
Rodrigo C. Alva
Capítulo 43
Sistemas silvipastoris em propriedades
rurais no Noroeste do Estado do Paraná
Jorge Ribaski
Maria Izabel Radomski
Vanderley Porfírio-Da-Silva
706 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
A região Noroeste do Paraná apresenta uma situação ambiental das mais degradadas no
Estado, sendo esta situação uma consequência direta do intenso desmatamento praticado
no passado e da forma inadequada de uso atual da terra, aliados à fragilidade atribuída
ao Arenito Caiuá, formação geológica que deu origem a solos extremamente suscetíveis
à erosão eólica e hídrica.
Da área total do Paraná (20 milhões de hectares), o Arenito Caiuá ocupa 16% (3,2 milhões
de hectares). Com 2,3 milhões de hectares de pastagens (72%), é considerada uma
importante região pecuária paranaense, abrigando aproximadamente 23% do rebanho
bovino do Estado, estimado em aproximadamente 9,5 milhões de cabeças (IBGE, 2011).
A expansão das áreas de pastagens nessa região foi uma consequência natural e até
mesmo benéfica para o tipo de solo da região, que é considerado impróprio para o cultivo
intensivo com culturas anuais, uma vez que favorece, ao longo dos anos, a queda de seu
teor original de matéria orgânica.
Os SSPs implantados no início, sem muito critério técnico, foram sendo adaptados às
características da região e hoje, pode-se dizer, possuem uma estratégia própria de
implantação e manejo e têm contribuído para dar maior sustentabilidade aos sistemas de
criação tradicionais.
Graças à pesquisa e a extensão rural, o reconhecimento dos benefícios gerados por sistemas
silvipastoris tem aumentado na região e vários tipos de sistemas começam a ser adotados
por produtores rurais. Nepomuceno e Silva (2009), avaliando sistemas de uso da terra em
43 propriedades da região Noroeste do Paraná, observaram que a prática silvipastoril já faz
parte da cultura produtiva local, em particular das propriedades com pecuária de corte.
As espécies do gênero Eucalyptus e Corymbia, além da grevílea (Grevillea robusta), são as
Capítulo 43
Sistemas silvipastoris em propriedades rurais no Noroeste do Estado do Paraná 707
que representam a maior parte da ocorrência nos sistemas silvipastoris, nessa região. Os
eucaliptos são usados principalmente como fonte de energia (lenha), estacas para cerca e
madeira para serraria. Aqueles produtores que optam pela grevílea, geralmente têm um
maior interesse pelo conforto térmico que o sistema oferece aos animais, além do uso
mais nobre, ou seja, madeira para serraria. Na sequência estão relatadas algumas dessas
experiências de campo e resultados de pesquisa em andamento, que buscam viabilizar e
consolidar os sistemas silvipastoris como uma estratégia de desenvolvimento sustentável
para a região.
Figura 1. Vista parcial do sistema silvipastoril com eucalipto (Corymbia citriodora), braquiária (Urochloa brizantha)
e bovinos da raça nelore, implantado no município de Paranavaí-PR.
708 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Como na época do plantio não havia disponibilidade de mudas clonais nem dos materiais
genéticos superiores de hoje, as mudas foram produzidas em sacos plásticos e com
material genético proveniente de sementes. Esses fatores, aliados às técnicas silviculturais
convencionais da época, contribuíram para a geração de um stand arbóreo heterogêneo
em crescimento e desenvolvimento.
Uma das primeiras pesquisas realizadas na área ocorreu aos 11 anos de implantação do
sistema, quando as árvores tinham 26 metros de altura e 32 centímetros de diâmetro
(DAP). Os resultados mostraram que a presença do componente arbóreo influenciou a
disponibilidade de matéria seca e a qualidade da forragem produzida (Tabela 1). Nos
locais mais próximos das árvores a produção de biomassa forrageira foi reduzida, porém
apresentou melhor qualidade em termos nutricionais, em função do aumento dos teores
de nitrogênio na matéria seca (Ribaski et al., 2003).
* Letras diferentes, dentro da mesma coluna, para cada uma das variáveis analisadas, indicam haver diferença
estatística significativa entre as médias, pelo Teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade.
Dessa forma, os autores concluíram que o sistema silvipastoril composto pela braquiária
(Urochloa brizantha) e pelo eucalipto (Corymbia citriodora) mostrou-se potencialmente
viável para a região, em função de não apresentar diferença na quantidade de nitrogênio
(proteína bruta) disponível para os animais, em relação à testemunha, e pelo adicional de
madeira produzido na área (204 m3ha-1).
Figura 2. Classificação das árvores de eucalipto (Corymbia citriodora), de acordo com critérios de forma e
qualidade dos fustes, em sistema silvipastoril implantado no município de Paranavaí-PR.
Ao todo foram avaliadas 112 árvores; destas, apenas quatro obtiveram a menor
classificação (classe 1), estando a maior parte concentrada nas classes 3 e 4, com 35 e 33
árvores respectivamente. No cálculo dos rendimentos em volume de madeira em metros
cúbicos, foi considerada a participação de cada classe em uma área de um hectare (Tabela
2). Para o cálculo dos valores a serem obtidos com a comercialização foi considerado o
rendimento de cada classe de árvore em metros cúbicos e foi utilizada como referência
para cada tora em pé o valor de R$ 94,00 o metro cúbico (Paraná, 2014).
Tabela 2. Estimativa de produção por hectare, em cada classe de árvore, e respectivos
valores da árvore de eucalipto em pé, em sistema silvipastoril com 19 anos de idade.
Volume Total R$ha-1
Classe
M³ ha-1 R$ ha-1 Ano*
1 155 14.415,00 759,00
2 170 15.810,00 832,00
3 220 20.460,00 1.077,00
4 290 26.970,00 1.419,00
5 370 34.410,00 1.811,00
* Tora em pé no produtor = R$ 94,00/m³ (valor médio para toras de 18 a >35 cm de DAP – Paraná, 2014).
O objetivo desta comparação foi mostrar a importância da seleção de boas mudas (padrão
genético), do uso de técnicas silviculturais adequadas e da condução e manejo das
árvores para que o stand se desenvolva da forma mais uniforme possível, proporcionando
maiores rendimentos ao produtor.
710 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 3. Produção de madeira e lenha (m³ha-1) em diferentes classes de árvores, de acordo com forma e
qualidade dos fustes e do volume total obtido.
Figura 4. Vista parcial do sistema silvipastoril com grevílea (Grevillea robusta), braquiária (Urochloa brizantha) e
gado de leite, implantado no município de Tapejara-PR
Para os produtores rurais, as funções socioeconômicas das árvores são mais perceptíveis
que as ecológicas. Entretanto, além da diversificação da produção na propriedade gerando
produtos e lucros adicionais, os sistemas silvipastoris contribuem para a diminuição dos
impactos ambientais negativos sobre as pastagens, o que permite reduzir, por exemplo,
a dependência externa de insumos, intensificando o uso do recurso solo e seu potencial
produtivo em longo prazo.
Com relação a esses aspectos, Radomski e Ribaski (2012) evidenciaram que a produção
de serapilheira variou em função das distâncias em relação aos renques das árvores, com
maiores aportes nos pontos mais próximos das linhas de árvores, atribuídos ao maior
acúmulo, nestes locais, de ramos e galhos das árvores (Figura 5).
712 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 5. Produção de serapilheira (matéria seca) em diferentes distâncias em relação ao renque de árvores em
um sistema silvipastoril com Grevillea robusta, no município de Tapejara-PR.
Os mesmos autores também avaliaram o efeito da grevílea (G. robusta) sobre a fertilidade
do solo e a produtividade da pastagem de U. brizantha, nesse sistema silvipastoril com
gado leiteiro. Os autores constataram que a serapilheira formada pelas árvores de grevílea
torna-se uma importante fonte de matéria orgânica e de nutrientes para o solo, além
de favorecer a produção de matéria seca e melhoria dos teores de N e K da pastagem,
particularmente no verão.
Considerações finais
Esses e outros resultados de pesquisa, nessa mesma região, têm levado à crescente adoção
dos sistemas silvipastoris, particularmente com essas duas espécies florestais (eucalipto e
grevílea). O principal fator de adoção, particularmente para a grevílea, de acordo com os
pecuaristas locais, está mais ligado aos efeitos benéficos das árvores sobre as pastagens
e os animais, do que propriamente o retorno econômico que as árvores podem render. Já
o aumento do número de serrarias e o valor da madeira na região, aliados à localização
estratégica dos polos moveleiros de Umuarama e Arapongas, que favorece e coloca a
região dentro do raio de ação destes dois grandes polos, torna a produção florestal uma
atividade atraente, segura e rentável. O somatório desses fatores positivos tem motivado
os pecuaristas a se interessarem pela conversão de áreas de pastagens tradicionais em
sistemas silvipastoris.
Referências
IBGE. Produção da pecuária municipal 2010: Brasil. Rio de Janeiro, 2011. v. 38, 65 p.
NEPOMUCENO, A. N.; SILVA, I. C. Caracterização de sistemas silvipastoris da Região Noroeste do Estado do Paraná.
Floresta, v. 39, n. 2, p. 279-287, 2009.
RADOMSKI, M. I.; RIBASKI, J. Produção da grevílea e eucalipto em sistema silvipastoril na região do Arenito
Caiuá, noroeste do Paraná. Colombo: Embrapa Florestas, 2011. 31 p. (Embrapa Florestas. Documentos, 231).
RADOMSKI, M. I.; RIBASKI, J. Fertilidade do solo e produtividade da pastagem em sistema silvipastoril com
Grevillea robusta. Pesquisa Florestal Brasileira, v. 32, n. 69, p. 53-61, 2012.
RIBASKI, J.; RAKOCEVIC, M.; PORFÍRIO-DA-SILVA, V. Avaliação de um sistema silvipastoril com eucalipto (Corymbia
citriodora) e braquiária (Brachiaria brizantha) no noroeste do Paraná. In: CONGRESSO FLORESTAL BRASILEIRO,
8., 2003, São Paulo. Benefícios, Produtos e Serviços da Floresta: Oportunidades e Desafios do Século XXI.
São Paulo: Sociedade Brasileira de Silvicultura: Sociedade Brasileira de Engenheiros Florestais, 2003. 1 CD-ROM.
Alvadi Antônio Balbino Junior
Capítulo 44
Integração Lavoura-Pecuária em solo
arenoso e clima quente: um caso da região
Noroeste do Paraná
Julio Cezar Franchini Leandro Cezar Teixeira
Antonio Cesar Pacheco Formighieri
Alvadi Antonio Balbinot Junior
Henrique Debiasi
716 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Na última década, muitas áreas antes ocupadas com pastagens perenes, especialmente
com espécies de braquiária (Urochloa spp.), foram convertidas em cultivos de soja. A
maioria dessas áreas apresenta baixos teores de argila (inferiores a 20%) e altos teores
de areia. Com isso, há baixa capacidade de retenção de água, carbono orgânico e
nutrientes, assim como há alta suscetibilidade à erosão. Aliado a isso, em geral, as áreas
arenosas onde ocorre a expansão da soja se encontram em regiões quentes, com alta
evapotranspiração. Portanto, dois fatores negativos ao cultivo de espécies graníferas
convergem nessa circunstância: o solo retém pouca água e o seu consumo é alto. Em
relação ao carbono orgânico, é a mesma situação, pois há necessidade de se acumular
matéria orgânica no solo para melhorar a estrutura do solo, aumentando a capacidade de
troca de cátions (CTC) e a retenção de água. Porém, o ambiente é quente, o que acelera a
mineralização do material orgânico. Isso impõe um grande desafio ao manejo do sistema
de produção nessas áreas para permitir o cultivo de espécies graníferas com rentabilidade
satisfatória. Esse contexto é observado na região Noroeste do Paraná, também conhecida
como Arenito Caiuá.
Neste capítulo será analisado o caso da Fazenda Santa Felicidade, cujo proprietário é o
Médico Veterinário, especialista em ILP, Antonio Cesar Pacheco Formighieri. A fazenda
está localizada em Maria Helena, PR, e apresenta 151 ha ocupados com a cultura da
soja no verão e pastagem anual de inverno, 161 ha com pastagem perene e 13 ha com
eucalipto. O relevo é ondulado, com declividade média de 5 a 10%. O solo da fazenda é
muito arenoso, com apenas 12% de argila.
1) Alta erosão hídrica, pois o solo exposto, desestruturado pela mobilização, ficou
suscetível ao processo erosivo, reduzindo a sua capacidade produtiva;
2) Alta incidência de plantas daninhas na cultura da soja, as quais eram difíceis de
serem controladas por meio dos herbicidas registrados para a soja convencional,
já que, na época, o cultivo de soja tolerante ao glifosato - Roundup Ready (RR)
não era regulamentado no Brasil;
3) Problemas na formação do estande da soja, pois o solo revolvido apresentava
baixa capacidade de retenção de água e alta temperatura.
Nesse contexto, de 2001 a 2005, ocorreram muitos entraves à viabilização econômica
do cultivo de soja na fazenda. Porém, especialmente a partir de 2005, novas tecnologias
foram incorporadas ao sistema de produção, facilitando o manejo, reduzindo custos e
proporcionando aumento de produtividade. Na última década, os principais fatores que
alavancaram a ILP na fazenda Santa Felicidade estão esquematizados na Figura 1, sendo
estes:
1) Uso de cultivares de soja RR. Essa tecnologia mudou radicalmente a ILP na Fazenda,
pois facilitou o manejo de plantas espontâneas de braquiária que emergiam
718 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 1. Principais fatores que impulsionaram a Integração Lavoura-Pecuária na última década - Fazenda Santa
Felicidade, Maria Helena, Noroeste do Paraná.
É importante mencionar a melhoria das condições químicas do solo geradas pelo cultivo
da soja, permitindo alta produção forrageira em sucessão à cultura. Nesse contexto,
há sinergia entre o cultivo de pastagens e de soja. A pastagem melhora a estrutura do
solo, aumenta os estoques de carbono orgânico e reduz a sobrevivência de doenças
necrotróficas e algumas pragas da cultura. Paralelamente a isso, a soja proporciona
melhoria nos atributos químicos do solo, favorecendo a pastagem cultivada em sucessão.
20 litros), utilizando-se ração para complementar a dieta. Para o gado de corte, obteve-se
0,65 kg dia-1 de ganho de peso para cada animal, utilizando-se lotação média de 4 UA ha-1,
o que confere ganho de aproximadamente 2,6 arrobas ha mês-1, sem complementação de
ração ou silagem. Mesmo após a utilização da U.ruziziensis como forragem de entressafra,
a mesma conferiu adequado aporte de palha para o cultivo de soja em plantio direto na
sucessão (Figura 2).
