Curso de Bacharelado em Teologia - Claretiano - Teologia Trinitária
Curso de Bacharelado em Teologia - Claretiano - Teologia Trinitária
Curso de Bacharelado em Teologia - Claretiano - Teologia Trinitária
TEOLOGIA TRINITÁRIA
Plano de Ensino
Caderno de Referência de Conteúdo
Caderno de Atividades e Interatividades
© Ação Educacional Clareana, 2008 – Batatais (SP)
Trabalho realizado pelo Centro Universitário Clareano de Batatais (SP)
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer
forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na
web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do
autor e da Ação Educacional Claretiana.
PLANO DE ENSINO
1 APRESENTAÇÃO.................................................................................................. 9
2 DADOS GERAIS DA DISCIPLINA........................................................................... 11
3 CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................................... 12
4 BIBLIOGRAFIA BÁSICA ........................................................................................ 13
5 BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ........................................................................ 14
1
PE
1. APRESENTAÇÃO
Seja muito bem-vindo(a)! Você está prestes a iniciar o estu-
do da disciplina Teologia Trinitária, que compõe o curso de Bacha-
relado em Teologia na modalidade EAD.
A teologia trinitária é a tentativa de entender e interpretar
o mistério central cristão de um só Deus em três Pessoas iguais e
distintas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo (Mt 28,19; 2Cor 13,13).
Como você já está se habituando nesta nova disciplina, saiba
que não fará este percurso sozinho. Percorreremos, juntos, a reve-
lação bíblica do adorável mistério trinitário, visitaremos as etapas
mais importantes da formação do dogma trinitário e, num esforço
de aprofundamento pessoal e de atualização, procuraremos refle-
tir sobre o significado e a pertinência do mistério para a vida cristã
e para a vida social.
Ao longo do curso de Bacharelado em Teologia, você já teve
oportunidade de entrar em contato com muitas disciplinas que lhe
10 © Teologia Trinitária
Objetivo geral
Os alunos da disciplina Teologia Trinitária do curso de Ba-
charelado em Teologia na modalidade EAD do Claretiano, dado o
Sistema Gerenciador de Aprendizagem e suas ferramentas, serão
capazes de interpretar os dados bíblicos da tradição teológica tri-
nitária para confrontá-los com as urgências e as questões atuais
da Igreja e do mundo.
Com esse intuito, os alunos contarão com recursos técnico-
pedagógicos facilitadores de aprendizagem, como Material Didá-
tico Mediacional, bibliotecas físicas e virtuais, ambiente virtual,
acompanhamento do professor responsável, do tutor a distância
e tutor presencial complementado por debates no Fórum.
Ao final desta disciplina, de acordo com a proposta orien-
tada pelo professor responsável e tutor a distância, terão condi-
ções de interagir com argumentos contundentes, além de disser-
tar com comparações e demonstrações sobre o tema estudado
nesta disciplina, elaborar um resumo, ou uma síntese, entre ou-
tras atividades. Para esse fim, levarão em consideração as ideias
debatidas na Sala de Aula Virtual, por meio de suas ferramentas,
bem como o que produziram durante o estudo.
12 © Teologia Trinitária
Modalidade
( ) Presencial ( X ) A distância
3. CONSIDERAÇÕES GERAIS
Este Plano de Ensino serve como um mapa que, normal-
mente, você consulta antes de iniciar uma viagem rumo a um
novo lugar. Evidentemente, o mapa não substitui a viagem: de
nada adiantaria ter um excelente mapa, cheio de informações
precisas e de detalhes minuciosos se você não se decidir a em-
preender a viagem.
4. BIBLIOGRAFIA BÁSICA
BINGEMER, M.; FELLER. V. Deus Trindade: a vida no coração do mundo. Valencia: Siquem,
2002.
FEINER, J.; LÖRER, M. (Org.). Mysterium Salutis, vol. II/1. Petrópolis: Vozes, 1978.
LADARIA, L. O Deus vivo e verdadeiro. São Paulo: Loyola, 2005.
14 © Teologia Trinitária
5. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
BENTO XVI. Carta Encíclica "Deus é amor". São Paulo: Paulus / Loyola, 2005.
BOFF, L. A Trindade e a sociedade. Petrópolis: Vozes, 1987.
______. O Pai-nosso. A oração da libertação integral. Petrópolis: Vozes, 1980.
CODA, P. O evento pascal. Trindade e história. São Paulo: Cidade Nova, 1987.
COMBLIN, J. O Espírito no mundo. Petrópolis: Vozes, 1978.
DE HALLEUX, A. «Dieu le Père tout-puissant», RThL 8 (1977) 401-422.
DURRWELL, F. O Pai: Deus em seu mistério. São Paulo: Paulinas, 1990.
FORTE, B. A Trindade como história. São Paulo: Paulinas, 1987.
______. Trindade para ateus. São Paulo: Paulinas, 1998.
GALVÃO, A. M. A Santíssima Trindade. O mistério de três pessoas e um só Deus. São Paulo:
Ave-Maria, 2000.
GESCHÉ, A. Deus. São Paulo: Paulinas, 2004.
KASPER, W. El Dios de Jesucristo. Salmanca: Sigueme, 1990.
KLOPPENBURG, B. Trindade. Petrópolis, Vozes, 2000.
LIBÂNIO, J. Deus Espírito Santo. São Paulo: Paulinas, 2000.
LIBÂNIO, J. Deus Pai. São Paulo: Paulinas, 2000.
LOHFINK, N. Deus. Politeísmo e monoteísmo na linguagem sobre Deus no Antigo
Testamento. In: ID. Grandes manchetes de ontem e de hoje. São Paulo: Paulinas, 1984, p.
151-170.
LORENZEN, L. Introdução à Trindade. São Paulo: Paulus, 2002.
MOLTMANN, J. Trindade e Reino de Deus. Petrópolis: Vozes, 2000.
O’DONNELL, J. Il mistero della Trinità. Casale Monferrato: Piemme, 1989.
PASTOR, F. Semântica do Mistério. São Paulo: Loyola, 1982.
PATFOORT, A. O mistério do Deus vivo. Rio de Janeiro: Lumen Christi, 1983.
PIKASA, X.; SILANES, N. Dicionário Teológico o Deus cristão. São Paulo: Paulus, 1988.
QUEIRUGA, A. T. Creio em Deus Pai. O Deus de Jesus como afirmação plena do humano.
São Paulo: Paulinas, 1993.
RAHNER, K. Algumas observações sobre o tratado dogmático De Trinitate. In: ID. O dogma
repensado. São Paulo: Paulinas, 1970, p. 217-253.
SCHEEBEN, M. A Santíssima Trindade, São Paulo: Paulus, 1999.
SCHNEIDER, T. H. (Org.), Manual de dogmática (vol. II), Petrópolis: Vozes, 2001.
SESBOÜÉ, B. (Org.) História dos dogmas (tom. I: O Deus da salvação. A tradição, a regra
de fé e os Símbolos; a economia da salvação; o desenvolvimento dos dogmas trinitários e
cristológicos). São Paulo: Loyola, 2002.
SIMONETTI, M. La crisi ariana nel IV secolo. Roma: 1975.
SMAIL, T. A pessoa do Espírito Santo. São Paulo: Loyola, 1998.
SPIDIK, T. Nós na Trindade. Breve ensaio sobre a Trindade. São Paulo: Paulinas, 2004.
STUDER, B. Dios Salvador en los padres de la Iglesia. Salamanca: Secretariado Trinitario,
1993.
VVAA. O Espírito Santo na Bíblia. São Paulo: Paulinas, 1988 (Cadernos Bíblicos 45).
CRC
1. INTRODUÇÃO
Seja bem-vindo(a) ao estudo da disciplina Teologia Trinitária, dis-
ponibilizada para você em ambiente virtual (Educação a Distância).
Como você poderá constatar, nesta parte, denominada Ca-
derno de Referência de Conteúdo, encontra-se o conteúdo básico
das quatro unidades em que se organiza a presente disciplina.
O estudo que agora vamos iniciar tem como assunto princi-
pal o que a revelação cristã nos propõe como o mistério da nossa
salvação: Deus é uno e trino. A fé é a resposta obediente do ser
humano ao Deus que se revela como realmente é: como Pai, Filho
e Espírito Santo. Como "explicar" esse mistério de que os Três são
um só Deus? Como "dar razões" de nossa fé num só Deus, que é
Pai, Filho e Espírito Santo?
Inicialmente, voltaremos nossa atenção para a própria reve-
lação bíblica. Recolhendo os dados bíblicos, veremos como a uni-
16 © Teologia Trinitária
dade que não seja trina. Mostrar que a trindade e a unidade não se
contradizem é a questão teológica que atravessa os séculos, desde o
início da Igreja até os dias de hoje. Durante dois milênios de reflexão
teológica, foram dadas três respostas erradas a essa questão.
• Triteísmo: o triteísmo afirma que há três deuses bem dis-
tintos, cada qual eterno e infinito. Além do erro de natu-
reza filosófica, essa posição afirma a pluralidade em detri-
mento da unidade.
• Modalismo: o modalismo acentua a unidade divina, que
nega a distinção pessoal do Pai, do Filho e do Espírito San-
to. As pessoas seriam assim somente três manifestações
ou modos com os quais o único Deus se revela e age na
criação e na redenção. Em outras palavras: Deus é um só
e aparece, às vezes, a modo de Pai, outras, a modo de
Filho e, ainda, a modo de Espírito Santo.
• Subordinacionismo: tanto acentua a distinção das Pesso-
as divinas que chega a negar a igualdade divina dessas
mesmas Pessoas. Segundo essa heresia, há um só Deus
− o Pai. O Filho distingue-se do Pai porque é inferior e não
é Deus como o Pai. O Espírito distingue-se, realmente, do
Pai e do Filho porque é inferior e subordinado aos dois. O
Filho, assim, é reduzido a um tipo de semideus ou, então,
à mera criatura. Nesse mesmo senso descendente, o Es-
pírito ocupa o terceiro lugar na hierarquia.
Como você pode ver, essas tendências erradas não conse-
guem manter em equilíbrio unidade e trindade. A afirmação de
um dos termos significa, ao mesmo tempo, a negação do outro.
Todo esforço da teologia trinitária consiste em afirmar tanto
a unidade quanto a trindade, tanto a distinção pessoal quanto a
igualdade (consubstancialidade) das pessoas divinas.
Como se organiza a teologia trinitária?
A teologia trinitária procura entender e interpretar o misté-
rio de um só Deus em três Pessoas iguais e distintas. Pai, Filho e Es-
pírito Santo não são, apenas, nomes vazios, mas remetem o fiel às
pessoas divinas, mais exatamente a Jesus, que revela Deus como
Abbá, o Pai e, consequentemente, revela-se como Filho. Além de
revelar Deus como o Pai e a si mesmo como Filho, Jesus promete
o outro Paráclito, o Espírito Santo. É sobre essa revelação realizada
por Jesus Cristo que a teologia trinitária constrói sua reflexão.
O dogma trinitário não é o resultado da razão humana e não
é uma criação da Igreja. Pelo contrário, para falar da Trindade, é
preciso partir do que Deus revelou de si mesmo mediante a vinda
de Cristo e o dom do Espírito em nossos corações. A intimidade do
ser mesmo de Deus só é acessível a nós porque o Pai nos enviou o
Filho e o Espírito Santo.
Esse princípio é importante e orienta a teologia trinitária
como tal. Não partimos de um conceito abstrato de Deus para
depois falar, dedutivamente, da Trindade. O ponto de partida da
teologia trinitária é o fato de que Jesus nos revelou o Pai e nos
prometeu o Espírito. A teologia trinitária, inicialmente, tem uma
atitude receptiva. É aquilo que chamamos de auditus fidei (ouvir
da fé). Recolhe os dados do AT e do NT nos quais encontra o teste-
munho da fé trinitária.
