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Análise comparativa entre as carreiras de pesquisa e de suporte à pesquisa na Embrapa : o enfoque da psicodinâmica

2007

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UNB FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO, CONTABILIDADE INFORMAÇÃO E DOCUMENTAÇÃO – FACE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO - PPGA E CIÊNCIA DA ROSANA HOFFMAN CÂMARA ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS CARREIRAS DE PESQUISA E DE SUPORTE À PESQUISA NA EMBRAPA: O ENFOQUE DA PSICODINÂMICA Brasília – DF 2007 ROSANA HOFFMAN CÂMARA ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS CARREIRAS DE PESQUISA E DE SUPORTE À PESQUISA NA EMBRAPA: O ENFOQUE DA PSICODINÂMICA Dissertação apresentada no Programa de Pós-Graduação em Administração, da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Ciência da Informação e Documentação (FACE), da Universidade de Brasília, como requisito à obtenção de grau de Mestre em Gestão Social e Trabalho. Orientadora: Profª. Drª. Maria de Fátima Bruno de Faria Brasília – DF 2007 ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS CARREIRAS DE PESQUISA E DE SUPORTE À PESQUISA NA EMBRAPA: O ENFOQUE DA PSICODINÂMICA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APROVADA PELA SEGUINTE COMISSÃO EXAMINADORA: ____________________________________________________ Profª. Dra. Maria de Fátima Bruno de Faria (Orientadora) Universidade de Brasília, Programa de Pós-Graduação em Administração Orientadora. _____________________________________________________ Profª. Dra. Ana Magnólia Mendes Universidade de Brasília, Instituto de Psicologia - Examinadora. ____________________________________________________ Profº. Dr. Marcus Vinícius Soares Siqueira Universidade de Brasília, Programa de Pós-Graduação em Administração Examinador. Ao meu esposo, João Batista Drummond Câmara e aos meus filhos Stella, Henrique e Arthur, que souberam esperar. Também ao meu pai e minha mãe Annita e Adolpho Hoffman (in memorian) que infelizmente não puderam compartilhar comigo este momento de realização. AGRADECIMENTOS À minha família, João, Stella, Henrique e Arthur e principalmente à minha mãe, Annita (in memorian). Todos acreditaram nesta investida e compreenderam a minha ausência nos momentos de recolhimento para estudo. Aos amigos constantes, mas que se mantiveram distantes em uma espera silenciosa e compreensiva. À professora Maria de Fátima Bruno de Faria, pela incessante orientação e alto grau de exigência, incentivando-me constantemente, com seu exemplo, a prosseguir em direção à minha meta de conhecimentos, e também por sua amizade e apoio. Aos professores Ana Magnólia Mendes, José Newton Garcia de Araújo e Marcus Vinícius Soares Siqueira. À primeira pelo auxílio irrestrito e constante no meu caminhar. Ao segundo por sua capacidade de observação, análise e síntese, pela exigência de precisão e pelo apoio ofertado no momento da qualificação do projeto desta dissertação e ao terceiro, por tão rápida e desprendidamente, ter aceitado contribuir de modo definitivo para a finalização deste trabalho. A todos os professores do mestrado, meu respeito, carinho e admiração, pois não se limitaram a apenas lecionar ou só transmitir conhecimentos. Sem exceções, foram amigos e companheiros, me incentivando em cada etapa cumprida, em cada passo desta caminhada. Ao professor Tomás de Aquino Guimarães, pela presença e cuidado constantes para que eu conseguisse chegar ao final desta tão gratificante etapa de minha vida, permitindo a realização de um sonho. Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da UnB, sempre dedicados ao trabalho diário e presentes em todos os momentos, dispostos a nos ajudar. Aos gestores do Departamento de Gestão de Pessoas da Embrapa, em especial ao Sr. José Prado Fonseca Filho, que acreditou em minha capacidade e me proporcionou tranqüilidade para a conclusão de meus estudos e ao Sr. César Felício Prata, pelo incentivo, apoio e ótima atuação como conselheiro acadêmico. Aos empregados da Embrapa, pela colaboração e engajamento nas respostas aos questionários e entrevistas desta pesquisa, sempre prontos a ajudar e sem os quais me seria impossível à conclusão deste. Aos amigos e colegas da turma do curso de Mestrado, pelos momentos de estudo, debates, aprendizado e sofrimento conjunto e, em especial, pelos momentos inesquecíveis de descontração após as aulas. A todos, meu carinho e em especial à Onília Almeida, Geraldo Torrecillas, Vinícius Correa, Virginia Nogueira, Leonardo Hoff, Rosânia Rodrigues de Sousa e Suzana Canez da Cruz Lima. Agradecer é saber que em algum momento se precisou de alguém. São inúmeras as pessoas que me acompanharam nesta jornada. Ninguém conseguiria sozinho. Certamente alguns aqui não foram citados. E certamente, não por minha vontade. Seria uma tarefa hercúlea tentar agradecer a todos que me auxiliaram, lançaram um olhar de apoio, uma palavra de incentivo, um gesto de compreensão, uma atitude de carinho. A todos vocês, que compartilharam meu sonho, dedico este trabalho com a mais profunda gratidão e respeito. "Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo..." Fernando Pessoa RESUMO O presente estudo teve como objetivo comparar diferenças na percepção de dois grupos de carreiras distintas de uma mesma organização de pesquisa, quanto à influência do contexto de trabalho e as vivências de prazer e de sofrimento advindas deste contexto. Foi amparado pelas abordagens da Ergonomia da Atividade e da Psicodinâmica do Trabalho. Partiu do princípio da importância da centralidade do trabalho na vida das pessoas e teve como pressuposto o entendimento de que o prazer e o sofrimento são resultantes da interação dos trabalhadores com determinado contexto de trabalho. Como indicadores de contexto as dimensões da organização, condições e relações socioprofissionais dos trabalhadores foram observadas e como indicadores das vivências de prazer foram utilizados a gratificação e a liberdade. Finalmente como indicadores de sofrimento, os sentimentos de insegurança e desgaste frente ao contexto organizacional embasaram os estudos. De acordo com a Psicodinâmica do Trabalho, as vivências de prazer e sofrimento são apresentadas como construto teórico de comportamento dialético em razão da coexistência das duas vivências em um único contexto de trabalho. O estudo foi realizado na Embrapa, sendo conduzido por meio das abordagens quantitativa e qualitativa. Na etapa quantitativa, participaram 245 empregados sendo 168 empregados da carreira de suporte à pesquisa e 77 empregados da carreira de pesquisa. Foram utilizadas as escalas EACT e EIPST. Na etapa qualitativa, foram realizadas onze entrevistas individuais abertas semi-estruturadas, sendo seis com o pessoal da carreira de suporte à pesquisa e cinco com o pessoal da carreira de pesquisa. As escalas foram analisadas mediante estatísticas descritivas e análises inferenciais por meio do software SPSS, versão 14.0 para Windows. Foi utilizada a técnica de análise de núcleos de sentido para o exame dos dados qualitativos. Com base nos resultados quantitativos e qualitativos foi possível constatar que, à época da pesquisa, havia diferenças de percepção entre empregados de duas carreiras distintas de uma mesma organização. Conclui-se que os empregados vivenciavam moderadamente prazer e sofrimento, sendo que prevaleciam vivências de sofrimento para os empregados da carreira de suporte à pesquisa com menos intensidade para o pessoal da carreira de pesquisa. As principais estratégias de enfrentamento do sofrimento encontradas foram a racionalização e a negação, recursos de defesas que buscam manter o equilíbrio biopsicossocial do trabalhador. Foram sugeridos estudos empíricos sob diferentes perspectivas teóricas, de forma a avançar no entendimento dos fenômenos estudados. Palavras-chave: contexto de trabalho, prazer e sofrimento, carreiras, estratégias de mediação. ABSTRACT The present study had as objective to compare differences in the perception of two distinct careers groups in a research organization, regarding the working context influence and the pleasure existences and of suffering come upon of this context. It was based in the Activity Ergonomics approaches and of psychodynamic of the work. It started in the centrality importance principle of work in people's life and as concern presupposed the understanding that the pleasure and the suffering are resultant of the workers interaction with determined working context. Like context indicators the organization dimensions, terms and workers' socioprofessional relationships were observed and how pleasure existences indicators were used the gratuity and the freedom. Finally how suffering indicators, the insecurity and waste front feeling to the organizational context based the studies. According to psychodynamics of the work, the pleasure and suffering existences are presented how theoretical construct of dialectic behavior in coexistence reason of the two existences in an only working context. The study was held in Embrapa, being conducted by means of the quantitative and qualitative approaches. In the quantitative stage, they took part 245 employees being 168 employees of the support career to the research and 77 employees of the research career. They were used EACT scales and EIPST. In the qualitative stage, they were performed eleven opened individual semi-structured interviews, being six with the support career people to the research and five with the research career people. The scales were analyzed by means of descriptive statistics and inferential analyses by means of the software SPSS, version 14.0 to Windows. The qualitative data were examined by means of the cores analysis technique of meaning. Based in the quantitative and qualitative results, it was possible, at the time of the study, to verify that there were perception differences among employees of two different careers in a same organization. It concludes that the employees feeling moderately pleasure and suffering, and prevailed suffering existences for the support career employees to the research with less intensity for the research career people. The facing main strategies of the found suffering went the rationalization and the denial, defenses resources who seek to keep worker's biopsychosocial balance. They were suggested empiric studies under different theoretical perspectives, to move forward in the understanding of the studied phenomena. Key -Words: Working context, pleasure and suffering, careers, mediation strategies. LISTA DE QUADROS Quadro 1: Quadro 2: Quadro 3: Quadro 4: Quadro 5: Quadro 6: Quadro 7: Quadro 8: Quadro 9 Quadro 10 Quadro 11 Quadro 12: Dimensões que constituem o Contexto de Trabalho................................... Indicadores de sofrimento no trabalho, segundo Jayet................................ Indicadores para verificação de prazer e sofrimento no ambiente organizacional.............................................................................................. Indicadores do contexto de trabalho................................................................ Indicadores de prazer e sofrimento no trabalho........................................... Composição da população........................................................................... Descrição da estrutura fatorial da Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT)........................................................................................ Descrição da estrutura fatorial da Escala de Indicadores de PrazerSofrimento no Trabalho (EIPST)................................................................. Principais resultados obtidos na análise quantitativa................................. Resumo das categorias sínteses da entrevistas individuais – Pessoal de Suporte à Pesquisa...................................................................................... Resumo das categorias sínteses da entrevistas individuais – Pessoal de Pesquisa...................................................................................................... Categorias das entrevistas individuais com pessoal das carreiras de Suporte à Pesquisa e de Pesquisa............................................................... 37 56 71 78 81 86 88 89 110 113 121 129 LISTA DE FIGURAS Figura 1: Aspectos centrais da dimensão da Organização do Trabalho.......................... Figura 2: Atividade de trabalho - Estratégias de mediação individual e coletiva do 38 tipo operatória.................................................................................................. 41 Figura 3: Funcionamento das estratégias de mobilização coletiva................................. 61 Figura 4: A Psicodinâmica do Trabalho.......................................................................... 66 Figura 5: Contexto de Produção de Bens e Serviços (CPBS) - Principais fatores......... Figura 6: Relação entre variáveis pertinentes ao objeto de estudo 78 da pesquisa........................................................................................................... 95 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1: Faixa Etária da Amostra......................................................................... 99 Gráfico 2: Grau de Escolaridade.............................................................................. 99 Gráfico 3: Outliers do Fator Insegurança................................................................. 104 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Caracterização da amostra quanto ao tempo de empresa e tempo no cargo..................................................................................................................... 100 Tabela 2: Média e desvio padrão dos fatores de contexto do trabalho................................ Tabela 3: Média e desvio padrão dos fatores das vivências de prazer 101 e sofrimento............................................................................................................ 101 Tabela 4: Média e Desvio Padrão dos fatores em cada carreira.......................................... 102 Tabela 5: Correlação entre os fatores das escalas e as duas carreiras estudadas................ 107 Tabela 6: Correlações entre os fatores das escalas e variáveis demográficas........................................................................................................ 108 SUMÁRIO 1 Introdução....................................................................................................................... 15 2 Referencial Teórico........................................................................................................ 21 2.1 Considerações sobre a evolução histórica do trabalho.................................................. 21 2.2 Concepções, sentido e significado do trabalho............................................................. 29 2.3 A Ergonomia da Atividade............................................................................................ 35 2.3.1 Conceitos centrais que compõem a Ergonomia da Atividade.................................... 39 2.4 A Psicodinâmica do trabalho........................................................................................ 42 2.4.1 Conceitos centrais que compõem a Psicodinâmica do Trabalho............................... 52 2.5 Ergonomia da Atividade e Psicodinâmica do Trabalho – Um diálogo entre duas disciplinas..................................................................................................................... 72 3 Metodologia................................................................................................................... 77 3.1 Abordagens utilizadas para a realização do estudo....................................................... 77 3.1.1 Ergonomia da Atividade............................................................................................ 77 3.1.2 Psicodinâmica do Trabalho........................................................................................ 79 3.2 Tipo de Pesquisa........................................................................................................... 82 3.3 População e Amostra.................................................................................................... 84 3.3.1 Contextualização da organização.............................................................................. 84 3.3.2 Critérios de seleção dos participantes........................................................................ 86 3.4 Instrumentos de Coleta de Dados................................................................................. 87 3.4.1 Questionário............................................................................................................... 87 3.4.2 Entrevistas individuais abertas semi-estruturadas..................................................... 90 3.5 Procedimentos de Coleta de Dados.............................................................................. 92 3.5.1 Questionários............................................................................................................. 92 3.5.2 Entrevistas.................................................................................................................. 93 3.6 Análise de Dados........................................................................................................... 93 3.6.1 Questionários.............................................................................................................. 93 3.6.2 Entrevistas.................................................................................................................. 95 4 Apresentação dos Resultados........................................................................................ 98 4.1 Resultados dos dados dos questionários....................................................................... 98 4.1.1 Resultados das análises estatísticas descritivas......................................................... 98 4.1.2 Resultados das análises estatísticas inferenciais........................................................ 102 4.1.2.1 Avaliação dos pressupostos dos testes estatísticos.................................................. 103 4.1.2.2 Resultados dos testes "t"......................................................................................... 105 4.1.2.3 Resultados das Correlações bivariadas................................................................... 106 4.1.2.4 Resultados da MANOVA....................................................................................... 108 4.1.3 Síntese dos resultados quantitativos.......................................................................... 110 4.2 Resultados dos dados das entrevistas........................................................................... 112 4.2.1 Resultados das entrevistas com o pessoal da carreira de suporte à pesquisa............ 113 4.2.2 Resultados das entrevistas com o pessoal da carreira de pesquisa........................... 121 4.2.3 Síntese dos resultados das entrevistas....................................................................... 129 5 Discussão dos Resultados............................................................................................. 130 5.1 Quantitativos................................................................................................................ 130 5.2 Qualitativos.................................................................................................................. 137 5.3 Quantitativos e qualitativos......................................................................................... 144 6 Conclusão....................................................................................................................... 150 Referências........................................................................................................................ 156 Anexo A - Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho – EACT.................................. 163 Anexo B - Escala de Indicadores de Prazer-Sofrimento no Trabalho EIPST................... 166 15 1 Introdução Indivíduo e sociedade. Não se concebe esta separação, assim como não se compreende a cisão entre pessoas e organizações de trabalho. São as pessoas que estruturam as organizações, que as planejam, fazem funcionar e atingir os objetivos e os resultados para que as mesmas continuem existindo. As pessoas constituem o pilar de uma organização produtiva, portanto, torna-se imperativo repensar questões relacionadas à qualidade de vida dos que nela trabalham. Após a mudança de paradigma da sociedade industrial para a sociedade do conhecimento, as organizações precisaram se adaptar rapidamente a esta nova realidade, para adaptarem-se às novas imposições do mercado. Todos os recursos organizacionais deveriam estar em pleno funcionamento, ajustados à nova conjuntura, para garantir a sobrevivência das pessoas inseridas nas organizações, da sociedade e das instituições. O ser humano se vê pressionado, tanto na vida pessoal como profissional, aumentando sua carga de trabalho e diminuindo assim o tempo para o descanso. Quando essa situação permanece por um tempo considerável, há o risco desse processo robotizar a pessoa e de se menosprezar a importância do bem-estar geral, o que pode levar o organismo a diminuir a capacidade de reagir a estímulos externos e chegar à situação de estresse, depressão e outras manifestações de adoecimento (DEJOURS, 1987, 1999a; FERREIRA; MENDES, 2003; MORIN, 2001; TEIXEIRA FILHO, 2004). Esse processo envolve desgastes, ansiedades, desequilíbrios e mudanças de paradigmas. As pessoas começam a sentir-se ameaçadas frente a essa situação. É preciso estar atento para manter a integridade física, psíquica e social dos trabalhadores no contexto de trabalho, buscando vias que minimizem o sofrimento acarretado pelas mudanças sociais e maximizem a qualidade de vida no trabalho. Diversos fatores contribuem ou prejudicam a manutenção dessa integridade. Mantê-la, não é uma tarefa fácil. Esta relação saúde-trabalho foi tema negligenciado por grandes instituições e corporações ao longo de um extenso período, entretanto, vem reassumindo seu destaque nas últimas décadas. (BORGES; YAMAMOTO, 2004; DEJOURS, 1993, 1994; FERNANDES, 1996; FERREIRA; MENDES, 2003; TEIXEIRA-FILHO, 2004). Constata-se, no entanto, o aumento do interesse por questões relacionadas ao bemestar do trabalhador bem como o aumento do número de pesquisas no mundo do trabalho que vêm se mostrando importantes e prolíferas devido à essencial posição que o trabalho assume 16 tanto para a estrutura social quanto econômica no mundo atual (ANTUNES, 1999; DEJOURS 1996, 1999a, 1999b, 2004; FERREIRA; MENDES, 2003; MORIN, 2001). Assim, torna-se necessário que tais fenômenos sejam investigados empiricamente para que se tenha um diagnóstico que fundamente possíveis ações mitigadoras dos fatores geradores de desgaste e de insegurança no ambiente de trabalho. Diante desse contexto, surgiu a motivação para investigar o seguinte problema de pesquisa: Existiam diferenças nas percepções de duas carreiras distintas, em uma mesma organização, sobre a influência do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento? Fundamentada nesse fato, a pesquisa teve por objetivo geral investigar se a percepção dos empregados de duas carreiras distintas, suporte à pesquisa e pesquisa, em uma organização com foco em ciência e desenvolvimento tecnológico, era diferenciada entre os dois grupos, em relação à influência do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento. Para o alcance deste objetivo, para esta pesquisa, fez-se a opção de abordar a concepção da Ergonomia da Atividade em articulação com a Psicodinâmica do Trabalho, proposta por Ferreira e Mendes (2003). A Ergonomia da Atividade define como contexto de trabalho a articulação das dimensões condições de trabalho (suporte organizacional, remuneração), organização do trabalho (ritmo, produtividade) e as relações sociais de trabalho (interações com chefias e colegas), dimensões estas, adotadas nesta pesquisa. Também para a Psicodinâmica do Trabalho a qualidade de vida do trabalhador está associada às relações sociais de trabalho e à sua condição de existência (MENDES, 2007). O eixo de análise é a dinâmica trabalho, prazer e sofrimento, que articula a organização do trabalho e os processos de subjetivação manifestos nas vivências de prazer e sofrimento e nas estratégias de ação para mediar estas vivências. Os fatores vinculados à Psicodinâmica adotados para análise nesta pesquisa para investigar as vivências de prazer e sofrimento no ambiente laboral foram: liberdade (sentimento de ser aceito e admirado no trabalho e ter liberdade para pensar, organizar e expressar sua individualidade); gratificação (sentimento de satisfação, realização e orgulho de que o trabalho tem sentido e valor por si mesmo, de que é importante e significativo para a pessoa, para a organização e para a sociedade); desgaste (sentimentos de desânimo, descontentamento, adormecimento intelectual e apatia em relação ao trabalho) e insegurança 17 (temor de não conseguir satisfazer as imposições organizacionais relacionadas à competência profissional, produtividade, ritmos e normas do trabalho). Assim, visando agregar informações à produção científica sobre o tema, a proposta deste estudo foi a de desenvolver uma pesquisa de natureza descritiva quanto à influência do contexto de trabalho, nas dimensões acima referenciadas, sobre as vivências de prazer e sofrimento das pessoas na organização em pauta, bem como se havia diferenças de percepções entre duas carreiras estabelecidas em uma mesma empresa. Esta pesquisa teve ainda como intuito: (a) verificar os indicadores de qualidade de vida por meio das influências do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento; (b) comparar as percepções entre dois grupos de carreiras distintas e as causas, consoantes ao contexto de trabalho, que influenciavam as vivências de prazer e sofrimento; (c) identificar as estratégias de defesa ou de mobilização individual ou coletiva utilizadas pelos dois grupos; (d) verificar a influência nos fenômenos pesquisados, das variáveis demográficas dos profissionais que trabalham na instituição pesquisada; e (e) fornecer à empresa pesquisada subsídios para desenvolvimento de programas que propiciem a melhoria do contexto organizacional no que se refere à qualidade de vida no trabalho, nas duas carreiras. Tais propósitos tiveram respaldo no cenário atual pelo qual passam as organizações e que calcaram a relevância desta pesquisa. Segundo Dejours (1987), embora todo e qualquer trabalho implique em sofrimento e prazer, há aqueles que, por suas próprias características, trazem em seu bojo, uma dosagem maior de sofrimento ou de prazer. Para o autor, quanto mais se sobe na hierarquia das empresas, mais há espaço para a expressão do sujeito e menores são as vivências de sofrimento. Mendes (1994) reforça esta premissa quando estudando o prazer-sofrimento identificou que, caso a organização do trabalho contemple a fragmentação e especialização, tarefas repetitivas e pouco significativas e as relações com pares ou hierarquia baseadas em fatores negativos como o controle e competitividade, predominarão vivências de sofrimento expressas em sentimentos como frustração, tédio e impotência. Impera, assim, a necessidade das organizações tomarem consciência da importância de averiguar como se dá a percepção desse fenômeno por parte dos que nela trabalham, no sentido de buscar mitigar o sofrimento das pessoas no ambiente laboral, visando adotar medidas que identifiquem e procurem eliminar ou reduzir possíveis fontes de adoecimento oriundas dessas situações. 18 Impactos do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento do trabalhador são assuntos de interesse tanto da Administração, como da Psicologia do Trabalho, Engenharia de Segurança e demais disciplinas correlatas. Tais fenômenos, expostos ao estudo das mais diferentes instâncias acadêmicas, emerge, embora não recentemente, da preocupação com a sobrevivência das organizações produtivas. Para Seligmann-Silva (1995) os trabalhadores, em geral, não deveriam ser expostos a condições físicas perigosas ou prejudiciais à saúde. Referindo-se à presença dessas condições, os autores afirmam que ela pode acarretar danos físicos, emocionais e sociais. Em organizações de pesquisa, os empregados, além de sofrerem as pressões dos ambientes internos e externos, ficam também expostos, em determinadas circunstâncias, a situações de risco, posto que alguns atuam em laboratórios que utilizam produtos danosos à saúde. Segundo Dejours (1993), é possível demonstrar que as condições e organização do trabalho e as suas pressões influenciam a integridade física, psíquica e social do trabalhador. A atividade profissional, além de um modo de ganhar a vida, constitui-se numa forma de inserção social, na qual aspectos físicos, psíquicos e sociais estão fortemente implicados, entretanto, existem estímulos eficientes para desencadear energias e uma sublimação compensatória, atribuída às atividades de utilidade e reconhecimento sociais, funcionando como operadores da saúde geral (DEJOURS; ABDOUCHELI; JAYET; 1994; DEJOURS; DESSORS; DESRIAUX 1993). Nesse caso, segundo esses autores, o trabalho torna-se um fator de integridade e de desenvolvimento desde que dê condições ao trabalhador de aliar o desejo de executar a tarefa às suas necessidades físicas, psíquicas e sociais, dependendo do contexto do trabalho e das condições em que o realiza. De acordo com Ferreira e Mendes (2003), no Brasil, estudos dessa natureza possuem uma importância ainda maior, devida à notória precariedade em que se encontram algumas categorias de trabalhadores, que sofrem com problemas como instabilidade profissional e sobrecarga de serviço, entre outros; e, por isso, são acometidos, além de outras, por mazelas como estresse e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT), estes últimos antigamente denominados de Lesões por Esforços Repetitivos (LER). Portanto, o sofrimento é tido como uma vivência freqüente e permanente de experiências dolorosas impostas por situações de trabalho. Posto isto, a relevância da pesquisa decorreu da identificação de fatores do contexto de trabalho que influenciam as vivências de prazer ou sofrimento em instituições de pesquisa, 19 bem como o efeito nos aspectos físicos, psíquicos e sociais e que podem impactar diretamente no cenário acima citado. As abordagens existentes e as pesquisas constantes em artigos científicos nacionais acerca do tema (ABRAHÃO, 1993; CODO, 2004b; FERREIRA; MENDES, 2003; PEREIRA, 2003; TILLMANN, 1994) demonstram poucas referências à percepção do prazer e sofrimento e do bem-estar físico, psíquico e social relativos a grupos com naturezas distintas de trabalho dentro de uma mesma organização. De modo geral, são investigadas categorias similares de profissionais em organizações diversas. Em face dessas constatações, tornou-se relevante desenvolver estudos comparativos sobre os fenômenos objeto desta pesquisa, de modo a contribuir, além do conhecimento acima citado, para melhoria de outras organizações de desenvolvimento científico e tecnológico, da sociedade, bem como para a organização objeto deste estudo. Para detalhamento deste estudo foram apresentados seis capítulos. O Capítulo 1 introduziu a contextualização do problema de pesquisa e calcou os objetivos propostos para esta nas abordagens teóricas, ressaltando a relevância e justificativa de propósitos. O Capítulo 2 trouxe o referencial teórico que fundamentou a investigação dos fenômenos propostos abrangidos dentro das organizações, bem como as abordagens correlatas ao tema. Trouxe uma exposição da evolução histórica do trabalho, aqui concebido como categoria central para a formação do sujeito e da sociedade, vislumbrando os sentidos que o trabalho assume frente aos principais modelos de gestão criados pelo sistema capitalista, as transformações ocorridas no mundo do trabalho em virtude da crise do capital e as implicações desse cenário para os trabalhadores. Em seguida descreveu a contribuição da Ergonomia da Atividade e da Psicodinâmica do Trabalho para o estudo das influências do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento, com base nas contribuições de Dejours e autores brasileiros, concebeu a operacionalização dos principais conceitos das abordagens verificadas e, finalmente, estabeleceu um diálogo entre as abordagens escolhidas para nortearem o estudo. O Capítulo 3 relatou a metodologia utilizada, propondo as abordagens que definiram as variáveis do estudo, a população investigada, os procedimentos adotados para coleta de dados e o tipo de análise de dados utilizada para o atingimento dos objetivos geral e específicos propostos. No Capítulo 4 foram expostos os resultados obtidos por meio da análise quantitativa, que permitiram a caracterizar a população pesquisada e apresentar estatísticas descritivas 20 como freqüência, médias e desvios-padrão e inferenciais como testes "t", correlações, ANOVAs e MANOVA. Os dados qualitativos foram apresentados por meio de quadros contendo cinco categorias referentes ao pessoal de suporte à pesquisa e cinco categorias referentes ao pessoal de pesquisa. O Capítulo 5 discutiu os achados do estudo, buscando responder à pergunta norteadora da pesquisa, com base na articulação dos objetivos propostos, resultados e referencial teórico. Ao finalizar, o Capítulo 6 apresentou as conclusões do estudo apontando contribuições, limites, agendas de pesquisa e algumas considerações finais. Haja vista todo o escopo apresentado nesta pesquisa, à seção a seguir trata, portanto, do referencial teórico no qual se calcou o estudo. 21 2 Referencial Teórico A primeira seção deste capítulo propôs um percurso histórico pelo mundo do trabalho para que se tivesse uma visão panorâmica do contexto em que se inseriu o presente estudo. Discorreu sobre como o trabalho chegou a ser o que é hoje e que fatores foram determinantes para que o contexto socioeconômico vigente no mundo do trabalho se transformasse na sociedade assalariada e precarizada que se encontra atualmente. Para tanto, buscou-se a compreensão da construção histórica do contexto de trabalho, influenciada pelas idéias da classe dominante, paralelamente à identificação das principais ocorrências críticas em cada período. 2.1 Considerações sobre a evolução histórica do trabalho Para entender como está estruturada a concepção de trabalho nos dias atuais, faz-se necessária uma apresentação da origem do construto, iniciando-se pela ideologia em que foi inicialmente sedimentada, a transformação da concepção pelo movimento operário, onde as correlações de forças entre trabalhadores, patrões e Estado promoveram a evolução das condições de vida e de trabalho, até o esgotamento do modelo taylorista-fordista, que desemboca na contemporaneidade e impele à reflexão sobre o prazer, sofrimento e saúde dos trabalhadores (BORGES; YAMAMOTO, 2004; DEJOURS, 1987; MACHADO, 2006; MOTTA, 1987; RIBEIRO; LEDA, 2005; TEIXEIRA FILHO, 2004). Segundo Borges e Yamamoto (2004), a origem da palavra trabalho está associada a alguns termos latinos. Pode-se citar o termo tripalium (do latim vulgar tripalium, instrumento de tortura composto de três paus ou varas cruzadas, ao qual se prendia o réu), que significava atormentar com o tripálio, um instrumento utilizado para tortura. A partir de então, pode-se perceber que o ato de trabalhar estava vinculado ao conceito de sofrimento, de martírio. Historicamente, o homem sempre precisou trabalhar para viver. Primeiramente para obter seu alimento, já que antes da civilização não tinha outras necessidades, face ao primitivismo de sua vida. Na história da dominação do mais forte sobre o mais fraco, entre outras coisas, a subjugação ocorreu também por meio do trabalho. O homem percebeu que poderia colocar outras pessoas para fazer seus serviços, o que originou o conceito de escravidão. A escravidão entre os egípcios, gregos e romanos atingiu grande proporções. Em Roma, os grandes senhores tinham escravos de várias classes, desde pastores, operários, gladiadores, músicos, filósofos e poetas. 22 Aristóteles afirmava que, para evoluir culturalmente, era necessário ser rico e ocioso e que isso não seria possível sem a escravidão, chegando essa a ser legal e justa, naquele e em outros períodos históricos (TEIXEIRA FILHO, 2004). Para agravar mais ainda este aspecto, os nobres não trabalhavam, o que tornava ainda mais estigmatizada essa atividade. Trabalho era sinônimo de escravidão e sofrimento. No antigo império greco-romano, o trabalho era depreciado pelos cidadãos, os considerados homens livres. Conforme Teixeira Filho (2004, p.7): Platão considerava o exercício das profissões vil e degradante. Na Roma antiga só duas profissões eram consideradas dignas: a agricultura e as armas. Para Cícero, ao trabalhar por dinheiro, o homem se colocava no nível dos escravos. Por direito legal, na Roma antiga, os homens livres podiam viver à custa do tesouro público. Ribeiro e Leda (2005) indicam que, com o advento do cristianismo, a concepção de sofrimento do trabalho não chega a se modificar drasticamente. O trabalho ainda era visto como tarefa penosa e humilhante, como punição para o pecado, pois ao ser condenado, Adão teve por expiação trabalhar para ganhar o pão com o suor do seu próprio rosto. A servidão também foi praticada no feudalismo e tinha como característica a vinculação do homem a terra e, apesar de os homens à época serem considerados livres, dependiam dos senhores feudais até mesmo para se locomoverem. Tinham direito à herança, porém, deveriam pagar impostos sobre esta ao dono da terra. As corporações de ofícios coexistiram com a servidão, mas tinham características diferentes, pois os trabalhadores estavam ligados a uma profissão, numa chamada associação de artes de misteres, ou seja, os artesãos, onde também o homem era explorado pelo homem, mais precisamente pelo Mestre, que normalmente era o proprietário da oficina ou o detentor do direito de explorar a profissão, subordinando os companheiros e aprendizes. Segundo Ribeiro e Leda (2005), embora as corporações de ofício utilizassem a ideologia da subjugação, o grau máximo de realização com o trabalho deu-se na época da produção artesanal, quando o trabalhador podia acompanhar e interferir em todas as etapas do processo produtivo. O artesão revelava uma grande identificação com o próprio produto, pois se sentia diretamente responsável pelos resultados obtidos. Historicamente, sabe-se que essas corporações foram no início prestigiadas pelos reis como forma de se contrapor ao poder dos nobres, porém acabou originando uma nova classe social, a burguesia, que com o poder econômico dominou grande parte dos reinados. 