Foto: Alvadi Antonio Balbinot Junior
Figura 2. Pastagem de Urochloa ruziziensis após cultivo de soja (em primeiro plano) e pastagem tradicional da
propriedade vizinha (em segundo plano).
Resultados de pesquisa obtidos nas condições do Estado do Paraná indicam que, em geral,
existe uma conservação de aproximadamente 5 a 10% do carbono adicionado ao solo na
forma de palhada. Considerando-se que a pastagem bem conduzida pode aportar em torno
de 10 toneladas de palha ha-1 entre os meses de maio e setembro (considerando raízes e
parte aérea), com um teor médio de 40% de carbono, haveria um aporte médio de pelo
menos 400 kg ha-1 de carbono, na forma de matéria orgânica do solo. No caso da região
Noroeste do PR, devido às altas temperaturas, o mais importante é a formação de um pool
de matéria orgânica transitório, com os benefícios a ele associados, como conservação de
nutrientes e conservação de água pela redução de temperatura na superfície.
Outro resultado pouco considerado, mas que apresenta alta relevância, é a valorização da
propriedade rural. A ILP possibilitou a mudança de patamar produtivo da Fazenda, saindo
de uma condição de alto nível de degradação para alto nível de produção e conservação
dos recursos naturais (Figura 3).
Considerações finais
A região Noroeste do Paraná é caracterizada por solos arenosos, clima quente e
pastagens em algum nível de degradação. A Integração Lavoura-Pecuária, considerando
especialmente a produção de carne, leite e soja é uma das estratégias mais indicadas
para mudar essa condição, possibilitando aumento na produção de riquezas associadas
à melhoria de indicadores ambientais. No entanto, é necessário fazer uma análise técnica
criteriosa sobre as particularidades de cada propriedade antes de iniciar o sistema,
considerando: tamanho da área; conformidade à legislação ambiental; condição de
vegetação, topografia, solo e clima; estrutura disponível; disponibilidade de mão-de-
obra; domínio tecnológico por parte do produtor e disponibilidade de assistência técnica
capacitada para implantação e condução do sistema.
Referência
SÁ, J. P. G.; CAVIGLIONE, J. H. Arenito Caiuá: capacidade de lotação das pastagens. Londrina: IAPAR, 1999. 15 p.
(IAPAR. Informe da pesquisa, 132).
Davi J. Bungenstab
Capítulo 45
Integração lavoura-pecuária em solos
hidromórficos no bioma Pampa
Jamir Luís Silva da Silva
Claudio Ramalho Townsend (in memoriam)
724 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
No Rio Grande do Sul (RS), o bioma Pampa apresenta uma área de aproximadamente
176.496 km2, o que equivale a 2,07% da área agropecuária brasileira e 63% do território
e 16% do PIB do Estado. A lavoura de arroz (Oryza sativa) representa importante setor
do agronegócio rio-grandense. Conforme dados do Instituto Rio-Grandense do Arroz, a
orizicultura envolve 18,5 mil produtores, gera mais de 230 mil empregos e valor bruto
estimado em R$ 5,0 bilhões, além da arrecadação anual em ICMS de R$ 500 milhões
(cerca de 3% do PIB estadual). Anualmente, em torno de 1,1 milhão de ha são usados pela
lavoura arrozeira, com aproximadamente 20 a 25% desta área sendo utilizada em sistema
integrado de produção agropecuária, durante o pousio da cultura do arroz.
É importante destacar que nos modelos de sistemas para esses ambientes, o cultivo
de arroz irrigado é a atividade preponderante dentro das rotações e/ou sucessões,
considerando sua exigência em manejo de solo e água. Mas deve ser realçado que, para
adequação da integração com pastagens de inverno e/ou verão e outras culturas de
verão nessas áreas, práticas/processos de drenagem do terreno, de calagem e fertilização
de acordo com as demandas dos cultivos, assim como o manejo do pastejo com carga
animal ajustada à capacidade de suporte dos pastos são ferramentas imprescindíveis para
a sustentação desses modelos de produção.
Do ponto de vista histórico, a integração de animais com culturas agrícolas nesse bioma
consta dos primeiros anos do século 20, onde bovinos pastejavam a resteva da cultura
de arroz na área das terras baixas. Esse modelo de sistema integrado ainda é utilizado no
presente momento. Grandes investimentos tecnológicos foram feitos na lavoura arrozeira
e poucos na pecuária utilizada nesse sistema agropastoril. Isso conduziu a elevações na
produtividade da cultura, podendo atingira mais de 12 t/ha, mas baixa produtividade
animal com índices de 50 a 90 kg ha-1 ano de peso vivo (PV) em pastagens nativas e/ou de
regeneração espontânea.
No planejamento de uso destas áreas é imprescindível pensar que 20% a 30% dos
componentes (culturas, pastagens ou plantas de cobertura) tenham como finalidade
principal a melhoria do solo, pela incorporação de palhada com boa relação C/N,
incorporação e ciclagem de nutrientes e fixação biológica de nitrogênio.
* Resultados adaptados de Silva et al. (1997); Saibro e Silva (1999); Reis e Saibro (2004); Silva e Silva (2009).
A B C
Figura 1. Detalhes de pastagem de azevém anual com nitrogênio (A); pastagem da leguminosa anual trevo Ball
(B) e arroz na sucessão (C). Unidade de Referência Tecnológica, EMATER-RS (Viamão, RS) e UFRGS. Fazenda dos
Touros, Capivari do Sul, RS. Safra de 1998/1999.
Em outra região arrozeira, Santa Vitória do Palmar, Litoral Sul, na Fazenda Pimenteira, Silva
(2009), trabalhando em uma Unidade de Referência Tecnológica (URT) com a mistura de
azevém, trevo branco, trevo vermelho e cornichão São Gabriel em solo corrigido e adubado
conforme recomendação técnica baseada em análise de solo e drenado superficialmente,
obteve índices de produtividade animal acima de 2.000 kg ha-1 de PV em 30 meses de
pastejo, no período de pousio da lavoura de arroz de 4 anos. Importante salientar que
no manejo das pastagens a carga animal sempre foi ajustada conforme a capacidade de
suporte do pasto e o pastoreio obedeceu aos critérios do método contínuo com carga
ajustada e variável (Silva, 2009) (Figura 2a). Na Figura 2b está apresentada imagem de
pastagem de azevém anual e cornichão El Rincón no segundo ano, no município de
Bacupari, Fazenda Cavalhada, que permitiram produtividade animal de 720 Kg ha-1 de PV
entre os meses de maio e outubro.
728 Fotos: Jamir Luís Silva da Silva
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A B
Figura 2. Detalhes de pastagens de inverno de segundo ano após a lavoura de arroz, manejada com fertilidade
ajustada à análise de solo e pastejo com oferta de forragem entre 12 e 15% de oferta de forragem, nos municípios
de Santa Vitória do Palmar - RS (A), Fazenda Pimenteira e Mostardas (B), Fazenda Cavalhada.
Produtores que empregam tecnologias com o uso do rolo-faca como ferramenta de manejo
de solo têm conseguido iniciar o pastejo antes de 100 dias após a colheita do arroz, devido à
rápida incorporação ao solo do volume de palhada residual da cultura do arroz irrigado. No
momento da entrada dos animais nas pastagens de inverno deve ser observada a estrutura de
piso, pois se o pasto não estiver bem estabelecido, com boa cobertura de massa de forragem e
sistema radicular desenvolvido, o início do pastejo fica comprometido. Em uma URT de ILP, no
município de Camaquã, RS, implantada no ano de 2009 o pastejo foi iniciado em 30 de junho,
com carga animal de 320 kg de PV ha-1 e massa de forragem em 1.600 kg ha-1, 100 dias após
a colheita da lavoura de arroz (Figura 3). Essa pastagem drenada, calcariada e fertilizada de
acordo com a recomendação técnica baseada em análise do solo, produziu 426 kg ha-1 de PV
até o final do ciclo do verão seguinte, o que equivale a cinco vezes mais, quando comparada
ao modelo tradicional utilizado na propriedade - semeadura a lanço de azevém em resteva de
arroz com as marachas (taipas) desmanchadas, sem correção e fertilizações.
Fotos: Jamir Luís Silva da Silva
A B
Figura 3. Resteva de arroz com uso de rolo-faca logo após a colheita do arroz (A), com pastagem na entrada dos
animais (30/junho) semeada em maio (B). Granja Cariola, Camaquã - RS, 2009.
A área foi conduzida com arroz irrigado até a safra 2005/06, a qual, após a colheita, foi
drenada com a construção de terraços de base larga (7 a 8 metros de largura) visando
o estabelecimento de pastagens e culturas de sequeiro. No inverno de 2006 ficou em
pousio, seguindo com soja semeada em dezembro de 2006. No inverno 2007, semeou-se
aveia+azevém+ervilhaca, seguido de milho no final da primavera. Em 2008, a sequência
foi aveia+azevém+ervilhaca (provindos da ressemeadura natural), com predominância de
azevém, seguidos de soja. Esta área vem sendo conduzida com pastagem de inverno de
ressemeadura natural (notadamente azevém anual) e no verão vem sendo alternando as
culturas de milho e soja em sistema de plantio direto na palhada do azevém. Durante os
períodos de inverno-primavera vêm sendo pastejada por novilhos da raça charolesa com
cargas contínuas ajustadas para 12 a 15% do PV de oferta de forragem em massa seca, o que
vem permitindo taxas de lotação de 600 a 1.000kg de PV ha-1, de acordo com a produção de
forragem. O pastejo tem gerado rendimento animal entre 225 e 344 kg ha-1 de PV entre final
de maio e início de outubro com a garantia da ressemeadura natural do azevém (Figura 4).
Figura 4. Integração de pastagem de inverno, em ressemeadura natural, e lavouras de soja (A) e milho (B) em
terras baixas. Estação Experimental Terras Baixas, Embrapa Clima Temperado. Capão do Leão - RS.
Considerações finais
A aplicação de tecnologias recomendadas e investimentos em pastagens cultivadas de
estação fria, na integração lavoura-pecuária, permitem bom desempenho do sistema e
boa rentabilidade em curto espaço de tempo nas terras baixas do bioma Pampa.
A produtividade animal potencial das pastagens de estação fria acrescida ao das pastagens
nativa em integração lavoura de arroz-pecuária de corte está muito acima da produção
média da pecuária tradicional no Rio Grande do Sul. Os resultados obtidos pela pesquisa
e por alguns produtores chegam a valores entre de 700 e 1.000 kg ha-1 ano de peso vivo,
ficando bem acima dos valores de 50 a 90 kg ha-1 ano, obtidos com o manejo tradicional
da pecuária gaúcha em pastagens nativas.
730 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Referências
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sucessão e rotação ao arroz Clearfield. In: WORKSHOP INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA-FLORESTA NO BIOMA
PAMPA, 1., 2009, Pelotas. Palestras... Pelotas: Embrapa Clima Temperado, 2009. 1 CD-ROM.
REIS, J. C. L.; SAIBRO, J. C. Integração do arroz com pastagens cultivadas e pecuária. In: GOMES, A. S.; MAGALHÃES
JUNIOR, A. M. (Ed.). Arroz irrigado no Sul do Brasil. Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2004. Cap.
24, p. 831-859.
SAIBRO, J. C.; SILVA, J. L. S. Integração sustentável do sistema arroz e pastagens utilizando misturas forrageiras
de estação fria no litoral norte do Rio Grande do Sul. In: CICLO DE PALESTRAS EM PRODUÇÃO E MANEJO DE
BOVINOS DE CORTE, 4., 1999, Canoas. Anais... Canoas: Ed. da Ulbra, 1999. p. 27-56.
SANTOS, D. T.; CARVALHO, P. C. F.; ANGUINONO, I.; CARMONA, F. C.; SANT’ANNA, D. M. Desafios e horizontes
da integração lavoura-pecuária em áreas cultivadas com arroz irrigado. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ARROZ
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de bovinos de corte em integração lavoura-pecuária nas terras baixas do Bioma Pampa. Pelotas: Embrapa
Clima Temperado, 2011b. 8 p. (Embrapa Clima Temperado. Circular técnica, 119).
Davi J. Bungenstab
Capítulo 46
O Papel dos Sistemas Integrados e
Diversificados no Desempenho das
Empresas Rurais: o caso da Sapé Agro
Artur Henrique Leite Falcette
732 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
As empresas rurais brasileiras vêm enfrentando um desafio crescente na última década, a
redução de suas margens de lucro. Depois dos ganhos de produtividade experimentados
após a revolução verde, fica cada vez mais difícil incrementar produtividade nas
propriedades rurais, o que, aliado a custos crescentes e voláteis, devido à globalização do
comércio, especialmente de commodities, proporciona instabilidade nos resultados do
produtor rural.
Por outro lado, os avanços em gestão também são crescentes e, cada vez mais, o produtor
entende o que e como analisar. Margem líquida, margem operacional e faturamento/
lucro por hectare passaram a ser amplamente discutidos, controlados e perseguidos.
Nesse contexto, algumas empresas rurais têm buscado soluções para contornar o
achatamento de suas margens, ou até mesmo para tentar elevá-las ao longo do tempo.
Entre as principais soluções observadas estão o aumento de área (expansão de atividades
já existentes), a integração de atividades já existentes e a inserção de novas atividades
no sistema de produção. E por trás dessa mudança no perfil dos sistemas produtivos
existem dois conceitos muito importantes, que sustentam essas decisões tomadas pelos
empresários; a economia de escala e a economia de escopo.
Ainda de acordo com os autores, a economia de escopo, por outro lado, faz com que
o custo médio unitário seja reduzido pela inserção de uma nova atividade no sistema
produtivo, ou seja, diversificando-se o sistema de produção. Esse tipo de situação pode
acontecer por 3 motivos:
O entendimento desses dois conceitos é fundamental para entender a ótica com a qual
empresas diversificadas e com atividades integradas enxergam o mercado e buscam a
Capítulo 46
O Papel dos Sistemas Integrados e Diversificados no Desempenho das Empresas Rurais: 733
o caso da Sapé Agro
A Sapé Agro
A Sapé Agropastoril LTDA é uma empresa rural familiar, localizada no município de
Maracaju – MS, atualmente produzindo soja, milho, aveia, cana de açúcar, leite, frango
de corte, gado de corte, genética da raça Brangus (reprodutores e matrizes), turismo
tecnológico rural e educação.