A teologia trinitária, em sua trajetória atual, prefere, por-
tanto, ater-se mais à linguagem e à maneira do Novo Testamento
de anunciar a verdade fundamental da Trindade, sem enveredar,
inicialmente, pelas especulações de tipo filosófico-escolástico. O
foco da questão é Jesus Cristo, e, a partir de sua pregação, prática
e pessoal compreende-se a Deus. É o Jesus histórico, dos Evange-
lhos, quem permite que avancemos na compreensão de Deus.
Ainda faz parte da atitude receptiva da teologia trinitária o es-
tudo da história da reflexão teológica. Não somos os primeiros a re-
fletir sobre a Trindade. Antes de nós, há dois milênios de diálogo, de
debate, de polêmica e de tomada de posição. As gerações que nos
antecederam fizeram um verdadeiro trabalho de inculturação da fé
22 © Teologia Trinitária
O Pai e o Filho
Jesus revela que Deus é Pai. Mais exatamente, que Deus é o
seu Pai. Entre eles, há uma relação originalíssima, que não se repe-
te. Por isso, quando falamos de paternidade divina, é preciso levar
em conta a diferença qualitativa que há entre a paternidade que
Jesus de Nazaré revela e a paternidade humana. Sem negar a se-
melhança entre essas duas paternidades, a palavra "Pai" só pode
indicar a Primeira Pessoa Divina se reconhecermos a distância in-
finita que existe entre a paternidade humana e a divina. De fato,
no ser humano, a paternidade é uma condição ou uma qualidade
em que o homem ingressa ao gerar e ao educar sua prole. Desse
modo, podemos dizer que natureza humana e a relação paterna
não coincidem, uma vez que o homem não nasce pai. Ele não é
pai por natureza, mas deve se tornar pai. Um homem não deixa de
ser homem por não ser pai. A paternidade é uma relação que se
"acrescenta" a uma natureza constituída anteriormente. Primeiro
é preciso existir, ou seja, ser homem, para depois poder ser pai.
A paternidade divina é diferente porque Deus não se tor-
na Pai. Ele o é desde sempre. Desde a eternidade, Deus existe
como o Pai que gera o Filho. A relação que Deus tem com o Filho é
totalmente paterna. Assim, a Pessoa do Pai identifica-se com sua
relação com o Filho. Quem ele é se define por sua relação. No ser
humano, a relação não é subsistente, ou seja, o ser humano não
é sua relação. Em Deus, a relação é subsistente, ou seja, a relação
da paternidade identifica-se com a Pessoa do Pai; a paternidade é
o Pai da mesma maneira como a relação filial é o Filho. Deus não
tem relações, Ele é pluralidade de relações.
Outra diferença entre paternidade humana e divina é que
a paternidade humana exige a maternidade e é completada pela
maternidade: é próprio do ser humano nascer de um pai e de uma
mãe. Deus, no entanto, é o único autor (a única fonte, a única ori-
gem) do Filho. Nesse sentido, a paternidade divina ultrapassa as
diferenças de sexo e integra em si a riqueza da maternidade. É por
24 © Teologia Trinitária
O Espírito Santo
Falemos, agora, um pouco do Espírito Santo. Conhecemos o
Espírito Santo porque ele nos foi prometido por Jesus e porque foi
derramado em nossos corações. Prestando atenção na atuação do
Espírito em Jesus e nos fiéis, chegamos a conhecer quem ele é na
eternidade divina. Isto é fundamental para a revelação do Espírito:
a partir do modo como ele age em Jesus e nos fiéis, a Igreja foi
levada a reconhecer que o Espírito é, também, Deus.
Vejamos, rapidamente, como o NT fala da atuação do Espíri-
to em Jesus e, depois, nos fiéis.
Em relação a Jesus, são importantes os eventos da encar-
nação, do batismo e da glorificação de Jesus. Na encarnação, o
Espírito desce sobre Maria para que o Verbo possa se encarnar. No
batismo, o Espírito desce e permanece sobre Jesus para ungi-lo e
torná-lo apto para a missão messiânica. Na cruz, Jesus entrega o
Espírito. Em todos esses acontecimentos, o Espírito não age como
mera força divina. Ele conduz Jesus em todo seu percurso terres-
tre, mas a ação do Espírito se caracteriza por ser ação de uma pes-
soa, não de uma mera força impessoal.
Nos fiéis, depois de Pentecostes, também o Espírito age.
Mas, aqui, há uma novidade. Ele se revela não só como Espírito de
Deus, mas como Espírito de Jesus. Os cristãos recebem o mesmo
Espírito que agiu em Jesus e, por isso, eles podem confessar que
Jesus é o Cristo. Quando lemos o NT, vemos que o Espírito está na
base de todo testemunho que os cristãos dão de Jesus.
28 © Teologia Trinitária
Conclusão
Para concluir, tentemos sintetizar, em poucas palavras, algu-
mas inspirações que a reflexão trinitária pode dar para a vida na
Igreja e no mundo.
O mistério trinitário mostra-nos que a diferença não é um
obstáculo para a comunhão. Nós temos a tendência de ver na dife-
rença uma dificuldade para a plena comunhão; pensamos que isto
só é possível na medida em que diminuímos ou suprimimos a dife-
rença. Na Trindade, a diferença, ou melhor, a alteridade ou distin-
ção pessoal, não impede a comunhão. Pelo contrário, na Trindade,
o que distingue é, também, o que une. O fato de o Pai ser distinto
do Filho e do Espírito Santo não os separa, mas os une. Também o
inverso é verdadeiro. O fato de Pai, o Filho e o Espírito serem um
só não suprime as diferenças pessoais deles. O fato de ser um só
não se dá em detrimento da distinção entre os Três divinos. Creio
que isto é muito inspirador para a vida em sociedade, especial-
mente no contexto atual de pluralismo cultural, religioso. A Trin-
30 © Teologia Trinitária
Glossário de Conceitos
Este Glossário permite a você uma consulta rápida e preci-
sa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom domínio
dos termos técnico-científicos utilizados na área de conhecimento
dos temas tratados na disciplina Teologia Trinitária.
Veja, a seguir, a definição dos principais conceitos desta dis-
ciplina:
1) Adocianismo: heresia espanhola do século 8º, segundo
a qual Cristo, enquanto Deus, era verdadeiro Filho de
Deus por natureza, mas enquanto homem, era somente
filho adotivo de Deus (cf. DS 595; 610-615; FIC 4.075;
4.079). Os expoentes principais foram: Elipando (aprox.
718-802), arcebispo de Toledo, e Félix (= 818), bispo de
Urgel. A dominação islâmica de Toledo, naquele tempo
capital da Espanha, e a teologia islâmica, em que um
dos princípios fundamentais é de que Deus não pode ter
filhos, foram o terreno propício para essa heresia que
Relações Propriedade
s
Pessoas
História da
Salvação Revelação
Missão
Missão
Econômica
Econômica
do Espírito
do Filho
Santo
Batismo
Encarnação
O Espírito O Espírito
Morte e Santo em Santo nos
Ressurreição Fiéis
Resposta
Fé Trinitária
Vida
Cristã
Tradição
Teologia
Magistério
Questões Autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados. Responder, dis-
cutir e comentar estas questões e relacioná-las com a Teologia,
pode ser uma forma de você medir o seu conhecimento, ter con-
tato com questões pertinentes ao assunto tratado e de lhe ajudar
na preparação para a prova final, que será dissertativa. Mais ainda:
é uma maneira privilegiada de você adquirir uma formação sólida
para a sua prática profissional.
Bibliografia Básica
É fundamental que você use a bibliografia básica em seus estu-
dos, mas não se prenda só a ela. Consulte também as apresentadas
no Plano de Ensino e no item Orientações de estudo para a unidade.
Dicas (Motivacionais)
O estudo da disciplina “teologia trinitária” fará com que você
participe ativamente da educação como um processo de cresci-
mento, de amadurecimento e de emancipação na vida de fé e na
reflexão intelectual. Fará também com que você se qualifique a
prestar um serviço à comunidade cristã. Com efeito, o cristão não
somente crê, mas deseja pensar a sua própria fé, e o teólogo as-
sume eclesialmente a responsabilidade de ajudar os fiéis a "da-
rem as razões" do próprio crer. Não pensar a fé é o primeiro passo
para estranhar a fé, o que, em muitos casos, acaba em abandono
da própria a fé. O teólogo não realiza sua função como pensador
desligado da comunidade da fé, mas dentro e a serviço dela. Por
isso é importante que você esteja atento à vida de fé dos cristãos:
o modo como exprimem vitalmente a fé trinitária e dela vivem.
Estudar teologia trinitária, portanto, é preparar-se para prestar um
serviço qualificado aos cristãos que vivem da fé trinitária. Além de
rigor científico, ao teólogo e ao estudante de teologia é necessária
essa familiaridade e intimidade com a comunidade que nasce da
fé trinitária. Seriedade científica e vida de oração, pesquisa inte-
lectual e participação eclesial, esforço mental e afeto cordial são
qualidades indispensáveis para o teólogo e para o estudante de
teologia.
Você, como aluno do curso de Bacharelado em Teologia na
modalidade EAD e futuro profissional em teologia, necessita de
uma sólida e consistente formação conceitual e cristã. O progres-
52 © Teologia Trinitária
1
1. OBJETIVOS
• Compreender e analisar os conceitos básicos da disciplina
Teologia Trinitária.
• Interpretar e conhecer os dados bíblicos do Novo Testa-
mento que transmitem a revelação trinitária.
• Analisar e reconhecer a importância do Antigo Testamen-
to para a revelação trinitária.
2. CONTEÚDOS
• Revelação do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
• Encarnação e batismo de Jesus: evento trinitário.
• Revelação trinitária e mistério pascal.
• Espírito do Filho enviado aos nossos corações.
• Textos triádicos.
54 © Teologia Trinitária
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Deus, em sua vida íntima e desde a eternidade, é de tal ma-
neira que pode ser “Deus-para-nós”. Ele não quis existir só para si,
mas, desde sempre, quis predestinar e fazer dos seres humanos
participantes de sua plenitude.
Conhecemos quem é “Deus-em-si”, mesmo porque Ele, gra-
tuita e livremente, quis ser “Deus-para-nós”.
5. QUESTÕES INTRODUTÓRIAS
O tema que juntos iremos estudar é o mistério da Trindade.
Estamos adentrando, neste ponto, a mais “teológica” de todas as
disciplinas do curso de Teologia.
“Teologia”, de fato, é o esforço metódico para entender e
interpretar as verdades reveladas por Deus, ou melhor, a verdade
que é o próprio Deus. Trata-se não somente de procurar compre-
ender as verdades reveladas por Ele, mas de conhecer melhor o
Deus de toda verdade.
INFORMAÇÃO:
Santo Tomás mostra, magistralmente, que Deus é o tema da Te-
ologia não só quando esta trata, diretamente, de Deus, mas tam-
bém quando se ocupa de outros assuntos ao estudá-los em sua
relação com Deus.
“A sagrada doutrina trata tudo em referência a Deus, por tratar do
mesmo Deus ou das coisas que lhe digam respeito, como princípio
56 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
A visão cristã de Deus tem, de fato, uma grande originalidade. Mas
essa originalidade não significa que nada podemos saber de Deus
fora da revelação cristã.
A plenitude da revelação não é quantitativa, mas, sim, qualitativa;
58 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
A Igreja Católica nada rejeita do que há de verdadeiro e santo nes-
sas religiões. Ela considera com sincera atenção aqueles modos
de agir e viver, aqueles preceitos e doutrinas. Se bem que em mui-
tos pontos estejam em desacordo com os que ela mesma tem e
anuncia; não raro refletem lampejos daquela verdade que ilumina
todos os homens. Ela anuncia e vê-se, de fato, obrigada a anun-
ciar, incessantemente, o Cristo, que é “caminho, verdade e vida”
(Jo 14,6), no qual todos os homens podem encontrar a plenitude
de vida religiosa e no qual Deus tudo reconciliou a Si. Exorta, por
isso, seus filhos, a que, com prudência e amor, por meio do diálogo
e da colaboração com os seguidores de outras religiões, testemu-
nhando sempre a fé e a vida cristãs, reconheçam, mantenham e
desenvolvam os bens espirituais e morais, como também os va-
lores socioculturais que entre eles se encontram (NA 2) (VIER, F.
