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DIREITO PENAL

Aula 3 | Princípios básicos de Direito Penal


Caio Paiva
Resumo de aula feito pelo professor Caio Paiva

1. Princípio da legalidade

• CF, art. 5º, XXXIX: "não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem
prévia cominação legal".
• CP, art. 1º: "Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia
cominação legal".
• CADH, art. 9º: "Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no
momento em que foram cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito
aplicável".
• DUDH, art. 11.2: "Ninguém pode ser culpado por qualquer ação ou omissão que,
no momento, não constituam delito perante o direito nacional ou internacional.
Também não será imposta pena mais grave do que aquela que, no momento da
prática, era aplicável ao ato delituoso".
• Nilo Batista: "O princípio da legalidade, também conhecido por 'princípio da
reserva legal' e divulgado pela fórmula nullum crimen nulla poena sine lege',
surge historicamente com a revolução burguesa e exprime, em nosso campo, o
mais importante estágio do movimento então ocorrido na direção da positividade
jurídica e da publicização da reação penal. Por um lado resposta pendular aos
abusos do absolutismo e, por outro, afirmação da nova ordem, o princípio da
legalidade a um só tempo garantia o indivíduo perante o poder estatal e demarcava
este mesmo poder como espaço exclusivo da coerção penal. Sua significação e
alcance políticos transcendem o condicionamento histórico que o produziu, e o
princípio da legalidade constitui a chave mestra de qualquer sistema penal que se
pretenda racional e justo".
• Nilo Batista

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o Função constitutiva do princípio da legalidade: "Nem sempre se
percebe que o princípio da legalidade não apenas exclui as penais ilegais
(função de garantia), porém ao mesmo tempo constitui a pena legal
(função constitutiva)".
o Quatro funções do princípio da legalidade: 1) proibir a retroatividade
da lei penal; 2) proibir a criação de penas pelo costume; 3) proibir o
emprego de analogia para criar crimes, fundamentar ou agravar penas; e
4) proibir incriminações vagas e indeterminadas.
• A lei penal deve ser escrita, estrita, certa e prévia.
• Franz Von Liszt: "O Código Penal é a Carta Magna do delinquente. Não protege
a ordem jurídica, nem a comunidade, senão o indivíduo que contra esta obrou.
Dispõe para ele o direito a ser castigado só se concorrem os requisitos legais e
dentro dos limites estabelecidos pela lei".
• Proibição de analogia
o Claus Roxin: "Analogia é trasladar uma regra jurídica a outro caso não
regulado na lei pela via do argumento da semelhança (dos casos). (...) Esta
argumentação por analogia, que em outros campos do Direito é um dos
métodos usuais de aplicação do Direito, em Direito Penal e para proteger
o réu está proibida quando opere em seu prejuízo. A analogia favorável ao
réu é também lícita sem a menor restrição em Direito Penal".
o Juarez Cirino dos Santos: "A analogia in bonam partem - a
chamada analogia intra legem - é permitida pelo princípio da legalidade,
sem nenhuma restrição: nas justificações, nas exculpações e em qualquer
hipótese de extinção ou de redução da punibilidade do comportamento
humano".
o STF: entende que, havendo disciplina legal expressa, não cabe analogia
visando beneficiar o réu. Neste sentido, "Ante disciplina normativa,
descabe a analogia visando beneficiar réu. ESTELIONATO – ENERGIA
ELÉTRICA – DANO – REPARAÇÃO – EFEITO. A reparação do dano,
no estelionato, repercute na fixação da pena – artigo 16 do Código Penal
–, não cabendo a aplicação analógica da disciplina especial do artigo 34
da Lei nº 9.249/1995, relativa aos tributos, incluída a contribuição social"
(HC 179.808, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, j. 16.11.2020); "Não