Atualmente, a empresa conta 5.535 hectares de área total, entre áreas próprias (fazendas
Sapé, Invernadinha e Volta Rica) e arrendadas (fazenda Pontal), sendo que parte de sua
produção de cana de açúcar (40%), encontra-se em área arrendada, enquanto o restante
da produção se concentra em áreas próprias. São cultivados atualmente cerca de 2500
hectares de soja no verão, que no inverno são utilizados para milho safrinha, aveia e
pastagens temporárias. Sua área fixa de pastagens, onde encontram-se as matrizes do
rebanho bovino de corte totalizam 390 hectares, suportando durante o verão 2.000
cabeças em média. A avicultura de corte produz em média 140 mil aves a cada 42 dias,
com intervalos de vazio sanitário de 12 dias.
As atividades produtivas
Cada uma das atividades desenvolvidas na Sapé Agro tem importância fundamental
para os resultados econômico-financeiros da empresa, bem como na gestão de risco das
atividades, buscada através da diversificação e da gestão dos sistemas integrados, como
a integração lavoura-pecuária.
Vale ressaltar que não foi somente a pecuária de corte que se beneficiou do sistema.
A integração de atividades, oriunda da diversificação, mudou a maneira de se pensar
a estratégia da empresa, bem como foi fundamental na construção de seu modelo de
negócio. O olhar para o hectare como menor unidade produtiva, que deve ter seus
ganhos maximizados, fez com que questionamentos surgissem dentro da empresa
no que tange a expansão (aumento de escala). Além disso, o valor de terra crescente
na região reduziu as margens de atividades que demandam grandes áreas para sua
execução, dificultando novos investimentos em terra. Um terceiro fator importante
nessa análise é a especialização crescente das propriedades rurais nas atividades que
praticam e, especialmente, nas atividades meio, ou seja, naquelas que acontecem dentro
da propriedade com o intuito de servir de suporte às atividades fim (produção de grãos,
gado etc). As atividades meio, normalmente, estão relacionadas aos processos produtivos
e acabaram sendo absorvidas internamente pelos produtores rurais com dois objetivos:
reduzir custos e/ou sanar dificuldades estruturais locais. É por isso que as empresas rurais
passaram a realizar atividades como: armazenamento de grãos, fabricação de rações,
manutenção de máquinas e equipamentos, transporte de grãos e máquinas, entre
outras. No geral, as empresas assumiram também atividades de gestão, como a gestão
administrativa do dia a dia, departamento pessoal, finanças e até contabilidade em alguns
casos, todas elas com o intuito de atender as atividades principais da empresa.
Com a Sapé Agro não foi diferente. A empresa se especializou em diversas atividades,
buscando principalmente a redução de custos. Nesse sentido, atividades como as
citadas acima, entre tantas outras, passaram a ser desenvolvidas de forma planejada,
estruturada e controlada, recebendo investimentos que elevaram consideravelmente
sua qualidade. Com essas novas áreas estabelecidas ao longo do tempo, operando com
qualidade e suportando as atividades fim da empresa (produção agropecuária de fato),
surge o questionamento de como maximizar sua atuação, uma vez que seu custo fixo já
está estabelecido. Dessa forma, a empresa desenvolve seu modelo de negócio baseado
nas premissas de maximização do resultado por hectare, pautado em atividades de
valor agregado e com redução/diluição dos custos fixos envolvidos no custo da terra e
nas atividades de suporte. A lógica, dessa forma, deixa de ser buscar o aumento de áreas
e atividades já existentes e passa a ser a busca por atividades que extraiam benefícios
das sinergias geradas com atividades já existentes, incorporando atividades de maior
margem, possibilitando também o aumento da margem de atividades já existentes.
As matrizes da fazenda começam sua migração das áreas fixas de pastagem para as áreas
de integração conforme essas vão sendo liberadas, o que acontece inicialmente com as
áreas de produção de silagem de milho. Nesse momento, elas são agrupadas em lotes
maiores, que serão novamente divididos antes do início dos partos (julho). Atualmente
100% do rebanho de matrizes passa por IATF (inseminação artificial em tempo fixo)
e ressincronização de cio, além de repasse com touros da raça Brangus, produzidos na
própria fazenda. Caso a prenhes não seja confirmada após o término da estação de
monta, as vacas são abatidas. O nascimento dos bezerros acontece no período entre julho
e setembro, quando as vacas ainda se encontram nas áreas de integração, o que faz com
que os animais nasçam em áreas mais limpas, que por se tratarem de áreas de agricultura,
usualmente estão livres de contaminação por parasitas e/ou agentes causadores de
doenças, especialmente intestinais. Quando retornam às áreas de pastagem (início de
setembro, liberando as áreas de agricultura para rebrote e dessecação), os bezerros já
possuem maior imunidade contra doenças, especialmente tristeza bovina.
Com o término do plantio dessas áreas e posterior avanço do outono, é fundamental que a
equipe de pecuária monitore muito bem a disponibilidade forrageira das áreas temporárias
e das áreas fixas de pastagem, buscando não perder o primeiro corte da pastagem,
que poderá prejudicar o manejo durante o inverno e causar perdas de matéria vegetal
(principalmente pelo pisoteamento pelos animais), bem como de não sobrecarregar as
áreas fixas de pastagem, fazendo com que a vedação aconteça o quanto antes para que a
forrageira se recupere o mais rapidamente possível durante a primavera, tendo em vista que
essas áreas receberão todo o rebanho de volta até meados do mês de setembro.
e delicado. Para tal, a interação entre as equipes nesse caso deve ser muito boa, pois
deverá ser definida qual a melhor época para o início de colheita do milho, eventualmente
antecipando-o (grão entre 22 e 24% de umidade) para que os animais passem a ter a
oferta de pastagem com maior antecedência. Da mesma forma, a saída dos animais
dessas áreas deve acontecer com antecedência suficiente para que seja deixada palhada
para o plantio de soja, evitando-se o superpastejo. Assim sendo, fica claro que a interação
e as concessões feitas pelas duas equipes na fase de planejamento, são a chave para o
bom funcionamento do sistema.
Esses números servem como referência para a criação de metas de rentabilidade para
cada uma das atividades, ajudando assim na definição dos preços de comercialização, ao
aplicar-se as margens estabelecidas como meta para o custo de produção do milho. Caso
esse valor seja maior que o valor corrente de mercado, a empresa pode optar em comprar
milho de fora, utilizando-o por exemplo na pecuária, carregando seu estoque para venda
futura a níveis mais altos. Essa decisão deve ser tomada com base no fluxo de caixa da
empresa e com conhecimento do custo de armazenagem desse produto.
Fica assim evidente que a integração das atividades de agricultura e pecuária, de maneira
profissional, visando maior rentabilidade do negócio, passa por um processo intensivo
de gestão da informação, que apoia o empresário rural em sua tomada de decisão. Essas
informações são fundamentais tanto na definição de premissas básicas do modelo, até a
avaliação de resultado do sistema, quando podemos entender se a terceira safra de fato
tem potencial para agregar rentabilidade ao negócio.
Na Sapé Agro, por exemplo, em anos onde nem todas as fêmeas bovinas estiveram em
áreas de integração, foi possível observar ganhos/perdas de peso e escore do rebanho.
Fêmeas que continuaram nas áreas fixas de pastagem, mesmo com suplementação
nutricional, feita com ração concentrada, apenas mantiveram seu peso, enquanto fêmeas
nas áreas de integração, alimentando-se somente das pastagens e restos culturais de
milho, apresentaram ganho de peso de 450 gramas/cabeça/dia.
Capítulo 46
O Papel dos Sistemas Integrados e Diversificados no Desempenho das Empresas Rurais: 739
o caso da Sapé Agro
Dessa forma, podemos concluir que se aproveitou mais do potencial de uso do solo,
conforme Tabela 2, já que os custos por hectare da implantação do sistema de integração
em comparação ao sistema tradicional, diferem somente na incorporação da Urochloa
ruziziensis no plantio.
Tabela 2. Faturamento Bruto Esperado nos Dois Sistemas de produção na Sapé Agro
(em R$/há).
Fonte da Receita Unidade V.U Produção/Ha R$/Ha
Soja Sacas 60,00 55,00 3.300,00
Milho Sacas 22,00 100,00 2.200,00
Carne Kg 9,00* 125,00** 1.125,00
Como podemos ver as três atividades diferem bastante em sua estrutura de custos,
tamanho e na margem apresentada. Na análise considerar-se-á que a área que elas
ocupam dentro da fazenda é a mesma. A primeira pergunta que gera discussão no
exemplo proposto consiste em se analisar qual atividade deveria ou poderia ser eliminada
do sistema, ou seja, caso tivéssemos que eliminar alguma delas do sistema, qual seria
escolhida. Para tal análise deve-se observar a margem operacional de cada uma delas,
indicador que permite com que essa comparação seja feita e que é obtido subtraindo-
se da receita líquida os custos diretos de produção e os custos indiretos (fixos), esses
últimos rateados entre as atividades (no caso do exemplo, utilizando-se o faturamento
740 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
de cada atividade como base de rateio, uma vez que todas ocupam a mesma área). A
resposta dessa questão sempre divide quem faz a comparação entre as atividades B e C.
Isso ocorre, pois existe uma dificuldade conceitual por parte de quem analisa de saber se
o número a ser observado é a margem operacional absoluta ou em termos percentuais.
Analisando a margem operacional em termos percentuais, parece óbvio que a atividade
B deve ser eliminada do sistema. No entanto, essa atividade deixa aproximadamente R$
3,8 milhões em caixa, enquanto a atividade C deixa pouco mais de R$ 1 milhão. É como
perguntar a quem analisa a preferência entre ser dono de 50% da lanchonete da esquina
ou de 1% da Coca-Cola.
Considerações finais
A discussão sobre a diversificação de sistemas agrícolas de produção atualmente
encontra-se no extremo oposto à especialização. É como se as empresas tivessem que
optar exclusivamente por um ou pelo outro, ou seja, por crescer na mesma atividade que
Capítulo 46
O Papel dos Sistemas Integrados e Diversificados no Desempenho das Empresas Rurais: 741
o caso da Sapé Agro
E a resposta para essa pergunta não é uma escolha simplista entre as opções de escala ou
escopo (crescer ou diversificar), isso porque, por mais antagônicos que esses diferentes
modelos pareçam, em determinado momento, com o ganho de maturidade na gestão,
bem como com o aumento de seu profissionalismo (domínio da gestão financeira, de
processos e de pessoas), a empresa deve buscar aproveitar o melhor dos dois modelos,
criando na diversificação de atividades a possibilidade de dar escala ao negócio.
Referências
PINDYCK, R. S.; RUBINFELD, D. L. Econometria: modelos e previsões. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
Rodrigo Peixoto
Capítulo 47
Integração lavoura-pecuária-floresta:
caso de sucesso da Fazenda Santa
Brígida, no Estado de Goiás
Priscila de Oliveira Raphael Augusto de Castro e Melo
Roberto José Freitas Alex da Silva
João Kluthcouski William Marchió
Anábio Aparecido Ribeiro Lourival Vilela
Luiz Adriano Maia Cordeiro Luiz Carlos Balbino
Luciene Pires Teixeira
744 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Sua área total é de 922 ha, dos quais 184,4 ha (20%) correspondem à Área de Reserva
Legal (ARL) e 27 ha à Área de Preservação Permanente (APP), existindo sete nascentes
hídricas. A Área de Uso Alternativo (AUA) é de aproximadamente 450 ha, onde nas safras
de verão são cultivados soja e milho. A área de pastagem é de 200 ha, na modalidade
de “pastagem exclusiva”, onde não se cultiva lavouras em rotação. A área de pastagem
consorciada com eucalipto em sistema de integração (outrora também consorciada
com culturas graníferas) é de 60 ha. Apesar dos solos com ótimas propriedades físicas e
topografia plana a suave ondulada, a Fazenda Santa Brígida até o ano de 2006 apresentava
apenas pastagens degradadas, com rebanho total de apenas 500 bovinos, sendo que os
de corte eram abatidos entre 4 e 4,5 anos de idade.
Em outubro de 2006 a Fazenda foi visitada por técnicos da Embrapa, que realizaram
um diagnóstico da propriedade. Concomitantemente, estabeleceu-se um acordo para
a participação da Embrapa no projeto de recuperação da capacidade produtiva da
propriedade, condicionada à abertura da Fazenda para a realização de atividades de
divulgação das técnicas, como dias-de-campo. Os custos relativos à insumos, serviços
e mão-de-obra foram assumidos pela fazenda. Também acordou-se a condução de
ensaios de validação de tecnologias e que fossem disponibilizadas vagas para estágios
de estudantes. A Embrapa conseguiu parceria com as empresas John Deere e Ikeda
Implementos Agrícolas, além de outras empresas setor agrícola.
Nos anos seguintes, outros sistemas de ILP foram adotados, principalmente com objetivo
de produzir forragem para o período seco. Assim, além dos consórcios de culturas
graníferas anuais com forrageiras perenes, gradativamente passou-se a ampliar o uso
de sucessão de culturas – como soja no verão seguida de milheto ou sorgo ou milho,
consorciado(s) com braquiária –, culminando na safra de 2008/2009, com a implantação
do sistema de integração com componente florestal, o sistema ILPF ou agrossilvipastoril,
em área de aproximadamente quatro hectares. Em razão do bom desenvolvimento das
árvores de eucalipto, na safra 2009/2010 ampliou-se a área com ILPF em mais 45 hectares
e na safra 2010/2011 em mais 10 hectares, com densidade média de 700 árvores por
Capítulo 47
Integração lavoura-pecuária-floresta: caso de sucesso da Fazenda Santa Brígida, no 745
Estado de Goiás
hectare. No conjunto dessas áreas, são contabilizadas mais de 40.000 árvores de eucalipto
em sistema de ILPF na fazenda, com produtividade média de madeira estimada em mais
de 21 st ha-1 ano-11, cujo corte está previsto para seis ou sete anos após o plantio.
Tabela 1. Teor de matéria orgânica do solo, produtividade de grãos de soja e milho, taxa
de lotação média anual e produtividade de bovinos de corte na Fazenda Santa Brígida, em
Ipameri-GO, entre as safras de 2006/2007 e 2015/2016.
Matéria Produtividade de grãos Taxa de lotação
Produtividade animal
Ano agrícola orgânica do solo Soja Milho média
Continua...
1
Um stereo (st) corresponde a 0,7 metro cúbico (m3) de eucalipto com casca ou 0,61 m3 de eucalipto sem casca.
Na forma inversa, um m3 de eucalipto corresponde a 1,43 st com casca, e 1,64 st sem casca.
2
Unidade de Referência Tecnológica é um modelo físico de sistemas de produção, implantado em área
pública ou privada, visando à validação, demonstração e transferência de tecnologias geradas, adaptadas e/
ou recomendadas pelo Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA) para a região. (Balbino et al.; 2011.)
746 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Tabela 1. Continuação.
