Aula 2 Cultura e Identidade - Visões A Respeito Do Outro
Aula 2 Cultura e Identidade - Visões A Respeito Do Outro
Aula 2 Cultura e Identidade - Visões A Respeito Do Outro
Apresentação
Nesta aula faremos reflexões acerca do conceito de ser humano. Você sabia que o ser humano pode ser classificado
como ser sociocultural? Afinal, o que é ser sociocultural?
Para entender o que isso significa, precisamos voltar no tempo e verificar como se deu a passagem do ser humano da
natureza (constituição primitiva) até chegar ao que chamamos de cultura (em sua constituição social, por exemplo).
Assim, seremos capazes de construir o significado de identidade, da nossa e dos outros.
Na perspectiva entre o eu e os outros, devemos rever algumas de nossas posturas frente ao que se costuma chamar de “a
cultura dos outros”. Essa reflexão nos trará luz sobre vários aspectos da sociedade moderna quanto à formação de grupos
culturais.
Objetivos
Definir os conceitos gerais de ser humano como ser sociocultural;
Primeiras palavras
Como já apresentado, esta aula será dividida em três partes. Primeiramente, estudaremos o conceito de ser humano como ser
sociocultural, verificando como se deu a passagem da natureza para a cultura. Em seguida, tomando como base o estudo
inicial sobre ser sociocultural, seremos capazes de construir o significado de identidade. Por último, vamos passar ao estudo
do comportamento em relação ao que se costuma chamar de “a cultura dos outros”.
Saiba mais
Você pode complementar o estudo desta aula com a leitura do capítulo 1 do livro Estudos culturais em língua inglesa, da
professora Ivi Furloni, que se encontra em nossas referências.
Que tal começarmos nossa aula tratando do conceito de ser humano como ser
sociocultural?
Pensar o ser humano como ser sociocultural parece-nos lógico e fácil porque nos reconhecemos por termos como base o
pensamento (senso comum) de que fazemos parte de uma sociedade. E, então, nos tornamos seres sociais.
Mas será que só isso é suficiente para nos classificarmos como um ser sociocultural?
Para resolver essa questão, vamos detalhar cada um dos conceitos envolvidos nesta primeira etapa de nossa aula.
De modo bem simplista, ser humano é dotado de inteligência, de razão. No entanto, com a leitura da obra Os
elementos da filosofia moral, escrita por James Rachels, (2006, p. 132) é possível identificar os pensamentos de Kant
sobre o ser humano. Para o filósofo, o ser humano tem lugar especial na criação divina se tomarmos como base a
criação dos outros animais.
Os animais irracionais seriam destituídos de um valor maior, se pensarmos que estes servem aos seres humanos em
seus objetivos. Por exemplo, temos o cavalo que, apesar de ser criação divina também, é usado como um meio para
servir à sociedade, visando o bem-estar da maioria. Desse modo, o cavalo é usado na lavoura para tocar gado, para
puxar carroças ou carruagens, como ainda se vê pelas ruas de Londres, nos tradicionais desfiles em datas especiais
com as aparições da rainha Elizabeth II.
Os cavalos também são usados em passeios tradicionais pelo Central Park, em Nova York, como parte do roteiro para
se conhecer um pouco da cultura local.
Para Kant, o homem seria dotado de um caráter racional, o que o distingue dos outros animais. Assim, o homem é possuidor
de dignidade, um valor inerente à sua constituição e que, por isso, nunca poderia ser usado como instrumento para se alcançar
qualquer fim.
Como ser racional, o ser humano realiza, de forma livre e consciente, suas ações e condutas frente a seus objetivos e desejos e,
por isso, é gerador de cultura nas suas mais diversas manifestações.
A partir dessa vivência, o indivíduo molda suas formas de pensar o mundo, sentir o que se passa com ele no convívio
social e agir sobre o meio em que vive. Tudo isso acontece baseado nos valores que ele adquiriu no contato com a
sociedade ou, ainda, nos valores que pretende difundir na sociedade, gerando elementos culturais que manifestam aquilo
que se passa em seu interior, como objetivos ou desejos.
Natureza
O ambiente natural é aquele em que não há intervenção humana.
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Cultura
O ambiente cultural é aquele sobre o qual o ser humano age.