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pode o julgador, por analogia, estabelecer sanção sem previsão legal, ainda
que para beneficiar o réu, ao argumento de que o legislador deveria ter
disciplinado a situação de outra forma. Em face do que dispõe o § 4º do
art. 155 do Código Penal, não se mostra possível aplicar a majorante do
crime de roubo ao furto qualificado" (HC 94.030, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, 1ª Turma, j. 20.5.2008).
o Criminalização da homofobia e da transfobia como racismo na
dimensão social: "Até que sobrevenha lei emanada do Congresso
Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização
definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República,
as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem
aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém,
por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua
dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante
adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei
nº 7.716, (...) constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso,
circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (CP, art. 121, §
2º, I)” (STF, ADO 26, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, j. 13.06.2019).
• Proibição de costume para fundamentar ou agravar a pena
o Juarez Cirino: "O princípio da legalidade proíbe o costume como
fundamento de criminalização e de punição de condutas porque exige lex
scripta para os tipos legais e as sanções penais. Mas assim como
a analogia e a retroatividade da lei penal mais favorável são admitidas,
também o costume pode ser admitido in bonam partem,
para excluir ou reduzir a pena ou para descriminalizar o fato, nas
hipóteses indicadas pela sociologia jurídica de perda de eficácia da lei
penal – e, com a perda de eficácia, a perda de validade da lei penal (...)".
o Zaffaroni: "“(...) é verdade que a lei penal não é derrogada pelo desuso,
mas também o é que uma lei penal que jamais é aplicada ou que se
interpreta pacificamente com certo âmbito de proibição, não pode ser
aplicada surpreendentemente contra um habitante somente porque o poder
quer selecioná-lo. Um tipo penal não é um instrumento para que o poder
surpreenda os cidadãos com sua arbitrariedade. A indiferença absoluta das

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agências de criminalização secundária ou seu entendimento da lei
condicionam uma perda da consciência da ilicitude e, por isso, não pode
se colocar em funcionamento uma criminalização secundária omitida por
longo tempo sem aviso prévio (...)”.
• Atenção! O STF entende que o princípio da adequação social não pode, por si só,
revogar crimes: HC 104.467 (casa de prostituição) e RHC 115.986 (violação de
direito autoral por venda de produtos “piratas”).
o O assunto da proibição de retroatividade prejudicial será abordado na
aula sobre aplicação da lei penal no tempo.
• Lei penal em branco: ocorre quando o Poder Legislativo admite uma
complementação de um tipo penal por outra lei penal ou mesmo por normativas
infralegais.
• Nilo Batista: "Fala-se em ‘reserva absoluta’ e ‘reserva relativa’ de lei para
aprofundar o entendimento de dispositivos constitucionais concernentes à reserva
legal. A concepção de ‘reserva absoluta’ postula que a lei penal resulte sempre do
debate democrático parlamentar, cujos procedimentos legislativos, e só eles,
teriam idoneidade para ponderar e garantir os interesses da liberdade individual e
da segurança pública, cumprindo à lei proceder a uma ‘integral formulação do
tipo’ (...). A concepção de reserva relativa nega o monopólio do poder legislativo
em assuntos penais e admite que a matéria de proibição possa ser parcialmente
definida por outras fontes de produção normativa, cabível que o legislador
estabeleça estruturas gerais e diretrizes, a serem complementadas, as primeiras
com observância das segundas, pelo regulamento. A constitucionalidade das
normas penais em branco de complementação heteróloga seria discutível à
luz da reserva absoluta da lei".
• Nilo Batista – sobre a classificação das normas penais em branco: “Chamam-
se normas penais em branco nas quais a conduta incriminada não está
integralmente descrita, necessitando de uma complementação que se apresenta em
outro dispositivo de lei (complementação homóloga), seja da própria lei penal
(complementação homóloga homovitelina), seja de lei diversa
(complementação homóloga heterovitelina), ou em fontes legislativas de
hierarquia constitucional inferior, como o ato administrativo, ou a lei estadual ou
municipal (complementação heteróloga)”.

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• Juarez Cirino - inconstitucionalidade das leis penais em branco: "As leis
penais em branco exprimem a tendência moderna de administrativização do
Direito Penal, com transferência de poderes punitivos a funcionários do Poder
Executivo ou a modalidades inferiores de atos normativos (Decreto, Resolução
etc.). (...) A transferência da competência legislativa de definição de crimes para
o Poder Executivo ou para níveis inferiores de atos legislativos infringe
o princípio da legalidade, (...) afinal, o emprego instrumental do Direito Penal
para realizar políticas públicas emergenciais é inconstitucional".
• Zaffaroni - inconstitucionalidade das leis penais em branco: "A lei penal em
branco sempre foi suspeita de violar o princípio da legalidade formal (...). Não
neutraliza a inconstitucionalidade das leis penais em branco o argumento das
matérias instáveis que as requerem, aduzindo que as rápidas mudanças não
poderiam ser acompanhadas pelo legislador penal (...). As únicas leis penais em
branco cuja constitucionalidade é tolerável são as chamadas impróprias, ou seja,
as que reenviam a outra norma emanada da mesma fonte. (...) Tais leis seriam
constitucionais na medida em que o complexo resultante de ambas as normas não
viola nenhum dos outros princípios limitativos a que se fez referência (estrita
legalidade, proibição de analogia, não retroatividade etc.)”.
• Exemplos de leis penais em branco no Brasil: crimes contra o meio ambiente
previstos na Lei 9.605/98 que dependem da complementação
normativa/administrativa de defina os conceitos de floresta, área de preservação
permanente, vegetação primária ou secundária etc; crimes previstos na Lei
11.343/2006 que dependem da complementação normativa/administrativa do
Ministério da Saúde sobre quais substâncias são consideradas drogas; etc.
• Entendimento do STF: pela constitucionalidade (RE 810.321, Rel. Min. Gilmar
Mendes, decisão monocrática de 17.6.2016; RE 748.829, Rel. Min. Rosa Weber,
decisão monocrática de 24.10.2016). Ambos os REs interpostos pela DPE/SP, que
questionava a constitucionalidade do art. 66 da Lei de Drogas, segundo o qual
“(...) denominam-se drogas substâncias entorpecentes, psicotrópicas, precursoras
e outras sob controle especial, da Portaria SVS/MS nº 344/1998”.
o Min. Gilmar Mendes (RE 810.321): “A compatibilidade das normas
penais em branco heterogêneas com o princípio da legalidade não é
questão simples. (...) De um modo geral, a doutrina admite a utilização da