Compêndio do Vaticano II: constituições, decretos, declarações.
Petrópolis: Vozes, 1968.
INFORMAÇÃO:
A unidade de Deus não é um apêndice ou uma questão secundá-
ria da Teologia ou da fé. Pelo contrário, estamos diante do núcleo
mais profundo da Teologia e da fé.
INFORMAÇÃO:
Quanto maior for a proximidade de Deus, maior ainda será a pos-
sibilidade de constatar sua grandeza imperscrutável. Quanto mais
Deus se revela, maior ainda é seu mistério, e não o inverso! Se
maior é a revelação, maior é o saber do não saber, porque esta
nos coloca diante da imensa grandeza de Deus.
tal. Você pode conferir essa informação nos textos bíblicos de:
Mc 14,36; Rm 8,15; Gl 4,6.
Quando Jesus tem como interlocutor Deus, sempre o cha-
ma de “Pai” (Mc 15,34; Mt 27,46; 11,25-27; Lc 10,21-22). O Filho
manifesta com esse modo peculiar de invocação a consciência de
sua proximidade com Deus, a familiaridade e o imediatismo de
sua relação com o Pai.
Na experiência humana que Jesus faz do Abbá, aproxima-
mo-nos do núcleo central da identidade pessoal e do mistério
de Jesus.
Para aprofundar seus conhecimentos sobre esse tema, su-
gerimos a seguinte leitura: Mysterium Salutis, vol. II/1, p. 84-85.
INFORMAÇÃO:
Em Jesus de Nazaré, revela-se uma profundidade, até então in-
suspeita, da paternidade de Deus e da filiação que dela deriva.
Pode-se dizer que o desenvolvimento da tradição cristã, em geral,
e da doutrina trinitária, em particular, tem seu fundamento na expe-
riência humana que Jesus teve de Deus. A “experiência do Abbá”
de Jesus de Nazaré, a consciência de sua filiação única e a posse
do Espírito são os germes da doutrina trinitária posterior.
INFORMAÇÃO:
Corpus iohanneum é um jargão que significa “corpo Joanino”, ou
seja, o conjunto dos escritos de João: seu Evangelho e suas três
cartas.
INFORMAÇÃO:
Sem essa referência ao Pai, é impossível para nós ter acesso ao
mistério da pessoa do Filho: Jesus vive constantemente orientado
para o Pai; a Ele, compete a primazia absoluta de sua vida inteira;
a comunhão entre eles é total.
INFORMAÇÃO:
De fato, Deus ama até o ponto de entregar o que lhe é mais caro
a fim de salvar os homens. Nesse dar e dar-se a si mesmo, nesse
compadecer-se e querer salvar está o verdadeiro amor. É, justa-
mente, esse amor, manifestado no envio do Filho, aquilo que cons-
titui a essência de Deus. No amor que se manifesta na doação de
Jesus, entrevê-se um novo modo de ser amor de Deus “ad intra”.
O Novo Testamento abre-nos ao mistério da vida intradivina na
revelação que aconteceu em Jesus.
d’Ele tudo procede por meio do único Senhor Jesus Cristo (1Cor
8,6; Rm 11,36).
Essa iniciativa de Deus Pai na criação nos coloca, de um
lado, na continuidade com o Antigo Testamento, mas nos mostra,
por outro lado, a novidade: o Deus criador é o Pai de Jesus, que
tudo realiza mediante o Filho (Cl 1,15ss; Hb 1,2-3; Jo 1,3.10). De
Deus, vem a iniciativa da missão de Jesus e de sua última vinda
(1Tm 6,14; Hb 3,20).
A paternidade de Deus manifesta-se, especialmente, na
ressurreição. Paulo vê Deus como o Pai do Senhor ressuscitado
(2Cor 1,3; 11,31; Ef 1,17; Fl 2,11; Rm 6,4). Desde então, o Deus
cristão não é outro senão o Pai de Jesus (Ef 1,2-3; 1Pd 1,3). O tí-
tulo de “Pai” fica assim incorporado, definitivamente, à confissão
do Deus cristão.
7. JESUS REVELASE
Para falar de si mesmo, parece que o Jesus histórico não usou
muito o título “Filho”. Em controvérsia, ele fazia uso frequente e
habitual do nome “Pai” para se referir a Deus. Somente no “hino de
júbilo” (Lc 10,21ss) é que encontramos essa autodenominação.
INFORMAÇÃO:
Do grego perikopé, esta é a ação de cortar em volta. “Perícope”
significa, portanto, “passagem bíblica” ou “trecho da Escritura”.
INFORMAÇÃO:
União hipostática: é “a união entre a plena divindade e huma-
nidade em uma pessoa (divina) de Jesus Cristo. Isso acontece
quando o ‘Verbo se fez carne’ (Jo 1,14; cf. DS 252-263; 301-302)”
(O’COLLINS; FARRUGIA, 1995, p. 406).
INFORMAÇÃO:
A expressão “acostumar-se” é usada por Irineu para falar da peda-
gogia de Deus, que se baseia na imagem da mútua familiaridade
entre Deus e o homem: “O Verbo de Deus habitou no homem e
ATENÇÃO!
Para aprofundar esse assunto e sobre ele refletir, leia: AGOSTI-
NHO. A Trindade (XV, 26,46). São Paulo: Paulus, 1995, p. 546-
550.
É o Pai que unge Jesus, não é o Filho que unge sua humani-
dade. Além disso, a descida do Espírito sobre Jesus deve ser vista
em relação com a voz do céu que proclama Jesus como o Filho: “Tu
és meu Filho amado, em ti me comprazo” (Mc 1,11).
A identidade de Jesus como Filho se manifesta nesse mo-
mento, e a descida do Espírito Santo não pode ser separada da
realização da obra de Jesus, que, como Filho de Deus, cumprirá sua
tarefa, delegada pelo Pai.
INFORMAÇÃO:
O momento do batismo é capital para a revelação da filiação de
Jesus, em plena identificação pessoal com a missão que o Pai lhe
confiou.
INFORMAÇÃO:
kénosis: é uma expressão grega que significa aniquilamento e es-
vaziamento; é o modo como o Filho se autocomunicou na história.
Opõe-se à doxa, que significa o modo de glória (BOFF, L. A trinda-
de, a sociedade e a libertação. Petrópolis: Vozes, 1986, p. 288).
ATENÇÃO!
Para aprofundar esse princípio, sugerimos que você leia: FEINER,
J.; LÖRER, M. (Org.). Mysterium Salutis, III/6, 85-86; Irineu de
Lião, Adversus Haereses, III, 18,5-6.
INFORMAÇÃO:
O pecador distanciou-se de Deus na desobediência, mas essa
alienação foi radicalmente superada por Jesus, que assumiu so-
bre si as consequências dessa desobediência. De fato, Jesus não
é um pecador, mas aceitou se fazer plenamente solidário por amor
aos pecadores.
INFORMAÇÃO:
O Filho livremente toma sobre si todo o peso da realidade do pe-
cado. Isto explica a agonia na cruz e também é expresso no grito
do abandonado. Ele enfrenta o abismo do pecado, isto é, a sepa-
ração de Deus, mas o faz por amor, transforma o pecado em amor,
cancela-o e recria nossa condição de filhos.
ATENÇÃO!
Para aprofundar-se nesse assunto, leia: KESSLER, H. Jesus Cris-
to – caminho da vida. In: SCHNEIDER, T. H. (Org.). Manual de
dogmática (vol. I). Petrópolis: Vozes, 2001. p. 371-372.
INFORMAÇÃO:
O poder onipotente de Deus manifesta-se nessa paternidade, ou
melhor, identifica-se com ela. Muitas passagens do Novo Testa-
mento o confirmam: 2Cor 1,3; 11,31; Ef 1,17; Fl 2,11.
INFORMAÇÃO:
Entre as duas missões, há, portanto, uma relação intrínseca e não
simples de justaposição: Jesus, o Filho enviado ao mundo, é a
fonte do Espírito para os homens.
infância (cf. Lc 1,41; 1,67; 2,25.27), veremos que tal ação foi possi-
bilitada pela vinda de Cristo.
Ao mesmo tempo, essa efusão difere da de Pentecostes. An-
tes de Pentecostes, a presença do Espírito tem como característi-
cas ser ocasional (de duração limitada) e se dar, somente, sobre
determinadas pessoas. Trata-se, portanto, de uma ação pontual
do Espírito, semelhante àquela que se deu nos profetas (cf. 1Pd
1,11).
Já a citação do profeta Joel no discurso de Pedro no dia de
Pentecostes (Cf. At 2,17ss; Jl 3,1-5) mostra a convicção de que, com
a ressurreição e ascensão do Senhor, chegou o momento previsto
da efusão universal do Espírito (sem limites nem fronteiras) como
um dom escatológico e estável que impele a Igreja para a evange-
lização e que lhe dá alegria do louvor a Deus (cf. At 2,4.11).
A doação do Espírito à Igreja e aos discípulos é consequência
inseparável da glorificação do Senhor.
Jesus disse em alta voz: Se alguém tem sede, venha a mim e beba,
aquele que crê em mim! Conforme a palavra da Escritura: de seu
seio jorrarão rios de água viva. Ele falava do Espírito que deviam
receber aqueles que tinham crido nele; pois não havia ainda o Espí-
rito, porque Jesus ainda não fora glorificado (Jo 7,37-39).
INFORMAÇÃO:
Dependendo da pontuação, este trecho “do seu seio jorrarão rios
de água viva”, pode se referir a Cristo ou a aquele que crê. A tradi-
ção mais antiga entende que se trata do seio de Cristo.
INFORMAÇÃO:
Com efeito, a água e o sangue do lado aberto de Cristo são in-
terpretados como alusão aos sacramentos do batismo e da euca-
ristia, mas, indiretamente, podem ser uma alusão ao Espírito que
sai do corpo de Jesus (cf. Jo 7,38; 19,34), que foi seu receptáculo
durante todo o tempo de sua vida.
INFORMAÇÃO:
Não é possível vivermos como filhos sem a ação do Espírito em
nós. Somente se formos conduzidos pelo Espírito de Deus é que
poderemos agir e viver como filhos de Deus.
INFORMAÇÃO:
O Espírito Santo, Espírito de Jesus e de Deus, cria em nós a atitu-
de de filiação, o espírito de filhos adotivos, contrário ao espírito de
escravo, que vive no temor.
INFORMAÇÃO:
Da mesma maneira com que agiu em Cristo, o Espírito não age em
nós como uma força exterior, mas partindo de nosso ser, porque
habita em nós.
INFORMAÇÃO:
O Espírito que habita em nós é, também, a força de Cristo que nos
une a ele. Ser templo do Espírito Santo e ser membro de Cristo é,
na realidade, a mesma coisa.
INFORMAÇÃO:
Não se trata, portanto, da introdução de uma nova verdade que
suplante ou substitua a de Cristo. Na verdade, o Espírito mantém
viva entre os discípulos a palavra e a própria presença de Jesus
(cf. 14,17; 15,26; 16,13).
INFORMAÇÃO:
Contra essas interpretações errôneas, deve-se recordar que o Es-
pírito desceu, inicialmente, sobre Jesus antes que este o comu-
nicasse aos homens. Nas duas missões (do Filho e do Espírito),
em sua distinção e em sua mútua implicação, realiza-se a obra da
salvação que tem no Pai − o único iniciador e a única fonte.
INFORMAÇÃO:
O Espírito Santo universaliza e torna eficaz, para todos os tempos
e lugares, a obra de Cristo, realizada em um momento e um lugar
determinados. Ao universalizá-la, o Espírito atualiza-a, ou seja,
torna-a presente como acontece nos sacramentos. Ao atualizá-la,
o Espírito interioriza-a nos homens, especialmente nos fiéis. Mas
a ação do Espírito não se limita ao âmbito visível da Igreja. A von-
tade salvadora de Deus não tem fronteiras, tampouco a mediação
de Jesus.