23 Machado (2006) observa que, na prática, já estava havendo a migração dos trabalhadores dos campos, que se faziam libertos da escravidão, da servidão ou mesmo das corporações para as cidades, que começavam a se desenvolver, surgindo uma nova classe de trabalhadores: o proletariado. Borges e Yamamoto (2004) indicam que, apenas após o surgimento do capitalismo, uma mudança mais visível se consolida no mundo do trabalho, a era denominada de Revolução Industrial, onde emergem os estudiosos e teóricos que analisaram e influenciaram todo o processo histórico recorrente no mundo do trabalho. Surge o trabalho assalariado, espectro da venda da força de trabalho do homem como uma mercadoria, privilegiando-se a visão utilitarista, quando se faz necessária uma ressignificação do mundo do trabalho, pois para a construção do novo “homo economicus”, exige-se o desmantelamento do clássico sistema de pensamentos, conceitos, compreensões e representações medievais do trabalho escravizante. “Assim, numa economia que nutre uma visão utilitarista do trabalho, formula-se uma ideologia que atribui elevada centralidade ao trabalho, independente de seu conteúdo, associada a uma ética do cumprimento do dever” (BORGES; YAMAMOTO, 2004, p.31). Borges e Yamamoto (2004) expõem que as tentativas de aumento de produtividade eram preocupações centrais das obras de Adam Smith no final do século XVII, cujo principal postulado focava-se em maior produtividade mediante a especialização do trabalhador em uma única tarefa. Este teórico afirmava que a divisão do trabalho era uma conseqüência natural das aptidões individuais do ser humano. Ribeiro e Leda (2005, p.1) apontam que: Com a Revolução Industrial a emoção é retirada do local de trabalho. A racionalização é a palavra mais repetida no mundo dos negócios. A programação e o controle são determinantes, tudo é calculado, preciso. O cronômetro entra na fábrica, apodera-se dela, regula-a, domina-a, ultrapassa os seus muros e vai ditar formas de convivência para uma nova sociedade. Para Durkheim (1987), a divisão do trabalho não se restringiu à esfera econômica. Essa ideologia contaminou todo um modelo de pensamento científico e social. A divisão do trabalho, ao mesmo tempo em que se tornou uma lei da natureza, configurou-se também como uma regra moral da conduta humana. Dejours (1987) aponta que o período de desenvolvimento do capitalismo industrial caracterizou-se pelo crescimento da produção, pelo êxodo rural e pela concentração de novas populações urbanas, que acarretaram condições de vida miseráveis. Quanto às condições de 24 trabalho da época, o autor denominava-a de Miséria Operária. Machado (2006) afirma que, nas indústrias, os patrões tinham a obrigação apenas de pagar um mísero salário, sem se preocuparem se era suficiente para as necessidades mínimas dos trabalhadores. Somava-se a isso, a abundância de mão-de-obra que chegava às cidades, de modo que não havia a preocupação da perda da prestação de serviços, podendo um operário facilmente ser substituído por outro. Essa situação prevaleceu até que surgiu, dadas às condições inóspitas dos trabalhadores, a chamada formação de uma consciência de classe. Assinala, ainda, que tais condições propiciaram o surgimento de luta de classes, colocando aqueles que estavam subjugados, em posição antagônica aos detentores dos grandes capitais, ou seja, posicionava-se de um lado a miséria dos operários e de outro, a opulência dos patrões. A consciência da classe operária foi formada lentamente durante todo o século XIX, favorecendo um campo fértil para o surgimento do direito do trabalho. Dejours (1987) corrobora essa afirmação quando indica que é do próprio movimento operário que surge a solidariedade e a ideologia revolucionária, bem como que as reivindicações operárias chegam ao nível político e marcam todo o século, aonde as reivindicações vão se ampliando, porém são deliberadamente postergadas politicamente. O autor traz alguns dados marcantes quanto à implementação de legislações que atendessem a essas reivindicações: nove anos para a supressão da caderneta operária (18811890), treze anos para o projeto de lei sobre a redução do tempo de trabalho das mulheres e crianças (1879-1892), onze anos para a aprovação da lei sobre a higiene e a segurança (18821893), quinze anos para a lei sobre acidentes de trabalho (1883-1898), quarenta anos para a jornada de dez horas (1879-1919), vinte e sete anos para o repouso semanal (1879-1906), vinte e cinco anos para a jornada de oito horas (1894-1919) e vinte e três anos para a jornada de oito horas nas minas (1890-1913). Somente a partir do final do século são obtidas leis sociais pertinentes, especificamente, à saúde dos trabalhadores. Borges e Yamamoto (2004, p. 32) indicam que “a história do desenvolvimento capitalista, é também a história da resistência dos trabalhadores”. Nasce a construção da consciência de classe dos próprios trabalhadores, estimulando o crescimento da organização trabalhista, que marcaram o final do século XVII e todo o século XIX pelo desenvolvimento de movimentos sindicais. As idéias de Engels e Marx impactaram profundamente esse processo de tomada de consciência de classe. Dejours (1987) afirma que o movimento operário adquire bases sólidas. As necessidades de produção oriundas da segunda grande guerra e a escassez da mão-de-obra, proveniente das mortes dos trabalhadores nos campos de batalha, balizam um vasto programa, 25 onde a proteção do corpo é a preocupação dominante. Uma verdadeira reviravolta na relação homem-trabalho. Paralelamente, é importante a distinção de que o século XVIII é conhecido como o século do Iluminismo e da razão. Um conjunto de fatos socioeconômicos e políticos cria o contexto favorável ao incremento na forma de gerenciar o trabalho e as empresas e leva à elaboração de uma sustentação científica para a concepção e organização do trabalho. Motta (1987) destaca que, no início do século XX, surgem os pioneiros da racionalização do trabalho, que ficaram conhecidos como os fundadores da Escola de Administração Científica, ou Escola Clássica. Essa escola privilegiava a administração dos recursos humanos nas empresas com foco no controle extensivo e no comando. Alguns autores indicam que Winslow Taylor imprime importantes mudanças no pensamento científico de gestão do trabalhador, à época (BORGES; YAMAMOTO, 2004; MOTTA, 1987). Sua teoria calcava-se fortemente “em sua avaliação da “vadiagem” no trabalho”, onde “... o trabalhador procura fazer sempre menos do que pode e que quando demonstra interesse em produzir, é perseguido pelos demais” (BORGES; YAMAMOTO, 2004, p. 35). É dele o estudo clássico sobre “Tempos e Movimentos”, que visava eliminar os movimentos desnecessários e substituir os movimentos lentos e ineficientes por movimentos rápidos, com o intuito de aumentar a produção. O homem deveria ser poupado de “pensar” e, para tanto, ênfase deveria ser dada à supervisão direta das tarefas. Cabia ao administrador, determinar a única maneira certa de se fazer o trabalho. As contribuições tayloristas na construção da administração científica do trabalho são complementadas por Henry Fayol (DEJOURS, 1987; MOTTA, 1987). Fayol partiu de uma visão macroscópica da organização, preocupando-se com as funções de gerenciamento. É dele a clássica divisão das funções do administrador em planejar, organizar, coordenar, comandar e controlar, o chamado POC3. Paralelamente ao Movimento da administração Científica, surge um modelo similar, desenvolvido por Henry Ford, que introduz inovações tecnológicas e econômicas ao sistema de produção. O mecanicismo e a produção em massa começam a afetar as normas de consumo e de vida da população (BORGES; YAMAMOTO, 2004; MOTTA, 1987). Ribeiro e Leda (2005) indicam que o método taylorista/fordista, utilizado nas indústrias, rapidamente contagia outras organizações, incluindo igreja, família e tipos de lazer. Valores novos passam a determinar a sincronização dos tempos de vida e do trabalho. São estabelecidos horários exatos para chegar e sair da fábrica, tempo predeterminado para 26 executar uma tarefa. O consumo do tempo livre é monitorado, a quantidade e as formas de lazer devem ser adequadas para não interferir na disposição e produtividade do operário. O trabalho passa a ser reconhecido como uma atividade central, na medida em que abrange a maior parte do tempo do indivíduo e em que é criado um novo espaço social para lhe dar o suporte necessário. Nesse período, destaca-se a invenção da esteira rolante, muito bem caracterizada por Charles Chaplin, em seu filme “Tempos Modernos”, onde esse modo de organizar o trabalho estabelece o ritmo do trabalho pela cadência da máquina. O período foi marcado pela intensificação e parcelamento das tarefas, exigências por eficiência, monotonia e falta de conteúdo do trabalho. Assim, as tendências da Administração Científica do Trabalho fundamentavam-se, portanto em conceitos como o “homo economicus”, uma única maneira certa de se trabalhar e em um incentivo monetário para o aumento da produção. O ser humano começa então, a sentir-se insatisfeito ao deparar-se com a realidade laboral (BORGES; YAMAMOTO, 2004; DEJOURS, 1987; MOTTA, 1987). Dejours (1987) considera que em 1893, com a chamada introdução do Movimento da Administração Científica nas indústrias, surge uma nova tecnologia de submissão, de disciplina do corpo e organização do trabalho, que interferem significativamente na saúde física e mental do trabalhador. O trabalho braçal é radicalmente separado do trabalho mental, onde as doenças se agravam. Motta (1987) enfatiza que com o crescimento da insatisfação do trabalhador, do movimento operário e sindical, bem como de críticos contundentes à administração científica do trabalho, surge a chamada Escola de Relações Humanas, como um contraponto da ciência à organização do trabalho vigente na época. Ressaltam-se estudos de cientistas sociais, marcados principalmente por pesquisas realizadas em uma fábrica de equipamentos eletrônicos em Hawthorne. Embora essa escola também visasse o aumento da produtividade e lucratividade pelos trabalhadores, estudava uma maneira de reduzir os custos dos conflitos entre trabalhadores e empresas. Cientistas como Mary Follet, Elton Mayo e Harold Leavit e a teoria do “homo social”, são os grandes nomes do período. A principal mudança social no mundo do trabalho a ser introduzida, focase na possibilidade do trabalhador poder agora, interferir, mesmo que de modo limitado, nas decisões (MOTTA, 1987). Não se objetiva aqui detalhar a influência da transformação do mundo do trabalho exercida por vários cientistas organizacionais do período, entretanto, não se pode esquecer o 27 impacto que tiveram as influências do enfoque Behaviorista e o “homem administrativo”, com nomes como Douglas McGregor, Chris Argyris, Rensis Likert, Chester Barnard e Hebert Simon, bem como do Estruturalismo e o “homem organizacional”, cujos teóricos mais conhecidos historicamente são Max Weber e Karl Marx (BORGES; YAMAMOTO, 2004; DEJOURS, 1987; MOTTA, 1987; RIBEIRO; LEDA, 2005). Borges e Yamamoto (2004) consideram que este período se constituiu em um dos mais efervescentes da história da humanidade. As duas guerras mundiais tiveram forte impacto no mundo do trabalho, principalmente no que tange às relações trabalho X capital e nas reformulações de idéias sobre o tema. Dejours (1987) revela que, após esse período, começa a desenhar-se uma nova etapa: a preocupação com a saúde mental do trabalhador. No âmbito econômico, ocorre um esgotamento do sistema taylorista. No âmbito social, o sistema organizacional não garante mais a superioridade e no âmbito ideológico, o sistema taylorista passa a ser acusado de desumano, tanto pelos operários quanto pelo patronato. Inicia-se a Era Pós-industrial. Ribeiro e Leda (2005) confirmam que no início da década de 70 com a crise do capitalismo, o modelo taylorista/fordista começou a dar os seus primeiros sinais de decadência. O mundo sofre mudanças que geram significativas transformações nas relações de trabalho. Tornou-se necessária uma nova forma de organização industrial, com uma estrutura mais flexível para adequar-se com mais facilidade às constantes transformações do mercado. Para Dejours (1987), o final do século XIX traz a mudança de paradigma da sociedade industrial para a sociedade do conhecimento. As organizações precisam se ajustar rapidamente a esta nova realidade, para adaptarem-se às novas imposições do mercado. O ser humano se vê pressionado, tanto na vida pessoal como profissional, aumentando sua carga de trabalho e diminuindo assim o tempo para o descanso. Quando permanece por um tempo considerável, o processo de “robotizar” o ser humano e menosprezar a importância do seu bem-estar levam o organismo a diminuir a capacidade de reagir a estímulos externos, que pode chegar à situação de estresse. Ribeiro e Leda (2005, p. 1) revelam que: Muitos fatos pressionaram os empresários, impulsionando-os a reverem os seus princípios de gestão administrativa. Dentre eles, pode-se citar: a crescente concorrência japonesa; o aumento do grau de exigência dos clientes, que não estavam mais dispostos a consumir produtos fabricados em série sem nenhuma diferenciação; a queda da taxa de lucro; a eclosão de revoltas do operariado e a crise 28 do Welfare State. É nesse contexto que emerge a era da acumulação flexível, caracterizada por um intenso processo de reestruturação da produção e do trabalho. Na década de 80, consagrou-se o modelo japonês, também conhecido como toyotismo, trazido para o ocidente pelo o engenheiro japonês Eiji Toyoda. Os empresários ocidentais buscavam soluções na experiência nipônica para os seus problemas. Uma nova forma de organização da produção e do trabalho, mais flexível e que exigisse menor concentração de estoques, disseminou-se, inicialmente nas indústrias, abrangendo posteriormente a área de serviços (ANTUNES, 1999; BORGES; YAMAMOTO, 2004; DEJOURS, 1987; RIBEIRO; LEDA, 2005). Nos anos 90, face às mudanças impostas pelo processo de globalização, que impactaram de modo significativo à sociedade produtiva e o modelo de geração e disseminação do conhecimento, torna-se agora, meio de engessamento do fluxo de desenvolvimento empresarial, por não mais dar respostas no tempo necessário aos processos de tomada de decisão, os quais devem ser cada vez mais imediatos e consistentes, acarretando um desnorteamento dos empregados envolvidos e conseqüências negativas para o ambiente laboral. A intervenção concreta na realidade, por meio do desenvolvimento de projetos intra e interinstitucionais e interdisciplinares, voltados ao enfrentamento de demandas sociais, propicia um espaço efetivo de vivência e participação dos trabalhadores. Justifica-se a premência dessa intervenção, posto que a conquista dos resultados obtidos pelas organizações nessa temática mostram-se incipientes e, principalmente, o enfrentamento dos novos desafios que se apresentam por força das mudanças sociais e tecnológicas que ocorrem de forma cada vez mais acelerada, impõem um esforço permanente de adequação organizacional. Começam a se afigurar outras tendências e desafios no mundo do trabalho. Muitas empresas dividem-se em pequenos grupos, em diferentes partes do mundo, numa relação de terceirização ou subcontratação. Vivencia-se um gradativo desaparecimento dos empregos permanentes somados a uma crescente precarização e instabilidade do trabalho. A classe trabalhadora convive com a fragmentação e a heterogeneidade em sua atual composição, submetendo-se a acordos e concessões das mais diversas ordens para a perpetuação da sobrevivência. A representatividade social dos sindicatos começa a ser reduzida. A classe trabalhadora experimenta uma situação de enfraquecimento e desamparo, mostrando-se apreensiva diante das mudanças de rumo da vida profissional. As incertezas do capitalismo flexível geram um aumento de desconfiança. Sofrem os desempregados por não verem 29 perspectivas e os empregados pelo receio de deixar de tê-las. (ANTUNES, 1999; BORGES; YAMAMOTO, 2004; RIBEIRO; LEDA, 2005). O mundo do trabalho, como tem sido chamado, vem passando por profundas transformações nas últimas três décadas. Aponta-se a crise estrutural do capitalismo que, em decorrência da política neoliberal, causou desemprego massivo, informalidade, precarização e decomposição dos salários, em nível global. Posto isso, pesquisas evidenciam que a saúde do trabalhador começa a sofrer os impactos da reestruturação produtiva. Afirmam ainda Borges e Yamamoto (2004, p.58) que “... embora cada uma das concepções citadas seja típica de um tempo histórico específico, o surgimento de uma não significa a extinção da outra. Todas de alguma forma continuam existindo”. Refletem ainda que a diversidade presente na atual realidade do mundo do trabalho indica um aumento da responsabilidade sobre estudos e concepções que norteiam cada ambiente laboral. De acordo com Ribeiro e Leda (2005) a categoria trabalho não pode ser pensada como natural ou a-histórica. O trabalho analisado em sua subjetividade, inserido em um contexto econômico, político e social com tantas diversidades, leva os indivíduos a terem duas vivências bastante distintas. A primeira referente a um caráter negativo; e a segunda a uma dimensão positiva. Em alguns momentos representa castigo divino, punição, fardo, incômodo, carga, algo esgotante para quem o realiza. Em outros, espaço de criação, realização, crescimento pessoal, possibilidade de o homem construir a si mesmo e marcar sua existência no mundo. Depreende-se do contexto histórico exposto, que fortes ideologias marcaram determinados períodos, porém, de modo geral, assumiram um caráter dicotômico e concomitante frente ao mundo do trabalho, que aparece ora como instrumento de tortura, castigo e sofrimento e ora como meio de felicidade, satisfação e prazer. Diante da conjuntura histórica apresentada, que culminou em várias concepções distintas do mundo do trabalho, a próxima seção visa contribuir para um debate sobre a natureza e o lugar do trabalho contemporâneo e ao mesmo tempo, refletir sobre o potencial que a dimensão do trabalho pode assumir na organização. 2.2 Concepções, sentido e significado do trabalho Nesta seção, são tratadas as concepções de trabalho, mediante alguns enfoques e abordagens teóricas, bem como de que modo essas concepções se inserem no ambiente de trabalho, em organizações formais. 30 Como visto anteriormente, as concepções de trabalho, ao longo do tempo, foram se modificando de acordo com o contexto histórico e social. No final do século XX, com a hegemonia do pensamento econômico, ampliou-se a influência das organizações na sociedade e na vida dos indivíduos, fazendo com que estes manifestassem diferentes concepções sobre o trabalho. Principalmente nas últimas três décadas do século XX, ocorreram inúmeras transformações sociais, entre as quais se destacam o pensamento econômico e empresarial na sociedade, o racionalismo econômico, ampliando enormemente o papel das organizações na sociedade e na vida dos indivíduos (CHANLAT, 1996). Para esse autor, o indivíduo depara-se com uma sociedade dominada pelo capital, na qual reina o pensamento de curto prazo e que estimula os trabalhadores a deixarem de ver o trabalho como uma parte da vida, encarando-o como uma forma de sobrevivência e acumulação de riquezas (CHANLAT, 1996). O processo de mudança em curso cria uma classe trabalhadora fragmentada, complexa e heterogênea, a ponto de apresentar-se mais qualificada em determinados setores (inclusive com relativa intelectualização do trabalho) e desqualificada e extremamente precarizada em outros (ANTUNES, 1999, 2002). Para tanto, faz-se importante à análise de alguns autores sobre o significado do trabalho, assim como da discussão de outro conceito inter-relacionado: o emprego. Para Morin (2001, p.12), a definição de trabalho refere-se à “uma atividade útil, determinada por um objetivo definido além do prazer gerado por sua execução” enquanto que emprego, “corresponde ao conjunto de atividades remuneradas e possui a noção de salário e do consentimento do indivíduo em permitir que uma outra pessoa dite suas condições de trabalho”. Santos (1997, p. 115) considera que “o trabalho consiste no exercício de uma atividade física ou intelectual aplicada na produção de bens ou serviços úteis à satisfação das necessidades humanas ou dos seres vivos”. Para o autor, não há uma distinção clara entre trabalho formal, o emprego, e o informal, trabalho sem vínculo empregatício. Já para Ferreira (2003, p. 34) “como processo, o trabalho é atividade mediadora entre o indivíduo e o ambiente, em uma via de mão-dupla: ao buscar transformar o ambiente para satisfazer suas necessidades materiais e espirituais, o indivíduo, como resultados dos efeitos da própria ação, é “transformado” por ele”. Vê-se que para alguns autores, as concepções de trabalho e emprego se misturam, não havendo consenso entre os mesmos. Assim, o termo trabalho ou emprego é objeto de distintos 31 significados ou sentidos. Ele pode ser entendido de acordo com diversos critérios utilizados na literatura. Implica em distinguir as relações de poder, classificar quanto às ocupações e profissões, quanto à complexidade, se formal ou informal, se emprego ou trabalho, se braçal ou intelectual, dentre outros. Em pesquisa realizada por Borges (1999), a autora confirma que as concepções do trabalho norteiam o indivíduo sobre a posição que o trabalho deve ocupar na vida, o modelo ideal de trabalho definido por meio dos valores humanos, a hierarquização e uma leitura das características do trabalho concreto. Essas concepções resultam de um processo histórico, no qual o desenvolvimento e propagação de cada uma acontecem paralelamente à evolução dos modos e relações de produção, da organização da sociedade como um todo e das formas de conhecimento humano. A autora classifica essas concepções em três grandes dimensões de interesses econômicos, ideológicos e políticos, justificando-se como instrumento das relações de poder. Para Borges (1999), essas concepções propagam-se pelas sociedades, por intermédio de vários agentes socializadores, destacando-se o próprio ambiente de trabalho (incluindo aí a gerência), o sindicalismo, as organizações educacionais, os governos, os partidos políticos, as organizações religiosas e a família. Pesquisas realizadas por Morin (2001) e Morin, Tonelli e Pliopas (2003), fundamentadas em estudos anteriores realizados pelo grupo Meaning of Work (MOW) em 1987, demonstram que a maioria dos indivíduos expressa que, mesmo que tivesse condições para viver o resto da vida confortavelmente, continuaria a trabalhar, pois o trabalho, além de fonte de sustento, é um meio de se relacionar com pessoas, se sentir como integrante de um grupo e da sociedade, para terem uma ocupação, um objetivo a ser atingido na vida. Além disso, apontam que o trabalho pode assumir tanto uma condição de neutralidade quanto de centralidade na vida dos trabalhadores, assim como na sua identificação com a sociedade. Para Mendes e Linhares (1996) em estudo realizado com enfermeiros atendentes de pacientes em UTI, identificaram que o trabalho aparece como elemento fundamental na construção do próprio indivíduo. Morin (2001) centralizou os estudos na identificação do que, para os trabalhadores, tem sentido ao se estar inserido em um contexto de trabalho e apontou cinco aspectos principais: i. realizar-se e atualizar competências; ii. adquirir segurança e ser autônomo; iii. relacionar-se com os outros e estar vinculado a algum grupo; iv. contribuir com a sociedade; v. ter um sentido na vida, o que inclui ter o que fazer e manter-se ocupado. Ao analisar quais os fatores da organização do trabalho que contribuiriam para um trabalho com 32 sentido, foram destacados: boas condições de trabalho (um trabalho que corresponda às suas competências, horário conveniente, bom salário e preservar boas condições de saúde); oportunidade de aprendizagem e realização adequada da tarefa; trabalho estimulante, variado e com autonomia. No Brasil, os resultados preliminares das pesquisas de Morin, Tonelli e Pliopas (2003), indicaram que o trabalho continua a ser essencial na vida das pessoas e que estas buscam, ao mesmo tempo, utilidade para suas atividades dentro das organizações e também para a sociedade. As autoras constataram que há semelhanças entre os resultados das pesquisas internacionais e os encontrados no estudo que realizaram. A análise dos resultados obtidos permitiu inferir que a definição de um trabalho com sentido pode ser influenciada por quatro variáveis subjetivas: a) o significado do trabalho, entendido como a concepção do que é trabalho para o indivíduo; b) o valor (grau de importância, centralidade) que o sujeito atribui ao trabalho; c) os valores éticos individuais; e d) o motivo (a razão) pela qual trabalha. Concluíram ainda que esses fatores são altamente influenciados pelo meio no qual o sujeito está inserido (cultural e social) e definiram que um trabalho com sentido é aquele que realiza, satisfaz e motiva o sujeito para a execução do trabalho. Pesquisa semelhante também foi realizada no Brasil por Bastos, Costa e Arouca (1999) onde se objetivou explorar o significado do trabalho entre dois segmentos de trabalhadores de uma empresa petroquímica e de uma construtora civil quanto à qualificação, às condições de trabalho e a inserção ocupacional, obtendo como resultados a importância da realização e instrumentalidade (necessidade e rendimentos) e da idéia de sobrevivência, mas com conteúdos com claro viés positivo (centralidade, desenvolvimento pessoal, dedicação, família e prazer). Já Borges e Yamamoto (2004, p.27) afirmam que “o trabalho não é um objeto natural... mas realiza-se na interação entre os homens ou entre os homens e a natureza” e segue as condições sociohistóricas das vivências subjetivas, ou seja, depende de acesso à tecnologia, do posicionamento na estrutura social, do saber fazer, das condições físicas, da cultura, sofrendo a variabilidade de diversos aspectos. Os autores organizam, para fins de melhorar a compreensão do construto e não de categorizá-los, desconsiderando a linearidade de ocorrências, a execução do trabalho em cinco dimensões, a saber: concreta (tecnologia, condições materiais e ambientais, segurança física, conforto), gerencial (divisão, controle, distribuição de tarefas), socioeconômica (prosperidade, renda, oferta de emprego, conflito distributivo), ideológica (em nível coletivo e 33 societal das relações sociais de poder) e, finalmente, a simbólica que abarca os aspectos subjetivos da relação de cada indivíduo com o trabalho. Indicam que são essas dimensões que compõem o mundo do trabalho. Ribeiro e Leda (2005, p.2) argumentam que, apesar do trabalho ser central para a maioria das pessoas, é crescente o número de trabalhadores que não reconhecem a esfera profissional como um espaço de realização, de reconhecimento, de poder ser útil à sociedade. Para eles, são poucos os que estão atuando em funções que permitem envolvimento e identificação. “Há na realidade, um grande grupo que trabalha apenas por necessidade financeira, que trocaria facilmente de atividade profissional. Para esse grupo, o trabalho não é um fim em si mesmo, é exclusivamente um meio para alcançar outros objetivos”. Ribeiro e Leda, (2005) expõem que, para a concepção dominante, a do capital, só tem sentido o trabalho bem remunerado, ou seja, o trabalhador migra para aquele que paga melhor. Já não existem, como em tempos recentes, profissões de maior prestígio, e sim profissões que abrem as portas para o dinheiro e o sucesso. Assim, o homem na sociedade contemporânea é reconhecido a partir do lugar que ocupa entre proprietário e consumidor, misturam-se o homem e a mercadoria. É a sociedade do consumo. Essa passa a ser a concepção predominante da representação que o homem elabora de si mesmo e dos outros à sua volta. Antunes (2002) corrobora este posicionamento alegando que, atualmente, os novos contornos do mundo do trabalho dificultam uma relação de maior envolvimento e identificação da classe trabalhadora com a vida profissional. Fundamental se faz, para averiguar o objetivo desse estudo quanto à existência de diferenças de percepções entre carreiras de natureza distintas, as reflexões de Antunes (2002) sobre as concepções do trabalho contemporâneo. A questão se revela sobre a suposição de que se o status quo, referente à cisão do trabalho intelectual e operacional, é mantida ou não. Esse autor classifica a classe trabalhadora em classe produtiva, a que produz trabalho material, e de classe improdutiva, a de trabalho imaterial, no ambiente organizacional, onde a produtiva se constitui naquela que efetivamente produz bens e que criam valor de troca para as empresas. Já a classe chamada de improdutiva, também vital para a sobrevivência do sistema, é aquela que cria valor de uso e não de troca, ou seja, que produz serviços. Antunes (2002, p.104) sugere ainda que se excluam da classe trabalhadora “os gestores do capital, seus altos funcionários, que detêm papel de controle no processo de trabalho, de valorização e reprodução do capital no interior das empresas e que recebem rendimentos elevados”. 34 Antunes (2002, p.121) concretiza uma crítica acirrada, vigente na concepção do trabalho contemporâneo, à tese da ciência como principal forma produtiva em substituição aos valores de troca, que acarretam cada vez mais a precarização e exploração no mundo do trabalho. Afirma não poder concordar “com a tese da transformação da ciência “na principal força produtiva” em substituição ao valor-trabalho, que se teria tornado inoperante”, pois considera que o trabalho material em conjunção com a ciência e tecnologia, deve constituir-se como uma única unidade para a sobrevivência social. Não se concebe mais uma separação rígida entre produção e elaboração, entre execução e concepção, entre avanço tecnológico e envolvimento adequado da força de trabalho, ou seja, a expropriação do saber fazer intelectual do trabalho, do trabalho abstrato, está também presente no trabalho material. Ante tal conjuntura, o autor apregoa que se tal fato ou mudança paradigmática efetivamente ocorresse, seria “explodida” a base material do sistema de produção do capital. Estabelece-se, então, um complexo processo interativo entre trabalho e ciência produtiva, que não leva (e não pode levar) à extinção do trabalho vivo e de sua potência constituinte sob o sistema de metabolismo social do capital. Esse processo de retro-alimentação impõe ao capital a necessidade de encontrar uma força de trabalho ainda mais complexa, multifuncional, que deve ser explorada de maneira mais intensa e sofisticada, ao menos nos ramos produtivos dotados de maior incremento tecnológico (ANTUNES, 2002, p. 123-124). Finalmente, Antunes (2002) busca, mediante as reflexões sobre a concepção do trabalho material e imaterial, cotejar a necessidade de uma reinterpretação ou reelaboração do significado da centralidade do trabalho contemporâneo. Assim, a palavra trabalho possui diversos significados e sentidos dentro de uma mesma cultura, e, mormente pode significar a realização que dá reconhecimento social, assim como a significação de esforço rotineiro e repetitivo, sem liberdade. Os indivíduos constroem suas concepções à medida que vivenciam as relações com o meio em que vivem. Para Mendes (2007) o trabalho considera a existência de forças contraditórias e conflitantes no contexto de trabalho, sendo as vivências de prazer e sofrimento entendidas como o sentido do trabalho e, como tal, um construto único e dialético. A autora reforça que um dos sentidos do trabalho é o prazer. Esse prazer emerge quando o trabalho cria identidade. Possibilita aprender sobre um fazer específico, criar, inovar e desenvolver novas formas para execução da tarefa, bem como, são oferecidas condições de interagir com os outros, de socialização e transformação do trabalho. As concepções acerca do sentido e do significado subjetivo que os trabalhadores atribuem ao ambiente de trabalho, com todas as dimensões e fatores intervenientes citados e 35 construídos com base nos conflitos, contradições e interações entre desejo/necessidade do trabalhador e as condições, organização e relações sociais particulares em determinado contexto organizacional, auxiliam na compreensão do estudo, atuando como “pano de fundo”, para a abordagem sobre como os trabalhadores estão imbricados no contexto de trabalho, por meio das abordagens da Ergonomia e da Psicodinâmica do Trabalho, temas tratados nos próximos tópicos. 2.3 A Ergonomia da Atividade Pode-se analisar o trabalho sob o aspecto motivacional, comprometimento, aprendizagem, socialização e assim por diante, sendo que alguns, se constituem pela combinação de dois ou mais destes prismas que caracterizam a atividade humana. Para fins de delimitação do construto, a análise deste estudo recairá sobre o trabalho na esfera organizacional ou no contexto de trabalho. Chanlat (1996) assegura que hoje as organizações detêm a primazia sobre o homem, haja vista a subordinação do trabalho ao universo dos objetos mercadorias e à racionalidade econômica. Mesmo com a análise realizada por outros autores sobre o esvaziamento do trabalho formal, percebe-se que o espaço ocupado pelas organizações na vida contemporânea faz com que elas sejam elemento de primeira grandeza no imaginário desse sujeito e nas suas construções sobre a realidade. Assim, pesquisas e estudos sobre os aspectos biopsicossociais do trabalhador no contexto de trabalho vêm proliferando. Ferreira (2003) assinala que os estudos sobre as condições de trabalho, oriundos da Ergonomia da Atividade, Engenharia de Produção, Ciências Biológicas e áreas afins, têm sido desenvolvido com afinco, principalmente nas duas últimas décadas. Para o autor, torna-se importante caracterizar as condições de trabalho em resposta às múltiplas demandas do mundo produtivo, tais como: melhorias das condições materiais e instrumentais de trabalho dos assalariados; identificação de agentes nocivos à saúde dos trabalhadores; transformações na organização sociotécnica do trabalho e impactos dos usos de novas tecnologias no contexto de trabalho, para que se possa, de um lado “compatibilizar os produtos e as tecnologias com as características dos usuários e, de outro, humanizar o contexto sociotécnico de trabalho, adaptando-o tanto aos objetivos do sujeito ou do grupo às exigências das tarefas” (FERREIRA, 2003, p.22). 36 O Contexto de Trabalho, aqui tratado, fundamenta-se principalmente na abordagem da Ergonomia, mais especificamente na Ergonomia da Atividade e, para tanto, faz-se necessária uma apresentação sobre essas disciplinas. A Ergonomia, disciplina que iniciou seus primeiros passos como ciência na década de 40, formou-se da confluência da psicologia, fisiologia, higiene e medicina do trabalho e das ciências exatas aplicadas ao trabalho. Seu objeto de interesse é o homem em situação de trabalho (WISNER, 1994). A Ergonomia se configura como uma área interdisciplinar, abrangendo um campo formado pelas ciências que estudam o homem e o mundo do trabalho (TILLMANN, 1994; CORRÊA, 2002). A finalidade profícua da Ergonomia, de acordo com Wisner (1994), é transformar o trabalho, para que possa ser efetuado fisicamente pelo homem com o máximo de conforto, segurança e eficácia. Entretanto, Ferreira e Mendes (2003) observam que há dois enfoques passíveis de estudo da área ergonômica, a Ergonomia da atividade e a Ergonomia do produto ou concepção, que têm traços peculiares e distintos. Para efeito do presente estudo, será explorado o enfoque referente à ergonomia da atividade, pois esse se relaciona diretamente com o objeto da pesquisa. Conforme apontam Ferreira e Mendes (2003, p. 35), a Ergonomia da Atividade é: Uma abordagem científica, que investiga a relação entre os indivíduos e o contexto de produção de bens e serviços. Analisa as contradições presentes nessa interrelação e, em conseqüência, as estratégias operatórias individuais e coletivas de mediação que são forjadas para responder à diversidade de exigências existentes nas situações de trabalho e reduzir a dimensão negativa do custo humano vivenciado pelos trabalhadores. Assim, a Ergonomia da atividade busca determinar os componentes da carga de trabalho, e sua repercussão sobre a saúde do trabalhador e sobre a produtividade. Atualmente, um dos principais objetos dos estudos em Ergonomia é a carga de trabalho (lógica de funcionamento do contexto de trabalho, que parte das concepções de desempenhos eficientes e eficazes) a que os trabalhadores estão submetidos, pois podem tornar-se fonte de sofrimento ou ao contrário, fonte de realização e de prazer. Para a Ergonomia da Atividade, a concepção de ambiente de trabalho ou Contexto de Trabalho, anteriormente denominado por Ferreira e Mendes (2003) de Contexto de Produção de Bens e Serviços (CPBS), disponibiliza os recursos materiais, instrumentais, 37 tecnológicos e organizacionais aos trabalhadores que exercem suas atividades (MENDES; FERREIRA; CRUZ, 2007). Para fins desta dissertação, será utilizada a nova nomenclatura, adotada por Mendes e Ferreira em 2007, ou seja, Contexto de Trabalho, que se caracterizam por "representações relativas à organização, às relações socioprofissionais e às condições de trabalho" (MENDES; FERREIRA; CRUZ, 2007, p. 76). As especificidades do olhar da Ergonomia da atividade voltam-se para a análise de três dimensões do mundo do trabalho que, segundo Ferreira (2003), fundamentam o tripé dessa abordagem: o mundo social ou Relações Sociais de Trabalho (composto pelos compromissos coletivos resultantes de negociações entre pares, gestores e atores da situação de trabalho como os usuários ou consumidores), o mundo objetivo ou Condições de Trabalho (caracterizada por um contexto de trabalho singular, espacialmente e formalmente circunscrito, cuja configuração é ditada por regras formais e informais) e mundo subjetivo ou Organização do Trabalho (representado pelo próprio sujeito trabalhador ao executar as atividades baseadas em estratégias de mediação individual e coletiva com o Contexto de Trabalho, buscando garantir assim, os meios necessários para sobrevivência, o bem-estar físico, psicológico e social e, ainda, responder às regras prescritas). As dimensões que constituem a análise da Ergonomia sobre o Contexto de Trabalho, encontram-se esquematizadas no Quadro 1: Relações sociais de trabalho Condições de trabalho Organização do trabalho Elementos interacionais que expressam as relações socioprofissionais de trabalho. Elementos estruturais que expressam as condições ambientais e de apoio institucional para realização do trabalho. Elementos prescritos, formais e/ou informais que expressam as concepções e as práticas de gestão de pessoas e do trabalho. Quadro 1: Dimensões que constituem o Contexto de Trabalho Fonte: Ferreira e Mendes (2003, p. 64). Essas três dimensões estabelecem os parâmetros básicos do contexto de trabalho com base nas quais são construídas as estratégias de mediação individuais e coletivas dos trabalhadores e que, em conjunto, refletem a estrutura, processos e cultura organizacional, além de agregar a complexidade do ambiente em função, sobretudo, da variabilidade, da diversidade, da dinâmica e da imprevisibilidade de seus elementos. Tais dimensões têm pesos 38 e valores diferenciados atribuídos a cada uma, ou seja, não são lineares para a compreensão das estratégias de mediação individual e coletiva dos trabalhadores. Conforme Ferreira (2003), os fatores que compõem o Contexto de Trabalho são as informações econômicas que envolvem a empresa (evolução histórica; ciclo de vida de um produto; posição no mercado; tipos de produtos e serviços existentes; exigências de clientes e usuários; comportamento dos concorrentes; dentre outros), a política pessoal da empresa (evolução demográfica do quadro de pessoal e sua distribuição; política de recrutamento, seleção e desenvolvimento de pessoal; a mobilidade interna do pessoal relacionado com a inovação tecnológica e ao perfil epidemiológico; dentre outros), as determinações jurídicas externas à empresa (Código de Defesa do Consumidor; Legislação de Segurança e Medicina do Trabalho do Ministério do Trabalho), as características externas da localização espacial da empresa (levantamento de informações como: variações climáticas; transportes existentes; fornecimento de saneamento básico; dentre outros), a organização do processo de trabalho (um dos principais estruturadores do contexto de trabalho), as propriedades técnicas (disposição topológica da estrutura organizacional; os fluxos de produção ou prestação de serviços; os procedimentos técnicos e administrativos; as características da matéria-prima; os instrumentos e equipamentos, dentre outros) e finalmente, as tarefas prescritas (constituem o modus operandi estabelecido pelos organizadores das atividades a serem executadas pelos trabalhadores em um dado ambiente de trabalho). Esses fatores encontram-se esquematizados na Figura 1: Regras Informais Normas de Segurança Exigências de Qualidade Tarefas prescritas Perfil da Organização do Trabalho Especificidades Técnicas Exigências de Produtividade Figura 1: Aspectos centrais da dimensão da Organização do Trabalho Fonte: Ferreira (2003, p. 64) Para fins de tornar mais claro o exposto neste tópico, o próximo tratará especificamente dos conceitos centrais abrangidos pela Ergonomia da Atividade. 