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norma penal em branco como técnica legislativa, permitindo que o
legislador remeta a outras fontes normativas, em melhor posição para
complementar a proibição. (...) Sendo justificável a remissão, não haveria
inconstitucionalidade. (...) No caso específico da Lei de Drogas – Lei
11.343/06 –, não há inconstitucionalidade a ser pronunciada”.
• Normas penais imperfeitas: são tipos penais em que o legislador não comina
uma pena específica para o tipo penal, remetendo para a pena de outro crime. São
exemplos o crime de uso de documento falso (CP, art. 304) e o crime de genocídio
(art. 1º da Lei 2.889/1956).
• Medidas provisórias: STF: “A inadmissibilidade da medida provisória em
matéria penal não compreende a de normas penais benéficas, assim, as que abolem
crimes ou lhes restringem o alcance, extingam ou abrandem penas ou ampliam os
casos de isenção de pena ou de extinção de punibilidade” (STF, RE 254.818, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence, Plenário, j. 8.11.2000).
o CF, alterada pela EC 32/2001: "[é vedada a edição de medidas
provisórias sobre matéria relativa a] direito penal, processual penal e
processual civil" (art. 62, I, b).
• Zaffaroni - princípio do respeito histórico ao âmbito legal do proibido: “A
legalidade é um princípio que serve para garantir a limitação do âmbito de
programação criminalizante legislativa, e não se pode reverter seu sentido
convertendo-o em um argumento de extensão inusitada e nunca previsto no
contexto originário do texto, cujo efeito é conceber um espaço seletivo de
criminalização que alcança os limites máximos de arbitrariedade. Um tipo penal
não pode erigir-se em instrumento para a criminalização indiscriminada. O
respeito histórico ao âmbito real do proibido se impõe na legalidade porque, do
contrário, a simples omissão das agências políticas poderia aumentar as proibições
punitivas (...). A criminalização primária se estabelece por ação das agências
políticas e não por omissões”.

2. Princípio da culpabilidade

• Nilo Batista: “O princípio da culpabilidade deve ser entendido, em primeiro


lugar, como repúdio a qualquer espécie de responsabilidade pelo resultado, ou

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responsabilidade objetiva. Mas deve igualmente ser entendido como exigência de
que a pena não seja infligida senão quando a conduta do sujeito, mesmo associada
causalmente a um resultado, lhe seja reprovável. Em primeiro lugar, pois, o
princípio da culpabilidade impõe a subjetividade da responsabilidade penal. Não
cabe, em direito penal, uma responsabilidade objetiva, derivada tão-só de uma
associação causal entre a conduta e um resultado de lesão ou perigo para um bem
jurídico. (...) Em segundo lugar, temos a personalidade da responsabilidade penal,
da qual derivam duas consequências: a intranscendência e a individualização da
pena”.
• Zaffaroni: “O princípio da culpabilidade abrange dois níveis: o de exclusão de
qualquer imputação de um resultado acidental não previsível (caso fortuito) e o
de exclusão da punibilidade por não haver podido conhecer a cominação ou
adequar sua conduta ao direito”.
• Actio libera in causa: “Dada à adoção da teoria da actio libera in causa pelo
Código Penal, somente a embriaguez completa decorrente de caso fortuito ou
força maior que reduza ou anule a capacidade de discernimento do agente quanto
ao caráter ilícito de sua conduta, é causa de redução ou exclusão da
responsabilidade penal nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 28 do CP” (STJ, AgRg
no REsp 1.165.821, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, j. 2.8.2012).
• Ato praticado por cliente e responsabilidade do advogado: “Reconhecer
responsabilidade penal de maneira extensiva ao advogado, por ato praticado por
seu cliente, é afastar as garantias constitucionais e legais conferidas ao advogado
para o exercício da sua atividade jurídica na condição de procurador e atribuir-lhe
responsabilidade objetiva por atos de terceiros” (STJ, RHC 24.606, Rel. Min. Nefi
Cordeiro, 6ª Turma, j. 26.5.2015).
• Crime societário: “O fato de o paciente ser sócio da empresa devedora de tributos
não é suficiente, por si só, para contra ele desencadear a persecução penal, se não
demonstrado um mínimo de indícios de que sua conduta tenha liame com os fatos,
sob pena de se caracterizar mera responsabilidade objetiva” (STJ, HC 289.043,
Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, j. 18.12.2014).
• Macrodelinquência econômica: “Não existe, no ordenamento positivo
brasileiro, ainda que se trate de práticas configuradoras de macrodelinqüência ou
caracterizadoras de delinqüência econômica, a possibilidade constitucional de