90 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
Para superar essa dificuldade, deve-se ter em mente que, na Trin-
dade, tudo é singular (nada é repetível). Por isso, não podemos
atribuir ao Espírito um ser “pessoal”, com as mesmas característi-
cas que as do Pai e do Filho.
INFORMAÇÃO:
Em relação ao Espírito Santo, não temos, no Novo Testamento,
uma afirmação explícita de sua divindade. É, porém, em sua asso-
ciação com o Pai e com o Filho, na realização do mistério de sal-
vação, que o Espírito Santo aparece em sua condição de Deus, e
não como simples criatura. A obra da salvação que Cristo realizou
dá seus frutos somente pela ação do Espírito Santo.
ATENÇÃO!
Sem a intervenção conjunta e, ao mesmo tempo, específica e dife-
renciada de cada uma das três pessoas da Trindade, nem o mun-
do nem o homem podem alcançar a salvação.
INFORMAÇÃO:
A estrutura Espírito-Filho-Pai é a ordem do caminho do homem a
Deus, possibilitado pela vinda de Deus a nós (Pai-Filho-Espírito):
“pois por meio dele, nós, judeus e gentios, num só Espírito, temos
acesso junto ao Pai” (Ef 2,18).
ATENÇÃO!
Convém observar de imediato que o texto não discorre sobre a
doutrina da Trindade, mas, simplesmente, proclama a revelação
desse mistério.
INFORMAÇÃO:
Como podemos notar, não se trata de uma revelação teórica ou
didática, mas da confissão e do testemunho de um mistério de
doação real acontecida na história.
por ele” (1Jo 4,9; cf. Jo 3,16). Na aparição histórica de Jesus, tem
lugar a revelação de Deus como Pai.
A revelação de Deus em Jesus pressupõe o anúncio do Antigo
Testamento. Ao menos até certo ponto, o Novo Testamento pres-
supõe que o Deus do Antigo Testamento, já claramente conhecido
(Deus da Aliança, o Criador de tudo e de todos e, portanto, o Deus
de todos os povos) é aquele que em Jesus se revela como “o Pai”.
O Deus do Antigo Testamento é aquele que os cristãos cha-
mam “o Pai”. Em outras palavras, o Deus que envia Jesus se identi-
fica com o único Deus de Israel (cf. Mc 12,26.29; Mt 4,10; 1Cor 8,6;
1Tm 2,5; Jo 5,44; 17,3).
A paternidade de Deus revela-se na missão de Jesus, o Filho.
Segundo Gl 4,4-6, essa missão tem como finalidade levar os ho-
mens a receber a filiação. O envio do Filho e a filiação adotiva dos
homens estão em relação íntima: Deus, que é Pai de Jesus, quer
ser, também, o Pai dos homens. O próprio Jesus introduz-nos em
sua relação filial com o Pai (cf. Mt 6,9).
Entre a paternidade de Deus em relação a Jesus e a filiação
dos discípulos, há uma inegável relação. Somente porque Jesus é o
Filho e o chama “Pai” é que ele pode ensinar os discípulos a invo-
cá-lo da mesma maneira e a viver a vida de filhos. É Jesus, o Filho,
quem pode introduzir os discípulos nessa relação paterno-filial.
Mas devemos reconhecer, também, que a filiação divina de
Jesus e a dos discípulos nunca se equiparam. Nunca encontramos,
no Novo Testamento, um “Pai nosso” no qual Jesus se inclua em
igualdade de condições com os demais. Assim se manifesta, em
suas palavras e em sua conduta, que a filiação de Jesus é única e é
fundamento da de seus discípulos.
O Espírito Santo é, segundo Paulo, o vínculo que relaciona a
filiação divina de Jesus com a nossa. É o mesmo Espírito que clama
em nós “Abbá” (Gl 4,6; Rm 8,15).
Outros textos triádicos que podemos citar são:
96 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
Esses poucos textos manifestam a consciência que os autores do
Novo Testamento tinham a respeito do Pai, do Filho e do Espíri-
to Santo: eles se distinguem realmente e permanecem unidos de
uma maneira especial. Será a reflexão teológica posterior da Igreja
que procurará explicitar o que já está “em germe”, ou seja, como a
unidade dos três não se opõe ao monoteísmo, mas o exprime.
ATENÇÃO!
Tornou-se suposição comum que o Antigo Testamento testemunha
o monoteísmo de Israel. No entanto, um exame mais acurado do
AT mostra, do ponto de vista histórico-religioso, que nossos con-
ceitos de “monoteísmo” e “politeísmo” são classificações muito
19. CONSIDERAÇÕES
A revelação do mistério de Deus não é mera informação di-
dática utilitária, mas é, especialmente, uma inserção do homem
na vida divina (cf. Ef 2,18). O que se comunica não é mera teoria,
mas é o próprio Deus. Ele se autocomunica para convidar os ho-
mens à comunhão com Ele.
A revelação de Deus Trino não acontece, somente, median-
te palavras, mas, sobretudo, com o envio do Filho e do Espírito
ao mundo pelo Pai. A salvação consiste na “filiação adotiva”. As
missões de Cristo e do Espírito têm como fim tornar essa filiação
possível.
As duas missões econômicas não são independentes entre
si, mas estão intimamente relacionadas. São dois momentos in-
separáveis da realização do único desígnio salvador de Deus. Sua
articulação interna descobre-se na vida de Jesus.
Jesus é o Filho de Deus enviado ao mundo. Ele, no entanto,
não é somente o Filho de Deus encarnado, mas também o porta-
dor do Espírito. Sobre Jesus, que é o Filho, atuou o Espírito. Pela
ação do Espírito, Jesus entregou-se na morte e ressuscitou.
O mistério pascal é um momento especialmente importante
da revelação do mistério de Deus. A capacidade do Filho de Deus
de sair de si, de ir ao encontro do perdido no distanciamento do
Pai (o abandono), verifica-se, juntamente, com sua entrega obe-
diente nas mãos do Pai.
O Pai, com a intervenção do Espírito, é o agente principal da
ressurreição de Jesus. Nesta, manifesta-se a unidade do Pai e do
2. CONTEÚDOS
• Origem da teologia trinitária nos padres apostólicos.
• Reflexão explicitamente trinitária dos padres apologetas.
• Teologia trinitária dos séculos 2° e 3°.
• Crise Ariana e o Concílio de Nicéia.
104 © Teologia Trinitária
• Capadócios.
• Concílios antigos e medievais.
4. INTRODUÇÃO
Na unidade anterior, conhecemos a teologia trinitária à luz
dos textos do Antigo e do Novo Testamentos.
Nesta unidade, percorreremos juntos dois milênios de refle-
xão, de aprofundamento, de diálogo teológico com a cultura e com
a polêmica e de disputas com as tendências heréticas, que amea-
çaram a reta recepção e transmissão da fé trinitária e das defini-
ções dogmáticas mais importantes, que a Igreja proclamou, e que
permanecem, pontos fixos para ulteriores desenvolvimentos.
Evidentemente, tal percurso só poderá destacar os autores
e os desenvolvimentos mais importantes e decisivos da história
INFORMAÇÃO:
Recorrer ao passado mostra-nos que não fomos nós os criadores
da fé trinitária nem que somos os primeiros a refletir sobre ela.
5. PADRES APOSTÓLICOS
Encontramos nos padres apostólicos algumas fórmulas trini-
tárias, mas não podemos falar de uma teologia trinitária desenvol-
vida plenamente.
Veremos como pouco a pouco a repetição das fórmulas tri-
nitárias obrigará a um maior aprofundamento dos conteúdos que
elas expressam. Não estamos, portanto, no período de grande de-
senvolvimento teológico, mas, sim, nos primeiros passos para tal
desenvolvimento.
INFORMAÇÃO:
Durante boa parte do período patrístico, o título de “Pai” incluía a
ideia da criação (Pai do mundo) além de seu sentido trinitário (Pai
do Filho). Somente com a Crise Ariana é que será excluída toda a
ideia de criação na compreensão da paternidade divina e que esta
será reservada, exclusivamente, ao seu sentido trinitário, exata-
mente para não dar a entender que Cristo seja criatura.
INFORMAÇÃO:
É interessante notar como a linguagem usada revela certa hesita-
ção e imprecisão terminológica; a reflexão teológica sobre o misté-
rio de Deus Trino está ainda dando seus primeiros passos.
6. APOLOGETAS
A reflexão trinitária propriamente dita começa quando os
cristãos se veem na necessidade de defender a própria fé dos ata-
ques adversários, de possíveis mal-entendidos e, também, de ex-
por a coerência do cristianismo aos hebreus e pagãos.
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
Logos: “No pensamento de João, Logos é a Palavra divina pree-
xistente mediante a qual ‘tudo foi feito’ e que ‘se fez carne e habitou
entre nós’ (Jo 1,1-14; 1Jo 1, 1-2; Ap 19,11-16). O caráter ‘verbal’
desse título cristológico quer insinuar que a divina autorrevelação
alcançou seu ápice com a encarnação histórica do Logos. Depois
de Nicéia, os termos ‘Logos’ e ‘Filho de Deus’ foram usados, in-
diferentemente, para designar a segunda pessoa da Trindade”
(O’COLLINS, G.; FARRUGIA, E. “Logos”. In: Dizionario sintético di
Teologia. Editrice Vaticana, 1995, p. 201).
INFORMAÇÃO:
É preciso levar em conta que esse conceito inclui e abarca uma
variedade muito grande de seitas e de escolas muito heterogêne-
as entre si. De qualquer forma, podemos considerá-lo, generica-
mente, um movimento religioso.
INFORMAÇÃO:
Os resumos dos termos “gnose”, “gnosticismo”, “marcionismo”
e “valentianos” têm como fonte: O’COLLINS, G.; FARRUGIA, G.
“Gnosi”; “Gnosticismo”; “Marcionismo”; “Valentiniani”. In: Diziona-
rio sintético di Teologia. Editrice Vaticana, 1995, p. 160; 160-161;
206; 410.
Gnose
É um modo de descrever a vida eterna (Jo 17,3). Esse conhe-
cimento vital do Pai e do Filho não é pura percepção intelectual das
118 © Teologia Trinitária
Gnosticismo
Movimento religioso dualista, que se inspirava no hebraís-
mo, no cristianismo e no paganismo; emergiu com clareza no sécu-
lo 2º d.C.; apresentava a salvação como um conjunto de elementos
espirituais livres da matéria ambiental malvada.
Os gnósticos cristãos negavam a encarnação real de Cristo
e a salvação da carne (lat.: salus carnis) por ele realizada. Rejei-
tavam (ou modificavam) a tradição e as escrituras nas linhas fun-
damentais do cristianismo, vangloriando-se de um conhecimento
privilegiado (de Deus e de nossa sorte humana) como fruto de tra-
dições secretas e de revelações. Os escritores ortodoxos cristãos,
especialmente Santo Irineu, fornecem muitas informações sobre o
gnosticismo. Um conhecimento direto e mais profundo desse mo-
vimento foi possível depois de 1945, quando 52 escritos, que tra-
tavam do gnosticismo, em língua copta e do século 4º d.C., foram
encontrados em Nag Hammadi (Egito).
