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MPRA Paper 14248

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Introduction to the consumer theory

Vieira, Pedro Cosme da Costa

Faculdade de Economia do Porto

24 March 2009

Online at https://mpra.ub.uni-muenchen.de/14248/
MPRA Paper No. 14248, posted 25 Mar 2009 07:53 UTC
Introdução à Teoria do Consumidor
Pedro Cosme da Costa Vieira
Faculdade de Economia do Porto

R. Dr. Roberto Frias, 4200-464 Porto, Portugal

pcosme@fep.up.pt

Resumo: Neste texto de apoio a uma disciplina de licenciatura, apresento a explicação


microeconomica do comportamento individual em função dos preços relativos. No capítulo 1,
apresento o mercado desagregado em três Leis da Natureza: i) que a decisão dos vendedores
se agrega na função de oferta; ii) que a decisão dos compradores se agrega na função de
procura; iii) que o mercado equilibra as pretensões dos compradores com as dos vendedores.
Este capítulo serve de motivação para o capítulo 2 onde se justifica a existência da função de
procura com a Teoria do Consumidor que assume o princípio que os consumidores
maximizam uma função de utilidade sob restrição do rendimento disponível e dos preços de
mercado.

Palavras Chave: Curva de indiferença, Restrição orçamental, maximização da utilidade

Classificação JEL: A22, D11

2009

1
Preâmbulo
Como, felizmente, vivemos numa sociedade que permite ao indivíduo liberdade de acção (sob
restrições), os modelos económicos construídos apenas com informação passada, i.e. os
modelos empíricos, não são suficientes para prever o sentido de evolução das variáveis
económicas em resposta a choques exógenos dissemelhante dos que aconteceram no passado.
Para ser possível desenvolver essa capacidade de previsão, é necessário expressar o
conhecimento económico em modelos teóricos que sejam suficientemente genéricos e
distantes da realidade empírica a ponto de abarcarem as situações novas, i.e., teremos que
construir modelos baseados em axiomas genéricos (Lucas, 1976)*. Como a realidade
económica resulta da agregação das decisões individuais, então os modelos genéricos mesmo
que macroeconómicos (e.g., Barro, 1984)** terão que ter por base teorias quanto à tomada de
decisão individual.

Infelizmente, por serem construções do intelecto que não resultam directamente por indução
da realidade observada, os modelos microeconómicos terão como limitação serem hipóteses
de explicativas que, por mais fundamentadas que estejam, estão longe do detalhe (i.e.,
variabilidade) que se observa nas decisões individuais.

Neste texto, será apresentada uma teoria do comportamento individual no qual o sistema de
preços relativos guiam as decisões dos agentes económicos. Tentaremos também explicar
como essas decisões individuais não conversadas se conjugam na explicação do que se
observa no mercado. Em termos de organização, no capítulo 1, apresentamos um modelo do
mercado que explica imediatamente a evidência empírica quanto à evolução dos preços e das
quantidades transaccionadas. Assim, desagregamos o mercado em três Leis da Natureza: i)
que a decisão dos vendedores quanto à quantidade que pretendem alienar se agrega na função

*
Lucas, Robert (1976). "Econometric Policy Evaluation: A Critique." Carnegie-Rochester Conference Series on
Public Policy 1: 19–46.
**
Barro, Robert J. (1984), Macroeconomics, John Wiley & Sons Inc

2
de oferta; ii) que a decisão dos compradores quanto à quantidade que pretendem adquirir se
agrega na função de procura; iii) que o preço de mercado equilibra as pretensões dos
compradores com as dos vendedores. Este capítulo serve de motivação para o capítulo 2 onde
é apresentada a Teoria do Consumidor em que é assumindo o princípio não observável de que
os agentes económicos são optimizadores (i.e., o Homo Economicus) sujeitos a restrições.
Assim, consideramos que os consumidores (que se denominam na Macroeconomia por
Famílias) maximizam o seu bem-estar individual (i.e., uma função de utilidade) sob restrição
do rendimento disponível e dos preços de mercado dos bens ou serviços.

Ressalva-se que este texto, não versando sobre a História do Pensamento Económico, não dá
perfeitos créditos aos autores originais dos conceitos que aqui são apresentados.

Em termos lectivos, este texto apoia entre 10 aulas (num curso semestral de introdução à
economia) até 20 aulas (num curso anual de Microeconomia).

No sentido de simplificar a apreensão dos conceitos económicos, tentei que o texto fosse o
mais simples possível de ler, apoiando a exposição em gráficos simples e num formalismo
matemático rudimentar (apenas se utilizando funções isoelásticas).

Escrevi o texto em Português por os textos em Inglês estarem, relativamente à população


falante, sobre - representados na Internet.

3
Índice

I – Modelo Empírico do Mercado 6

1.1. Conceitos introdutórios


Limitações da teoria
Economia positiva ou Economia normativa (do bem-estar)
Factos estilizados
1.2. Quantidade transaccionada e preço de mercado
Variáveis endógenas e exógenas ao modelo
1.3. Curvas de oferta, de procura e equilíbrio de mercado
1.4. Alterações nas curvas de oferta e de procura
Deslocamento da curva de oferta
Deslocamento da curva de procura
Curvas agregadas e curvas individuais
Variações relativas, Elasticidade arco e ponto
Procura elástica
1.5. Aplicações
Preço máximo / mínimo
Imposto /subsídio
Repartição do imposto/subsídio entre vendedores e compradores
O preço do dinheiro e sua evolução.

4
II – Teoria do Consumidor 39

2.0. Introdução
2.1. Preferências e gostos dos consumidores
2.1.1 Curva de indiferença
Comparabilidade entre os cabazes de bens e serviços:
Transitividade da Comparação; Insaciabilidade
Taxa marginal de substituição
Evolução da taxa marginal de substituição com a quantidade
2.1.2. Função de utilidade
Função ordinal / cardinal
2.2. Restrição orçamental
Recta orçamental
Bens privados e públicos.
Efeito na RO da alteração do rendimento.
Efeito na RO da alteração dos preços.
2.3. Decisão do consumidor – Escolha do melhor cabaz possível.
Generalização a cabazes em IRn.
Formalização matemática do problema de optimização.
Efeito de uma alteração do preço.
Bens substitutos, complementares e independentes.
Efeito de uma alteração do rendimento.
Bens inferiores e bens normais (de primeira necessidade e de luxo).
Efeito substituição e efeito rendimento.
Determinação da curva de procura individual.
Função de utilidade indirecta.
Excedente do consumidor.
2.4. Aplicações
Combate à exclusão: Subsídio em dinheiro ou em espécie. Desconto no preço.
Função de oferta de trabalho.
Taxa de juro, consumo e poupança.
Risco. Lotaria. Aversão / neutralidade / atracção pelo risco.
Capital humano e crescimento endógeno.
Contabilidade do bem-estar

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I – Modelo Empírico do Mercado
Sumário: Neste capítulo é apresentado um modelo do mercado que resulta muito
directamente do que se observa diariamente nos mercados (quanto à evolução dos preços e
das quantidades transaccionadas quando ocorrem em variáveis exógenas). O modelo empírico
contempla três Leis da Natureza: i) os compradores agregam-se na Curva de Procura, ii) os
vendedores agregam-se na Curva de Oferta, e iii) a transacção de mercado acontece no ponto
de intersecção destas duas curvas (ponto de Equilíbrio Walrassiano). Considerando o preço e
a quantidade como as variáveis endógenas do modelo empírico de mercado, apresento o efeito
no mercado das alterações na procura e na oferta (i.e., deslocamentos das curvas) e nas
políticas do governo (controlo de preços e impostos/subsídios). Neste capítulo não pretendo
racionalizar as Leis da Natureza apresentadas (i.e., qual a justificação teórica profunda para a
existência das curvas de oferta, de procura e do equilíbrio de mercado).

Objectivos pedagógicos: Primeiro, pretendo que o aluno compreenda sucintamente como os


mercados, através do mecanismo dos preços relativos e das quantidades transaccionadas,
permitem que se as decisões dos agentes económicos se ajustem quando ocorrem alterações
no ambiente económico (e.g., alterações da tecnologia, dos gostos ou das políticas do
Governo). Segundo, pretendo que o modelo empírico seja uma motivação e o critério de
avaliação para a Teoria do Consumidor apresentada no capítulo 2 (que é baseada em
pressupostos não validáveis directamente a partir da evidência empírica).

1.1. Conceitos introdutórios

Objecto. A Microeconomia trata das decisões dos agentes económicos de pequena dimensão
(etimologicamente, micro que dizer pequeno). O estudo microeconómico pode ser feito à
escala do indivíduo ou a um nível mais agregado como, por exemplo, à escala da família, da

6
empresa ou da indústria. Os bens ou serviços poderão ser perfeitamente homogéneos (e.g.,
Maça Golden calibre 40/45) ou ter um certo grau de agregação (e heterogeneidade), por
exemplo, ao nível de Maçãs, Fruta ou Produtos Vegetais Frescos.

À escala micro, sendo fixa a quantidade de recursos (bens e serviços), a decisão dos
indivíduos quanto à sua afectação tem como principal variável o preço relativo dos diversos
bens ou serviços. Neste sentido, a Microeconomia também a pode ser entendida como a
“teoria dos preços relativos”.

Por oposição, a Macroeconomia trata das grandezas agregadas ao nível do país (por exemplo,
o Produto que traduz o total de bens e serviços produzido no país) não havendo atenção no
estudo do efeito da alteração dos preços relativos dos diversos bens ou serviços. Chama-se à
atenção que, por dessemelhança com a Microeconomia, na Macroeconomia é a taxa de juro
que equilibra o mercado de bens e serviços (ver o ponto 2.4.3.).

Limitações da micro-teoria. É sabido que dois indivíduos aparentemente iguais não tomam
necessariamente a mesma decisão. Em termos epistemológicos não podemos distinguir se é o
modelo que erra (por falta de informação) ou se é o comportamento individual que tem uma
parcela de “erro” (por exemplo, 30% do comportamento é racionalizado e os restantes 70% é
aleatório). Em termos de falta de informação, podemos conjecturar que, apesar de parecerem
idênticos, os indivíduos têm diferenças que não conseguimos vislumbrar. Apenas se as
diferenças fossem controladas é que seria possível a previsão sem erro. Em termos de
racionalidade humana limitada, podemos conjecturar que a capacidade de cálculo do cérebro
humano não permite resolver problemas com muito elevada complexidade pelo que o
comportamento é aproximado ao que deveria ser, podendo mesmo acontecer que o
pensamento humano tenha uma componente aleatória: sendo o cérebro formado por células, é
necessária a divisão dos problemas em pequenas partes que serão processadas parcelarmente
podendo haver faltas ou repetições de parcelas, (semelhante ao Método de Monte Carlo).

Motivado pelo erro de previsão dos modelos, os resultados microeconomicos devem ser
interpretado como uma fundamentação para as tendências (e.g., de aumento, diminuição ou
manutenção) e não devem ser olhados no pormenor da magnitude estimada pelo modelo.

Apesar da Microeconomia ser uma simplificação grosseira da realidade, o seu estudo é


fundamental porque permite compreender a economia em novas situações, por exemplo,
quando forem aplicadas políticas nunca antes experimentadas. Além disso, por estar a um

7
escala próxima da empresa (ao nível dos preços e das quantidades) permite que os gestores
compreendam a evolução dos mercados em resposta à alteração das suas acções e
racionalizem como os outros agentes económicos vão responder.

Economia positiva ou Economia normativa (do bem-estar)

Positivismo: Para que haja progresso do conhecimento terá que ser continuamente
acrescentado conhecimento novo.

Para que possa haver um continuo acrescentar de conhecimento, o conhecimento antigo tem
que poder ser retomado, criticado e aumentado por qualquer outro homem sem necessidade de
o refazer. Para que isso seja possível, terá que ser utilizado um método objectivo de criação de
conhecimento: o método científico. Por objectivo quer-se dizer que é universal e, tanto quanto
possível, não pessoal.

Considera-se que o método científico é positivo no sentido de que i) o investigador não emite
opinião moral sobre o fenómeno (i.e., se a Natureza está bem ou mal); ii) o conhecimento é
um modelo (matemático) da realidade (e não a realidade); iii) resultam dos modelos predições
que podem ser testadas empiricamente e; iv) apenas as hipóteses explicativas que estão
positivamente em acordo com a realidade é que podem ser aceites como válidas (não basta
não poder provar que são falsas). Por exemplo, eu não saber o que são os OVNIs
(exactamente Objectos Voadores Não Identificados) e não poder afirmar que não são
construídos por extraterrestre, não me permite concluir de que existem extraterrestres.

O conhecimento científico serão hipóteses sobre a realidade que vão sendo progressivamente
reforçadas e aceites por uma percentagem cada vez maior de pessoas, ou enfraquecidas e
aceites por uma percentagem cada vez menor de pessoas. Por exemplo, a teoria de evolução
das espécies de Darwin (1859)* é uma hipótese para explicar a existência, extinção e
aparecimento das espécies vivas que se tem tornado cada vez mais forte (i.e., mais apoiada na
evidência empírica) e aceite por maior percentagem de pessoas, apesar de haver muitas
pessoas que não a aceitam.

Conhecimento normativo: Além de haver muito conhecimento que não pode ser objectivo
(e.g., o conhecimento estético, religioso ou filosófico), o fim último do conhecimento é a

*
Darwin, Charles (1859), On the Origin of Species, Londres

8
tomada de decisão (i.e., a acção). Mas a tomada de decisão obriga a classificar as situações
como boas ou más e o sentido da alteração que melhora as situações. Por exemplo, eu dizer
que a pobreza tem que ser combatida pressupõe que é uma coisa má. Então, estou a adoptar
uma perspectiva normativa: o que fazer para transformar a realidade no sentido que eu penso
ser bom.

Ex1.1: Que analises têm subjacente uma perspectiva positiva ou normativa?

A) Se a EU liberalizar a politica de vistos para os indivíduos de elevada escolaridade, os


países africanos ficam sem médicos; B) Quando a temperatura desce, o preço das verduras
aumenta; C) Os subsídios agrícolas da EU são prejudiciais às economias dos países africanos;
D) O investimento das autarquias deve ser canalizado para os espaços públicos (e.g., jardins,
vias de comunicação e estacionamento público) em desfavor dos espaços privados (e.g.,
habitação e estacionamento privado).

R: A) e B) Perspectiva positiva; C) e D) Perspectiva normativa.

Factos estilizados. A Natureza é demasiado complexa para as nossas capacidades de


observação e raciocínio pelo que se torna necessário que decomponhamos (i.e., analisemos) a
realidade em algumas variáveis assumidas como independentes e que nos concentremos
apenas nas tendências gerais dessas variáveis de estudo. Por exemplo, o salário de uma pessoa
depende de muitos factores e condicionantes (e.g., se é homem ou mulher, a sua experiência
profissional, a escolaridade, o competência natural, a idade, a altura, o peso ou se se relaciona
bem com os colegas). No entanto, se nos concentrarmos nas “mais importantes”, comparando
milhares de indivíduos, podemos ver que, em média, existe uma tendência positiva entre o
nível de escolaridade e o salário. Denominam-se factos estilizados exactamente às “grandes
tendência” das variáveis e dos seus relacionamentos.

1.2. Quantidade transaccionada e preço de mercado.

Por haver diversidade de clima, de recursos naturais ou especialização na produção, os


indivíduos têm uns bens e serviços em grande quantidade e outros em pequena quantidade. É
obvio ser muito mais dispendioso produzir bananas, ananás e café em Portugal do que
produzi-los no Brasil ou em Angola.

9
Os indivíduos, por apreciarem o consumo diversificado de bens e serviços, podem melhorar
globalmente o seu bem-estar se trocarem os bens que têm em grande quantidade pelos que
têm em pequena quantidade. Por exemplo, as pessoas que vivem à beira-mar têm muito peixe
e pouco cereal enquanto que as que vivem mais no interior têm muito cereal e pouco peixe.
Então, todas as pessoas melhoram se houver a possibilidade de trocar peixe por cereal.

Sendo que a troca implica a troca de determinadas quantidades de bens ou serviços, vamos
procurar construir um modelo que explique a decisão de troca em termos de quantidade
transaccionada e do preço. Havendo outras variáveis importantes (e.g., as facilidades de
pagamento), vou assumir o preço da transacção como o factor mais importante na
determinação da quantidade trocada.

O preço traduz a razão de troca entre cada par de bens, e.g., eu poder trocar três quilogramas
de cereal por cada quilograma de peixe. Como vivemos numa sociedade com moeda (que
funciona como unidade de valor), cada bem terá o seu preço monetário. Então, posso
imaginar, em vez da troca directa entre bens ou serviços, a transacção de cada bem ou serviço
contra uma quantidade de moeda (i.e., o seu preço).

Vou considerar um modelo do mercado de um bem ou serviço em que existe, por um lado, o
preço nominal e a quantidade transaccionada (que serão variáveis endógenas do modelo) e,
por outro lado, múltiplos parâmetros (que serão variáveis exógenas ao modelo).

A quantidade transaccionada num mercado é, geralmente, um fluxo, e.g., 100kg de maçãs por
hora (mercado contínuo no tempo). Existem também mercados que funcionam apenas
pontualmente no tempo (mercado por chamada). Assim sendo, tanto podemos representar a
quantidade transaccionada como “unidades de quantidade/unidades de tempo” como apenas
por “unidades de quantidade”. No caso do preço unitário, mesmo que as quantidades sejam
em “unidades/hora”, será sempre em unidades monetárias por unidade de quantidade do bem
ou serviço, por exemplo, “€/kg”.

Se não houvesse alteração das variáveis exógenas, o mercado ficaria sempre no mesmo ponto,
i.e., o preço de mercado e a quantidade transaccionada seriam invariantes no tempo. Por
exemplo, o preço das maçãs seria sempre de 1.00€/kg e vender-se-iam sempre 10000kg/hora
de maçãs. No entanto, as múltiplas variáveis exógenas ao mercado estão continuamente a
alterar de valor pelo que o mercado (i.e., o preço e a quantidade transaccionada) evolui ao
longo do tempo. Em termos empíricos, apresento na Fig. 1 a evolução diária de um mercado
de maçãs onde várias vendedoras competem pelos compradores que aparecem (dados

10
simulados com cada ponto a representar, e.g., um quarto de hora). Desta figura não é possível
descobrir qualquer regularidade que possa ser aproveitada na explicação da evolução das
variáveis endógenas (da quantidade transaccionada e do preço) quando ocorrem alterações
exógenas (e.g., da temperatura).

preço
2,00 €

1,50 €

1,00 €

0,50 €

0,00 €
0 5 10 Quantidade15
(t)

Fig.1.1 – Quantidade transaccionada e preço de mercado (de maçãs).

No sentido de descobrir as Leis da Natureza (i.e., regularidades empíricas aproveitáveis) que


caracterizam o mercado, teremos que analisar os efeitos dos acontecimentos de forma isolada,
i.e., fazer uma análise (de equilíbrio) parcial do mercado. A análise parcial consiste no estudo
do mercado de um bem ou serviço específico assumindo-o independente dos mercados onde
se transaccionam os outros bens ou serviços. Esta análise é levada a cabo pela inclusão dos
preços dos outros bens ou serviços como variáveis exógenas ao mercado em análise. Em
economia a analise parcial é explicitada pela expressão latina ceteris paribus (ceteris: as
outras coisas; paribus: iguais).

Alteração no padrão da procura. Já referi que, se “tudo se mantivesse constante”, os preços


e as quantidades transaccionadas ficavam invariantes no tempo. No entanto, estão sempre a
ocorrer alterações em variáveis (e.g., do estado do tempo ou da tecnologia) que influenciam o
preço de mercado e a quantidade transaccionada. A título ilustrativo consideremos exemplo
hipotético do milho que, nos últimos anos, além do habitual consumo na alimentação animal e
humana começou a ser usado na produção de bio combustíveis. Apresento na Fig.1.2 a

11
evolução do preço médio e das quantidades transaccionadas a cada ano (dados simulados para
servirem de ilustração). Neste exemplo, contrariamente ao da Fig.1.1, transparece uma
regularidade na evolução (as variáveis preço e quantidade estão positivamente
correlacionadas) que se acentua se representarmos num gráfico o preço de transacção com as
quantidades transaccionadas (ver, Fig.1.3): nos pontos em que o preço de mercado (em
€/tonelada) é maior, a quantidade transaccionada (em toneladas) também é maior.