Matéria Produtividade de grãos Taxa de lotação
Produtividade animal
Ano agrícola orgânica do solo Soja Milho média
*Estimativa de 1ª safra + 2ª safra. **Segunda safra de 2016 foi prejudicada pelo clima e não por fatores locais.
Em relação à soja, destaca-se que desde o primeiro ano de cultivo em áreas anteriormente
ocupadas com pastagem e solo degradados, a produtividade tem sido igual ou superior
à média nacional (entre 2.700 e 3.000 kg ha-1). Nos dez anos avaliados, a produtividade
da soja aumentou cerca de 40%, saindo de aproximadamente 2.700 kg ha-1 na safra
2006/2007 para 3.780 kg ha-1 na safra 2015/2016. Mesmo com a evolução do material
genético e técnicas de manejo disponíveis para a soja, que também influenciam essa
evolução, dificilmente isso seria plenamente possível sem as condições favoráveis criadas
pela integração.
Na Fazenda Santa Brígida também se produz milho para silagem – sempre em sucessão ao
cultivo de soja precoce –, consorciado com braquiária (U. brizantha), cuja produtividade
tem sido superior a 50 t ha-1. O principal benefício é que após a colheita da silagem a área
fica com pastagem de alta qualidade para alimentação animal durante a estação seca.
Capítulo 47
Integração lavoura-pecuária-floresta: caso de sucesso da Fazenda Santa Brígida, no 747
Estado de Goiás
Quanto à produção animal, destaca-se a evolução da taxa de lotação média anual, que
passou de 0,5 UA ha-1 em 2006 para 4,0 UA ha-1 em média no ano agrícola 2015/2016
(Tabela 1). Outro incremento importante foi na produtividade de carne, que passou de
69 kg ha-1 de Peso Vivo (PV) em 2006/2007 para 730 kg ha-1 de PV em 2015/2016, tendo
sido ofertado apenas sal proteinado aos animais em pastejo. Salienta-se que o suprimento
adequado de minerais somente ocorreu após a safra 2010/2011, pois anteriormente o
manejo animal e das pastagens era realizado pelo método tradicional da região.
No ano agrícola 2014/2015, além da melhoria das pastagens ao longo dos anos, houve
mudança na suplementação animal, que foi mantida apenas com sal proteinado, mas
em quantidades ajustadas para as categorias e estação do ano. Os lotes de animais
mais leves foram suplementados com 0,3% do PV na seca e 0,15% do PV nas águas. Nos
lotes de animais mais pesados a suplementação foi de 0,4 % do PV, além da oferta de
promotores de crescimento. A produção animal nesta última condição foi de 730 kg ha-1
de PV, o que significa uma produção de carne por hectare 10 vezes maior que antes da
adoção do sistema (Tabela 1). Essa produção foi mantida em 2015/2016 mesmo com o
comprometimento do consórcio do milho com braquiária, devido ao clima.
Além desses treinamentos, a URT Fazenda Santa Brígida possibilitou, através de inúmeros
estudos, o desenvolvimento de dois novos sistemas de produção de ILP que preveem a
inserção da forrageira leguminosa guandu-anão (Cajanus cajan). São eles: “Sistema Santa
Brígida” (Oliveira et al., 2010) (Figura 1) e “Feno Tropical” (Silva, 2014). Algumas dissertações
de mestrado foram desenvolvidas a partir desta URT ILPF, nas áreas de Produção Vegetal,
com ênfase em qualidade do solo (Oliveira, 2014), e de Ciências Ambientais, com ênfase
em socioecoeficiência de sistemas integrados e não-integrados, cujo trabalho síntese
(Costa et al., 2014), foi premiado no congresso internacional World Resources Forum,
realizado em 2014, em Arequipa, Peru.
Além disso, entre 2007 e 2015 foram realizados 17 dias de campo com a presença de um
total de 5.600 participantes, de diversos segmentos da sociedade. Outros sete eventos
menores, com até 70 participantes também foram realizadas de acordo com demandas
específicas, incluindo gestores públicos e formadores de opinião.
748 Foto: Rodrigo Peixoto
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 1. Sistema Santa Brígida: milho consorciado com braquiária e guandu-anão, Fazenda Santa Brígida,
Ipameri-GO.
Benefícios Econômicos
A partir dos custos e receitas apurados, foi possível levantar indicadores de eficiência
econômica para as atividades componentes do módulo com sistema ILPF na Fazenda
Santa Brígida. Este módulo tem área total de 45,6 hectares, sendo dividido em 15,75 ha
para o plantio de eucalipto – iniciado em 2009, e aproximadamente 30 ha para as culturas
anuais de soja (safra 2009/2010), milho consorciado com forrageira (safra 2010/2011) e
pecuária de corte (em sistema de engorda) (Figura 2) introduzida no módulo integrado
a partir do 3º ano (2011). A floresta plantada tem finalidade energética, com ciclo de
produção de sete anos.
O componente florestal foi implantado em uma área de 15,75 ha, com renques de fileiras
duplas, em espaçamento de 3 m x 1 m e 26 m entre renques, totalizando 31,5 mil mudas
plantadas e densidade de 689,6 plantas ha-1. O incremento médio anual (IMA) foi estimado
em 15,54 m-3 ha-1 ano-1, que, usando-se um fator de conversão (m3; st) de 1,4, representa
uma produtividade média esperada de madeira de 21,76 st ha-1 ano-1.
Capítulo 47
Integração lavoura-pecuária-floresta: caso de sucesso da Fazenda Santa Brígida, no 749
Estado de Goiás
Considerações finais
A URT ILPF Fazenda Santa Brígida tem sido local de inúmeros estudos, com uma equipe
nuclear sólida ao longo desses nove anos e também com participação pontual de outros
profissionais, de acordo com a dinâmica de equipes nas diferentes instituições parceiras.
Um primeiro estudo de caso desta URT foi publicado em 2013 (Oliveira et al., 2013), com
mais detalhes da fazenda e da parceria, e informações de produtividades até o ano de
2012. O presente estudo de caso, além de ser um resumo do trabalho nesta URT, com
inclusão de parceiros, é uma atualização que inclui informações de 2013 a 2015. Esta
versão resumida e atualizada permitiu corroborar a anterior, uma vez que se observou
melhoria contínua no solo e nas produtividades vegetal e animal na Fazenda Santa Brígida.
Agradecimentos
Os autores agradecem à proprietária Marize Porto Costa e à Rede de Fomento ILPF.
Referências
BALBINO, L. C.; PORFIRIO-DA-SILVA, V.; KICHEL, A. N.; ROSINHA, R. O.; COSTA, J. A. A. da Manual orientador para
implantação de unidades de referência tecnológica de integração lavoura-pecuária-floresta URT iLPF.
Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2011. 48 p. (Embrapa Cerrados. Documentos, 303).
COSTA, M. P.; OLIVEIRA, S. A.; CIRILO, F.; MEDEIROS, G. de. Eco-efficiency analysis of integrated and non-integrated
crop, forestry and livestock production systems in the brazilian Cerrado. In: WORLD RESOURCES FORUM, 2014,
Arequipa. Proceedings... Gallen, Switzerland: World Resources Forum, 2014.
OLIVEIRA, P. de; FREITAS, R. J.; KLUTHCOUSKI, J.; RIBEIRO, A. A.; CORDEIRO, L. A. M.; TEIXEIRA, L. P.; MELO, R. A. de C.
e; VILELA, L.; BALBINO, L. C. Evolução de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (iLPF): estudo de
caso da Fazenda Santa Brígida, Ipameri, GO. Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2013. 50 p. (Embrapa Cerrados.
Documentos, 318).
OLIVEIRA, P.; KLUTHCOUSKI, J.; FAVARIN, J. L.; SANTOS, D. de C. Sistema Santa Brígida - Tecnologia Embrapa:
consorciação de milho com leguminosas. Santo Antônio de Goiás: Embrapa Arroz e Feijão, 2010. 16 p. (Embrapa
Arroz e Feijão. Circular técnica, 88).
752 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
SILVA, A. da. Consórcio de guandu-anão com Urochloa ruziziensis para produção de feno tropical. 2014.
40 f. Dissertação (Mestrado em Produção Vegetal) - Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de
Ipameri, Ipameri.
TEIXEIRA, L. P.; MELO, R. A. de C. e; VILELA, L.; BALBINO, L. C.; CORDEIRO, L. A. M. Viabilidade econômica da
integração lavoura-pecuária-floresta (ilpf ): estudo de caso em Ipameri-GO. Sociedade e Desenvolvimento
Rural, v. 6, n. 2, set. 2012.
Luis Alfonso Giraldo Valderrama
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia*
Luis Alfonso Giraldo Valderrama
* Tradução livre da língua espanhola para a língua portuguesa realizada por Davi J. Bungenstab com
consentimento do autor. Para acesso ao texto original em espanhol, favor contatar os editores.
754 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
A localização geográfica da Colômbia no cinturão intertropical, faz dela um dos locais mais
ricos em recursos hídricos, ecossistemas e espécies, pois com menos de 1% da superfície
do planeta, abriga cerca de 10% de suas espécies de fauna e flora.
O país possui uma grande variedade de zonas climáticas, variando do nível do mar às
regiões de páramo (desertos andinos), o que permite a exploração de diferentes raças
bovinas que produzem carne, leite e dupla finalidade (carne e leite). Essa atividade pecuária
é considerada a atividade econômica agrícola com maior presença no país, ocupando
80,3% do território nacional, em contraste com as culturas agrícolas que ocupam 7,3%,
as florestas 10,3% e outros usos com 2,1%. O setor agropecuário do país, nas últimas
décadas, continua tendo grande importância relativa no contexto da economia nacional.
Com base nos dados estatísticos publicados pelo Departamento Nacional de Estatística,
estima-se que, embora o gado bovino na Colômbia participe com pouco menos de 3,6%
do Produto Interno Bruto Nacional (PIB), ele representa 27% do PIB agrícola e pecuário e
64% do PIB da pecuária, indicando a importância econômica dessa atividade produtiva
no setor agrícola do país.
Por outro lado, na Colômbia, 70% da pecuária bovina está sob sistemas de produção
extensivos, caracterizados por baixa eficiência no uso da terra, juntamente com grande
deterioração ambiental devido a problemas como o desmatamento, queima, erosão,
perda de biodiversidade e desigualdade social, fatores que fizeram com que a pecuária
bovina seja vista como um setor produtivo que compromete a sustentabilidade ecológica
(Mahecha et al., 2002).
menos 60% da terra com vocação agrícola é usada para pecuária extensiva” (Federación
Colombiana de Ganaderos, 2006).
Nessas áreas tropicais existe uma grande diversidade de recursos forrageiros para a
alimentação animal, que se manifesta por um alto número de plantas vasculares por
unidade de área, predominantemente pastagens do gênero Brachiaria (decumbens,
humidícola e brizantha) principalmente, além dos gêneros Panicum maximus (cv Tanzânia
e Mombasa), Dichantium e Hyparrenhia, associados a um grande número de leguminosas
herbáceas nativas, principalmente do gênero Desmodium sp, Centrosema e outros.
Além disso, essas explorações tanto de clima quente quanto frio surgiram após o corte
e queima das florestas andinas altas ou de nevoeiro, resultando em agroecossistemas
com baixa cobertura arbórea e solos desprotegidos, tornando essas áreas especialmente
suscetíveis à erosão. Além disso, a produção de leite de maneira tradicional implica alto
uso de fertilizantes e agroquímicos, o que causa problemas ambientais, além de aumentar
os custos de produção e reduzir sua competitividade.
Com base nesse contexto, este capítulo tem como objetivo caracterizar e quantificar
diferentes arranjos em sistemas silvipastoris (SSP) na Colômbia, com o potencial de
aumentar a produção de bovinos para carne e leite em várias condições agroecológicas,
de solo e de topografia. É uma proposta de reconversão da pecuária, melhoria e/ou
persistência e sustentabilidade biofísica e econômica de fazendas de pecuária em diferentes
regiões dos altos e baixos trópicos da Colômbia, especialmente no departamento de
Antioquia, considerado pioneiro na implementação destes no país. Também se discute
a quantificação do sequestro de carbono e seu potencial para formular projetos sob o
esquema do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), dentro do Protocolo de Kyoto
(PK) e as emissões entéricas de metano pela pecuária com o fim de se obter um balanço
de gases de efeito estufa da pecuária de corte e leite no país.
Antecedentes.
Na Colômbia já são mais de quinze anos que instituições como a Universidade Nacional
da Colômbia, sede de Medellín, Corpoica, o Centro de Pesquisa em Sistemas Sustentáveis
de Produção Agrícola, Universidade de Nariño, Universidade de Caldas e as Empresas
Autônomas Regionais do país, entre outras, iniciaram um processo sistemático, sustentado
e documentado de geração de conhecimento e desenvolvimento tecnológico com
sistemas silvipastoris de qualidade para a pecuária colombiana. Para avaliar biológica,
ambiental e economicamente foram implementados diferentes sistemas silvipastoris
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 757
Figura 1. Localização geográfica dos locais de implementação de sistemas silvopastoris em Antioquia, Colômbia.
Por meio de um processo técnico de avaliações técnicas anteriores realizadas no país, ficou
evidente que o gênero de árvores leguminosas Acácia, tanto Acacia decurrens quanto
758 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Nas regiões de pecuária de Antioquia, que são áreas baixas ou de menor altura acima do
nível do mar, onde predominam os sistemas de dupla finalidade (carne e leite) e carne, a
leguminosa acácia (Acacia mangium), está bem adaptada a solos ácidos, a madeireira e
forrageira chamada mutambo (Guazuma ulmifolia) apresenta excelente desempenho em
solos de baixa a média fertilidade e a árvore arbustiva leucaena (Leucena leucocephala)
apresenta boa adaptação às condições de solos pouco ácidos e de fertilidade moderada,
podem ser associadas a espécies estoloníferas de alta cobertura, como a braquiária (B.
humidícola e B. arrecta) (Tabela 2); bem como a gramínea naturalizada Jaraguá (Hyparrenia
ruffa) e, em outros casos, pastagens introduzidas como capim-guiné (Megathyrsus
maximus), com as cultivares Mombasa e Tanzânia.
As árvores perenes no SSP geralmente têm seu dossel acima das espécies forrageiras,
consumidas pelos animais para que, quando crescem no mesmo terreno, as primeiras
interfiram na passagem da radiação luminosa para o estrato herbáceo. O inverso pode
ocorrer nos estágios iniciais do estabelecimento de árvores perenes, principalmente se
combinadas com espécies de gramíneas ou pastagens herbáceas de crescimento rápido
e ereto ou com leguminosas de crescimento entrelaçado. Para evitar tais problemas, o
estabelecimento de pastagens é frequentemente adiado até que as árvores atinjam
uma altura de modo que possam funcionar como espécies dominantes na forragem,
ou o controle da competição seja intensificado por meio de controles mecânicos, como
desramas frequentes.