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incidência da responsabilidade penal objetiva. Prevalece, sempre, em sede
criminal, como princípio dominante do sistema normativo, o dogma da
responsabilidade com culpa (“nullum crimen sine culpa”)” (STF, HC 88.875, Rel.
Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. 7.12.2010).
• Assuntos que serão discutidos em aulas sobre a culpabilidade
o Actio libera in causa
o Coculpabilidade ou culpabilidade por vulnerabilidade
o Crimes agravados pelo resultado
o Entre outros.

3. Princípio da lesividade

• Também conhecido como princípio da ofensividade ou princípio da exclusiva


proteção de bens jurídicos.
• Traduz-se no brocardo nullum crimen sine iniuria (não há crime sem lesão).
• A intervenção do Direito Penal fica condicionada a uma ofensa – atual ou
potencial – ao bem jurídico.
• Ninguém pode ser punido pelo que pensa, pelo que é nem por comportamentos
considerados – pelo Estado – como imorais.
• Quatro principais funções do princípio da lesividade para NILO BATISTA:
o Primeira: proibir a incriminação de uma atitude interna. As ideias e
convicções, os desejos, aspirações e sentimentos dos homens não podem
constituir o fundamento de um tipo penal, nem mesmo quando se orientem
para a prática de um crime: o projeto mental do cometimento de um crime
(cogitação) não é punível. (...) É imprescindível que a atitude interna esteja
nitidamente associada a uma conduta externa.
o Segunda: proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito
do próprio autor. Os atos preparatórios para o cometimento de um crime
cuja execução, entretanto, não é iniciada, não são punidos. Da mesma
forma, o simples conluio entre duas ou mais pessoas para a prática de um
crime não será punido, se sua execução não for iniciada. (...) O mesmo
fundamento veda a punibilidade da autolesão, ou seja, a conduta externa
que, embora vulnerando formalmente um bem jurídico, não ultrapassa o

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âmbito do próprio autor; como por exemplo o suicídio, a automutilação e
o uso de drogas.
o Terceira: proibir a incriminação de simples estados de condições
existenciais. O direito penal só pode ser um direito penal da ação, e não
um direito penal do autor, como eventualmente se pretendeu. (...) O que é
vedado pelo princípio da lesividade é a imposição de pena (isto é, a
constituição de um crime) a um simples estado ou condição desse homem,
refutando-se, pois, as propostas de um direito penal de autor e suas
derivações mais ou menos dissimuladas (...).
o Quarta: proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem
qualquer bem jurídico. Estamos aqui falando do ‘direito à diferença’, de
práticas e hábitos de grupos minoritários que não podem ser
criminalizadas. (...) Estamos falando também de condutas que só podem
ser objeto de apreciação moral (como práticas sexuais, quaisquer que
sejam, entre adultos conscientes, ou como a simples mentira).
• Ferrajoli: “Em conclusão, o princípio da lesividade (...) tem o valor de critério
polivalente de minimização das proibições penais. E equivale a um princípio de
tolerância a respeito dos desvios, idôneo para reduzir a intervenção penal
ao mínimo necessário e, com isso, para reforçar sua legitimidade e confiança. Se
o direito penal é um remédio extremo, devem ser privados de toda relevância
jurídica os delitos de mera desobediência e rebaixados à categoria de dano civil
os prejuízos reparáveis e à ilícito administrativo todas as violações de normas
administrativas”.
• Claus Roxin: As cominações penais arbitrárias não protegem bens jurídicos são
inadmissíveis. (...) Pela mesma razão estaria vedado proteger finalidades
ideológicas mediante normas jurídico-penais. (...) Por último, (...) as meras
imoralidades não violam nenhum bem jurídico e por isso devem ficar impunes.
Assim, p. ex., a punição de relações homossexuais ou outras consideradas
imorais”.
• Manter a casa de prostituição
o Código Penal, art. 229: “Manter, por conta própria ou de terceiro,
estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de
lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente”.