400 € 130
Mt
Preço
350 € 125

300 € 120

250 € 115
Quantidade
200 € 110

150 € 105

100 € 100
1990 1995 2000 2005 Ano

Fig.1.2 – Quantidade transaccionada e preço de mercado.

preço
400 €

350 €

300 €

250 €

200 €

150 €

100 €
100 105 110 115 Quantidade 120
(Mt)

Fig.1.3 – Quantidade transaccionada e preço de mercado (milho).

Vejamos outro exemplo que permite visualizar o mesmo tipo de relação entre preço e
quantidade transaccionada. Relativamente às verduras cruas, os consumidores apreciam-nas

12
mais no Verão que no Inverno (e supondo que não há diferenças na produção). Desta forma, o
mercado tem dois períodos distintos, o Verão e o Inverno, induzidos por alterações do padrão
de consumo. Na fig.1.4 apresento a evolução do mercado (quantidades e preços) dos últimos
15 anos (dados simulados com cada ponto a representa um semestre).

Preço
1,7

1,6
Verão
1,5

1,4

1,3
Inverno
1,2

1,1
100 110 120 130 140 150 Quantidade
160 170

Fig.1.4 – Quantidade transaccionada e preço de mercado (verdura).

Nas Fig.1.3 e Fig.1.4 observa-se que, em termos estilizados, existe uma associação entre a
quantidade transaccionada e o preço: a um preço mais elevado está associada uma
quantidade transaccionada maior. Vamos denominar esta correlação positiva por Curva A.

Alterações no padrão da oferta. Mas existem outros exemplos que parecem contrariar a Lei
da Natureza que denominei por Curva A. Por exemplo, a produção de leite está muito
condicionada pelas condições meteorológicas: Quando o Inverno é seco, a produção
enfraquece e vice-versa. No entanto, o consumo não se altera significativamente (com a
pluviosidade durante o Inverno). Apresento na Fig.1.5 a evolução do mercado quanto as
quantidades transaccionadas e preços do leite ao longo dos últimos 16 anos (dados
simulados).

13
Preço
400 (€/t)

390
Seco
380

370
Húmido
360

350
100 105 110 115 Quantidade (Mt)
120 125

Fig.1.5 – Quantidade transaccionada e preço de mercado (leite).

Tal como nas Fig.1.3 e Fig.1.4, na Fig.1.5 também se observa, em termos estilizados, uma
associação entre a quantidade transaccionada e o preço mas de sentido contrário: um preço
mais elevado está associado com uma quantidade transaccionada menor. Vamos
denominar esta correlação negativa por Curva B.

O que podemos observar nas fig.1.3, fig.1.4 e fig.1.5? Aparentemente, não conseguimos
relacionar as quantidades transaccionadas com os preços, havendo duas possibilidades, a
relação ser positiva (a curva A) ou negativa (a curva B). (Há ainda a possibilidade de não se
observar qualquer regularidade, Fig.1.1)

1.3. Curvas de oferta, de procura e equilíbrio de mercado*

Curva da Oferta: Na curva A, (fig.1.3 e fig.1.4), o que observamos no mercado é o efeito


isolado de uma alteração no padrão da procura (mantivemos as condições de oferta). Assim,
resulta do reforço da procura (por exemplo, induzido pelo aumento do rendimento do
compradores) um aumento da quantidade transaccionada e do preço de mercado (e vice-versa
quando há um enfraquecimento da procura). Apesar de parecer estranho, quando há uma
alteração no padrão da procura e mantendo o resto constante (ceteris paribus), o que é

*
A sistematização do mercado nestas três Leis da Natureza data-se na primeira metade do Sec. XIX e é uma
síntese dos trabalhos de Walras (1834-1910), Cournot (1801-77) e Marshall (1842-1924).

14
revelado pelo mercado é o comportamento dos vendedores: ficamos a saber que os
vendedores estarão disponíveis para vender uma maior quantidade se o preço for maior (maior
quantidade disponível implica maior preço).

Curva da Procura: Na Curva B, (fig.1.5), o que observamos no mercado é o efeito isolado


de uma alteração nas condições da oferta (mantivemos o padrão de procura). Resultou que um
reforço da oferta (por exemplo, pela ocorrência de uma inovação tecnológica) induz um
aumento da quantidade transaccionada e uma diminuição do preço de mercado (e vice-versa
quando há um enfraquecimento da oferta). Assim, quando há uma alteração no padrão da
oferta e se mantém o resto constante (ceteris paribus), o que é revelado pelo mercado é o
comportamento dos compradores: ficamos a saber que os compradores estarão disponíveis
para adquirir uma maior quantidade se o preço de mercado diminuir (maior quantidade
implica menor preço).

Equilíbrio Walrassiano de Mercado: Sendo que no mercado se encontram as intenções dos


compradores e dos vendedores, então, a quantidade transaccionada e o preço de mercado
resultam do equilíbrio entre as vontades destes agentes económicos: o mercado vai
transaccionar no ponto onde a vontade dos compradores (i.e., a curva de procura) iguala (i.e.,
está em equilíbrio) a vontade dos vendedores (i.e., a curva da oferta). Representamos na
fig.1.6 as curvas da procura e da oferta e o equilíbrio de mercado.

130
Preço
C. Procura

120

Equilíbrio C. Oferta
110

100

90
100 105 110 115 120 125 Quantidade
130

Fig.1.6 – Curvas da procura e da oferta e equilíbrio de mercado.

15
Non-tâtonnement de Walras: No mercado apenas existem as transacções do ponto de
equilíbrio (tâtonnement: tentativa e erro): Enquanto o mercado está fechado, os agentes
calculam o ponto de equilíbrio e, quando o mercado abre, realizam-se as transacções. Não nos
vamos preocupar agora sobre uma teoria profunda para o equilíbrio de mercado. Aqui é
apenas uma Lei da Natureza a utilizar sem por em causa. Recordo que o conceito de equilíbrio
de Nash* (em que nenhum agente económico tem incentivos para alterar a sua acção) apenas
surge em 1951.

Nota: A quantidade transaccionada no mercado não é “a curva da procura” nem a “curva da


oferta” mas apenas um ponto destas duas curvas que coincide nas duas (a intersecção). Assim,
falamos de “quantidade procurada” e “quantidade oferecida” como as quantidades que de
facto são concretizadas no mercado.

Ex1.2: Supondo que a curva de oferta de mercado é dada por S(p) = 50 + 0.25p e a curva de
procura de mercado é dada por D(p) = 100 – 0.75 p, qual será a quantidade transaccionada no
mercado e a que preço?

R: O equilíbrio será nas quantidades: S = D ⇔ 50 + 0.25p = 100 – 0.75p ⇔ p = 50 e


Q = 62.5. Se as curvas forem dadas explicitadas em ordem aos preços, pS = 4Q – 200 e
pD = –1.33Q + 133, o equilíbrio também é nos preços: pS = pD ⇒ 4Q – 200 = –1.33Q + 133.

1.4. Alterações nas curvas de oferta e de procura.

Quando falei em “alteração do padrão” da procura ou da oferta estava-me a referir a


deslocamentos das curvas (também denominadas por funções) no espaço preço/quantidade.

Deslocamento da curva de oferta. Quando acontecem alterações nos valores das variáveis
exógenas (qualquer variável menos o preço do bem ou serviço em estudo) que influenciam a
quantidade que os vendedores oferecem para cada preço, dizemos que acontece um
deslocamento da curva de oferta como um todo. Existe um enfraquecimento da oferta
quando, para cada preço, diminui a quantidade que os vendedores disponibilizam para venda

*
Nash, John (1951), “Non-Cooperative Games”, The Annals of Mathematics, 54(2), pp. 286-295.

16
(para cada preço). Por exemplo, quando o vento forte destrói as estufas da nossa região, a
curva de oferta de legumes desloca-se no sentido do enfraquecimento. Em termos gráficos,
traduz-se um enfraquecimento da oferta pelo deslocar para a esquerda e para cima da
curva de oferta (ver fig. 1.7).

Preço
130
C. Procura

120
o P. Equilíbrio muda

110

100
C. Oferta

90
100 105 110 115 120 125 Quantidade
130

Fig.1.7 – Efeito no ponto de equilíbrio de mercado de um enfraquecimento da oferta.

Existe um fortalecimento da oferta quando, para cada preço, aumenta a quantidade que os
vendedores estão disponíveis para vender. Por exemplo, o acordo que permitiu ao chineses
vender camisas na União Europeia fez com que a curva de oferta de camisas se deslocasse no
sentido do fortalecimento. Em termos gráficos, um fortalecimento da oferta implica que a
curva de oferta se desloca para a direita e para baixo (ver fig.1.8).

A expressão latina ceteris paribus , como já referi, traduz a condição de que tudo o resto
(neste caso, a curva da procura) se mantém inalterado. É a condição imposta para se poder
levar a cabo a análise parcial (e o equilíbrio parcial) que estamos a apresentar. Na análise
parcial apenas temos em atenção metade de um mercado enquanto que no equilíbrio parcial
apenas temos em atenção o equilíbrio do mercado de um bem ou serviço (e assumimos tudo o
resto exógeno e constante). Em termos matemáticos consiste numa “análise de derivadas
parciais”.

17
Preço
130
C. Procura

120

110

o P. Equilíbrio muda
100
C. Oferta

90
100 105 110 115 120 125 Quantidade
130

Fig.1.8 – Efeito no ponto de equilíbrio de mercado de um reforço da procura.

Podemos confirmar visualmente nas Fig.1.7 e Fig.1.8 que quando há alterações na curva de
oferta, ceteris paribus, o equilíbrio de mercado torna visíveis pontos ao longo da curva de
procura. Associado a deslocações da curva de oferta está o aumento das quantidades
transaccionadas e a diminuição do preço de mercado (e vice-versa): do enfraquecimento
resulta um aumento do preço e diminuição da quantidade transaccionada e do fortalecimento
resulta uma diminuição do preço e um aumento da quantidade transaccionada.

Ex1.3: Referente a cada ano, a curva de oferta de leite (Mt) é positivamente influenciada pela
pluviosidade (mm), S(p) = 50 + 0.50p + 0.10h, enquanto que a curva de procura não, D(p) =
150 – 0.75 p. De que forma o preço (€/l) e a quantidade transaccionada no mercado se alteram
se num ano a pluviosidade for maior em 1mm?

R: O equilíbrio de mercado será onde S = D ⇔ 50 + 0.50p + 0.01h = 150 – 0.75p ⇔ 1.25p =


100 – 0.01h ⇔ p = 80 – 0.008h e Q = 90 + 0.006h. Um aumento da pluviosidade de 1mm,
ceteris paribus, induz um aumento da quantidade transaccionada de 0.006Mt = [90 +
0.006(h+1) – (90 + 0.006h)] e uma diminuição do preço de 0.008€/l = [80 – 0.008(h+1) – (80
– 0.008h)].

Deslocamento da curva de procura. Quando acontecem alterações nos valores das variáveis
exógenas que influenciam a procura, dizemos que se observa um deslocamento na curva de

18
procura como um todo. Existe um enfraquecimento da procura quando, para cada preço,
diminui a quantidade que os compradores se disponibilizam a comprar. Por exemplo, no
Inverno existe um enfraquecimento da procura de gelados. Em termos gráficos, o
enfraquecimento faz com que a curva de procura se desloque para a esquerda e para baixo
(ver fig.1.9).

Preço
130
C. Procura

120

C. Oferta
110
o P. Equilíbrio muda

100

90
100 105 110 115 120 125 Quantidade
130

Fig.1.9 – Efeito no ponto de equilíbrio de mercado de um enfraquecimento da procura.

Existe um fortalecimento da procura quando, para cada preço, aumenta a quantidade que os
compradores se disponibilizam a adquirir. Por exemplo, quando chove, existe um
fortalecimento da procura de guarda-chuvas. Em termos gráficos, a curva de procura desloca-
se para a direita e para cima (ver Fig.1.10).

Podemos visualizar nas Fig.1.9 e Fig.1.10 que quando há alterações na curva de procura,
ceteris paribus, o equilíbrio de mercado torna visíveis pontos ao longo da curva de oferta.
Associado a alterações na curva de procura está o aumento (ou diminuição) das quantidades
transaccionadas e do preço de mercado: do enfraquecimento resulta uma diminuição do preço
e da quantidade transaccionada e no fortalecimento resulta um aumento do preço e da
quantidade transaccionada.

19
Preço
130
C. Procura

120

o P. Equilíbrio muda
110

100
C. Oferta

90
100 105 110 115 120 125 Quantidade
130

Fig.1.10 – Efeito no ponto de equilíbrio de mercado de um fortalecimento da procura.

Ex1.4: Numa região, onde normalmente se consumem 100t/dia de pão a um preço unitário de
0.15€, têm-se ultimamente consumido 150t/dia de pão a um preço unitário de 0.18€. Será que
esta alteração é induzida por um padeiro estar doente?

R: Não. Um padeiro doente induziria um enfraquecimento na oferta pelo que seria de


acontecer uma diminuição da quantidade transaccionada acompanhada por um aumento do
preço. No entanto, observa-se um aumento do preço em simultâneo com o aumento da
quantidade transaccionada o que indicia um reforço da procura.

Curvas agregadas e curvas individuais. As curvas que se observam no mercado resultam da


soma das curvas dos agentes económicos individuais que estão presentes no mercado. Se por
exemplo, ao preço de 0.50€/kg o João quer adquirir 3kg de maçãs e a Maria 5kg de maçãs,
então, no agregado, ao preço de 0.50€/kg, querem adquirir 8kg de maçãs. No caso de termos
as curvas individuais como funções explicitadas em ordem às quantidades, bastará somá-las.
Se o Joaquim se caracteriza por sJ(p) = 5 – 0.1p e a Mariana por sM(p) = 10 – 0.2p, a curva de
mercado será S(p) = sJ(p) + sM(p) = 55 – 0.3p. Agregam-se de forma idêntica as curvas de
oferta. Ao somarmos simplesmente as curvas individuais estamos a assumir que os agentes
económicos se assumem atómicos (i.e., que não têm qualquer influência no mercado) o que
não acontece principalmente quando há no mercado poucos vendedores (os casos do
Monopólio e do Oligopólio) ou poucos compradores (os casos do Monopsónio e do
Oligopsónio).

20
Ex1.5: Numa mercado existem 1000 compradores idênticos cujas curvas de procura
individual são d(p) = 1 – 0.01p e 50 vendedores idênticos cujas curvas de oferta são
s(p) = –1 + 0.1p, quantidades em kg/hora e preço em cent./kg. Qual será a quantidade
adquirida por cada comprador e a que preço?

R: Primeiro, somamos para cada preço as quantidades. Com compradores idênticos temos
D(p) = 1000d(p) = 1000.( 1 – 0.01p) = 1000 – 10p. Com vendedores idênticos temos
S(p) =50s(p) = 50.(– 1 + 0.1p) = –50 + 5p. Segundo, o equilíbrio de mercado será em
D(p) = S(p) ⇔ 1000 – 10p = –50 + 5p ⇔ 15p = 1050 ⇔ p = 70 cent./kg e Q = 300 kg/hora.
Terceiro, o preço será o de mercado, p = 70 cent./kg, enquanto que a quantidade individual se
obtém dividindo o total transaccionado pelos 1000 compradores, q = 0.300 kg/hora/indivíduo.

Devemos notar que a soma das curvas individuais se faz sempre nas quantidades e nunca nos
preços. Supondo que temos a representação gráfica de dois grupos de consumidores (grupo 1
e 2), em termos gráficos, como o preço está representado no eixo vertical, a soma será feita na
horizontal (ver Fig. 1.11).

120
Preço

100

80

60
S = s1 + s2
40
s1 s2
20

0
0 10 20 30 40 Quantidade
50 60

Fig.1.11 – Curva de procura como soma horizontal de duas curvas de procura individuais.

Ex1.6: Num mercado de produtos higiénicos, a curva de procura é linear e passa por dois
pontos conhecidos, para mulheres e homens (ver tabela abaixo). Existindo 1000 mulheres e

21
1500 homens e sendo a curva de oferta S(p) = –2500 + 2000p, qual o género (homem ou
mulher) que adquire mais deste produto?

Consumo Mulheres Homens


1 u./mês 1€ 0.5€
2 u./mês 0.5€ 0.25€
R: 1) a curva de procura de cada mulher será dm(p) = a + b.p ⇒ {1 = a + b ∧ 2 = a + 0.5b} ⇔
{a = 3 ∧ b = –2} ⇒ dm(p) = 3 – 2p, p <3/2 e de cada homem será dh(p) = c + d.p ⇒
{1 = c + 0.5d ∧ 2 = c + 0.25d} ⇔ {c = 5 ∧ d = –4} ⇒ dh(p) = 5 – 4p, p <3/4; 2) a curva de
procura de mercado vai ter uma quebra no preços 0.75€/u. porque os homens saem do
1500dh + 1000dm, p ≤ 3 / 4 7500 − 8000 p, p ≤ 3 / 4
mercado: D =  = 3) o equilíbrio
1000dm, 3 / 4 < p ≤ 3 / 2 3000 − 2000 p, 3 / 4 < p ≤ 3 / 2
de mercado será D(p) = S(p) ⇔ 7500 – 8000p = –2500 + 2000p ⇔ 10000 = 10000p ⇔ p = 1€
e dm(1) = 1u. e dh(1) = –1u.; 4) Não estamos no domínio aceitável para o preço. Teremos que
usar a “outra” parte da curva da procura D(p) = S(p) ⇔ 3000 – 2000p = –2500 + 2000p ⇔
5500 = 4000p ⇔ p = 1.375€/u. e dm(1.375) = 0.25u. e dh(1.375) = 0u.

No mercado a quantidade transaccionada será 250u. ao preço unitário de 1.375€/u. São as


mulheres que adquirem mais (os homens não compram).

Variações relativas, Elasticidade. Para tornarmos compatíveis análises empíricos em que se


utilizam realidades económicas muito diferentes, a evolução em termos relativos das variáveis
económicas é mais relevante que a sua variação absoluta. Por exemplo, quando comparamos
os países pobres com os países ricos, a taxa de crescimento anual (em percentagem) é mais
comparável que o crescimento absoluto (em euros). Então, pode ter importância definir as
curvas de procura e de oferta (na vizinhança do ponto de equilíbrio) em termos relativos. Por
exemplo, dizer que, quando o preço aumenta 1%, a quantidade procurada aumenta 0.75%.
Esta grandeza que relaciona variações relativas não tem dimensões e denomina-se por
elasticidade (no exemplo será 0.75).

Elasticidade arco. A determinação da elasticidade arco (ou média) é feita quando se


conhecem dois pontos da curva e obtém-se dividindo a variação relativa da quantidade pela
variação relativa do preço. Por exemplo, conhecemos os pontos S(5) = 90 e S(7) = 110. Então,

22
em torno do ponto médio, existe uma variação relativa da quantidade oferecida de
(90 – 110)/100 = 20% e uma variação relativa do preço de (7–5)/6 = 33.3% pelo que a
elasticidade preço da oferta será 20%/33% = 0.6.