Além disso, a densidade de árvores silvipastoris em locais de clima frio ou alto na área
andina da Colômbia afeta o grau de infestação de ervas daninhas do pasto, mostrando que,
à medida que aumenta a densidade de árvores de ambas as acácias, diminui a intensidade
de luminosidade que recebe a vegetação sob o dossel das árvores, aumentando a presença
de ervas daninhas ou arbustos lenhosos no sistema de pastagem. Isso é explicado pelas
menores necessidades de radiação solar para alcançar a saturação de luz que têm as
espécies vegetais de via metabólica fotossintética do tipo C3 (Sanderson, et al., 1997),
uma vez que o principal fator limitante para o crescimento de pastagens em sistemas
silvipastoris é o nível de sombra exercido por árvores e arbustos (Shelton et al., 1987).
Em geral, a intensidade da luz que penetra através do dossel das árvores nos sistemas
silvipastoris é menor, comparada à quantidade de luz recebida por um pasto ou piquete
sem árvores, tanto em clima frio quanto nos trópicos (Tabela 3), como em áreas de planície
ou clima quente (Tabela 4).
Tabela 4. Rendimento de biomassa da pastagem, intensidade de luz que penetra no
dossel de árvores e porcentagem de plantas lenhosas em diferentes sistemas de pecuária
nos trópicos baixos de Antioquia, Colômbia.
Biomassa Intensidade Plantas
Local Idade: Tipo de
pastagem Luminosa na lenhosas
(meses) sistema
(kg MS / Ha) copa (Lux)* (%)
SSP (AD) 2321 a 765 b 1.7 a
Caucasia 1
SSP (BD) 2511 a 1548 b 2.5 b
24 m
CONTROLE 2197 a 2340 a 1.3 a
SSP (AD) 1939 a 1643 c 13 a
Caucasia 2
SSP (BD) 2491b 3430 b 13 a
24 m
CONTROLE 2133a 3762 a 10 a
Continua...
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 761
Tabela 4. Continuação.
A sombra das árvores, atenuando a intensidade da luz e a temperatura foliar das plantas,
também modifica o teor de proteína bruta das forragens tropicais (Pezo e Ibrahim, 1998).
Tabela 6. Proteína, parede celular e digestibilidade de forragens de várias espécies, em
diferentes sistemas de criação de animais nos trópicos de baixos em Antioquia, Colômbia.
Local Sistema PB FDN FDA DISMS
(Tipo de pastagem) pecuário (%) (%) (%) (%)
SSP (AD) 6,8 a 76.2 b 40.5 a 64.5 a
Caucasia 1
SSP (BD) 7.4 a 77.9 a 40.6 a 62.3 b
(Brachiaria humidícola)
CONTROLE 5.9 b 78.5 a 40.5 a 61,0 b
SSP (AD) 11.4 a 66.3 b 38.3 a 65.6 a
Caucasia 2
SSP (BD) 10.7 a 66.9 b 36.7 a 62.3 b
(Hyparrenia ruffa)
CONTROLE 9.0 b 67.5 a 30.1 b 61,0 b
SSP (AD) 6.4 a 73.3 a 58,0 b 46.1 a
SJ del Nus
SSP (BD) 5.6 b 72.5 b 53.4 a 46.8 a
(Hyparrenia ruffa)
CONTROLE 5.3 b 74.9 a 49.6 a 42.3 b
SSP (AD) 8.6 a 71.6 b 41.3 a 55.6 b
Carepa
SSP (BD) 6.7 b 71.4 b 39.1 b 58.5 a
(Brachiaria arrecta)
CONTROLE 5.1 b 73.9 a 38.3 b 51.6 c
a, b, c na coluna diferem P <0,05. CONTROLE: Sistema controle, sem árvores.
Trabalhos realizados por Daccarett e Blyndestein (1986), verificaram que a grama estrela
(Cynodon nlemfuensis) associada a árvores de Murungú (Eritrhyna poeppigiana) tinha
8,4% de PB, enquanto a mesma grama em pleno sol tinha 6% de concentração de PB.
Por outro lado, em situações de sombreamento moderado, maiores concentrações de
nitrogênio foram obtidas na forragem de pastagens que crescem à sombra das árvores
em relação às não sombreadas (Belsky et al., 1993).
No entanto, dados relatados em outros testes realizados na Austrália e Costa Rica não
foram consistentes nos resultados obtidos em relação ao efeito da diminuição da
radiação luminosa recebida pelas pastagens sob o dossel das árvores sobre o conteúdo e
composição de carboidratos estruturais, digestibilidade e consumo pelo gado (Sanderson
et al., 1997). Assim, Deinum e Dirven (1974) e Wilson (1982) postulam que a sombra afeta
negativamente a digestibilidade, enquanto Kephart e Buxton (1993) e Zelada (1996)
encontraram o efeito oposto, outros autores (Samarakoon et al., 1990; Norton et al. 1991)
não detectaram efeitos significativos. Essas diferenças poderiam ser devidas aos efeitos
diferenciados pelo tipo de sombra na folhagem das pastagens, pelos efeitos da densidade
de plantio, arranjo silvipastoril, tipo e idade das pastagens, época do ano (verão, inverno),
entre outras causas.
bem como o peso vivo dos animais ao se considerar a Unidade Animal (UA), uma vez
que uma vaca holandesa adulta com 555 kg de peso vivo não consome ou compacta
o solo na mesma magnitude que um outro animal de 420 kg. É importante mencionar
que quanto às espécies florestais incluídas nas espécies silvipastoris, sejam elas arbustos
ou leguminosas herbáceas, os aumentos na biomassa em oferta seriam maiores, o que
implicaria maior potencial de carga animal no SSP.
Tabela 7. Capacidade de carga animal (UA/ha) e incrementos (%) na carga animal, com
diferentes sistemas silvipastoris nos trópicos altos de Antioquia, Colômbia.
Local Carga animal
Sistema Pecuário
(Arranjo silvipastoril) (UA / Ha) *
Marinilla Controle (tradicional sem árvores) 2,6
(Pennisetum clandestinum + Acacia decurrens) Silvopastoril (árvores BD-400 / Ha) 3,2 (23%)
A Tabela 8 mostra como os incrementos na carga animal (UA/ha) são superiores aos
encontrados em clima frio ou nas áreas andinas do país, com valores de aumento acima
de 100%, o que mostra como em situações de clima quente os limitantes da produção
animal são o baixo suprimento de forragem e sua composição química deficiente ou
baixa qualidade nutricional que implicam baixo consumo de matéria seca pelos animais.
Tabela 8. Capacidade de carga animal (UA/ha) e aumentos (%) na carga animal, com
diferentes sistemas silvipastoris nos baixos trópicos de Antioquia, Colômbia.
Local Carga animal
Sistema Pecuário
(Arranjo silvipastoril) (UA / Ha) *
Caucasia 1 Controle (tradicional sem árvores) 1,0
(Brachiaria humidícola + Acacia mangium) Silvopastoril (Baixa densidade) 2,0 (100%)
Continua...
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 765
Tabela 8. Continuação.
Para evitar a perda de espécies desejáveis, a carga animal deve estar em conformidade com
o suprimento de forragem de espécies palatáveis e, entre elas, o material verde comestível.
Além disso, se pretender-se favorecer a persistência das espécies mais desejáveis, a duração
do período de descanso deve ser maior do que a recomendada para sistemas exclusivamente
pastoris, uma vez que a menor taxa de rebrota mostrada pelas pastagens que crescem sob
a sombra deve ser compensada de alguma maneira (Wong, 1991).
Na compactação do solo, a pressão exercida pelos cascos dos animais a médio ou longo
prazo resultará na redução do volume de macroporos no solo. Isso afetará negativamente
a taxa de infiltração de água no solo e aumentará a resistência à penetração radicular no
perfil do solo, diminuindo a disponibilidade de oxigênio para o sistema radicular (Pezo
et al., 1992), especialmente nas pastagens e arbustos associados a diferentes arranjos
silvipastoris.
Os pastos sem árvores mostram maior compactação do solo devido a animais em pastejo
do que em pastos com árvores. Entre os SSPs, isso é mais alto em arranjos silvipastoris com
gramíneas de crescimento ereto ou perfilhos, como pastagens de jaraguá (Hyparrenia ruffa).
Além disso, essa compactação é mais perceptível em situações de topografia pendente,
Tabela 10. Compactação do solo (Lb / cm2) e decréscimo (%), com diferentes sistemas
silvipastoris nos trópicos baixos de Antioquia, Colômbia.
Local Idade Compactação
Sistema Pecuário
(Arranjo silvipastoril) (meses) (Lb / cm2) *
Controle (tradicional sem árvores) 133,8
Caucasia 1 Sistema silvipastoril
34 90,0 (32%)
(B. humidícola + A. mangium) (AD - 160 árvores / Ha)
Sistema silvipastoril (Árvores BD-40 / Ha) 82,3 (30%)
Controle (tradicional sem árvores) 148,3
Caucasia 2 Sistema silvipastoril
35 123,3 (17%)
(H. ruffa + A. mangium) (AD - 160 árvores / Ha)
Sistema silvipastoril (Árvores BD-40 / Ha) 108,9 (27%)
Continua...
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 767
como é o caso da associação de Leucaena com jaraguá em San José del Nus, tabela 10.
Tabela 11. Produção de leite por animal e por área (ha), em diferentes sistemas pecuários
no trópico alto da Antioquia, Colômbia.
Sitio Leite por Animal Leite por Hectare
Sistema Pecuário
(Arranjo silvopastoril) (L/vaca/dia) (L/Ha/ano)
Marinilla Controle (Tradicional sem árvores) 13,3 b 10374 b
(P. clandestinum + A. decurrens) Silvipastoril (BD-400 árvores/Ha) 13.9 a 13344 a
Em geral, nos locais de grande altitude ou de clima frio, se evidencia um maior incremento
quando os níveis produtivos do sistema apresentam menor produtividade, demonstrando
que os sistemas silvipastoris apresentam potencial para o aumento da produção de leite.
Nessas condições climáticas frias da Colômbia, devido ao aumento da taxa de lotação no
sistema silvipastoril, e às maiores deficiências nutricionais para suprir as necessidades de
produção de leite, que são compensadas pela maior qualidade nutricional das pastagens
Figura 2. Utilização de sistema silvipastoril Acacia decurrens + Pennisetum clandestinum, Santa Elena, Antioquia,
Colômbia.
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 769
Figura 3. Utilização de sistema silvipastoril Acacia decurrens + Pennisetum clandestinum, Belmira, Antioquia,
Colômbia.
Em geral, nos sistemas em que há presença de árvores, o ganho de peso dos animais Zebu
Tabela 13. Ganho de peso animal (boi) e por área (ha), em diferentes sistemas pecuários
nos baixos trópicos de Antioquia, Colômbia.
Ganho de peso por Produção por
Sitio
Sistema Pecuário Animal Hectare
(Arranjo silvipastoril)
(kg animal-1 dia-1) (kg ha-1 ano-1)
Caucasia 1 Controle (Tradicional sem árvores) 0,485 b 177 b
(B. humidícola + A. mangium) Silvipastoril (AD-160 árvores/Ha) 0,695 a 507 a
Controle (Tradicional sem árvores) 0,293 b 106 b
Caucasia 2
(H. ruffa + A. mangium) Silvipastoril (AD-160 árvores /Ha) 0,690 a 428 a
Continua...
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 771
Figura 4. Utilização de arranjo silvipastoril Acacia mangium + Urochloa humidícola, em Callejones Caucasia
Antioquia, Colômbia.
772 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 5. Ilustração de conforto animal no sistema silvipastoril Acacia mangium + Urochloa humidícola. Caucasia-
Antioquia, Colômbia.
Tabela 15. Parâmetros ambientais e fisiológicos dos animais, durante o verão em dois
sistemas pecuários para a produção de gado de corte no trópico baixo de Caucasia (50
m em relação ao nível do mar). Antioquia, Colômbia.
Hora do dia no período do verão
Parâmetro ambiental e
07:00 12:00 16:00
fisiológico animal
SSP * Controle SSP Controle SSP Controle
Temperatura ambiente (ºC) 26,5a 26,8a 31,1b 35,8a 33,0b 35,7a
Umidade relativa (%) 76,1b 82,0a 61,9a 60,3a 53,9b 57,0a
Intensidade lumínica (Lux) ** 19,6b 154a 79,3b 853a 58,5b 311a
Frequência respiratória
26±1b 29±2a 30±1b 35±1a 28±1b 32±1a
(respirações minuto-1)
Temperatura retal (ºC) 38,3a 38,7a 38,0b 39,1a 38,7b 39,3a
* Arranjo silvipastoril A. mangium + B. humidícola em AD, 160 árvores/Ha.
** Lux = Jaules m-2 segundo-1. As letras a, b entre colunas diferem P<0.05.
A Tabela 15 ilustra esse aspecto, no sítio Caucasia 1, localizado em uma região com altitude
de 50 metros em relação ao nível do mar e apresenta clima quente, às 12 horas da manhã
o microambiente criado sob a copa das árvores no SSP, a temperatura ambiente foi 4.5ºC
menor que a pleno sol (CONTROLE); da mesma forma, a quantidade de radiação solar
recebida pelos animais na massa corporal em pastejo no mesmo horário foi muito menor
(90% menos), quando pastam em SSP. Essas duas características ambientais são favoráveis
ao comportamento animal, afetando positivamente os parâmetros fisiológicos quando
comparado ao estresse causado pelo ambiente adverso. Assim, a taxa de respiratória foi
menor no SSP (30,1 respirações/minuto) em relação à área sem arvores ou controle (35,1
respirações/minuto), ambos as medições realizadas às ao meio-dia.
Esses dois parâmetros, menor temperatura ambiente e menor radiação solar recebida
por bovinos em pastejo sob SSP, afetam positivamente o consumo alimentar, pois este
foi maior 2,62% em relação ao controle (sem árvores), que foi de 2,23% (Tabela 14). Esse
maior consumo de MS pelos bovinos em SSP tem um forte impacto na produtividade
nas condições tropicais baixas. O potencial de produção de carne em pastagens tropicais
depende de muitos fatores, incluindo fertilidade do solo, espécies forrageiras e seu
manejo, regime pluviométrico e tipo de animal utilizado. Quando a engorda no SSP é de
machos, o sistema demonstra grande efetividade devido ao seu baixo custo, rusticidade e
alta adaptação ao meio, já que os animais têm acesso à folhagem fornecida pelas árvores
e sombra que melhora as condições ambientais e o seu conforto.