39 2.3.1 Conceitos centrais que compõem a Ergonomia da Atividade Os conceitos centrais da Ergonomia da Atividade aqui assumidos, apresentados principalmente por Ferreira e Mendes (2003), modelam o quadro teórico da abordagem e se constituem em: eventos críticos e complexidade no contexto de trabalho; tarefas formais e informais; custo humano do trabalho (CHT); vivências de bem-estar e mal-estar e atividades de trabalho como estratégias de mediação (estratégias operatórias), e que serão explicitados a seguir. Os eventos críticos no contexto de trabalho são fatores que apresentam uma interrupção no curso de uma atividade de trabalho que, por sua vez, podem ser uni ou multicausal (fatores técnicos, organizacionais, tecnológicos, panes, erros, dentre outros). A complexidade no contexto de trabalho caracteriza-se por um conjunto de circunstâncias ou fatos resultantes do confronto entre as dificuldades externas e as competências individuais e coletivas, que impõe um custo humano específico aos trabalhadores. As tarefas formais e informais caracterizam-se como a operacionalização do trabalho prescrito formal ou informalmente, em termos de objetivo(s) estabelecido(s) em condições determinadas para um sujeito ou um coletivo de trabalhadores, ou seja, a noção de tarefa diz respeito, principalmente, à forma de cumprimento das diversas atividades formalmente prescritas para o trabalhador (metas, prazos, utilização adequada de materiais e obediência aos procedimentos e às regras). No contexto de trabalho, a prescrição das tarefas pode aparecer sob as formas de descrição formal e/ou informal da estrutura dos processos técnicos, pelos instrumentos e meios de informação, pelos procedimentos ou por meio de regras detalhadas e estritas. Para Wisner (1994), o custo humano do trabalho (CHT) ou carga de trabalho ou ainda, atividade de trabalho compreende os componentes físico (esforços despendidos pelo trabalhador na realização da tarefa, ou seja, gestos, posturas e deslocamentos executados), cognitivo (funções perceptivas e mentais exigidas para a realização do trabalho, tais como memória, atenção, audição e visão, dentre outros) e psíquico (significado que o conteúdo, natureza e organização do trabalho assumem para cada trabalhador e determinam seu grau de realização existencial) que se inter-relacionam. Abrahão (1993) ressalta que o CHT ou carga de trabalho é determinado pelas características dos trabalhadores, pelas regras de funcionamento da empresa e pelo contexto de realização do trabalho. O CHT é perpassado pela posição hierárquica dos trabalhadores, 40 bem como pelo salário e objetos de negociação via um contrato em que a tarefa prescrita é detalhada. Por outro lado, é a tarefa real que leva o trabalhador a elaborar um compromisso entre os objetivos da produção, suas características e o reconhecimento social, o que pode gerar um resultado positivo e/ou negativo na produção da saúde. Tillmann (1994), em pesquisa realizada com operários rurais, corrobora indicando que a carga psíquica do trabalho tem relação com o conteúdo significativo do trabalho, portanto, os componentes da carga de trabalho são responsáveis por manifestações de saúde, prazer e sofrimento físicos, psíquicos e psicossomáticos, que dependem da sobrecarga prescrita na organização do trabalho e das características da personalidade do sujeito. Em síntese, a carga de trabalho ou o CHT relaciona-se diretamente com a atividade e orienta as estratégias de mediação individual e coletiva, abrangendo as propriedades cognitivas, físicas e psíquicas e, por sua vez, caracterizam as concepções de significado e sentido que as pessoas atribuem ao trabalho nas organizações. Como vivências de bem-estar e mal-estar, a Ergonomia da Atividade indica as representações mentais dos trabalhadores atinentes ao estado biopsicossocial em determinados momentos e contextos. As representações de bem-estar consistem em avaliações positivas que os trabalhadores fazem sobre o seu estado físico, psicológico e social relativo ao contexto de trabalho no qual estão inseridos e as de mal-estar são as avaliações negativas. As atividades de trabalho como estratégias de mediação individuais e coletivas, que na Ergonomia da Atividade se referem às estratégias operatórias, visam responder às exigências presentes na organização, principalmente, no que concerne à discrepância entre as tarefas prescritas e as situações reais de trabalho. Dejours (1987) faz uma crítica contundente às questões colocadas pelos primeiros ergonomistas, quando se refere à diferença fundamental entre o trabalho real, realizado pelos trabalhadores, e o trabalho prescrito, organizado por engenheiros e ergonomistas, dentre outros. Ergonomistas mais contemporâneos confirmam essa visão quando afirmam que nas empresas que ainda adotam princípios tayloristas, geralmente existem disparidades entre o trabalho prescrito e o trabalho real, visto que ocorrem padronizações das tarefas indistintamente, desconsiderando a variabilidade intra e interindividual, e com uma margem restrita de negociação. O resultado da aplicação desses princípios coloca o trabalho como uma atividade imposta, que sofre pressões, gera dificuldades e são determinantes na produção de sofrimento (ABRAHÃO, 1993; FERREIRA; MENDES, 2003; WISNER, 1994). 41 Essas disparidades serão menores à medida que as prescrições formais e informais das tarefas sejam flexíveis, oferecendo margem de liberdade para que os trabalhadores possam melhor confrontar as contradições existentes. Logo, essas estratégias são fundamentais para a manutenção da integridade biopsicossocial e, ao mesmo tempo, podem perder a efetividade quando não conseguem mais responder às exigências da organização, podendo, nesse caso, em virtude do fracasso em relação à não resolução do conflito, levar ao adoecimento no trabalho. Os conceitos específicos em Ergonomia da Atividade são apresentados de modo esquemático na Figura 2. Eles estruturam um modelo teórico de compreensão da atividade de trabalho enquanto estratégias de mediação individual e coletiva, do tipo operatória. Figura 2: Atividade de trabalho - Estratégias de mediação individual e coletiva do tipo operatória Fonte: Ferreira e Mendes (2003, p. 52). Depreende-se assim que alguns autores contemporâneos percebem algo mais do que a simples prescrição ou conteúdo do trabalho para o atingimento da saúde geral do trabalhador. Se a organização do trabalho oferecer uma margem de liberdade nas possibilidades do trabalhador utilizar, em maior ou menor grau, estratégias operatórias, entendidas como as operações mentais empregadas para ajustar as competências do sujeito às exigências das situações de trabalho, terá maior chance de obter sucesso na integridade física, psíquica e social do trabalhador. 42 Dejours (1987, 1993, 1994, 1999a, 1999b, 2004, 2005, 2007) mostra-se um importante estudioso do impacto que a organização do trabalho pode causar à integridade física, psíquica e social do trabalhador. Embora seus pressupostos explanados na abordagem da Psicodinâmica do Trabalho não abarquem com igual interesse, como na abordagem metodológica da Ergonomia da Atividade, as condições de trabalho, nortearam um “olhar” mais aprofundado sobre a análise, em nível primordialmente coletivo, das vivências de prazer e sofrimento do trabalhador nas organizações. A cooperação entre a Ergonomia da Atividade e a Psicodinâmica do Trabalho abordagens que têm nítidas afinidades conceituais, epistemológicas e históricas (FERREIRA; MENDES, 2003) - é bastante fértil e com múltiplas possibilidades de interface. Justifica-se também aí, a opção teórica neste estudo, pela Psicodinâmica do Trabalho, que compõe o tópico seguinte. 2.4 A Psicodinâmica do Trabalho A trilha histórica de construção do modelo teórico que se inicia com estudos sobre a Psicopatologia do Trabalho e culmina com a Psicodinâmica do Trabalho, revista por Mendes e Morrone (2002), pode ser demonstrada em três fases marcadas pela ampliação e reformulação de conceitos e integração de novas concepções. A primeira fase ou a denominada Psicopatologia do Trabalho começou a ganhar força a partir dos estudos realizados por um grupo de pesquisadores na década de 50 conduzidos por Louis Le Guillant, que focalizou, sobretudo, algumas síndromes e perturbações psíquicas, provocadas pelas exigências de determinadas realidades ocupacionais. Le Guillant et al. (1984) evidenciaram as manifestações psicossomáticas e os distúrbios mentais provocados por exigências de trabalho específicas. Esses estudos romperam com a predominância caracterizada, até aquele momento, por estudos baseados na patologia profissional e na medicina do trabalho, cuja preocupação se concentrava nos danos físico-químico-biológicos ocasionados pela situação de trabalho. Le Guillant et al. (1984) optaram por estudar as categorias de telefonistas e mecanógrafos em função da natureza das atividades e da percepção que tinha da freqüência crescente de alterações mentais e "nervosas" nesse tipo de trabalho, oriundas, particularmente, das características de certas condições de trabalho. Identificou nessas categorias uma patologia a que denominou de "Síndrome Geral de Fadiga Nervosa", originalmente identificada por médicos do trabalho como doenças profissionais ou a "Neurose das 43 Telefonistas". Em pesquisa publicada em 1956, os autores revelaram dados que indicavam uma "Síndrome Subjetiva Comum" da Fadiga Nervosa, com sintomas específicos tais como: alterações do humor e do caráter, alterações do sono, um conjunto de manifestações somáticas variáveis e a repercussão destas diferentes alterações sobre a vida das trabalhadoras. Desse estudo, concluíram que a intensidade e a permanência das alterações chegavam a constituir uma verdadeira neurose. Esse estudo foi importante na medida em que identificou que, quanto mais controladas, fatigadas ou nervosas as pessoas se mantinham, mais tinham a produtividade aumentada. Identificaram também a despersonalização do significado do trabalho, a “robotização” e a cisão entre o trabalho mecanizado e o intelectualizado. Enfim, concluíram que era o trabalho e as condições materiais e "morais" provenientes deste, os responsáveis pela neurose das telefonistas e de outras categorias em todos os empregos que exigissem, com ou sem fadiga muscular, um ritmo excessivamente rápido de operações que propiciavam condições de trabalho objetiva ou subjetivamente penosas (mecanização dos atos e monotonia, vigilância rígida, relações humanas na empresa alteradas, dentre outras). Herdeiro dessa rica tradição francesa de Psicopatologia do Trabalho, Christophe Dejours, no final dos anos 1970, interessado na restauração da integridade e dignidade do homem no papel de trabalhador, inicia uma longa fase de estudos e pesquisas por meio de enquetes clínicas sobre a temática, que girava em torno do conflito entre organização do trabalho e funcionamento psíquico, para além do modelo causalista, núcleo central dos estudos (JAQUES, 2003; LANCMAN; SZNELMAN, 2004), ou seja, Dejours acreditava que o trabalho conduzia inevitavelmente ao sofrimento psíquico, podendo, inclusive, levar o sujeito à loucura, de forma gradual ou paulatina. Portanto, Dejours (1987) indica a organização do trabalho como a principal fonte de desestabilização psíquica dos trabalhadores. Na tentativa de estabelecer uma definição operacional para o conceito, a psicopatologia do trabalho tinha por organização do trabalho a divisão do trabalho, o conteúdo da tarefa (à medida que ele dela deriva), o sistema hierárquico, as modalidades de comando, as relações de poder e as questões de responsabilidade. A psicopatologia do trabalho enfatizava o desequilíbrio, o patológico e a rigidez da organização do trabalho, que indicavam ao trabalhador o escape mediante defesas para manter o equilíbrio psíquico e em caso de fracasso, a descompensação mental. Esse período, frutífero para Dejours, aliou-se ao fato de que os trabalhadores não mais se mostravam passivos em face das exigências e pressões organizacionais, mas capazes de se 44 proteger dos efeitos negativos à saúde mental. Mesmo coagidos, trilhavam modos de construir sistemas defensivos, fundamentalmente coletivos. Diante disso, as investigações empíricas, por meio da análise clínica, revelaram resultados diferentes dos esperados. Tem início a segunda fase de construção do modelo teórico, entre o final dos anos 80 e princípio dos anos 90, quando Dejours começa a problematizar a pragmática de seus postulados. O modelo não se suporta mais ao visar apenas o disfuncionamento psíquico do trabalhador. O autor começa a questionar-se sobre como os trabalhadores mantinham-se adaptados e ativos no trabalho, face às adversidades da organização do trabalho a eles imposta. Redireciona os estudos não mais para a doença e sim para a saúde e os mecanismos de enfrentamento do sofrimento utilizados pelos trabalhadores para tornar, no mínimo suportável, a realidade de trabalho. Dejours et al. (1993) chegaram à conclusão de que o trabalho, por si só, não é capaz de produzir doença mental, embora possa provocar doenças psicossomáticas e distúrbios psíquicos. Além disso, constatou que o ser humano tem uma tendência natural a buscar o prazer e evitar o sofrimento, a fim de manter o equilíbrio psíquico mediante o desenvolvimento de estratégias (individuais e coletivas), para atenuar a consciência do sofrimento. O autor passou a considerar, também, que o prazer pode ser advindo da própria relação do indivíduo com o trabalho. À medida que a maioria dos trabalhadores conseguia conjurar a loucura, apesar da violência da organização do trabalho, a questão central que passava a sobrelevar é a de que a normalidade (equilíbrio instável, precário, entre sofrimento e defesas) se configurava como enigma (LANCMAN; SZNELMAN, 2004). Tendo como ponto inicial essa perspectiva e com fundamento na comprovação de que a doença nem sempre emitia sinais de manifestação visíveis e objetivos no contexto laboral é que a psicopatologia do trabalho buscou respostas para a nova problematização estabelecida, a de que modo os trabalhadores, em sua maioria, conseguiam preservar um equilíbrio psíquico e manter-se na normalidade, apesar das situações constritivas vivenciadas no trabalho (DEJOURS, 1996). O próprio Dejours (2007, p. 10-11) reafirma mais tarde diante deste paradoxo: Descobre-se então que a "normalidade" é uma conquista, que resulta essencialmente da criação de estratégias individuais e coletivas de defesa dos trabalhadores no que se refere ao sofrimento no trabalho. Um campo extraordinário revela-se então aos clínicos, mostrando a engenhosidade do espírito humano quando se trata de resistir à adversidade. 45 Christophe Dejours destacou-se nessa perspectiva, fundamentando na psicopatologia do trabalho, a corrente teórica que atualmente assume a condição de ciência interdisciplinar e adota como suporte contribuições de diversas áreas do conhecimento humano, especialmente da psicologia e das teorias psicanalíticas (SELIGMAN-SILVA, 1995). Embora calcada ainda nos pressupostos iniciais, ocorre uma marcante reviravolta nos desígnios da disciplina, que começa a se constituir como um modelo teórico-metodológico. Dejours (2007, p. 11) afirma que "descobertas significativas foram feitas desde então, sobre a inteligência do corpo, sobre a engenhosidade e sobre a psicodinâmica do reconhecimento que permite transformar o sofrimento em prazer, conferindo sentido e valor a esse sofrimento". Diante de tantas reflexões, Dejours (1996) começa a reorganizar a práxis de seus estudos para a dinâmica ocorrida entre empresa, organização do trabalho e trabalhador. Segundo Lancman e Sznelman (2004), a partir daí, sua abordagem, ao mesmo tempo, reformulou-se e afirmou-se na comunidade científica, cujos efeitos levaram às mudanças assumidas em 1992, propondo uma nova denominação: "Psicodinâmica do Trabalho" (que incorporaria no seu interior as questões da psicopatologia do trabalho). Dejours (2007) confirma que a psicopatologia do trabalho insere-se como campo da psicodinâmica do trabalho: o das descompensações que surgem quando as estratégias de defesa são comprometidas por um sofrimento que o sujeito não consegue contornar, tornandose autodestrutivo. O campo da Psicodinâmica do Trabalho é o do sofrimento e do conteúdo, da significação e das formas desse sofrimento. Tem por referências o diálogo com os conceitos ergonômicos de trabalho prescrito e trabalho real, que prioriza aspectos relacionados à organização do trabalho (como ritmo, jornada, hierarquia, responsabilidade, controle, dentre outros), propondo-se a investigar e interagir no hiato formado entre o chamado trabalho formal e o informal inserido nas instituições. As intervenções propostas se voltam para o coletivo de trabalho (e não indivíduos isoladamente) e para aspectos da organização do trabalho a que os indivíduos estão submetidos. Introduz o conceito de sofrimento em uma dimensão dinâmica, “concebido como a vivência subjetiva intermediária entre a doença mental descompensada e o conforto (ou bem-estar) psíquico [...] que suscita estratégias defensivas [...] construídas, organizadas e gerenciadas coletivamente" (DEJOURS; ABDOUCHELY; JAYET, 1994, p. 127). Dejours (1996) admite que a Psicodinâmica do Trabalho não foca o trabalho apenas em seu lado negativo, o do sofrimento, mas também, acima de tudo, fornece instrumentos 46 para perceber as possibilidades do trabalho como estruturante psíquico e os possíveis encaminhamentos do sofrimento em direção ao prazer e à saúde. Assim também, considera Pereira (2003) ao destacar que a psicodinâmica não é lugar só do sofrimento, mas também do prazer, da dinâmica interna das situações de trabalho e não exclusivamente da organização do trabalho. O equilíbrio é produto desta dinâmica, das relações subjetivas, condutas e ações dos trabalhadores, que são responsáveis pela transformação do sofrimento em prazer. Lancman e Sznelman (2004) enfatizam que ao sair do estado absolutamente incipiente acerca das relações entre subjetividade e trabalho, no que tange puramente à inteligência da prática, uma das dimensões desconhecidas do trabalho, Dejours apresentou as características e condições de mobilização no trabalho de um outro tipo de inteligência, a criativa, astuciosa e corporal, ou seja, retoma a inteligência prática e explicita uma segunda dimensão desconhecida do trabalho, a sabedoria prática. Dejours começa a focar os estudos no debate acerca da perda de centralidade e significado do trabalho. Reafirma o caráter sempre enigmático do trabalho e ressalta três dimensões essenciais para o enfrentamento: a engenhosidade, a cooperação e a mobilização subjetiva (LANCMAN; SZNELMAN, 2004). Pereira (2003) explica que a atividade produtiva é produto do uso da engenhosidade (inteligência operária), que se manifesta no confronto entre o que é imposto pela organização do trabalho e nas necessidades psíquicas do trabalhador. Atua como uma espécie de resistência ao domínio dos conhecimentos e procedimentos padronizados e preconizados pela concepção e preparação do trabalho. Quanto ao segundo componente, a autora revela que o trabalho exige sempre a coordenação das atividades singulares por meio da cooperação. Esta não é prescrita nem decretada. Depende da possibilidade de os agentes estabelecerem entre si relações intersubjetivas de confiança. Já no processo de mobilização subjetiva, o trabalhador faz uso de sua personalidade, inteligência e criatividade para se contrapor a uma racionalidade subjetiva específica gerada na situação de trabalho. Essa dinâmica apoia-se no processo de contribuição e retribuição. A contribuição é espontânea à organização do trabalho real e tem como retorno a retribuição simbólica, que se dá pelo reconhecimento pelos pares, processo ao qual é atribuído a construção da identidade social e de realização de si mesmo. Estes componentes do trabalho demonstram que ele é resultado da interseção de três mundos: o objetivo, o social e o subjetivo. Desta forma, a organização do trabalho é um compromisso resultante da negociação social simultânea entre os pares e os diferentes níveis hierárquicos (PEREIRA, 2003). 47 Depreende-se, portanto, que ao se desenvolver nos estudos empíricos, Dejours passa a considerar os aspectos positivos relacionados ao trabalho, passando a compreendê-lo, também, como fonte de prazer e de estruturação psíquica. O próprio conceito de sofrimento vai se modificando. Dejours (1996) já distingue dois tipos de sofrimento: o sofrimento criativo e o sofrimento patogênico, afirmando que quando o sofrimento pode ser transformado em criatividade, ele traz uma contribuição que beneficia a identidade e aumenta a resistência do sujeito ao risco de desestabilização psíquica e somática. Chega-se à conclusão de que o estudo da normalidade não elimina os efeitos psicopatológicos que o trabalho pode exercer nos trabalhadores. Neste sentido, a normalidade não implica ausência de sofrimento, bem como o sofrimento não exclui o prazer. Dejours (1999a) reconhece que a organização do trabalho se apresenta menos monolítica do que ele preconizava, caracterizando-se pela mobilidade e mutabilidade. Reconhece ainda que o funcionamento psíquico do trabalhador é regulado pelos mecanismos de mobilização subjetiva, tendo o sujeito um papel ativo diante das imposições, manifestando a possibilidade de transformar concretamente as situações de trabalho, para que estas possam trazer benefícios para a saúde mental. A partir da análise dos fatores presentes na organização do trabalho e a dinâmica de reação do trabalhador frente às dificuldades encontradas, a psicodinâmica do trabalho pretende minimizar a distância entre a organização prescrita e a organização real do trabalho, considerando o ganho para a saúde mental nas organizações que a diminuição desta distância representa. A terceira fase, a atual, que em termos cronológicos se mescla à segunda, dedica a sua ênfase na análise do trabalho como locus de construção da identidade do trabalhador, no estudo da dinâmica do reconhecimento e de seu papel sobre a vivência do prazer e sofrimento no trabalho, bem como no estudo das novas formas de organização do trabalho e seu impacto sobre as vivências de prazer e sofrimento. Nesse período, fértil e consistente, desenvolve-se uma nova etapa, onde Dejours (1999a, b) se institui mais solidamente no mundo social, ampliando sua influência. Os novos modelos de organização do trabalho são oriundos das mudanças estruturais ocorridas nos últimos anos em decorrência da explosão da competitividade entre empresas em prol da própria sobrevivência no mercado, que levaram ao processo de reestruturação produtiva e tecnológica, à produção ligada aos fluxos de demanda diversificada, à exigência de trabalhadores generalistas e polivalentes, à redução dos níveis hierárquicos, com 48 estabelecimento de coordenação horizontal e à valorização da autonomia e qualificação profissional, dentre outros. Além desses aspectos, a Psicodinâmica do Trabalho tem estudado o sofrimento sob a tônica do desemprego e da injustiça social. Sob esse aspecto, Dejours (1999b) retoma as diversas faces do sofrimento, tema de pesquisas anteriores, como o medo da incompetência, a pressão por trabalho, a negação do medo e faz um alerta ao movimento que aponta como crescente, de banalização da injustiça social. O autor defende a idéia de que a banalização do mal e da injustiça no sistema neoliberal se sustenta menos na violência e mais na colaboração e no zelo agregados pela maioria dos trabalhadores às novas formas de organização do trabalho. Onde não há cooperação e entendimento, não há produção. O receio ao desemprego e à precarização do trabalho faz com que os que trabalham e os que não trabalham vivenciem a dicotomia entre prazer e sofrimento de modo diferenciado dos tempos do taylorismo/fordismo. Os desempregados, com a perda do seu trabalho, perdem o direito de contribuir com a sociedade e a oportunidade de obter o reconhecimento por meio do trabalho. Para o autor, aquele que se encontra desempregado há muito tempo perde algo que no fundo é manifesta a própria identidade, ou seja, o direito de ser útil à sociedade. As pessoas querem trabalhar, não pelo prazer de sofrer, mas porque se espera alguma coisa em troca, grande parte, o reconhecimento. Neste novo paradigma, Dejours (2007) ressalta que as novas formas de organização do trabalho, de gestão e direção das empresas, provocam novas respostas ao desequilíbrio do trabalhador. Surgem doenças como os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - LER/DORT; burnout - estado de exaustão prolongada e diminuição de interesse, especialmente em relação ao trabalho e karoshi - morte por sobrecarga de trabalho; as patologias resultantes de agressões que vitimam pessoas no exercício da função; as patologias do assédio moral; as patologias mortíferas dos suicídios e das tentativas de suicídio e pressupõe que essas novas doenças estão relacionadas a uma forma específica de coação: a adoção generalizada da avaliação individualizada das performances, ou avaliação de desempenho, somada à introdução dos critérios da Qualidade Total. Entretanto, para Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994, p.18-19) o trabalho não causa necessariamente sofrimento e doença, podendo ser favorável ao equilíbrio mental e a saúde do corpo desde que haja adequação entre organização do trabalho e a estrutura mental, por meio de uma análise precisa da psicodinâmica da relação homem/trabalho, que deve propiciar um ajuste da carga psíquica da atividade, mediante a tentativa de diminuir a distância que se 49 estabelece entre a organização prescrita e a organização real do trabalho. Se o trabalhador conseguir canalizar para a atividade a carga psíquica, esta será equilibrante, caso contrário, será fatigante. Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) afirmam que para transformar um trabalho fatigante em equilibrante, precisa-se flexibilizar a organização do trabalho de modo a deixar maior liberdade ao trabalhador para organizar seu próprio método de trabalho, bem como relevar plenamente as aptidões psicomotoras, psicosensoriais e psíquicas, de modo a obter-se a condição de prazer na realização das tarefas laborais. Concluem que o papel da organização na instituição do trabalho é o de propiciar o processo equilibrante da relação homem e trabalho. Dejours (1987, p. 103) ressalva, porém, que existem empresas que não priorizam o bem-estar do trabalhador, mas exploram deliberadamente o sofrimento psíquico, utilizando esse como o próprio instrumento para obtenção do trabalho. Neste caso, “o trabalho não causa sofrimento, é o sofrimento que produz o trabalho”. Depreende-se, portanto, que para Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994), os condicionantes de prazer ou sofrimento nas organizações estão diretamente vinculados à organização do trabalho, podendo ou não ocorrer sob condições precárias de trabalho. Algumas organizações se valem de comportamentos de insegurança do trabalhador em relação à perda do emprego e aumentam a pressão, que causa o sofrimento e, conseqüentemente, conseguem aumento da produtividade. Para Mendes (2004, p.1) “a psicodinâmica do trabalho inevitavelmente requer a construção de um espaço organizacional que valorize a subjetividade, considerando os trabalhadores sujeitos do seu trabalho e não objetos de produção”. Entretanto, é necessária a introdução de outras variáveis para apreensão da psicodinâmica do trabalho, que dependem de práticas de gestão organizacional voltadas para a evitação das situações adversas ao bem-estar, agregando aspectos da saúde física, mental e social do trabalhador. O modelo atual da Psicodinâmica do Trabalho supõe um modelo de trabalhador ativo, empreendedor, com história pessoal, aspirações, desejos, motivações e necessidades psicológicas, que, inserido no mundo do trabalho, se depara com determinada organização do trabalho, prescrita por normas e regras de execução. Também estão presentes neste contexto, os componentes sociais, tratados por coletivo de trabalho, com os quais o trabalhador se relaciona de forma dinâmica de interação e cooperação, ocorrendo assim a promoção do reconhecimento no trabalho (PEREIRA, 2003). 50 Benevides (2004) analisou diversas pesquisas realizadas com diferentes categorias profissionais que vivenciaram, em suas empresas ou em seu ambiente de trabalho, processos como a industrialização, a terceirização, a reestruturação produtiva e a privatização tais como operários da construção civil, bancários e telefônicos. Todas as pesquisas tomaram como elemento central de análise, a dinâmica relação de reciprocidade e interdependência entre a subjetividade do trabalhador, o sofrimento e o adoecimento resultantes da precarização das relações e condições de trabalho que acompanham esses processos ditos inovadores. Os resultados dessas pesquisas foram analisados à luz do modelo econômico vigente, verificando que as contradições são tantas e tão intensas, que levam o trabalhador a enfrentar e a subjetivar, de diferentes maneiras, o desgaste do embate entre as condições subjetivas e a realidade. Concluiu que o produto final desse confronto é uma subjetividade própria a cada categoria de trabalhadores, assim como estratégias próprias de enfrentamento do sofrimento, de modo que o adoecimento decorre, ou do fracasso dessas estratégias, ou da completa impossibilidade do trabalhador para enfrentá-lo. Para Ferreira e Mendes (2003, p.52) O itinerário teórico da Psicodinâmica do Trabalho é também marcado por uma dialética na compreensão dos seus conceitos básicos. De um lado, o sujeito trabalhador(a) que pensa nas suas relações de trabalho e atribui um sentido às situações, que não é só psíquico, mas depende das condições socioeconômicas oferecidas pelo contexto histórico. Por outro, as situações de trabalho modificam as percepções desse trabalhador de si mesmo, dos outros e do próprio trabalho, resultando em uma subjetividade no trabalho que, por sua vez, pode ser diferente da subjetividade do indivíduo. Essa subjetividade permite a construção do sentido do trabalho atribuído de forma compartilhada por um grupo de trabalhadores, que pode ser de prazer e/ou de sofrimento. Ferreira (1999, p. 8) sintetiza que “a Psicodinâmica do Trabalho não trabalha no campo da patologia do trabalho, da doença. Seu problema é o da saúde e da normalidade, é analisar como funcionam as defesas graças às quais os homens e mulheres podem lutar contra os efeitos patogênicos dos riscos do trabalho”. Enfim, a Psicodinâmica do Trabalho dedica-se a pesquisar o estudo dos fatores, nas situações de trabalho, que levam ao prazer e ao sofrimento, a identificar os aspectos patogênicos específicos de algumas categorias profissionais e situações de trabalho e analisar as transformações do sofrimento mental mediadas por estratégias defensivas vinculadas à organização do trabalho, buscando entender os processos psíquicos que ocorrem entre o trabalho prescrito e o trabalho real. 51 Certamente, a construção de um modelo teórico é complexa. Depende de vários anos de trabalhos, pesquisas e estudos e da contribuição de pesquisadores de áreas distintas, embora que afins, em ambientes e contextos variados. Depende ainda, e talvez seja essa a “mola propulsora” que incentiva a contínua busca do conhecimento, de críticas, por vezes contrariamente contundentes, que procuram refutar a construção do modelo teórico. Entretanto, o rigor científico indica que a tentativa de refutação constante do objeto de estudo, além de extremamente necessária, constitui-se como o principal fundamento da ciência, pois encaminha à construção cada vez mais sólida do construto. Como em qualquer outra concepção teórica, a Psicodinâmica do Trabalho também se constrói por meio de críticas, consistentes ou não, à abordagem científica. Cabe aqui, citar algumas, como ponto de equilíbrio para o desenvolvimento deste estudo. Lancman e Sznelman (2004) sintetizam algumas outras concepções em relação à Psicodinâmica do Trabalho, destacando que as proposições de Dejours têm contribuído tanto para ser aceito por setores até então refratários ou reticentes, quanto para alavancar uma nova leva de dissidências no próprio núcleo de formuladores dessa abordagem. Afirmam que Damien Cru, grande amigo e colaborador do autor, já havia se distanciado de suas proposições. A partir de então, também Philippe Davezies tem apresentado duras críticas aos novos encaminhamentos. Em paralelo, no mesmo laboratório dirigido por Dejours, outra corrente clínica do trabalho vem se desenvolvendo desde 1993, liderada por Yves Clot. Esta linha, autodenominada Clínica da Atividade (ou Clínica do Trabalho e dos Meios de Trabalho), reforça esse movimento crítico. Clot (1993 apud LANCMAN; SZNELMAN, 2004) critica em Dejours o que seria uma despotencialização da saúde e valorização da normalidade, assim como considera equivocada a proposição de que o objeto da psicodinâmica do trabalho seria não o trabalho, mas uma psicologia do sujeito, focada na análise dos processos intersubjetivos mobilizados pelas situações de trabalho. Para Clot (1993 apud LANCMAN; SZNELMAN, 2004) são as relações entre atividade e subjetividade que devem estar no centro da análise. O trabalho é visto por ele não apenas como trabalho psíquico, mas como atividade concreta e irredutível, continente oculto da subjetividade no trabalho. Autores brasileiros que vêm estudando e pesquisando a abordagem da Psicodinâmica no país, igualmente assumem posições divergentes ou convergentes com os pressupostos de Dejours. Dentre eles, faz-se importante citar Codo, Soratto, Vasques-Menezes e Mendes. No que se refere aos pressupostos sobre a organização do trabalho e a ideologia defensiva, Codo, Soratto e Vasques-Menezes (2004) adotam concepções diferenciadas das 52 apresentadas. Para eles o conceito de Organização do Trabalho, proveniente da Ergonomia, compreende as tarefas e os modos operativos. Argumentam que, na concepção da Psicodinâmica, tal conceito sofreu um deslocamento do plano técnico e político para o plano das interpretações, para um jogo social e simbólico entre os atores envolvidos. Já em relação ao conceito de Ideologia Defensiva, que corresponde a um mecanismo de defesa contra o sofrimento e que se transforma em um valor a ser defendido pelo grupo, salientam que se trata de uma autêntica contribuição científica, mas que seria necessário um esforço no plano teórico e um outro esforço no plano empírico, para a melhor compreensão do fenômeno, face às poucas pesquisas confirmatórias sobre a temática. Indicam ainda, um aparente desequilíbrio da psicodinâmica para o lado subjetivo, em detrimento do lado objetivo, desconsiderando a realidade concreta do trabalho. Haja vista ser a prática da psicodinâmica relativamente recente, consequentemente apresenta ambigüidades e lacunas, tendo em vista que implica a construção de paradigma distinto das pesquisas tradicionais da área. Entretanto, resultados de pesquisas indicam, segundo Mendes (2002), que é possível ter acesso aos aspectos psicodinâmicos do contexto organizacional, por meio do referencial psicanalítico e que estes aspectos podem e devem ser integrados aos aspectos estruturais, processuais e funcionais, no intuito de ampliar o entendimento dos objetos de estudo das vivências de prazer e sofrimento nas organizações. 2.4.1 Conceitos centrais que compõem a Psicodinâmica do Trabalho O quadro teórico de referência da Psicodinâmica do Trabalho, adotado no presente estudo, contemplou alguns conceitos centrais que orientaram sua perspectiva de análise. Dentre eles, merecem destaque os fatores que compõem a dinâmica prazer e sofrimento psíquico no trabalho, a saber: organização do trabalho para a Psicodinâmica, trabalho real e prescrito, carga de trabalho ou custo humano do trabalho para a Psicodinâmica, vivências de sofrimento no trabalho, vivências de prazer no trabalho, estratégias de mobilização coletiva, estratégias defensivas (individuais e coletivas) e estratégias criativas, e que serão explicitados a seguir. Em relação à organização do trabalho, na abordagem da Psicodinâmica, o conceito foi conjugado às condições de trabalho, que já eram alvo de estudos de pesquisas por profissionais das áreas médicas e ergonômicas. Para Dejours (1987), a organização do trabalho, concebida por um trabalho especializado da empresa e estranho aos trabalhadores, choca-se diretamente com a vida 53 mental e com a esfera das realizações, das motivações e dos desejos do indivíduo, levando-o à perda do sentido na realização das tarefas. No trabalho artesanal, que precedeu a organização científica do trabalho e, ainda hoje, rege as tarefas muito qualificadas, uma parte da organização do trabalho é definida pelo próprio operador. A organização temporal do trabalho, a escolha das técnicas operatórias, os instrumentos e os materiais empregados permitem-lhe, dentro de alguns limites, adaptarem o trabalho as suas aspirações e competências, conferindo parte de sua identidade na realização das tarefas, colaborando para que o trabalho tenha sentido para o executor. Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994, p.26-27) afirmam que “[...] a organização do trabalho é, de certa forma, a vontade de outro. Ela é, primeiramente, a divisão do trabalho e sua repartição entre os trabalhadores, isto é, a divisão dos homens: a organização do trabalho recorta assim, de uma só vez, o conteúdo da tarefa e as relações humanas de trabalho”. Traduz-se, portanto, no resultado de combinações entre a organização e os trabalhadores para definir normas e regras, e entre níveis hierárquicos para negociar essas regras e obter novos compromissos renegociáveis posteriormente, caracterizando-se pela sua evolução em função das pessoas, do grupo, da experiência e do tempo. São modos operatórios cognitivos, procedimentos e instrumentos utilizados pelos trabalhadores para produzir algo, em consonância com as atividades pactuadas. Cada categoria profissional está submetida a uma determinada organização do trabalho e essa definição depende dos interesses econômicos, ideológicos e políticos daqueles que definem o processo produtivo. A organização do trabalho exerce influências multideterminadas no funcionamento psíquico dos trabalhadores. Tais influências podem ser positivas ou negativas, dependendo do confronto entre as características de personalidade e a margem de liberdade admitida pelo modelo de organização vigente que permite ou não a transformação da realidade do trabalho (PEREIRA, 2003). Assim, a organização do trabalho é um processo intersubjetivo, compreendendo as dinâmicas existentes nas situações de trabalho, resultantes da interação dos sujeitos com uma dada realidade (MENDES, 1999). Ponto importante abrangido pelos estudiosos da área concentra-se na discrepância entre trabalho real e prescrito, enquanto desencadeadora de um custo psíquico para o trabalhador, que traz conseqüências para a organização do trabalho em termos da natureza da tarefa em si e das relações socioprofissionais, fazendo com que o sujeito se coloque em estado de esforço permanente para dar conta da realidade, muitas vezes, incompatível com seus investimentos psicológicos e seus limites pessoais. 