Em termos de expressão matemática temos:

Q2 − Q1 Q2 − Q1
Q 0.5(Q2 + Q1 )
ε p,Q = =
p2 − p1 p2 − p1
p 0.5( p2 + p1 )

Também poderíamos utilizar logaritmos (i.e., ajustar um função isoelástica). Partindo de dois
pontos, (y1, x1) e (y2, x2) determinamos ε ajustando Q = A.xε:

Q1 = A.x1ε ln(Q1 ) − ln(Q2 ) ln(90) − ln(110)


 ⇒ Q1 / Q2 = ( x1 / x 2)ε ⇔ ε p , Q = = = 0.596
Q2 = A.x2 ε
ln( x1 ) − ln( x2 ) ln(5) − ln(7)

Elasticidade ponto. A determinação da elasticidade ponto é feita com recurso ao cálculo


matemático. Assim, é o limite da elasticidade arco quando a diferença dos preços se aproxima
de zero. Tem em consideração o valor da derivada da função e os valores da quantidade e do
preço no ponto. Para ficar mais claro, vou usar a definição de derivada na elasticidade preço
da procura:

D2 − D1 D ( p + h) − D ( p )
D D ( p)  D ( p + h) − D ( p )  p dD p
ε = lim = lim = lim  =
 D( p ) dp D
p 2 → p1 p2 − p1 h→0 h h →0
 h
p p

Podemos agora confirmar que a elasticidade ponto de y = A.xe é e em qualquer abcissa:

x x
y ' ( x) = A.e.x e −1 =e
y A.xe

Procura elástica ou inelástica: Se a elasticidade da função de procura for menor que um,
diz-se que a procura é inelástica enquanto que se for superior a um diz-se que a procura é
elástica. No caso fronteira, a procura é de elasticidade unitária.

23
Ex1.7: Sendo a curva de procura D(p) = 100 – p e a curva de oferta S(p) = –10 + 10p,
relativamente ao ponto de equilíbrio, qual será a variação relativa da quantidade procurada se
o preço aumentar 1%?

R: O equilíbrio é D(p) = S(p) ⇔ 100 – p = –10 + 10p ⇔ p = 10€/u. e Q = 90u. A elasticidade


no ponto é D’(p).p/Q = –1x10/ 90 = –0.11. Então, se o preço aumentar 1%, a quantidade
procurada diminui 0.11%.

Outro exemplo: Para a função de procura D(p) = 100 – 3p, determine a elasticidade preço da
procura. Determine o ponto em que a essa elasticidade vale –0.5.

dD p p −3p
R: Para um ponto genérico, temos = −3 = .
dp D 100 − 3 p 100 − 3 p

−3p
O ponto em que εp,D = –0.5 resolve = −0.5 ⇔ −3 p = −50 + 1.5 p ⇔ p = 11.11€ / u. ,
100 − 3 p

D(11.11) = 66.67u.

Meio de transporte e utilização Elasticidade preço da procura


Viagem de avião, passeio –1.52
Viagem de comboio, passeio –1.40
Viagem de avião, negócios –1.15
Viagem de comboio, negócios –0.70
Tab. 1.1 – Estimativa da elasticidade preço da procura (ep,d)
(Fonte: Besanko, 2ªed, Table 2.2)

Ex1.8: Sendo que a curva de procura se fortalece com o rendimento disponível,


D(p) = 100 – p + 0.25R, e a curvas de oferta é S(p) = –10 + 5p, para um rendimento de 1000€
qual será a variação relativa da quantidade procurada induzida por um aumento do rendimento
em 1% (denomina-se por elasticidade rendimento da procura)?

R: O equilíbrio será D(p) = S(p) ⇔ 100 – p + 0.25R = –10 + 5p ⇔ 360 = 6p ⇔ p = 60€/u. e


Q = 290u. A elasticidade no ponto será relativamente ao rendimento será dada por
D’R(p).R/Q = 0.25x1000/290 = 0.862. Então, o aumento de 1% no rendimento induz um
aumento de 0.862% na quantidade procurada.

24
Alimento Elasticidade rendimento da procura
Natas 1.72
Maças 1.32
Ervilhas frescas 1.05
Cebolas 0.58
Manteiga 0.37
Margarina –0.20
Tab. 1.2 – Estimativa da elasticidade rendimento da procura (er,d)
(Fonte: Besanko, 2ªed, Table 2.4)

1.5. Aplicações: intervenções do governo.

O governo, por vezes, julga que o mercado não está a funcionar de forma conveniente para o
bem da sociedade e decide intervir politicamente no sentido de alterar os preços e a
quantidade transaccionadas na direcção politicamente considerada como a mais conveniente*.
Vamos considerar, havendo outras, as politicas de imposição de um preço máximo ou mínimo
e a cobrança de um imposto (que se soma ao preço do vendedor) ou atribuição de um subsídio
(que se subtrai ao preço do vendedor).

Imposição de um preço máximo. Por vezes, os governos intervêm no mercado impondo um


preço máximo. Por exemplo, as condicionantes do mercado apontam para que o preço do pão
suba de 0.15€/u. para 0.20€/u. mas o governo, pensando acalmar o descontentamento dos
consumidores, impõe que o preço não possa ultrapassar os 16€/u. Apenas existem efeitos no
mercado da imposição de um preço máximo se o preço imposto for inferior ao preço de
equilíbrio de mercado**. É óbvio que se o governo impusesse que o preço do pão não podia
ultrapassar 1.00€/u., a política não teria qualquer efeito. Já a imposição de um preço máximo
de 0.16€/u. terá efeitos no mercado.

A imposição de um preço máximo inferior ao preço de equilíbrio (walrassiano) induz uma


diminuição da quantidade transaccionada e do preço de mercado (ver Fig.1.12 onde o preço
de equilíbrio seria 2.00€/u. e o governo obriga a que, no máximo, seja 1.60€/u.).

*
Na Economia Pública estudam-se situações em que os governantes não procura o bem-estar da sociedade mas o
seu próprio bem-estar. Por exemplo, as alterações das políticas económicas no decorrer do ciclo eleitoral.
**
Enquanto que no equilíbrio walrassiano o mercado está fora do equilíbrio porque, àquele preço, os
compradores querem adquirir maior quantidade que os vendedores querem vender, no sentido de equilíbrio de
Nash, o mercado está em equilíbrio porque os compradores conformam-se com a imposição (que é
conhecimento público e perfeito) não havendo incentivos para que tentem adquirir maior quantidade.

25
Preço
2,4
D S
2,2

1,8

1,6

1,4
95 100 105 110 Quantidade
115

Fig.1.12 – Imposição de um preço máximo menor que o preço de equilíbrio.

Ao preço máximo obrigatório, os consumidores estariam disponíveis para consumir maior


quantidade mas os vendedores não estão disponíveis para colocar à venda tanta quantidade.
Observa-se que deixa de haver mercadoria disponível: no caso dos bens, as prateleiras ficam
vazias e, no caso dos serviços, aumenta o tempo de espera para o atendimento. Pode ainda
verificar-se uma degradação da qualidade do bem ou serviço e surgir um mercado paralelo em
que as transacções acontecem a um preço maior que o valor máximo imposto pelo governo.

Nas situações de imposição de um preço máximo efectivo, o mercado vai ficar fora do ponto
do equilíbrio walrassiano e sobre a curva da oferta.

Ex1.9: Num mercado de pão, a curva de procura é D(p) = 280 – 6p e a curva de oferta é
S(p) = 80 + 4p (preço em cent./u. e quantidade em milhares de unidades). i) Qual o equilíbrio
de mercado e ii) que alterações induz o governo ao impor 16cent./u. como preço máximo?

R: i) O equilíbrio de mercado será D(p) = S(p) ⇔ 280 – 6p = 80 + 4p ⇒ 200 = 10p ⇔ p = 20


e Q = 160. ii) Se for imposto como preço máximo 16cent./u., então haverá uma diminuição do
preço de transacção (16 < 20) acompanhada por uma diminuição da quantidade
transaccionada: Q = menor{D; S} = menor{280 – 6p; 80 + 4p} = menor{184; 144} = 144u. O
mercado vai ficar sobre a curva de oferta.

26
Preço mínimo. Os governos também podem intervir no mercado pela imposição de um preço
mínimo. Por exemplo, o mercado aponta para que o preço da carne de vaca diminua de
5.00€/kg para 3.50€/kg mas o governo, pensando tal ser pernicioso para os agricultores,
decreta que o preço não pode ser inferior a 4.00€/kg.

Apenas existirão efeitos desta política se o preço mínimo for superior ao preço de equilíbrio.
Se, no exemplo, o governo impusesse que o preço da carne não podia ser menor que 1.00€/kg
não haveria qualquer alteração no mercado. Pelo contrário, a imposição de 4.0€/kg como
preço mínimo já terá efeitos no mercado.

A imposição de um preço mínimo superior ao preço de equilíbrio induz uma diminuição da


quantidade transaccionada e um aumento do preço de mercado (ver Fig.1.13).

Ao preço mínimo obrigatório (mais elevado que o de equilíbrio walrassiano), os vendedores


estariam disponíveis para vender maior quantidade mas os compradores não estão disponíveis
para adquirir tanta quantidade. Observa-se que começa haver excesso de mercadoria
disponível: no caso dos bens, as prateleiras ficam cheias e, no caso dos serviços, não existem
clientes. Como os vendedores têm muitos stocks, surge um mercado paralelo em que as
transacções acontecem a um preço de saldo (preço menor que o obrigatório).

Nas situações de imposição de um preço mínimo efectivo, o mercado vai ficar fora do normal
ponto do equilíbrio e apenas sobre a curva da procura.

Preço
4,5
D

4
S

3,5

3
100 102 104 106 108 110 112 Quantidade
114

Fig.1.13 – Imposição de um preço mínimo superior ao preço de equilíbrio.

27
Ex1.10: No mercado de carne, a curva de procura é D(p) = 430 – 60p e a curva de oferta é
S(p) = 80 + 40p (preço em €/kg e quantidade em milhares de kg). Qual o equilíbrio de
mercado e que alterações induz o governo ao impor 4€/kg como preço mínimo?

R: 1) O equilíbrio de mercado será D(p) = S(p) ⇔ 430 – 60p = 80 + 40p ⇒ 350 = 100p ⇔ p
= 3.5€ e Q = 220t. Se for imposto 4€/kg como preço mínimo, então haverá um aumento do
preço de transacção (4 < 3.5) acompanhada por uma diminuição da quantidade
transaccionada: Q = menor{430 – 60p; 80 + 40p} = menor{190; 240} = 190. O mercado vai
ficar sobre a curva de procura.

Resumindo, a imposição pelo governo de um preço efectivo diferente do de normal


equilíbrio, induz sempre uma diminuição da quantidade transaccionada. Se for imposto um
preço máximo inferior ao de normal equilíbrio, os vendedores não querem vender tanto como
os compradores querem comprar. Se for imposto um preço mínimo superior ao de normal
equilíbrio, os compradores não querem comprar tanto como os vendedores querem vender.

Ex1.11: Num hipotético mercado, as curvas de procura D e de p D S


oferta S são dadas na tabela ao lado. Qual será o preço e a 2€/kg 150kg 25kg
quantidade transaccionada em equilíbrio de mercado? Qual 4€/kg 140kg 80kg

será a quantidade transaccionada se o governo impuser 4€/kg 6€/kg 130kg 130kg


8€/kg 120kg 137kg
como preço máximo? E 10€/kg como preço mínimo?
10€/kg 110kg 140kg
R: Em equilíbrio a quantidade transaccionada será 130kg ao 12€/kg 100kg 155kg
preço de 6€/kg. A quantidade transaccionada a 4€/kg será 80kg (lado da oferta). A quantidade
transaccionada a 10€/kg será 110kg (lado da procura).

Cobrança de um imposto. Os governos também podem intervir no mercado cobrando um


imposto sobre o preço, tipo IVA (imposto sobre o valor acrescentado). O principal objectivo
do governo, além de controlar o mercado, é obter rendimentos para cobrir os custos do seu
funcionamento (e para poder atribuir subsídios noutros mercado).

A cobrança de um imposto faz com que o preço que os compradores pagam seja superior (no
valor do imposto) ao preço que os vendedores recebem. Assim, o imposto aumenta o preço
que os consumidores pagam e diminui o preço que os vendedores recebem de forma que

28
diminui a quantidade transaccionada. Na Fig.1.14, inicialmente no mercado são
transaccionadas 110u. ao preço de 3.5€/u. e a introdução de um imposto de 1€/u. faz diminuir
a quantidade transaccionada para 105u., aumentar o preço que os compradores pagam para
4€/u. e diminuir o preço que os vendedores recebem para 3€/u.

Preço
4,5
D
4
S

3,5 Imposto

2,5
100 102 104 106 108 110 112 Quantidade
114

Fig.13 – Efeito no mercado da cobrança de um imposto sobre o preço de transacção

Ex1.12: No mercado de bacalhau, a curva de procura é D(p) = 1500 – 50p e a curva de oferta
é S(p) = 950 + 5p (preço em €/kg e quantidade em toneladas). Qual o equilíbrio de mercado e
que alterações induz a imposição de 3€/kg de imposto?

R: 1) O equilíbrio de mercado será D(p) = S(p) ⇔ 1500 – 50p = 950 + 5p ⇒ 550 = 55p ⇔
p = 10€/kg e Q = 1000t. 2.1) Se for cobrado o imposto de 3€/kg, o cálculo do novo ponto de
equilíbrio de mercado pode ser feito ao preço dos vendedores (o preço dos compradores será
maior que o preço dos vendedores, ver Fig.1.14). pc = pv + 3 ⇒ D(pv + 3) = S(pv)
⇔ 1500 – 50(pv+3) = 950 + 5pv ⇒ 400 = 55pv ⇔ pv = 7.27€/kg, pc = 10.27€/kg e Q = 986.4t.

O preço dos vendedores diminui de 10€/kg para 7.27€/kg, o preço dos compradores aumenta
de 10€/kg para 10.27€/kg e a quantidade transaccionada diminui de 1000t. para 986.4t.

2.2) De forma equivalente, podemos calcular o novo equilíbrio de mercado ao “preço dos
compradores”: D(pc) = S(pc – 3) ⇔ 1500 – 50pc = 950 + 5(pc – 3 ) ⇒ 565 = 55pc ⇔
pc = 10.27€/kg, pv = 7.27€/kg e Q = 990.9t.

29
A resolução do mercado “ao preço do vendedor” torna equivalente a introdução de um
imposto sobre o preço a um enfraquecimento da oferta (ver. Fig.1.14).

Preço
4,5
D

pc4 S

3,5 Imposto

pv3

2,5
100 102 104 106 108 110 112 Quantidade
114

Fig.1.14 – Determinação do equilíbrio de mercado ao “preço do vendedor”

Repartição do imposto entre vendedores e compradores. Já mostrei que o imposto, I,


induz um aumento do preço que os compradores pagam, pc, e uma diminuição do preço que
os vendedores recebem, pv, de tal forma que pc – pv = I. O que pretendo calcular neste ponto é,
em termos percentuais relativos, a distribuição do efeito do imposto no preço dos
compradores e dos vendedores. Retomando o Ex.1.12, em termos absolutos, o imposto de
3€/kg repartiu-se 0.27€/kg para os compradores e 2.73€/kg para os vendedores. Então, em
termos relativos, 9% do imposto (0.27/9) será suportado pelos compradores e 91% do imposto
(2.73/3) será suportado pelos vendedores. Como regra, quanto mais sensível for a curva ao
preço, menor será a percentagem do imposto suportada.

Ex1.13: Num mercado de seguros, a curva de procura é D(p) = 3000 – 10p e a curva de oferta
é S(p) = –750 + 5p (preço em €/seguro e quantidade em seguros). i) Qual o equilíbrio de
mercado, ii) que alterações induz a imposição de 30€/s de imposto e iii) como é distribuído o
imposto?

R: i) O equilíbrio de mercado será D(p) = S(p) ⇔ 3000 – 10p = –750 + 5p ⇒ 3750 = 15p ⇔
p = 250€/s e Q = 500s. ii) Se for cobrado o imposto de 30€/s, o cálculo do novo ponto de
equilíbrio de mercado ao preço dos vendedores será pc = pv + 30 ⇒ D(pv + 30) = S(pv) ⇔

30
3000 – 10(pv+30) = –750 + 5pv ⇒ 3450 = 15pv ⇔ pv = 230€/s, pc = 260€/s e Q = 400s. iii) Os
compradores suportam (260–250)/30 = 1/3 e os vendedores (250–230)/30=2/3 do imposto.

Atribuição de um subsídio. Em termos algébricos, um subsídio corresponde a um imposto


de sinal negativo. Assim sendo, a atribuição de um subsídio faz com que o preço que os
compradores pagam seja inferior (no valor do subsídio) ao preço que os vendedores recebem.
Assim, o imposto diminui o preço que os consumidores pagam e aumenta o preço que os
vendedores recebem de forma que aumenta a quantidade transaccionada. Na Fig.1.15,
inicialmente no mercado são transaccionadas 110u. ao preço de 3.5€/u.. e a atribuição de um
subsídio de 1€/u. faz aumentar a quantidade transaccionada para 115u., baixa o preço que os
compradores pagam para 3€/u. e aumenta o preço que os vendedores recebem para 4€/u.

Preço
4,5
S

3,5 Subsídio

D
2,5
108 110 112 114 Quantidade
116

Fig.1.15 – Efeito no mercado da atribuição de um subsídio (ao preço)

Ex1.14: No mercado de bacalhau, a curva de procura é D(p) = 1500 – 50p e a curva de oferta
é S(p) = 950 + 5p (preço em €/kg e quantidade em toneladas). Qual o equilíbrio de mercado e
que alterações induz a atribuição de 3€/kg de subsídio?

R: 1) O equilíbrio de mercado inicial é (ver Ex1.12) p = 10€/kg e Q = 1000t. 2.1) Com o


subsídio de 3€/kg, o novo ponto de equilíbrio de mercado feito ao preço dos vendedores será
pc = pv – 3 ⇒ D(pv – 3) = S(pv) ⇔ 1500 – 50(pv – 3) = 950 + 5pv ⇒ 700 = 55pv ⇔ pv =
12.73€/kg, pc = 9.73€/kg e Q = 1013.6t.

31
Repartição do subsídio entre vendedores e compradores. O subsídio, S, é um imposto de
sinal negativo pelo que virá o preço que os compradores pagam, pc, menor que o preço que os
vendedores recebem, pv, de tal forma que pv – pc = S. O que pretendemos calcular neste ponto
é, em termos percentuais, a distribuição do efeito relativo do subsídio no preço dos
compradores e dos vendedores. Retomando o Ex.1.13, em termos absolutos, o subsídio de
3€/kg repartiu-se 0.27€/kg para os compradores e 2.73€/kg para os vendedores. Então, em
termos relativos, 9% do subsídio vai para os compradores e 91% do subsídio vai para os
vendedores. Quanto mais sensível for a curva ao preço, menor será a percentagem do subsídio
com que ficam beneficiados.

Ex1.15: Num mercado de “tomar conta de crianças ao fim de semana”, a curva de procura é
D(p) = 500 – 25p e a curva de oferta é S(p) = –250 + 50p (preço em €/criança e quantidade
em crianças). i) Qual o equilíbrio de mercado, ii) que alterações induz a atribuição pelo
governo de um subsídio de 5€/c. e iii) como é distribuído o subsídio?

R: i) O equilíbrio de mercado será D(p) = S(p) ⇔ 500 – 25p = –250 + 50p ⇒ 750 = 75p ⇔
p = 10€/c e Q = 250c. ii) Se for atribuído 30€/s de subsídio, o cálculo do novo ponto de
equilíbrio de mercado ao preço dos compradores será pc + 5 = pv ⇒ D(pc) = S(pc + 5) ⇔
500 – 25pc = –250 + 50(pc + 5) ⇒ 500 = 75pc ⇔ pc = 6.67€/c, pv = 11.67€/c e Q = 333c. iii)
Os compradores beneficiam (10–6.67)/5 = 2/3 e os vendedores (11.67–10)/5=1/3 do subsídio.

O preço do dinheiro e sua evolução. O valor do dinheiro não é intrínseco (excepto para os
coleccionadores de notas e moedas) mas resulta de ter poder aquisitivo. Assim, o valor de
uma soma de dinheiro é consequência de, com ela, se poder comprar bens e serviços que têm
valor (apesar de dependente da valoração que cada pessoa faz). O preço unitário de um bem
ou serviço é a quantidade de dinheiro necessária para adquirir uma unidade desse bem ou
serviço. Então, o preço unitário do dinheiro será uma unidade monetária (e.g., como para
comprar um euro é necessário pagar um euro, então o preço de um euro será um euro)
parecendo que esta discussão não faz sentido económico. A questão ganha sentido quando
retiramos à moeda a sua função de unidade de valor e a atribuirmos a outro activo: e.g.,
custando o milho 0.50€/kg e o frango 1.75€/kg, passando o milho a ser a unidade de valor,
então o preço do frango passará a ser 3.5kg de milho/kg e o preço do dinheiro a ser 2kg de
milho/euro. Considerando um bem compósito que agrega os bens e serviços que se

32
transaccionam numa zona monetária e assumindo uma unidade desse bem compósito como
unidade de valor, então o preço do dinheiro serão as unidades de bem compósito necessárias
para adquirir uma unidade de dinheiro (ou as unidades de bem composto que se obtêm pela
venda de uma unidade de dinheiro).