Marcionismo
Movimento dualista ascético fundado por Marcião, nascido
no Ponto, Ásia Menor. Marcião veio a Roma aproximadamente no
ano 140 e foi excomungado em 144. Em suas Antíteses, sustentava
que o criador (demiurgo) e a lei do AT eram absolutamente incom-
patíveis com o Deus de amor e de graça pregado por Jesus. Por
isso, ele rejeitava completamente as Escrituras hebraicas e acei-
tava, somente, as cartas paulinas e uma versão mutilada do Evan-
gelho de Lucas. Interpretava a pessoa e a obra de Cristo segundo
uma perspectiva doceta. Por algum tempo, Marcião teve muitos
seguidores. Teólogos como Irineu de Lião e Tertuliano sentiram o
dever de confutá-lo. A formação do cânon foi, em parte, uma res-
Valentinianos
São os seguidores de Valentino, que fundou uma das seitas
gnósticas mais importantes do século 2º. Parece que ele nasceu
no Egito e que guiou os gnósticos de Alexandria antes de chegar a
Roma por volta de 135. Permaneceu aí, aproximadamente, por 20
anos e, até certo ponto, esperou se tornar bispo de Roma. Ensinou
um sistema complicado de éons que, originalmente, formavam o
pleroma. Mais tarde, mediante a syzigies (do siríaco "unir em ma-
trimônio"), a deusa Sophia e um dos éons inferiores deram ori-
gem ao Demiurgo ou criador do universo, identificado como Deus
(mau) do AT. Esse sistema foi combatido energicamente por Santo
Irineu de Lião (cf. DS 1341).
A teologia de Irineu tem uma estrutura claramente trinitária.
Partindo do acontecimento salvífico (a oikonomia), a estrutura te-
ológica poderia ser esta: Pai-Filho-Espírito-Filho-Pai.
Mesmo correndo o risco de esquematizar demais, essa es-
trutura fornece uma chave de compreensão da teologia de Irineu,
que pressupõe, sempre, este duplo movimento trinitário: uma li-
nha descendente, que procede do Pai através do Filho até o Espírito
Santo que nos foi comunicado; e uma linha ascendente, que, par-
tindo do Espírito em nós, volta através do Filho até o Pai. Segundo
Irineu, a salvação realiza-se por meio de uma gnose na qual todo
homem pode ver a Deus por causa da vinda Dele até o homem.
Irineu afirma que o Filho e o Espírito intervêm na obra cria-
dora do Pai. Deus é assistido, em algumas passagens, pelo Logos
(Adv. Haer. II, 2,4) e, em outras, pelo Logos e pela Sabedoria Deus
(Adv. Haer. IV, pref. 4; 7,4), que são como duas energias criadoras
a patentear o fato de que Deus não tem necessidade alguma da
120 © Teologia Trinitária
criatura para sua atividade criadora. Pelo contrário: para criar, Ele
se serviu de suas próprias forças, a saber, do Filho e do Espírito.
Essa doutrina das "duas mãos" explica, ademais, como Deus, do
mesmo modo como agiu no início da criação, continua agindo com
o Filho e com o Espírito ao longo de toda a história da salvação.
Essa continuidade é importante, pois mostra a correspondência
básica entre a obra criadora e a obra da salvação (cf. LADARIA, L. El
Dios vivo y verdadero. Secretariado Trinitario, 1998, p. 146).
Para Irineu, o Filho é Deus, participa da divindade e vem do
Pai. Ele acentua o aspecto da geração eterna do Filho mais do que
os pensadores cristãos anteriores.
Em controvérsia, ao falar do Filho e do Espírito como os exe-
cutores das revelações divinas (Adv. Haer. III, 8,3; IV,6,7; IV 38,3),
Irineu usa expressões de sabor subordinacionista.
Com efeito, ele afirma a divindade do Filho, mas essa divin-
dade é compatível com certa "subordinação" em relação ao Pai.
Assim, o ponto fraco da teologia trinitária de Irineu consiste
em não ter chegado a afirmar uma consubstancialidade totalmen-
te "perfeita" entre ambos: o Filho não é igual ao Pai em todos os
seus atributos.
Fundamental na teologia de Irineu é a afirmação de que o
Filho é o revelador do Pai: O Filho é o conhecimento do Pai. Nesse
sentido, o Filho é o visível do Pai: "Pelo Verbo tornado visível e pal-
pável, o Pai se revelou, embora nem todos cressem nele do mes-
mo modo [...]; a realidade invisível que se vê no Filho é o Pai, e a
realidade visível, em que se vê o Pai, é o Filho" (Adv. Haer. IV 6,6).
O fato de o Filho dar a conhecer o Pai implica a unidade de
ambos: o Filho é o único que compreende o Pai. Mas a cognosci-
bilidade do Filho em relação à incognoscibilidade do Pai implicam
que, em um aspecto, ele é inferior: "o próprio Pai, que é incomen-
surável, foi medido no Filho; com efeito, o Filho é a medida do Pai
porque o compreende" (Adv. Haer. IV, 4,2). Entretanto, essa com-
INFORMAÇÃO:
Regra de fé (regula fidei): Norma de fé como critério público e ecle-
sial para discernir a verdadeira revelação comunicada por Cris-
to à Igreja. Irineu desenvolveu esse conceito contra os gnósticos
que afirmavam possuir revelações especiais acessíveis somente
a uma elite (O’COLLINS, G.; FARRUGIA, E. Regola dei fede. In:
Dizionario sintético di teologia, Editrice Vaticana, 1995, p. 308.).
INFORMAÇÃO:
O Filho não é outro deus rival, pois ele provém da substância do
Pai e cumpre a vontade d’Ele. Por isso, Deus não sofre dispersão
pelo fato de o Filho e o Espírito ocuparem o segundo e o terceiro
lugares, partícipes que são da substância do Pai. A monarquia não
é destruída, mas fica claro, ao mesmo tempo, que o Pai, o Filho e
o Espírito não são a mesma coisa.
INFORMAÇÃO:
Esses três unidos, mas não identificados em todos os aspectos,
são chamados com frequência “pessoas” (personas). Evidente-
mente, não se trata ainda do desenvolvimento completo dos con-
teúdos posteriores dessa noção.
126 © Teologia Trinitária
Ou se dirá que Deus não pôde gerar esta Sabedoria antes de tê-
la gerado, de modo que ele pôs no mundo depois aquilo que não
existia previamente, ou então que ele podia, sim, gerá-la, mas – su-
posição que não se deve fazer – que não o queria. Ambas as hipó-
teses são absurdas e ímpias, é claro: imaginar que Deus tenha pro-
gredido da impotência à potência ou que, podendo fazê-lo, tenha
negligenciado ou adiado gerar a Sabedoria. Deus é sempre Pai de
seu Filho único, nascido dele, tomando dele o que é, sem, porém,
nenhum começo [...]. Como é possível dizer que houve um momen-
to em que o Filho não teria sido? Isso equivaleria dizer que houve
um momento em que a Verdade não teria sido, em que a Sabedoria
não teria sido, em que a Vida não teria sido, quando em todos esses
aspectos (de ser) especifica-se perfeitamente a substância do Pai
(Princ. I,2,2; IV,4,1).
INFORMAÇÃO:
O Logos é, além de divino, uma hipóstase própria. A individualida-
de (idiotes) do Filho é distinta da do Pai. Ele é o resplendor da luz,
mas possui uma subsistência pessoal.
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
Em Orígenes, “os termos ‘hipóstase‘ (hypostasis), ‘substância’
(ousia), ‘substrato’ (hypokeimenon), empregados a propósito de
Deus, têm ainda sentidos muito próximos, senão sinônimos. Eles
designam a realidade concreta, por oposição àquilo que só existe
no espírito” (SESBOÜÉ, 2002. p. 195)
Hipóstase significa a natureza substancial ou a realidade que está
sob algo (cf. Hb 1,3). O termo criou problemas nas controvérsias
cristológicas e trinitárias dos séculos 4º e 5º, quando começou a
significar uma “realidade concreta e singular”, ou uma “existên-
cia distinta pessoal”. Por fim, o ensino oficial da Igreja falou de
Deus como três “hipóstases” que compartilham a única substância
ou natureza, e de Cristo como duas naturezas e uma “única hi-
póstase” ou pessoa (cf. DS 125-126; 300-303; 421). Na teologia
trinitária, usa-se o termo para sublinhar que as pessoas divinas
são reais e não apenas aparentes (O’COLLINS, G.; FARRUGIA,
E. Ipostasi. In: Dizionario sintético di teologia. Editrice Vaticana,
1995, p. 182.)
INFORMAÇÃO:
A crise ariana, porém, não será totalmente negativa para a fé da
Igreja. Ela será a ocasião para a primeira definição solene da Igre-
ja não só sobre a doutrina trinitária, mas também sobre o ponto
central da fé, ou seja, a identidade última de Jesus salvador. Com
isso, a Igreja procurará definir o sentido do monoteísmo cristão.
138 © Teologia Trinitária
Doutrina de Ário
Ário era um presbítero de Alexandria, nascido por volta do
ano 260. Ele considerava Cristo uma criatura privilegiada. Sua pre-
ocupação fundamental era a afirmação da unicidade de Deus, que
estaria comprometida, segundo ele, se fosse aceita a divindade do
Filho. A carta que Ário dirigiu ao bispo Alexandre de Alexandria é
um bom resumo de sua doutrina:
Conhecemos um só Deus, único incriado, único eterno, único sem
princípio, único verdadeiro, único imortal, único verdadeiramente
bom, único poderoso [...]. Esse Deus gerou um Filho unigênito an-
tes de todos os séculos, por meio do qual criou os séculos e todas
as coisas; nascido, não em aparência, mas em verdade; obediente
à sua vontade, imutável e inalterável; criatura perfeita de Deus, po-
rém não como uma das criaturas; feito por Deus, porém não como
as demais obras [...]. É, como dissemos, criado pela vontade do Pai
antes dos tempos e dos séculos, recebe do Pai a vida e o ser, e o Pai
o glorifica ao fazê-lo participar de seu ser [...]. O Filho saiu do Pai,
fora do tempo, criado e constituído antes dos séculos; não existia
antes de nascer, mas nasceu antes de todas as coisas, fora do tem-
po. Recebe o ser, Ele só, do Pai só. Não é nem eterno, nem coeter-
no, nem incriado junto com o Pai! (HILÁRIO DE POITIERS, Trin. IV,
12-13).
INFORMAÇÃO:
Este é, também, o significado do título grego pantokrator. Sua tra-
dução mais adequada não é o “Onipotente” ou o “Todo-poderoso”.
Pantokrator não é, inicialmente, “O que tudo pode”, mas “O que
tudo mantém e rege” em seu poder transcendente; por isso, não
indica uma propriedade abstrata, mas o exercício efetivo do poder
criador.
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
O estudo do título pantokrátor revelou que originalmente o termo
grego tinha dois sentidos: um bíblico e outro helenístico-cristão.
O sentido bíblico se ligava ao termo hebreu shebaôt, fortemente
marcado pelo sentido sacro e nacionalista dos títulos “Senhor dos
exércitos” e “Senhor do universo”; assim os primeiros autores cris-
tãos orientavam a interpretação do termo para as ideias de poder,
de autoridade e de domínio. Mais comum, porém, era a associa-
ção do título à criação e à conservação do universo. De fato, nos
textos antigos nenhum indício formal leva a distinguir a onipotência
divina de sua atividade criadora, mesmo que esses dois atributos
não se reduzam a simples sinônimos. Pela sua derivação do verbo
krateîn, a palavra pantokrátor indicava normalmente uma relação
permanente de Deus com o universo e não somente o ato inau-
gural de sua fundação. Além disso, pantokrátor era entendido não
no sentido de “reger tudo”, mas de “tudo deter”, de “tudo ter nas
mãos”, indicando não o “Soberano”, o “Dominador” do Universo
que o criou (ho tôn pantôn kratôn), mas o “Providente” que o envol-
ve com sua solicitude e o “Salvador” que o mantém na existência
(ho ta panta kratôn). Essa acepção helenística foi adotada pelos
autores do símbolo, depois que o título de Pai passou a excluir
toda ideia de criação (Pai do mundo) para se restringir ao sentido
trinitário de Pai (que gera o Filho). Quando o termo grego passa
144 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
Dizer que o Filho foi gerado equivale a dizer que ele é “da essên-
cia do Pai”. Como um homem gera um homem, assim, o Pai gera
o Filho, comunicando-lhe sua substância: Deus gera Deus. Além
disso, Nicéia procurou sublinhar que a geração não deve ser en-
tendida como algo material, como se o Filho fosse uma parte do
Pai, mas que é uma geração espiritual, sem separação de subs-
tância.