54 Dejours, Dessors e Desriaux (1993) em seus estudos sobre a organização do trabalho, identificaram a existência de uma defasagem entre o que eles denominaram de organização do trabalho prescrita e a organização do trabalho real. Esses autores definem que a organização do trabalho prescrita é aquela que “[...] materializa-se por um tipo de manual de procedimentos, em que para cada operação a efetuar há uma grade muito detalhada de tarefas elementares a realizar” (DEJOURS; DESSORS; DESRIAUX, 1993, p. 51). Na prática, esta organização prescrita do trabalho torna-se inaplicável, necessitando de adaptações. Os trabalhadores, por sua vez, estabelecem rearranjos desta organização prescrita do trabalho, para que se torne realizável, ou seja, a organização prescrita do trabalho diz respeito às normas e procedimentos, que prescrevem os modos operatórios que devem ser obedecidos pelos trabalhadores. A organização real do trabalho está relacionada ao que de fato acontece no dia-a-dia do trabalho. Afirmam também que, essas adaptações, via de regra, implicam avanços obrigatórios sobre os limites da legalidade ou exposição a riscos de cometimento de transgressões disciplinares e até aos perigos relacionados a questões de proteção e segurança. Para que a prescrição possa ser operacionalizada, ela necessita sempre ser reajustada e reinterpretada pelos trabalhadores. Dejours, Dessors e Desriaux (1993), asseguram que esta contradição entre organização prescrita e organização real conduz a que os vários grupos de trabalhadores elaborem maneiras variadas de burlar a organização prescrita e construir uma ou várias organizações reais. Portanto, tais situações inevitáveis de reajustes da organização do trabalho prescrito, que implicam driblar os mecanismos de controle, tornam-se fontes geradoras de desconforto e angústia para os trabalhadores e, como defesa contra estes sentimentos, eles encobrem os ajustamentos realizados pelo segredo, pelo sigilo sobre os modos operatórios adotados por cada uma das equipes. Esta tática defensiva do segredo no mesmo local de trabalho provoca desconfiança, entre os próprios trabalhadores, deteriorando a atmosfera e as relações de trabalho e, em última instância, acaba fragilizando as próprias bases da cooperação. A organização do trabalho e a distinção entre o que ocorre entre o trabalho real e o prescrito, que levam às vivências de prazer e sofrimento vêm sendo estudadas empiricamente no Brasil desde o início da década de 90. Tais pesquisas apontam que a incoerência, entre o conteúdo da tarefa e as aspirações dos trabalhadores, pode levar à desestruturação das relações psicoafetivas com os colegas, à despersonalização com relação ao produto, a frustrações e ao adormecimento intelectual. 55 Tillman (1996), em pesquisa realizada com grupos de operários rurais, identificou que dentro de uma mesma empresa, em diversos grupos com atividades similares, podem-se encontrar diferentes modelos de organização do trabalho. Essas distinções são claramente percebidas pelos trabalhadores e cada um as interpreta de acordo com a própria subjetividade. Para esclarecer o impacto da organização do trabalho na vida dos trabalhadores e compreender a dinâmica do indivíduo nas situações de trabalho, faz-se necessário um adequado exame da noção de carga de trabalho sob o enfoque da Psicodinâmica. O conceito de carga de trabalho, ou custo humano do trabalho é proveniente da Ergonomia, como já exposto anteriormente, e, de um modo geral, compreende os seguintes aspectos: físico, cognitivo e psíquico que estão diretamente relacionados entre si. Quando ocorre sobrecarga em um desses aspectos, esta alteração é freqüentemente acompanhada do aumento de carga nos dois outros domínios. Mota (2002) observa nas organizações de trabalho, um aumento progressivo do nível de complexidade das tarefas, decorrente dos avanços tecnológicos e de outras transformações socioeconômicas que caracterizam a conjuntura atual. Isto significa que a carga cognitiva do trabalho, de um modo geral, vem aumentando consideravelmente, o que, por sua vez, tem provocado à elevação dos requisitos de desempenho de cargos e funções. Por outro lado, Mendes (1994) revela que há categorias profissionais que, por natureza, têm um custo cognitivo maior, e que, em alguns casos, a carga de trabalho também aumentou em função das mudanças citadas anteriormente. Tais categorias caracterizam-se por tarefas que implicam em resolução de problemas, tomadas de decisão e/ou uso de códigos, símbolos, instrumentos ou equipamentos complexos. Segundo Dejours (1987, 1993, 1994), a organização do trabalho contém vários elementos que influenciam a formação da auto-imagem do trabalhador que, por sua vez, são razões para o sofrimento. Neste ponto, torna-se importante relatar o que a bibliografia traz sobre o que é o sofrimento. Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994, p.14) indicam que: O sofrimento designa então, em uma primeira abordagem, o campo que separa a doença da saúde. Dentro de uma segunda acepção, o sofrimento designa um campo pouco restritivo. Entre o homem e a organização prescrita para a realização do trabalho, existe, às vezes, um espaço de liberdade que autoriza uma negociação, invenções e ações de modulação do modo operatório, isto é, uma invenção do operador sobre a própria organização trabalho, para adaptá-la às suas necessidades, e mesmo para torná-la mais congruente com seu desejo. Logo que esta negociação é 56 conduzida a seu último limite, e que a relação homem-organização do trabalho fica bloqueada, começa o domínio do sofrimento — e da luta contra o sofrimento. Quando o trabalhador esgota todos os meios de defesa em tentativas de modificar a organização do trabalho, atingindo níveis de insatisfação elevados, assumem vivências de sofrimento. Para Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) o sofrimento tem início, quando a organização do trabalho não possibilita a descarga da energia pulsional, isto é, quando há um conflito entre organização do trabalho e funcionamento psíquico. Esta energia, então, acumula-se no aparelho psíquico, gerando uma sensação de desprazer e de tensão. Ao se deparar com este tipo de vivência, o indivíduo precisa ajustar-se ou adaptar-se à organização do trabalho, para torná-la mais próxima de seu desejo, a fim de resguardar o seu equilíbrio psíquico, ou seja, para evitar a descompensação. Assim, Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) argumentam que o sofrimento é uma vivência intermediária entre a doença mental e o bem-estar psíquico, ou seja, deve ser concebido como uma vivência bivalente, que pode ter uma conotação positiva ou negativa, dependendo das estratégias utilizadas pelo indivíduo, para administrar a situação. Ainda em relação ao sofrimento, pesquisas realizadas por Jayet (1994) resultam em categorias de signos indicadores do sofrimento associado ao trabalho (Quadro 2). Medo físico relacionado à fragilidade do corpo quando exposto a determinadas condições de trabalho. Medo moral, que significa o medo do julgamento dos outros e de não suportar a situação de pressão e adversidade na qual realiza a tarefa. Dúvidas sobre a utilidade social e profissional do seu trabalho. Sentimento de injustiça, reflexo da ingratidão da empresa e das recompensas sem considerar as competências. Falta de reconhecimento retratada na ausência de Tédio por desempenhar tarefas pouco valorizadas. retribuição financeira ou moral e do nãoreconhecimento do mérito pessoal. Dificuldade de poder dar sua contribuição à sociedade, Sobrecarga do trabalho, gerando a impressão de que gerando um sentimento de inatividade, de inutilidade e não vai dar conta das responsabilidades. de depreciação da sua identidade profissional. Ininteligibilidade das decisões organizacionais, que Incertezas sobre o futuro da organização e seu próprio gera falta de referência da realidade. futuro. Perda do sentido do trabalho a partir da nãoAmbivalência entre segurança, rentabilidade e compreensão da lógica das decisões, levando à qualidade. desprofissionalização. Falta de confiança, que produz a negação dos problemas, manifestada em um sentimento de Conflitos entre valores individuais e organizacionais. desordem, de culpabilidade, de vergonha e de fatalidade para lidar com as situações de trabalho. Quadro 2: Indicadores de sofrimento no trabalho, segundo Jayet (1994 apud FERREIRA; MENDES, 2001). Fonte: Ferreira e Mendes (2001, p. 96). Assim, as vivências de sofrimento aparecem associadas à divisão e à padronização de tarefas com subutilização do potencial técnico e da criatividade; rigidez hierárquica, com excesso de procedimentos burocráticos, ingerências políticas, centralização de informações, 57 falta de participação nas decisões e não-reconhecimento; pouca perspectiva de crescimento profissional, dentre outros. Das reflexões apresentadas por Mendes (1999), conclui-se que o sofrimento no trabalho instala-se quando a realidade não oferece possibilidades de gratificação dos desejos do trabalhador, constituindo-se parte da natureza dinâmica que envolve o indivíduo e a organização. Também para Ferreira e Mendes (2003, p.53), O sofrimento emerge como vivência, por vezes inconsciente, individual e/ou compartilhada por um grupo de trabalhadores, de experiências dolorosas, como angústia, medo e insegurança, provenientes de conflitos e de contradições originados do confronto entre desejo e necessidades do trabalhador e as características de determinado Contexto de Produção de Bens e Serviços – CPBS. Para esses últimos, as principais características do sofrimento são a de que ele: origina-se dos males que o trabalho causa no corpo, na mente e nas relações socioprofissionais; tem como principais causas as dimensões da organização, das condições e das relações de trabalho que estruturam os contextos de trabalho; constitui um dos antecedentes do mal-estar no trabalho, sob a forma de uma avaliação de que algo não vai bem; manifesta-se por ansiedade, insatisfação, indignidade, inutilidade, desvalorização e desgaste no trabalho. Em seu aspecto dicotômico frente ao sofrimento, diante do que Dejours (1996) denomina de ressonância simbólica, ou seja, quando o trabalho possibilita, de alguma forma, que o trabalhador possa por meio dele se reconciliar com os desejos e aspirações individuais mais profundos, alcançando a sua realização, emergem as vivências de prazer no trabalho. [...] o sujeito aborda a situação concreta sem ter que deixar sua história, seu passado e sua memória no ‘vestuário’. Ao contrário, ele confere à situação de trabalho o poder de engajamento para realizar através do trabalho sua curiosidade e sua epistemofilia (história de vida). O trabalho oferece-lhe de alguma maneira uma ocasião suplementar de perseguir seu questionamento interior e traçar sua história (DEJOURS, 1996, p. 157). É importante ressaltar as conclusões a que chegaram Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) de que o prazer ocorre, quando há um livre funcionamento do aparelho psíquico, independentemente do tipo de tarefa realizada. Em outras palavras, um trabalho intelectual pode ser fonte de sofrimento, assim como um trabalho braçal pode ser acompanhado de um enorme prazer e vice-versa, dependendo da possibilidade de escolha do indivíduo e do grau de 58 liberdade que a organização do trabalho lhe proporciona, para que ele possa utilizar o seu potencial criativo, no sentido de descobrir a melhor maneira de realizar o seu trabalho. Assim, o prazer no trabalho caracteriza um estado marcado pela diminuição da carga psíquica e conseqüente livre funcionamento do aparelho psíquico, derivado da articulação do trabalho às necessidades e desejos psicológicos do trabalhador. Para Ferreira e Mendes (2003, p.54), o prazer é uma vivência individual e ou compartilhada por um grupo de trabalhadores de experiências de gratificação provenientes da satisfação dos desejos e de necessidades do trabalhador, quando da mediação bem-sucedida dos conflitos e contradições gerados em determinado Contexto de Produção de Bens e Serviços. Para esses últimos, as principais características da vivência de prazer são a de que essa se origina do bem que o trabalho causa no corpo, na mente e nas relações com as pessoas; também têm como principais causas as dimensões da organização, das condições e das relações sociais de trabalho que estruturam o contexto de trabalho; constitui um dos antecedentes de bem-estar no trabalho sob a forma de uma avaliação consciente de que algo vai bem e, conseqüentemente, um indicador de saúde; manifesta-se por meio da gratificação, da realização, do reconhecimento, da liberdade e da valorização no trabalho; constitui um dos indicadores de saúde no trabalho por possibilitar a estruturação psíquica, a identidade e a expressão da subjetividade individual em função de uma subjetividade no trabalho que viabilize as negociações, a formação de compromisso e a ressonância entre o subjetivo e a realidade concreta de trabalho; é vivenciada quando a sublimação é possível, significando que a organização, as condições e as relações sociais de trabalho permitem uma descarga do investimento pulsional e, finalmente, quando ocorre ressignificação do sofrimento, levando à transformação do contexto do trabalho em fonte de prazer. Depreende-se, então, que as vivências de prazer são advindas da transformação do sofrimento e/ou da própria relação do indivíduo com o trabalho. No primeiro caso, é o resultado da mobilização subjetiva, no sentido da mudança efetiva da situação. No segundo caso, o prazer é decorrente da descarga psíquica proporcionada pela própria tarefa. Essa relação se configura na dinâmica que ocorre entre as vivências. Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) apresentam um modelo qualitativo, denominado de abordagem econômica do funcionamento psíquico, segundo a qual o trabalho pode ser equilibrante ou fatigante, à medida que permite, ou não, a descarga de energia psíquica, proveniente do livre funcionamento do aparelho psíquico. 59 Os autores explicam que a energia psíquica pode se acumular, tornando-se fonte de tensão e desprazer. A carga psíquica poderá crescer, até que aparecem à fadiga, a astenia e, a partir daí, o trabalho fatigante. Por outro lado, quando há um espaço para negociação, ou seja, quando o trabalhador pode utilizar o seu potencial criativo, para reformular a organização do trabalho, buscando a melhor maneira de atingir os objetivos preestabelecidos, ocorre o trabalho estruturante. Revela-se assim, um dos pressupostos da Psicodinâmica do Trabalho, posto que, em conseqüência das afirmações desses autores, que consideram que o tipo de trabalho pode ou não determinar canais para aliviar a energia pulsional do indivíduo, iniciam-se as pesquisas empíricas que visam determinar se a atividade a que está submetido o trabalhador, permite uma descarga adequada de sua energia psíquica, ou seja, problematizam a existência ou não de algum tipo de trabalho ou de organização do trabalho mais conveniente à saúde psíquica do trabalhador. Verifica-se, pois, que sentimentos de sofrimento ou de prazer experimentado pelo indivíduo são determinados pela amplitude de espaço de liberdade existente entre organização prescrita e o que realmente ocorre na execução do trabalho. Entende-se, então, que quando existe uma predominância da compatibilidade entre tarefa prescrita e atividade real, ou uma flexibilidade na organização do trabalho que permita a negociação, tem lugar vivências de prazer, caso contrário, imperam as vivências de sofrimento. Conclui-se, portanto, que as peculiaridades específicas do trabalho e a forma com que está organizado, concorrem diretamente para o sofrimento ou o prazer psíquico experimentado individualmente pelo trabalhador, bem como associa-se à extensão do limite de liberdade oferecido pela organização do trabalho à ação psíquica do trabalhador. Pesquisas realizadas por Mendes (1995), Mendes e Linhares (1996) e Mendes e Abrahão (1996) indicam que o prazer é vivenciado quando o trabalho favorece a valorização e reconhecimento, especialmente, pela realização de uma tarefa significativa e importante para a organização e a sociedade. O uso da criatividade e a possibilidade de expressar uma marca pessoal também são fontes de prazer e, ainda, o orgulho e admiração pelo que se faz, aliados ao reconhecimento da chefia e dos colegas. Tais pesquisas revelam que situações de medo e de tédio são responsáveis pela emergência do sofrimento, que se reflete em sintomas como a ansiedade e a insatisfação. Pelo exposto neste tópico, identifica-se a dinâmica ocorrida no contexto de trabalho dentro da perspectiva da Psicodinâmica, onde os trabalhadores utilizam-se de diversas 60 estratégias para buscar o prazer e evitar o sofrimento, ou seja, o descompasso entre o trabalho prescrito e o real, proveniente da organização do trabalho e da carga psíquica de trabalho imposta aos trabalhadores, se constituem em fonte geradora de sofrimento ou de prazer, a depender dos mecanismos mediadores utilizados por eles. As pesquisas realizadas sobre estes mecanismos, indicaram que, para enfrentar essa dicotomia de possibilidades de vivências que nasce da interação com os contextos de trabalhos, os trabalhadores constroem estratégias de mobilização coletiva, estratégias defensivas (individuais ou coletivas) e estratégias criativas. As estratégias de mobilização coletiva, conforme afirmam Ferreira e Mendes (2003, p.55): São modos de agir em conjunto dos trabalhadores, por meio do espaço público de discussão e da cooperação, para eliminar o custo humano negativo do trabalho, ressignificar o sofrimento, fazer a gestão das contradições; e transformar em fonte de prazer e bem-estar a organização, as condições e as relações sociais de trabalho. Então para Ferreira e Mendes (2003), são elementos que constituem a estratégia de mobilização coletiva, o espaço público de discussão (espaço da fala e de expressão coletiva do sofrimento que se caracterizam por ser um campo no qual as opiniões, eventualmente contraditórias, podem ser livremente formuladas e publicamente declaradas e um espaço conquistado pelos trabalhadores) e a cooperação (possibilidade de ação coordenada para construir um produto comum com base na confiança e na solidariedade, caracterizando-se pela convergência das contribuições de cada trabalhador e das relações de interdependência, valorização e reconhecimento da marca pessoal e do esforço de cada um para realizar o trabalho e para participar do coletivo). Para Dejours (1999a), o espaço para discussão atualmente é praticamente determinado pelos executivos, pois os operários desejam se expressar neste âmbito de discussão, contudo, ao abordar a validade do espaço para discussão no trabalho, argumenta que a liberdade para falar está diretamente vinculada à necessidade de ter-se um ouvinte, neste sentido o poder do executivo, ou do líder de equipe para regular a amplitude desta fala e, conseqüentemente do impacto desta fala em mudanças na organização do trabalho, é indiscutível. A Figura 3, sistematiza o funcionamento das estratégias de mobilização coletiva. 61 ESTRATÉGIAS DE MOBILIZAÇÃO COLETIVA ESPAÇO COOPERAÇÃO PÚBLICO Figura 3: funcionamento das estratégias de mobilização coletiva. Fonte: Baseada em Dejours (1999a). As estratégias defensivas se interpõem entre a organização do trabalho e o funcionamento psíquico, atuando como uma espécie de amortecedor contra as pressões organizacionais do trabalho. No que concerne às estratégias defensivas individuais, Dejours (1987) procurou demonstrar que o máximo fracionamento das tarefas no trabalho, a competitividade exacerbada e a cisão entre trabalho intelectual e braçal, levam os trabalhadores à solidão, então há a procura de mecanismos compensatórios para tal situação. Surgem as defesas personalizadas, que, por vezes, tomam lugar das defesas coletivas. Para Mendes (2007) as defesas começam individuais, transformam-se em coletivas e quando não se sustentam, transformam-se em individuais, tais como as de racionalização, passividade, aceitação e negação. Dejours (1996) reforça que, entre essas reações de defesa, figuram as defesas individuais estabelecidas com base em fatores vinculados à vivência individual de cada trabalhador e as defesas construídas pelo coletivo de trabalhadores, denominadas de “[...] defesas coletivas e de ideologias defensivas de profissão, cuja principal distinção, em relação às primeiras reside no fato de que seu funcionamento exige a participação coletiva dos trabalhadores no espaço das interações sociais onde estão organizadas” (DEJOURS, 1996, p. 154). Para Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994), as estratégias de defesa coletivas dependem de condições externas e sustentam-se no consenso de um grupo específico de trabalhadores. As defesas caracterizam-se por comportamentos de isolamento psicoafetivo e profissional do grupo de trabalho, de resignação, de descrença, de renúncia à participação, de indiferença e de apatia. Mendes (2007) reforça que determinados grupos não dão conta de construir sistemas de defesa que se sustentem. 62 Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) indicam que as estratégias defensivas coletivas são, geralmente, construídas e empregadas pelos trabalhadores coletivamente, diferenciandose, desta forma, dos mecanismos de defesa individuais, amparados pela teoria psicanalítica e descritos como mecanismos de defesa ou mecanismos de proteção contra o sofrimento (medo, insegurança, angústia e ansiedade). Tais estratégias funcionam, então, como regras, denominadas de regras defensivas ou ideologias defensivas, que pressupõem um acordo tácito entre os trabalhadores e são típicas de cada categoria profissional. Portanto, existem as ideologias defensivas dos operários da construção civil, dos soldados do Exército, dos marinheiros, das enfermeiras, dos médicos e cirurgiões, dentre outros. Mendes (2007) corrobora que o sofrimento e as defesas desempenham importante papel a fim de assegurar a saúde dos trabalhadores. Não obstante, as defesas podem constituir uma armadilha, gerando a alienação. A alienação se constrói quando essas defesas se transformam em ideologia defensiva, ou seja, quando as estratégias de defesa coletiva se transformam em ideologia. A autora afirma que a ideologia defensiva tem por objetivo mascarar, conter e ocultar uma ansiedade particularmente grave, indicando ser específica de um grupo social particular. Destina-se a lutar contra um perigo e um risco reais. Ela é coletivamente elaborada e alimentada. Segundo a autora, para ser eficaz: A ideologia defensiva deve conseguir a participação de todos os interessados no encobrimento do sofrimento. Aquele que não contribui ou que não partilha do conteúdo é, cedo ou tarde, excluído. Para ser funcional, ela deve ser dotada de certa coerência, o que supõe arranjos relativamente rígidos com a realidade. Tão inevitável quanto a própria realidade, a ideologia defensiva torna-se obrigatória. Ela substitui os mecanismos de defesa individuais, tornando-os impotentes (MENDES, 2007, p.25). As estratégias defensivas, muitas vezes inconscientes, individuais e ou compartilhadas por um grupo específico de trabalhadores, caracterizam-se por mecanismos, dentre outros, de negação (negação do próprio sofrimento e do sofrimento alheio no trabalho, caracterizando-se pela naturalização do sofrimento e das injustiças que os trabalhadores padecem, eliminação do coletivo de trabalho, dentre outros) e/ou racionalização (evitação e minimização da angústia, do medo e da insegurança vivenciados no trabalho, caracterizando-se pela busca de justificativas externas para explicar situações de trabalho dolorosas e por comportamentos de apatia, resignação, indiferença, passividade, conformidade e de controle sobre pessoas e situações que podem ameaçar a estabilidade e desmascarar as razões do imobilismo diante das 63 adversidades do contexto de trabalho) do sofrimento e do custo humano negativo, causados pelas contradições e pelos conflitos vivenciados em determinado contexto de trabalho (FERREIRA; MENDES, 2003). Ferreira e Mendes (2003) explicam que as estratégias defensivas se suportam por um determinado tempo e têm o papel de preservar o ego contra os conflitos e os afetos dolorosos. Entretanto, alertam que apesar de protegerem os indivíduos, atuam pela transformação, pela suavização da realidade, podendo, desse modo, ludibriar os trabalhadores, mascarando o sofrimento e diminuindo a ação contra as pressões do trabalho. Nessa perspectiva, tornam-se instrumentos de aumento de produtividade e de exploração pela organização do trabalho, além de que, a constante utilização das estratégias defensivas, pode levar à alienação, quando fracassa como estratégia, tornando-se ineficazes e levando ao adoecimento. Por meio de pesquisas empíricas realizadas, Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) concluíram que as estratégias utilizadas pelos trabalhadores são em sua maioria coletivas e não individuais. Acontecem quando o grupo compartilha o sofrimento e encontra soluções para lidar com as situações causadoras de sofrimento. Essas estratégias coletivas de defesa diferenciam-se das estratégias individuais na medida que desaparecem quando a causa do sofrimento, localizada na organização do trabalho é afastada. Assim sendo, as estratégias operatórias (Ergonomia da atividade) e de mobilização coletiva são mais apropriadas do que as defensivas para manter os trabalhadores próximos da saúde, principalmente, quando ocorre compartilhamento da estratégia operatória. Pesquisas realizadas por Mendes (1994,1996) e Mendes e Linhares (1996) identificam que os indicadores de comportamentos defensivos podem ser diferenciados em profissões específicas. Tais pesquisas foram realizadas com funcionários públicos e enfermeiros. Foram verificados como indicadores de comportamentos defensivos a racionalização ou passividade e aceitação diante do elemento que faz sofrer, o individualismo e trabalho solitário diante de situações como falta de cooperação, de confiança, de compartilhamento de regras no grupo de trabalho impulsoras de sofrimento, no caso do estudo com funcionários públicos e no caso do estudo com enfermeiros os indicadores foram a impessoalidade no contato com o paciente, o distanciamento emocional da relação com o paciente, a evitação do contato com o paciente e familiares e a valorização dos procedimentos técnicos em detrimento da relação interpessoal. Segundo Dejours (1999b), as estratégias criativas, por sua vez, implicam na utilização de certo tipo de inteligência, denominada de inteligência astuciosa, mobilizada frente a situações inéditas, ao imprevisto e frente a situações cambiantes. 64 A inteligência astuciosa caracteriza-se, basicamente, pela utilização da astúcia, da criatividade e da inovação, em detrimento do emprego da força física. Os mecanismos psíquicos utilizados entre as estratégias criativas estão os processos de criação, imaginação, inovação e ajustamento, que conduzem ao alcance dos objetivos da descarga psíquica, por meio de procedimentos mais eficazes. Por outro lado, implica também em transgressão às prescrições preestabelecidas e embora elaboradas no espaço psíquico privado, este tipo de inteligência necessita de uma validação social, para tornar-se socialmente eficaz (LANCMAN; SZNELMAN, 2004). Mota (2002) explica que quando a estratégia criativa é validada pelo grupo, ela se transforma em regras de ofício, que, além de provocar mudanças na organização do trabalho, conduzem ao prazer, diferentemente das regras defensivas, que levam apenas à atenuação do sofrimento. A validação social traduz-se, na prática, através do reconhecimento, que se manifesta de duas formas diferentes de julgamento. O primeiro é o “julgamento de utilidade” ou o reconhecimento pelos chefes, subordinados e clientes. O segundo traduz-se pelo “julgamento de beleza” ou o reconhecimento pelos pares e colegas, mais significativo, é um reconhecimento de habilidade, de inteligência, de talento pessoal e de originalidade. (DEJOURS, 2004, 2005; LANCMAN; SZNELMAN, 2004). Esses autores salientam que as regras de ofício fornecem as bases essenciais e necessárias ao estabelecimento das relações de confiança entre os trabalhadores, na medida em que se sustentam a partir da cooperação, do consenso sobre as maneiras de trabalhar em conjunto. Neste sentido, são capazes de promover a coesão e a construção do coletivo de trabalho, o coletivo de regra, em oposição ao coletivo de defesa, estruturado pelas estratégias defensivas (DEJOURS, 2004, 2005; LANCMAN; SZNELMAN, 2004). Mendes et al. (2003), em estudo realizado sobre o sofrimento psíquico no trabalho de atendimento em um restaurante Fast-Food, com quatro atendentes, que responderam a entrevistas abertas semi-estruturadas, identificaram mecanismos de controle excessivo, considerado como estratégia de defesa, uma vez que consiste numa forma de adequar a subjetividade do empregado à realidade de seu universo laboral. Indicaram que nesses casos, características objetivas do contexto de trabalho são percebidas de forma que suas peculiaridades negativas sejam minimizadas ou atribuídas a fatores alheios, como, por exemplo, o acaso e como forma de mobilização coletiva no trabalho ou uma forma criativa e prática de enfrentar a sobrecarga de tarefas e o ritmo exacerbado. Mendes et al. (2003) perceberam ainda a presença do fator confiança no relacionamento dos atendentes, fator esse 65 que os possibilitava amenizar a sensação de pressão, uma vez que existia a colaboração interpessoal para o alcance dos objetivos. Concluíram que, apesar dos resultados serem preliminares, a pesquisa demonstrou indicadores claros e válidos da utilização das estratégias. Sintetizando, o prazer é uma vivência que compreende experiências de gratificação provenientes da satisfação dos desejos e necessidades podendo ser individual ou compartilhada por um grupo de trabalhadores. O sofrimento é entendido pela vivência de experiências dolorosas, como angústia, medo e insegurança, oriundo de conflitos e de contradições vivenciados pelos trabalhadores que fazem uso de estratégias de mobilização coletiva, estratégias defensivas individuais (como negação, racionalização e compensação para lidar com o sofrimento) e coletivas e estratégias criativas. Para fins de facilitar a compreensão a respeito da interação entre os construtos apresentados, a Figura 4 procura esquematizar os principais conceitos abordados pela Psicodinâmica do Trabalho, abordados neste estudo. 66 TRABALHO SUJEITO SOFRIMENTO PRAZER INDIVIDUAIS ESTRATÉGIAS INTELIGÊNCIA ASTUCIOSA/ TRANSGRES SÃO DAS PRESCRIÇÕES INDIVIDUAIS (Mecanismos de defesa) DEFENSI VAS (MEDIAÇÃO) MOBILIZA ÇÃO COLETIVA CRIATI VAS (MEDIAÇÃO) COLETIVAS: QUANDO VALIDADAS SOCIALMENTE TORNAM-SE REGRAS DE OFÍCIO COLETIVAS (Ideologias defensivas) (coletivo de defesa) (coletivo de regra) FALHAM NÃO SIM MINIMIZAM O SOFRIMENTO (ADAPTATIVAS) TRABALHO FATIGANTE/ DOENÇA RECONHECI MENTO: COOPERAÇÃO ESPAÇO PÚBLICO DE DISCUSSÃO NÃO TRABALHO ESTRUTURANTE Figura 4: A Psicodinâmica do Trabalho Fonte: Baseada em Ferreira e Mendes (2003) Vale ressaltar que a Psicodinâmica, não se constitui um processo estático. A Figura 4, apenas sistematiza conceitos, entretanto, pesquisas em clínica do trabalho vêm demonstrando, por exemplo, que não apenas o sofrimento é gerador de adoecimento, o prazer, oriundo de 67 sentimentos de gratificação do sujeito, quando percebidos e manipulados pela organização do trabalho, podem gerar a denominada auto-aceleração, o que também pode acarretar o adoecimento (MENDES, 2007). Os estudos em Psicodinâmica do Trabalho constataram que o sofrimento é inerente à relação do homem com o trabalho, estando presente em todas as situações da vida, como uma conseqüência natural da frustração do desejo. Por outro lado, passaram a observar, também, que as vivências de prazer e de sofrimento não são excludentes entre si, sendo que normalmente há uma predominância de uma sobre a outra. São poucas as situações em que os trabalhadores vivenciam apenas prazer ou apenas sofrimento. Depreende-se que essa dinâmica ocorre, pois são inúmeros os fatores que influenciam a maneira como os trabalhadores se sentem no trabalho, além de que as pessoas têm uma tendência natural a buscar o prazer e evitar o sofrimento, seja qual for o contexto em que estiverem inseridos, posto que necessitam de defesas para a manutenção do equilíbrio psíquico, mesmo que a homeostase se mantenha e as leve a uma acomodação ou alienação psíquica. Ferreira e Mendes (2003, p.53), a partir dos postulados preconizados pela Psicodinâmica do Trabalho, concluem que: O prazer-sofrimento é um construto único, originado das mediações utilizadas pelos trabalhadores para manter a saúde, evitando o sofrimento e buscando alternativas para obter prazer. Logo, o trabalho é uma das fontes de saúde psíquica, de construção (ou reconstrução) da identidade do sujeito, e não necessariamente lugar de sofrimento; ele é uma possibilidade de expressão da subjetividade individual e da construção de uma subjetividade no trabalho, que permita a saúde e não o adoecimento ao atribuir o sentido do trabalho como prazer. No entanto, na maior parte das vezes, nossas pesquisas demonstram que é o sofrimento que predomina diante de condições externas extremamente restritivas às possibilidades de os sujeitos negociarem seus desejos diante da realidade e/ou quando se esgotam todas as tentativas individuais e coletivas de reação às adversidades do trabalho, instalando-se o adoecimento. Os pressupostos teóricos postulados pela Psicodinâmica do Trabalho, têm sido corroborados, por estudos empíricos realizados desde meados da década de 90, por pesquisadores brasileiros, que vêm identificando constantemente as vivências de prazer e sofrimento provenientes da organização do trabalho e as estratégias defensivas e de mobilização coletiva, seja por meio de estudos qualitativos ou quantitativos. As pesquisas desenvolvidas por Mendes (1999), Ribeiro e Mendes (2000), Diniz e Mendes (2000), Antloga (2003), Ferreira e Mendes (2001) e Mendes e Tamayo (2001) confirmaram a influência da organização do trabalho no prazer-sofrimento, tanto no que diz 68 respeito aos aspectos da racionalidade do trabalho, quanto dos atuais paradigmas de organização do trabalho. Mazilli e Lunardi (1995), em pesquisa realizada com enfermeiros, identificaram em uma organização do trabalho autocrática e autoritária, elementos fortemente implicados na gênese do sofrimento no trabalho. Revelaram-se como propiciadores de sofrimento o descaso, o desconhecimento ou a negação das dificuldades originadas na hierarquia e no grupo de trabalho, assim como a sobrecarga de trabalho e as precárias condições físicas de trabalho. Barcellos (1999) desenvolveu estudo sobre as condições de trabalho dos policiais que realizam o policiamento ostensivo na Brigada Militar de Porto Alegre. As condições e a organização de trabalho dos policiais militares foram articuladas com o conjunto de discursos e práticas institucionais que cercam o fenômeno e com o sofrimento físico e mental produzido pela atividade policial. Foi privilegiado, na pesquisa, o estudo de aspectos da Ergonomia relacionados às pressões físicas, químicas e biológicas, as divisões técnica e social do trabalho e sua associação com as vivências de sofrimento, além de aspectos relativos à defasagem entre trabalho prescrito e real. Concluiu que a precariedade das condições de trabalho, aliada à rigidez estabelecida na forma de organização de trabalho dos policiais militares, constituía-se em fonte de sofrimento mental que proporcionava na vida desses trabalhadores um impacto, que se projetava além dos limites da atividade laboral, alcançando o seu espaço de existência particular. A influência da organização do trabalho na vivência de sofrimento foi abordada por Ribeiro, Leda e Mendes (2005) em pesquisa realizada com profissionais de uma empresa pública. Os autores enfatizaram que o sofrimento psíquico no trabalho estava relacionado à percepção da falta de espaço na organização para inovar e criar, à execução de tarefas padronizadas e repetitivas e à existência de relação confusa e conflituosa com a hierarquia. Com o objetivo de verificar a predominância da vivência de prazer ou de sofrimento em profissionais em função da atividade de liderança, Diniz e Mendes (2000) realizaram pesquisa com chefes e não chefes de uma instituição pública, observando que a vivência de sofrimento é a mais representativa em profissionais que não exercem função de chefia. O prazer também é vivenciado, segundo Mendes e Abrahão (1996), de acordo com resultados empíricos obtidos em pesquisa realizada com engenheiros de telecomunicação, quando o trabalhador sente reconhecimento e valorização, tendo em vista: realização de tarefas com começo, meio e fim; visualização dos resultados da produção; descentralização das decisões; autonomia técnica; controle do processo produtivo; possibilidade de aprender e desenvolver-se profissionalmente e liberdade de expressão. 69 Estudo realizado por Mota (2002) buscou verificar o impacto dos programas de treinamento sobre as vivências de prazer-sofrimento no trabalho. Os profissionais estudados foram policiais militares. Não foram identificadas vivências de sofrimento. Pode-se atribuir esses resultados às circunstâncias momentâneas, posto que os trabalhadores se encontravam em um ambiente diverso do cotidiano. Fook e Silva-Júnior (2004) realizaram um estudo sobre sofrimento psíquico com profissionais de transportes públicos coletivos de Campina Grande-PB. Para identificar a existência de sofrimento psíquico, utilizaram o instrumento Self Report Questionaire (S.R.Q.20), um questionário composto de 20 perguntas, já validado para utilização no Brasil. Nas respostas obtidas por meio do instrumento, concluíram que, considerando-se a organização do trabalho no setor de transportes coletivos, é pequena a incidência de sofrimento psíquico na população estudada. Os resultados indicaram que os trabalhadores executavam atividades das quais gostavam. Resende e Mendes (2004) investigaram as estratégias defensivas e de mobilização subjetiva de enfrentamento do sofrimento psíquico no trabalho bancário, em três agências de bancos públicos localizados no Distrito Federal. Os resultados apontaram para quatro categorias: descontentamento com o trabalho, estratégias para enfrentar o estresse, insatisfação com a empresa e relacionamentos profissionais, todas relacionadas com o sofrimento. Para enfrentar tal sofrimento, as pesquisadoras concluíram que são utilizadas defesas de negação e controle por meio de mecanismos de racionalização. Morrone e Mendes (2003) investigaram o prazer e o sofrimento de trabalhadores em atividades informais sob o prisma da Psicodinâmica do Trabalho. O objetivo foi analisar as relações entre as vivências de prazer e de sofrimento, os atributos da organização do trabalho e a dinâmica do reconhecimento. Os achados demonstraram características de flexibilidade da organização do trabalho que favoreciam o prazer e a precariedade das condições de trabalho como elemento provocador de sofrimento. Inferiram que esse sofrimento é enfrentado por estratégias defensivas e ressignificado pela dinâmica do reconhecimento, que implica a valorização da atividade informal como alternativa para sobrevivência e para fazer face ao desemprego. Concluíram que essa categoria profissional tentava encontrar caminhos para manutenção da saúde ao utilizarem mecanismos que favoreciam o enfrentamento do sofrimento e a busca do prazer. De todo o cabedal teórico apresentado, resta ainda enfatizar como foram definidos os fatores de prazer e sofrimento ao longo do desenvolvimento científico e que subsidiaram a maioria das pesquisas hoje realizadas no país. 70 Dejours (1987, 1994) relacionava quatro indicadores característicos à vivência do sofrimento, a saber: a indignidade, a inutilidade, a desqualificação e a vivência depressiva. Na década de noventa, a realização no país dos estudos empíricos já citados, conduziram ao estabelecimento de outros fatores como sentimentos de desgaste e cansaço (MENDES, 1997) e sentimentos de desgosto e insegurança (MORRONE, 2001). Os fatores para a vivência de prazer foram definidos como sentimentos de valorização e reconhecimento por Mendes (1997, 1999), Ferreira e Mendes (2001) e Mendes e Tamayo (2001). Esses fatores foram reelaborados por Pereira (2003) incluindo assim a gratificação e a liberdade e como fatores de sofrimento foram apontados o desgaste e a insegurança. Mendes (2004) concluiu que o prazer, oriundo da organização do trabalho, é avaliado por dois fatores: realização (sentimento de gratificação, orgulho e identificação com determinado trabalho que atenda às necessidades profissionais); e liberdade (sentimento de estar livre para pensar, organizar e falar sobre o trabalho). Enquanto o sofrimento é avaliado pelos fatores: desgaste (sentimento de desânimo, cansaço, ansiedade, frustração, tensão emocional, sobrecarga e estresse no trabalho); e desvalorização (sentimento de incompetência diante das pressões para atender as exigências de desempenho e produtividade). Para Dejours (1987), a dinâmica entre o prazer e o sofrimento do trabalhador está ligada às dimensões: condições de trabalho (ambiente físico, químico, biológico, condições de higiene, de segurança e as características antropométricas - medida do corpo humano - do posto laboral) e organização do trabalho (divisão, o conteúdo da tarefa, o sistema hierárquico, as modalidades de comando, as relações de poder, as questões de responsabilidade, não aceitação mais da cisão entre o trabalho intelectual e manual dentre outras). Já para Mendes (2004) a dinâmica entre prazer e sofrimento está ligada às dimensões organização, condições e relações sociais de trabalho e são consideradas atributos que influenciam o clima organizacional e a satisfação do trabalhador, que, por sua vez, se caracterizam como avaliações circunstanciais do ambiente de trabalho, funcionando como termômetro que indica ou não o bem-estar na organização. Mendes (2004) destaca que as condições de trabalho são avaliadas por indicadores como: ambiente físico (sinalização, espaço, ar, luz, temperatura, som); matéria prima e informacionais (instrumentos, ferramentas, máquinas, documentação; equipamentos materiais arquitetônicos, aparelhagem e mobiliário); suporte organizacional (como informações, suprimentos e tecnologias); e política de remuneração, desenvolvimento de pessoal e benefícios. 