Por que houve essa mudança da natureza para a cultura? Como se deu essa
passagem?
A natureza era um meio hostil, agressivo e, com o passar do tempo, o homem primitivo começou a perceber que teria maiores
chances de sobreviver se vivesse em grupo. No começo, viver em grupo tinha a ver tão somente com a sobrevivência – um
elemento instintivo e inato que é a preservação da vida –, o que estava diretamente ligado às questões biológicas de
alimentação (deslocamento para caçadas), proteção térmica (intempéries do tempo como frio e calor) e reprodução.
Em um processo de evolução, o homem percebeu que tinha a capacidade de adaptação. Neste momento, deixou de ser
nômade e se fixou nos locais que considera mais adequado. Dessa fixação espacial, surgem necessidades diferentes daquelas
que o homem já conhecia. Com o surgimento de tais necessidades, habilidades devem ser desenvolvidas, pois é preciso
aprender a criar animais para abate, a plantar o que já sabem que podem comer, a inventar instrumentos que facilitem a vida
cotidiana, aprender a criar e dominar o fogo etc.
Saiba mais
Para ilustrar este tópico que trata da passagem da natureza para a cultura, sugiro que assista ao filme A guerra do fogo, que
mostra que os homens pré-históricos acreditavam que o fogo era algo sobrenatural. Assista ao trailer.
Atividade
2. Como se deu a passagem da natureza para a cultura?
Pinturas rupestres
Neste processo de passagem da vida na natureza para uma vida em grupo, novas formas de pensar surgiram. A criação desse
novo modo de vida fez com que a transmissão do que foi aprendido por meio das experiências evoluísse, gerando a primeira
forma de cultura.
A primeira forma de registro do conhecimento adquirido remonta aos desenhos nas cavernas, feitos com ossos, pedras,
carvão, barro, sementes etc.
(Fonte: Allison Herreid / Shutterstock).
Atualmente, há muitas formas de manifestação de cultura ou de fenômenos culturais. Existem muitos grupos sociais que se
manifestam por meio de um sistema simbólico, que representa o modo de pensar a existência, facilitando a comunicação na
sociedade.
Por meio dos fenômenos culturais, o mundo social ganha um novo sentido, que permite a construção do conhecimento, ao
mesmo tempo em que funciona como meio de integração, exercendo uma função social. Passamos, então, da natureza para a
cultura, que pode se manifestar pela arte, religião, direito, ciência, língua etc.
Ordem social
Vamos pensar um pouco a respeito de função social e reprodução da ordem social?
Precisamos lembrar que a função social busca a igualdade social e é um dos pilares das sociedades modernas, mas, antes de
prosseguirmos, precisamos entender o que significa ordem social.
Veja a seguir uma definição de ordem social de acordo com o ordenamento constitucional presente no site Jusbrasil.
Como podemos notar, a ordem social envolve todos os campos que norteiam a vida em sociedade e as relações entre os
indivíduos, nos campos jurídico, social ou moral.
Em total sintonia com tais campos, poderemos verificar a existência de uma sociedade democrática, bem organizada, policiada
e fundamentada no trabalho como base de sustentação da sociedade como um todo. A ordem social visa o bem-estar e a
justiça social.
(Fonte: Rawpixel.com / Shutterstock).
Ku Klux Klan
Ku Klux Klan
A Ku Klux Klan é uma organização terrorista que incitava a cultura do ódio aos negros, principalmente no sul dos
Estados Unidos. Os membros dessa organização estavam ligados a várias ações violentas, cujas vítimas podiam ser
negras ou até mesmo brancas. A acusação contra as brancas? Acreditar na igualdade das pessoas e defender a
extensão dos direitos civis aos negros.
A Ku Klux Klan pode ser considerada um exemplo de cultura que exerce função social e que ajuda a reproduzir ou
conservar a ordem social?
Podemos dizer que a A Ku Klux Klan ajudava a conservar uma ordem pensada e estabelecida por uma minoria, no sul
dos Estados Unidos, ao disseminar a cultura de ódio aos negros. Mas esse não é o tipo de cultura que desejamos
estudar e ver propagada. A ordem de que tratamos, neste exemplo, é aquela em que os membros da organização
acreditavam. Mas essa não é a ordem ideal.