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o STF: “No crime de manter casa de prostituição, os bens jurídicos
protegidos são a moralidade sexual e os bons costumes, valores de elevada
importância social a serem resguardados pelo direito penal, não havendo
que se falar em aplicação do princípio da fragmentariedade” (HC 104.467,
Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, j. 8.2.2011).
o Luís Greco: “a decisão do STF, ao entender que o bem jurídico protegido
pelo art. 229 do CP é a moralidade sexual, manifestou indiferença pelos
avanços teóricos do direito penal e pela ampla produção literária da
doutrina (...)”
• A mentira do réu no interrogatório não pode ser valorada negativamente – na
circunstância da personalidade ou da conduta social – pelo juiz na dosimetria da
pena (STF, HC 195.937, Rel. Min. Edson Fachin, decisão monocrática de
2.2.2021; STJ, AgRg no AREsp 984.996, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª
Turma, j. 15.5.2018).
• Possibilidade de punição de atos preparatórios: excepcionalmente admite-se a
punição de atos preparatórios como crimes autônomos, como é o caso, p. ex., do
crime de associação criminosa (CP, art. 288), da constituição de milícia privada
(CP, art. 288-A) e da mera posse de petrechos para falsificação de moeda (CP, art.
291).
• Possibilidade de punição da manifestação de discursos de ódio: crimes de
racismo, crime de apologia (CP, art. 287).

4. Princípio da intervenção minima

• Nilo Batista: “Uma república que tenha como fundamento ‘a dignidade da pessoa
humana’ (art. 1º, III, da CF) e como objetivos a construção de uma ‘sociedade
livre, justa e solidária’ e a promoção do ‘bem de todos’ (art. 2º, incisos I e IV, da
CF) deve conter, pelo menos, a inflação penal”.
• Marcelo Semer: "A composição com o princípio da lesividade impõe cautela. Se
não pode haver criminalização onde não há lesão ou exposição a perigo de bem
jurídico, o inverso não é necessariamente obrigatório. Não é a simples existência
de lesão ou exposição a bem jurídico que impõe a criminalização. A lesividade é
critério imprescindível, mas não suficiente para a legitimidade da punição. É

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preciso submetê-la, ainda, ao princípio da necessidade. O princípio da intervenção
mínima se projeta em duas dimensões: a fragmentariedade e a subsidiariedade. A
ideia da fragmentação nasce da própria legalidade: nem tudo o que é ilícito, imoral
ou antissocial é crime, apenas as condutas selecionadas previamente pelo
legislador. A natureza fragmentária implica em que o Direito Penal não se obriga
a sancionar todas as condutas lesivas aos bens jurídicos, mas apenas aquelas mais
graves e mais perigosas praticadas contra os bens mais relevantes. (...) A
subsidiariedade, a seu turno, parte do reconhecimento de que o Direito Penal não
é a única forma de controle social”.
• Dimensões: necessidade (a intervenção penal deve ser indispensável no contexto
da prevenção da prática de novos crimes), adequação (qualitativa e
quantitativamente, a pena deve corresponder ao mal causado pelo crime)
e proporcionalidade em sentido estrito (ponderação de meios e fins para decidir
sobre a intervenção penal).
• Zaffaroni: “A criminalização alcança um limite de irracionalidade intolerável
quando o conflito sobre cuja base opera é de ínfima lesividade ou quando, não o
sendo, a afetação de direitos que importa é grosseiramente desproporcional com
a magnitude da lesividade do conflito. Como é impossível demonstrar a
racionalidade da pena, as agências jurídicas devem constatar, pelo menos, que o
custo de direitos da suspensão do conflito guarde um mínimo de
proporcionalidade com o grau de lesão que haja provocado”.
• Proibição do excesso e proibição de proteção insuficiente: “Pode-se dizer que
os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso, como
também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou
imperativos de tutela. Os mandatos constitucionais de criminalização, portanto,
impõem ao legislador, para o seu devido cumprimento, o dever de observância do
princípio da proporcionalidade como proibição de excesso e como proibição de
proteção insuficiente” (STF, HC 104.410, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, j.
6.3.2012).
o Crítica - Juarez Cirino dos Santos: “Finalmente, é importante registrar:
o princípio da proporcionalidade não conhece, em nenhuma de suas
formulações originais, a pretensa dimensão de proibição de proteção
insuficiente, criada pela imaginação punitivista da literatura brasileira”.