71 Mendes (2004) define que, na organização do trabalho, são avaliados os seguintes indicadores: divisão hierárquica, técnica e social do trabalho (metas, qualidade e quantidade de produção esperada); regras formais (missão, normas, dispositivos jurídicos e procedimentos); duração da jornada (pausas e turnos); ritmos de trabalho (prazos e tipos de pressão); controles (supervisão, fiscalização e disciplina); e natureza do trabalho (conteúdo e características das tarefas). A autora afirma ainda que, para as relações sociais de trabalho, são considerados como indicadores as interações hierárquicas (relações de poder); interações coletivas (intra e intergrupos) e as interações externas (clientes, usuários, consumidores, representantes institucionais e fornecedores). Para melhor compreensão dos aspectos relacionados às vivências de prazer e sofrimento, ligadas às dimensões organizacionais expostas por Mendes (2004), segue-se o Quadro 3 esquemático: DIMENSÕES INDICADORES ITENS SINALIZAÇÃO, ESPAÇO, AR, LUZ, TEMPERATURA, SOM, INSTRUMENTOS, FERRAMENTAS, MÁQUINAS, DOCUMENTAÇÃO, EQUIPAMENTOS MATERIAIS ARQUITETÔNICOS, APARELHAGEM E MOBILIÁRIO. AMBIENTE FÍSICO CONDIÇÕES DE TRABALHO MATÉRIA PRIMA E INFORMAÇÕES E SUPRIMENTOS. INFORMACIONAIS. SUPORTE ORGANIZACIONAL TECNOLOGIAS. POLÍTICA DE REMUNERAÇÃO DESENVOLVIMENTO PESSOAL BENEFÍCIOS DIVISÃO TÉCNICA E TRABALHO. ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DE TREINAMENTO DESENVOLVIMENTO E AUXÍLIOS E VALES DIVERSOS HIERÁRQUICA, METAS, QUALIDADE E SOCIAL DO QUANTIDADE DE PRODUÇÃO ESPERADA. REGRAS FORMAIS MISSÃO, NORMAS, DISPOSITIVOS JURÍDICOS E PROCEDIMENTOS. DURAÇÃO DA JORNADA PAUSAS E TURNOS RITMOS DE TRABALHO PRAZOS E TIPOS DE PRESSÃO. INTERAÇÕES HIERÁRQUICAS SUPERVISÃO, FISCALIZAÇÃO E DISCIPLINA. CONTEÚDO E CARACTERÍSTICAS DAS TAREFAS. RELAÇÕES DE PODER INTERAÇÕES COLETIVAS INTRA E INTERGRUPOS INTERAÇÕES EXTERNAS CLIENTES, USUÁRIOS, CONSUMIDORES, REPRESENTANTES INSTITUCIONAIS E FORNECEDORES. CONTROLES NATUREZA DO TRABALHO RELAÇÕES SOCIAIS DE PROMOÇÕES E PREMIAÇÕES TRABALHO Quadro 3: Indicadores para verificação de prazer e sofrimento no ambiente organizacional Fonte: Baseado em Mendes (2004) 72 Neste estudo, optou-se pelas dimensões organizacionais definidas por Mendes (2004), Ferreira e Mendes (2003), além dos fatores de prazer e sofrimento reelaborados por Pereira (2003), incluindo assim a gratificação e a liberdade, como fatores de prazer e o desgaste e a insegurança como fatores de sofrimento, melhor conceituados no capítulo 3. 2.5 Ergonomia da Atividade e Psicodinâmica do trabalho – um diálogo entre duas disciplinas Essa seção visou abarcar a relação da Ergonomia da Atividade e a Psicodinâmica do Trabalho em um contexto organizacional, bem como apresentar pesquisas realizadas sob essas influências, a fim de que pudessem subsidiar os objetivos propostos neste estudo. O enfoque adotado por Ferreira e Mendes (2003), para investigar a influência entre o Contexto de Trabalho e a Psicodinâmica, abordagens teórico-metodológica com afinidades conceituais, epistemológicas e históricas e que norteiam o presente estudo, fundamenta-se em dois pressupostos complementares. O primeiro, advindo principalmente da Ergonomia da Atividade, refere-se à atividade do sujeito propriamente dita, onde, em situação de trabalho, a atividade caracteriza-se como um processo permanente de regulação e mediação que visa o ajuste do trabalhador às tarefas prescritas, ou às múltiplas determinações do contexto de trabalho (situacionais, físicas, materiais, instrumentais, organizacionais, sociais). O segundo está afeto à avaliação que o trabalhador faz de seu estado interno, resultando em vivências de prazer-sofrimento, que pode ser compartilhada coletivamente e é influenciada pela atividade de trabalho. Depreende-se desses pressupostos, já abordados de modo mais abrangente em seções anteriores, que toda a atividade laboral veicula implicitamente um custo humano que se expressa sob a forma de carga de trabalho, e as vivências de prazer e sofrimento têm como um dos resultantes o confronto ou conflito do sujeito com essa carga (trabalho real e trabalho prescrito) que, por conseguinte, impacta nas vivências subjetivas e no sentido e significado atribuído ao Contexto de Trabalho. Para tanto, o sujeito utiliza, basicamente, três estratégias de mediação individual e coletiva que visam manter a integridade física, psíquica e social. Ferreira e Mendes (2003) indicam que as principais estratégias de mediação individual e coletiva utilizadas pelos trabalhadores são: as estratégias operatórias (afetas à Ergonomia da Atividade), as estratégias de mobilização coletiva e as estratégias defensivas (afetas à Psicodinâmica do Trabalho). 73 De acordo com Ferreira e Mendes (2003, p. 43-44), as Estratégias de Mediação Individuais e Coletivas (EMIC) são: os “modos de pensar, sentir e de agir” diante de um contexto de produção específico. Elas visam a responder do melhor modo possível aos possíveis conflitos oriundos da diversidade de contradições que caracteriza o custo humano do trabalho, e que podem gerar sofrimento, buscando instaurar o predomínio de representações/vivências individuais e coletivas de prazer e bem-estar. Para os trabalhadores, responder adequadamente pode significar manter e / ou transformar as solicitações que resultam das variáveis presentes no contexto de produção. De acordo com esses autores, o prazer é definido como uma vivência individual ou de um grupo de trabalhadores de experiências de gratificação oriundas da mediação entre as necessidades do indivíduo e as exigências do contexto de trabalho. Em contrapartida, o sofrimento é uma vivência de sentimentos dolorosos como angústia, medo e insegurança, provenientes dos conflitos entre o indivíduo e o contexto de trabalho. Os dois pressupostos básicos, objeto desse estudo, vêm sendo estudados empiricamente mediante pesquisas realizadas por autores nacionais desde o início da década de 90 (MENDES; MORRONE, 2002). Esses estudos centraram-se na perspectiva de verificar as contradições, confrontos e conflitos provenientes das necessidades dos trabalhadores em relação ao contexto de trabalho e às vivências de prazer e sofrimento, em diversas categorias de trabalhado. Barros (2004) corrobora tais conclusões quando afirma que tais pesquisas, realizadas com servidores de empresa pública do Distrito Federal, operários da construção civil do DF, professores virtuais de uma instituição de ensino superior particular em Brasília, operadores de teleatendimento em Goiânia, empregados de construção civil e profissionais da área de gestão de pessoas de uma instituição financeira, indicam que as contradições provenientes do conflito entre as necessidades do indivíduo e o contexto de trabalho geram uma subjetividade específica (prazer e sofrimento no trabalho) em cada categoria estudada. Dessa forma, as vivências de prazer e sofrimento, são enfrentadas mediante estratégias de mediação, que variam de acordo com o contexto de trabalho de cada categoria profissional. Portanto, quando as estratégias falham ou quando a vivência do sofrimento é muito intensa e não é possível o seu enfrentamento, o adoecimento pode se instalar. Vale a citação de algumas dessas pesquisas no sentido de articular as contribuições, corroborar ou não os achados e consequentemente, agregar valor à temática abordada, ora em pauta. 74 Ferreira e Mendes (2001), em estudo realizado com servidores públicos no DF, investigaram a inter-relação entre atividade de atendimento ao público e vivências de prazer e sofrimento no trabalho nos dois pressupostos objetos do presente estudo. A atividade e a vivência de prazer e sofrimento oriundos do custo humano do trabalho. Utilizaram técnicas de coleta e análise de dados qualitativa e quantitativa com 64 sujeitos e concluíram que a atividade de trabalho constitui um dos elementos explicativos para a predominância de vivências de sofrimento dos atendentes. Facas et al. (2004), em pesquisa que investigou o trabalho de professores virtuais no contexto de trabalho, o custo humano no exercício da atividade, o prazer e o sofrimento vivenciados nesse ambiente e as estratégias de mediação individuais e coletivas utilizadas, realizaram entrevistas individuais semi-estruturadas e abertas com dois “professores virtuais”. Os pesquisadores verificaram que, quanto à organização do trabalho, existe liberdade, embora por vezes, o professor fique além de sua carga horária estabelecida para concluir as atividades. As condições de trabalho eram precárias em alguns pontos tais como a existência de reclamações com relação a mobiliário, ventilação, ruídos e equipamentos. Quanto às relações sociais com a chefia, havia diálogo aberto e com os pares era de companheirismo, sendo que a dinâmica entre estes e os alunos foi considerada excelente. Concluíram que a flexibilidade na organização do trabalho pode tanto ser positiva quanto negativa e que as condições de trabalho e as relações sociais eram adequadas. Indicaram que esses fatores favoreceram as vivências de prazer. Vieira (2005) realizou pesquisa com 396 operadores de uma central de teleatendimento, fundamentada no pressuposto de que o confronto dos resultados da interrelação dos trabalhadores com o contexto de trabalho pode ser fonte de prazer ou de sofrimento e dependem das estratégias utilizadas pelos trabalhadores para ressignificar o sofrimento e transformá-lo em prazer. O contexto de trabalho compreendeu as dimensões: condições de trabalho, organização do trabalho e relações socioprofissionais. Para tanto, utilizou a Escala de Indicadores de Prazer e Sofrimento no Trabalho (EIPST), revalidada em sua pesquisa, com quatro fatores: gratificação e liberdade, para prazer e desgaste e insegurança, para sofrimento. Os resultados obtidos indicaram a presença de vivências moderadas de prazer e sofrimento, prevalecendo às vivências de prazer em relação às vivências de sofrimento. Os resultados sugeriram que os atendentes poderiam estar utilizando estratégias defensivas, como a negação, racionalização e a compensação para lidar com o sofrimento e manter a integridade física, psíquica e social. 75 Embora a escala a ser utilizada nesse estudo, por opção, tenha sido a validada por Pereira (2003), os fatores e indicadores recorrentes nas escalas de Vieira (2005) e Pereira (2003) são semelhantes, mudando-se apenas o modo de colocação das afirmativas referentes a estes, ou seja, Pereira (2003) utilizou uma escala com frases mais completas e elaboradas do que Vieira (2005), cuja escala continha apenas palavras que se referiam aos fatores, fato este que não influiu de modo definitivo na comparação entre os resultados encontrados. Barros e Mendes (2003) investigaram o Contexto de Trabalho e as vivências de prazer e sofrimento no trabalho dos operários terceirizados de uma cooperativa do Distrito Federal, utilizando o modelo teórico-metodológico adotado por Ferreira e Mendes (2003), mediante a aplicação de entrevistas coletivas semi-estruturadas com dois grupos de cinco operários terceirizados cada um, totalizando dez participantes. Os resultados apontaram para um contexto de trabalho caracterizado por uma organização do trabalho rígida quanto à qualidade dos serviços, mas flexível em relação ao horário. As condições de trabalho foram consideradas satisfatórias e as relações de trabalho, amigáveis. A necessidade de sobrevivência e a satisfação no trabalho indicaram concomitantemente neutralização do sofrimento por meio das condições favoráveis do contexto de trabalho e da utilização das relações sociais de trabalho como estratégias mediadoras do sofrimento. Silva e Mendes (2004) analisaram a relação entre o contexto de trabalho e os indicadores de prazer e sofrimento em 71 profissionais da área de gestão de pessoas de uma instituição financeira. Utilizaram-se do Inventário de Riscos de Adoecimento (ITRA), composto pela Escala de Condições, Organização e Relações de Trabalho (ECORT) e pela Escala de Indicadores de Prazer e Sofrimento no Trabalho (EIPST). O contexto de trabalho foi percebido moderadamente pelos participantes. O fator da ECORT com maior média foi organização do trabalho. Os resultados da EIPST indicaram vivências também moderadas de prazer e sofrimento. As vivências de prazer apresentaram maior média em relação às de sofrimento. O fator liberdade apresentou a maior média. A avaliação teórica e empírica das implicações de variáveis do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento no trabalho apontou uma contradição entre vivência de prazer em um contexto insatisfatório. Os resultados mostram que os sujeitos adotavam como estratégias defensivas, a racionalização e a negação para evitar o sofrimento. Silva, Campos e Mendes (2004), em pesquisa realizada com líderes religiosos neopentacostais e tradicionais, encontraram resultados que ratificaram a pesquisa anteriormente citada, concluindo que não existe diferença estatisticamente significativa entre a vivência de prazer-sofrimento e percepção do Contexto de Trabalho, ou seja, há 76 predominância de prazer em um contexto de trabalho insatisfatório, embora existissem diferenças de estruturas e concepções de trabalho totalmente diferentes, indicando que outras variáveis poderiam ter maior influência sobre as atividades. Analisando-se as recentes contribuições por meio de pesquisas que objetivaram verificar as inter-relações entre o Contexto de Trabalho e a Psicodinâmica, conclui-se que as vivências de prazer e sofrimento são enfrentadas mediante estratégias de mediação, que variam de acordo com o contexto de cada organização e da natureza do trabalho. Assim, as pesquisas confirmam que a atividade de trabalho, bem como as condições de trabalho favoráveis, constituíam-se como prognósticos para a predominância de vivências de prazer, ou ao contrário, quando percebidas como negativas, atuavam como prognósticos de sofrimento dos trabalhadores. Os pesquisadores concluíram ainda, que independentemente de perceberem o contexto como insatisfatório, os trabalhadores tendiam, de modo geral, depender da escolha das estratégias defensivas a serem utilizadas no Contexto de Trabalho, regulando as vivências de sofrimento a fim de manterem a integridade física, psíquica e social. Com o intuito de atingir o objetivo proposto neste estudo, definiram-se na próxima seção, os elementos que compuseram e delinearam os procedimentos utilizados para a investigação das percepções dos trabalhadores da organização investigada, quanto aos pressupostos da atividade (contexto do trabalho), das vivências de prazer e sofrimento (organização do trabalho), bem como a identificação das estratégias de mediação utilizadas pelos trabalhadores, haja vista as especificidades das naturezas de trabalho investigadas. Assim, fundamentado no referencial teórico exposto nesta e em seções anteriores, principalmente no que concerniu ao Contexto de Trabalho e à Psicodinâmica, o próximo capítulo trata da metodologia utilizada para a consecução da pesquisa. 77 3 Metodologia Depreende-se que a opção de um delineamento metodológico para o estudo empírico caracteriza-se como uma preocupação capital para qualquer pesquisador que queira alcançar objetivos eminentemente científicos. Por tratar-se de uma pesquisa na área das ciências sociais, a estrutura metodológica deve ser rigorosamente planejada, considerando-se em primeiro plano, a ética do pesquisador ao engendrar-se em determinada organização. A obtenção de dados requer um redobrado cuidado do pesquisador quanto às opiniões dos respondentes e da organização. Devem imperar, portanto, a ética e o rigor científico, no caminho a ser trilhado. Posto isso, este capítulo visou delinear o método de pesquisa realizado para alcançar os objetivos propostos neste estudo. Foram descritos, os modelos fundamentados no arcabouço teórico, o tipo de pesquisa conduzida, a população selecionada para participar da pesquisa, os instrumentos e procedimentos para a coleta de dados e as técnicas utilizadas para a análise de dados. 3.1 Abordagens utilizadas para a realização do estudo Para investigar as vivências de prazer e sofrimento, bem como o contexto do trabalho, optou-se pela utilização das abordagens da Ergonomia da Atividade e Psicodinâmica do Trabalho, a seguir detalhadas. 3.1.1 Ergonomia da Atividade A perspectiva histórica apresentada, bem como as concepções oriundas dos significados e sentidos do trabalho, privilegiam as condições, a organização e as inter-relações no mundo do trabalho, que se constituem em características influentes em diferentes segmentos da organização. Para tanto, com vistas a investigar os fatores que compõem o Contexto de Trabalho, optou-se pelo enfoque proposto por Ferreira e Mendes (2003) e Mendes (2007), que abrangem a organização do trabalho, as condições de trabalho e as relações socioprofissionais de trabalho. Os fatores escolhidos para investigação nesta pesquisa sobre o Contexto de Trabalho ou Contexto de Produção de Bens e Serviços (CPBS), encontram-se representados na Figura 5: 78 Figura 5: Contexto de Produção de Bens e Serviços (CPBS) - Principais fatores Fonte: Ferreira e Mendes (2003, p. 41). Para Ferreira e Mendes (2003, p. 41), o CPBS: Expressa o lócus material, organizacional e social onde se operam a atividade de trabalho e as estratégias individual e coletiva de mediação utilizadas pelos trabalhadores na interação com a realidade de trabalho. Esse contexto articula múltiplas e diversificadas variáveis, compondo uma totalidade integrada e articulada. O Quadro 4 mostra, de modo esquemático, o que representam, para esses autores, os indicadores que norteiam o Contexto de Trabalho. Organização do trabalho Representações sobre a divisão do trabalho, normas, tempo e controle exigidos para o desempenho das tarefas. Condições de trabalho Representações sobre o apoio institucional recebido para a realização do trabalho em termos de ambiente físico, equipamentos, material e gestão voltada para o desempenho e desenvolvimento profissional. Relações sociais de trabalho Representações sobre a comunicação e a sociabilidade no trabalho, interação profissional com colegas e chefias. Quadro 4: Indicadores do contexto de trabalho. Fonte: Ferreira e Mendes (2003, p. 64). Ferreira e Mendes (2003) explicitam que a organização do trabalho (OT), constitui-se por elementos formal ou informalmente prescritos, que denotam as diretrizes práticas do trabalho, presentes no lócus de produção e que impactam diretamente no funcionamento 79 operacional da organização. Indicam que a OT integra os seguintes elementos: divisão do trabalho (hierárquica, técnica e social), produtividade esperada (metas, qualidade e quantidade), regras formais (missão, normas, dispositivos jurídicos e procedimentos), tempo de trabalho (duração da jornada, pausas e turnos), ritmos (prazos e tipos de pressão), controles (supervisão, fiscalização e disciplina) e características das tarefas (natureza e conteúdo). Ferreira e Mendes (2003) afirmam ainda que as Condições de Trabalho (CT) compõem-se por elementos estruturais presentes no lócus de trabalho e têm na infra-estrutura organizacional, no apoio institucional e nas práticas administrativas, a representatividade. Os indicadores desse fator são: o ambiente físico (sinalização, espaço, ar luz, temperatura e som); instrumentos (ferramentas, máquinas e documentação); equipamentos (materiais arquitetônicos, aparelhagem e mobiliário); matéria-prima (objetos materiais/simbólicos informacionais); suporte organizacional (informações, suprimentos e tecnologia) e práticas de remuneração, desenvolvimento de pessoal e benefícios, dentre outras. Para Ferreira e Mendes (2003), as Relações Sociais de Trabalho (RST) constituem-se pelos elementos interacionais que indicam as relações socioprofissionais de trabalho presentes no lócus de produção, e que caracterizam o fator social. Os princípios que o integram são: interações hierárquicas (chefias imediatas e superiores); interações coletivas intra e intergrupos (membros da equipe e de outros grupos de trabalho) e interações externas (usuários, consumidores e representantes institucionais). Para fins desse estudo, foi utilizado, portanto, o conceito de Contexto de Trabalho com os três fatores que o compõem, bem como seus indicadores. 3.1.2 Psicodinâmica do Trabalho Haja vista que o objetivo desse estudo foi verificar a percepção das vivências de prazer e sofrimento oriundas do contexto do trabalho, optou-se pela abordagem teórica da Psicodinâmica do Trabalho, posto que se assenta na relação subjetiva do trabalhador sobre seu próprio trabalho e gerada, principalmente, por questões relacionadas à atividade e às relações socioprofissionais com a Empresa, com a chefia e com os colegas de trabalho (MENDES, 1999). A experiência do sofrimento no trabalho foi considerada durante décadas como derivada apenas de aspectos ligados diretamente à organização do trabalho. Nos anos oitenta, a partir da análise do discurso dos trabalhadores em pesquisas realizadas por Dejours (1987, 1996), quatro indicadores foram caracterizados como reveladores da vivência de sofrimento 80 no trabalho. A indignidade (relacionado à frustração narcísica diante da percepção de que o trabalho é “robotizado”, despersonalizado, que não permite a utilização da inteligência e imaginação, causa isolamento psicoafetivo e é subjugado a um sistema de poder); a inutilidade (percepção de que o trabalho não tem finalidade e significação para si mesmo, para a família, para a organização e para a sociedade em geral); a desqualificação (percepção de que as tarefas são pouco complexas, não exigem conhecimentos específicos, implicando a desmotivação e a não realização profissional e a vivência depressiva (que condensa os sentimento de indignidade, inutilidade e desqualificação, ampliando-os). Essa depressão é marcada pela fadiga, produz o adormecimento intelectual, à alienação mental e marca o triunfo do condicionamento ao comportamento produtivo. De acordo com Jaques (2003), o método proposto por Dejours calca-se essencialmente na escuta, na interpretação e na devolução, sendo enfaticamente contrário ao uso de questionários e estudos epidemiológicos, além de impor restrições à observação do cotidiano de trabalho por priorizar a escuta do trabalhador e para tanto, privilegia o emprego da entrevista coletiva. Jaques (2003) observa que, como concepção de ciência e de pesquisa, a Psicodinâmica prioriza os modelos teóricos concebidos pela via investigativa, que servem ao ordenamento das evidências empíricas. Cita ainda que outra adaptação comum em estudos e pesquisas brasileiras, com base nos pressupostos dejourianos, é a substituição da entrevista coletiva pela entrevista individual. Tal substituição se deve a dificuldades de reunir coletivamente os trabalhadores, mas, inegavelmente, limita as abrangências da proposta, pois a interação grupal permite reconstruir a lógica das pressões do trabalho e as defesas (principalmente coletivas) contra os efeitos psicológicos dessas pressões. Entretanto, pesquisadores brasileiros, tendo como precursores Mendes e Tamayo (2001) e Morrone (2001) identificaram a necessidade de construir uma medida objetiva, para o estudo do prazer e sofrimento no trabalho, enfocando esse construto dialético como vivências de sentimentos de valorização, reconhecimento e desgaste no trabalho. A pesquisa foi realizada numa empresa pública de abastecimento e saneamento com 554 empregados. Foi aplicada uma escala para medir o prazer-sofrimento, onde os resultados indicaram uma preponderância das vivências de prazer, sendo o sofrimento vivenciado moderadamente. Após a construção e validação de uma escala quantitativa para a mensuração de indicadores de prazer e sofrimento por pesquisadores brasileiros, os estudos vêm demonstrando que a utilização de um instrumento de medida sobre a temática não só é possível como é útil para a realização de procedimentos de diagnóstico e intervenção nas 81 organizações de trabalho. No entanto, enfatizam a importância de combinar métodos quantitativos e qualitativos, para o estudo das vivências psíquicas no trabalho, argumentando que a coleta de dados qualitativos permite a análise do particular, enquanto que a coleta de dados quantitativos permite a análise do geral. Nesta trajetória, Mendes (1999), Morrone (2001) e Pereira (2003) identificaram dois fatores relacionados ao prazer e dois relacionados ao sofrimento no trabalho. Gratificação e liberdade, relativos ao prazer e insegurança e desgaste, relativos ao sofrimento. O Quadro 5 apresenta, de modo esquemático, a descrição dos fatores que representam indicadores de prazer e sofrimento no trabalho. Liberdade Sentimento de ser aceito e admirado no trabalho e ter liberdade para pensar, organizar e expressar sua individualidade; Gratificação Sentimento de satisfação, realização e orgulho de que o trabalho tem sentido e valor por si mesmo, de que é importante e significativo para a pessoa, para a organização e para a sociedade. Indicadores de Prazer Sentimentos de desânimo, descontentamento, adormecimento intelectual e apatia em relação ao trabalho; Indicadores de Temor de não conseguir satisfazer as imposições Sofrimento organizacionais relacionadas à competência profissional, Insegurança produtividade, ritmos e normas do trabalho. Quadro 5: Indicadores de prazer e sofrimento no trabalho Fonte: Mendes (1999), Morrone (2001) e Pereira (2003). Desgaste Como se pode perceber no Quadro 5, o prazer no contexto do trabalho acontece quando se vivencia a gratificação e a liberdade. A gratificação é o sentimento de satisfação, realização, orgulho e identificação com um trabalho que atende às aspirações profissionais. A liberdade é o sentimento de estar livre para pensar, organizar e falar sobre o trabalho, considerando-se que o modo particular de trabalhar é reconhecido pelas chefias e colegas. O sofrimento é experienciado quando existem sentimentos de insegurança e desgaste no trabalho. A insegurança é vivenciada pelo receio de perder o emprego e por não se conseguir atender às expectativas relacionadas à competência profissional, às exigências de produtividade e às pressões do trabalho. O desgaste é o sentimento de que o trabalho causa estresse, sobrecarga, tensão emocional, cansaço, ansiedade, desânimo e frustração. Conforme pressupostos da Psicodinâmica do Trabalho (DEJOURS, 1987, 1996, 1999a, 1999b, 2004) quando não há espaço para a expressão subjetiva, quando não existe reconhecimento e a empresa apresenta uma forma rígida de organização do trabalho, onde não permite a mobilização do trabalhador, esse pode recorrer a comportamentos de alienação em 82 relação ao seu grupo de trabalho, de resignação, de descrença, de renúncia à participação, de indiferença e de apatia. Por outro lado, a depender da percepção e da inter-relação entre a subjetividade do trabalhador, pode frutificar um processo saudável de transformação do sofrimento em prazer, o que é denominado de mobilização subjetiva e se caracteriza pelo uso dos recursos psicológicos do trabalhador e pelo espaço público de discussão sobre o trabalho. Esta ressignificação do sofrimento acontece a partir de uma operação simbólica: o resgate do sentido do trabalho (MENDES, 1999). Finalmente, ressalta-se que os diversos métodos, conjugados ou não, utilizados no estudo das vivências de prazer e sofrimento no trabalho, vêm contribuindo sobremaneira para o entendimento do fenômeno e a relação entre suas variáveis, bem como vêm subsidiando estratégias mitigadoras e equilibrantes no ambiente laboral. 3.2 Tipo de Pesquisa Para a classificação dessa pesquisa, tomou-se como base as taxonomias propostas por Rubio (2003), Richardson et al. (1999) e Miller (1991). Estes autores classificam as pesquisas em dois aspectos: quanto aos fins ou objetivos e quanto aos meios de investigação. Como o propósito desse estudo foi a descrição e estabelecimento de relações entre a percepção do contexto de trabalho e a influência nas vivências de prazer e sofrimento em duas carreiras distintas de determinada organização, quanto aos fins, à pesquisa foi descritiva, pois revelou características de determinada população ou determinado fenômeno, além de ter estabelecido relações entre variáveis. Para Miller (1991), a pesquisa descritiva é concebida mediante informações obtidas geralmente por meio de questionários e entrevistas. Este tipo de pesquisa tem como objetivo fundamental a descrição das características de determinado grupo de pessoas ou fenômenos, com o estabelecimento de relações entre variáveis. Rubio (1996), por sua vez, afirma que a pesquisa descritiva está interessada em descobrir e observar fenômenos, procurando descrevê-los, classificá-los e interpretá-los. Quanto aos meios de investigação, essa pesquisa caracterizou-se como bibliográfica, estudo de caso e de campo. A pesquisa bibliográfica examinou materiais diversos publicados sobre o assunto, além de algumas teses, dissertações e periódicos classificados como A e B no sistema Qualis, 83 da CAPES, nos últimos cinco anos, tais como RAC, RAE, RAUSP, Revista Estudos e Pesquisas em Psicologia, Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, Revista Produção, Revista Estudos em Psicologia, dentre outros. Hartley (2004) explicita que o estudo de caso se constitui em uma pesquisa sobre determinado grupo ou indivíduo, que visa analisar aspectos variados de sua vida, consiste de uma pesquisa empírico-analítica e possibilita um maior aprofundamento na realidade social. Para Godoy (1995, p. 25), o estudo de caso se caracteriza como "um tipo de pesquisa cujo objeto é uma unidade que se analisa profundamente. Visa ao exame detalhado de um ambiente, de um simples sujeito ou de uma situação em particular". Já para Gondim et al. (2005), embora um estudo de caso compreenda um detalhamento do caso em profundidade, ao deslocar-se o foco da pesquisa para a comparação com modelos teóricos, cria-se um terreno propício para o refinamento da teoria, que pretende compreender ou explicar o fenômeno estudado. Tratou-se, portanto, de um estudo de caso, pois investigou o fenômeno em uma única organização e buscou-se a compreensão deste por meio do refinamento teórico, utilizando-se, para o levantamento de dados, de questionários de perguntas fechadas e de entrevistas individuais abertas semi-estruturadas, com o intuito de identificar a percepção de empregados de diferentes carreiras. Segundo Spink (2003, p.18), o termo pesquisa de campo é empregado para "descrever um tipo de pesquisa feito nos lugares da vida cotidiana e fora do laboratório ou da sala de entrevista", ou seja, os dados foram coletados no local do objeto de estudo. Finalmente, quanto aos procedimentos de coleta de dados, essa pesquisa foi mista. Caracterizou-se como quantitativa "pelo emprego da quantificação tanto na coleta quanto no tratamento dos dados” (RICHARDSON et al., 1999, p. 70) e como qualitativa, posto que também foram utilizadas, a posteriori, entrevistas individuais semi-estruturadas, cujo objetivo principal, de acordo com Zanelli (2002, p.83) “é buscar entender o que as pessoas apreendem ao perceberem o que acontece em seus mundos”. O propósito da utilização de procedimento misto baseou-se nas constatações de Ferreira e Mendes (2007, p.74) que recomendam a aplicação conjunta de dois métodos, um tratamento quantitativo, além do qualitativo, "visando a uma apreensão com base em diferentes olhares sobre o objeto de estudo". A utilização de instrumento quantitativo, segundo os autores, presta-se para atender casos onde há maior demanda de trabalhadores, além de "exercer um papel auxiliar de "termômetro", objetivando uma análise descritiva do real e traçando um perfil de alguns fatores que podem interferir no processo do trabalho". O 84 uso da pesquisa qualitativa permitiu também clarificar e ilustrar os dados quantitativos, bem como aprofundar e melhorar a qualidade da interpretação. 3.3 População e Amostra 3.3.1 Contextualização da organização O estudo foi realizado em 2006 na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, criada em 26 de abril de 1973. A Empresa tinha como principais objetivos o planejamento, supervisão, orientação, controle e execução ou promoção da execução de atividades de pesquisa agropecuária, visando produzir conhecimentos tecnológicos a serem empregados no desenvolvimento da agricultura nacional e internacional (EMBRAPA, 2006). Tinha como missão, "viabilizar soluções para o desenvolvimento sustentável do espaço rural, com foco no agronegócio, por meio da geração, adaptação e transferência de conhecimentos e tecnologias, em benefício dos diversos segmentos da sociedade brasileira" (EMBRAPA, 2006). A Empresa, neste período, atuava por intermédio de 37 Centros de Pesquisa e três escritórios, compondo um total de 40 Unidades Descentralizadas e 11 Unidades Centrais, estando presente em quase todos os Estados da Federação. Possuía, à época do estudo, 8.619 empregados, dos quais 2.221 eram pesquisadores, 45% com mestrado, 53% com doutorado e 2% com nível superior, operando um orçamento da ordem de R$ 877 milhões anuais (EMBRAPA, 2006). A Embrapa coordenava também o Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA), constituído por instituições públicas federais, estaduais, universidades, empresas privadas e fundações, que, de forma cooperada, executavam pesquisas nas diferentes áreas geográficas e campos do conhecimento científico (EMBRAPA, 2006). Na Embrapa, as unidades de pesquisa eram descentralizadas em função de áreas geográficas e de produtos pesquisados ou linhas de pesquisa e foram assim organizadas para centrar seus esforços na investigação de um produto ou conjunto de produtos agrícolas, de problemas e recursos naturais de uma dada região ecológica ou de procedimentos e produtos a serem adaptados para determinado âmbito regional. Tal estrutura agrupava especialidades e 85 recursos organizacionais, de modo que os conhecimentos e as tecnologias previstos na sua missão pudessem ser gerados (BORGES-ANDRADE; XAVIER; AFANASIEFF, 1992). Contudo, mesmo tendo optado por essa forma de estruturação para suas unidades de pesquisa, a Embrapa ainda mantinha outra estrutura mais tradicional nas suas unidades centrais, as quais se organizavam por especialidades ou funções, para o exercício de atividades mais rotineiras da Empresa (EMBRAPA, 2006). Esta estrutura, numa organização de pesquisa como a Embrapa, tinha dois grandes grupos de papéis ocupacionais: um de pesquisa e outro de suporte à pesquisa. O primeiro grupo era formado pelos pesquisadores, responsáveis pelas atividades diretamente relacionadas à missão e aos objetivos da Empresa. O segundo grande grupo era composto pelos demais empregados, que se ocupavam predominantemente de atividades mais rotineiras e de apoio logístico às atividades de pesquisa (BORGES-ANDRADE; XAVIER; AFANASIEFF, 1992). O divisor de águas na Embrapa, quando se desejava separar as carreiras de suporte e de pesquisa pela natureza da organização ou pelas suas características estruturais e de metas, era a diferença entre as unidades centrais e as descentralizadas. Cabia a estas últimas realizarem a pesquisa agropecuária propriamente dita: eram os Centros de Pesquisa por Produtos e por Recursos e as Unidades de Pesquisa de âmbito Estadual e de Apoio a Programas Nacionais, localizados em quase todas as Unidades da Federação. Nas unidades descentralizadas, estava concentrado o maior número de pesquisadores (EMBRAPA, 2006). Havia, por parte da instituição, um grande esforço no sentido de descentralizar a execução da pesquisa, de exercer uma política de planejamento participativo no que concernia à formulação das diretrizes gerais dos programas e projetos, de estimular a autonomia dos pesquisadores e de valorizar projetos audaciosos de pesquisa (BORGES-ANDRADE; XAVIER; AFANASIEFF, 1992). A carreira de suporte também se refletia em parte da estrutura das unidades descentralizadas da Empresa, particularmente nas operações administrativas executadas em consonância ou coordenadas pela administração central, estivessem eles no campo, nos laboratórios, nos setores administrativos, em bibliotecas, em casas de vegetação em oficinas, em centros de computação ou em setores de transporte. Nesta carreira encontravam-se, em maior número, os papéis ocupacionais de apoio à pesquisa: pessoal de campo, técnicos agrícolas, pessoal de laboratório, operadores de máquinas e veículos, pessoal de biblioteca, de desenho e de impressão e técnicos graduados e, 86 na maior parte, pós-graduados, com especializações nas diversas áreas da agronomia, veterinária, estatística e matemática e das ciências biológicas, químicas, econômicas e sociais. A carreira de pesquisa estava menos presente na Sede do que nas unidades de pesquisa. No caso da Embrapa, a carreira de apoio predominava na administração central, particularmente nos departamentos encarregados de administrar a informação, o patrimônio, os materiais, os recursos financeiros o processo de controle e desenvolvimento e de gestão de pessoas. Havia também nas unidades centrais, profissionais graduados ou pós-graduados com atribuições de coordenar todo o sistema e dar-lhe o apoio administrativo e político necessário para que a pesquisa pudesse ser feita. Elas referiam-se aos departamentos da Sede da Empresa, dedicados a assuntos como planejamento, programação e difusão da pesquisa, orçamento, gestão de pessoas e materiais, informática, publicações, documentação e outros, e as assessorias para assuntos jurídicos, de relações públicas, dentre outras (EMBRAPA, 2006). 