Pensando no ideal francês, percebemos que as pessoas mudaram. Essa mudança de pensamento fez com que a sociedade
evoluísse para uma sociedade mais justa e igualitária.
Embora tais ideais tenham aparecido na constituição francesa, podemos ver que, provavelmente, tenham influência da cultura
americana, mesmo que de forma indireta, visto que na Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, do ano
de 1776, já havia menção a eles.
A sociedade se transforma em função das mudanças internas dos indivíduos que nela habitam.
Diante de exemplos tão diferentes, você pode perceber que a cultura está ligada às condições materiais, econômicas e sociais
de uma sociedade. Por que isso acontece?
Isso ocorre porque a cultura é formada por um conjunto de princípios morais, leis jurídicas, regras sociais, símbolos culturais,
conhecimentos de toda ordem que fazem com que a nossa existência, como ser humano e sociocultural, tenha sentido. Desse
modo, o universo cultural vai além das manifestações artísticas, como muitos pensam.
Que tal analisarmos o conceito de identidade na forma individual, social e cultural para resolver a essa questão?
Identidade individual
O conceito de identidade no âmbito individual se refere a tudo aquilo que pertence ao mundo da pessoa,
que possui significado para ela, sobre o que ela pensa de si e dos outros. Também envolve quem ela é,
de acordo com o país onde nasceu, a sociedade (classe social) em que vive, o gênero e o momento
histórico em que participa como agente ou coadjuvante.
Identidade social
Temos também uma identidade social a partir da qual se forma a visão que os outros têm de nós. A
identidade social possui características a nós atribuídas pelo mundo exterior, que nos categorizam por
profissão, por exemplo, com atributos e qualidades predefinidos.
Em outras palavras, temos uma identidade pessoal com uma visão interior e uma identidade social,
com uma visão exterior.
Identidade cultural
A identidade, num conceito cultural, se refere à formação que cada pessoa tem de si mesma, a maneira
como vê o mundo com o qual se relaciona e como se comporta em relação a ele. A identidade cultural
seria uma espécie de elo entre o mundo pessoal e o externo, uma vez que se refere ao sentimento de
pertencimento a um grupo específico, manifestando-se nas variadas categorias culturais, expressão
nacionalidade, etnia, raça, gênero e religião.
A identidade cultural se constrói e se mantém viva pelo ato de compartilhamento do saber coletivo,
formado pelo legado cultural, pelo modo de comunicação e linguagem, que se manifesta de forma
estética e envolve normas, costumes e tradições.
Atenção
A formação da identidade, seja ela qual for, não é algo estanque. Pelo contrário, formamos nossa identidade perpétua e
continuamente à medida em que agimos no mundo que também nos influencia. Desse modo, a identidade cultural se revela
complexa em função das múltiplas facetas apresentadas pelos indivíduos ao se relacionarem com vários grupos que
exprimem cultura.
Primeiramente, é equivocado pensar em uma cultura verdadeira ou numa melhor cultura. Na realidade, pensamos a cultura do
ponto de vista da sociedade a qual pertencemos, mas isso não significa que ela seja a única. É por causa desse pensamento
equivocado a respeito da cultura que temos visto surgir tanto preconceito e tanta intolerância em relação ao que é diferente.
Desse modo, para pensar a cultura dos outros, podemos recorrer aos estudos antropológicos que discutem conceitos de
alteridade, etnocentrismo, xenofobia e relativismo cultural. Vejamos o que significa cada um destes termos para podermos
compreender melhor a cultura dos outros.
Alteridade
No que diz respeito à alteridade, verificamos que, de modo geral, a alteridade diz respeito à natureza ou condição do que é
outro, do que é distinto. Pensando nesta definição, podemos verificar que, para entender o outro, precisamos nos entender
porque, geralmente, pensamos o outro a partir daquilo que sabemos sobre nós.
Podemos praticar a alteridade de um ponto de vista antropológico, buscando compreender o homem em sociedade, nas
mais diversas manifestações culturais, verificando pontos de semelhança ou de diferença entre os próprios indivíduos ou
entre as culturas.
Agindo assim, seremos capazes de entender melhor o outro, poderemos nos colocar no lugar dele (o que envolve o
conceito de empatia, uma atitude ativa e objetiva de entender todo o contexto em que vive o outro) e teremos uma atitude
positiva e harmoniosa frente às outras culturas, pois, na verdade, o eu só existe em relação ao contato com o outro.