Efeito de uma variação da quantidade de moeda. Em função do preço do dinheiro, por um


lado, os vendedores de dinheiro (i.e., quem tem dinheiro e não tem bens e serviços) vão
pretender vender uma determinada quantidade de dinheiro e, por outro lado, os compradores
de dinheiro (i.e., quem não tem dinheiro e tem bens e serviços) vão pretender comprar uma
determinada quantidade de dinheiro. Então, podemos imaginar um mercado de dinheiro com
curvas de oferta, de procura e equilíbrio em que o preço do dinheiro são kg do bem compósito
por € e a quantidade transaccionada são € por dia (a quantidade transaccionada como um
fluxo):

130 kg/€
preço
Curva de Procura de €

120

110 Curva de Oferta de €

100

90
100 105 110 115 120 125 130
Quantidade 135
€/dia

Fig.1.16 – O mercado de dinheiro

Em termos verbais, definimos que o preço do dinheiro é o inverso do preço médio dos bens e
serviços transaccionados na zona monetária (e não a taxa de juro que é o preço do crédito).

Quando há um reforço da oferta de dinheiro (e.g., por o banco central emitir mais moeda) a
curva da oferta de dinheiro desloca-se para a direita pelo que diminui o preço do dinheiro (i.e.,
o dinheiro desvaloriza: aumenta a inflação) e aumenta a quantidade de dinheiro em circulação
(em termos nominais). Quando há um reforço da procura de dinheiro (e.g., as pessoas
aumentam o seu rendimento, i.e., a quantidade de bens e serviços que têm) a curva da procura

33
de dinheiro desloca-se para a direita pelo que aumenta o preço do dinheiro (i.e., o dinheiro
valoriza: existe deflação) e aumenta a quantidade de dinheiro em circulação (em termos
nominais).

O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao preço de uma moeda em termos de unidades
monetárias de outra moeda (i.e., à taxa de cambio). Vamos supor o Brasil (Reais) e a Europa
(Euros). Se o preço unitário do Euro diminuir de 3 Reais/Euro para 2 Reais/Euro (o Euro fica
mais barato) então aumenta a quantidade procurada e diminui a quantidade oferecida de
Euros.

Exercícios de recapitulação

Ex1.16: No mercado das “Viagens à Terra Santa”, sabemos que em condições normais são
vendidas por ano 6000 viagens a 1500€ cada uma. Nos anos de intifada, há enfraquecimento
da procura de forma que são vendidas 1200 viagens a 1000€ cada uma. Sabemos ainda que,
quando o preço aumenta 1%, a quantidade procurada diminui em 0.5% e que o IVA é de 20%.
Determine o efeito no mercado de uma diminuição do IVA de 20% para 5% e como se
distribui o efeito sobre o preço.

R. Primeiro, determinamos a curva da oferta e a curva da procura. Como é dada a elasticidade


da procura (–0.5) e um ponto (1500; 6000), vou estimar o modelo isoelástico:

A) D(p) = K.p–0.5 ⇒ 6000 = K.1500–0.5 ⇒ K = 232379 ⇒ D(p) = 232379.p–0.5

B) Como há alterações na procura, os pontos (1500; 6000) e (1000, 1200) são da curva
de oferta. Para usar o preço dos vendedores, temos que retirar o IVA (de 20%) do preço dos
compradores de forma que 1500€→1250€ e 1000€→833.3€. Podemos estimar uma recta:

6000 = A + 1250 B 4800 = 416.7 B  B = 11.52


S(p) = A + B.p ⇒  ⇔ ⇔
1200 = A + 833.3B −  A = −8400

⇒ S(p) = –8400 + 11.52p

Segundo, determinamos o equilíbrio de mercado com a nova taxa de IVA (ao preço dos
compradores, podendo também ser calculado ao preço dos vendedores).

D(p) = S(p/1.05)

232379.p–0.5= –8400 + 11.52p/1.05

34
Apenas conseguimos resolver esta equação no Excel

B2: = 232379+8400*A2^0,5-10.97^A2^1,5

Atingir objectivo: definir célula B2 para o valor 0 por alteração


da célula A2.

O preço de mercado das viagens diminuirá de 1500€ para 1343.48€ e a quantidade


transaccionada aumentará de 6000 viagens para 6340 viagens. A diminuição do IVA induz
uma diminuição do preço dos compradores em 156.52€ e um aumento do preço dos
vendedores em 29.50€.

Ex1.17: Num mercado de alimentos, em termos de kg por mês, a curva de procura do


individuo i cujo rendimento é ri vem dada por d(p) = 1.75p–0.5ri0.5. A curva de oferta de cada
vendedor vem dada por s(p) = 20p0.25.(2h – h2) onde h mede a pluviosidade anual. Existe um
total de 50 vendedores e 300 consumidores (200 com 400€/mês e 100 com 900€/mês). i)
Determine o equilíbrio de mercado num ano em que chova 1m. ii) Determine quanto adquiriu
cada consumidor. iii) Quantifique o efeito do governo, para ajudar os consumidores, impor
como preço máximo 20€/kg. iv) Quantifique o efeito do governo, para ajudar os vendedores,
impor como preço mínimo 20€/kg.

R. Obtém-se a curva de procura de mercado somando as curvas individuais dos 300


consumidores, repartidas em duas classes de rendimento:

D( p ) = 200(1.75 p −0.5 4000.5 ) + 100(1.75 p −0.5 900 0.5 ) = 7000 p −0.5 + 5250 p −0.5 = 12250 p −0.5

A curva de oferta obtém-se multiplicando a curva individual por 50: S ( p) = 1000 p 0.25 .

No equilíbrio a quantidade procurada é igual à quantidade oferecida:

D( p ) = S ( p ) ⇔ 12250 p −0.5 = 1000 p 0.25 ⇔ 12.250 = p 0.75 ⇔ p = 28.239€; Q = 2305kg

ii) Os mais pobres consomem D( p ) = 1.75(28.239) −0.5 400 0.5 = 6.586kg por mês e os mais

ricos consomem D( p ) = 1.75(28.239) −0.5 900 0.5 = 9.880kg por mês.

iii) A quantidade transaccionada será o mínimo entre a quantidade que uns querem comprar e
a que outros querem vender.

{ }
menor{D( p ); S ( p )} ⇔ menor 12250 × 20 −0.5 ; 1000 × 200.25 = menor{2739.2; 2114.7} = 2114.7

35
A quantidade transaccionada no mercado diminui porque os vendedores diminuem a
quantidade oferecida.

iv) Como o preço de mercado é superior ao preço mínimo imposto, não tem qualquer efeito.

Ex1.18: Segundo um estudo de um hipermercado, os 700 pescadores de sardinha de


Matosinhos estão disponíveis para vender 100t/dia se o preço for de 1€/kg, 200t/dia se o preço
for de 2€/kg e 200t/dia se o preço for de 3€/kg. Supondo que a curva de procura dos clientes
do hipermercado é D(p) = 500 – 10p e que o hipermercado tem 0.5€/kg de margem de
comercialização (para cobrir os custos de transporte, exposição, refrigeração, etc.). i) Qual o
preço contratado com os pescadores? ii) Qual o efeito de o governo cobrir os custos de
comercialização e quanto custa por cada pescador esta política?

R. Com os três pontos podemos estimar uma curva de oferta do segundo grau.

100 = A + B + C 100 − B − C = A  A = 100


  
S ( p) = A + Bp + Cp ⇒ 200 = A + 2 B + 4C ⇔ 100 − 3C = B ⇔  B = −50
2

400 = A + 3B + 9C 300 = 2 B + 8C C = 50
  

i) O preço pago aos pescadores é o de equilíbrio de mercado em que o preço dos compradores
é maior em 0.5€/kg (a margem é como se fosse um imposto): S ( p ) = D( p + 0.5)

⇔ 100 − 50 p + 50 p 2 = 435 − 10( p + 0.5) ⇔ 50 p 2 − 40 p − 330 = 0 ⇒ p = 3€ / kg .

ii) Esta política ajuda mais os consumidores que os pescadores já que o preço pago aos
pescadores aumenta 0.02€/kg e o preço pago pelos consumidores diminui 0.03€/kg.

S ( p ) = D ( p ) ⇔ 100 − 50 p + 50 p 2 = 435 − 10 p ⇔ 50 p 2 − 40 p − 335 = 0 ⇒ p = 3.02€ / kg


Como serão comercializadas 404.808t/dia, a política custará 20240€/dia que, a dividir por
700, dá 28.91€/dia/pescador.

Ex1.19: No mercado de Camarão há 1000 compradores idênticos com curva de procura


d(p) = 0.6 – 0.05p e 40 vendedores idênticos com curva de oferta s(p) = –1.5 + 1.5p.

i) Determine o equilíbrio de mercado. o preço e a quantidade transaccionada no equilíbrio.

ii) Se o governo quiser que as capturas diminuam em 20%, que imposto terá que impor?

iii) Se o preço mínimo fosse 8€/kg, qual a quantidade transaccionada?

36
R. i) D(p) = S(p) ⇔ 1000( 0.6 – 0.05p) = 40(–1.5 + 1.5p) ⇔ p = 6.00€/kg; Q = 300kg.

ii) D(pv + I) = S(pv) ⇔ 1000( 0.6 – 0.05(pv + I)) = 40(–1.5 + 1.5pv) ⇔ pv = 6 – 0.(45).
Resolvendo S(pv ) = 240 vem –60 + 60(6 – 0.(45)I) = 240 ⇔ I = 2.2€/kg.

iii) menor{S(8); D(8)} = menor{420; 200} = 200kg. Os compradores não querem adquirir
maior quantidade.

Ex1.20: Na última década assistimos a um aumento extraordinário do preço do petróleo.


Represento na figura seguinte a evolução do preço (dólares americanos por barril) e
quantidade transaccionada (milhões de barris por dia) médias ao longo de cada ano civil:

$/b
75
65
y = 0,3641x 2 - 53,627x + 1997,8
55
45
35
25
15
73 78 83 M.b/dia

i) O que representará a recta de ajustamento y = 0.3641x2 – 53.627x + 1997.8?

ii) Será que podemos afirmar que a responsabilidade para o aumento dos preços foi a guerra
do Iraque (i.e., um enfraquecimento da oferta)?

iii) Sendo que em 2007 a quantidade consumida foi de 85.220 Milhões.barris/dia ao preço
médio de 72.4$/b, se em 2008 essa quantidade diminuir 5%, para quanto se prevê que evolua
o preço médio do barril de petróleo?

R. i) A recta ajustada é uma estimativa para a função de oferta inversa p(S) pois no eixo
vertical está o preço e no horizontal as quantidades transaccionadas. Se quiséssemos a função
procura teríamos que utilizar a formula resolvente da equação do 2º grau:

53.627 + 53.627 2 − 4 × 0.3641× (1997.8 − p)


p = 0.3641S − 53.627 S + 1997.8 ⇒ S ( p ) =
2

2 × 0.3641

37
ii) Como aconteceu em simultâneo um aumento do preço e da quantidade transaccionada, é o
resultado dum reforço da procura. Se fosse um enfraquecimento da oferta, observava-se um
aumento do preço associado a uma diminuição da quantidade transaccionada.

iii) Usando p(S) obtemos p = 0.3641 × (0.95 × 85) 2 − 53.627 × (0.95 × 85) + 1997.8 = 41.6$ / b .

Desce para 41.6€/barril

38
II – Teoria do Consumidor

Sumário: Apresento a curva de procura do agente económico partindo da maximização de


uma função utilidade (não observável) sujeita à restrição orçamental e aos preços de mercado.
Detalho a explicação do que é uma curva de indiferença, a função de utilidade, a recta
orçamental e apresento a condição de primeira ordem da maximização (igualdade de Jevon).
Finalmente, explico o que é o efeito substituição e efeito rendimento de uma alteração dos
preços e apresento aplicações que fazem uma ligação com a macroeconomia nova clássica
(ver http://en.wikipedia.org/wiki/New_classical_economics) de que Barro (1984) é um
manual pioneiro.

Objectivos pedagógicos: O aluno compreender como podemos obter a curva de procura


partindo de axiomas gerais quanto à motivação dos agentes económicos. A teoria contempla
três axiomas (não observáveis): i) que os gostos e preferências dos consumidores se
condensam na função de utilidade, ii) que os consumidores têm um rendimento disponível e
iii) que escolhem o cabaz de bens ou serviços que maximiza a sua utilidade sob restrição do
rendimento disponível e dos preços de mercado (é assumido serem price takers). O aluno
deve entender que a Teoria do Consumidor se aplicar a todo o comportamento humano e que
serve de fundamento para os modelos macroeconómicos e de análise social. Este ponto é
conseguido pela apresentação de algumas aplicações, i.e., políticas de combate à exclusão,
função oferta de trabalho, função poupança, a modelização do risco e a teoria do bem-estar.

2.0 Introdução

O núcleo conceptual da Teoria do Consumidor é o princípio de que a decisão dos agentes


económicos resulta de uma comparação entre o benefício da sua acção (i.e., o ganho de bem-

39
estar que origina) com o custo de a implementar (i.e., o dispêndio de recursos escassos
disponíveis): ”La Nature a placé l’Humanité sous le gouvernement de deux souverains
maîtres, la douleur e le plaisir [...]. Par principe d’utilité, on entend ce principe qui approuve
ou désapprouve chaque action, quelle qu’elle soit, en fonction de la tendance qu’elle paraît
avoir à augmenter ou diminuer le bonheur de la partie dont l’intérêt est en cause.” Jeremy
Bentham (1789), Uma Introdução aos Princípios da Moral e da Legislação. O filósofo
Bentham (1748-1832), seguido por John Stuart Mill (1806-73) e James Mill (1773-1836),
teorizou e difundiu o utilitarismo como o fundo ético do Homem que responde a todas as
questões acerca do que fazer, do que admirar e de como viver, em termos da maximização da
felicidade individual sob restrição do permitido pela sociedade. Assim, insere-se num
movimento filosófico de libertação do Homem da esfera do sagrado (i.e., da moral cristã).

O princípio da optimização resulta directamente da teoria da Selecção Natural de Charles


Darwin (1859): os indivíduos mais optimizadores têm maior probabilidade de sobreviver, de
ter filhos e de transmitir essa ética aos seus filhos (e concidadãos).

2.1. Preferências e gostos dos consumidores

Na teoria do consumidor que vamos expor, considero que o problema económico do


indivíduo é a escolha de um cabaz formados por quantidades variáveis de dois bens ou
serviços (ocasionalmente, mais bens ou serviços) sujeita ao rendimento disponível. Vou
assumir que os indivíduos possuem informação e raciocínio perfeitos (o que é informação
pública e perfeita).

2.1.1 Curva de indiferença

Princípio da Utilidade (dos bens ou serviços): Cada indivíduo tem necessidades que, quando
satisfeitas, lhe permitem viver numa situação de maior conforto, de maior bem-estar. Em
termos económicos, as necessidades humanas são satisfeitas com a apropriação e fruição de
bens e serviços. O valor económico dos bens e serviços resulta directamente da sua
capacidade em satisfazer essas necessidades humanas. Se um objecto não satisfaz nenhuma
necessidade humana, então não tem valor económico. De entre as coisas com valor
económico, a afectação das que estão disponíveis em quantidades ilimitadas não são um
problema porque o indivíduo consegue sempre apropriar a quantidade suficiente para
satisfazer as suas necessidades. Assim, a Economia concentra-se nos bens ou serviços úteis e

40
que são escassos. Também têm relevância económica as coisas que sendo prejudiciais ao
bem-estar, a sua destruição ou armazenamento obriga a despender recursos escassos, como
por exemplo, o lixo e a poluição.

O valor das coisas (i.e., a sua utilidade) é subjectiva pois depende dos gostos e preferências da
pessoa que as vai consumir ou fruir.

A aceitação do utilitarismo como princípio moral que rege a vida do indivíduo inviabiliza a
existência de uma economia centralizada eficiente. Isto porque, ao nível de um país, o agente
central não tem conhecimento sobre os gostos dos indivíduos.

Princípio da Comparabilidade (entre cabazes de bens e serviços): Se considerarmos um


cabaz A formado pelas quantidades a1 e a2 de dois bens ou serviços abstractos, A = (a1, a2), o
ser humano é capaz de o comparar com outro qualquer cabaz B = (b1, b2) formado por
quantidade diferentes dos mesmos bens ou serviços. O indivíduo pode considerar que o cabaz
B é pior, análogo, ou melhor, que o cabaz A. Esta comparação permite que o indivíduo prefira
o cabaz A ao B, esteja indiferente entre A e B ou prefira o cabaz B ao A, exclusivamente.

Princípio da Transitividade da Comparação: A transitividade das comparações traduz que


as escolhas do consumidor são consistentes. Se, por exemplo, A é melhor que B e B é melhor
que C, então A é melhor que C. Vamos codificar “melhor que” como >; “análogo a” como =;
e “pior que” como <;

Exercício 2.1. Considere os cabazes, A, B, C e D. Se A = B, B > C e C = D como se compara


A com D? Se A = B e B = C como se compara A com C? Se A = B, B = C e C = D como se
compara A com D? Se A = B, B = C e C = D como se compara A com D?

R: A > D; A = C; A = D; Não se sabe.

Princípio da Insaciabilidade: O ser humano prefere sempre apropriar uma maior


quantidade/qualidade de bens ou serviços. Sendo que, em termos de quantidade, isso não é
uma verdade incontestável, se pensarmos em termos de qualidade já se torna perfeitamente
aceitável este princípio teórico. Por exemplo, apesar de não querermos consumir maior

41
quantidade de comida, preferíamos comida mais saborosa (i.e., de maior qualidade). A
insaciabilidade é importante na definição teórica das escolhas do indivíduo. Sendo o cabaz
A = (a1, a2) e o cabaz B = (b1, b2), pela insaciabilidade termos que (ver fig. 2.1) :

B é pior que A se a1 > b1 e a2 = b2; ou se a1 = b1 e a2 > b2.

B é melhor que A se a1 = b1 e a2 < b2; ou se a1 < b1 e a2 = b2.

Fig.2.1 – Aplicação da insaciabilidade na comparação de cabazes

Taxa marginal de substituição: Sendo o cabaz A = (a1, a2), existe uma proporção k que faz o
cabaz B = (a1 + δ; a2 + δ.k) análogo a A (em que δ é uma quantidade infinitesimal e k uma
constante de valor negativo). Isto traduz que se eu substituir a quantidade infinitesimal δ do
bem 1 pela quantidade δ.k do bem 2, o indivíduo fica indiferentes entre os dois cabazes. Este
princípio permite-me começar a preencher as zonas “incomparáveis” da fig. 2.1. A proporção
k denomina-se por taxa marginal de substituição de a1 por a2 e traduz a inclinação da linha de
fronteira que separa a zona dos cabazes melhores que A da zona dos cabazes piores que A. O
principio da insaciabildiade obriga a que a proporção k seja negativa: quando aumenta a
quantidade de um bem, para eu ficar com um cabaz equivalente, tenho que diminuir a
quantidade do outro bem ou serviço (ver, fig.2.2). A insaciabilidade diz que o aumento de
quantidade de ambos os bens transforma o cabaz noutro melhor e vice-versa.