3.3.2 Critérios de seleção dos participantes Os dados quantitativos foram coletados junto ao universo dos empregados lotados nas sete unidades da empresa, situadas no Distrito Federal. A escolha dessas unidades deveu-se ao fator conveniência ou acessibilidade à população e justificou-se diante da diversidade existente entre unidades centralizadas e descentralizadas, que possuíam planos diretores distintos, ou Plano Diretor da Unidade (PDU), o que possibilitou enriquecer a análise, de modo que fossem consideradas as particularidades inerentes aos fenômenos das vivências de prazer e sofrimento influenciadas pelo contexto de trabalho. No que concerne à população das unidades do DF pesquisadas em 2006, encontrava-se distribuída conforme o Quadro 6, que se segue: Unidades da Embrapa no DF 786 30 376 332 108 Número de empregados Pesquisadores 190 21 97 53 07 284 108 176 242 2.158 41 517 201 1695 Número total de Empregados Embrapa Sede (11 unidades centrais) Embrapa Café Embrapa Cerrados Embrapa Hortaliças Embrapa Informação Tecnológica Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia Embrapa Transferência de Tecnologia TOTAL Quadro 6: Composição da população em 2006. Fonte: Embrapa (2006) Número de empregados de Suporte à Pesquisa 596 09 279 225 101 87 Dos 2.158 empregados das Unidades da Embrapa no Distrito Federal, 944 estavam lotados em outros órgãos, afastados da organização ou não possuíam endereço eletrônico, como por exemplo, empregados que executavam as atividades em campos experimentais da Empresa. A população, portanto, foi reduzida para 1.214 empregados. A coleta dos dados qualitativos, que visou aprofundar e melhorar a qualidade da interpretação, em momento posterior, abranjeu uma amostra de cinco pesquisadores e seis empregados de suporte à pesquisa, tendo sido, portanto, realizadas 11 entrevistas. Alguns critérios utilizados para a escolha dos 11 entrevistados foram: as primeiras seis entrevistas foram realizadas com o pessoal de suporte à pesquisa e as cinco seguintes com pesquisadores. Cinco entrevistados com até dez anos de empresa e seis entrevistados com mais de 20 anos de empresa. Cinco entrevistados da sede da Empresa (três de suporte e dois de pesquisa) e seis entrevistados lotados em Unidades de Pesquisa (três de suporte e três de pesquisa). A escolha se deu primeiramente por sorteio e, depois de contatados os empregados sorteados, foram consideradas a acessibilidade e disponibilidade dos entrevistados. 3.4 Instrumentos de Coleta de Dados A coleta de dados foi realizada em dois momentos distintos. Primeiramente, foram aplicadas duas escalas já validadas e posteriormente, foram realizadas entrevistas individuais abertas semi-estruturadas. 3.4.1 Questionários Nesta coleta, foi utilizado um questionário composto por três partes. A primeira e a segunda partes constituíam-se nas escalas propriamente ditas, a escala para avaliação dos indicadores de organização, condições e relações socioprofissionais do trabalho, ou seja, a Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT) e a escala que abrangia a avaliação da percepção dos respondentes quanto aos indicadores de: gratificação, liberdade, insegurança e desgaste, a Escala de Indicadores de Prazer-Sofrimento no Trabalho (EIPST). Na terceira e última parte constavam as variáveis demográficas (Anexo A). Estas duas escalas faziam parte de um instrumento composto por quatro escalas criado por Ferreira e Mendes (2003), denominado de Inventário de Trabalho e Riscos de Adoecimento (ITRA), tendo sido adaptado e revalidado em 2004, publicado por Mendes et al. (2005), e novamente submetido à validação, ocorrendo pequenos ajustes no ano de 2006, 88 em sua terceira versão. Nesta pesquisa optou-se, em função dos objetivos propostos, pela utilização de apenas duas das quatro escalas constantes do instrumento, a Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT) e a Escala de Indicadores de Prazer-Sofrimento no Trabalho (EIPST) . A Escala de Avaliação do Contexto de Bens e Serviços (ECBS), em 2006 foi renomeada para Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT). Elaborada e validada por Ferreira e Mendes (2003), foi adaptada e revalidada em 2004 e 2006 e considerava os seguintes fatores: condições de trabalho, organização e relações socioprofissionais. A Escala de Avaliação do Contexto do Trabalho (EACT) era composta por 33 itens, agrupados nos fatores constantes do Quadro 7, a serem respondidos em um escala “Likert” que ia de 1 (nunca) a 5 (sempre), os quais permitiam ao respondente manifestar a percepção sobre os aspectos do ambiente de trabalho, como se segue: FATORES 1. Condições de Trabalho — 10 itens, • alfa = 0,89 • • Qualidade do ambiente físico, posto de • trabalho, equipamentos e material • disponibilizados para a execução do trabalho. • • • • • 2. Relações Socioprofissionais — 12 • itens, alfa = 0,87 • • • Gestão do trabalho, comunicação e • interação socioprofíssional. • • • • • • • 3. Organização do Trabalho — 10 itens, • alfa = 0,72 • • • Natureza e divisão das tarefas, nas • normas, controles e ritmos de trabalho. • • ITENS As condições de trabalho são precárias. O ambiente físico é desconfortável. Existe barulho no ambiente de trabalho. O mobiliário existente no local de trabalho é inadequado. Os instrumentos de trabalho são insuficientes para realizar as tarefas. O posto de trabalho é inadequado para realização das tarefas. Os equipamentos necessários para realização das tarefas são precários. O espaço físico para realizar o trabalho é inadequado. As condições de trabalho oferecem riscos à segurança física das pessoas. O material de consumo é insuficiente. As tarefas não estão claramente definidas. A autonomia é inexistente. A distribuição das tarefas é injusta. Os funcionários são excluídos das decisões. Existem dificuldades na comunicação chefia-subordinado. Existem disputas profissionais no local de trabalho. Existe individualismo no ambiente de trabalho. Existem conflitos no ambiente de trabalho. A comunicação entre funcionários é insatisfatória. O bem-estar dos funcionários não é uma prioridade. As informações que preciso para executar minhas tarefas são de difícil acesso. Falta apoio das chefias para o meu desenvolvimento profissional. O ritmo de trabalho é acelerado. As tarefas são cumpridas com pressão temporal. A cobrança por resultados é presente. As normas para execução das tarefas são rígidas. Existe fiscalização do desempenho. O número de pessoas é insuficiente para se realizar as tarefas. Os resultados esperados estão fora da realidade. 89 • Existe divisão entre quem planeja e quem executa as tarefas. • As tarefas são repetitivas. • Falta tempo para realizar pausa de descanso no trabalho. Quadro 7: Descrição da estrutura fatorial da Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT). Fonte: Ferreira e Mendes (2007, p. 77-83) A fim de facilitar a análise dos resultados da Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT), Ferreira e Mendes (2007) criaram uma classificação a partir das médias das respostas aos fatores. Considerando que todos os itens possuiam conotação negativa, indicaram como resultado para o contexto de trabalho, a seguinte classificação: acima de 3,7 = avaliação mais negativa, grave; entre 2,3 e 3,69 = avaliação mais moderada, crítico; e abaixo de 2,29 = avaliação mais positiva, satisfatório (FERREIRA; MENDES, 2007). A segunda escala escolhida foi a Escala de Indicadores de Prazer e Sofrimento (EIPST) e teve quatro versões anteriores, publicadas nos estudos de Mendes (1999), Pereira (2003), Resende (2004), Silva (2004) e Vieira (2005), além de Ferreira e Mendes (2003) e Mendes et al. (2005). De acordo com Ferreira e Mendes (2007), esse percurso permitiu concluir a consistência psicométrica da escala, pois a estrutura fatorial se manteve constante em todas as versões. Haja vista que Pereira (2003) utilizou uma escala com frases mais completas e elaboradas, optou-se pela versão utilizada por esta autora. A Escala de Indicadores de Prazer e Sofrimento (EIPST) é composta por 30 itens, agrupados nos fatores constantes do Quadro 8, a serem respondidos em um escala “Likert” que vai de 1 (nunca) a 5 (sempre). Os itens refletem os sentimentos de prazer e sofrimento vivenciados no contexto de trabalho, como se segue: FATORES 1 - Gratificação – 8 itens, alfa = 0,89 • • • • Sentimentos de satisfação, realização, • orgulho identificação com um trabalho • que atende às aspirações profissionais. 2 - Liberdade – 7 itens, alfa = 0,82 • • • • Sentimentos de estar livre para pensar, organizar e falar sobre o trabalho, • originado no reconhecimento das chefias e colegas, do modo particular de • trabalhar. • • • ITENS Sinto satisfação em executar minhas tarefas. Meu trabalho é gratificante. Quando executo minhas tarefas, realizo-me profissionalmente. Sinto orgulho do trabalho que realizo. Sinto-me identificado com as tarefas que realizo. Meu trabalho é compatível com as minhas aspirações profissionais. Sinto disposição mental para realizar minhas tarefas. O tipo de trabalho que faço é admirado pelos outros. Tenho liberdade para dizer o que penso sobre meu trabalho. Sinto o reconhecimento da minha chefia pelo trabalho que realizo. Tenho espaço para discutir com os colegas as dificuldades com o trabalho. Sinto-me reconhecido pelos colegas pelo trabalho que realizo. Tenho liberdade para organizar meu trabalho da forma que quero. Sinto meus colegas solidários comigo. No meu trabalho posso usar o meu estilo pessoal. 90 • • Sentimentos de receio de perder o • emprego, por não conseguir atender às • expectativas relacionadas competência profissional, às exigências de • produtividade e às pressões do trabalho. 3. Insegurança – 7 itens, alfa = 0,80 Tenho receio de ser demitido ao cometer erros. Sinto-me ameaçado de demissão. Sinto-me inseguro diante da ameaça de perder meu emprego. Sinto-me inseguro quando não atendo ao ritmo imposto pela minha empresa. Sinto-me inseguro quando não correspondo às expectativas da empresa em relação ao meu trabalho. • Receio não ser capaz de executar minhas tarefas no prazo estipulado pela minha empresa. • Sinto-me pressionado no meu trabalho. 4 - Desgaste – 8 itens, alfa = 0,86 • Meu trabalho é desgastante. • Meu trabalho me causa estresse. Sentimentos de que o trabalho causa • Sinto-me sobrecarregado no meu trabalho. estresse, sobrecarga, tensão emocional, • Meu trabalho me causa tensão emocional. cansaço, ansiedade, desânimo e • Meu trabalho é cansativo. frustração. • Meu trabalho me causa ansiedade. • Sinto desânimo no trabalho. • Sinto frustração no meu trabalho. Quadro 8: Descrição da estrutura fatorial da Escala de Indicadores de Prazer-Sofrimento no Trabalho (EIPST), desenvolvida por Mendes (1999) e validada por Pereira (2003). Fonte: Pereira (2003, p.92-93). Para os fatores de prazer, a análise deve considerar que os itens têm conotação positiva, com a seguinte classificação criada por Ferreira e Mendes (2007): acima de 4,0 = avaliação mais positiva, satisfatório; entre 3,9 e 2,1 = avaliação moderada, crítico; abaixo de 2,0 = avaliação para raramente, grave. Para os fatores do sofrimento, considerando que os itens são negativos, para os autores a análise deve ser feita com base na seguinte classificação: acima de 4,0 = avaliação mais negativa, grave; entre 3,9 e 2,1 = avaliação moderada, crítico; abaixo de 2,0 = avaliação menos negativa, satisfatório (FERREIRA; MENDES, 2007). 3.4.2 Entrevistas individuais abertas semi-estruturadas Para Ferreira e Mendes (2007, p.85), com a utilização de instrumentos quantitativos "ganha-se em generalidade e perdem-se especificidades; identifica-se o visível, mas não se sabe o que está por trás dele; obtém-se a objetivação e não se apreende o processo de subjetivação mais completo". Neste sentido, os autores corroboram que "deve ser preservado o seu papel limitado e interdependente, obrigando o pesquisador, por exemplo, a usar de entrevistas e observações para complementar e possibilitar a apreensão mais completa do objeto de estudo da Ergonomia da Atividade e da Psicodinâmica do Trabalho" (FERREIRA; MENDES, 2007, p. 85). 91 Também para Gaskell (2002) e Zanelli (2002), a entrevista desempenha um papel essencial quando combinada com outros métodos de pesquisa. Para os autores, a premissa fundamental da entrevista é a compreensão dos mundos, das vidas dos sujeitos e dos grupos por meio da exploração de opiniões e das diversas representações que os entrevistados têm do tema pesquisado. Posto isto, visando ampliar o olhar sobre o objeto de estudo e melhor esclarecer os dados quantitativos, captar as nuanças da percepção dos entrevistados para ampliar a compreensão da realidade vivida pelos respondentes, bem como aprofundar a questão de como os empregados percebem o contexto de trabalho e a relação deste com as vivências de prazer e sofrimento nas carreiras de pesquisa e de suporte à pesquisa na Embrapa, optou-se também pela utilização do método qualitativo, utilizando-se com meio de coleta de dados, a técnica de entrevistas individuais abertas semi-estruturadas. As entrevistas tomaram por base o seguinte roteiro: 1 - Eu gostaria que você me falasse um pouco da sua rotina de trabalho. Como é um dia de trabalho seu, desde a hora que você entra até a hora que você sai da empresa? 2 – E as condições de trabalho que você tem na empresa? Como é isso pra você? Como você percebe as condições em termo de ambiente, equipamentos, material? 3 – Como você percebe as relações socioprofissionais no ambiente de trabalho? 4 – Você gostaria de falar mais alguma coisa? Complementar alguma coisa? O roteiro, flexível, teve por objetivo investigar a percepção dos entrevistados, de duas carreiras distintas, sobre o contexto de trabalho e a influência que este exerce nas vivências de prazer e sofrimento, além de buscar identificar estratégias de mediação individual e coletiva. A partir das especificidades dos comentários dos entrevistados, foram ainda elaboradas questões sobre os sentimentos dos empregados em relação a alguns conteúdos relatados e, quando necessário, outras questões livres, decorrentes de reflexões, esclarecimentos ou aprofundamento de determinados comentários foram utilizadas. Assim, realizou-se inserções e estímulos, por meio de outros questionamentos, na medida em que era necessário investigar ou esclarecer mais algum aspecto relatado. 92 3.5 Procedimentos de coleta dos dados 3.5.1 Questionários O questionário foi alocado na Intranet da empresa por meio de um software eletrônico, o Academic Survey Sistem and Evaluetion Tool (ASSET). Este software permite que os dados sejam transmitidos diretamente ao banco de dados da empresa e podem ser transportados, após a finalização do processo, para o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS). Para os 1.214 empregados constantes da população foram enviados e-mails individuais, com um texto explicativo que identificava a pesquisadora, apresentava os objetivos do estudo, solicitava a participação na pesquisa, explicava ao respondente como utilizar o software e preencher o questionário e definia um prazo de encerramento da atividade. Foi reforçada a questão de que os dados seriam analisados de modo agrupado, a fim de preservar a confiança e fidedignidade das respostas dos pesquisados. Os e-mails foram enviados no dia 14.09.2006 tendo sido estipulado um prazo para o retorno das respostas até o dia 30.09.2006. Após este período, como a quantidade de respostas foi considerada pequena, apenas 16% da população, o prazo foi estendido até o dia 06.10.2006, quando se obteve um total de 245 questionários completos (20,18% da população). Vale ressaltar ainda que, ao configurar-se o questionário em ambiente de intranet, se fez a opção de que fossem enviados ao banco de dados, somente questionários totalmente preenchidos, ou seja, ao deixar alguma questão em branco, o sistema informava ao respondente que o questionário não estava completo e que não seria possível aproveitá-lo. O ASSET permite o monitoramento da pesquisa em relação ao número de respondentes que finalizaram ou não o questionário. Haja vista a opção feita de salvar no banco de dados somente os questionários totalmente preenchidos, obteve-se como vantagem, um banco de dados sem casos faltosos (missings), o que facilitou, posteriormente, o procedimento estatístico. Por outro lado, houve 39 respondentes que não finalizaram o questionário e, portanto, não tiveram seus dados computados, o que acarretou a perda de 1,5% de empregados que se dispuseram a responder a pesquisa. 93 3.5.2 Entrevistas As entrevistas individuais foram realizadas no período de 07.11.2006 até 22.11.2006, no próprio local de trabalho, em um espaço reservado, durando cerca de uma hora cada. Foram realizadas, em média, de uma a duas entrevistas diárias, em um total de 11, conduzidas pela própria pesquisadora. Inicialmente, foi solicitado ao participante permissão para a gravação da entrevista, de modo que as respostas fossem posteriormente transcritas e analisadas. Foi ainda relatado aos entrevistados o motivo da entrevista (vinculação ao programa de pós-graduação), a importância da colaboração deles no processo, o objetivo da pesquisa, como seria o procedimento da entrevista (que seriam realizadas questões sobre o objetivo do estudo), além da garantia do sigilo dos dados obtidos. Inicialmente foram previstas apenas dez entrevistas, cinco com empregados da carreira de suporte à pesquisa e cinco com empregados da carreira de pesquisa, entretanto, optou-se por realizar uma primeira entrevista piloto para reavaliação e reajuste de procedimentos antes da finalização da coleta dos dados. Vale ressaltar que os dados coletados nesta primeira entrevista, também foram considerados para a análise final. 3.6 Análise dos Dados 3.6.1 Questionários Os dados obtidos com a aplicação das escalas foram analisados por meio do aplicativo Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 14.0 para Windows. Os dados foram submetidos a análises estatísticas descritivas: distribuições de freqüências, cálculos de médias e desvios-padrão, e inferenciais: teste "t" de Student, correlações de Pearson e análise de variância multivariada (MANOVA), seguida pela Análise de variância univariada (ANOVA). As estatísticas descritivas (freqüências, média e desvio padrão) visaram caracterizar os participantes da pesquisa (dados demográficos), bem como analisar dados referentes às respostas às escalas de EACT e EIPST. As estatísticas inferenciais (testes T, correlações de Pearson e Manova) tiveram por fim, verificar a existência de relações entre as variáveis dependentes (escalas EACT e EIPST), as variáveis independentes (carreira de pesquisa e de suporte à pesquisa) e as variáveis 94 demográficas (sexo, unidades, tempo de empresa, cargos de chefia), posto que, as decisões destes cálculos estatísticos específicos foram as que melhor resultado forneceram ao objetivo da pesquisa. Para Hair Jr. et al. (2005), o teste "t" de Student compara igualdades e diferenças entre as médias de dois grupos independentes. As variâncias dos dois grupos podem ser iguais ou diferentes, havendo alternativas de teste para as duas situações. Esta estatística permitiu comparar e analisar as médias dos fatores de contexto de trabalho e dos de prazer-sofrimento e entre as variáveis demográficas e as duas carreiras, visando à identificação de diferenças entre os fatores. Segundo Tabachnick e Fidell (1996), o Coeficiente de Correlação Linear de Pearson mede a relação entre duas variáveis contínuas em termos de direção (positiva ou negativa) e magnitude (-1≤ r ≤ +1). O valor 0 (zero) significa que não há relação linear, o valor 1 indica uma relação linear perfeita e o valor -1 também indica uma relação linear perfeita, mas inversa, ou seja, quando uma das variáveis aumenta a outra diminui. Quanto mais próximo estiver de 1 ou -1, mais forte é a relação linear entre as duas variáveis. Logo, o coeficiente de correlação tem ênfase na predição do grau de dependência entre duas variáveis. Esta análise propiciou a avaliação do grau de relacionamento linear entre as variáveis dependentes (escalas EACT e EIPST), a independente (carreiras) e as variáveis demográficas contínuas (idade; nº. de filhos, tempo na organização e tempo no atual cargo). De acordo com Hair Jr. et al. (2005, p. 271), a MANOVA “é uma técnica que mede as diferenças para duas ou mais variáveis métricas, com base em um conjunto de variáveis categóricas (não-métricas), que atuam como variáveis independentes”. Essa técnica presta-se para analisar, estatisticamente, diferenças entre grupos, daí a opção pelo emprego da MANOVA, pois permitiu identificar se haviam diferenças significativas nas médias de respostas dos dois grupos: pesquisadores e profissionais que atuam em suporte à pesquisa (variável independente) em relação aos fatores das escalas (variáveis dependentes). Na busca de esclarecer as análises realizadas, a Figura 6, abaixo, retrata as relações entre as variáveis investigadas. 95 Contexto de Trabalho Prazer e Sofrimento Organização, condições e relações sociais de trabalho. Gratificação, liberdade, desgaste e insegurança Carreira de pesquisa Carreira de suporte à pesquisa Variáveis Variáveis demográficas demográficas Figura 6: Relação entre variáveis pertinentes ao objeto de estudo da pesquisa 3.6.2 Entrevistas As entrevistas, depois de transcritas, foram analisadas por meio da técnica de análise dos núcleos de sentido (ANS), elaborada por Mendes (1994) e inspirada e adaptada da técnica de análise de conteúdo categorial, desenvolvida por Laurence Bardin em 1970. A análise de conteúdo categorial caracteriza-se pelo exame das falas dos respondentes visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, sentidos e compreensões que permitam a análise inferencial da fala do entrevistado. Buscam-se confirmações ou contradições da maneira como as atitudes e opiniões se desenvolvem nas entrevistas e de clássicas racionalizações (BARDIN, 2004; GASKELL, 2002). Gaskell (2002, p. 85) considera que o objetivo desse tipo de análise é: [...] procurar sentidos e compreensão. O que é realmente falado constitui os dados, mas a análise deve ir além da aceitação deste valor aparente. A procura é por temas com conteúdo comum e pelas funções destes temas. Algumas perspectivas teóricas falam de representações centrais e periféricas, sendo as primeiras aquelas que estão disseminadas dentro de um meio social. Mendes (2007, p.40) indica que em Psicodinâmica " interessa saber como ter acesso ao invisível, como apreender a prática do trabalho, o trabalho vivo, a mobilização para o fazer, o engajamento da inteligência, do saber fazer e da subjetividade", ou seja, na análise, os pesquisadores devem ser capazes de revelar o trabalho na sua complexidade, desvelando mediações, contradições e intersubjetividade. O conceito de Análise de Núcleo de Sentido (ANS), para Mendes (2007, p.45): 96 Consiste no desmembramento do texto em unidades, em núcleos de sentido formados a partir da investigação dos temas sobressalentes do discurso. É uma técnica de análise de textos produzidos pela comunicação oral e/ou escrita. É aplicada por meio de procedimentos sistemáticos, que envolvem definição de critérios para análise. Tem a finalidade de agrupar o conteúdo latente e manifesto do texto, com base em temas constitutivos de um núcleo de sentido, em definições que dêem maior suporte às interpretações. A autora recomenda que, após leitura geral de cada entrevista e marcação das falas que representam os temas, estes sejam classificados e agrupados em núcleos de sentido e posteriormente categorizados pelo critério de semelhança de significado semântico, lógico e psicológico. Mendes (2007, p.46) afirma que " o status de núcleo de sentido é dado pela força dos temas, que ao serem recorrentes criam uma consistência em torno daquele núcleo." Destaca ainda que " a nomeação e a definição dos núcleos de sentido é um dos passos mais difíceis da análise, e ao mesmo tempo, o essencial para se dizer que a técnica foi aplicada" (MENDES, 2007, p.46). Para se obter a validade dos conteúdos agrupados nas categorias, dois juizes, estudantes de pós-graduação, em nível de doutorado, do Curso de Psicologia da Universidade de Brasília, partindo de uma análise indutiva, realizaram leitura flutuante de cada entrevista transcrita e, após, procederam à identificação de temas. A seguir, estes temas foram agrupados em categorias, em quadros matriciais, pelos pressupostos utilizados por Bardin (2004), onde são obedecidas às regras de exclusão mútua – cada elemento só pode existir em uma categoria; homogeneidade – para definir uma categoria, é preciso haver só uma dimensão na análise e se existirem diferentes níveis de análise, eles devem ser separados em diferentes categorias; pertinência – as categorias devem dizer respeito às intenções do investigador, aos objetivos da pesquisa às questões norteadoras, às características da mensagem, etc.; objetividade e fidelidade – se as categorias forem bem definidas, se os índices e indicadores que determinam à entrada de um elemento numa categoria forem bem claros, não haverá distorções devido à subjetividade dos analistas; produtividade – as categorias serão produtivas se os resultados forem férteis em inferências, em hipóteses novas, em dados exatos. Foram seguidos também os pressupostos de semelhança de significado e núcleo de sentido, indicados por Mendes (2007). 97 Tendo sido elaboradas as categorias sínteses, passou-se à fase de construção da definição de cada categoria, fundamentadas nas verbalizações relativas aos temas, ambos registrados nos quadros matriciais. Os títulos e as definições das categorias, foram estabelecidos tomando-se por base as falas dos entrevistados, seguindo sugestão de Mendes (2007, p.46) que propõe que "o nome e a definição devem ser sempre criados com base nos conteúdos verbalizados e com um certo refinamento gramatical de forma. Às vezes, o nome da categoria é uma fala do sujeito". Em todo o processo de construção de categorias, pela análise indutiva, procurou-se preservar na íntegra a fala do entrevistado. A partir da análise das categorias, almejou-se identificar a existência de semelhanças e diferenças de percepções entre empregados de carreiras distintas, sobre a influência do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento. Foram identificadas dez categorias, sendo cinco para o pessoal da carreira de suporte à pesquisa e cinco para o pessoal da carreira de pesquisa. Os dados encontrados nas análises dos questionários e das entrevistas, apresentados e analisados separadamente em um primeiro momento e depois comparados, compõem o próximo capítulo. 98 4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS Para atender ao objetivo de verificar se existiam diferenças na percepção das pessoas com duas carreiras de uma mesma organização sobre a influência do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento, foram adotados dois tipos de técnicas de coleta de dados, primeiramente quantitativas e em seguida qualitativas, apresentadas nesta ordem. 4.1 Resultados dos dados dos questionários Para atender ao objetivo proposto, os dados foram submetidos a análises estatísticas descritivas e inferenciais como: distribuições de freqüências, cálculos de médias e desviospadrão, teste “t” de Student, correlações e análise de variância multivariada (MANOVA). 4.1.1 Resultados das análises estatísticas descritivas As estatísticas descritivas (freqüência, média e desvio padrão) visaram à caracterização dos participantes da pesquisa (dados demográficos), coletados na última etapa do questionário (Anexo B) bem como a análise de alguns dados referentes às respostas dadas às escalas de EACT e EIPST. A amostra desta pesquisa foi composta por empregados da Embrapa – DF (N=245) das carreiras de pesquisa (N= 77) e de suporte à pesquisa (N=168), representando 31,4% e 68,6% da população, respectivamente. Os dados foram coletados nas Unidades Centrais (N= 116; 47,3 %) e nas descentralizadas (N= 129; 52,7%) da empresa. A amostra foi composta por empregados do gênero masculino (47,3%) e feminino (52,7%). Grande parte dos respondentes era casada (58%) e possuía entre 2 e 3 filhos, sendo que 3,7% encontravam-se na faixa de 19 a 26 anos e 28,2% acima de 51 anos, ou seja, 67,1% encontravam-se na faixa etária que compreendia as idades entre 35 e mais de 51 anos, conforme o Gráfico 1: 99 Gráfico 1: Faixa etária da amostra Em relação aos cargos de chefia, 153 representantes não possuíam cargo de chefia (62,4%) e 92 exerciam algum cargo de chefia (37,6%). Pôde-se perceber um alto grau de escolaridade na amostra, sendo 3,7% com ensino superior incompleto e 26,9% com doutorado, ou seja, 62,8% já possuem algum tipo de pós-graduação, como mostra o Gráfico 2: Gráfico 2: Grau de escolaridade Quanto ao tempo de empresa, os resultados com maiores freqüências estavam entre 01 e 05 anos (N = 81; 33,1%) e com mais de 26 anos de empresa (N = 76; 31%), apresentando 100 média de 3,46 e desvio padrão de 2,11. O alto desvio padrão encontrado justifica-se, haja vista a ocorrência de contratações recentes, à época, após um grande período com ausência de concurso público para a contratação de pessoal na organização, o que localizou os valores nos extremos (Ver Tabela 1). Os dados sobre o tempo de permanência no cargo, ou seja, de ascensão na carreira, mostraram média de 3,01 e desvio padrão de 1,89. O alto desvio padrão justificava-se pelo fato de que a maioria dos respondentes (35,1%) encontrava-se na faixa de 01 a 05 anos de tempo de empresa, ou seja, eram ainda recentes na instituição. Os resultados relativos ao tempo de empresa e tempo no cargo dos participantes da pesquisa constam da Tabela 1: Tabela 1: Caracterização da amostra quanto ao tempo de empresa e tempo no cargo Tempo de Empresa de 01 a 05 anos de 06 a 10 anos de 11 a 15 anos de 16 a 20 anos de 21 a 25 anos mais de 26 anos Tempo no Cargo de 01 a 05 anos de 06 a 10 anos de 11 a 15 anos de 16 a 20 anos de 21 a 25 anos mais de 26 anos Freqüência Percentual Média Desvio padrão 81 24 10 37 17 76 33,1 9,8 4,1 15,1 6,9 31,0 3,46 2,11 Freqüência Percentual Média Desvio padrão 86 32 23 42 22 40 35,1 13,1 9,4 17,1 9,0 16,3 3,01 1,89 Para a análise dos resultados relativos à média das respostas aos fatores das escalas EACT e EIPST, conforme apresentados nas Tabelas 2 e 3, vale a pena ressaltar que em ambas, as opções de respostas eram “Nunca” = 1, “Raramente” = 2, “Às vezes” = 3, “Frequentemente” = 4 e “Sempre” = 5. Na escala de EACT, todos os 33 itens têm uma conotação negativa, assim, o “nunca” corresponde à ausência da condição pesquisada e o “sempre”, à forte presença da condição pesquisada. Analisando-se a média dos fatores de contexto de trabalho, (ver Tabela 2), verificou-se que em relação aos fatores - Condições de Trabalho e Relações Sociais –– a maioria dos respondentes situava-se entre “raramente” e “às vezes” e em relação ao fator –– Organização do Trabalho – a média encontrava-se entre “às vezes” e “freqüentemente”. 101 Tabela 2: Média e desvio padrão dos fatores de contexto do trabalho. Variáveis Organização do trabalho Média 3,30 Desvio Padrão 0,53 Relações Sociais 2,83 0,67 Condições de trabalho 2,52 0,80 Nesta análise, os resultados indicaram que "raramente" ou apenas "às vezes" as condições de trabalho e as relações sociais interferem de modo negativo no contexto de trabalho, já quanto à organização do trabalho, que avalia itens como representações sobre a divisão do trabalho, normas, tempo e controle exigidos para o desempenho das tarefas, o resultado situou-se entre "às vezes" e “frequentemente”. Na escala EIPST os fatores gratificação e liberdade têm conotação positiva e os fatores desgaste e insegurança têm conotação negativa, portanto, a análise geral da escala foi realizada observando-se em primeiro lugar os escores dados aos indicadores de prazer e posteriormente aos indicadores de sofrimento. Foram analisadas as médias dos fatores da escala de prazer e sofrimento, constantes da Tabela 3, e verificou-se que em relação aos fatores – Gratificação e Liberdade –– específicos da vivência de prazer, no fator gratificação, foi observado que a média das respostas situou-se em 4 (freqüentemente) e a média do fator liberdade situou-se entre os escores de 3 ( às vezes) e 4 (freqüentemente). Já quando se observaram os fatores - Insegurança e Desgaste indicadores da escala de sofrimento, com relação ao fator insegurança, a média das respostas situou-se no valor 2 (raramente) e quanto ao fator desgaste, percebeu-se que as respostas dos sujeitos estabeleceram um limite que variou de 2 a 3 (raramente e às vezes), com maior predomínio do valor 3. Tabela 3: Média e desvio padrão dos fatores das vivências de prazer e sofrimento. Variáveis Média Desvio Padrão Gratificação 4,0 0,67 Liberdade 3,5 0,65 Desgaste 2,74 0,76 Insegurança 2,3 0,74 102 Nesta análise, os resultados indicaram que as vivências de prazer, nos fatores gratificação e liberdade foram preponderantes em relação às vivências de sofrimento, nos fatores insegurança e desgaste. Foram também analisadas as médias e desvios padrões para cada fator em relação às carreiras, visando à caracterização dos fatores de prazer e sofrimento em cada um dos grupos, como apresentadas na Tabela 4. Tabela 4: Média e Desvio-Padrão dos fatores em cada carreira Fatores/ Carreiras Condições Relações Organização de sociais do trabalho trabalho M=2,43 M=2,76 M=3,24 Gratificação Liberdade Insegurança Desgaste DP=0,81 M=3,79 M=3,48 M=2,03 M=2,72 DP=0,67 DP=0,53 DP=0,69 DP=0,67 DP=0,78 DP=0,76 M=2,69 M=2,97 DP=0,74 DP=0,63 M=2,51 M=2,83 Total DP=0,80 DP=0,66 Suporte à Pesquisa: N = 168 Pesquisa: N = 77 Total: N = 245 M=3,39 DP=0,50 M=3,29 DP=0,53 M=4,17 DP=0,49 M=3,91 DP=0,66 M=3,58 DP=0,57 M=3,51 DP=0,65 M=2,02 DP=0,66 M=2,03 DP=0,74 M=2,79 DP=0,74 M=2,74 DP=0,75 Suporte à pesquisa Pesquisa dores Observando-se as médias dos fatores analisadas por grupo de carreiras, mostrou-se relevante apenas o fator gratificação com M= 3,79; DP = 0,69 para suporte e M= 4,17; DP=0,49 para pesquisa. Os resultados indicaram que os pesquisadores sentem mais gratificação no trabalho do que as pessoas da carreira de suporte à pesquisa. Diante dos resultados descritivos preliminares, ainda em detrimento das demais análises, percebeu-se a predominância, entre os respondentes, das vivências de prazer (reconhecimento e gratificação) e um posicionamento, de modo geral, moderado em relação ao contexto de trabalho. 4.1.2 Resultados das análises estatísticas inferenciais Nesta seção foram apresentados, sucessivamente, os resultados encontrados nas análises estatísticas inferenciais. O teste “t” de Student teve por objetivo testar a igualdade entre as médias dos fatores das escalas investigadas e as variáveis demográficas (sexo, unidades, tempo de empresa, cargos de chefia), bem como entre as carreiras de pesquisa e suporte à pesquisa. 103 Foram também calculadas correlações de Pearson, a fim de verificar a existência de relações lineares entre as variáveis contínuas dependentes (escalas EACT e EIPST), a independente (carreiras) e as variáveis demográficas (idade; nº. de filhos, tempo na organização e tempo no atual cargo). Para analisar a existência de diferenças significativas entre mais de uma variável dependente (os fatores das escalas EACT e EIPST) e a variável independente (os dois grupos pesquisados - Pesquisa e Suporte à pesquisa), foi realizada a análise de variância multivariada (MANOVA), que se presta para verificar, estatisticamente, diferenças entre variáveis em grupos distintos. 4.1.2.1 Avaliação dos pressupostos dos testes estatísticos Os dados obtidos por intermédio dos questionários foram inicialmente submetidos a análises estatísticas descritivas e de cunho exploratório, conforme recomendam Tabachnick e Fidell (1996), objetivando avaliar a correção do arquivo de dados, as variáveis com distribuição não normal, bem como localizar dados extremos (outliers). Haja vista o procedimento metodológico adotado, não havia casos faltosos (missings), nos dados provenientes dos 245 sujeitos constantes da amostra. Foram localizados nove dados extremos (outliers) univariados nos fatores, condições de trabalho (1 caso; pesquisador); relações sociais (5 casos; 2 suporte e 3 pesquisa) e organização do trabalho (3 casos; 2 suporte e 1 pesquisa) da escala EACT e treze outliers univariados nos fatores liberdade (3 casos, 2 suporte e 1 pesquisa); insegurança (6 casos, 4 suporte e 2 pesquisa), demonstrado no Gráfico 3, e desgaste (5 casos, 4 suporte e 1 pesquisa), sendo que não foram encontrados outlliers no fator gratificação da escala EIPST. No entanto, como nem a recodificação para o valor mais próximo da média nem a eliminação dos casos produziu resultados satisfatórios nas análises subseqüentes, optou-se por mantê-los. 104 Gráfico 3: Outliers do fator insegurança De acordo com Hair Jr. et al. (2005), os pressupostos requeridos para o teste “t” são: a homogeneidade, avaliada por meio do teste de Levene, cujo resultado apontou para a igualdade de variâncias em todos os fatores e a normalidade, verificada por meio do teste de Lilliefors, encontrando-se uma distribuição normal, ainda que com alguns outliers. Vale lembrar que o pressuposto de independência entre os grupos é automático, pois são grupos vindos de populações mutuamente excludentes (sexo – masculino/feminino; unidades – centrais/descentralizadas; tempo de empresa – entre um e cinco anos/ vinte e um e vinte e cinco anos, cargos de chefia – possui/não possui). Para a correlação bivariada, os pressupostos requeridos são de que as variáveis devem ser contínuas, caso das variáveis analisadas (TABACHNICK; FIDELL, 1996). A Manova exige os seguintes pressupostos: homogeneidade, atendida mediante o teste de Levene; normalidade, confirmada por meio do teste de Lilliefors e linearidade, observada por meio do coeficiente de correlação de Pearson, onde o nível de significância encontrado para todas as variáveis foi de p≤ 0,0001, a exceção da variável gratificação em relação a variável condições de trabalho (p≤ 0,29), entretanto observou-se que ela apresentou distribuição com pequena assimetria e/ou curtose (r= - 0,06), o que não interferiu na análise global (HAIR Jr. et al., 2005). Após a MANOVA, foi realizada a analise de variância univariada (ANOVA) com vistas a identificar a variável com melhor valor explicativo. 