INFORMAÇÃO:
A geração que dá o ser ao Filho é de natureza diversa da criação.
A geração do Filho não é uma criação do nada. O Concílio definiu
o modo de origem do Filho como uma geração, excluindo, absolu-
tamente, a criação.
INFORMAÇÃO:
O símbolo de Nicéia parte da confissão de um Deus, o Pai, que é
uno e único. De sua essência, procede o Filho, que é tão divino
quanto o Pai. Daí se segue que o Filho possui a única e indivisível
essência própria do Pai. O Filho é o “unigênito” (em grego: mono-
ghenes) porque sua ousia deriva do Pai; sua ousia é igual a do
Pai desde “quando” nasceu sem ser criado. Por conseguinte, ele
é também coeterno ao Pai e, enquanto Filho gerado do Pai, parti-
cipa de tal maneira da natureza do Pai que é preciso confessá-lo,
também, como criador. Portanto, a conclusão lógica da confissão
trinitária de Nicéia não é, somente, a igualdade de essência entre
o Pai e o Filho, mas, sobretudo, a unidade de essência entre am-
bos.
INFORMAÇÃO:
Sabelianismo: heresia de Sabélio (dos inícios do século 3º. em
Roma), chamada também de modalismo: o Filho e o Espírito San-
to seriam simples modos de manifestação da divindade e não Pes-
soas distintas (BOFF, 1986, p. 290-291).
INFORMAÇÃO:
De fato, somente Deus pode resgatar a criação. Ela se tornara
imperfeita por causa do pecado. Assim, a “criação” da humanidade
do Filho tem lugar para completar sua obra, isto é, a encarnação
torna-se necessária para que o homem possa ser divinizado e ter
acesso ao Pai: “O homem unido a uma criatura, isto é, se o Filho
não fosse Deus verdadeiro não podia ser divinizado, e o homem
não teria podido estar na presença do Pai se o que se tinha re-
vestido de seu corpo não fosse por natureza o Verbo verdadeiro
do Pai” (C. Ar., II,70). Como se nota, o argumento soteriológico
desempenha um papel essencial no discurso trinitário de Atanásio.
O que está em jogo é a salvação do homem, que não pode se re-
alizar se o salvador não é o Filho verdadeiro do Pai.
INFORMAÇÃO:
Deus é livre e nada faz sem liberdade. Mas é preciso entender que
liberdade e necessidade em Deus não se relacionam do mesmo
modo como em nós. No ser criado, tudo o que é necessário não
é livre, e tudo o que é voluntário não é necessário. Mas em Deus,
necessidade e vontade não se contradizem nem se opõem: o que
é livre é também necessário e vice-versa.
INFORMAÇÃO:
O caminho da salvação não começa somente com o nascimento
humano de Jesus, mas já está atuante no Antigo Testamento e
chega a seu cumprimento no acontecimento único e definitivo da
encarnação.
INFORMAÇÃO:
O nome “dom”, relacionado ao Espírito, terá influência em auto-
res posteriores, como em Santo Agostinho. Assim, podemos dizer
que Hilário colocou os problemas dogmáticos acerca do Espírito
sem desenvolvê-los, mas outros o farão no desenvolvimento da
teologia.
9. PADRES CAPADÓCIOS
Os padres capadócios (Basílio de Cesaréia, Gregório Nazian-
zeno e Gregório de Nissa) tiveram um papel de destaque no de-
lho, mas isto não o faz menos Deus do que o Pai, porque o “não ser
gerado” não indica a essência (o ser-Deus), mas a relação.
Os nomes relativos podem, também, ser aplicados, analoga-
mente, a seres muito diversos entre si. Esse é o caso de "pai" e "fi-
lho", que podem ser aplicados tanto a Deus quanto aos homens.
Isto só é possível, exatamente, porque os nomes relativos
não indicam o que as coisas são em si mesmas, mas a relação que
as une.
Ora, os termos relativos, quando aplicados analogamente a
Deus e aos homens, não levam a pensar que Deus e os homens te-
nham a mesma substância: a relação é análoga, mas a substância
é diversa.
As consequências dessa genial distinção que Basílio desco-
bre são enormes. Ele não só refutou, brilhantemente, o raciocínio
de Eunômio, mas especialmente lançou as bases de uma futura
teologia trinitária, que manterá, em tensão equilibrada, a unidade
da essência divina com a pluralidade das pessoas, precisamente a
partir da distinção entre os termos absolutos e os relativos.
O texto a seguir mostra bem essa combinação entre o que é
comum e aquilo que é próprio em Deus:
Se quer aceitar o que é verdade, isto é, que o gerado e o inascível
são propriedades distintas consideradas na substância, que condu-
zem como pela mão à noção clara e sem confusão de Pai e Filho,
então se escapará do perigo da impiedade e se guardará a coerên-
cia nos raciocínios. Pois as propriedades, como características e
formas consideradas na substância, fazem uma distinção entre o
que é comum graças às características que as particularizam, mas
não rompem o que há de comum na essência. Por exemplo, a di-
vindade é comum, mas a paternidade e a filiação são propriedades
(idiomata). E da combinação dos dois elementos, o comum e o pró-
prio, opera-se em nós a compreensão da verdade. Assim, quando
ouvimos falar da luz inascível pensamos no Pai, e se ouvimos falar
de uma luz gerada compreendemos a noção do Filho. Enquanto
luz e luz, não há entre eles nenhuma oposição, enquanto gerado e
inascível, são considerados em contraposição. Tal é, com efeito, a
natureza da propriedade, a de mostrar a alteridade na identidade
da essência (ousia) (C. Eun II,28).
164 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
A essência divina, porém, não pode ser definida como as catego-
rias humanas. Só conhecemos Deus por meio de sua atividade.
Assim, a única disposição salvadora do Pai é realizada pelo Filho
e pelo Espírito.
INFORMAÇÃO:
As afirmações do Concílio de Constantinopla sobre o Espírito
Santo, embora diferentes no estilo das que se aplicam ao Filho,
refletem a fé convicta na divindade da terceira pessoa, igual em
divindade ao Pai e ao Filho.
Epistula Synodica
No ano 382, um ano após o Concílio de Constantinopla I,
portanto, o papa Damaso convidou os bispos do Oriente para um
concílio na Itália. De Constantinopla, os bispos orientais escreve-
ram uma longa carta ao papa Damaso, desculpando-se por não
poder assistir ao Concílio. Nela, os bispos inserem uma confissão
de fé trinitária:
Tomus Damasi
Como visto anteriormente, o papa Damaso convocou um
concílio em Roma. O documento contém uma série de anátemas
nos quais se resume a fé trinitária e se condenam os diferentes
erros. A problemática do documento é, mais ou menos, idêntica à
do Concílio de Constantinopla: os erros cristológicos e trinitários,
especialmente pneumatológicos. Leiamos dois desses anátemas:
Se alguém não disser que única é a divindade, a majestade, o po-
der, única a glória e a realeza, único o reino e única a vontade e a
verdade do Pai e do Filho e do Espírito Santo é herético.
Se alguém não disser que as três pessoas do Pai e do Filho e do Es-
pírito Santo são reais e iguais, eternamente viventes, contendo em
si todas as coisas visíveis e invisíveis, onipotentes, juízes de tudo,
que a tudo dão vida, tudo criam, tudo conservam, é herético (DS
172-173).
Concílio de Calcedônia
O Concílio de Calcedônia foi realizado no ano 451. Ele foi con-
vocado para fazer frente à heresia monofisita de Eutiques (aproxi-
madamente 378-545). Essa heresia consistia em reduzir Cristo a
uma só natureza, a divina. O Concílio afirmou a única pessoa de
Cristo em duas naturezas: a divina e a humana.
176 © Teologia Trinitária
Concílio de Constantinopla II
Esse Concílio, que se reuniu em 553, foi convocado pelo im-
perador Justiniano I (527-565) para estabelecer a paz na Igreja do
Oriente e para superar o monofisismo.
Fica também claramente definido que ousía não pode mais ser
empregado para designar a hipóstase do Pai, do Filho e do Espírito.
Lembre-se de que, em Nicéia, ousía e hypóstasis eram ter-
mos reversíveis. Constantinopla II consagra e define a oposição
desses dois termos: há três hipóstases na única natureza da Trin-
dade consubstancial.
Outro avanço semântico e trinitário, testemunhado pelo câ-
non trinitário, é o uso do termo niceno "consubstancial" para toda a
Trindade: as três pessoas são, reciprocamente, consubstanciais, por-
que subsistem na mesma natureza única. A Trindade consubstancial
é um só Deus porque cada pessoa possui a única divindade.
O cânon ressalta a igualdade das três pessoas, no sentido de
que elas possuem a mesma divindade, a mesma natureza.
Essa única divindade é adorada em três hipóstases, ou pessoas,
que são três subsistentes reais, e não só três que aparecem como
tais. Em Deus, portanto, sem que haja separação da unidade da
essência, há distinção real de três pessoas. A divindade una não é a
soma das três pessoas, mas a unidade da divindade é somente a da
Trindade consubstancial (LADARIA, 1998. p. 234).
14. CONSIDERAÇÕES
A Teologia Trinitária e a ortodoxia eclesial rejeitaram, durante
a história, algumas tendências que podiam destruir a fé trinitária.
Rejeitou-se, inicialmente, a tendência triteísta que afirmava
que há três deuses. Além de errada filosoficamente, ela não é fiel
à revelação divina.
Rejeitou-se, também, o modalismo, que afirmava, unilateral-
mente, a unidade divina que termina reduzindo o Pai, o Filho e o
Espírito Santo somente a três modos ou representações da mesma
substância divina. Conhecida, também, como sabelianismo, essa
tendência defende a unidade divina, mas nega a trindade.
Reprovou-se, por fim, a tendência subordinacionista, que
reconhecia um só Deus, o Pai, e subordinava o Filho e o Espírito
como suas criaturas.
As tendências subordinacionistas são agrupadas sob um
nome comum: o arianismo.
3
1. OBJETIVOS
• Identificar e interpretar o método atual da Teologia Trinitária.
• Compreender e conhecer os termos técnicos mais impor-
tantes da Teologia Trinitária.
• Analisar e interpretar as analogias trinitárias da mente
humana e do amor interpessoal.
2. CONTEÚDOS
• Axioma fundamental.
• Missões econômicas e processões imanentes.
• Analogia psicológica e amor interpessoal.
• Relações e pessoas divinas.
• Propriedades e apropriações.
• Pericórese e circumincessio.
184 © Teologia Trinitária
4. INTRODUÇÃO
Anteriormente, voltamos nossa atenção para o testemunho
bíblico da revelação trinitária e para a reflexão da Igreja antiga –
que parte de sua fé transmitida, vivida e celebrada – sobre o Deus
Uno e Trino.
5. DA ECONOMIA À TEOLOGIA
Como já sabemos, a revelação do Deus cristão é uma auto-
comunicação que se dá na história e como história da salvação.
Esse fato tem consequências para o tratado da Trindade, como
bem ilustra o Catecismo da Igreja Católica: “Toda a história da sal-
vação não é senão a história da via e dos meios pelos quais o Deus
186 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
Entre o mistério da Trindade e a história da salvação, há uma cor-
relação que é consequência da própria dinâmica da autocomuni-
cação divina: somente por meio da história da salvação podemos
chegar ao Mistério de Deus em si; somente à luz do mistério de
Deus a história da salvação tem sentido.
INFORMAÇÃO:
A formulação desse axioma e a discussão que ele provocou fize-
ram que a Teologia tomasse consciência de que somente a partir
de Cristo tem sentido falar da Trindade.
INFORMAÇÃO:
Esses dois aspectos (mistério de Deus e da nossa salvação, Deus
em si e Deus para nós) não podem ser separados.
ções errôneas que o próprio Rahner não quis dar ao seu axioma.
Ora, ao acentuar o que o axioma não quer dizer, chega-se a enten-
der com mais clareza o que ele quer dizer.