Etnocentrismo
Quando pensamos o outro como um ser diferente, estamos praticando um vício social, o etnocentrismo, que é
considerado um vício e uma espécie de mazela social, pois é a tendência que temos de ver o mundo segundo a
perspectiva de nossa cultura, de nossa sociedade e de nossa religião, achando que os “nossos” são os melhores, os
corretos.
Pessoas com atitudes etnocêntricas costumam menosprezar a cultura alheia e consideram que os seus padrões culturais
são superiores. O etnocentrismo consiste em julgar o outro a partir do seu ponto de vista, desembocando, mais uma vez,
nos preconceitos das mais diversas ordens.
Xenofobia
A xenofobia pode se manifestar como uma forma simples hostilidade e chegar ao ponto de ter total aversão ou ódio
daquele que é proveniente de outro país.
Esse é mais um entre tantos problemas sociais que desembocam no preconceito ao estrangeiro, tomando como
justificativa alguns fatores de ordem religiosa, social ou histórica. Além disso, também é uma forma de discriminação por
achar que a outra nacionalidade é inferior, e costuma chamar a atenção às questões de raça, em que se considera a
pessoa como ser superior ou inferior.
Como exemplo máximo de etnocentrismo e xenofobia, podemos citar o Holocausto, caso de extermínio de judeus,
motivado por Hitler que considerava os alemães como superiores, como únicos e verdadeiros descendentes da raça
ariana. Para Hitler, todos os que não fossem descendentes dos arianos, deveriam ser considerados estrangeiros.
Você já leu o romance O menino do pijama listrado, de John Boyne? Nesta obra, você poderá ver como era a atmosfera e a
vida na época do holocausto. Nesta obra, a xenofobia é marcada pelo ódio à raça judaica, considerada inferior, que acabou
no extermínio de 6 milhões de judeus.
Relativismo cultural
Como podemos acabar com o etnocentrismo, a xenofobia ou qualquer outro tipo de preconceito? A chave para responder
a esta pergunta reside no que chamamos de relativismo1 cultural.
O relativismo cultural é uma perspectiva que podemos assumir, numa postura antropológica, ao observarmos a nossa
própria cultura e a cultura dos outros, ou seja, podemos nos afastar um pouco da nossa cultura para analisar,
experimentar ou vivenciar a cultura do outro sem julgamento de valor.
No relativismo cultural, não há cultura absoluta, mas culturas que se mostram de forma dependentes, sem valor
hierárquico.
Um exemplo de relativismo cultural relacionado aos estudos culturais de língua inglesa pode ser a comparação entre as
formas de governo americana e inglesa. Na Inglaterra, a monarquia é a forma de governo, sem constituição formal, com
regras baseadas nos costumes do povo. Nos Estado Unidos, a república é a forma de governo, com a constituição federal
à frente do ordenamento jurídico.
Diferentemente do que vivenciamos no Brasil, a cultura inglesa está toda pautada na monarquia e nos costumes do povo.
Se você ainda se pergunta qual é a melhor cultura, precisa saber que todas as culturas são válidas, importantes. Assim,
não nos cabe julgar nenhuma delas como melhor ou superior. Todas as culturas são formas de manifestação do
pensamento de um povo, cada qual com suas especificidades e valores.
Atividade
3. Defina e explique o conceito de identidade cultural.
4. Etnocentrismo e xenofobia são sinônimos?
Notas
Relativismo 1
Relativizar é olhar o outro por um ponto de vista diferente, é não julgar, é ter uma abordagem cultural sem julgamentos
preestabelecidos daquilo que é reconhecido como certo, verdadeiro ou melhor.
Referências
FURLONI, Ivi. Estudos culturais em língua inglesa. Rio de Janeiro: SESES, 2015.
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Explore mais
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Leia o texto:
Declaração de independência e constituição americana: federalização do Estado, de Bruno J. R. Boaventura;
Artigo de José Carlos de Paula Carvalho: Etnocentrismo: inconsciente, imaginário e preconceito no universo das
organizações educativas.
Leia o livro:
O menino do pijama listrado, de John Boyne.
Assista:
Trailer do filme O menino de pijama listrado.