105 4.1.2.2 Resultados dos testes “t” Para testar a igualdade entre as médias dos fatores das escalas investigadas e as variáveis demográficas (sexo, unidades, tempo de empresa, cargos de chefia), bem como entre as carreiras de pesquisa e suporte à pesquisa, foi utilizado o teste “t” de Student. Em relação às carreiras de pesquisa e de suporte à pesquisa e as escalas, os pesquisadores apresentaram escores maiores na escala de contexto com os fatores agrupados (t = 2,8; p = 0,05). Para cada fator em separado, foram encontrados os seguintes escores: organização do trabalho (t= 1,9; p= 0,04), condições de trabalho (t = 2,3; p = 0,02) e relações sociais (t = 2,2; p = 0,02) e também nos fatores constituintes da escala de prazer (t= 3,2; p= 0,001), sendo encontrados resultados significativos apenas no fator gratificação (t = 4,3; p =0,001). Não foram encontrados escores significativos nos fatores constituintes da escala de sofrimento. Estes resultados indicam que o pessoal da carreira de pesquisa percebeu mais negativamente o contexto de trabalho do que o pessoal da carreira de suporte à pesquisa, mas em contrapartida vivenciou mais sentimentos de gratificação do que o pessoal da carreira de suporte. Em relação às variáveis demográficas, os dados mostraram que o sexo feminino indicou ter menos liberdade do que o sexo masculino (t = 2,4; p= 0,01) e as unidades descentralizadas perceberam mais negativamente o contexto de trabalho do que as unidades centrais nos fatores organização do trabalho (t= 2,8; p= 0,005), condições de trabalho (t = 5,0; p = 0,0001) e relações sociais (t = 4,5; p = 0,0001). Foram ainda relevantes, os fatores gratificação (t= 2,3; p= 0,02), insegurança (t= 2,1; p= 0,03) e desgaste (t= 1,9; p= 0,5) para as unidades descentralizadas, o que se inferiu que, embora as unidades descentralizadas apresentassem maior gratificação, possuíam também maior insegurança e desgaste. Não foram encontrados escores significativos quanto ao contexto de trabalho ao se comparar empregados com tempo de empresa entre um e cinco anos e entre vinte e um e vinte e cinco anos (valores extremos da escala), entretanto, estes foram significativos nos fatores gratificação (t= 2,8; p= 0,05), liberdade (t= 2,6; p= 0,09) e insegurança (t= 3,8; p= 0,0001), o que mostrou que os empregados mais antigos na empresa possuíam uma visão mais positiva quanto à vivência de prazer do que os empregados mais recentes, além de menor insegurança. Quando foram comparados os escores da percepção de empregados com e sem cargo de chefia, foram encontradas diferenças de médias nos fatores organização do trabalho (t= 2,1; p= 0,04) e gratificação (t= 4,4; p= 0,0001), que indicaram que os empregados com cargo de chefia possuíam melhor percepção sobre os indicadores de organização do trabalho como 106 representações sobre a divisão do trabalho, normas, tempo e controle exigidos para o desempenho das tarefas. 4.1.2.3. Resultados das Correlações bivariadas Para mensurar o grau de relação linear das variáveis dependentes entre si (condições de trabalho, relações sociais, organização do trabalho, gratificação, liberdade, insegurança e desgaste) e entre a variável independente (carreira de suporte à pesquisa e carreira de pesquisa), bem como das variáveis dependentes e os dados demográficos (idade, tempo de empresa e tempo no cargo), foram calculadas correlações bivariadas de Person. Inicialmente foram mensuradas as correlações entre os fatores das escalas EACT e EIPST. Foram observadas correlações significativas positivas entre o fator condições de trabalho e os seguintes fatores: relações sociais (r = 0,50; p ≤ 0,0001), organização do trabalho (r = 0,37; p ≤ 0,0001), insegurança (r = 0,34; p ≤ 0,0001) e desgaste (r = 0,43; p ≤ 0,0001). Não foi encontrada correlação linear significativa entre o fator condições de trabalho e gratificação, mas entre o fator condições de trabalho e liberdade (r = - 0,30; p ≤ 0,0001), foi encontrada correlação negativa. O fator relações sociais de trabalho apresentou correlações positivas entre os fatores organização do trabalho (r = 0,43; p ≤ 0,0001), insegurança (r = 0,36; p ≤ 0,0001) e desgaste (r = 0,46; p ≤ 0,0001) e correlações negativas entre os fatores gratificação (r = - 0,20; p ≤ 0,002) e liberdade (r = - 0,57; p ≤ 0,0001). Em relação ao fator organização do trabalho, os dados mostraram correlações lineares positivas entre os fatores gratificação (r = 0,13; p ≤ 0,043), insegurança (r = 0,44; p ≤ 0,0001) e desgaste (r = 0,54; p ≤ 0,0001) e correlação negativa entre o fator liberdade (r = 0,2; p ≤ 0,002). O fator gratificação mostrou correlação positiva entre o fator liberdade (r = 0,51; p≤0,0001) e correlações negativas entre os fatores insegurança (r = - 0,17; p ≤ 0,008) e desgaste (r = - 0,26; p ≤ 0,0001). Já o fator liberdade apresentou correlações negativas entre os fatores insegurança (r = - 0,49; p ≤ 0,0001 e desgaste (r = - 0,40;p ≤ 0,0001). Finalmente, o fator insegurança apresentou relação linear positiva entre o fator desgaste (r= 0,52; p ≤ 0,0001). Os resultados mostraram que a maior parte dos fatores da escala do contexto de 107 trabalho exercem influência significativa nas vivências de prazer e sofrimento da população estudada, a exceção da correlação entre os fatores condições de trabalho e gratificação (r = 0,06; p≤0,29). Vale lembrar que a escala EACT apresenta conotação negativa em todos os itens, bem como os fatores de insegurança e desgaste na escala de EIPST. Assim os dados mostraram que frente a um contexto de trabalho insatisfatório, diminui o sentimento de liberdade e aumentam os sentimentos de insegurança e desgaste. A vivência de gratificação se mostrou diretamente influenciada pelo contexto de trabalho, especificamente no fator condições de trabalho, entretanto, apresentou correlação significativa para os fatores relações sociais e organização do trabalho. Isso permitiu afirmar que há correlação entre os fatores analisados, indicando que as variáveis se influenciam umas as outras, ou seja, conquanto essas observações sejam verdadeiras, tornou-se evidente que todas as variáveis de contexto de trabalho investigadas, influenciam as vivências de prazer e sofrimento, pois apresentaram correlações significativas. Foram também realizadas correlações bivariadas para melhor detalhamento da influência dos fatores investigados nas escalas entre as carreiras de suporte à pesquisa e pesquisa. Os resultados encontrados foram mostrados na Tabela 5, abaixo. Tabela 5: Correlação entre os fatores das escalas e as duas carreiras estudadas Condições Trabalho X Cargos r = 0,15* de Organização Trabalho X Cargos r = 0,12* p ≤ 0,019 p ≤ 0,048 do Gratificação X Cargos r = 0,27** p ≤ 0,0001 N = 245; *p≤ 0, 5; ** p≤ 0,05. Os resultados indicaram não haver correlação entre as duas carreiras e os fatores liberdade, desgaste e insegurança, constantes da escala EIPST. As demais correlações mostraram que existem relações lineares positivas entre as duas carreiras e os fatores condições de trabalho, organização do trabalho e gratificação, ou seja, as condições de trabalho e a organização do trabalho foram percebidas como insatisfatórias, o que não interferiu diretamente nos sentimentos de gratificação para ambas as carreiras. Finalmente, foi verificado também, se existiam relações entre os fatores das duas escalas e as variáveis demográficas: idade, tempo de empresa e tempo no cargo, demonstrados na Tabela 6. 108 Tabela 6: Correlações entre os fatores das escalas e variáveis demográficas Dados Demogr. Liberdade Gratificação Insegurança r = 0,17** p ≤ 0,005 r = 0,17* p ≤ 0,006 r = 0,16** p ≤ 0,009 r = 0,22** p ≤ 0,0001 r = 0,21** p ≤ 0,0001 r = - 0,22** p ≤ 0,0001 r = - 0,22** p ≤ 0,0001 Fatores Idade Tempo de Empresa Tempo no Cargo r = 0,22** p ≤ 0,0001 N = 245; *p≤ 0,5; ** p≤ 0,05. De modo geral, as correlações estabelecidas entre os fatores Liberdade, Gratificação e Insegurança e os dados demográficos constantes da Tabela 6, apresentaram-se com valores de moderados a baixos, entretanto foram significativos. Não foram observadas correlações significativas entre as variáveis demográficas: idade, tempo de empresa e tempo no cargo e os fatores: condições do trabalho, organização do trabalho, relações sociais e desgaste. Os resultados das correlações entre os fatores liberdade, gratificação e insegurança, da escala de prazer e sofrimento, indicaram correlações positivas significativas entre liberdade e idade, tempo de empresa e tempo no cargo. De modo similar, ocorreram correlações positivas entre o fator gratificação e estas variáveis, a exceção de tempo de empresa. Os achados revelam que quanto maior a idade e tempo no cargo possuíam os respondentes, mais estes vivenciavam sentimentos de liberdade e de gratificação. O fator insegurança revelou correlação positiva entre a idade dos respondentes, entretanto a correlação foi negativa com os dados referentes à tempo no cargo e na empresa. Haja vista que o fator insegurança tem conotação negativa, os dados mostraram que quanto maior a idade, menor o sentimento de insegurança, entretanto quanto mais tempo no cargo e na empresa os empregados possuíam, o sentimento de insegurança aumentava. 4.1.2.4. Resultados da MANOVA Para analisar a existência de diferenças significativas entre os fatores das escalas EACT e EIPST e os dois grupos a pesquisados (Pesquisa e Suporte à pesquisa), foi calculada a análise de variância multivariada (MANOVA). 109 Realizou-se primeiramente uma análise dos fatores de cada escala em separado e posteriormente, todos os fatores das duas escalas em conjunto, com o intuito de se checar se haviam diferenças de resultados. Embora estas diferenças tenham sido identificadas, de acordo com Hair et al. (2005, p. 282), "as diferenças de medidas dependentes individuais são menos importantes do que seu efeito coletivo". Assim, utilizando a variável "dois cargos" (suporte à pesquisa e pesquisa) como variável independente e as variáveis condições de trabalho, organização do trabalho e relações sociais como variáveis dependentes foi realizada uma análise de variância multivariada (MANOVA). Não foram encontradas diferenças significativas entre os dois grupos estudados em relação aos fatores da escala EACT (Wilk’s λ = 0,60; F = 8, 168; p = 0,55). Utilizando a variável "dois cargos" como variável independente e as variáveis gratificação, liberdade, desgaste e insegurança como variáveis dependentes foi realizada uma análise de variância multivariada (MANOVA). Resultados significativos foram encontrados entre os dois grupos avaliados (suporte à pesquisa e pesquisa) e as variáveis dependentes mensuradas (Wilk’s λ = 0,09; F = 10,166; p ≤ 0,0001). Procedeu-se, em seguida, à análise univariada, a fim de se verificar quais variáveis dependentes (gratificação, liberdade, desgaste e insegurança) possuía melhor valor explicativo nas diferenças observadas entre os empregados da carreira de suporte à pesquisa e os da carreira de pesquisa. Assim, foram realizadas análises de variância univariadas (ANOVA) para cada variável dependente, testes estes conduzidos pela própria MANOVA ajustados pelo método de Bonferroni e revelaram que somente o fator Gratificação (F = 18,77; p ≤ 0,0001) apresentava diferença significativa entre os grupos. Utilizando a variável "dois cargos" como variável independente e as todas as variáveis das duas escalas como variáveis dependentes (condições, organização, relações de trabalho, gratificação, liberdade, desgaste e insegurança) foi realizada uma análise de variância multivariada (MANOVA). Resultados significativos foram encontrados entre os grupos avaliados e as variáveis dependentes mensuradas (Wilk’s λ = 0,52; F = 70,9; p = 0,0001). Foram realizadas análises de variância univariadas (ANOVA) para cada variável dependente, testes estes conduzidos pela própria MANOVA, ajustados pelo método de Bonferroni, que apontaram diferenças significativas entre empregados da carreira de suporte à pesquisa e empregados da carreira de pesquisa em relação aos fatores condições de trabalho (F=5,61; p<0,02), relações sociais (F=5,10; p<0,03), organização do trabalho (F=3,94; p<0,05) e gratificação (F=18,76; p≤0,001). 110 Os dados demonstraram que há diferença significativa entre os dois grupos no que tange à percepção da influência da maioria dos fatores do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento (Wilk’s λ = 0,52; F = 70,9; p = 0,0001), à exceção dos fatores liberdade, desgaste e insegurança. 4.1.3 Síntese dos resultados quantitativos Foram sintetizados no Quadro 9 os principais resultados obtidos na análise quantitativa, considerando-se N = 245, sendo que 168 pessoas eram da carreira suporte à pesquisa e 77 pessoas da carreira de pesquisa. Vale lembrar que o objetivo da pesquisa era identificar a influência do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento na percepção de duas carreiras de uma mesma organização, a carreira de suporte à pesquisa e a carreira de pesquisa. ESTATÍSTICA Análise de média e desvio-padrão para os fatores na percepção das duas carreiras. OBJETIVOS Caracteriza ção dos participantes da pesquisa e análise de dados referentes às respostas dadas às escalas. PRINCIPAIS RESULTADOS Análise das médias e desvio padrão dos fatores Organização do trabalho: M = 3,30 DP = 0,53 Relações Sociais: DP = 0,67 M = 2,83 Condições de Trabalho: M = 2,52 DP = 0,80 Gratificação: M= 4,0 DP = 0,67 Liberdade: M= 3,5 DP = 0,65 Desgaste: M= 2,74 DP = 0,76 Insegurança: M= 2,3 DP = 0,74 Análise das médias e desvio padrão dos fatores em relação às carreiras Carrei -ra/ Fator Supor -te Pes quisa Condições Relações Organi- Gratifi- Liberda Deszação cação de gaste Insegurança M=2,43 DP=0,81 M=2,69 DP=0,74 M=2,76 DP=0,67 M=2,97 DP=0,63 M=3,24 DP=0,53 M=3,39 DP=0,50 M=2,03 DP=0,78 M=2,02 DP=0,66 M=3,79 DP=0,69 M=4,17 DP=0,49 M=3,48 DP=0,67 M=3,58 DP=0,57 M=2,72 DP=0,76 M=2,79 DP=0,74 111 ESTATÍSTICA OBJETIVOS PRINCIPAIS RESULTADOS Comparação entre as duas carreiras Escala de contexto todos os fatores: t = 2,8 p = 0,05 Escala de contexto cada fator Organização do trabalho t = 1,9 p = 0,04 Condições de trabalho t = 2,3 p = 0,02 Relações sociais Escala de prazer todos os fatores: t = 2,2 t = 3,2 p = 0,02 P = 0,001 t = 4,3 p =0,001 Escala de prazer cada fator Teste “t” Student Verificar e comparar as médias dos fatores de contexto de trabalho e dos de de prazersofrimento e entre as duas carreiras e as variáveis demográficas. Gratificação Comparação entre os fatores das escalas e as variáveis demográficas Gênero: Liberdade: mulheres t = 2,40 p = 0,010 Organização do trabalho t = 2,8 p = 0,005. Condições de trabalho t = 5,0 p = 0,0001 Relações sociais t = 4,5 p = 0,0001 Gratificação t = 2,3 p = 0,02 Insegurança t = 2,1 p = 0,03 Desgaste t = 1,9 p = 0,5 Unidades Descentralizadas: Empregados com tempo de empresa entre 01 e 05 anos e entre 21 e 25 anos: Gratificação t = 2,8 p = 0,05 Liberdade t = 2,6 p = 0,09 Insegurança t = 3,8 p = 0,0001 Organização do trabalho t = 2,1 p = 0,04 Gratificação t = 4,4 p = 0,0001 Empregados com e sem cargo de chefia: ESTATÍSTICA OBJETIVOS PRINCIPAIS RESULTADOS Correlações de Verificar a Correlação entre todos os fatores das escalas Pearson existência de CondiCondi- Relações Organi- Gratifica- Liberdacorrelações ções ções Sociais zação ção de lineares entre Relações r = 0,50 as variáveis Sociais p ≤ 0,0001 dependentes r = 0,42 (escalas EACT Organiza r = 0,37 ção p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 e EIPST), a independente e Gratifica r = - 0,06 r = - 0,20 R = 0,12 as variáveis -ção p ≤ 0,3 p ≤ 0,002 p ≤ 0,043 demográficas Liberda- r = - 0,29 r = - 0,57 r = - 0,19 r = 0,50 de p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,002 p ≤ 0,0001 Insegurança Desgaste Insegu -rança - r = 0,34 r = 0,36 r = 0,44 r = - 0,17 r = - 0,48 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,008 p ≤ 0,0001 r = 0,43 r = 0,45 r = 0,54 r = - 0,26 r = - 0,40 r = 0,52 - p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 Correlação entre os fatores das escalas e as duas carreiras Condições de Trabalho r = 0,15 p ≤ 0,019 Organização do Trabalho r = 0,12 p ≤ 0,048 112 Gratificação r = 0,26 p ≤ 0,0001 Correlações entre os fatores das escalas e variáveis demográficas Liberdade: Idade Tempo de Empresa r = 0,17 r = 0,17 p ≤ 0,005 p ≤ 0,006 Tempo no Cargo r = 0,16 p ≤ 0,009 r = 0,22 r = 0,22 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 Gratificação: Idade Tempo no Cargo Insegurança Idade Tempo de Empresa Tempo no Cargo ESTATÍSTICA OBJETIVOS Análise Variância Multivariada (MANOVA) Análise Variância Univariada (ANOVA) Analisar a existência de diferenças significativas de entre mais de uma variável dependente (os das e fatores escalas EACT e de EIPST) e a variável independente (os dois grupos a serem pesquisados Pesquisa e Suporte à pesquisa) r = 0,21 r = - 0,22 r = - 0,22 PRINCIPAIS RESULTADOS Escala EIPST: Wilk’s λ = 0,09 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 p ≤ 0,0001 F = 10,166 p ≤ 0,0001 ANOVA Gratificação F = 18,77 p = 0,0001 F = 70,9 p = 0,0001 Condições de Trabalho F = 5,61 p = 0,02 Relações de Trabalho F = 5,10 p = 0,03 Organização do Trabalho F = 3,94 p = 0,05 Gratificação F = 18,76 p ≤ 0,0001 Todos os fatores e as duas carreiras: Wilk’s λ =0,52 ANOVA Quadro 9: Principais resultados obtidos na análise quantitativa. Os principais resultados estatísticos, bem como os principais resultados qualitativos foram objeto de análise mais aprofundada no capítulo referente à discussão dos dados. 4.2 Resultados dos dados das entrevistas Os dados foram analisados por meio da técnica de Análise dos Núcleos de Sentido (ANS), técnica elaborada por Mendes (1994) e inspirada e adaptada da técnica de análise de conteúdo categorial, desenvolvida por Laurence Bardin em 1970. A utilização da técnica de ANS seguiu os pressupostos de exclusão mútua; homogeneidade; pertinência; objetividade e fidelidade e produtividade propostos por Bardin (1970), bem como os pressupostos de semelhança de significado e núcleo de sentido, propostos por Mendes (2007). 113 Optou-se por nomear os títulos e elaborar as definições das categorias, “tomando-se por base as falas dos entrevistados”, de acordo com Mendes (2007, p.46). 4.2.1 Resultados das entrevistas com o pessoal da carreira de suporte à pesquisa A análise de conteúdo das entrevistas individuais com os empregados da carreira de suporte à pesquisa, indicou um total de cinco categorias empíricas, resumidas no Quadro 10. Categorias 1S – “A gente tem que dar conta de tudo”. 2S – “As condições de trabalho não são boas". 3S – “Você sabe com quem você está falando?”. 4S – "É complicado. Tá achando que tá agradando e não está". 5S – “Procuro racionalizar para não deixar chegar no emocional”. Quadro 10:Resumo das categorias sínteses das entrevistas individuais – Pessoal de Suporte à Pesquisa Categoria 1S: A gente tem que dar conta de tudo Definição: O fluxo de trabalho é grande, o que exige o atendimento de muitas demandas ao mesmo tempo, com rapidez para que seja possível ser realizado dentro do horário de trabalho ou faz com que algumas pessoas optem por levar atividades para terminar em casa ou ficar depois do horário de expediente. Acreditam que a implantação de normas e sistemas de procedimentos, bem como o aumento do quadro de pessoal, deve facilitar o desenvolvimento das atividades. Verbalizam em relação ao processo de tomada de decisão na empresa, que embora a gerência defina quem é responsável pelo o que, a dificuldade maior se dá com a falta de diretrizes de ações, de decisão interna sobre como deve ser o fluxo do trabalho. Creditam às dificuldades a falta de mudança no quadro de chefes, que são antigos na Empresa e a falta de investimento nos gerentes, que não estabelecem prioridades. Temas Exemplos de Verbalizações E3: "A gente tem que dar conta de tudo". E1: "Tô levando serviço para casa e tô ficando aqui depois das 5h". E1: "Então vai juntando, vai dando uma ah..engarrafamento de trabalho...Vai gerando um sentimento de que você não vai dar conta nunca..." E3: "Ah! A rotina é sempre a mesma. Então, a rotina é sempre essa, não muda muito não, não é?" Fluxo / E4: "É um fluxo grande de trabalho, mas a gente consegue fazer dentro do horário de Demanda trabalho. Às vezes tem que fazer isso bem rápido". de trabalho E5: "Então também fica comigo e tem uma demanda muito grande. É a rotina do dia-adia... a gente vai levando. Vai matando jacaré a cada hora... é estar fazendo uma tarefa e /Rotina aparecer uma mais urgente e ter que correr pra aquela tarefa e terminar ela". E5: "Não tem empregado, então contrata estagiários pra ajudar as pessoas nas atividades. É um dos problemas que a gente tem. Hoje você está, amanhã você já não está com ele. Você não pode contar com aquela pessoa". E6: "tenho um cronograma de uma série de assuntos em função da demanda, e cada dia eu vou executando parte desse conjunto de demanda, salvo em certos momentos 114 quando surge uma demanda com mais urgência, ou até demandas inesperadas, então eu canalizo pra poder... não respeito o cronograma pra poder atender essas demandas que surgem". E6: Alguns exemplos, é falta de pessoal do ponto de vista de estagiário ou mestrandos, ou doutorandos. O nosso problema aqui é falta de pessoal. Não adianta estagiário e instrutor porque não é um trabalho que estagiário consiga desenvolver de uma maneira digamos assim, satisfatória. Porque tem que ter um treinamento muito grande. A gente tem essa dificuldade. E5: "É porque a gente não tem ainda, um quadro em que a gente possa cada um saber fazer as rotinas do outro. Teremos o manual de procedimento que são os tópicos, ali cada um fez a sua área, então todos os procedimentos estão ali dentro. Então se alguém Normas faltar, não vier amanhã, passar um mês e ir embora, ali está toda a rotina do processo. /procedi Então isso vai ajudar muito". E6: "O que existe em termos de facilidades e dificuldades é criar sistemas de trabalho. mentos Que aperfeiçoar o sistema de gestão, aperfeiçoar o sistema de execução das tarefas, aperfeiçoar, gerar padrões de respostas para os atendimentos, sistematizar tudo isso, pra gente poder ter um modelo de trabalho que acho que isso que é o mais complexo". E1: "Uma atividade estratégica, que é complicado ela ser inserida dentro do departamento sem as decisões que demandam é...essa atividade, de forma que fica complicado para mim nesse sentido porque eu preciso fazer o que sou cobrada de órgãos externos e quando eu chego aqui eu não consigo implementar por falta de decisão interna". E4: "Na sede, e principalmente aqui na sede, os processos são mais organizados, é definido quem é responsável". E5: "Acho que o quadro de chefia tem que ser renovado também. Acho que tem muita gente muito tempo ali dentro, vai ficando aquele ranço, aquela coisa. Tem que começar formar novas lideranças ali dentro, novos perfis de líderes". Tomada de E5: "Acho que o nosso problema maior está no gerenciamento de pessoas. A Embrapa tinha que investir mais, em gerência". Decisão E6: "Não é uma questão de capacidade. É uma questão de pura decisão administrativa. É uma questão de manter a atribuição. Porque as pessoas que tem, são atribuições diversas em função de inúmeras demandas. Então isso sugere uma falta de organização de tomada de decisão ou de uma organização mais complexa da empresa como um todo". E6: "Não é que falta verba, falta é decisão. A empresa dizer que isso é prioritário". E6: "A Embrapa não conhece a própria Embrapa. Ela tinha que debater interno pra decidir quais são as áreas que ela tem competência, quais os projetos prioritários dela". E6: "A Embrapa tem que ter uma postura em quais as áreas que ela atua e definir as prioridades. Não adianta eu chegar e dizer que a Embrapa vai pesquisar tudo. A Embrapa não vai pesquisar tudo. Isso é impossível". Esta categoria retrata a organização do trabalho no que diz respeito ao fluxo de trabalho, normas e procedimentos, bem como se dá o processo decisório. Os respondentes sentem que o fluxo de trabalho é grande. Embora tenham uma rotina definida, fazem diversas coisas ao mesmo tempo, o que dificulta a realização das tarefas, por vezes, dentro do horário do expediente. Apontam causas e soluções para as dificuldades encontradas. Acreditam que a contratação de mais pessoas e a implementação de manuais de normas e procedimentos facilitaria o andamento das atividades. Indicam que o corpo gerencial da empresa é antigo, 115 não há trocas e que falta investimento em capacitação do mesmo, o que compromete o processo de tomada de decisão e de definição de diretrizes institucionais. Categoria 2S: As condições de trabalho não são boas Definição: As condições do ambiente físico de trabalho não são boas, a sala não é adequada, reclamam do barulho do telefone e das pessoas conversando alto, do calor, além da falta de privacidade, pela disposição do mobiliário em “ilhas”. Quando conseguem melhorar alguma coisa no ambiente de trabalho é em função de negociação com a chefia ou dependência de verbas de outras entidades. Pela falta de investimento, trabalham com equipamentos velhos, móveis antigos e de modo precário. Faltam equipamentos tanto de segurança (EPIs) quanto os que ajustam o corpo às necessidades de trabalho. Reclamam de exposição a produtos químicos como "venenos". Sentem que não há garantias de manutenção das condições de saúde. Creditam à falta de equipamentos à burocracia e à falta de verba. Temas Exemplos de Verbalizações Ambiente físico de trabalho Móveis e Equipamen tos E4: "As condições de trabalho não são boas". E1: "Eu vejo que a sala não é adequada, a sala é muito barulhenta, não dá para fazer um trabalho de concentração". E1: "Essa coisa de estação de trabalho muito junta ela gera promiscuidade que não é legal para o trabalho". E2: "Nós estamos em “ilhas” (...) Em ilhas todo mundo espera que se fale mais baixo entre as pessoas. Principalmente porque é o colega do outro lado da divisória. Essa é uma coisa que ainda ninguém percebeu. Coisas mais emergenciais tudo bem, mas não pode virar rotina. E é o que acontece na nossa sala, rotina". E2: "A sala é quente. Não é um ambiente gostoso, confortável. Dá vontade de pegar a mesa e colocar lá fora, incomoda". E3: "Então, essas coisinhas, acho que prejudicam, tiram até sua individualidade ('Ilhas")". E5: "Eles estão melhorando muito a nossa condição no trabalho. A nossa sala foi toda reformada e a gente batalhou pra isso, quando eu faço (organiza) esse treinamento externo (para outras instituições) a gente ganha recurso. Aí eu negocio com eles, então eu consegui o ar condicionado, consegui aquele grandalhão, pintamos a sala, trocamos o piso". E2: "Prejudica quando não há investimento, quando você tem equipamentos e móveis antigos, velhos demais, que se você tivesse um 386 que um processo leva meia hora e num Pentium levaria 5 minutos, você vai ficar com seu técnico, seu analista parado, esperando a máquina processar". E4: "Às vezes eu estou com uma pessoa no telefone e eu tenho que dar informações então, tem que vir e pegar algum material e às vezes uma das coisas que eu tenho percebido e que eu faço muito é isso aqui, oh. Dobra aqui o telefone e fica assim (dobra a cabeça em direção ao ombro), repassando alguma coisa. E muitas vezes pelo telefone e no computador". E4: "Mas como é que se faz isso, se nem equipamento de segurança que é essencial, está na lei, vocês não conseguem dar?". E4: "Na unidade em termos de condições de trabalho, eu acho que falta muito mais. Desde equipamentos, até se precisar mesmo, o que se pode oferecer de melhor para aquelas pessoas, pra que não se contaminem com produtos (químicos), porque são utilizados muitos venenos em campo?" E4: "Sempre se fazia listas e listas e não conseguia adquirir. Acabava assim, eles adquiriam de alguma forma, através de recursos de fundação, acabavam se virando. Acho que assim estaria garantindo uma condição de saúde melhor". 116 E5: "Mas não foi sempre assim. Quando eu cheguei aqui não tinha nem água pra beber. Porque não tinham dinheiro. Tem coisas que são prioritárias. Por exemplo, não pode deixar faltar água. É primordial pra sobrevivência de qualquer ser humano. Então melhorou bem." E5: "Pois é, está faltando os EPIs. Alguns equipamentos estão em falta realmente. Trabalhamos este ano precário. Tentamos fazer da melhor maneira possível. Ficou um pouquinho fora, mas não foi nem por conta da chefia. Foi por conta de orçamento." E6: "Existe dificuldade quando a gente solicita um recurso, demora muito. Se a gente precisa de um material de pesquisa, vamos supor, um novo computador. Existe uma demora nesse processo. Demora em função de procedimentos internos, burocráticos". Esta categoria indica como são as condições de trabalho para a realização das atividades. Mostra que os empregados da carreira de suporte, de modo geral, possuem um ambiente de trabalho quente e barulhento, além de que a disposição do mobiliário em “ilhas”, interfere na realização das tarefas. Não possuem o número adequado de equipamentos para garantir a segurança física e os que utilizam para a realização das atividades diárias, por vezes são antigos e dificultam o fluxo de trabalho. Há ainda a demora, em função de ausência de verbas ou de burocracia, para a aquisição de material. Categoria 3S: Você sabe com quem você está falando? Definição: O relacionamento com os pares e chefia é visto, em alguns momentos, como bom e com diálogo, embora não muito próximos, mantendo-se mais formais, profissionais. Em muitos momentos, reclamam de discriminação em função do cargo, tempo de trabalho e titulação. A vivência da discriminação traz sentimentos de desprezo e humilhação. Relatam que são intimidados, principalmente por pesquisadores e que já presenciaram ameaças de agressão física. Manifestam que sofrem muito com isso. Acreditam que a situação está mudando e que a empresa deveria investir mais nessa mudança. E2: "Você sabe com quem você está falando? Eu tenho “Doutorado”, “eu sou DR”. E1: "Ainda tem aqui na empresa aquela fala que a gente ouvia de mais que a empresa é dos pesquisadores. Que nós estamos aqui de favor. Ainda existe essa é...essas declarações é...verbais ou não verbais, né?" E2: "Muitos pesquisadores acreditam que os pesquisadores são “os reis da cocada preta”. O restante é barata". E2: "Ele é meu chefe, meu coordenador e eu sou a empregada, devo um certo respeito e não... é um certo distanciamento, é um respeito pela pessoa, eu acho Discriminação/ melhor me resguardar". Distanciamen E2: "Às vezes, (me sinto) uma barata. Passo bom dia, bom dia, mas ninguém tá dando bola... tem dia que eu me sinto assim, lá em baixo, me sinto uma barata. to/ Sofrimento Então, isso, principalmente eu sinto assim quando em alguns comentários e atitudes, tipo assim "cala a boca!!!"... quando eu cheguei na Empresa, há dois anos atrás e comecei a escutar isso, eu me sentia pior do que uma barata, me sentia como uma ameba, uma pessoa completamente excluída e marginalizada do grupo”. E3: "Eles não olham para mim, e às vezes entram direto na sala do chefe... às vezes, pensam que é uma pessoa qualquer, passam, nem cumprimentam, vão direto, sabe? " E3: "E... por uma ou outra unidade que eu já trabalhei, percebi que tem muita diferença no tratamento, então, tem muita discriminação". E4: "Na unidade a gente tem mais dificuldade de relacionamento com o público 117 Integração/ Mudança interno. O relacionamento é difícil com relação aos pesquisadores. Mesmo não sendo isso uma prática geral, quando o relacionamento não é bom, mesmo sendo pouco ele afeta muito". E4: "Uma coisa que é muito chata mesmo, e que chega a ser antiético. Expõem, brigam através da Internet". E4: " E quando está no nível mais alto pro mais baixo, não tem nenhum problema. Mas quando é do nível mais baixo para o mais alto daí sim, tem problemas, vem reclama. Mas se tiver um pesquisador que humilha, a palavra é essa, humilhar mesmo, se você tem um pesquisador que humilha uma pessoa do nível mais baixo que ele, é completamente normal. É visto como uma coisa normal. Eu não vejo isso como uma coisa normal". E4: "As pessoas pouco esclarecidas, eles lidam como se aquilo estivesse ofendendo eles, mas eles não sabem como se defender. Alguns são fortes o suficiente e saem dando os gritos deles. Fica aquele mal-estar ali na hora, etc., mas ele não sabe a quem recorrer". E5: "Quando eu cheguei aqui, foi muito difícil. Porque na sede você não lida com pesquisador. E aqui você lida. É um processo que foi muito desgastante, passei dois anos sofrendo muito. Tem uns que são difíceis mesmo. Tem uns que só mesmo no profissional, e não dá pra você ter uma relação, uma atividade maior com eles porque até eles próprios colocam essa barreira pra você. Eles se acham". E5: "A grande dificuldade da gente é essa. Porque às vezes, eles são muito temperamentais. Então não estão muito preocupados se eles vão te magoar. Acontece, acontecem coisas terríveis. A gente viu gente até com agressão física". E5: "Acho que você agredir os outros com palavras, intimidando, eles (pesquisadores) usam termos intimidadores". E6: "Existe uma certa formalidade, as relações são muito mais formais. Isso gera um pouco de impacto na qualidade de trabalho, no estado emocional do pessoal que participa cada um nas sua atividade, falta um pouco de pessoalidade. Isso afeta grande parte da empresa. Inclusive essa dimensão que a corporação tem dificulta a proximidade entre todas as chefias, chefiados, em todos os níveis. De tal maneira que as realidades também vão sendo cada vez mais desconhecidas. Os gestores de nível mais alto têm dificuldade de entender, os detalhes que estão realmente acontecendo dentro das várias áreas da empresa". E2: "A maioria do pessoal do suporte é mestre. Me tratam super bem. Tratam de maneira igual e você fica sabendo dois, três dias depois que o cara está fazendo mestrado ou terminou o doutorado. É muito diferente. Os pesquisadores recém chegados, muitos antigos e recém chegados, o pessoal que está aí no meio é mais fácil de se lidar". E4: "Com a coordenadoria, e é tranqüilo. A gente consegue ter um relacionamento bom". E4: "Tem pessoas amáveis, pessoas tranqüilas, que conseguem se expressar conseguem dizer o que não gostou, sem magoar, sem ofensa, sem nada”. E5: “Têm pessoas ótimas aqui dentro. Têm pessoas, pesquisadores de alma boníssima”. E5: "Tem um processo consciente de que eles precisam fazer essa integração pra que eles conheçam melhor o seu parceiro aqui dentro". E5: "Acho que o pessoal que está entrando agora, os pesquisadores e eu tenho liberdade com alguns, eu falo: olha, não seja estagiário, porque você não é profissional agora. Por favor, não fique igual seus colegas. Eles morrem de rir. Olha eu vou voltar aqui, e se eu notar que você está do mesmo jeito, não deixa te contagiar. Porque é a tendência. (...)". Esta categoria expressa como se dá o relacionamento com os pares e chefia. O relacionamento é, de modo geral, distante e formal. Há casos de discriminação em relação ao 118 tempo de trabalho, titulação e à ocupação funcional dentro da empresa, o que gera sentimentos de desprezo e humilhação, caracterizando o sofrimento. Há tentativas de integração e de mudança desta situação por parte da empresa. Categoria 4S: É complicado. Tá achando que tá agradando e não está. Definição: Revelam sentimentos de ansiedade, frustração e desgaste, por não conseguirem realizar as atividades do modo como gostariam e sentem-se muito cobrados, o que gera insatisfação e insegurança. Afirmam que não há oportunidade de capacitação do pessoal de suporte e, embora a empresa esteja investido mais nesse aspecto agora, acham que não têm as mesmas regalias que o pessoal de pesquisa. O reconhecimento e desvalorização se dão pela percepção do investimento ou não no desenvolvimento do empregado. Não sabem se estão agradando ou não e têm receio de serem demitidos e desanimam-se ainda, com o descaso da empresa em manter os empregados. Em outros momentos demonstram um sentimento de liberdade e autonomia em relação ao pensar e agir no trabalho, sentem-se reconhecidos e indicam a possibilidade de serem criativos no trabalho. Temas Exemplos de Verbalizações E5: "É complicado. Ta achando que ta agradando e não está”. E1: “eu fico assim... é... querendo trabalhar, querendo desenvolver e não consigo... então meu sentimento mesmo é de ansiedade, frustração às vezes". E1: "Nós éramos nada, tanto é que não tinha capacitações pra gente, não tinha nenhuma oportunidade da gente crescer, então o que aconteceu, os pesquisadores ficaram lá em cima com doutorado, mestrado e o pessoal de apoio aqui lá em embaixo, né? É, hoje não, hoje está havendo oportunidade de capacitação para o pessoal do suporte, né? Hoje é reconhecido, então eu acho que a empresa mudou muito. Porque os pesquisadores tudo pós-doctor e o pessoal do suporte não tinha direito a nada, né? A se capacitar. Então essa defasagem ela vai perdurar alguns anos, né? " Ansiedade/ E2: "Se fulano é pesquisador consegue algumas regalias internas do que o analista no mesmo processo. O pesquisador por ser pesquisador, conhece fulano, que é Desgaste/ pesquisador que pode agilizar um processo. E o analista não. O analista pode Decepção/ esperar. Talvez eles imaginam que pesquisador é mais importante porque precisa Frustração/ continuar com as pesquisas aqui. Mas o analista também tem prioridade. Também precisa por algum motivo". Estresse/ E3: "Então, eu acho que eles não levam em conta o jeito que eu sou, ou me dar um Desvaloriza curso superior, para eu melhorar. Então, isso te desanima de correr atrás, e até de fazer um curso superior... " ção/ Injustiça/ E3: "Outro dia, pedi um curso de português, e aqui falaram para o nosso Insegurança. departamento que ia sair, e depois falaram que não tinha jeito. Então, parece que, para algumas pessoas, parece que a coisa flui mais”. E3: "Então, você vai ficando meio decepcionada com a profissão". E5: "Eles foram categóricos comigo, dizendo que ou era lá ou rua. Se você me perguntar: - você fez alguma coisa? Não. Não que eu me lembre, sabe? É muito desagradável você chegar no local você sendo imposta pra eles. Eu cheguei e falei, olha, eu sei que estou sendo imposta ao senhor, o senhor de desculpa, mas eu preciso do emprego, não posso abrir mão dele". E5: "Agora, um descaso com a gente que é da casa, muito grande”. E5: "Então a gente vai ficando meio desanimada... acho que o nosso setor de Recursos Humanos, não está tão humano. Está deixando a desejar em alguns processos". E6: Existem certos programas que de certa forma restringem, privilegiam certas áreas no esquecimento de outras áreas. 119 Gratificação/ Reconhecimento/ Liberdade/ Autonomia/ Satisfação/ Criatividade E2: "Bom, diretamente me sinto vamos dizer assim, respeitada". E2: "A liberdade eu acho boa. Sinto que a minha capacidade técnica está sendo reconhecida por ter essa liberdade". E2: "Como que você vai chegar lá não interessa, me diga o que você quer que chegue. Como que você quer. Essa é a autonomia que eu vou ter". E4: "Eu gosto, é uma satisfação muito grande ter alguma coisa que a gente é responsável e que você tem que dar respostas, isso tudo é interessante e gratificante". E6: "Eu tenho cronograma de trabalho que eu faço pra eu mesmo. É, um cronograma com base no volume das tarefas que eu tenho". E6: "porque existe um componente de arte ali, de criatividade, que tem que embutir em cada um dos processos. Embutindo criatividade cada vez que acontece". Esta categoria indica os sentimentos de desgaste, frustração, desvalorização, ansiedade e insegurança, bem como os de reconhecimento, gratificação e liberdade no trabalho. Mostra uma ambivalência de reações frente à organização do trabalho. Ao mesmo tempo em que constatam uma situação desfavorável em relação à carreira na empresa, percebem uma tentativa de investimento nos empregados, propiciando liberdade e autonomia de ações. Categoria 5S: Procuro racionalizar para não deixar chegar no emocional Definição: Para enfrentar as dificuldades algumas pessoas tendem a racionalizar, para não deixar chegar ao emocional. Alguns desistem de trabalhar naquele momento e procuram ler e estudar. Outros ainda preferem assumir comportamentos de neutralidade, quando as dificuldades não os afetam pessoalmente. Alguns tendem a se acomodar ou evitar a situação, não brigam e não questionam, "engolem" desaforos e por vezes, saem do ambiente, ou ainda, condicionam-se à situação para ficar mais relaxado, pois acreditam que não terão vantagens em agir de outro modo. Por outro lado, alguns disseram que aprenderam a falar "não", se acham injustiçados com alguns procedimentos da Empresa e recorrem até mesmo à instância judicial quando se sentem magoados. Procuram uma forma de burlar algumas regras quando se irritam com elas. Relatam alguns casos de adoecimento e acreditam que os problemas de coluna e LER/DORT são os que têm trazido mais problemas de doenças do trabalho, além das conseqüências do estresse, e alegam que em função disso, têm muitas pessoas que acabam se afastando do trabalho e ficam sem qualidade de vida. Relatam ainda a existência de casos de alcoolismo. Preocupam-se ainda com a qualidade de vida que terão no período de aposentadoria. Temas Exemplos de Verbalizações E1: "Procuro racionalizar para não deixar chegar no emocional". E1: "(...) vou para a biblioteca e às vezes desisto de...de... trabalhar nesse momento". E2: "Como eu não crescia, no meu caso eu fiz a monografia. Foi uma válvula de Racionalização escape estudar. Fiz minha monografia". E3: "E eu detesto aparecer. Eu não gosto, de jeito nenhum, nem por bem, nem por mal". E5: "Aqui todos estudaram muito, mas esqueceram o principal que é o lado emocional. Então é complicado". Neutralidade/ E2: "Por enquanto neutra, não tenho um sentimento formado se é bom ou não é bom. Por enquanto é neutro pra mim. Não está interferindo diretamente no meu Acomodação/ trabalho. Enquanto não me afetar, tá bom". Condicionamen E3: "É como eu te disse, a gente, nessa altura do campeonato que eu estou aqui, eu não vou brigar, não vou questionar nada". 