Tabela 16. Parâmetros ambientais e fisiológicos dos animais, durante o verão em dois
sistemas pecuários para a produção de gado leiteiro no trópico alto de Santa Elena
(2538 m em relação ao nível do mar). Antioquia, Colômbia.
Hora do dia no período do verão
Parâmetros ambientais e
07:00 12:00 16:00
fisiológicos dos animais
SSP * Controle SSP Controle SSP Controle
Temperatura ambiental (ºC) 15,0b 17,6a 20,0b 27,3a 17,3a 18,3a
Umidade relativa (%) 80,0b 82,0a 60,6a 78,0a 63,6b 69,0a
Intensidade luminosa (Lux) ** 104b 1696a 344b 4923a 129b 1568a
Frequência respiratória,
34±8b 44±6a 32±2b 49±1a 33±1b 40±2a
(respirações minute-1)
Temperatura retal (ºC) 38,6a 38,1b 38,0b 39,1a 38,5b 39,1a
* Arranjo silvipastoril A. mangium + U. humidícola em AD, 160 árvores ha-1.
** Lux = Julios/m2/segundo. a, b entre colunas diferem P<0.05.
A redução da temperatura proporcionada pela sombra das árvores, mesmo que seja de 2 a
3ºC, é extremamente importante quando a temperatura ambiente excede o limite superior
da “zona de conforto” ou “zona de neutralidade térmica”. Fora desses limites, os mecanismos
de perda ou emissão de calor que os animais “homeotérmicos” possuem, resulta no aumento
na temperatura corporal, com consequências negativas na produtividade animal (Djimde
et al., 1989). Qualquer queda na temperatura ambiente favorece a eliminação do calor por
evaporação e, portanto, a redução da carga calórica do animal.
por meio de sua imobilização nos diferentes segmentos do sistema silvipastoril, como o
solo, pastagens e biomassa das árvores e arbustos que os compõem.
Figura 6. Captura de carbono (t de C ha-1) em sistema silvipastoril de Acacia decurrens + Pennisetum clandestinum,
com seis anos de plantio, no trópico alto. Antioquia, Colômbia.
Localidade: Caucasia 1
Figura 7. Captura de carbono (t de C ha-1) em silvipastoril de Acacia mangium + Urochloa humidícola, com seis
anos de plantio, no trópico baixo de Caucasia. Antioquia, Colômbia.
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 777
Localidade: Carepa
Figura 8. Captura de carbono (t de C ha-1) em silvipastoril de Guazuma ulmifolia + Urochloa arrecta, com seis
anos de plantio, no trópico baixo de Carepa. Antioquia, Colômbia.
(solos, árvores e pastagens, tanto na parte aérea quanto na parte radicular), para três locais
diferentes dos trópicos alto e baixo em Antioquia, são mostrados nas Figuras 6, 7 e 8.
Em geral, para os três locais onde foram implantados diferentes manejos e sistemas
silvipastoris, estudados durante seis anos, a imobilização de carbono foi superior em
sistemas pecuários que envolveram árvores ou SSP, tanto em alta como em baixa
densidade de árvores plantadas (AD; BD), em comparação com o sistema sem árvores ou
tradicional (ST), principalmente devido ao acúmulo de CO2 na biomassa aérea (fuste) e
na biomassa radicular (raízes), que aporta o componente florestal nos diferentes arranjos
silvipastoris ( Figuras 6, 7 e 8).
Por outro lado, o cuidadoso monitoramento da biomassa das árvores permite calcular o
incremento médio anual (IMA) no sequestro de carbono, uma vez que é muito dinâmico,
778 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
mostrando fluxos de fixação mais rápido e de maior magnitude do que qualquer outro
segmento do SSP. O IMA para o local de Santa Helena (altitude tropical), é maior do que
os demais locais tropicais baixos (Tabela 17), possivelmente devido aa baixas taxas de
mineralização da matéria orgânica em locais com uma temperatura mais baixa, uma vez
que são considerados como solos vulcânicos (Andisolos), que tem uma alta capacidade para
Tabela 17. Imobilização total e incrementos médios anuais (IMA) na captura de carbono
(tCO2 / Ha), em três arranjos silvipastoris, em diferentes locais do trópico baixo e alto de
Antioquia, Colômbia.
Sitio Densidade Total IMA
(Arranjo silvipastoril) (árvores ha-1) (tCO2 ha-1) (tCO2 ha-1)
Santa Elena 625 – Alta Densidade 260 a 9,9 a
(P. clandestinum + A. decurrens) 278 - Baixa Densidade 251 a 11,5 b
sequestrar carbono devido à forma amorfa complexa na matriz do solo (Veldkamp, 2004).
O carbono total (CO2 ha-1) armazenado no arranjo SSP de clima frio ou região andina da
Colômbia (Santa Elena) mostra os valores mais elevados em comparação com os locais de
clima quente (Caucasia e carepa). Isto é devido ao maior acúmulo de carbono devido aos
níveis muito elevados de matéria orgânica com alto teor de argila que que possui o solo
(alófanas), que formam complexos com a matéria orgânica fixando o carbono no solo e
tornando-se difícil a sua mobilização.
Finalmente, os valores encontrados dos aumentos anuais de carbono são valores muito
altos, comparados com os aumentos anuais médios relatados para as zonas de vida
correspondentes (Kerr et al., 1999), porque esses SSPs são relativamente jovens e se
encontram em seus períodos de crescimento máximo.
1) A calorimetria da respiração;
3) Técnicas meteorológicas;
4) As equações preditivas e;
Uma das técnicas in vitro mais utilizada na produção animal de ruminantes, para estudar
os processos de fermentação anaeróbica do rúmen, é a técnica de gases (Theodorou et
al, 1994). A semelhança entre a produção de CH4 determinada com a técnica in vitro e os
valores determinados in vivo (R2 = 0,80), sugere que esta técnica in vitro, tem o potencial
para avaliar a produção de CH4 em ruminantes (Rymer; Givens 2002, Getachew et al.,
2005), uma vez que mede a produção de gás final e a degradabilidade (fermentação) do
substrato, se o consumo voluntário é conhecido ou quantificado (Blümmel et al, 2005).
Além disso, a produção total de metano ao dia in vitro utilizando a técnica de gases e sua
determinação na câmara de respiração de circuito aberto, se relacionam positivamente R2
= 0,89 (P <0,0001), quando se avaliam a forragem (palha) (Blümmel et al, 2005).
consumido por vacas holandesas como substratos para incubação in vitro e quantificar as
emissões de metano durante o processo de fermentação ruminal. As proporções utilizadas
foram, 100:0; 80:20C e 80:20A, correspondendo a 100% de forragem da pastagem de
Kikuyo (P. clandestinum), sem suplemento alimentar; 80% de forragem da pastagem de
Kikuyo e 20% de um alimento ou concentrado comercial como suplemento alimentar;
80% de forragem da pastagem de kikuyo e 20% de forragem da leguminosa de acácia
preta (A. decurrens), como suplemento nutricional para as vacas.
Letras minúsculas na linha indicam diferenças significativas pelo teste de Duncan (P<0.05)
(Tabela 18).
Tabela 19. Emissões de metano in vitro, em três dietas com diferentes proporções de
capim braquiária (U. humidicola) e folhagem de A. mangium, em clima quente na Caucasia.
Antioquia, Colômbia.
Proporção de folhagem de árvore na dieta, (tratamento) *
100:0 80:20 70:30 60:40
Produção de metano
entérico 203 a 163 b 152 b 156 b
(mmol 24h-1)
Letras minúsculas na linha indicam diferenças significativas pelo teste de Duncan (P<0.05)
Continua...
782 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Considerações finais
Na Colômbia, a identificação, avaliação e utilização de sistemas silvipastoris em sistemas
de produção pecuária tem tido grande impulso e crescimento nos últimos anos. Embora
exista carência de informação e documentação precisa, confiável e sistemática de longo
prazo (mais de oito anos), que permitam aumentar e melhorar o conhecimento sobre
as interações entre os componentes arbóreo-pastagem-solo-animal. Esta informação é
indispensável para gerar pontos de intervenção e parâmetros de manejo de sistemas
silvipastoris em diferentes condições climáticas, edáficas e de ecossistemas, garantindo
uma maior eficiência, produtividade, sustentabilidade ambiental e competitividade em
longo prazo na pecuária.
Agradecimentos
Agradecemos ao Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural (MARD) da Colômbia,
Universidade Nacional da Colômbia, Vice-Reitor Acadêmico e Conselho Nacional de
Pesquisa (DINAIN) pelo aporte financeiro e à COLCIENCIAS pelo apoio financeiro através
do programa Jovens Pesquisadores.
Capítulo 48
Sistemas silvipastoris na Colômbia 783
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Marina Castro
Capítulo 49
Sistemas agroflorestais Mediterrânicos:
situação atual e perspectivas futuras
Marina Castro
Adolfo Rosati
Anastasia Pantera
Gerardo Moreno
María Rosa Mosquera Losada
788 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
As regiões mediterrânicas ocorrem na transição entre as zonas climáticas temperadas e
tropicais, em latitudes que variam sensivelmente entre os 30° e 40° Norte e Sul, na parte
oeste dos continentes (Gómez-Sal, 2000). Distribuem-se pela bacia do Mediterrâneo, África
do Sul, sudoeste da Austrália, Chile e Califórnia. Na Europa, a região mediterrânica estende-
se parcialmente pelos territórios da França, Itália, Espanha e Portugal, integralmente pelo
território da Grécia, Malta e Chipre (Sundseth, 2009).
O uso do solo secular, na região Mediterrânica moldou a paisagem atual (Gómez Sal,
2000). As transformações induzidas pelo homem configuraram a paisagem, modificando
comunidades de plantas e animais, a constituição genética de indivíduos, raças e ecotipos.
A adaptação humana desenvolveu sistemas diferenciados de uso do solo e formas de
exploração dos recursos. Entre eles, os usos multifuncionais como os agroflorestais, são
de extrema importância nas regiões mediterrâneas.
Os sistemas agroflorestais foram definidos por diferentes autores (Nair, 1993) como
combinações do uso do solo que envolvem “a integração deliberada de árvores e/
ou arbustos com culturas agrícolas e/ou produção de gado, simultaneamente ou
sequencialmente, na mesma superfície”. Os sistemas agroflorestais caracterizam-se por
otimizar os benefícios das interações biológicas entre estratos (árvores e/ou arbustos) e
culturas no sub-bosque e/ou pastagens, e com eles a produção pecuária (Association for
Temperate Agroforestry, 2015; European Agroforestry Association, 2015).
Florestas pastejadas
O pastejo por animais domésticos dos bosques de carvalho, áreas de mata e outras áreas
não cercadas, nos países mediterrânicos é provavelmente a mais antiga prática agroflorestal
na Europa. O pastejo dos bosques representa um dos melhores exemplos de integração
espacial e temporal ao nível da paisagem, uma vez que se caracteriza por uma estreita
ligação entre agricultura, pecuária e silvicultura, associada a explorações familiares.
mosaico. Assim, a paisagem pode ser vista como um mosaico de pequenas unidades,
contendo cada uma delas alguns atributos ecológicos diferenciais: diversidade biológica,
estrutura ecológica e produtividade. Em particular, a alteração espaço-temporal dos
picos de produtividade vegetal, seguindo a evolução fenológica, é uma das principais
referências ecológicas para avaliar a adaptação dos sistemas de produção animal no
Mediterrâneo (Gómez-Sal, 2000). Por tudo isto, os bosques pastejados podem ser vistos
como um sistema silvipastoril icônico, com elevado valor natural e cultural, por outras
palavras, eles simbolizam um estilo de vida do Mediterrâneo.
A natureza, distribuição e função das árvores e outro tipo de vegetação lenhosa depende
muito das condições específicas de cada região mediterrânica e a combinação de
diferentes habitats ou manchas. Portanto, as espécies vegetais e a estratégia da sua
exploração mudam ao longo do Mediterrâneo.
Na Itália, as florestas pastejadas cobrem uma área de 361.000 ha (Plieninger et al., 2015) e
cerca de 280.000 ha são dominados por Quercus (Bernetti, 1995). As espécies Q. pubescens,
Q. cerris, Q. suber, e Q. ilex ocorrem em florestas mistas no centro e sul da Itália e ilhas
(Pardini, 2009). Os carvalhos frequentemente existem como componentes de sistemas
silvipastoris, integrando vários recursos na propriedade (Pardini; Nori, 2011). O sub-bosque
compreende espécies palatáveis e alguns arbustos não palatáveis, mas geralmente não
existe um estrato herbáceo desenvolvido, devido à reduzida radiação que atinge o solo.
Estas florestas são pastejadas no verão, quando os animais procuram folhas verdes e
sombra, e no inverno, quando a árvore protege os animais dos ventos frios (Pardini, 2006).
Durante as estações de elevada produtividade (primavera e outono), o gado pastoreia as
pastagens herbáceas não-florestais. A produção de pastagem nas florestas de quercíneas
é baixa (1a 2 toneladas de matéria seca por hectare) mas o sub-bosque lenhoso (incluindo
a regeneração da espécie e os rebentos de raiz) podem contribuir com 2 a 4 toneladas
de matéria seca de folhas por hectare. O sub-bosque lenhoso é mais produtivo do que
792 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Estas talhadias são caracterizadas pela presença de um estrato arbóreo (400 – 1.100 pés
ha-1) com um sub-bosque dominado pela sua própria regeneração e em menor extensão
por arbustos da família das leguminosas. O estrato herbáceo é normalmente escasso, com
uma produção anual variando entre 570 – 2.500 kg MS ha-1 ano-1).
Este sistema agrosilvipastoril foi originado a partir dos desbastes dos bosques perenifólios,
onde árvores, gramíneas nativas, culturas e gado interagem positivamente sob práticas
de gestão específicas (Campos, 2004; Joffre et al., 1999). Geralmente estes sistemas
caracterizam-se por uma estrutura vegetal em dois estratos na mesma unidade de
superfície: um arbóreo aberto do tipo savanoide e um herbáceo que pode ser pastagem
ou cultura anual (Moreno; Pulido, 2009). O estrato arbóreo é dominado por quercíneas
mediterrânicas perenifólias – azinheira (Q. ilex) ou sobreiro (Q. suber) – e em muito menor
extensão, por quercíneas caducifólias (Q. pyrenaica, Quercus faginea). A densidade varia
entre 20 e 80 árvores por hectare (Pinto-Correia; Mascarenhas, 1999). O sub-bosque é
dominado por plantas anuais de inverno e, em menor extensão, por pequenos arbustos
perenifólios (Vicente; Alés, 2006).