42
Fig.2.2 – Aplicação da substituibilidade na comparação de cabazes

Curva de indiferença: Se eu continuar a aplicar a “substituição” de um pouco do bem 1 por


um pouco do bem 2 (e vice-versa), vou traçando uma linha que contêm todos os cabazes
análogos ao cabaz A. Como o indivíduo é indiferente entre os cabazes que formam essa linha,
esta denomina-se por curva de indiferença e separa a zona dos capazes melhores que A da
zona dos cabazes piores que A. A taxa marginal de substituição entre o bem 1 e o bem 2
indica a inclinação da curva de indiferença em cada ponto, i.e., a derivada da curva de
indiferença (ver fig. 2.3).

Evolução da taxa marginal de substituição com a quantidade: Para termos uma “teoria
bem comportada” (i.e., de que resultem curvas de procura contínuas e decrescentes) é
necessário que qualquer linha que una dois cabazes da curva de indiferença passe apenas pela
zona dos cabazes melhores que A, o que, em termos matemáticos, traduz que a CI é convexa.
Esta característica obriga a que a taxa marginal de substituição (a inclinação da CI) diminua
da esquerda para a direita. Esta característica é aceitável em termos económicos já que traduz
que se eu tiver uma pequena quantidade do bem 1, apenas trocarei uma unidade desse bem
por uma quantidade grande do bem 2 (k será grande em grandeza). Se, pelo contrário, eu tiver
uma grande quantidade do bem 1, então estarei disponível para trocar uma unidade desse bem
por uma quantidade mais pequena do bem 2 (k será pequeno em grandeza): Em termos
relativos, quanto mais escasso for um bem ou serviço, maior será o seu valor unitário.

43
Fig.2.3 – Curva de indiferença

Exercício 2.2. Um indivíduo tem como curva de indiferença y = 100/x. Qual é, em A = (x, y)
= (5, 20), a taxa marginal de substituição do bem X pelo bem Y? E no cabaz B = (20, 5)?

R: TMSxy = y’ = –100/x2 ⇒ TMSA = –4: quando tenho 5 unidades do bem X, para compensar
a perda de uma unidade do bem X, necessito de adquirir 4 unidades do bem Y; TMSB = –
0.25: quando tenho 20 unidades do bem X, para compensar a perda de uma unidade do bem
X, apenas necessito de adquirir 0.25 unidades do bem Y.

Posso caracterizar as preferências do indivíduo por um conjunto de curvas de indiferença.


Comparando duas curvas de indiferença, pelo princípio da insaciabilidade, as que estão à
direita e acima contêm cabazes que são preferíveis aos que se encontram nas curvas de
indiferenças à esquerda e abaixo (ver, fig.2.4).

Fig.2.4 – Curvas de indiferença “melhores”

44
As curvas de indiferença nunca se intersectam. Por
redução ao absurdo, observando a figura ao lado e
atendendo à insaciabilidade, o cabaz D é preferível ao
cabaz A porque contém mais do bem 1 e do bem 2. Mas,
o cabaz B que é análogo ao cabaz A (está sobre a mesma
C.I.) é preferível ao cabaz C que é análogo ao cabaz D,
resultando ser o cabaz A preferível ao cabaz D.

Exercício 2.3. Conhecem-se duas curvas de indiferença de um individuo, CI1: a2 = 100/a12 e


CI2: a2 = 10/a12. i) Verifique que estas duas curvas não se intersectam. ii) Qual das duas
curvas contêm cabazes preferíveis? iii) Calcule e interprete a taxa marginal de substituição em
A = (5, 4) e em B = (2.5, 1.6) e verifique se estão de acordo com a teoria.

R: i) Teria que haver um ponto em que as curvas coincidissem: a2 = 100/a12 e a2 = 10/a12 ⇔


100/a12 = 10/a12 ⇔ 100 a12 = 10 a12 ⇔ a1 = 0 e a2 = +8 , mas este ponto não faz parte de IR2.
ii) Pegando num cabaz de CI1, A = (10, 1), existe em CI2 o cabaz B = (10, 0.1) que é pior que
A pelo que os cabazes da CI1 são preferíveis aos cabazes da CI2. iii) Em A pertence à CI1:
TMSA = –200/a13 = – 1.6, preciso de 1.6 unidades do bem 2 para compensar a perda de uma
unidade do bem 1. B pertence à CI2: TMSA = –20/a13 = –1.28, preciso de 1.28 unidades do
bem 2 para compensar a perda de uma unidade do bem 1. Apesar de eu ter menor quantidade
do bem 1, como estou em curvas de indiferença diferentes, não se verifica necessariamente o
princípio de que a TMS diminui da esquerda para a direita (quando a quantidade do bem 1
aumenta).

2.1.2. Função de utilidade

Poderíamos avançar com uma análise das escolhas do consumidor usando apenas a
representação gráfica das curvas de indiferença. No entanto, para modelizar de forma
matemática a Teoria do Consumidor, torna-se necessário atribuir um número a cada curva de
indiferença de tal forma que uma curva de indiferença com cabazes preferíveis terá que ter
associado um número superior. A esse número chama-se nível de utilidade e com ele
constrói-se uma Função de Utilidade que dá as curvas de indiferença de forma implícita.

45
Podemos obter a taxa marginal de substituição num determinado cabaz sem explicitar a forma
funcional da curva de indiferença que lá passa. Para isso usa-se o teorema da derivação da
função implícita (não nos vamos concentrar na apresentação deste teorema porque não tem
importância económica e o tema será tratado em Matemática I).

∂U ( x, y )
Sendo y(x) dada implicitamente por U ( x, y ) = q ⇒ TMSxy =
dy
=− ∂x .
dx ∂U ( x, y )
∂y

Função ordinal: A função de utilidade denomina-se por ordinal porque a magnitude da


utilidade apenas é considerada em termos relativos (de ordenação). Se, por exemplo, o cabaz
A for melhor que o cabaz B, então basta que U(A) seja maior que U(B), não interessando a
magnitude da diferença (ver Ex2.4). No caso de a magnitude ser importante, denomina-se a
função por cardinal (e.g., no modelo do risco).

Ex2.4. Os gostos e preferências de um agente económico condensam-se na função de


utilidade U(a1,a2) = a1.a2. i) Determine a curva de indiferença que passa pelo cabaz A =
(5,10). ii) Verifique que as funções V(a1,a2) = ln(a1) + ln(a2) e Z(a1,a2) = a14. a24 condensam as
mesmas preferências que U(a1,a2). iii) Calcule directamente de U(a1,a2) e de Z(a1,a2) e
interprete a taxa marginal de substituição em A = (10, 10).

R: i) U(5, 10) = 50 ⇒ a2 = 50/a1.

ii) V(5, 10) = ln(5) + ln(10) = 3,912 ⇔ ln(a2) = 3,912 – ln(a1) ⇔ a2 = 50/a1; Z(5, 10) =
6.25E6 ⇔ a24 = 6.25E6/a14 ⇔ a2 = 50/a1

iii) TMS = – U’a1/U’a2 = – a2/a1 = –10/5 = –2; TMS = – Z’a1/Z’a2 = – a12 a23/a13 a22 = a2/a1 =
–10/5 = –2, em A, preciso de 2u. do bem 2 para compensar a perda de 1u. do bem 1.

2.2. Restrição orçamental

É sabido que, em termos genéricos, o estudo da Economia está dependente da circunstância


de a quantidade disponível de bens e serviços ser limitada e inferior às necessidades. Em
termos individuais, o consumidor tem um rendimento nominal (i.e., em euros) que aplica na
aquisição de bens ou serviços cujos preços de mercado são dados (o agente é price taker). O
rendimento disponível das famílias tem origem principalmente nos salários (ver, Tab. 2.1),

46
sendo também importantes os rendimentos do capital (e.g., dividendos) e as transferências do
estado (e.g., rendimento de inserção social). É normal usar a família como a célula individual
de decisão económica porque as decisões dos seus membros estão interligadas (em média,
metade dos seus membros não tem rendimento).

Sector de actividade principal Portugal Norte Centro Lisboa Alentejo Algarve Açores Madeira

Todos os sectores 736 684 648 899 685 687 637 693

Agricultura, silvicultura e pesca 507 446 502 646 567 456 512 522

Indústria, construção, energia e água 662 619 591 883 676 656 551 635

Serviços 787 749 696 905 710 708 687 721


Tab. 2.1 - Salário médio mensal líquido 2007, trabalhadores por conta de outrem
(€/mês, 14 meses por ano. www.ine.pt)

Ex2.5: Um determinado aluno tem 600 € /mês de rendimento que pode gastar em alimentação
cujo preço é 5€/u., vestuário cujo preço é 10€/u. e habitação cujo preço é 100€/u.. Qual será o
cabaz que o aluno pode consumir em cada mês?

R: Qualquer cabaz X = (a, v, h) que custe menos que o rendimento, 5a + 10v + 100h = 600.

Tal como consideramos para as curvas de indiferença (e.g., fig.2.4), tomemos o exemplo de
um cabaz genérico com dois bens ou serviços, A = (a1, a2). Neste caso, a restrição orçamental
vem dada por p1.a1 + p2.a2 = r, podendo ser representada graficamente (ver, Fig.2.5).

Fig.2.5 – Restrição orçamental

47
Recta orçamental: Denomina-se a linha fronteira entre a zona dos cabazes que o indivíduo
pode adquirir da zona de cabazes que o indivíduo não pode adquirir por recta orçamental, RO.
O indivíduo ao adquirir um cabaz sobre a RO esgota o rendimento, p1.a1 + p2.a2 = r. Podemos
explicitar a RO, a2 = r/p2 – a1.p1/p2 e verificar que na intersecção com o eixo vertical (i.e., a1
= 0) a RO vale r/p2, na intersecção com o eixo horizontal (i.e., a2 = 0) a RO vale r/p1, e que a
inclinação da RO vale – p1/p2. A intersecção com o eixo vertical traduz o máximo que o
indivíduo pode comprar do bem 2 enquanto que a intersecção com o eixo horizontal traduz o
máximo que pode comprar do bem 1. A inclinação da RO traduz que para comprar mais uma
unidade do bem 1 eu tenho que abdicar de comprar – p1/p2 unidades do bem 2: é idêntico à
TMS mas aqui pretendo manter a despesa constante (e igual ao rendimento), enquanto na
TMS pretendo manter o nível de utilidade constante. Esta inclinação denomina-se por Custo
de Oportunidade (que é um conceito muito importante mas que não desenvolvo aqui por estar
mais associado à Teoria do Produtor).

Ex2.6: Um indivíduo tem de rendimento disponível 1000€/mês que gasta em alimentação e


habitação, (a, h), cujos preços unitários são 2.5€/u. e 5€/u., respectivamente. i) Qual a
quantidade máxima de alimentação e de habitação que o individuo pode adquirir? ii) Sobre a
RO, quantas unidade de alimentação tem que abdicar para adquirir mais uma unidade de
habitação? iii) Verifique se o indivíduo pode adquirir o cabaz (a, h) = (200, 150).

R: i) amax = 1000/2.5 = 400u.; hmax = 1000/5=200u. ii) Para manter a despesa sobre a RO,
tem que abdicar de 2 unidades de a por cada unidade a mais de h: –ph/pa = –5/2.5 = –2. iii)
Não pode adquirir pois a despesa, 200*2.5+150*5 = 1250€, seria maior que os 1000€ de
rendimento disponível.

Bens privados e bens públicos. No exemplo anterior os bens são privados no sentido de que
o indivíduo para os consumir tem que gastar na sua aquisição parte do rendimento que tem
disponíveis (principio da exclusão: quem não paga, não tem) e, por outro lado, os outros
indivíduos deixam de o poder consumir (princípio da rivalidade: se eu consumo, mais
ninguém consome). No entanto, existem bens ou serviços que não têm estas características: os
Bens Públicos: e.g., eu posso usufruir da iluminação de uma rua que não prejudico o consumo
de outros bens (é-me gratuito pois é paga pela Câmara Municipal) e o meu consumo em nada
diminui as possibilidades dos outros indivíduos usufruírem da iluminação. Normalmente, o

48
custo marginal de produzir (ou usufruir) um bem público é próximo de zero e muito menor
que o custo fixo (conceitos a desenvolver no capítulo da teoria do produtor). Há ainda os bens
comuns (não-exclusão e rivalidade) e os bens de clube (exclusão e não-rivalidade).

Efeito na RO da alteração do rendimento: Quando o rendimento aumenta (e os preços se


mantêm), o indivíduo pode consumir cabazes mais recheados. Em termos gráficos, este
acontecimento traduz-se por um deslocamento da RO para a direita e para cima (ver Fig.2.6).
Quando o rendimento diminui, passa-se exactamente o contrário: deslocando-se a RO para a
esquerda e para baixo. Como o declive traduz o rácio entre os preços (dado por –p1/p2), o
deslocamento da RO induzido pela alteração do rendimento dá origem a uma nova RO
paralela à inicial.

Fig.2.6 – Efeito da alteração do rendimento na RO

Ex2.6: Sendo que um indivíduo tem de rendimento disponível 500€/mês que gasta em dois
bens, (x, y), cujos preços unitários são 2€/u. e 5€/u., respectivamente. i) Represente
graficamente a RO ii) Represente graficamente um aumento no rendimento de 100€/mês.

R: i) 2x + 5y = 500 ⇔ y = 100 – 0.4x ⇒ posso localizar os pontos extremos (0;100) e (250;0)


e uni-los por uma recta (linha azul) ; ii) 2x + 5y = 600 ⇔ y = 120 – 0.4x ⇒ posso localizar os
pontos extremos (0;120) e (300,0) e uni-los por uma recta (linha rosa).

49
120

100

80

60
y
40

20

0
0 50 100 x 150 200 250 300

Efeito na RO da alteração dos preços: Quando um preço se altera, a intersecção com o eixo
que representa o bem ou serviço respectivo também se altera mas em sentido contrário. Esse
facto resulta de o ponto de intersecção ser a quantidade que eu posso comprar e por isso
inversamente proporcional ao preço, r/p: Quanto mais barato for o bem ou serviço, maior
quantidade posso comprar. Na Fig. 2.7, represento uma alteração da RO quando o preço do
bem representado no eixo dos yy diminui (mantendo-se o rendimento e o preço do bem
representado no eixo dos xx).

Fig.2.7 – Efeito da diminuição do preço do bem 2 na RO

A RO altera-se de forma análoga, mutatis mutandis, quando acontece uma diminuição do


preço do bem representado no eixo dos xx, situação que represento na Fig 2.8 (mantendo-se o
rendimento e o preço do bem representado no eixo dos yy).

50
Fig.2.8 – Efeito da diminuição do preço do bem 1 na RO

mutatis mutandis: Expressão latina que traduz “mudando o que tem que ser mudado”. É
aplicado na comparação de situações que são diferentes mas entre as quais existe alguma
analogia. e.g., o ser humano, mutatis mutandis, é anatomicamente igual ao rato.

Ex2.7: Sendo que um indivíduo tem de rendimento disponível 500€/mês que gasta em dois
bens, (x, y), cujos preços unitários são 2€/u. e 5€/u., respectivamente. i) Represente
graficamente a RO e ii) o efeito na RO de o preço do bem y passar a ser 10€.

R: i) inicialmente, 2x + 5y = 500 ⇔ y = 100 – 0.4x ⇒ pontos extremos (0; 100) e (250; 0);
depois, ii) 2x + 10y = 500 ⇔ y = 50 – 0.2x ⇒ pontos extremos (0; 50) e (250, 0).

120
Y

100
py = 5€/u.
80

60
py = 10€/u.
40

20

0
0 50 100 150 200 250 X
300

51
Pela comparação das Fig.2.6, Fig.2.7 e Fig.2.8, vemos que uma alteração do rendimento é
equivalente a uma alteração proporcional e de sinal contrário de ambos os preços. Por
exemplo, o aumento do rendimento em 1% é equivalente à descida de ambos os preços em
1%. Isto traduz, e veremos com mais pormenor em ponto posterior, que uma alteração da RO
pode ser decomposta numa alteração dos preços relativos (a rotação da RO) e numa alteração
do rendimento (o deslocamento da RO).

2.3. Decisão do consumidor – Escolha do cabaz.

Agora que já introduzi os conceitos de Curva de Indiferença e de Restrição Orçamental, posso


avançar para a decisão do consumidor que, sob o princípio de que o consumidor é
optimizador, será a escolha do melhor cabaz possível (e que resulta da insaciabilidade) dada
a restrição orçamental (que contem o rendimento e os preços de mercado como um dado).

Em termos gráficos, vamos reunir um exemplo de uma restrição orçamental com uma curva
de indiferença de nível de utilidade U1 (Fig.2.9). No caso representado, devido ao princípio da
insaciabilidade, qualquer cabaz à direita da CI e abaixo da RO é ainda possível de adquirir e
existem nessa área cabaz melhores que os que se localizam em U1, (os contidos na zona azul).

Fig.2.9 – Escolha do consumidor (1)

Então, o cabaz óptimo obriga a considerar outra CI mais à direita e acima, por exemplo a CI
de nível de utilidade U2 > U1. No entanto, ainda é possível a aquisição de cabazes melhores
que os da curva U2 (a zona vermelha da Fig.2.10).

52
Fig.2.10 – Escolha do consumidor (2)

Na melhor das hipóteses, o consumidor pode escolher um cabaz sobre a CI cujo nível de
utilidade é U3 > U2 > U1 (ver Fig.2.11). Neste caso limite, a CI é tangente à RO e o cabaz
óptimo encontra-se exactamente no ponto de tangencia. Em termos matemáticos, no cabaz
óptimo teremos que a taxa marginal de substituição (a inclinação da Curva de Indiferença) é
igual ao custo de oportunidade (a inclinação da Recta Orçamental): –U’x/U’y = –px/py.

Fig.2.11 – Escolha do consumidor (3)

Ex2.8: Sendo que um indivíduo tem de rendimento disponível 500€/mês que gasta em dois
bens, (x, y), cujos preços unitários são 2€/u. e 5€/u. respectivamente, e os seus gostos se
podem condensam-se na função de utilidade U(x,y) = x.y. i) Determine o cabaz óptimo. ii)
verifique que o cabaz óptimo não se altera se a utilidade se condensar em V(x,y) = x4.y4.

53
R: A inclinação da RO é –2/5 = –0.4. i) A TMSxy genérica é – U’x / U’y = –y/x. Então no
cabaz óptimo (y/x = 0.4 e 2x + 5y = 500) ⇒ (y = 0.4x e 2x + 2x = 500) ⇒ (x, y) = (125, 50);
ii) A TMSxy mantém-se, – U’x / U’y = – (3x2.y3)/(3x3.y3) = –y3/x3 = –y/x, pelo que o cabaz
óptimo também se mantém.

Generalização a cabazes em IRn: Podemos facilmente generalizar a primeira condição de


optimização a cabazes com n bens ou serviços (havendo necessidade ainda de que se verifique
a restrição orçamental). Esta forma é muito mais simples de memorizar.

U '1 p U' U' U 'i


Em IR 2 , − =− 1 ⇔ 1 = 2 ⇒ Em IR n ⇒ ∀i, =k
U '2 p2 p1 p2 pi

Esta condição também garante que, apesar de a função de utilidade ser diferente de
consumidor para consumidor, é possível que todos os consumidores igualem o mesmo preço
de mercado à sua utilidade marginal. Apesar da função de utilidade ser diferente de pessoa
para pessoa, utilidade marginal será igual para todos (a menos de um factor de escala).

Ex2.9: Um determinado aluno tem 600 € /mês de rendimento que pode gastar em alimentação
(5€/u.), vestuário (10€/u) e habitação (100€/u.). Sendo que as seus gostos se podem condensar
na função de utilidade U(a, v, h) = a.v.h, determine o cabaz óptimo do aluno.

R: (a, v, h) = (40, 20, 2). Como temos três bens, temos que ter um sistema com três equações:

U 'a U 'v U 'v U 'h 


 = ; = ; a. pa + v. pv + h. ph = 600 Resolvendo, vem
 pa pv pv ph 

10v = 5a a = 2v − a = 40
 v.h a.h a.h a.v     
 = ; = ; −  ⇔ 100h = 10v ⇔ h = 0.1v ⇔ − ⇔ h = 2
 5 10 10 100  − − 10v + 10v + 10v = 600 v = 20
   

Formalização matemática do problema de optimização: A escolha do cabaz óptimo obriga


a utilizar a (primeira) condição de optimização que foi obtida de forma gráfica. No entanto,
podemos formalizar o problema de optimização do consumidor em termos matemáticos e
resolvê-lo:

54
{( x, y) : V = MaxU ( x, y), sa x. p x + y. p y = r}

Este modelo de extremos com uma equação de ligação pode ser tratado genericamente
utilizando a equação Lagrangeana (tema tratado aprofundadamente em Matemática I).