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• Juarez Cirino dos Santos - proporcionalidade abstrata e proporcionalidade
concreta: “O princípio da proporcionalidade abstrata dirige-se ao legislador:
limita a criminalização primária às hipóteses de graves violações de direitos
humanos – ou seja, exclui lesões insignificantes de bens jurídicos e delimita a
cominação de penas criminais conforme a natureza e extensão do dano social
produzido pelo crime. Nesse aspecto, a proposta de hierarquização das lesões de
bens jurídicos é essencial para adequar as escalas penais ao princípio da
proporcionalidade abstrata: por exemplo, penas por lesões contra a propriedade
não podem ser superiores às penas por lesões contra a vida (...). O princípio da
proporcionalidade concreta dirige-se ao Juiz criminal: permite equacionar os
custos individuais e sociais da criminalização secundária, em relação à aplicação
e execução da pena criminal".
• Medida de segurança de tratamento ambulatorial para crime apenado com
reclusão: “Via de regra, consoante a diretriz do art. 97 do CP, se o agente for
inimputável, o juiz determinará sua internação. Caso o fato previsto como crime
seja punível com detenção, poderá o indivíduo ser submetido a tratamento
ambulatorial. O critério não é inflexível. Mesmo acontecido um delito apenado
com reclusão, o juiz poderá, excepcionalmente, à luz do princípio da
proporcionalidade, sujeitar o inimputável a tratamento ambulatorial, desde que
constate, indene de dúvidas, a desnecessidade da internação para o fim de cura da
periculosidade” (STJ, HC 584.154, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, j.
4.8.2020).
• Constitucionalidade do preceito secundário do crime de tráfico de drogas: “O
preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/06 trata-se de opção legislativa no
combate ao tráfico de drogas, apenando com maior severidade aqueles infratores,
não competindo ao Poder Judiciário interferir nessas escolhas. No caso, a DPE/SP
alegava a inconstitucionalidade do patamar mínimo da pena de multa prevista para
o tipo penal em razão da violação dos princípios constitucionais da isonomia e da
individualização da pena” (STF, AgRg no RE 1.291.306, Rel. Min. Alexandre de
Moraes, 1ª Turma, j. 26.10.2020).
• Inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273 do Código Penal: “É
inconstitucional a aplicação do preceito secundário do art. 273 do Código Penal,
com redação dada pela Lei 9.677/1998 (reclusão, de 10 a 15 anos, e multa), à

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hipótese prevista no seu § 1º-B, I, que versa sobre a importação de medicamento
sem registro no órgão de vigilância sanitária. Para esta situação específica, fica
repristinado o preceito secundário do art. 273, na redação originária (reclusão, de
1 a 3 anos, e multa)” (STF, RE 979.962, Rel. Min. Roberto Barroso, Plenário, j.
24.3.2021).
• Incompetência do Poder Judiciário e separações dos poderes: “Este Supremo
Tribunal Federal possui jurisprudência cristalizada no sentido de que não cabe ao
Poder Judiciário, com base nos princípios da proporcionalidade e da
individualização da pena, interferir na atividade legiferante, constitucionalmente
atribuída ao Poder Legislativo, notadamente no que se refere ao quantum da
sanção penal prevista no preceito secundário dos delitos, tendo em vista tratar-se
de matéria de política criminal. Tal proceder, por parte do Estado-Juiz, incorreria
em nítida violação ao princípio da separação dos poderes” (STF, ARE 1.305.785
AgR, Rel. Min. Edson Fachin, 2ª Turma, j. 12.5.2021).
• Pena mais severa no crime de moeda falsa: “A redação do art. 289 do Código
Penal não ofende o princípio da proporcionalidade ao aplicar pena mais severa ao
agente que promove a circulação de moeda falsa para obter vantagem financeira
indevida, em comparação ao que, após receber uma cédula falsa de boa-fé, para
não sofrer prejuízo, a repassa a terceiros” (STJ, AgRg no AREsp 815.155, Rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, j. 15.12.2015).
• Agravante da reincidência e regime aberto: “O reconhecimento da agravante
da reincidência não impede a fixação do regime prisional aberto, especialmente
quando o juízo de primeiro grau, próximo aos fatos e provas, motiva a sua escolha
nas circunstâncias concretas do delito, observando a proporcionalidade entre a
conduta praticada e a resposta penal” (STF, HC 187.203, Rel. Min. Edson Fachin,
2ª Turma, j. 8.4.2021).
• Aborto e primeiro trimestre da gestação: “É preciso conferir interpretação
conforme a Constituição aos próprios arts. 124 a 126 do Código Penal – que
tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a
interrupção voluntária da gestaçãoefetivada no primeiro trimestre. A
criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher,
bem como o princípio da proporcionalidade” (STF, HC 124.306, Rel. Min.
Roberto Barroso, 1ª Turma, j. 9.8.2016).