O montado ocorre sob condições mediterrânicas severas, ou seja, verões muito secos
e longos. As temperaturas durante o verão atingem frequentemente os 30-40°C. A
precipitação média varia entre os 500-600 mm anuais, distribuída irregularmente, e
concentrando-se no período de Outubro a Março uma vez que as flutuações inter e intra-
anuais são características deste tipo de clima (Correia, 1993).
O sobreiro domina nas áreas costeiras de Portugal, onde a influência oceânica é mais forte,
enquanto a azinheira é característica das áreas mais secas e/ou mais frias.
Portugal é o maior produtor mundial de cortiça, com uma produção média anual de cerca
de 100.000 t, o que corresponde a cerca de metade da produção mundial (Leal et al., 2006).
A cortiça é retirada periodicamente ao longo da vida dos sobreiros e a produção média de
cortiça por árvore adulta em cada ciclo de 9 anos varia entre 5 kg (árvores jovens) e 71 kg
(árvores adultas) (Montero; Cañellas, 2003), iniciando-se este processo quando as árvores
têm uma idade de 25-30 anos (Montero; Cañellas, 2003) (com diâmetro à altura do peito
acima de 70 cm) (Leal et al., 2007).
Após a adesão de Espanha e Portugal à União Europeia em 1986, a gestão extensiva foi
parcialmente substituída por uma gestão semi-intensiva, incluindo a substituição parcial de
raças nativas por outras exóticas tidas como mais produtivas, aumentando as taxas de lotação,
substituindo ovinos por bovinos e abandonando a transumância (deslocamento sazonal de
rebanhos para locais que oferecem melhores condições durante uma parte do ano).
Na Itália, as áreas de bosque onde a cobertura de árvores não é suficiente para serem
classificados como floresta (porque as árvores são muito esparsas ou porque foram
substituídas por arbustos), são identificadas com nomes específicos no sistema cadastral,
como Pascolo arborato (pastagem com árvores dispersas com cobertura arbórea natural
mas menos densa do que a floresta) (Figura 4), Pascolo cespugliato (pastagem com
arbustos) ou Prato arborato (terra com alguma cobertura natural de árvores e onde o
feno pode ser produzido, a partir de herbáceas espontâneas).
796 Foto: Marina M. F. de Castro
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Os olivais em associação com diversas culturas entre as árvores formam uma paisagem
contínua em muitas partes do sul da Europa (Eichhorn et al., 2006). A oliveira intercalada
com culturas agrícolas anuais é uma das formas de uso multifuncional mais representativo
e completo da região mediterrânica, uma vez que produz uma grande diversidade de
produtos na mesma unidade de superfície, entre eles, azeitonas para consumo humano
(incluindo azeitonas de mesa e azeitonas para azeite), folhagem para alimentação animal
(Molina-Alcaide; Yáñez-Ruiz, 2008) (Figura 5) e espaço para cultivar diversos tipos de
culturas intercaladas. Na maioria das vezes, as oliveiras associam-se a cereais ou videiras,
resultando em um sistema silviagrícola típico (Papanastasis et al., 2009).
Capítulo 49
Sistemas agroflorestais Mediterrânicos: situação atual e perspectivas futuras 797
Do ponto de vista ecológico, a oliveira pode ser encontrada em uma ampla gama de
condições climáticas na zona Mediterrânica; invernos suaves e precipitação média entre
450-800 mm são ideais para esta espécie.
Na Grécia, por vezes, os olivais incluem laranjeiras, amendoeiras, nogueiras, figueiras e várias
espécies para alimentação animal (Papanastasis et al., 2009). Em Portugal, é frequente o
cultivo de cereais (centeio e aveia) para consumo direto dos animais ou o aproveitamento
798 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
do pasto das entrelinhas das oliveiras resultando em sistemas silvipastoris. Tal como
referido anteriormente, as azeitonas são o principal produto deste sistema de cultivo, mas
frequentemente os subprodutos (principalmente folhas de oliveira) estão integrados no
sistema. Em muitos casos, onde a pecuária é integrada com o sistema agrícola, a poda
das árvores fornece recursos adicionais, reduzindo assim os custos para a alimentação
animal. De acordo com Delgado-Pertíñez et al. (2000) as folhas de oliveira no momento da
poda têm um alto valor forrageiro com cerca de 12% de proteína bruta e 43% de matéria
orgânica digestível (com base na matéria seca). Após a colheita comercial das azeitonas,
ovinos e caprinos aproveitam os frutos deixados no solo. No passado, os rebanhos
dormiam nos olivais durante o verão para fertilizar as árvores, promovendo, assim, a
reciclagem de nutrientes, outro componente importante do seu uso multifuncional. O
reaparecimento desta prática pode revelar-se muito útil para a produção orgânica. Outro
uso do sistema é o aproveitamento das árvores velhas e improdutivas, assim como os
materiais de poda, que podem ser usados para lenha.
Na Itália, usos com árvores dispersas e culturas lenhosas (arbóreas) são classificadas no
sistema cadastral como “seminativo arborato”. Até o século passado, as árvores cultivadas
no “seminativo arborato” incluíam não apenas árvores frutíferas, mas também árvores
forrageiras (ulmeiro, freixo, carvalho) que eram usadas ao mesmo tempo como suportes
para as videiras. Hoje em dia, esses sistemas praticamente desapareceram, mas os poucos
remanescentes são frequentemente promovidos como um valor cultural/histórico
adicional aos seus produtos (ou seja, vinho).
a taxa atual de plantação para Portugal, norte da Espanha e França estimada em 4.500
ha ano-1 (Álvarez-Álvarez et al., 2004). Infelizmente, há também uma elevada taxa de
mortalidade causada por doenças, como o cancro do castanheiro e a tinta do castanheiro
(Cryphonectria parasitica Murr Barr. e Phytopthora sp.) que afetam diversas áreas de
produção de castanha, principalmente em Portugal, Espanha e Itália.
Nas situações mais comuns, as castanheiras são cultivadas para a produção de fruto, com
uma densidade de cerca de 70 a 100 árvores ha-1 (espaçamento de 12 x 12 ou 10 x 10
m), mas podem formar outros diferentes tipos de sistemas agroflorestais. vhhhhTambém
há outras situações nas quais os pomares de castanheira são cultivados com cereais para
consumo direto de ovelhas; em outros casos, a vegetação espontânea é beneficiada e
usada para pastagem pelos animais, resultando assim em um típico sistema silvipastoril.
Recentemente, também se têm desenvolvido sistemas nos quais se estabelece pastagem
sob as árvores para melhorar as técnicas de colheita mecânica (Castro, 2009). Em todas
as situações, as castanhas deixadas no chão após a colheita comercial são aproveitadas
por rebanhos de ovinos. Em Portugal, a utilização deste recurso está limitada aos ovinos,
uma vez que os proprietários dos pomares receiam que outro tipo de animal produza
danos nas árvores. Na Galiza, atualmente, a castanha de reduzida qualidade, sem valor
comercial, é usada para alimentar animais em estábulo, aumentando a qualidade da
carne e, portanto, a rentabilidade da empresa (Rigueiro-Rodríguez et al., 2004).
A castanheira, deliberadamente cultivada, ao longo dos últimos 400 anos, em certas áreas
da Grécia, produz diversos produtos, entre os quais podemos destacar; fruto, madeira de
qualidade, mel, lenha, vida selvagem, carne, lazer/turismo etc. (Pantera; Mouflis, 1996).
Como em muitas áreas da Grécia, a castanheira faz parte de uma comunidade subclímax,
o seu cultivo incluía a limpeza de espécies infestantes, enxertia de castanheiros silvestres
e podas (Pantera; Mouflis, 1996). A maioria destes sistemas foi abandonada em décadas
recentes, devido à sua baixa rentabilidade (escassa e dispendiosa mão de obra) face aos
rendimentos mais favoráveis oriundos do turismo que as populações rurais conseguem
obter. Outra significativa ameaça a estes sistemas, é o cancro do castanheiro que tem
dizimado um elevado número de árvores nos últimos anos.
culturais, alguns deles, estão conscientes do efeito negativo desta prática no solo e na
sua contribuição para a propagação da doença da tinta. O que tem motivado alguns
agricultores a manter ou reintroduzir sistemas silvipastoris, reduzindo assim a necessidade
de revolvimento do solo frequente.
Nos últimos anos, têm sido caracterizadas variedades de castanha, regionais por
associações de produtores, como forma de valorização do produto. Por exemplo, o
IGP (Indicación Geográfica Protegida de Castaña de Galicia) caracterizou cerca de 100
variedades de castanha em toda a Galiza, das quais oito variedades foram declaradas de
elevado interesse comercial. Foram criadas algumas empresas muito rentáveis sendo a
maioria delas importantes na exportação de produtos manufaturados de Espanha.
Considerações finais
A região do Mediterrâneo sempre se caracterizou por restrições abióticas significativas
à especialização, tendo sempre predominado a diversificação agrícola. Vários produtos
de sucesso, como vinho, azeite, frutas frescas e nozes, bem como os sistemas extensivos
de produção de carne e queijo são produzidos em sistemas agroflorestais. Ao longo dos
tempos, as florestas mediterrâneas foram sempre exploradas em uma perspectiva de uso
multifuncional, desempenhando funções de conservação do solo e da água, entre outras,
e produzindo produtos florestais lenhosos e não lenhosos (Croitoru; Merlo, 2005). Entre os
produtos lenhosos florestais, a preponderância da cortiça, resina, carvão vegetal, lenha,
relativos à produção madeireira, é considerável. Nesse contexto, as florestas mediterrâneas
podem ser consideradas como componentes-chave do capital natural nesta região. Os
benefícios fornecidos pelo capital natural incluem bens e serviços; dos quais a sociedade
humana obtém valor ambiental, social e econômico (Costanza et al., 1997).
A Política Agrícola Comum Europeia deve considerar os sistemas agroflorestais como uma
meta para aumentar o uso da vegetação lenhosa nos países mediterrâneos, pois isso fará:
Para atingir esses objetivos, os sistemas agroflorestais tradicionais devem ser mantidos e
otimizados, onde for possível, para torná-los mais vantajosos, sistemas novos e inovadores
devem ser estudados, combinando os benefícios dos sistemas tradicionais com práticas
agrícolas modernas, para melhorar o rendimento agrícola através de intensificação
sustentável da produção.
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Capítulo 49
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Horst-Jürgen Schwartz
Capítulo 50
Potencial de sistemas de produção
integrados em zonas áridas e semiáridas
da África*
Horst-Jürgen Schwartz
* Tradução livre da língua inglesa para a língua portuguesa realizada por Davi J. Bungenstab com consentimento
do autor. Para acesso ao texto original em ingês, favor contatar os editores.
810 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Introdução
Nas últimas décadas, a incorporação de árvores e outras plantas lenhosas em sistemas
de produção agrícola tem recebido cada vez mais atenção científica, mas também um
crescente interesse das agências de desenvolvimento que atuam em áreas agrícolas na
África. Sistemas agroflorestais, silvipastoris e agrossilvipastoris são vistos e promovidos
como meio de aumentar a produção de alimentos, enquanto proporcionam valiosos
serviços ambientais. Alega-se que tais sistemas impedem e até revertem a degradação
generalizada do solo, melhoram e diversificam o universo de produtos agrícolas, e
protegem a biodiversidade local e regional.
metade oriental esse padrão é menos evidente devido aos efeitos perturbadores do
Grande Vale do Rift Africano, com sua cadeia montanhosa norte-sul, vales profundos e
grandes lagos. A leste do Grande Rift não há nenhuma zona úmida equatorial, ao invés
disso encontra-se um mosaico de potenciais ecológicos, determinados principalmente
pela altitude e em seguida pela latitude.
As zonas sub-úmidas e semiáridas que cobrem a maior parte da ASS recebem entre 350
mm e 1.500 mm de precipitação pluviométrica anual. Na metade ocidental do continente
a precipitação pluviométrica monomodal é predominante enquanto na metade oriental
ela é predominantemente bimodal. A duração do período de crescimento varia de oito
meses com 1.500 mm a três meses com menos de 350 mm.
A vegetação natural na zona úmida é a floresta tropical perene, onde o potencial para os
sistemas ILPF é limitado, principalmente devido ao elevado desafio de parasitas e doenças
endêmicas para rebanhos de ruminantes. À margem desta zona ecológica, bovinos,
ovinos, caprinos e aves estão associados a plantações de árvores frutíferas como o dendê,
manga, goiaba, cacau, banana.
Seguindo o gradiente climático, saindo dos trópicos em direção à zona sub-úmida até a
zona semiárida, nessa ordem, a floresta tropical dá lugar à floresta semi-decídua, à savana
arborizada, à savana de campos e à pastagem semiárida anual com pequenos arbustos.
Intercaladas encontram-se áreas de altitude variada, que podem atingir desde geleiras até
812 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
As zonas semiáridas até as áridas com sua precipitação baixa e irregular são utilizadas
principalmente por pastores nômades que têm seus modos específicos de incorporação
das árvores e outras plantas lenhosas ao seu sistema de produção.
As árvores e arbustos têm uma variedade de funções nas propriedades. Elas são usadas
para demarcar limites ou para formar cercas vivas ao redor de fazendas e campos. Ao
mesmo tempo, elas podem produzir frutos, forragem em sistemas de capineira (cut and
carry system), geram sombra e caso sejam plantadas corretamente, servem como quebra-
vento e reduzem a erosão do solo.
Se os arbustos e as árvores são intercalados com culturas, eles podem ser dispostos em
fileiras alternadas, na forma de cultivo em faixas, ou como itens dispersos aleatoriamente
nos campos ou pastagens.
Nas áreas de alta pluviosidade, das zonas úmidas até as sub-úmidas, é comum o cultivo de
quintal intensivo com multi-extrato, também chamado de hortas ou pomares domésticos.
É um sistema tradicional bastante estável de agrosilvicultura, que combina culturas
de árvores com culturas alimentares herbáceas para subsistência, às vezes culturas
comerciais, como chá, café ou cacau e animais (cabras e aves) em lotes muito pequenos ao
redor da casa. Ele proporciona meios de subsistência razoáveis em áreas com densidade
populacional muito elevada, como em grande parte do planalto da ASS.
Espécies animais
As espécies de animais presentes nos sistemas de ILPF são os ruminantes domésticos,
bovinos, caprinos e ovinos e nas áreas secas também camelos (Camelus dromedarius).
Os asininos são de grande importância na região, mas geralmente são deixados para
procurar seu próprio alimento em beiras de estradas e áreas abandonadas. A avicultura
é encontrada praticamente em todos os lugares, mas assim como os asininos, elas se
alimentam de todo tipo de alimento produzido na propriedade.