A segunda parte do axioma fundamental não quer negar
que a comunicação econômica da Trindade Imanente seja gra-
tuita e livre.
A identificação (sem confusão) que o axioma faz entre Trin-
dade Imanente e Econômica não quer afirmar que a Trindade Ima-
nente só exista na economia, que Deus se torne trino na medida
em que se comunica aos homens e que a Trindade das Pessoas
seja fruto de sua decisão de se autocomunicar. Na economia, e
por ela, Deus comunica-se gratuita e livremente, não se aperfeiçoa
nela nem se constitui como Trindade.
Portanto, o axioma não nega a distinção (sem separação)
entre Trindade Imanente e Econômica, entre Trindade em si e em
sua comunicação. É essa distinção que reafirma a liberdade divina.
Essa distinção entre Trindade Imanente e Econômica se desdobra
em outra afirmação: a Trindade imanente é o fundamento trans-
cendente da economia salvadora.
A identidade (sem confusão) entre Trindade Imanente e Eco-
nômica não pode ser explicada em termos de uma realização de
Deus na economia.
Assim, a Trindade Imanente não se confunde com o desen-
volvimento da economia da salvação nem se dissolve nela, tam-
pouco se "esgota" na dispensação (dispensatio) salvadora na qual
se comunica gratuita e livremente.
Em sua comunicação salvadora, Deus revela-nos com mais
proximidade seu insondável mistério, mas não o elimina nem o
enfraquece!
De fato, não se pode esquecer que esse mistério da proximi-
dade de Deus em sua autocomunicação realiza-se na história por
meio do despojamento divino (= kénosis), da cruz e do esvazia-
mento que nos obrigam a reconhecer, uma vez mais, uma distin-
ção entre Trindade Imanente e Econômica. A revelação da glória
de Deus dá-se, paradoxalmente, na suprema humilhação da cruz.
INFORMAÇÃO:
Kénosis: A auto-humilhação a que se submeteu a segunda Pes-
soa da Trindade na Encarnação (Fl 2,5-11, cf. 2Cor 8,9). Isto não
significa (e não podia significar) o abandono da natureza ou da
substância divina. Comportou, no entanto, a aceitação dos limi-
tes da existência humana que, de fato, chegaram ao cume da hu-
milhação suprema da morte na cruz (O’COLLINS & FARRUGIA,
1995, p. 186).
6. MISSÕES ECONÔMICAS
Como vimos nas partes bíblica e histórica, o Pai enviou o Fi-
lho (Gl 4,4, Jo 3,17; 5,23; 6,27; 17,18) e o Espírito Santo (Gl 4,6; Jo
14,16.26) ao mundo a fim de nos introduzir na comunhão que eles
vivem e são em si mesmos.
INFORMAÇÃO:
O envio no tempo da segunda e da terceira pessoas pelo Pai é o
que a Teologia Trinitária chama “missões divinas econômicas ou
temporais”. A importância delas para a fé e para a Teologia é que,
a partir delas, Deus possibilitou-nos o acesso à salvação e à sua
vida interior.
196 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
Não é, portanto, um raciocínio por analogia que nos levou a cha-
mar Deus de Pai, mas a revelação do Filho.
INFORMAÇÃO:
A presença qualificada e pessoal do Filho se dá mediante a encar-
nação, isto é, da presença visível na natureza humana assumida
pelo Verbo. A presença qualificada do Espírito consiste no dom
invisível, universal, estável e verificável mediante a inabitação nos
corações. Inabitação trinitária é a presença de Deus que “habita
em” o mundo e o homem. Há dois modos de presença da Trinda-
198 © Teologia Trinitária
7. PROCESSÕES IMANENTES
Se Deus, de fato, revela-se livre e gratuitamente na econo-
mia salvadora como é em si mesmo, podemos dizer que as mis-
sões divinas temporais têm origem nas processões eternas e, ao
mesmo tempo, as revelam.
As missões econômicas podem ser qualificadas como imita-
ção, ampliação e prolongamento das processões eternas.
INFORMAÇÃO:
A partir dessa relação entre missões e processões divinas, pode-
mos compreender a diferença que há entre as teofanias e as mis-
sões divinas. Uma missão econômica é a manifestação sensível
da processão eterna de uma Pessoa divina, por isso sempre inclui
a teofania da Pessoa enviada. Pelo contrário, uma Pessoa divina
pode se manifestar no tempo sem, contudo, revelar a sua proces-
são eterna. Por isso, o Pai, que não procede de ninguém, pode se
manifestar de modo sensível, por exemplo, na voz que se ouve
após o batismo de Jesus, mas Ele não é enviado “porque, mesmo
que Deus Pai tenha querido se manifestar visivelmente por meio
da criatura submissa, seria totalmente absurdo afirmar que tenha
sido mandado pelo Filho, que ele gerou, ou pelo Espírito Santo,
que dele procede” (SANTO AGOSTINHO. A trindade. São Paulo:
Paulus, 1994, 4,21,32, p. 189).
Santo Agostinho
Agostinho valeu-se de comparações tiradas da alma humana
para iluminar o mistério da Trindade.
Ele recorreu a essas comparações porque, segundo sua in-
terpretação de Gn 1,26s, a alma humana é a única criatura feita à
imagem e semelhança da Trindade (cf. De Trin. 7,6,12).
Agostinho pretendia penetrar nessa imagem divina impressa
na alma para obter alguma luz para se aproximar do mistério trini-
tário. Evidentemente, ele tem consciência de que essa imagem na
alma humana é imensamente desproporcional à Trindade mesma.
Dentre todas as criaturas, porém, é a única que recebeu tal ima-
gem da Trindade.
Criado por Deus, o homem é criado à imagem da Trindade.
No Comentário literal inacabado ao Gênesis (393), aparece o pri-
meiro indício de que Agostinho, pensando na Trindade, volta sua
atenção ao homem: “O homem não foi criado somente à imagem
do Pai, nem somente à do Filho nem somente à do Espírito Santo, e
sim, à imagem da própria Trindade” (disponível em: < http://www.
augustinus.it/italiano/genesi_incompiuto/index2.htm> Acesso
em: 25 maio 2010).
NFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
Para você entender os termos memória, inteligência e vontade:
Quando Agostinho fala da memória, ele não pensa nas simples
recordações das coisas passadas, mas naquilo que dá identidade
à nossa vida, àquilo que se diria, em termos modernos, a pre-
sença do ser humano a si mesmo, a consciência. Sabemos como
a esclerose da memória destrói a consciência do ser humano, o
faz perder a sua personalidade. A memória fundamental pode ser
considerada a imagem de Deus Pai. Dela surgem os pensamentos
que são como palavras interiores com as quais falamos com nós
mesmos, de modo análogo como o Filho nasce do Pai. Então in-
tervém um outro ato da alma. O ser humano que gera seus pensa-
mentos os ama, não quer se separar deles. O ato de amar aquilo
que pensamos e a decisão de realizá-lo é a vontade, a terceira
faculdade fundamental da alma, que pode ser considerada como
imagem do Espírito Santo, Espírito do amor. A nossa vida interior
se desenvolve, portanto, na contínua comunicação entre a nossa
consciência de ser, de conhecer e de amar. Esse dinamismo, pen-
sa Agostinho, é um vestígio do Deus trino (SPIDIK, 2004, p. 36).
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
Santo Tomás de Aquino (1224/1225-1274) era membro da Ordem
dos Pregadores (dominicanos). Estudou sob a direção de Alberto
Magno em Paris e em Colônia. Autor prolífico, sua obra ultrapassa
oito milhões de palavras.
INFORMAÇÃO:
A caridade perfeita e verdadeira exige e explica a pluralidade de
pessoas em Deus: o Pai é o amor-fonte, que sai de si mesmo e
comunica tudo que tem e é para o Filho em gesto de geração; o
Pai é entrega total, infinita e eterna; o Filho, por sua vez, é amor
que recebe em gesto de agradecimento a plenitude do ser divino;
ele recebe tudo e em tudo corresponde ao Pai.
O que é afinal honrar o Pai senão proclamar que ele tem um Filho?
Porque uma coisa é quando te falam de Deus enquanto Deus, ou-
tra quando te falam de Deus como Pai. Quando te falam enquan-
to Deus, indicam o criador, o onipotente, o sumo espírito, eterno,
invisível, imutável; quando te falam dele como Pai, recomendam
a ti o Filho, porque Deus não se poderia chamar de Pai se não
tivesse um Filho, nem Filho, se não tivesse um Pai (Tract. 19,6
CCL 36,191). (disponível em: <http://www.augustinus.it/italiano/
commento_vsg/index2.htm>. Acesso em: 25 maio 2010).
INFORMAÇÃO:
Em sintonia com essa reflexão, há um princípio elaborado pelo
Concílio de Florença que vale a pena reter na memória: [Em Deus]
tudo é um, exceto quando se interpõe a oposição da relação (Om-
niaque unum sunt, ubi non obviat relationis oppositio, DS 1.330).
INFORMAÇÃO:
Em Deus, trindade de pessoas e unidade de essência não se con-
tradizem.
A trindade de pessoas não faz de Deus menos “Uno”, tampouco a
unidade divina o faz menos “Trino”. A unidade divina não é atenu-
ada pelas relações distintas e reais. Pelo contrário, elas próprias
exprimem a unidade.
Boécio (480-524)
Político e teólogo, Boécio é considerado o primeiro dos es-
colásticos. Ele escreveu um opúsculo intitulado Como a Trindade
é um só Deus e não três deuses. Como pode ver, o título explica,
explicitamente, seu intento.
Nesse opúsculo, Boécio vê na noção de relação o ponto de
partida para mostrar que unidade e trindade não se contradizem
em Deus: "A substância contém a unidade, a relação multiplica a
Trindade: por isso só é afirmado individual e separadamente aqui-
lo que diz respeito à relação" (SESBOÜÉ, 2002, p. 266).
Em outra obra, Boécio elabora uma definição de pessoa que
terá grande aceitação durante toda a Idade Média: "pessoa é uma
substância individual de natureza racional” (Persona est naturae
rationalis individua substantia) (Liber de persona et duabus natu-
ris, 3, citado por SESBOÜÉ, 2002, p. 266).
Como toda boa definição, cada termo usado tem um significa-
do preciso e uma razão para sua escolha. Vamos, então, analisá-los:
• Substância individual (individua substantia): significa o
substrato individualizado do ser ou o princípio de espe-
cificação.
216 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
As pessoas divinas (Pai, Filho e Espírito Santo) são pessoas divi-
nas enquanto se relacionam. A relação não só distingue as pesso-
as, mas também as une; a “oposição” entre elas deve ser entendi-
da como reciprocidade. Por isso, a unidade divina não é unicidade
solitária, mas unidade da comunhão, autêntica unidade de Pesso-
as que não somente estão em relação, mas que são a sua própria
relação subsistente. Diversamente do ser humano, as Pessoas di-
vinas não precisam ser primeiro, para depois entrarem em relação.
As Pessoas só são enquanto se relacionam e se doam.
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
As pessoas divinas não são menos e sim infinitamente mais dia-
lógicas do que as pessoas humanas. As pessoas divinas não só
estão em diálogo, mas, sobretudo, são diálogo. O Pai é pura auto-
expressão e alocução ao Filho, sua palavra; o Filho é todo ouvidos
ao Pai e, portanto, pura realização de seu envio; e o Espírito Santo
é pura recepção, puro dom. Essas relações pessoais são recípro-
cas, mas não são intercambiáveis. O Pai é o que fala; o Filho, o
que responde ou corresponde; o Pai é, mediante o Filho e com
Ele, o que dá, e o Espírito Santo é o que recebe. O Filho, em sua
resposta, não é o que fala, nem o Espírito Santo é o doador. Daqui
não se segue que não haja um tu recíproco. A resposta obediente
e a gratuidade é também um dizer “tu”, que leva a sério a peculia-
ridade da própria e da outra pessoa. Isso significa que em Deus e
entre as pessoas divinas há – não “apesar de”, mas por causa da
sua unidade infinitamente maior – uma inter-relacionalidade e in-
terpessoalidade infinitamente maiores que nas relações interpes-
soais dos homens [...].