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• Concurso de pessoas e crime patrimonial: “É inadmissível aplicar, no furto
qualificado, pelo concurso de agentes, a majorante do roubo” (STJ, Súmula 442).
• Punição da tentativa da falta grave com a sanção correspondente à falta
consumada: “Não é possível acolher a tese segundo a qual o art. 49, § único, da
LEP (‘Pune-se a tentativa com a sanção correspondente à falta consumada’),
deveria ser interpretado à luz dos princípios da proporcionalidade e da
razoabilidade. Não há qualquer óbice a que, em razão de critérios de política
legislativa, seja estabelecida idêntica sanção, às hipóteses de consumação ou
tentativa de determinados ilícitos, inclusive no campo da execução da pena” (STF,
RHC 89.459, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, j. 24.6.2008).

6. Princípio da humanização da pena

• Ferrajoli: “A história das penas é, sem dúvida, mais horrenda e infamante para a
humanidade do que a própria história dos delitos; porque mais cruel e talvez mais
numerosas do que as violências produzidas pelos delitos têm sido as produzidas
pelas penas e porque, enquanto o delito costuma ser uma violência ocasional e às
vezes impulsiva e necessária, a violência imposta por meio da pena é sempre
programada, consciente, organizada por muitos contra um. Frente à artificial
função de defesa social, não é arriscado afirmar que o conjunto das penas
cominadas na história tem produzido ao gênero humano um custo de sangue, de
vidas e de padecimentos incomparavelmente superior ao produzido pela soma de
todos os delitos”.
• Dele dele resulta a absoluta proibição – tanto pelo Direito nacional como pelo
DIDH – das penas crueis, desumanas ou degradantes.
• Nilo Batista: “O princípio da humanidade intervém na cominação, na aplicação
e na execução da pena, e neste último terreno tem hoje, face à posição dominante
da pena privativa da liberdade, um campo de intervenção especialmente
importante”.
• Pena de morte e o DIDH: rumo à abolição universal. Proibida pelo Estatuto de
Roma. Admitida excepcionalmente por tratados como a CADH e o PIDCP.

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• Nilo Batista: “São também inaceitáveis, porque desconsideram a autorregularão
como atributo da pessoa humana, penas que pretendam interferir fisicamente
numa ‘metamorfose’ do réu: castração ou esterilização, lobotomia etc”.

7. Princípio da proibição da dupla punição

• CF, art. 5º, XXXVI: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico
perfeito e a coisa julgada”.
• CADH, art. 8.4: “O acusado absolvido por sentença passada em julgado não
poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos”.
• A garantia contra o bis in idem ou da vedação da persecução penal múltipla busca
proteger a pessoa para que ela não seja novamente processada por fatos pelos
quais já foi julgada. Mas o princípio também funciona num âmbito material para
além do âmbito processual.
• Marcelo Semer: “As repercussões processuais são imediatas e evidentes, como a
litispendência (quando das ações penais visam julgar o mesmo fato criminoso) ou
a proibição constitucional de repetir a coisa julgada. Tangenciando o ne bis in
idem, o desmembramento em diversas ações penais de condutas praticadas sob
continuidade delitiva também causa sensível prejuízo ao réu, impondo que
aguardem a unificação das penas em fase de execução, suportando os ônus de uma
pena artificialmente elevada. (...) No âmbito material, o ne bis in idem deve se
projetar tanto sobre os fatos quanto sobre as penas. O conflito de normas pode ser
usado para resolver os principais percalços do ne bis in idem na tipicidade, por
intermédio da especialidade, da consunção, da absorção, do ante-fato ou pós fato
impuníveis. (...) Da mesma forma como é vedado atribuir duas vezes o mesmo
fato ao agente, também infringe o ne bis in idem a duplicidade da consideração de
uma mesma circunstância para aplicação da pena”.
• CADH e PIDCP: comparados estes tratados, cada um se mostra mais amplo a
partir de determinado ponto, embora o ponto em que o PIDCP é mais amplo seja
facilmente corrigido com uma interpretação extensiva da CADH. De acordo com
o PIDCP, “Ninguém poderá ser processado ou punido por um delito pelo qual já
foi absolvido ou condenado por sentença transitada em julgado” (art. 14.7). A
CADH, por sua vez, refere-se somente à absolvição como resultado do primeiro