Capítulo 50
Potencial de sistemas de produção integrados em zonas áridas e semiáridas da África 815
Três tipos de alimentos para animais estão disponíveis através da inclusão de espécies
arbóreas no sistema agrícola:
1) Partes de arbustos e árvores, folhas, flores, frutos, cascas, brotos e raízes que
podem ser colhidas pelo homem e fornecidas aos animais (capineiras), ou podem
ser colhidas diretamente pelos animais;
2) Subprodutos, que são principalmente polpas ou cascas de frutas (frescas ou secas),
ocasionalmente também tortas da extração de óleo se houver processamento de
quaisquer sementes de oleaginosas no local; além disso, pode haver resíduos de
culturas cultivadas sob vegetação lenhosa e pastagem de resteva após a colheita;
3) Vegetação de sub-bosque que consiste de gramíneas, arbustos ou lenhosas
perenes menores, que também podem ser colhidas pelo homem ou ingeridas
diretamente pelos animais.
Figura 2. Índice de seletividade “E” para bovinos e camelos calculados para uma savana arborizada semiárida no
Quênia durante a estação da seca.
Capítulo 50
Potencial de sistemas de produção integrados em zonas áridas e semiáridas da África 817
A forte preferência do gado pelo capim é óbvia, embora durante a estação seca as
gramíneas tenham qualidade inferior às folhagens e frutos da vegetação lenhosa acessível
e disponível, que por sua vez é a visivelmente preferida pelos camelos.
Figura 3. Proporção do tempo total de alimentação gasto em diferentes alturas do extrato vegetal acima do solo
por herbívoros domésticos em pastejo.
Animais como camelos e cabras, que possuem uma capacidade de apreensão suficiente
para pequenas forragens folheadas [pastejadores seletivos] e um alcance adequado para
a colheita do extrato vegetal mais alto, têm vantagens distintas durante as estações secas
quando faltam as forragens de alta qualidade na camada herbácea.
818 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Acessibilidade
Como mencionado acima, acessibilidade é uma função de alcance, mas também de
altura e diâmetro de coroa da planta para qualquer combinação de espécies de plantas
forrageiras e de animais. Uma representação esquemática desta relação é apresentada na
Figura 4, que delineia a profundidade de penetração por ramoneio de animais em árvores
e arbustos densos.
Experimentos de longa duração com cabras da raça “Small East African” (leste-africanas
pequenas) em pastagem de arbusto anão [espécie dominante: Duosperma eremophilum]
mostraram que a disponibilidade de biomassa de folhas para as cabras em ramoneio
não era necessariamente função da biomassa total da folhagem, mas sim em função da
densidade de planta e do diâmetro da coroa. Elevadas densidades de planta, combinadas
com os diâmetros médios da copa, proporcionaram os níveis mais elevados de
disponibilidade em taxas de lotação que permitiram rendimentos constantes da forragem.
Isso certamente tem relação paralela com outras combinações de espécies animais e de
plantas, afetando o manejo de espécies forrageiras lenhosas cultivadas.
Abaixo alguns sistemas de ILPF são descritos para documentar a vasta gama de sistemas
que são praticados.
Agricultura itinerante
A agricultura itinerante é provavelmente o mais antigo sistema de integração que existe,
sendo praticado há muitos séculos e pode ser encontrada nas regiões de potencial
mais elevado das planícies úmidas e sub-úmidas e também em altitudes mais elevadas,
onde a vegetação natural potencial é a floresta. Os agricultores desmatam áreas de
tamanho moderado de floresta virgem ou secundária usando derrubada e queimada,
geralmente poupando árvores e plantas lenhosas que tem algum uso direto. Os animais,
que usualmente são aves e/ou caprinos, procuram alimentos na floresta circundante e
são suplementados com resíduos da lavoura e pastoreio da resteva. A área desmatada é
cultivada por alguns anos, até que a fertilidade do solo declinar. Então, ela é abandonada
e a floresta retoma a terra pela sucessão natural. Estes períodos de pousio chegavam a 40
anos ou mais no passado. Mas o aumento da densidade populacional agora está forçando
uma redução dos períodos de pousio para menos de 10 anos em muitas áreas, às vezes
sendo transformada em cultivo contínuo.
820 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
A Figura 6 mostra alguns dos aspectos mais importantes de uma leiteria de pequenos
produtores no interior da Tanzânia. Em primeiro plano está o curral de ordenha, à
direita o abrigo sem paredes para o gado. A unidade é sombreada por uma velha
mangueira (Mangifera indica). Logo atrás do curral e do abrigo está uma área de 2.000
m² com alfafa (Medicago sativa) e um pouco mais adiante estão 30 cercas vivas de
Leucaena com 20 plantas cada. Isso é suficiente para complementar com proteína
uma dieta à base de capim Napier para duas vacas leiteiras cruzadas. O rendimento
esperado por lactação é de cerca de 2.500 litros de leite por ano. O trato dos animais
é exclusivo pelo sistema de capineira enquanto as vacas estão em lactação. Vacas
secas são amarradas às margens de estradas ou em terras comunais. A gliricídia pode
ser encontrada em circunstâncias semelhantes, contudo, geralmente o produtor a
conduz até atingirem altura para corte e rebrota, usando as folhas como alimento e a
madeira para combustível ou madeira. Vários produtores daquela aldeia mantêm um
viveiro comunitário para Napier, Leucaena e várias árvores frutíferas (Figura 7).
822 Foto: Horst-Jürgen Schwartz
ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Sistemas de plantação
Sistemas de plantação podem oferecer um potencial interessante para a integração com
a pecuária. Sisal, palma de óleo, palmeira de tâmara, seringueira, várias árvores frutíferas
e plantações de árvores para madeira podem oferecer possibilidades interessantes de
integração com a pecuária na ASS. A vegetação de sub-bosque natural ou plantada pode
ser usada como alimento para o gado, bem como o seu esterco pode reciclar alguns
nutrientes para as árvores cultivadas. Com exceção do sisal, todos os sistemas de plantações
têm em comum a característica de que eles estão disponíveis para alimentação direta
apenas por determinados períodos do ciclo de produção. Eles também podem ser usados
com capineiras durante outros períodos, e que eles não produzem qualquer biomassa
herbácea após o fechamento do dossel devido à concorrência por luz. Esses ciclos são
diferentes para cada espécie. O pastejo entre linhas de sisal não tem tais restrições.
A maioria das árvores precisa de um período inicial após o plantio, dois ou mais anos,
para se estabelecerem e crescerem de forma que as folhas fiquem fora do alcance dos
animais. A partir daí a área pode ser usada para pastagem até que as copas das árvores
se fechem e a biomassa de cobertura do solo se torne insignificante. Este é o caso das
plantações de seringueira, onde o pastoreio começa cerca de 3 a 4 anos após o plantio e
pode durar de 6 a 8 anos até o fechamento do dossel. Quando as árvores amadurecem e
as copas se afinam, há novamente um potencial, porém limitado, de pastoreio. A Figura 8
mostra o gado pastoreando uma área madura de seringueira que já atingiu o final de sua
vida produtiva. Há um aumento da cobertura herbácea do solo, embora de má qualidade.
Como as árvores são velhas, não há mais preocupação de que os animais possam danificar
a casca, o que tornaria a colheita menos eficiente.
Capítulo 50
Potencial de sistemas de produção integrados em zonas áridas e semiáridas da África 823
Nos três primeiros anos após o plantio dos coqueiros, a vegetação do sub-bosque só
pode ser utilizada em sistema de capineira. Depois de três anos, as árvores estão altas o
suficiente para permitir pastejo direto por bovinos ou pequenos ruminantes. A colheita
dos frutos começa aos cinco anos. Nos primeiros oito anos após o plantio, a vegetação
herbácea rasteira apresenta seu máximo rendimento. Depois disso os rendimentos
diminuem ao mínimo em cerca de vinte anos após o plantio e permanecem nesse nível
mínimo devido ao sombreamento pelo dossel agora fechado. Entre 25 e 30 anos as
árvores serão substituídas por novas mudas, os rendimentos da forragem aumentam e o
pastoreio não poderá acontecer até que atinjam três anos. O ajuste no número de animais
precisa ser constante para equilibrar da oferta de forragem.
824 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Figura 9. Escala temporal para um sistema que integra palma de óleo e pecuária.
Figura 12. Representação esquemática de um cultivo sobre terraços em nível pelo plantio em camadas de
diferentes espécies.
Figura 13. Terraço de retenção de água e solo com Aloe ssp. e pequenas mudas de Acácia em área erodida,
Província de Nyanza, Quênia Ocidental.
Foto: Horst-Jürgen Schwartz
Figura 14. A mesma área da Figura 13, quatro anos depois, onde será iniciado novamente o pastejo com ovelhas
e gado com controle da taxa de lotação na próxima estação chuvosa.
Capítulo 50
Potencial de sistemas de produção integrados em zonas áridas e semiáridas da África 829
Bosques de árvores
Os bosques são um sistema com pouco potencial na integração, mas devem ser
mencionados aqui porque parecem estar aumentando, mesmo em sistemas de
pequenos produtores. É uma introdução relativamente recente utilizando especialmente
com Eucalyptus spp., outras espécies exóticas e também algumas árvores nativas
africanas para a produção da madeira nos topos de colinas e em inclinações íngremes
que apresentam risco de erosão. Há também alguma expansão onde as plantações de
eucalipto são estabelecidas em terra de elevado potencial produtivo, uma vez que a
renda bruta por unidade de área pode exceder em 200% a renda do milho se as árvores
forem cultivadas para celulose (Oballa et al., 2010). Embora os bosques possam aumentar
consideravelmente a renda da propriedade, eles são na verdade um empreendimento
separado que pode progressivamente transformar-se em um sistema de integração.
Outras árvores com produtos de alto valor de mercado, como a Mangifera indica, Persea
americana, Anacardium occidentale, e o Eucalyptus ssp., por outro lado, parecem reduzir o
rendimento das culturas na sua proximidade.
O cultivo do sorgo consorciado com Acacia saligna mostrou melhor eficiência total no uso
da água, quando comparados com seus cultivos solteiros (Droppelmann; Berliner, 2003).
É muito provável que outras combinações de lavoura-floresta possam ser encontradas e
apresentem características similares.
830 ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta
Outras medidas incluem uma reabilitação mais ativa das árvores como o exemplo
mostrado nas Figuras 13 e 14. De importância similar são as medidas de retenção de água
obtidas com a implantação de terraceamento em microbacias ou terraços em nível que
geralmente são estabilizados com o cultivo de plantas rasteiras ou arbustos.
Desafios
Questões de posse da terra
De acordo com Dixon et al. (2001), 3% do total das terras agrícolas na ASS são sistemas
de cultivo de árvores (povoamentos florestais), 11% são sistemas baseados na exploração
florestal (cultivo itinerante), 8% são sistemas agropastoris e 14% são sistemas pastoris.
O emprego dos sistemas de integração é comum por tradição, mas não é tão eficiente
quanto poderia ser. Nos quase dois terços restantes das áreas agrícolas, a inclusão de
plantas lenhosas nos sistemas de produção é menos comum, muitas vezes restrito à
demarcação de divisas sob forma de cercas, utilizando os troncos das árvores como
mourões vivos. Apenas cerca de 5 a 6% de todas as terras estão sob gestão comercial em
grande escala. O restante é composto de pequenas propriedades, variando de 0,5 ha no
Planalto Ocidental no Quênia (com elevado potencial produtivo) a cerca de 20 hectares
nas planícies áridas e semiáridas do Sahel Ocidental.
Uma vez que, como regra geral, diversos anos são necessários antes que os sistemas
agroflorestais gerem retornos econômicos, famílias com maior poder aquisitivo são
mais propensas a adotarem esses sistemas. Famílias lideradas por mulheres são menos
relutantes em aplicar técnicas agroflorestais que melhorem a fertilidade de solo,
enquanto que as lideradas por homens mostram uma tendência de confiar mais em
fertilizantes comerciais. O manejo animal, especialmente o controle de pastejo livre feito
pela comunidade para evitar o pastejo ou dano às árvores recém-plantadas é um outro
ponto crucial para a aceitação.
Outro caso de controvérsia é o eucalipto. Ele foi introduzido há mais de 100 anos na África
do Sul e cultivado para a produção de madeira. Nos últimos 50 anos ele foi introduzido em
muitos outros países africanos. O eucalipto é uma das plantas lenhosas de crescimento mais
rápido no mundo. O eucalipto produz madeira de elevado valor para celulose e construção.
Na ASS ele é plantado não apenas em plantações comerciais de larga escala, mas também
é utilizado em pequenos bosques, em cercas de divisas de propriedades e como árvores
únicas dispersas na propriedade. Há apenas 10 a 15 anos que tais plantios experimentaram
uma grande expansão. Devido ao crescimento rápido, a demanda por água é elevada,
fazendo com que em muitos países africanos, onde o recurso hídrico é escasso, o plantio de
eucalipto seja proibido. Sendo que em alguns desses países, as árvores já existentes estão
sendo erradicadas. Davidson (1993) indicou que o eucalipto utiliza menor quantidade de
água por unidade de peso de biomassa produzida em relação aos outros tipos das árvores
e muitos cultivos agrícolas, mas sua elevada produção de biomassa sob circunstâncias de
baixa precipitação pluviométrica pode reduzir o fluxo de correntes de água com maior
intensidade que espécies de árvores de crescimento mais lento. Tendo em vista o valor de
mercado elevado dos produtos do eucalipto, estas considerações sobre a demanda de água
podem ter sido negligenciadas. Atualmente, a controvérsia entre promotores e adversários
de espécies não-decíduas e de crescimento rápido tomou um viés quase ideológico e o
eucalipto tem sido chamado de árvore dos colonialistas.
Sumário e perspectivas
A integração lavoura-pecuária-floresta é um conjunto de práticas agrícolas que combina
árvores, pecuária e culturas agrícolas. É uma prática antiga, mas foi negligenciada por
muitas décadas durante o século passado em favor da intensificação, mecanização e
monoculturas de larga escala. O desmatamento nos trópicos, a degradação do solo e a
crescente insegurança alimentar reavivaram o interesse por essa prática desde a década
de 1970. Há muitos benefícios a serem obtidos a partir de sistemas agroflorestais e
sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta, como forragem para gado, madeira e
lenha, serviços ambientais como quebra-ventos, melhoria da fertilidade do solo, proteção
contra erosão, aumento da biodiversidade e também, sequestro de carbono.
Apesar dessas vantagens evidentes, a adoção pelos produtores não foi tão rápida quanto
o esperado por pesquisadores e organizações de desenvolvimento. As razões para isso
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CGPE 15479