 Lx = 0 U x + λ . px = 0 U x U y
   =
L = U ( x, y ) + λ .( x. px + y. p y − r ) ⇒  Ly = 0 ⇒ U y + λ . p y = 0 ⇒  px py
  
 Lλ = 0  x. px + y. p y = r  x. px + y. p y = r

A lagrangeana, por ser um método geral, permite introduzir várias restrições (com um
multiplicadores por restrição), contrariamente ao uso da igualdade de Jevon que apenas é
complementada pela restrição orçamental.

Também podemos resolver este problema de optimização por incorporação da equação de


ligação na função a optimizar. Desta forma determina-se a quantidade de um dos bens, e.g., x:

{x : V = MaxU ( x, r / p y − x. p x / p y )}

E, substituindo a solução na equação de ligação, obtemos a quantidade do outro bem.

Ex2.10: Um indivíduo tem 1000 €/mês de rendimento que pode gastar em alimentação (5€/u.)
ou habitação (10€/u.) e os seus gostos condensam-se na função U(a, h) = a + 2h + a.h.
Determine i) o seu cabaz óptimo; e ii) a elasticidade preço da procura de alimentos e a
elasticidade preço-cruzado da procura de habitação.

R: i) (a, h) = (100, 50). O problema é {( a, h) : V = Max[a + 2h + a.h], sa 5a + 10h = 1000}

[ ]
⇒ V = Max[(200 − 2h) + 2h + (200 − 2h).h ] ⇒ V = Max 200 + 200h − 2h 2 ⇒ 200 − 4h = 0
⇒ h = 50 e a = 100 .

ii) Vou aumentar o preço de a em 1%: {( a, h) : V = Max[a + 2h + a.h], sa 5.05a + 10h = 1000}

[
⇒ V = Max[(198.02 − 1.98h) + 2h + (198.02 − 1.98h).h] ⇔ V = Max 198.02 + 198.04h − 1.98h 2 ]
⇒ 198.04 − 3.96h ⇔ h = 50.005 e a = 99
 99 − 100   50.005 − 50 
ea pa =   / 1% = −1.005; eh pa =   / 1% = 0.010 .
 99.5   50.0025 

Também se poderia calcular a elasticidade com a resolução para um preço genérico e o


cálculo analítica da elasticidade

55
{( x, y) : V = Max[a + 2h + a.h], sa pa .a + 10h = 1000}
1 + h 2 + a  505
 =  pa .a = 10 + 10h − 2 pa − a = −1
 pa 10 ⇔ ⇔ ⇔ pa
 p .a + 10h = 1000  pa .a + 10h = 1000 10 + 10h − 2 pa + 10h = 1000 h = 49.5 + 0.1 p
 a  a

da pa 505 pa dh pa 0 .1 0 .1
ea pa = . =− 2 = −1; ehpa = . = = = 0.01
dpa a pa 505 / pa dpa h 49.5 / pa + 0.1 9.9 + 0.1

Carne\preço P. Vaca P. Porco P. Frango


C. Vaca –0.65 0.01 0.20
C. Porco 0.25 –0.45 0.16
C. Frango 0.12 0.20 –0.65
Tab. 2.2 – Estimativa da elasticidade preço-cruzado da procurada (eqx,py)
(Fonte: Besanko, 2ªed, Table 2.5)

Efeito de uma alteração do preço: Quando se altera o preço de um bem ou serviço, resulta
uma alteração em sentido contrário na quantidade consumida do bem ou serviço respectivo
mas também é possível que ocorra uma alteração na quantidade consumida dos outros bens.
Do aumento do preço resulta sempre numa diminuição da quantidade consumida do bem
correspondente. Na Fig.2.12 representa-se uma diminuição do preço do bem 1.

Fig.2.12 – Efeito de uma alteração do preço

56
Na Fig.2.12, quando o preço do bem 1 é px1, o cabaz óptimo a adquirir é o representado pelo
ponto A. Quando ocorre uma diminuição do preço do bem 1, a recta orçamental roda para a
esquerda (no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio) pelo que o indivíduo pode passar
para uma curva de indiferença mais à direita (melhor) da inicial. Desta forma passa a adquirir
o cabaz representado pelo ponto B que tem maior quantidade do bem 1 (e do bem 2).
Podemos ver o que acontece com o aumento do preço revertendo a análise (passar de px2 para
px1).

Bens substitutos, complementares e independentes: Quando o preço de um bem varia, a


quantidade adquirida dos outros bens também varia. Quando acontece um aumento do preço
do bem X, se a quantidade procurada do bem Y aumenta, então Y é um bem substituto do
bem X. Se a quantidade procurada do bem Y diminui, então Y é um bem complementar do
bem X. Se a quantidade procurada do bem Y se mantém, então Y é um bem independente do
bem X. Notar que estas definições têm subjacente que existe um preço concreto para o outro
bem e que estamos na condição de ceteris paribus.

Apesar de parecer que é suficiente termos uma TMS decrescente para que os bens sejam
substitutos, tal não é verdade. Por exemplo, no caso da função de utilidade isoelástica,
u = xy , a TMS = − y / x vai diminuindo em grandeza mas veremos que os bens x e y são

independentes, y ( p y , p x ) = 0.5r / p y e x( p x , p y ) = 0.5r / p x . Quando praticar os exercícios

sobre a determinação das curvas de procura, o aluno irá compreender melhor como se obtêm
esta duas funções de procura.

Efeito de uma alteração do rendimento: Quando o rendimento disponível aumenta,


acontece um deslocamento da recta orçamental para a direita (e para cima) pelo que a situação
do indivíduo melhora. O aumento do rendimento, em termos gerais, induz um aumento das
quantidades adquiridas dos bens ou serviços considerados no cabaz (ver Fig.2.13). No
entanto, também pode acontecer que a quantidade procurada de um (ou de alguns) dos bens
ou serviços (mas nunca de todos devido ao princípio da insaciabilidade) diminua.

57
Fig.2.13 – Efeito de um aumento do rendimento

Bens inferiores e bens normais (de primeira necessidade e de luxo): Se, quando o
rendimento aumenta, a quantidade consumida aumentar, temos um bem ou serviço normal.
De entre os bens normais, se a quantidade adquirida aumentar pouco (se a elasticidade da
quantidade relativamente ao rendimento for menor que 1), temos um bem ou serviço de
primeira necessidade; se a quantidade adquirida aumentar muito (se a elasticidade da
quantidade relativamente ao rendimento for maior que 1), temos um bem ou serviço de luxo.
Se, pelo contrário, a quantidade consumida diminuir, temos um bem inferior. Um exemplo
de bem ou serviço inferior é a estadia em parques de campismo (em relação com a estadia em
hotéis).

Para um gestor de um produto interessa saber que tipo de bem coloca no mercado pois, por
exemplo, se o seu produto for de primeira necessidade, as suas vendas vão evoluir de forma
menos positiva que a economia no geral, passando-se o contrário em períodos de crise.

Efeito substituição e efeito rendimento: Quando se verifica uma alteração de um preço, por
um lado, a recta orçamental roda e, por outro lado, desloca-se. O efeito substituição (também
se pode considera como o efeito da alteração dos preços relativos) quantifica a alteração do
cabaz que resulta da rotação da recta orçamental mas compensado o rendimento de forma
que o indivíduo fica sobre a mesma curva de indiferença. O efeito rendimento (também se
pode considerar como o efeito da alteração do rendimento real, rever p. 52) quantifica a
alteração do cabaz que resulta do deslocamento da recta orçamental (depois de introduzido o
efeito substituição) e traduz passar-se de uma curva de indiferença para outra. Estes conceitos

58
são importantes porque estão por detrás do cálculo da taxa de inflação (i.e., na escolha dos
ponderadores utilizados no cálculo do índice de preço) e no cálculo do rendimento real (i.e., a
preços constantes) dos consumidores. Esta decomposição, apesar de se dever ao trabalho de
Hicks e Allen* e ser ligeiramente diferente do considerado no trabalho original de Slutsky**,
por ser este último ser o trabalho pioneiro, é normal denominar esta divisão do efeito da
alteração dos preços como decomposição de Slutsky.

A função que relaciona a quantidade procurada com o preço, compensando o rendimento de


forma a manter o mesmo nível de utilidade, denomina-se de Procura Hicksiana (ou procura
rendimento compensado).

Na Fig.2.14, inicialmente estamos na recta orçamental (e na CI) azul de que resulta o cabaz
óptimo representado pelo ponto A = (a1, a2). Posteriormente, acontece um aumento do preço
do bem 1 para o dobro, passando o cabaz óptimo a ser o representado pelo ponto B. Indo para
a Fig.2.15, vemos que o efeito substituição se traduz pela alteração do cabaz do ponto A para
o ponto A’ = (a1+ ESx, a2 + ESy) em que os preços são os novos mas o rendimento do
indivíduo é compensado de forma a manter o mesmo nível de utilidade (RO cor de laranja). O
efeito rendimento traduz-se pela passagem do cabaz do ponto A’ para o cabaz do ponto B =
(a1+ ESx + ERx, a2 + ESy + ERy) e mede quanto o indivíduo piora pela não compensação do
rendimento.

Fig.2.14 – Efeito substituição e efeito rendimento (1)

*
Hicks, J. e Allen (1934), “A reconsideration of the theory of Value”, Economica, 1, pp. 54-76 e 196-219
**
Slutsky, Yevgeni (1915), “Sulla teoria del bilancio del consumatore”. Giornale degli Economisti, 51: 1–26.

59
Fig.2.15 – Efeito substituição e efeito rendimento (2)

Reparar que o aumento do preço de um bem ou serviço tem como efeito substituição a
diminuição da quantidade procurada do bem cujo preço aumenta (na Fig.2.15, ESx < 0) e o
aumento da quantidade procurada de todos os outros bens ou serviços, (na Fig.2.15, ESy > 0)
e vice-versa.

Em termos infinitesimais podemos partir do ponto inicial A e somar a alteração do cabaz


mudando os preços e mantendo a utilidade fixa (Fig. 2.16, vector As–A) à alteração do cabaz
mudando o rendimento e mantendo os preços fixos (Fig. 2.16, vector Ar–A):

dx ∂x ∂x
= dp + dR
dp ∂p U * dR p*

Fig.2.16 – Efeito substituição e efeito rendimento (3)

60
Também podíamos decompor o efeito total determinando primeiro o efeito rendimento
(mantendo os preços iniciais e deslocando a RO para a nova CI) e depois determinando o
efeito substituição (rodando a RO sempre tangente à nova CI). Os resultados não são
necessariamente iguais mas serão idênticos (Fig. 2.15, As–A ≈ B–Ar e Ar–A ≈ B–As).

Apesar de não haver uma alteração do rendimento (nominal), existe “efeito rendimento”
porque, em termos económicos, um aumento dos preços (e.g., para o dobro) é equivalente a
uma diminuição do rendimento (para metade), ver p. 52.

Os preços evoluem ao longo do tempo e, no fim de cada período (e.g., cada ano), nas
negociações salariais o trabalhador procura retornar, em termos de utilidade, pelo menos à
situação de partida, i.e., voltar do ponto B para o ponto A’. Sendo que nessa negociação é tido
em conta a evolução dos preços (i.e., a taxa de inflação), então, a compensação do rendimento
necessária para voltar à situação inicial, em termos percentuais, será a exacta medida dessa
taxa de inflação.

EX2.11. Um indivíduo tem de rendimento disponível 500€/mês que gasta na aquisição de


dois bens, (x, y), cujos preços unitários são 5€/u. e 10€/u., respectivamente, e os seus gostos
podem-se condensar na função de utilidade U(x,y) = x + 2y + x.y. i) Quantifique o efeito
substituição e o efeito rendimento nos bens x e y de um aumento do preço de x para 10€. ii)
Determine a taxa de inflação.

1 + y 2 + x  x = 50
 = 10(1 + y ) = 5(2 + x) 2 y = x 
R:  5 10 ⇔ ⇔ ⇔  y = 25
 5 x + 10 y = 500 −  10 y + 10 y = 500 U = 1350

Vou determinar o cabaz que, com os novos preços, mantém o nível de utilidade U = 1350:

1 + y 2 + x
 10 = 10 10(1 + y ) = 10(2 + x)  y = x +1
  
 x + 2 y + x. y = 1350 ⇔ − ⇔  x + 2 x + 2 + x 2 + x = 1350 ⇔
10 x + 10 y = R − −
  

 x 2 + 4 x − 1348 = 0  x = 34,77u.
 
− ⇒  y = 35,77u.
_  R = 705,40€
 

O efeito substituição em x é 34.77–50 = –15.23u. e em y é 35.77–25 = +10.77u.

61
O efeito rendimento é a diferença para o novo cabaz óptimo:
U 'x U ' y 1 + y 2 + x
P = P  = 10(1 + y ) = 10(2 + x) y = x +1
 x y ⇔  10 10 ⇔ ⇔
 P .x + P . y = R  10 x + 10 y = 500 −  20 y + 10 = 500
 x y

⇔ x = 24.5; y = 25.5
O efeito rendimento em x é 24.5 – 34.77 = –10.27u. e em y é 25.5–35.77 = – 10.17u.

ii) Para manter o nível de utilidade seria necessário (para adquirir x =34.77u. e y = 35.77u.),
aumentar o rendimento para 705.40€, logo, a inflação foi de 705.40/500–1 = 41.1%.

Dificuldade empírica de determinação do rendimento compensado: Como a função de


utilidade não é observável, não é empiricamente possível determinar qual a compensação do
rendimento necessário para que o individuo volte ao mesmo nível de utilidade. Então, não é
possível determinar a “verdadeira” taxa de inflação. Como, em termos empíricos, apenas é
conhecido o perfil de consumo do indivíduo (i.e., o cabaz A e o cabaz B) e os preços de
mercado, teremos que os usar para obter uma estimativa da taxa de inflação.

Existem duas alternativas. Na primeira, denominada de índice de Laspeyres (ver Fig.2.17),


compara-se a despesa inicial, p x , 0 x0 + p y , 0 y0 , com a despesa “final” p x ,1 x0 + p y ,1 y0 que seria

necessária para voltar a adquirir, aos novos preços (px,1; py,1), o cabaz de bens adquirido
inicialmente, i.e., o cabaz A = (x0; y0),:

I L = ( p x ,1 x0 + p y ,1 y0 )/ ( p x ,0 x0 + p y , 0 y0 ) .

Fica claro na figura que, se o rendimento for actualizado com a medida da taxa de inflação de
Laspeyres, quando a inflação é positiva, o consumidor fica numa situação melhor que a do
início do período (pois, com a RO cor de laranja, pode atingir uma curva de indiferença
superior à inicial).

62
Fig.2.17 – Compensação do rendimento com o índice de Laspeyres

Na segunda alternativa, denominada de Índice de Paasche (ver Fig.2.18), compara-se a


despesa final, px ,1 x1 + p y ,1 y1 , com a despesa “inicial” p x , 0 x1 + p y ,0 y1 que seria necessária para

adquirir, aos preços antigos (px,0; py,0), o cabaz de bens adquirido actualmente, i.e., o cabaz B
= (x1; y1):

I L = ( p x ,1 x1 + p y ,1 y1 )/ ( p x ,0 x1 + p y , 0 y1 ).

Com inflação positiva, como a situação no fim do período (cabaz B), é pior que a prevista
pela RO cor de laranja (pois esta permitiria adquirir um cabaz melhor que B), se o rendimento
for actualizado com a medida da taxa de inflação de Paasche, o consumidor fica numa
situação pior (pois, com a RO cor de laranja, poderia atingir uma curva de indiferença
superior à actual: quantifica-se na Fig.2.18 a perda de rendimento a verde).

As diferenças entre os índices dão uma medida do erro da estimativa da inflação. Para
alterações pequenas dos preços relativos, as diferenças entre os índices são pouco expressivas.

Sendo que, normalmente, o Índice de Preços aos Consumidor é um índice de Laspeyres, o


índice de preços implicito no PIB é um índice de Paasche (o PIB a preços constantes obtém-
se multiplicando as quantidades de bens e serviços produzidas no anos 1 pelos preços de
mercado do anos 0, i.e., do ano base, enquanto que o PIB a preços correntes obtém-se
multiplicando as quantidades de bens e serviços produzidas no anos 1 pelos preços de
mercado do anos 1).

63
Fig.2.18 – Compensação do rendimento com o índice de Paasche

Voltando ao EX2.11: iv) Determine a taxa de inflação segundo Laspeyres e Passche.

R: iv) – Inicialmente o rendimento era 500€/mês e o cabaz óptimo era x = 50 e y = 25.


Segundo o Índice de Laspeyres, torna-se necessário o rendimento de 750€/mês (50x10 +
25x10) para comprar o cabaz inicial aos novos preços pelo que a estimativa para a taxa de
inflação é de 50% (superior à “verdadeira” que é 41.1%). Segundo o Índice de Passche, seria
suficiente o rendimento de 377.50€/mês (24.5x5+25.5x10) para comprar o cabaz actual aos
preços anteriores pelo que a estimativa para a taxa de inflação é 500/377.5 – 1 = 32.5%
(inferior à “verdadeira” que é 41.1%). Sobre o cabaz de Laspeyres anda-se para esquerda (i =
750/500 – 1) enquanto que sobre o cabaz de passche anda-se para a direita (i = 500/377.5 – 1).

Apenas consideramos uma alteração dos preços (entre dois períodos). Se considerarmos mais
períodos (ver, tab. 2.3), o índice de Paasche vai ser calculado com um “cabaz variável” (o de
cada período), enquanto que o índice de Laspeyres vai ser calculado com um “cabaz fixo” (o
do período base).

Tab. 2.3 – Comparação do índice de Paasche com o índice de Laspeyres

F2: =B2*C2+D2*E2 G2: =B2*$C$2+D2*$E$2 H2: =F2/G2

I2: =$B$2*C2+$D$2*E2 J2: =I2/$I$2

64
Por ser mais fácil de construir e favorecer os consumidores, o índice de preços ao consumidor
usa o método de Laspeyres, actualizado o cabaz a intervalos de tempo espaçados. Em
Portugal, o Índice de preços no Consumidor é um índice de Laspeyres calculado com base em
2002 usando os seguintes ponderadores das classes de consumo (dados: INE, IPC - base 2002
- Nota Metodológica, 2003):

Classe Ponderação
Alimentação e bebidas não alcoólicas 20,081%
Bebidas alcoólicas e tabaco 3,017%
Vestuário e calçado 6,965%
Habitação, água, gás e outros combustíveis 10,029%
Acessórios para o lar, equipamento doméstico e manutenção corrente da habitação 8,055%
Saúde 5,642%
Transportes 19,130%
Comunicações 3,439%
Lazer, recreação e cultura 5,009%
Educação 1,502%
Restaurantes e hotéis 10,790%
Bens e serviços diversos 6,341%
Tab. 2.4 – Ponderadores do IPC - Portugal, 2002 como ano base (dados: www.ine.pt)

Determinação da curva de procura individual: Quando, no capítulo 1, falamos do


mercado, referi que a curva de procura de mercado (que não é directamente observável)
resulta da soma das curvas de procura individuais dos agentes económicos. Então, se
conseguirmos obter uma teoria de que resultem curvas de procura individuais com
propriedades adequadas (serem decrescente com o preço), então fica justificado teoricamente
a existência da curva de procura de mercado (e a conjectura de que é decrescente com o
preço). A obtenção de uma curva de procura particular vai estar dependente dos gostos e
preferências do indivíduo e do seu rendimento disponível.