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julgamento. A Corte IDH abordou o assunto no julgamento do Caso Rosadio
Villavicencio vs. Peru (2019).
• Agora, vejamos porque a CADH é mais ampla: a CADH se refere aos mesmos
fatos e o PIDCP ao mesmo crime. A Corte IDH fez essa anotação no julgamento
do Caso Loayza Tamayo vs. Peru: “A garantia do ne bis in idem busca proteger
os direitos dos indivíduos que foram processados por determinados fatos para que
não voltem a ser processados pelos mesmos fatos. Diferentemente da fórmula
utilizada por outros instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos
(por exemplo, o PIDCP, art. 14.7, que se refere ao mesmo ‘crime’), a CADH
utiliza a expressão ‘os mesmos fatos’, que é um termo mais amplo em benefício
ao réu” (Corte IDH, Caso Loayza Tamayo vs. Peru).
• Bis in idem e etapa recursal: a CADH condiciona o bis in idem à verificação do
trânsito em julgado do primeiro julgamento. Assim, não há violação da proibição
do bis in idem quando o réu é submetido a novo julgamento em instância recursal
a partir de recurso da acusação. A Corte IDH ressaltou isso no Caso Mohamed
vs. Argentina: “Entre os elementos que conformam a situação regulada pelo art.
8.4 da CADH, encontra-se a realização de um primeiro julgamento que termina
numa sentença transitada em julgado de caráter absolutório. Importante
compreender, porém, que o processo penal é somente um através de suas diversas
etapas, incluindo os recursos ordinários que sejam interpostos contra a sentença.
A Corte reitera que o princípio do ne bis in idem se sustenta na proibição de um
novo julgamento sobre os mesmos fatos que tenham sido matéria da sentença
proferida com autoridade de coisa julgada”.
• Relativização do bis in idem: nos termos em que colocado na CADH, a proibição
do bis in idem não admite relativização. No entanto, a jurisprudência da Corte
IDH é no sentido de que se trata de uma garantia relativa, e não absoluta (Caso
Carpio Nicolle e outros vs. Guatemala; Caso Almonacid Arellano vs. Chile;
supervisão de cumprimento no Caso Bámaca Velásquez vs. Guatemala). Há aqui
uma convergência com o art. 20 do Estatuto de Roma do TPI, que trata da
chamada coisa julgada aparente ou fraudulenta. A Corte IDH restringe a
relativização do bis in idem aos crimes mais graves contra os direitos humanos.
• Independência de instâncias: quando a CADH proíbe um novo processo pelos
mesmos fatos, isso quer dizer que se interdita apenas um novo processo penal ou

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que o cidadão pode ser processado pelos mesmos fatos também nas demais
instâncias (num processo administrativo disciplinar ou numa ação por
improbidade administrativa por exemplo)? Questão muito discutida na
doutrina. A Corte IDH se manifestou sobre o assunto no julgamento do Caso
Rosadio Villavicencio vs. Peru, afirmando que a garantia incide apenas no âmbito
da jurisdição penal, não impedindo, assim, a concomitância de demandas em
instâncias diversas pelos mesmos fatos.
• Bis in idem no âmbito transnacional: o art. 8º do CP estabelece que “A pena
cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime,
quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”. Assim, busca atenuar e
não eliminar a dupla persecução penal. O STF decidiu pela realização de controle
de convencionalidade do art. 8º do CP, tendo por paradigmas o art. 8.4 da CADH
e o art. 14.7 do PIDCP, que determinam a vedação à dupla persecução penal, ainda
que em jurisdições de países distintos (HC 171.118, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar
Mendes, j. 2019).
• Bis in idem no ajuizamento de denúncia pelos mesmos fatos na Justiça
Eleitoral e na Justiça Comum: tratando-se de idênticas imputações, não incide
a tese de independência entre as instâncias, pois as duas demandas são de natureza
criminal (STJ, REsp 1.847.488, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, j. 20.4.2021).
• Duplicidade de sentenças: “Os institutos da litispendência e da coisa julgada
direcionam à insubsistência do segundo processo e da segunda sentença proferida,
sendo imprópria a prevalência do que seja mais favorável ao acusado” (STF, HC
101.131, Rel. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, j. 25.10.2011). No
mesmo sentido: STJ, RHC 69.586, 2018 (pode ser interessante ler também o voto
vencido do Min. Sebastião Reis Júnior, que fundamenta seu entendimento na
doutrina de Paulo Rangel).

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