A afirmação de que as pessoas são relações é uma afirmação so-
bre a trindade de Deus, mas dela se segue algo decisivo sobre o
homem como imagem e semelhança de Deus. O homem não é um
“ser em si” autárquico (substância) nem um “ser para si” autônomo
individual (sujeito), e sim um ser que vem de Deus e ruma para
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
Toda a economia divina é obra comum das três pessoas divinas.
Pois da mesma forma que a Trindade não tem senão uma única
e mesma natureza, assim também não tem senão uma única e
mesma operação. “O Pai, o Filho e o Espírito Santo não são três
princípios das criaturas, mas um só princípio” (Concílio de Floren-
ça, DS 1331). Contudo, cada pessoa divina opera a obra comum
segundo sua propriedade pessoal. Assim a Igreja confessa, na li-
nha do Novo Testamento: “Um Deus e Pai do qual são todas as
coisas, um Senhor Jesus Cristo para quem são todas as coisas,
um Espírito Santo em quem são todas as coisas” (II Concílio de
Constantinopla, DS 421). São, sobretudo, as missões divinas da
Encarnação do Filho e do dom do Espírito Santo que manifestam
as propriedades das pessoas divinas.
Obra ao mesmo tempo comum e pessoal, toda a economia divina
dá a conhecer tanto a propriedade das pessoas divinas como a
sua única natureza. Outrossim, toda a vida cristã é comunhão com
cada uma das pessoas divinas, sem de modo algum separá-las.
Quem rende glória ao Pai o faz pelo Filho no Espírito Santo; quem
segue a Cristo o faz porque o Pai o atrai e o Espírito o impulsiona
(Catecismo da Igreja Católica, 1997, n. 258-259).
Hilário de Poitiers:
O que está no Pai está no Filho, o que está no não gerado está no
Unigênito [...]. Não é que os dois sejam o mesmo, mas que um está
no outro, e não há em um e no outro uma coisa distinta. O Pai está
no Filho porque o Filho nasceu dele, o Filho está no Pai porque de
nenhum outro tem o ser Filho [...]. Assim estão um no outro, por-
que como tudo é perfeito no Pai não gerado também o é no Filho
unigênito [...]. Aquele em quem está Deus é Deus. Porque Deus não
habita em uma natureza distinta e alheia a ele mesmo (POITIERS,
2005, p. 79).
Concílio de Florença:
Por causa dessa unidade o Pai está todo inteiro no Filho, todo no Es-
pírito Santo; o Filho está todo no Pai, todo no Espírito Santo; o Espí-
rito Santo está todo inteiro no Pai, todo inteiro no Filho (DS 1.331).
O "estar em" de uma pessoa divina nas outras duas não deve
ser entendido como algo acrescentado a uma essência divina pré-
via. Pelo contrário, a inabitação recíproca constitui a própria uni-
dade divina. Não se deve, também, pensar o “estar em" em modo
estático, pois há verdadeira interação dinâmica entre as três pes-
soas: a pericorese une mantendo a distinção.
Na unidade pericorética trinitária e na unidade que se cons-
titui por meio de Jesus Cristo, a unidade e a autonomia não se
contrapõem. Quanto maior é a unidade, maior será a autonomia.
A verdadeira autonomia só pode se realizar mediante a unidade
do amor. Em Deus, a máxima unidade das pessoas coincide com
a máxima distinção delas, e não o inverso. Na unidade com Deus
fundada em Cristo, o homem não é anulado nem absorvido. Pelo
contrário, a unidade com Deus significa distinção permanente e
funda a verdadeira autonomia e liberdade do homem. A comu-
nhão pericorética da Trindade é o fundamento mais profundo e o
sentido último do mistério da pessoa humana e de sua perfeição
no amor (cf. KASPER, 1990, p. 323-324).
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR:
Deus é a Trindade de Pessoas entrelaçadas pelo amor e pela co-
munhão. As três são originárias desde toda a eternidade. Nenhuma
é anterior à outra. As relações são antes de participação recíproca
que de derivação hipostática; são de correlação e de comunhão
e menos de produção e processão. O que se produz e procede é
a revelação intratrinitária e interpessoal. Uma Pessoa é condição
da revelação da outra num dinamismo infinito como espelhos que
se espelham triplamente sem fim. O risco do triteísmo é evitado
pela comunhão e pela pericórese, quer dizer, pelas relações sem-
pre ternárias que originalmente vigoram entre as Pessoas. Ela é
simultânea e originária com as Pessoas. Elas são o que são por
sua essencial e intrínseca comunhão. Se assim é fica patente que
em Deus tudo é ternário, tudo é Patreque, Filioque e Spirituque. As
partículas de conjunção se aplicam absolutamente às três Pesso-
as. A partícula “e” se encontra sempre e em tudo [...]. Enfim, cada
Pessoa recebe tudo da outra e simultaneamente dá. Como são
Três Únicos, nunca, na verdade, há relações diádicas de oposição
(Pai e Filho ou Pai-Filho e Espírito Santo), mas relações ternárias
de comunicação e de comunhão. Existindo como Três eternamen-
te, também eternamente se entrelaçam e convergem na suprema
comunhão que se mostra como unidade do mesmo e único Deus
15. CONSIDERAÇÕES
Para falar da Trindade, a Teologia Trinitária recorre ao uso de
uma terminologia que a ajuda no debate interno e no diálogo com
a cultura atual sobre tal conceito.
16. EREFERÊNCIAS
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<http://www.augustinus.it/italiano/commento_vsg/index2.htm>. Acesso em: 20 ago.
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SPIDIK, T. Nós na trindade. Breve ensaio sobre a trindade. São Paulo: Paulinas, 2004.
4
1. OBJETIVOS
• Apresentar o estudo do mistério da Trindade como encon-
tro com os acontecimentos da revelação e da salvação.
• Refletir sobre a importância da fé trinitária para os cristãos e
seu valor na organização da esperança e na luta pela justiça.
• Identificar os pontos que podem e devem ser desenvolvi-
dos pela Teologia Trinitária.
2. CONTEÚDOS
• Trindade e transcendência humana.
• Trindade e a dualidade varão-mulher.
• Salvação e liberdade.
• Sofrimento de Deus.
• Comunhão divina e humana.
• Missões divinas e missão da Igreja.
234 © Teologia Trinitária
4. INTRODUÇÃO
Na unidade anterior, aprofundamos nosso estudo sobre o
mistério trinitário e sua relevância tanto para a Igreja quanto para
a sociedade contemporânea.
Nesta unidade, recolheremos, de maneira explícita, algumas
intuições sobre a Trindade, que surgiram ao longo do percurso fei-
to até agora.
Lançaremos um olhar retrospectivo, mas também prospecti-
vo, sobre as atitudes e os comportamentos concretos que o Misté-
rio Trinitário nos inspira a assumir na vida cristã e na da sociedade
humana.
As reflexões que faremos juntos servem mais para provocar
uma reflexão do que para dar respostas definitivas. Esta é, de fato,
a dinâmica da investigação teológica: quando pensamos ter chega-
do a uma conclusão, é aí que começa nosso trabalho.
Bons estudos!
A Palavra, pela qual tudo foi feito, fez-se, ela própria, mundo.
O Logos encarnado é, em consequência, a lógica do mundo. O Pai
pensa-nos e ama-nos, paternalmente, no Filho e no Espírito, e isto
funda a existência, a razão e a liberdade humanas: “Ele pensa em
mim, por isso sou” (cogitor ergo sum).
O Pai criou o homem para ser mais do que homem. O Pai é
para o Filho e este para o Pai; o homem é criado para Deus.
A transcendência do homem – sua sede de infinito, o desejo
de conhecer o bem e não o erro, o anelo de bem e de felicidade,
sua inquietude fundamental (o coração inquieto de Santo Agosti-
nho: cor inquietum) –, tem sua condição de possibilidade no fato
de sua criação ter-se dado para isto.
Constitutivamente criado para Deus, a transcendência do
homem para além de si mesmo só se compreende no contexto do
Pai, que, em sua doação de amor, se comunica, perfeitamente, ao
Filho e ao Espírito de tal forma que eles sejam Deus como é o Pai.
O Pai cria, imprimindo no homem a marca do Unigênito que
tudo recebe, e devolve ao Pai (ele é total receptividade e entre-
ga); cria insuflando seu Espírito, que é a societas do Pai e do Filho
(amor dos dois e procedente dos dois).
A fecundidade paterna de Deus, que se manifesta e age na
criação e na história salvadora, exprime, em maneira participativa,
vocacional, livre e gratuita, a inefável paternidade eterna.
Alargando essa perspectiva trinitária para todo o cosmo, Leo-
nardo BOFF (1986, p. 283) parte do Pai como princípio da criação:
A ação própria do Pai é a criação. Ao se revelar ao Filho no Espí-
rito, o Pai projeta todos os criáveis, expressão de si, do Filho e do
Espírito Santo. Uma vez criados, todos os seres expressam o misté-
rio do Pai, possuem um caráter filial (porque eles provêm do Pai),
fraternal-sororal (porque são criados no Filho) e "espiritual" (quer
dizer cheios de sentido, de dinamismo, porque foram criados na
força do Espírito Santo).
236 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
O conhecimento do mistério do Pai atinge sua profundidade salví-
fica na inserção do homem, por participação, nas relações eternas
com o Filho e o Espírito.
8. SOFRIMENTO DE DEUS
A imutabilidade e impassibilidade divinas não significam, ab-
solutamente, indiferença ao que acontece com os homens. Deus
Trino, na cruz de Cristo, é modelo de toda compaixão.
A paternidade mostra-se em toda sua claridade na miseri-
córdia, manifesta-se em sua plenitude na paixão e na morte de seu
amado Filho. Assim, a presença nova e definitiva de Deus com e
nos homens é, também, presença de despojamento (kénosis).
O sofrimento do Filho é sofrimento do Verbo que se fez car-
ne. Tendo assumido uma carne passível, os sofrimentos humanos
são transfigurados no sofrimento do Filho.
242 © Teologia Trinitária
INFORMAÇÃO:
Monarquia paterna significa que o Pai é a única origem e fonte do
Filho e do Espírito Santo. Alguns teólogos atuais, entre eles L. Boff,
acham que essa concepção não faz justiça a plena igualdade das
pessoas divinas: o Pai detém tudo, o Filho e o Espírito só recebem
do Pai. Isto leva, também, a ameaçar a comunhão das pessoas,
uma vez que a comunhão só pode se dar entre iguais. Mas bem
entendida, a monarquia paterna não ameaça nem a igualdade das
pessoas divinas tampouco a comunhão entre elas. Já que o Pai dá
tudo, o Filho recebe tudo e o Espírito é espirado pelos dois, não
há por que contrapor igualdade e comunhão das pessoas divinas
à monarquia paterna.
Com efeito, Bento XVI confirma que a unidade com Deus não viola
nem destrói nada:
Na verdade, existe uma unificação do homem com Deus – sonho
originário do homem –, mas esta unificação não é confundir-se, um
afundar no oceano anônimo do Divino; é unidade que cria amor, na
qual ambos – Deus e o homem – permanecem eles mesmos, mas
tornando-se plenamente uma só coisa (BENTO XVI, Carta Encíclica
"Deus é amor", 2005, p. 10.)
13. EREFERÊNCIAS
AGOSTINHO. In Iohannis evangelium tractatus: Disponível em: <http://www.augustinus.
it/italiano/commento_vsg/index2.htm>. Acesso em: 20 ago. 2008.
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Ed. CNBB – Paulina – Paulus, 2007.
MOLTMANN, Trindade e Reino de Deus, Petrópolis: Vozes, 2000.
QUEIRUGA, A. T. Creio em Deus Pai. O Deus de Jesus como afirmação plena do humano.
São Paulo: Paulinas, 1993.