Vamos obter as funções de procura walrassiana (cujas variáveis são os preços dos bens e o
rendimento) resolvendo o problema de maximização da utilidade considerando o preço do
bem x como variável e o preço do bem y e o rendimento disponível como parâmetros

65
(variáveis exógenas). Já mostrei (ver p. 54) que, sendo o indivíduo optimizador, então resolve,
para preços e rendimento genéricos, o sistema e equações:

U x U y
 =
x( p x , p y , r ), y ( p x , p y , r ) :  p x py
 x. p + y. p = r
 x y

A título de curiosidade, recordo que a curva da procura que consideramos no primeiro


capítulo tem como variável apenas o preço do bem ou serviço em consideração e, é aceitável
denomina-la por função procura marshaliana (que, em rigor, também engloba os preços dos
outros bens e serviços como variáveis).

Ex2.12: Sendo que um indivíduo tem de rendimento disponível 500€ que gasta em dois bens,
A = (x, y), cujos preços unitários são px e 2€/u., respectivamente, e os seus gostos se
condensam na função de utilidade U(x,y) = x.y, determine a curva de procura individual x(px).

 y x
 = 2 y = x. px 250
R: A curva de procura será  p x 2 ⇔ ⇔x= que é
 x. p + 2 y = 500  x. p x + x. px = 500 px
 x

decrescente com o preço do bem x.

Ex2.13: Um indivíduo tem de rendimento R que gasta no cabaz, A = (x, y), cujo preço unitário
é P = (px, py), e os seus gostos condensam-se na função de utilidade U(x, y) = x2.y. Classifique
os bens que fazem parte do cabaz.

 p  R
U 'x U ' y  2 x. y x 2  y = x. x  y=
 =  = 2 x. y. p y = x px
2
 2 py  3 py
 px p y ⇔  px py ⇔ ⇔ ⇔
 RO  x. p + y. p = R  x. px + y. p y = R  x. px + x. px . p y = R  x = 2R
  x y
 2 py  3 px

R 1 3p R 2 3p
err , y = y 'R . = .R. y = 1; er , x = x'R . = .R. y = 1; e py , x = 0; e px , y = 0
y 3 py R y 3 py 2R

Os bens x e y são bens normais com elasticidade da procura relativamente ao rendimento


unitária e são bens independentes entre si.

66
Função de utilidade indirecta: O cabaz que o indivíduo vai adquirir está dependente do seu
rendimento (e dos preços). Então, matematicamente, eu posso calcular a função de utilidade
indirecta como o nível de utilidade que o indivíduo atinge para cada rendimento (sob a
suposição de que escolhe o cabaz óptimo). Esta função é crescente com o rendimento (o que
resulta da insaciabilidade).

V (r ) = Max{U ( x1 , x2 ), s.a. p1.x1 + p2 x2 = r}, V ' ( r ) > 0

Em termos algébricos, determino as funções procura (com o rendimento como variável) e


substituo na função de utilidade. Esta função será posteriormente utilizada, por exemplo, no
estudo do comportamento sob risco e na Teoria do Produtor.

Função despesa: Esta função retorna a despesa mínima para atingir um determinado nível de
utilidade. Assim, é a inversa da função de utilidade inversa: R(u). Não tem grande
importância. Em termos algébricos, determino as funções procura (com o nível de utilidade
como variável) e substituo na função despesa (i.e., na restrição orçamental).

Curva de Engel: A função que relaciona a quantidade adquirida com o rendimento


denomina-se por Curva de Engel. Na Macroeconomia esta curva (agregando todos os bens e
serviços) é denominada por Curva de Consumo e é assumida positiva e crescente com o
rendimento, tendo, sem perda de generalidade, forma funcional C = C0 + k.R, em que C0 é o
consumo autónomo e k é a propensão marginal ao consumo (0 < k < 1 se o rendimento estiver
nas mesmas unidades que a quantidade consumida).

Ex2.14: Sendo que um indivíduo tem de rendimento disponível r que gasta em dois bens, A =
(x, y), cujos preços unitários são px. e py, respectivamente, e os seus gostos se podem
condensam-se na função de utilidade U(x,y) = x.(1 + y).

i) Determine a curva de procura individual x(px) e y(py). ii) determine a elasticidade preço da
procura, a elasticidade preço cruzado da procura e a elasticidade rendimento da procura do
bem x quando r = 1000€/mês, px = 10€/u. e py = 10€/u.; iii) determine a função de utilidade
indirecta. iv) determine a função despesa.

R: i) Como temos 2 bens, temos que resolver um sistema com duas equações:

67
1 + y x
 p = p (1 + y ). p y = x. p x r − py r − py
 x y ⇔ ⇔ y( p y ) = ; x( p x ) = 1 +
 x. p + y. p = r  (1 + y ). p y + y. p y = r 2 py 2 px
 x y

px r − py 2 px r − py 990
ii) ex( p x ) = x' ( px ) =− px =− =− < 0.
x 2 px
2
2 px + r − p y 2 px + r − p y 1010

py 1 2 px py 10
ex( p y ) = x' ( p y ) =− py =− =− < 0 (complementares).
x 2 px 2 Px + r − p y 2 Px + r − p y 1010

r 1 2 px r 1000
ex(r ) = x' (r ) = r = = que é >0 e <1 (primeira
x 2 px 2 px + r − p y 2 px + r − p y 1010

necessidade).

 r − p y  r − p y  (2 Px + r − p y )(r + p y )
iii) V (r ) = x.(1 + y ) = 1 + 1 + =
 2 p x  2 p y  4 px . p y

1 + y x
 p = p u ⋅ p y / p x = x 2 .  x(u ) = (u ⋅ p y / px )
0.5
u / x. p y = x. px
 x y ⇔ ⇔ ⇔
iv)  1+ y = u / x  y = u / x − 1  y (u ) = (u ⋅ px / p y ) − 1
0.5

 x.(1 + y ) = u
R(u ) = x(u ) Px + y (u ) Py = (u ⋅ p y / px ) 0.5 Px + (u ⋅ px / p y )0.5 Py − Py

Excedente do consumidor: Como a função de procura resulta do problema de maximização


da utilidade do indivíduo, então existe uma relação entre esta função e a função de utilidade
(que é uma escala do bem-estar do indivíduo) que não é observável. Da igualdade de Jevon,

U 'x U ' y U' ∂U


= ⇔ U 'x = y px ⇔ = k . px
px py py ∂x

Sendo que U é uma função, então nesta expressão px deixa de ser um valor para ser a função
de procura explicitada em ordem ao preço (função de procura inversa). Se, e.g., a função de
procura fosse dada por x(p) = A + B.p, a função inversa viria dada em por p(x) = (x – A)/B e
teríamos U’x = (x – A)/B. Como existe esta relação entre o preço e a derivada da função de
utilidade, podemos algebricamente calcular o ganho de bem-estar invertendo a operação de
derivação:

∂U x
= k . px ⇔ ∂U = k . px .∂x ⇒ U ( x ) = U (0) + k .∫ p x .∂x
∂x 0

68
A partir da observação do mercado, não conseguimos estimar U(0) nem k. No entanto, como a
função de utilidade é ordinal, podemos construir uma função utilidade equivalente à que

desconhecemos partindo apenas da curva de procura: Ec ( x) = [U ( x) − U (0)]/ k = ∫ p x .∂x . Em


x

termos gráficos, esta função, que é a utilidade em unidade monetárias, corresponde à área
abaixo da curva de procura.

Se à utilidade que o agente económico obtém pela aquisição dos bens ou serviços
descontarmos a despesa que incorre (área a amarelo da Fig.2.19), então obtemos o aumento
líquido de utilidade que se denomina por Excedente do Consumidor. É uma medida de
quando o indivíduo aumenta o seu bem-estar por poder comprar a quantidade x do bem ou
serviço ao preço p e vem dada em unidades monetárias (i.e., euros). Em termos gráficos, o
excedente do consumidor vem dado pela área que fica abaixo da curva de procura e acima do
preço de transacção (ver, Fig.2.19).

Fig.2.19 – Excedente do Consumidor

Em termos matemáticos, como a integração é a operação inversa da derivação, se g(x) = f(x)’,


então f(x) = C + ∫g(x). A integração é um ponto programático a tratar aprofundadamente em
Matemática II. Se, por exemplo, a curva de procura é q = 100 – 5.p, se o preço de mercado for
P = 10€/u. (e Q = 50u.), o excedente do consumidor será (comparar com a área do triângulo):
50
q = 100 − 5 p ⇒ p = 20 − 0.2q ⇒ E.c (q ) = ∫ (20 − 0.2q).∂q − despesa
0

0 .2 2
= 20Q − .Q − p.q = 1000 − 250 − 500 = 250€
2

69
Se, relativamente ao equilíbrio, o preço de transacção aumentar, então o excedente do
consumidor diminui (ver, Fig.2.19). Se diminuir, inicialmente o excedente aumenta mas
depois diminui (não haverá quem queira vender).

2.4. Aplicações

Neste ponto aplicamos a teoria do consumidor a alguns exemplos de políticas do governo.


Estas políticas, por actuarem ao nível dos preços e das quantidades transaccionadas de
determinados bens ou serviços, denominam-se por microeconómicas (por oposição às
políticas macroeconómicas de, e.g., estabilização da inflação). Pretende-se ainda neste ponto
que o aluno compreenda o que é a taxa de juro e como actua na estabilização da economia (é
uma ligação à macroeconomia).

2.4.1. Combate à exclusão: Subsídio em dinheiro ou em espécie. Desconto no preço.

Uma economia para progredir tem que criar incentivos para que os agentes económicos
revelem as suas capacidades, arrisquem novas soluções e criem novos bens ou serviços de
maior valor. Estes incentivos têm como efeito acessório o surgir de assimetrias no
rendimento: o motor do progresso tem a exclusão como dano colateral.

Não se pode pôr em causa o benefício que resulta da existência de liberdade económica (i.e., o
modelo capitalista) porque tem esta falha. Até porque o modelo económico alternativo (a
economia planificada) não funciona. Devemos antes imaginar mecanismos que, dentro da
economia de mercado, ultrapassem as suas (relativamente pequenas) falhas.

Por exemplo, vamos supor que existem dois polícias em que um deles corre muito mais
rápido que o outro (mas o “chefe” não sabe qual). Numa economia igualitária, como ambos
ganham o mesmo salário, então o que corre mais rápido vai esconder essa capacidade (para
não se cansar tanto). Numa economia de mercado, como será dado um salário maior ao
polícia que capturar mais fugitivos, então o que corre mais vai revelar a sua capacidade
(correndo a toda a velocidade atrás deles).

Sendo que a falta de recursos é a principal causa de exclusão, as políticas dos governos de
combate à exclusão passam pela atribuição de subsídios (em dinheiro ou em espécie). Em
Portugal no ano de 2009, a principal política de combate à exclusão social é o Rendimento
Social de Inserção que é atribuído a cerca de 3.5% da população e consiste num subsídio em

70
dinheiro até 187.18€/mês para os adultos e metade para as crianças. A atribuição de
subsídios em espécie traduzem-se na oferta de bens ou serviços de primeira necessidade
(alimentação, habitação, assistência médica, cabeleireiro, etc.), mas, pelas razões que vamos
explicar usando a Teoria do Consumidor, apenas se justifica a pessoas com uma
desarticulação social de especial gravidade (e.g., toxicodependentes, sem abrigo, dementes,
crianças e idosos abandonados). Acrescenta-se que, em Portugal, o Serviço Nacional de
Saúde e o Sistema Público de Ensino têm cobertura universal e são praticamente gratuitos
(e.g., uma consulta médica obriga ao pagamento de 2.20€).

Subsídio em dinheiro: Na Teoria do Consumidor, a atribuição de um subsídio em dinheiro


induz um aumento do rendimento. Sendo que o indivíduo acrescenta o subsídio s ao
rendimento r e gasta ambos na aquisição dos bens X e Y, então passará a ter como recta
orçamental x.px + y.py = r + s. Esta nova recta orçamental ficará localizada à direita da RO
sem subsídio pelo que o nível de consumo (e consequente bem-estar) do indivíduo aumenta
(ver, Fig.2.20).

Fig.2.20 – Efeito da atribuição de um subsídio em dinheiro

Ex2.15: Uma família, formada por dois adultos e três crianças, tem como único rendimento
um salário líquido de 400€/mês que gasta em vestuário e alimentação cujos preços são 5€/u. e
2.5€/u., respectivamente. Os gostos e preferências da família podem ser condensados na
função de utilidade U(v, a) = a2.v0.5. Se lhes for atribuído 300€/mês de RSI, calcule em quanto
aumentará o consumo da família.

71
R: Vamos introduzir no sistema de equações o subsídio em dinheiro como o parâmetro s:

 2.a.v 0.5 0.5.a 2 .v −0.5


 = 8v = a a = 128 + 0.32s
 2.5 5 ⇔ ⇔ . Substituindo s por 300,
 2.5a + 5v = 400 + s  20v + 5v = 400 + s v = 16 + 0.04s

resultam mais 96 unidades de alimentação e mais 12 unidades de roupa (por mês).

Subsídio em espécie: Neste caso, também vai existir um deslocamento da recta orçamental
para a direita mas não se desloca a totalidade da recta (supondo que o indivíduo não vende os
bens que recebe). Na Fig.2.21 podemos ver que o deslocamento da recta orçamental induzido
pela oferta da quantidade s do bem 1 causa uma quebra na RO. No exemplo apresentado da
Fig.2.21, a atribuição do subsídio em espécie é equivalente à atribuição do subsídio em
dinheiro (pois a CI atingida é a mesma).

Fig.2.21 – Efeito da atribuição de um subsídio em espécie (1)

No exemplo apresentado na Fig.2.22 já podemos ver que, a atribuição do subsídio em espécie


é menos favorável (para o indivíduo) que o correspondente subsídio em dinheiro (pois a CI
atingida é inferior). Se fosse atribuído um subsídio em dinheiro, o indivíduo podia adquirir o
cabaz representado no ponto C e atingir a CI de nível U3. O subsídio em espécie (a quantidade
s do bem 1) permite adquirir o cabaz B e atingir a CI de nível U2 que é menor que U3.

72
Fig.2.22 – Efeito da atribuição de um subsídio em espécie (2)

Em termos algébricos, resolve-se o modelo de optimização acrescentando o subsídio em


espécie como se fosse em dinheiro. Se a solução cair fora da zona possível, a solução será
exactamente a quantidade do subsídio. Por exemplo, se o subsídio for a dadiva da quantidade
s do bem 1, a solução estará fora da restrição se a1 < s, sendo que neste caso o cabaz será a1 =
s e a2 = r/p2.

Ex2.16: Uma família, formada por dois adultos e três crianças, tem como único rendimento
um salário líquido de 400€/mês que gastam em vinho e alimentação cujos preços são 5€/u. e
2.5€/u., respectivamente. Os gostos e preferências da família podem ser condensados na
função de utilidade U(v, a) = a.v10. Se lhes for atribuído um subsídio de 120u. de alimentação
(cujo valor pecuniário é 300€/mês), calcule em quanto aumentará o consumo da família.

R: Vou introduzir no sistema de equações o subsídio em dinheiro como o parâmetro s. Coloco


s no membro direito da equação (a diminuir a quantidade que compro) mas podia coloca-lo no
membro direito como rendimento (2.5s).

 0.5.a −0.5 .v10 10.a 0.5 .v 9


 = a = 0.1v a = 7.62 + 5.71 a = 13.33
 2 .5 5 ⇔ ⇔ ⇔
 2.5(a − s ) + 5v = 400 0.25v + 5v = 400 + 2.5s v = 76.19 + 57.14 v = 133.33

Como a solução algébrica não verifica a condição a = s, o cabaz consumido será a = 120u.
(aumenta 102.38u.) e v = 400/5 = 80u. (aumenta 3.81u.). Se o subsídio fosse em dinheiro, a
maior parte iria para vinho (aumentava 57.14u.).

73
Desconto no preço: Será uma situação intermédia entre a atribuição de um subsídio em
dinheiro e um subsídio em espécie, havendo um reforço maior do bem cujo preço tem um
desconto. Em termos gráficos, vai induzir uma rotação da recta orçamental no sentido da
expansão das possibilidades de consumo.

Fig.2.23 – Efeito da atribuição de um desconto no preço

Ex2.17: Supondo a mesma família formada por dois adultos e três crianças, tem como
rendimento um salário líquido de 400€/mês que gastam em vinho e alimentação cujos preços
são 5€/u. e 2.5€/u., respectivamente. Os gostos e preferências da família podem ser
condensados na função de utilidade U(v, a) = a.v10. Se lhes for atribuído um desconto no
preço da alimentação de 2.35€ calcule o aumento do consumo da família e o rendimento
equivalente.

 0.5.a −0.5 .v10 10.a 0.5 .v 9


 = v = 0.6a a = 126.98
 2. 5 − 2 . 35 5 ⇔ ⇔
R:  0.15a + 3a = 400 v = 76.19
 (2.5 − 2.35) a + 5v = 400
RE : 2.5a + 5v = 698.41€ / mês

Notar que, como se pretendia, a quantidade adquirida de alimentação aumentou sem aumentar
a quantidade adquirida de vinho. Assim, a atribuição de um desconto no preço também é
eficaz na condução do consumo na direcção pretendida (mas não aplicável, por exemplo, aos
dementes ou às crianças abandonadas).

74
A atribuição de um desconto no preço (do bem que se quer ver o consumo aumentado) tem a
vantagem de poder ser auxiliado pela imposição de um imposto no preço (do bem que se quer
ver o consumo diminuído) e assim tornar nula a despesa pública da política de alteração do
padrão de consumo. Exemplo desta combinação de políticas é a tributação dos combustíveis e
a atribuição de subsídios aos transportes públicos colectivos.

A atribuição de um subsídio em dinheiro permite que o subsidiado atinja um nível de bem-


estar (dado pela sua função de utilidade) superior a um desconto no preço ou a um subsídio
em espécie. Nos ex2.15 a 2.17, Udinh = 4.35E21 > Udesc = 1.07E21 > Uesp = 0.84E21. No
entanto, quando os gostos e preferências do indivíduo estão de tal maneira danificados (e.g.,
toxicodependentes) que socialmente as suas opções são contrários ao “seu” bem-estar, a
atribuição de desconto no preço ou de um subsídio em espécie são políticas mais eficazes na
condução do consumo na direcção socialmente considerada mais conveniente.

2.4.2. Função de oferta de trabalho.

Podemos imaginar a economia como dois agentes económicos, as empresas e as famílias, em


que as famílias procuram (e consomem) bens e serviços e oferecem trabalho e as empresas
procuram trabalho e oferecem bens e serviços (ver Fig.2.24).

Para as famílias, o aumento do consumo tem um efeito positivo no seu nível de bem-estar
enquanto que o aumento das horas de trabalho tem um efeito negativo no bem-estar.

Fig.2.24 – O circuito económico com Famílias e Empresas

75
Considerando que i) podemos agregar todos os bens e serviços numa mercadoria compósita,
X, cujo preço unitário é 1 (é o numerário), ii) que o indivíduo nasce com uma quantidade de
tempo disponível, L0, que pode consumir como lazer, L, ou vender como trabalho, T = L0 – L,
cujo preço unitário é w (o salário real unitário por fazer o preço do bem igual a 1), então
podemos facilmente aplicar a Teoria do Consumidor na determinação da função de oferta de
trabalho do indivíduo.

{( X , L) : V = MaxU ( X , L), sa X = ( L0 − L).w}

Precisamos formalizar a função de utilidade para podermos determinar uma forma funcional
para L(w) e, consequentemente, uma curva de oferta de trabalho, T(w) = L0 – L(w)

A recta orçamental vem dada por X = (L0 – L).w (é gasto todo o salário na aquisição do bem X
ao preço unitário) e tem a forma explícita L = L0 – X/w (a RO intersecta o eixo do lazer em L0
e o eixo dos bens e serviços em L0.w (ver Fig.2.25).

Fig.2.25 – Oferta de trabalho (1)

Ex2.18: Supondo L0 = 100 horas/semana e que os gostos e preferências da família podem ser
condensados na função de utilidade U(X, L) = 2L + X.L. Determine a função oferta de
trabalho da família.

U ' x U ' L L 2 + X
 =  =  X = Lw − 2  L = 50 + 1 / w
 x
P P ⇔ 1 w ⇔ ⇔
 Lw − 2 = (100 − L) w  X = 50w − 1 .
L
R:   X = (100 − L) w
 X = (100 − L) w
⇒ T ( w) = L0 − L = 50 − 1 / w

76
É importante notar que uma alteração do salário unitário não altera o ponto de intersecção da
RO com o eixo do lazer porque esse ponto vale sempre L0. Assim, um aumento do salário é
equivalente a uma diminuição do preço dos bens e serviços e vice-versa pelo que não tem
como efeito, obrigatoriamente, um aumento da quantidade oferecida de trabalho (ver Fig.2.26
onde se representa uma situação em que o aumento do salário unitário induz uma diminuição
da quantidade oferecida de trabalho).

Fig.2.26 – Oferta de trabalho (2)

A evidência empírica é no sentido de corroborar que, nos países onde o salário unitário é
relativamente elevado, a curva de oferta de trabalho é decrescente (ver Fig.2.27, dados da
curva de oferta individual de trabalho dos USA retirados de Burda and Wyplosz, 2005, tabela
4.1, p. 76, transformados assumindo que cada ano tem 52 semanas, T em horas por semana e
w é um índice do salário real normalizado a w1870 = 1).

A teoria macroeconomica (e.g., Barro) distingue uma alteração do salário temporário (i.e., na
semana do carnaval, os salários do Rio de Janeiro aumentam) em que prevalece o efeito
substituição (haverá um aumento da quantidade oferecida de trabalho – diminuição do lazer)
de um aumento definitivo em que prevalece o efeito riqueza (haverá uma diminuição da
quantidade oferecida de trabalho – aumento do lazer).

77
8
w
2000
7
6
5
4
3
2
1870
1
0
30 35 40 45 50 55 T60

Fig.2.27 – Curva de oferta de trabalho, USA, 1870-2000

2.4.3. Taxa de juro, consumo e poupança.

O princípio da insaciabilidade parece excluir que a Teoria do Consumidor possa explicar a


existência de poupança. No entanto, esse resultado depende de termos considerado até agora
que a decisão do agente não tem em atenção o futuro (o modelo também é válido sob o
pressuposto de que o indivíduo tem vida infinita e que os valores assumidos pelas variáveis se
mantêm constantes para sempre). No sentido de estudarmos a influência da taxa de juro no
consumo e na poupança, vamos agora explorar uma situação que se desenvolve ao longo do
tempo.

Em termos de modelação, vamos considerar períodos de tempo distintos, começamos a


análise pelo último período de vida e andamos para trás no tempo. Está metodologia
denomina-se por Backward Induction.

Último período: Assumindo que o indivíduo i) vive o seu último período, ii) no início do
qual recebe o activo S, iii) e durante o qual obtém o rendimento r0. O princípio da
insaciabilidade garante que o indivíduo gastará S + r0 na aquisição do bem ou serviço
compósito X0 ao preço p0. O índice zero traduz que já não lhe resta mais nenhum período de
vida (o índice diminuir é standard na Economia Dinâmica , Stokey, Lucas e Prescott, 1989)*.

X 0 = ( S + r0 ). p0

*
Stokey, NL, RE Lucas e EC Prescott (1989), Recursive Methods in Economic Dynamics, Harvard University
Press

78
Penúltimo período: Vamos agora assumir que o indivíduo i) vive o seu penúltimo período,
ii) no início do qual recebe a riqueza h1 (que também poderíamos denominas por S1), iii) e
durante o qual obtém o rendimento r1. O indivíduo tem como rendimento h1 + r1 podendo
gastar parte na aquisição de bens ou serviços (X1 ao preço p1) e poupar a parte S que transitará
para o período futuro (mais o juro). Sendo que condensamos os gostos e preferências do
indivíduo na função de utilidade U(x1, x2) = u(x1) +u(x0) e que a poupança é remunerada à
taxa de juro R por período, então a recta orçamental será x1.p1 + x0.p0 = h1 + r1 + S.R + r0 onde
S = (h1 + r1 – x1.p1) quantifica a poupança do período presente.

Apesar de o modelo incorporar o que se vai passar no período futuro (o período de índice
zero), a decisão quanto ao consumo e à poupança é tomada no período presente (o período de
índice um). Esta questão é importante se pensarmos que o rendimento e o preço do último
período são previsões (o modelo é aplicável no estudo da informação imperfeita: com
incerteza e expectativas).

Re-arranjando a RO na forma “descontada” e na forma explícita em relação ao presente (sem


p r  r  1
inflação, i.e., p = p1 = p0): x1. p + x0 . = h1 + r1 + 0 ; x1. =  h1 + r1 + 0  / p − x0 .
1+ R 1+ R  1+ R  1+ R

Quando há um aumento da taxa de juro (de Ra para Rb, ver Fig.2.28), A RO roda em torno do
ponto (r0/p0, r1/p1) no sentido do bem futuro (porque o seu preço “diminui”, p0/(1 + R), e
desloca-se para baixo porque o “rendimento” futuro, r0/(1 + R), também diminui).

Fig.2.28 – Efeito na Recta Orçamental de um aumento da taxa de juro

79
No caso de o indivíduo apenas ter rendimento no período presente (porque no futuro está
reformado), a alteração da RO apenas sofre o efeito da “diminuição” do preço futuro. No caso
de o indivíduo apenas ter rendimento no período futuro (crianças que andam a estudar), a
alteração da RO sofre o efeito do “aumento” do preço presente. Apesar de na realidade não
haver alterações dos preços ou dos rendimentos, a taxa de juro faz diminuir o consumo (no
período presente) e, consequentemente, aumentar a poupança e o consumo planeado para o
período futuro (ver Fig.2.29). Notar estar neste modelo a fundamentação teórica para, nos
modelos macroeconómicos, ser a taxa de juro que equilibra o mercado de bens e serviços. Por
outro lado, este modelo justifica os Bancos Centrais aumentarem a taxa de desconto quando
há pressões inflacionistas: Sendo que se pretende manter um nível de preços estáveis e, no
presente, há um excesso de consumo que pressiona uma subida de preços (i.e., inflação), a
forma de diminuir o consumo (e controlar a inflação) é através de uma subida da taxa de juro
(neste caso, inicialmente o indivíduo pretendia endividar-se mas o aumento da taxa de juro
faz com que equilibre o orçamento: o cabaz caminha no sentido do ponto de rotação).

Fig.2.29 – Efeito no consumo de um aumento da taxa de juro (de R0 para R1)

Ex2.19: Supondo indivíduo cujo um rendimento é de r = 100€/mês, que vive este e mais
outro mês, que consome um bem ou serviço compósito X cujo preço é 5€/u., que os gostos e
preferências podem ser condensados na função de utilidade U(x1, x0) = √x1+√x0. Determine a
função de poupança.

80
 0.5 / x1 0.5 / x0
 =  x0 = (1 + R) 2 x1  x0 = 20(1 + R)
 5 5 /(1 + R )   100 R
R:;  ⇔ 2+ R ⇔  20 ⇒ s ( R) =
 5 100  x1 (2 + R) = 20  x1 = 1 + R 1+ R
5 x1 + x0 . = 100 +  1 + R
1+ R 1+ R

O modelo pode ser estendido a vários períodos, começando a análise sempre no último.

2.4.4. Risco.

O risco surge de o indivíduo não ter conhecimento perfeito do que vai acontecer no período
futuro. Assim, os modelos que o incorporam traduzem a relaxação de que existe
conhecimento público e perfeito. Existem autores quem distinguem o risco da incerteza mas,
aqui, não tem relevância.

Vamos considerar um modelo de uma lotaria simples. No entanto, este modelo é de aplicação
mais genérica.

A aplicação da teoria do consumidor ao estudo do risco obriga a que a função de utilidade


seja semi-cardinal. Quer isto dizer que não basta que a função de utilidade atribua um número
maior aos cabazes melhores mas tem que dar uma medida da proporção relativa da utilidade
retirada dos cabazes (e.g., terá que dizer que o cabaz A é 3 vezes melhor que o cabaz B).

Lotaria: O indivíduo pretende escolher entre a quantia r certa (sem risco) e uma lotaria P da
qual pode ganhar o valor P0 com a probabilidade q ou P1 com a probabilidade (1 – q)*. A
decisão vai ser em termos de valor esperado. Sendo V(r) o nível máximo de utilidade que o
indivíduo atinge com o rendimento r, V (r ) = Max U ( x, y ), sa x. px + y. p y = r , o indivíduo vai

comparar V(r) com a utilidade esperada da lotaria e escolher a opção a que corresponder
maior valor: {se V (r ) < V ( P0 ).q + V ( P1 ).(1 − q ) ⇒ Lotaria; senão ⇒ r}

Ex2.20: Um indivíduo ganha actualmente 600€/mês que gasta em vestuário e alimentação


cujos preços são 5€/u. e 2.5€/u., respectivamente e os seus gostos e preferências podem-se
condensar na função de utilidade U(a, v) = a0.5.v0.5. Se se despedir, tem 40% de probabilidade

*
P tem distribuição binomial com valor médio P0q+P1(1–q) e variância (P1–P0)2q(1–q).

81
se arranjar um novo emprego cujo salário é 1000€/mês mas pode não o arranjar e ficar
reduzido a ganhar apenas 400€/mês. Será de se despedir?

R: Primeiro, determinamos a função utilidade indirecta V(r):

 0.5.a −0.5 .v 0.5 0.5.a 0.5 .v −0.5


 = a = 2v a = 0.2r
 2 .5 5 ⇔ ⇔ ⇒ V (r ) = 0.020.5 r
2.5a + 5v = r 5v + 5v = r v = 0 . 1r

Segundo, comparamos o certo com o valor esperado: {V (600) ?? 0.4V (1000) + 0.6V (400)}

{ }
⇔ 0.020.5 × 600 ?? 0.4 × 0.020.5 × 1000 + 0.60 × 0.020.5 × 400 ⇒ {84.85 < 90.51}

Conclui-se que se deve despedir e tentar a sua sorte.

Aversão / neutralidade / atracção pelo risco: Vamos supor a situação em que o rendimento
fixo (sem risco) é igual ao rendimento esperado (médio) da lotaria (com risco). Neste caso, se
o indivíduo preferir o rendimento fixo, é avesso ao risco (risk averse); se estiver indiferentes,
é neutro ao risco (risk neutral), se preferir a lotaria, é atraído pelo risco (risk lover).

No Ex2.20, o indivíduo é neutro ao risco: se a lotaria fosse ganhar 900€/mês com 40% de
probabilidade ou 600€/mês com 60% de probabilidade, o valor esperado (médio) seria
exactamente o que ganha agora, i.e., 600€/mês e teríamos uma igualdade nas utilidades:

{0.02 0.5
}
× 600 ?? 0.4 × 0.020.5 × 900 + 0.60 × 0.020.5 × 400 ⇒ {84.85 = 84.85}

2.4.5. Capital humano e crescimento económico endógeno.

A evidência empírica mostra que o aumento da escolaridade é o principal factor* que justifica
a tendência secular do crescimento económico per capita. Em termos estáticos, a capacidade
de um indivíduo criar riqueza é crescente com a sua escolaridade e, em termos dinâmicos, os
pais transmitem aos filhos um nível de escolaridade crescente com o seu próprio nível de
escolaridade. Como a escolarização dos filhos implica que os pais diminuam o rendimento
disponível para consumo, para racionalizarmos este comportamento teremos que assumir que

*
Os outros serão o capital per capita e mobilidade dos factores de produção (i.e., o comércio).

82
os pais incorporam na sua função de utilidade o bem-estar futuro dos filhos, i.e., os pais são
altruístas, assumindo a escolarização dos filhos como um investimento.

Vamos assumir, sem perda de generalidade, que i) o rendimento é linearmente crescente com
a escolaridade, R = k.E, e que ii) quem não tem filhos maximiza o bem-estar consumindo os
bens x e y cujos preços são unitários. iii) Sendo a função de utilidade U(x, y) = x.y, teremos
como função utilidade indirecta:

x y
 =  x = 0.5kE
1 1 ⇔ ⇒ V (k .E ) = 0.25k 2 E 2
 x + y = kE  y = 0.5kE

Vamos ainda supor que iv) quem tem filhos, gasta parte do rendimento na sua escolarização e
v) inclui na sua utilidade, a utilidade dos filhos. vi) Escolarizar os filhos tem um preço
unitário p. Sendo o nível de escolaridade dos pais E0, para os pais altruístas com n filhos, a
função de utilidade indirecta será, sem perda de generalidade:

VP (k .E0 ) = V (k .E0 − n. p.E ).V (k .E )n

Então, os pais altruístas vão determinar o nível de escolaridade dos filhos que maximiza esta
nova medida de bem-estar:

VP (k .E0 ) = V (k .E0 − n.E. p ).V (k .E )n


VP (k .E0 ) = 0.25(k .E0 − n.E. p ) 2 .0.25n k 2 n .E 2 n
dVP
= 0.5(k .E0 − E. p )(−n. p ).0.25n k 2 n .E 2 n + 0.25(k .E0 − n.E. p )2 .0.25n k 2 n .2nE 2 n −1 = 0
dE
k
E= E0
(1 + n). p

Se usar uma curva de rendimento do tipo R = R0 + kE α (mais de acordo com a evidência


empírica), a manipulação algébrica será mais difícil mas, em termos de estática comparada, os
resultados serão idênticos.

Análise de estática comparada. Podemos agora estudar como evolui a escolaridade de


geração para geração com as diversas variáveis exógenas do modelo (o número de filhos, o
preço da escolaridade e a “produtividade” da escolaridade). Verifica-se do modelo que haverá
progresso (i.e., aumento da escolaridade a cada geração) se os pais tiverem poucos filhos (n

83
pequeno), se o aumento do rendimento com a escolaridade for elevada (k elevado) e se o
preço da escolarização for baixo (p pequeno):

k k
E > E0 sse >1⇔ p <
(1 + n). p 1+ n

Estes resultados estão de acordo com a evidência empírica: em média, os filhos de pais com
baixa escolaridade (e baixo rendimento), também têm baixa escolaridade (e baixo
rendimento) e os filhos de famílias numerosas têm baixa escolaridade. Também poderíamos
incluir no modelo que os pais antecipam que o bem-estar dos filhos vai depender da
escolaridade dos netos para modelizarmos um processo dinâmico de progresso económico.

2.4.6. Contabilidade do bem-estar.

Como os gostos e preferências dos indivíduos são codificados em funções de utilidade


ordinais, então não podemos comparar os indivíduos pelo nível de utilidade. Em particular,
não podemos calcular o efeito social de uma política pela simples soma das utilidades dos
indivíduos afectados. O caminho certo é determinar o saldo (em termos monetários) das
compensações dos rendimentos (mais os impostos cobrados) que permitem retornar à situação
de bem-estar inicial de todos os indivíduos.

Ex2.21: Existem dois indivíduos, I1 e I2, que gastam o seu rendimento em alimentação, a, e
em vinho, v. Actualmente, um tem 500€/mês de rendimento e os seus gostos condensam-se na
função de utilidade U(a, v) = 10.a0.3.v0.7 e outro tem 1000€/mês de rendimento e seus gostos
condensam-se na função de utilidade U(a, v) = a0.7.v0.3. Os preços da alimentação e do vinho
são 2€/kg e 5€/l, respectivamente. Supondo que a diminuição do consumo de vinho em 1%
aumenta o rendimento em 0.1%, deverá o governo cobrar um imposto de 1€/l de vinho?

R: Primeiro, determinamos o nível de bem-estar inicial:

 3.a 0.3 .v 0.7 7.a 0.3 .v 0.7


 = v = 0.933a v = 70
I1:  2a 5v ⇔ ⇔ ⇒ U1 = 714.640
2a + 5v = 500  2 a + 4. 667 a = 500  a = 75

 0.7.a 0.7 .v 0.3 0.3.a 0.7 .v 0.3


 = v = 0.171a v = 60
I2:  2a 5v ⇔ ⇔ ⇒ U 2 = 206.202
2a + 5v = 1000 2 a + 0 . 857 a = 1000 a = 350

84
Depois, determinamos a nova situação para um rendimento genérico:

 3.a 0.3 .v 0.7 7.a 0.3 .v 0.7


 = v = 0.777a v = 0.117r
I1:  2a 6v ⇔ ⇔ ⇒ V1 (r ) = 1.258r
2a + 5v = r 2a + 4.667a = r a = 0.150r

 0.7.a 0.7 .v 0.3 0.3.a 0.7 .v 0.3


 = v = 0.143a v = 0.05r
I2:  2a 6v ⇔ ⇔ ⇒ V2 (r ) = 0.195r
2a + 5v = r  2 a + 0 . 857 a = r  a = 0 . 35 r

Compensamos o rendimento para voltarem a uma situação idêntica à inicial:

r1 : V1 (r ) = 714.640 ⇒ r1 = 714.640 / 1.258 = 568.06€ ⇒ v1 = 66.274 (diminui 5.3%)

r2 : V2 (r ) = 206.202 ⇒ r2 = 206.202 / 0.195 = 1056.22€ ⇒ v2 = 52.811 (diminui 12.0%)

E determinamos o saldo da política somando os efeitos sobre os dois indivíduos:

∆i=(Rnecessário – salário + imposto)

∆ = ∆1 + ∆ 2 = (568.06 − 500 × 1.0053 + 66.27 ) + (1056.22 − 1000 × 1.012 + 52.81) = 9,44€

Como o saldo é positivo, o governo deverá implementar esta política.

Exercício de recapitulação

Ex2.22: Um homem que ganha 600€/mês está a pensar casar-se com uma mulher que ganha
1500€/mês. Agora é ele que decide o que comprar com o seu rendimento mas, depois de casar
será a mulher a gerir o lar. O dinheiro pode ser gasto em habitação (4€/m2/mês), alimentação
(3€/kg) ou diversões (10€/u.). Os gostos do homem condensam-se na função de utilidade
Uh(h, a, d) = 10h0.1a0.3d0.6; e os da mulher na função Um(h, a, d) = 10h0.5a0.3d0.1.

i) Sendo que quando casados, a habitação é desfrutada plenamente por ambos, a alimentação é
dividida por 2 e as diversões por 1.1, e.g., Um(h, a, d) = 10h0.5(a/2)0.3(d/1.1)0.1, devem casar?

ii) E se fosse o homem a decidir o que comprar?

R. Enquanto solteiros, o nível de bem-estar do homem é 448.1 e o da mulher 1761.9:

85
 h 0.1a 0.3d 0.6 3h 0.1a 0.3d 0.6
 =
 0.1 40h.3 0.6 3a
a = 4 h h = 15m 2
h a d 0.1 0.3 0.6
6h a d  
 = ⇔ d = 2.4h ⇔ a = 60kg ⇒ u = 448.1
 4h 10d  4h + 12h + 24h = 600 d = 36u.
 4h + 3a + 10d = 600  

 6h 0.6 a 0.3d 0.1 3h 0.6 a 0.3d 0.1


 =
 0.64h0.3 0.1 3a
a = 0.667h h = 260.9m 2
 6h a d 0.5 0.6 0.1
h a d  
 = ⇔ d = 0.067h ⇔ a = 173.9kg
 4h 10d 4h + 3h + 0.667h = 2000 d = 17.4u.
  

4h + 3a + 10d = 1500

Depois de casados, a mulher adquirirá:

 6h 0.6 ( a / 2) 0.3 ( d / 1.1) 0.1 3h 0.6 ( a / 2) 0.3 (d / 1.1) 0.1


 =
 0.6 4 h 3a h = 339.13m 2
a = 0.667h
 6h ( a / 2) ( d / 1.1)
0. 3 0.1 0.5 0.6
h a ( d / 1.1) 0. 1
 
 = ⇔ d = 0.067h ⇔ a = 226.09kg
 4h 10d  4h + 3h + 0.667h = 2600 d = 22.61u.
 4h + 3a + 10d = 2600  


Devem casar pois os níveis de bem-estar do homem e da mulher subirão (para 453.7 e 1786.5,
respectivamente) por causa de partilharem despesas (habitação e diversões).

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