120 to/ Evitação Aprender a falar não/Irritação/ Burla Adoecimento E3: "A não ser que seja uma coisa mais forte, eu chego para a colega e falo, eu tento é harmonizar, às vezes engulo desaforo, mas... " E3: "Às vezes você sabe que poderia fazer mais, mas pensa que não tem retorno, você fica condicionado mesmo, nessas coisas negativas. A melhorar, a gente sabe que tem, há muito que melhorar. Mas às vezes, você se esforça e melhora, mas você não leva nenhuma vantagem com aquilo, sabe? " E3: Então, é assim, é levar adiante, eu aprendi a gostar da empresa, mas a gente sabe que tem coisas que deixam a desejar, infelizmente, para a gente, nível médio. E 4: "E isso me levou a um cansaço e a gente acaba querendo mudar. Foi o meu caso. Eu queria mudar porque estava realmente bastante cansada". E5: "Tem mais dois anos. Então eu fico (pensando): - só mais dois anos!! ". E5: “Por que eu vou ficar fazendo alguma coisa por elas se a própria direção não está preocupada com isso?”. E5: "... eu estou falando não. Aprendi a falar não". E5: "Por um erro, a punição deles... eu gostaria de saber como é que eles fazem o processo lá quando eles erram. Porque eu sei que eles corrigem. Eu fiquei muito magoada, fiquei mesmo. Se tem uma coisa que eu fiquei muito chateada, fiquei. Fui no chefe de gabinete, briguei mesmo e estou brigando. Nem que seja por via judicial". E5: "Eu acho que te irrita, você já chega irritada com aquela coisa. Se você atrasar 10 minutinhos você já chega estressada no trabalho. Se atrasar 10 minutinhos, você vai ter que trabalhar mais aqueles 10 minutinhos por conta daquilo que vão descontar do meu salário". E5: "Porque aquilo ali é muito... quem mexe com isso sabe que você burla. Então pra quem é malandro, fica depois do expediente, fica fazendo hora, pra depois tirar dias. Isso não vai medir o seu trabalho, o seu desempenho". E5: Quando você vê não tem mais como administrar aquilo, então você começa a agredir quando não precisava nem agredir. E4: "E muitas doenças que estão relacionadas também não diretamente ao trabalho, mas que afeta o trabalho. E eu acho que com relação ao trabalho, diretamente ao corpo, são os problemas de coluna e LER que tem trazido muitos problemas de doenças do trabalho, tem muitas pessoas que acabam se afastando do trabalho e ficam completamente sem qualidade de vida, ossos tortos, uma coisa meio calamitosa." E 4: "Tem algumas coisas que ainda seria interessante que fosse corrigido, porque é muito gratificante você ter trabalhado uma vida toda e depois que você se aposentar ter qualidade de vida." E4: " E muitas doenças que estão relacionadas também não diretamente ao trabalho mas que afeta o trabalho... Alcoolismo." E5: Porque eu já tive um estresse (em uma situação de trabalho). Tive um estresse em 94 e até hoje eu sinto a seqüela dele. Porque qualquer situação de estresse que ocorra, eu começo a tossir, vomitar, eu fico nervosa, estou tentando melhorar isso". E5: "Tem um amigo nosso que estava bonzinho e deu uma endocardia, quase morreu, paralisou um lado. Eu fico olhando e pensando: - será que vale a pena tanta correria, tanta dedicação, tanto sofrimento na sua vida e quando você está pra ir embora acontece uma coisa dessas? Eu acho que com o tempo a gente vai aprendendo e amadurecendo muito". E5: "Tem que também tem que começar a procurar melhorar a qualidade de vida senão... não é só a empresa, você também tem que ter a contrapartida. As pessoas não criaram o hábito..." E5: " Inclusive assim, eu acho que quando você vai recuperar um alcoólatra no AA, a gente está com um trabalho aí que o psicólogo está fazendo tudo". 121 Esta categoria refere-se às estratégias defensivas individuais e coletivas para enfrentar o sofrimento e manter, ou não, o bem-estar. Percebe-se que, de modo geral, as estratégias são basicamente individuais. Tendem a racionalizar as emoções, acomodar-se às dificuldades ou manterem-se neutros diante dos fatos e circunstâncias. Alguns tendem a defender-se por meio do diálogo, burla ou até mesmo judicialmente. Quando as estratégias falham, surgem os casos de estresse, alcoolismo, Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT), dentre outros, o que promove uma procura da melhoria das condições de saúde atuais e futuras. 4.2.2 Resultados das entrevistas com o pessoal da carreira de pesquisa A análise dos núcleos temáticos das entrevistas individuais com os empregados da carreira de pesquisa, indicou um total de cinco categorias empíricas, delineadas a seguir no Quadro 11. Categorias 1P- “Você deixa muita coisa para fazer, tudo é pra ontem”. 2P - "Em geral acho que as condições de trabalho são tranqüilas, o ambiente bem tranqüilo". 3P - "O problema todo está nas relações interpessoais". 4P - "Eu me sinto feliz no trabalho, gosto da Embrapa". 5P - "E não vou pro enfrentamento, raramente eu vou pro enfrentamento". Quadro 11: Resumo das categorias sínteses das entrevistas individuais – Pessoal de Pesquisa Categoria 1P: Você deixa muita coisa para fazer, tudo é pra ontem. Definição: O fluxo de trabalho é grande e atribulado. Não há rotina ou planejamento das atividades, cada dia apresenta características diferentes, param o que estão fazendo para fazer outra coisa, é "aquele apaga fogo" e acham que não conseguem executar o trabalho de modo eficiente. Executam as tarefas por demanda, fazem várias coisas ao mesmo tempo e por vezes ficam depois do horário ou levam trabalho para casa. Afirmam que a empresa é cheia de normas e muito burocrática, além de novas legislações que têm que seguir e são trabalhosas. Acham que perdem tempo com demandas burocráticas, que tiram o estímulo e não faz sentido, em detrimento do aspecto da prática de pesquisa. O fato de o pesquisador ter que arrecadar recursos financeiros em outras instituições faz com que percam “um tempo precioso de pesquisa” atrás de patrocínio. Acreditam que a Embrapa é uma empresa que não tem uma organização em sua estrutura básica, não realiza as pesquisas com bases reais, sem uma linha de pesquisa definida e sem sintonia com a cadeia produtiva. Afirmam que a gestão da empresa ainda é um "ferimento" grande, pois é deficiente e falta acompanhamento efetivo, apresentando contra-sensos pela falta de definição de rumos. A falta de coordenação faz com que cada unidade central ou descentralizada “defendam seu território” e não troquem entre si, recursos ou conhecimentos. 122 Temas Exemplos de Verbalizações E4: "Você deixa muita coisa para fazer, tudo é pra ontem". E2: "Rotina é uma coisa que praticamente não existe. Então, é um leque muito grande de procedimentos, não existe, assim, um procedimento único". E1: "Eu tento me planejar, para fazer alguma coisa, mas acabo não fazendo (...) E às vezes Fluxo / eu tenho que levar trabalho para casa para poder dar conta, não é? Para poder dar conta do fluxo". demanda E3: " Mas não é uma coisa assim... não é rotineira". E4: "Tem as demandas diárias que aparecem da Embrapa como um todo, que você chega, de planeja fazer umas coisas, mas acaba pegando uma série de atividades, é aquele "apaga trabalho fogo" rápido, né? Tem coisa que era pra ontem e você tem que fazer, né? Isso acho que acontece até além do que deveria, tem muito, então você perde um tempo com isso e /rotina acaba não conseguindo fazer de uma forma mais eficiente e com uma qualidade melhor, justamente porque tem que fazer rápido". E5: "Eu chego na empresa com uma agenda do que você vai fazer naquele dia, mas eu sei que vou ter muitas surpresas durante aquele dia. Um telefonema pode mudar todo o rumo da minha atividade". E5: "Então eu acho isso, é muito corrido". E1: "A gente tem que trabalhar com uma série de normas, tem que obedecer uma série de normas de lei, estabelecidas pelo ministério”. E2: "A Embrapa é cheia de normas, tem muita norma". E4: "Tem muita legislação para seguir, para fazer, tem coisa diferente e nova na legislação Normas/ que dá trabalho...". Procedi E4: "Dependendo do resultado do projeto que você ta fazendo, tem toda uma burocracia. Tem que ficar fazendo relatório, então a gente perde muito tempo mais na parte mentos burocrática do que no aspecto prático, então a gente pega um trabalho para produzir, mas /Burocra na verdade o que tem que ficar produzindo mesmo na parte essencial é muito inferior ao tempo que demanda a burocracia. ". cia E4: "Só que como a Embrapa não tem muitos recursos (financeiros), você tem que ficar captando recurso fora, isso acaba amarrando, né? ". E5: "E a burocracia que não faz sentido. Gasta um tempo precioso, isso eu acho irritante, eu acho que a burocracia tira o estímulo, ela é a pior coisa que pode acontecer. Tem que ter um fluxo". E2: "Não tem um projeto para a atividade-fim nossa, em pesquisa. Não tem um programa Acompa de aprimoramento, o acompanhamento da pesquisa é precário... essa estrutura é falha". nhamento E2: "A Embrapa não tem pesquisa exatamente com bases reais. Também não tem cobrança sobre isso". das E3: "Nessa parte de gestão teria muito a contribuir na empresa porque é ainda um Diretrizes ferimento que nós temos, uma deficiência muito grande." E5: "você conviver com esse paradoxo o tempo inteiro. É o tempo inteiro assim, tem da contra-sensos". Empresa E5: "É complicado. Tem que lidar com essas duas coisas na Embrapa? Tem, mas eu acho que a gente deveria definir melhor os rumos que a gente vai tomar...". E2: "Tem departamentos aqui na Sede da Embrapa, que simplesmente não se conhecem e Falta de nós temos um problema sério, em relação à integração de projetos". integra E2: "Bom, tinha que se discutir um programa de pesquisa sob o enfoque nacional. Mas ção entre discutir isso de forma que as unidades não tivessem esse espírito bairrista que atualmente elas têm". as E4: "Eu acho que isso daí a gente acaba exteriorizando o nosso próprio jeito, assim,"isso aqui é meu...isso é seu..., isso pode, isso não pode...”E fica tudo numa coisa que a gente unidades sente que é muito mais farsa". 123 Essa categoria expressa a organização do trabalho no que diz respeito ao fluxo de trabalho, normas e procedimentos, bem como à ausência de diretrizes para a Empresa como um todo. Os pesquisadores sentem que o fluxo de trabalho é grande, fazem diversas coisas ao mesmo tempo, sem rotinas ou planejamento das atividades, o que dificulta a realização das tarefas de modo eficaz e por vezes dentro do horário do expediente. Demonstram insatisfação com o excessivo exercício burocrático cotidiano e com a necessidade de eles mesmos terem que captar recursos em entidades externas para o desenvolvimento dos projetos, o que dificulta a realização da atividade fim da empresa, a prática da pesquisa. Afirmam que existem dificuldades para que as pesquisas em todas as Unidades da Instituição fiquem alinhadas, ou seja, cada Unidade da empresa decide a pesquisa que será realizada, podendo ocorrer falta de integração e cooperação entre as unidades centrais e descentralizadas da Empresa. Categoria 2P: Em geral acho que as condições de trabalho são tranqüilas, o ambiente bem tranqüilo. Definição: As condições do ambiente físico de trabalho são, de modo geral, consideradas boas. O ambiente é tranqüilo e sem barulho. Possuem equipamento e suporte necessários à realização das atividades, porém dizem ser uma condição apenas das unidades em que trabalham, pois acreditam que em outras unidades as coisas não acontecem do mesmo modo. Relatam que podem ter dificuldades "anormalmente", em uma questão ou outra, quanto ao equipamento, mas que de modo geral, não existem fatores limitantes para a realização do trabalho. Temas Exemplos de Verbalizações E4: "Em geral acho que as condições de trabalho são tranqüilas, o ambiente bem tranqüilo". E1: "Eu tenho todas as necessidades atendidas para o cargo". E2: "Tenho os equipamentos mínimos necessários". E2:"Tem unidades que têm equipamentos de sobra, e outras que não têm equipamento nenhum. E trabalham com o mesmo produto. Tem unidade que tem pessoal de sobra em determinada área, e a outra não tem nenhum". Ambiente E3: "Nós temos muito boas instalações, nós temos um ambiente bem tranqüilo, você não vê muito grito e alguém correndo pelos corredores." físico de E4: "A gente acaba sentindo diretamente quando tem que fazer alguma coisa no trabalho e laboratório, e aí, chega lá para fazer uma coisa e o microscópio eletrônico tava equipamentos quebrado e não tinha recurso para consertar, mas a Embrapa, de modo geral, tem equipamento, comparando com muitos outros centros. A gente pode ter dificuldades anormalmente, uma questão ou outra, mas de modo geral, não limitante para o trabalho relacionado". E5: "Eu tenho telefone liberado para mim, posso fazer ligação para celular, interurbano, não tem nada que me impeça. Eu tenho carro, se eu topar dirigir, a qualquer hora que eu quiser, posso entrar aqui à noite a qualquer momento que eu quiser, ninguém me impede". 124 Esta categoria indica como são as condições de trabalho para a realização das atividades. Mostra que os pesquisadores, de modo geral, possuem um ambiente de trabalho tranquilo e silencioso, que não interfere na realização das tarefas. Possuem os equipamentos necessários para suprir as necessidades e os problemas encontrados são apenas pontuais. Categoria 3P: O problema todo está nas relações interpessoais Definição: O relacionamento com a chefia é, de modo geral, bom, entretanto, com os pares, é visto como necessário, mas conflituoso. Há disputa entre grupos internos e de outras unidades, o que gera “comunidades”. A competitividade é também atribuída ao sistema de avaliação da unidade, imperfeito e “predatório”. Relatam que alguns pesquisadores têm o “nariz muito empinado” e que existem claramente duas “castas”, a dos mais antigos e a dos mais novos de empresa. Afirmam que há momentos em que acontecem “pressões psicológicas fortes” entre estas castas. O distanciamento é relacionado ao sistema de avaliação individual, que também desestimula a realização de tarefas consideradas importantes, mas menos valorizadas. Com o pessoal de suporte à pesquisa, alguns não “cobram” de ninguém que os chame de “Dr.”, que têm que procurar fazer com que a “luta” entre “classes” não exista e que deve haver respeito mútuo, mas que o distanciamento veladamente ainda existe. Outros se dizem “irritados” com a falta de disponibilidade de atendimento eficaz do pessoal do suporte, além de que, por vezes, são criticados pelos colegas quando tentam inserir estas pessoas no trabalho científico. As questões de relacionamento são atribuídas à falta de comunicação entre as pessoas e a cultura da empresa, que sempre valorizou mais o pesquisador. Temas Exemplos de Verbalizações E2: "O problema todo está nas relações interpessoais". E1: "É uma situação em que há conflitos, também. Mas aos poucos a gente começa a administrar essas coisas, e as normas, e a legislação, e o conflito, porque é a administração do conflito". E1: "Não é bom... Assim, a disputa de grupos internos. Uma luta...". E1: “É um pessoal muito inteligente, demandativo e questionador. De uma certa maneira, é o que eu chamo de egos, não é?” E3: "Na Embrapa você tem que conversar. Você tem que conversar, conversar e conversar. Você tem que ouvir as pessoas e não adianta você ficar com essa conversa de você deixar de ser primeiro pra você sair pra fora você tem que estar organizado interno." E3: "Mas um tratamento que eu espero e acho que as pessoas devem dar de Relacionamento respeito e uma das coisas que eu sempre defendi, eu não estou defendendo que com pares e vocês... e nunca cobrei de ninguém de me chamar de Dr., etc. Agora, respeito, a chefia/ gente tem que ter muito." Comunidade/ E3: "Claro que nós tentamos evoluir para as coisas terem diferenças hierárquicas, Casta diferenças profissionais, mas você tem que procurar não existir essas diferenças entre classes fortes assim, porque isso também dificulta o respeito mútuo. Mas a Embrapa o foco era o pesquisador." E3: "Eu digo que nas unidades ainda existe muito em função de que... (fazendo um comentário), muito essa função, que muitas pessoas falam, essa luta de classe no Brasil, que na verdade não existe luta de classe no Brasil, não existe briga. Não tem luta... mas essa luta de classe porque você é do suporte, eu sou da pesquisa, sou importante ou menos importante, infelizmente isso veladamente existe. Eu vejo isso porque sempre favoreci esse lado de conversa com o pessoal de campo, com o pessoal misturado, eu acho que aí está a base pra você procurar a qualidade no trabalho." E3: "Não adianta eu ter um computador de última geração aqui, se você não se 125 relaciona bem com o cara que te dá suporte lá. Essas coisas irritam." E3: "“Muitas vezes o pesquisador está muito preocupado com quem está ali com ele, que é o chefe do Centro, aquela comunidade dele." E3: "Os centros não podem prescindir do conhecimento parco das pessoas. E o conhecimento parco das pessoas você só consegue com relacionamento. Se você não tiver, cai fora. E esse é o mais importante pra inovação." E4: "O que eu sinto um pouco que o próprio SAAD, ele acabou gerando uma competição, aí você, poxa...Às vezes tem uma pessoa, que as vezes você faz um a coisinha...né? Que gera alguns atritos, às vezes ta fazendo, acho que por conta que tem meio uma competiçãozinha, então eu acho que o sistema atual está gerando uma competição entre os pesquisadores da mesma unidade, como também entre unidades diferentes. Algum tempo atrás, tinha muita gente que tinha o "nariz muito empinado", então cria até um certo ranço, que ainda meio que existe". E4: "A relação entre pesquisador e pessoal de suporte é bem baixa, às vezes você não encontra pessoas que ta com o tempo livre, se conta muito com a boa vontade da pessoa de poder fazer, que a gente já sabe que ela ta sobrecarregada". E4: "Agora que tem mesmo esse negócio de ser mais "alto" ou mais "baixo", tem". E5: "E nós temos um chefe que é muito legal". E5: "mas eu sinto uma certa... tem uma chefia ou outra que, pra gente conversar, eu não dou conta". E5: "Eu acho que aqui a gente tem duas castas, claramente. Os que foram contratados no governo anterior e os que foram contratados depois. Tem horas que tem umas pressões psicológicas fortes que rola com relação a essa casta e a gente (...) a gente é usado como inocente útil nessa história". E5: "Tem pessoas que tem esse reconhecimento, mas a maioria das vezes é difícil reconhecer o suporte, você é meio criticado por colocar essa pessoa no trabalho científico. Eu sinto muito essa pressão". E2: "Tem um outro programa, também, de avaliação dentro das unidades da Embrapa, que é um sistema predatório, e só estimula a predação. As unidades estão preocupadas em fazer pontos, para se ratear cada vez mais dentro da Embrapa". E3: "Essas avaliações no meu modo de ver, elas têm uma série de, ou tiveram e ainda continuam tendo, imperfeições, vamos dizer assim. Às vezes você acaba julgando muito a qualidade, mas você não está julgando o resultado." Avaliação de E4: "Você vê, às vezes essa coisa do SAAD (Sistema de Acompanhamento e Desempenho das Avaliação do Desempenho), NIA (Nota de Impacto da Atividade – processo do unidades e SAAD), às vezes você tem uma função que leva o NIA lá em baixo. Você sabe que individuais é importante e o próprio chefe fala "Não...Isso aqui é muito importante!!!", mas o NIA tá lá em baixo. Na atividade (X) a gente tem uma demanda enorme, mas não é valorizado, então o chefe pode até falar que valoriza, mas não faz esforço para colocar o NIA mais em cima, então acaba desestimulando um pouco a pessoa". E5: "E tem essa história do NIA que é a coisa mais maluca do mundo. O que é que é isso? As coisas mais importantes na unidade que estão no PDU da unidade tem NIA baixo. Então você não é estimulada a fazer". Esta categoria representa como se dão às relações sociais no ambiente laboral. O relacionamento com os superiores é percebido como satisfatório. Entre os pares o relacionamento é ambivalente, pois se agrupam para atingir metas e objetivos, mas de modo geral mostra-se conflituoso, competitivo e formal, haja vista a formação de dois grupos bem distintos, o dos mais antigos e o dos mais recentes na empresa. O sistema de avaliação da unidade e de desempenho contribui sobremaneira para estimular este distanciamento. Já com 126 o pessoal de suporte à pesquisa os relacionamentos quase não acontecem e quando existem, de modo geral não é satisfatório. Categoria 4P: Eu me sinto feliz no trabalho, gosto da Embrapa. Definição: O trabalho, na maior parte das vezes, é visto como sendo importante para a organização e para a sociedade, há gratificação e reconhecimento da empresa, principalmente pelo status do cargo que ocupam. O trabalho é dinâmico e flexível, o que permite liberdade para criar e decidir, pois não há rigidez nem mesmo de horário de trabalho. A empresa investe muito em capacitação e na segurança de emprego. Sentem-se incomodados e “cansados” quando algum tipo de atividade que realizam, não é suficientemente valorizada pela chefia, pares ou sociedade ou quando são “cobrados” por atividades que discordam ou não gostam de realizar. Alguns se sentem também desvalorizados por desenvolver as mesmas atividades que seus pares e terem um salário menor. Temas Exemplos de Verbalizações E5: "Eu me sinto feliz no trabalho, gosto da Embrapa". E1: "Então, isso está permitindo que a indústria nacional de sementes tenha uma base boa de competição com as multinacionais. Porque, senão... o financiamento das pesquisas seria complicado... então, isso é gratificante, a gente poder ajudar todos esses arranjos que estão sendo montados, na atuação da iniciativa privada". E3: "E eu tive a oportunidade de ter o luxo de poder escolher o local de trabalho. E eu acredito que pra qualidade de vida você tem que conhecer as pessoas, com quem você trabalha.” E3: " É uma tarefa que você pode dar conta e você pode crescer, ou dar sugestão... Não é aquilo que os outros determinam que é melhor qualidade de vida. Você decide seus padrões." E3: "A inovação hoje está mais presente porque não é fazer pesquisa por pesquisa. É você fazer uma pesquisa e saber o que ela vai, qual o efeito social, econômico, ambiental que ela vai fazer. É uma coisa que está muito mais direcionada. Hoje o pesquisador tem que direcionar mais, ele não está... era mais livre, hoje não quer dizer que não é livre, mas hoje ele tem uma direção, um foco maior, as unidades querem mais isso. Então, essa lei de inovação... Essa definição de inovação... Eu não posso entender que se você quer que as pessoas cada vez mais sejam criativas, você tem que Gratificação trabalhar num ambiente que tenha mais flexibilidade, ambiente que tem mais Reconheci agilidade, que tem mais confiança mútua. Pra você ser criativo. E o pesquisador mento também pra procurar inovação, ele tem que estar num ambiente propício pra isso." Liberdade/ E4: "O que eu acho muito interessante é que a Embrapa te dá flexibilidade no trabalho Autonomia em geral, não é um trabalho muito rígido, você consegue colocar um pouco do que Segurança você quer, trabalhar com atividades bem prazerosas, em termos de serviço você Criatividade/ consegue atuar melhor, e isso é muito importante". Inovação/ E4: "A gente não é demandado por turnos, é por atividades e resultados, a gente tem Flexibilidade um pouco mais de flexibilidade de horas de chegar cedo, chegar até um pouco mais tarde, tem aquela coisa que você ta aqui para a pesquisa, não tem porque ter um esquema muito vigiado de horário, então isso facilita, isso te dá uma tranqüilidade para trabalhar". E5: "Eu acho que a Embrapa é uma mãe". E5: "Mas achei prazeroso trabalhar com as pessoas e estou sendo bem reconhecida no trabalho que faço". E5: "Nunca recebi um tipo de... às vezes trabalho errado, pisei na bola, mas nunca recebi nenhuma reprimenda, acho que todo mundo sabe que estou tentando fazer o melhor". E5: "E foi a Embrapa que me fez me sentir cidadã, uma pessoa que tem carteira 127 Frustração Perda de Status Insegurança Desvaloriza ção assinada, que pode fazer planos pro futuro". E5: "Eu acho que a empresa dá uma possibilidade da pessoa crescer. Eu fiz vários cursos, mas ia atrás". E1: "E aí, eu já não estava mais vendo o desafio, que eu gosto de desafio". E2: "E nós temos pesquisadores que trabalham há quinze, vinte anos, que passaram uma vida laboral toda na Embrapa, e não fizeram pesquisas. Tem pesquisadores em funções seríssimas, eu me coloco entre eles, e ninguém me perguntou o quê que eu fiz. Eu estou me aposentando, e ninguém me perguntou o quê que eu fiz como pesquisador. A pessoa não tem seu projeto acompanhado. Então, isso todo cria um clima, que não é um clima confortável. O cidadão entra na Embrapa, e a Embrapa não pergunta nem cobra qual o produto que ele vai oferecer". E3: "E muitas vezes a gente fica um pouco... porque não pode tomar decisão sem primeiro escutá-lo em determinadas coisas (chefe)." E4: "Gostaria de falar sobre o sistema de valorização daqui. Acho que a Embrapa perde um pouco em termos de valorização das funções das pessoas. Ao mesmo tempo que tem um discurso que quer valorizar, quer estimular, na prática se vê que ta deixando meio de lado um pouco isso". E5: "Acho que até janeiro vão colocar o crachá (ponto eletrônico) e eu não sei como vai ser isso, a catraca eu vou ter que trabalhar de madrugada. Em vez de trabalhar em casa, eu venho pra cá". E5: "Eu sofro é sempre com esse rigor. Mas é muito mais uma coisa minha de trabalhar no serviço público, que realmente exigem algumas coisas...vai dando uma certa canseira". E5: "Isso incomoda. Essa dualidade que a gente convive, incomoda, é o que me faz ir pra casa pensando se eu to no lugar certo, será que é isso mesmo, e quando eu vou conversar com as pessoas, os agricultores, me cobro essa posição, e fica dividido”. E5: "Tem hora que a gente dá o sangue absurdo aqui pra isso e essa casta é reconhecida... a gente é meio... substituto sempre dessa casta, a gente é sempre o outro quando não tem essa casta, estou vivendo esse momento agora, assim, dificuldade mesmo, do reconhecimento da gente". E5: "E você está ali, substituta eterna dessas pessoas (chefia). Às vezes você ganha um afago na cabeça, porque às vezes você trabalhou bem, então ah, vou botar seu nome aqui no quarto autor. Às vezes você teve um trabalhão e tal, mas porque ele vai te colocar como titular do projeto se é ele que aprova o projeto? Quer dizer, a coisa é perversa, a história é perversa. Sem te chamar muitas vezes. Muitas vezes você não concorda com a forma, muitas vezes você leva uma lambada, como já aconteceu comigo". Esta categoria indica os sentimentos de gratificação, reconhecimento e liberdade no trabalho, bem como os de insegurança e desgaste. Mostra uma dualidade de reações frente à organização do trabalho. Ao mesmo tempo em que constatam a grande valorização do trabalho por parte da chefia, pares e sociedade, mostram sentimentos de insegurança e desgaste quando se percebem diante de situações que podem provocar a perda do status ou da liberdade já adquiridos ou quando se sentem usados pelos colegas. 128 Categoria 5P: E não vou pro enfrentamento, raramente eu vou pro enfrentamento. Definição: Para lidar com as dificuldades algumas pessoas tendem a não enfrentá-las, esquivando-se dos problemas de modo direto ou acomodam-se às circunstâncias e procuram não se indispor com os outros. Tentam se "disciplinar" para adaptar-se, mas sentem que isso os "trava". Outros mudam de setor, assumem comportamentos de neutralidade, ou ainda, negam a própria responsabilidade para não se sentirem culpados. Por vezes, para não se chatearem com recusas de outras pessoas, tendem a realizar as atividades de modo solitário. Procuram investir nas relações interpessoais para darem um "jeitinho" de conseguir que as coisas fluam, mas nem sempre obtêm sucesso. Temas Exemplos de Verbalizações E5: "E não vou pro enfrentamento, raramente eu vou pro enfrentamento (...) o fato é que o chefe (...) pra mim é um saco completo, e aí o que eu faço? Eu tenho uma menina lindinha aí que está fazendo um trabalho comigo e é ela que conversa com Evitação/ ele e consegue tudo com ele. Eu nem vou lá porque eu não consigo. Me trata como se fosse um bebê, eu acho isso um saco". Isolamento/ E1: "Eu sempre... sempre levei minha vida sem me indispor com a pessoa. Conformismo/ Trabalho, mas não sou de brigar. Eu brinco...". Acomodação/ E4: "Mas eu já estou mais conformado...(com o trabalho)". E5: "As pessoas não querem pegar no pesado, eu já falo: pode deixar que eu faço. Adaptação Numa boa, né? Se a pessoa tiver um pouquinho de dificuldade pra fazer, eu não vou buscar outra pessoa pra fazer, com certeza eu não faço isso bem, mas às vezes eu fico muito sobrecarregada. Levo (trabalho) pra casa, levo estresse pra casa, me chateio com algumas coisas". E5: "Aqui tem uma demanda, mas a decisão não é minha. A decisão é de outra Mudança/Neu pessoa. Então você não se sente culpado por um processo seu não estar caminhando, porque você faz o melhor daquilo." tralidade E5: "Se é empresa de pesquisa, ela fica prejudicada (ir atrás de recursos). Se ela remunera pra ir captar recursos e ela está satisfeita com isso, mesmo sabendo que no final do ano eu não vou apresentar nenhum trabalho científico porque eu fiquei o ano inteiro captando recurso, tudo bem. Se ela compreende isso tudo bem. Agora se ela vier me cobrar o trabalho científico, vai ser complicado". E5: "Mas tento levar isso (dificuldades) profissionalmente, eu tenho que fazer o meu trabalho. Não importa de quem, pra quem". Investimento em E5: "Aqui, eu gasto muito tempo naquela coisa de ter uma conversa... pra ter um relações pessoais bom trabalho, pra ter respostas rápidas pra quando eu preciso de coisas rápidas. Eu / Dar um já compreendi que meu ambiente de trabalho me exige isso". "Jeitinho" E5: "Gasto um tempo maior do que eu gastaria normalmente fazendo essa coisa da relação, tomando cafezinho". E5: "O que a gente tem que fazer é estar associando com os colegas, cada um fazendo uma parte pra gente poder partir pra um trabalho em conjunto e publicar". E5: "Tem que conviver. Eu sou a rainha do jeito. Eu dou um jeito. Às vezes eu tomo um ferro danado, é um prejuízo doido, mas é isso aí". E5: "O que eu percebo é isso, o tempo todo não há embate porque se houver embate é sério. Nós vamos no jeitinho (com as pessoas) e muitas vezes não somos atendidos porque o jeitinho às vezes não funciona, e... ". Esta categoria refere-se às estratégias defensivas individuais e coletivas para enfrentar o sofrimento e manter o bem-estar. Mostra que, de modo geral, as estratégias são basicamente individuais, ou seja, a de não confrontar as dificuldades ou negar os fatos e circunstâncias. Preferem mudar de setor ou acomodar-se e aceitar as situações para conseguirem se adaptar às 129 adversidades. A estratégia para conseguir burlar a organização do trabalho, dando um "jeitinho" para que as coisas fluam com maior rapidez, se dá por meio do investimento em relações pessoais. 4.2.3 Síntese dos resultados das entrevistas São sintetizadas no Quadro 12 as 10 categorias obtidas com o pessoal da carreira de Suporte à Pesquisa e com o pessoal da carreira de Pesquisa no presente estudo. Carreira Suporte à Pesquisa Categorias 1S – “A gente tem que dar conta de tudo” 2S – “As condições de trabalho não são boas“ 3S – “Você sabe com quem você está falando?”. 4S – "É complicado. Tá achando que tá agradando e não está". 5S – "Procuro racionalizar para não deixar chegar no emocional”. 1P- “Você deixa muita coisa para fazer, tudo é pra ontem”. 2P - "Em geral acho que as condições de trabalho são tranqüilas, o ambiente bem tranqüilo". Pesquisa 3P - "O problema todo está nas relações interpessoais". 4P - "Eu me sinto feliz no trabalho, gosto da Embrapa". 5P - "E não vou pro enfrentamento, raramente eu vou pro enfrentamento". Quadro 12: Categorias das entrevistas individuais com pessoal das carreiras de Suporte à Pesquisa e de Pesquisa A relação entre as categorias das duas carreiras demonstra algumas diferenças e semelhanças de percepção do contexto de trabalho e a influência deste nas vivências de prazer e sofrimento, bem como as estratégias de mediação utilizadas pelas duas carreiras. Os resultados quantitativos e qualitativos encontrados na pesquisa foram discutidos com mais profundidade e à luz da teoria, na próxima seção. 130 5 Discussão dos resultados Neste capítulo foram discutidos os resultados encontrados na pesquisa, à luz do arcabouço teórico desenvolvido pela literatura pertinente à Ergonomia da Atividade e à Psicodinâmica do Trabalho, considerando-se o objetivo geral deste estudo, que foi verificar se existiam diferenças na percepção de duas carreiras distintas de uma mesma organização, sobre a influência que o contexto de trabalho exercia nas vivências de prazer e sofrimento. 5.1 Quantitativos Ferreira e Mendes (2007) orientam que, ao se verificar a média dos fatores das escalas, cada fator deve ser analisado em separado e em seguida, o conjunto, pode ser interpretado, a depender dos níveis de avaliação que predominaram, como satisfatórios, críticos e graves. Afirmam que "satisfatório" significa um resultado positivo e produtor de prazer no trabalho, aspecto a ser mantido e consolidado no ambiente organizacional; "crítico" é um resultado mediano, indicador de situação-limite, potencializando o custo negativo e o sofrimento no trabalho, sinalizando estado de alerta e "grave" é um resultado negativo e produtor de custo humano e sofrimento no trabalho, preditor de forte risco de adoecimento (FERREIRA; MENDES, 2007). Segundo Ferreira e Mendes (2007), para se interpretar a média dos fatores do Contexto de Trabalho, devem ser considerados os seguintes parâmetros: acima de 3,7 = avaliação mais negativa, grave; entre 2,3 e 3,69 = avaliação mais moderada, crítico; e abaixo de 2,29 = avaliação mais positiva, satisfatório. Já os parâmetros para os resultados dos fatores gratificação e liberdade, relativos à vivência de prazer são: acima de 4,0 = avaliação mais positiva, satisfatório; entre 3,9 e 2,1 = avaliação moderada, crítico; abaixo de 2,0 = avaliação para raramente, grave. Para os fatores desgaste e insegurança, relativos às vivências de sofrimento são: acima de 4,0 = avaliação mais negativa, grave; entre 3,9 e 2,1 = avaliação moderada, crítico; abaixo de 2,0 = avaliação menos negativa, satisfatório. Quando calculadas as médias dos fatores de contexto de trabalho, os resultados apresentaram-se entre 2,3 e 3,69, indicando uma avaliação mais moderada (crítico), tanto para o pessoal da carreira de suporte quanto para o da carreira de pesquisa. Com tais resultados apresentados nas médias dos fatores da escala de contexto, realizou-se uma análise mais aprofundada dos itens dos fatores, com o intuito de se obter um 131 quadro mais detalhado, para a compreensão de o porquê esses valores se mantinham no parâmetro moderado. Foram identificados os itens "o ritmo de trabalho é acelerado" (M = 3,81; DP = 0,81) e "a cobrança por resultados é presente" (M = 3,91; DP = 0,80) com os valores mais críticos. Estes itens são constantes do fator organização do trabalho. As condições de trabalho foram percebidas como satisfatórias e as relações socioprofissionais como moderadas. Assim, o resultado moderado encontrado na média da escala de contexto, mostrou-se como um indicador de situação-limite, ou seja, o contexto encontrava-se mediado por estratégias operatórias individuais e coletivas que, de acordo com Ferreira e Mendes (2003) são elaboradas para responder à diversidade de exigências existentes nas situações de trabalho e reduzir a dimensão negativa do custo humano vivenciado pelos trabalhadores. Nos testes "t" em relação às carreiras de pesquisa e de suporte à pesquisa e as duas escalas, os pesquisadores apresentaram escores maiores na escala de contexto, indicando que o pessoal da carreira de pesquisa percebeu mais negativamente o contexto de trabalho. Na análise de variância multivariada, não foram encontradas diferenças significativas entre os dois grupos estudados em relação aos fatores agrupados do contexto de trabalho. Quando calculadas as médias dos fatores das vivências de prazer e sofrimento, os resultados para o fator gratificação apresentaram-se como moderado (critico) para o pessoal de suporte e positivo (satisfatório) para o pessoal de pesquisa. Quanto aos fatores liberdade e desgaste, os resultados mostraram-se moderados (críticos) para as duas carreiras. Já para o fator insegurança, as médias apontaram avaliação menos negativa (satisfatória) para os empregados das duas carreiras. Estes dados mostraram a utilização adequada das estratégias de mediação e corroboraram a abordagem da Psicodinâmica que indica que as vivências de prazer e sofrimento são enfrentadas mediante estratégias de mediação individual ou coletiva, que variam de acordo com o contexto de trabalho de cada categoria profissional (DEJOURS, 1987, 2007; FERREIRA; MENDES, 2003; MENDES, 2007). Vale lembrar que o uso das mediações não faze com que o prazer prevaleça sobre o sofrimento. O sofrimento é real, mesmo que de maneira moderada e residual, necessitando ser mitigado por meio das estratégias de defesa. Assim, para os fatores liberdade e desgaste que se encontravam no nível moderado (crítico) para as duas carreiras, pôde-se concluir que provavelmente as estratégias de mediação do sofrimento, estavam se mantendo de modo equilibrado. 132 Para a escala de prazer e sofrimento no trabalho, também foram realizadas análises mais aprofundadas dos itens. Foram identificados os itens "sinto-me ameaçado de demissão" (M = 1,39; DP = 0,82); "tenho receio de ser demitido ao cometer erros" (M = 1,81; DP = 0,97) e "sinto-me inseguro diante da ameaça de perder meu emprego" (M = 1,84; DP = 1,06) com os resultados mais satisfatórios. Posto que a Embrapa é uma empresa pública e que, embora seja regida pela CLT, raramente os empregados são demitidos, estes resultados já eram esperados. Para o fator gratificação, os seguintes itens foram preponderantes para a diferença de resultados encontrados entre os dois grupos: "sinto-me identificado com as tarefas que realizo" (suporte à pesquisa M = 3,80; DP = 0,92 / pesquisadores M = 4,23; DP = 0,68); "sinto disposição mental para realizar minhas tarefas" (suporte à pesquisa M = 3,96; DP = 0,75 / pesquisadores M= 4,21; DP = 0,61) "meu trabalho é gratificante" (suporte à pesquisa M = 3,73; DP = 0,91 / pesquisadores M = 4,13; DP = 0,69) "meu trabalho é compatível com as minhas aspirações profissionais" (suporte à pesquisa M = 3,4; DP = 0,09 / pesquisadores M = 4,05; DP = 0,77). Os testes "t" realizados entre os fatores e as duas carreiras, confirmaram os achados encontrados nas médias dos fatores e indicaram que o pessoal da carreira de pesquisa vivenciou mais sentimentos de gratificação do que o pessoal da carreira de suporte. Não foram encontrados escores significativos nos fatores constituintes da escala de sofrimento em relação às duas carreiras. Os cálculos das correlações também corroboraram os achados nas médias e testes "t" nos fatores avaliados na escala de prazer e sofrimento, sendo que o fator gratificação mostrou correlação positiva entre o fator liberdade e correlações negativa entre o fator insegurança. Em contrapartida, os resultados indicaram não haver correlação significativa entre as duas carreiras e os fatores liberdade, desgaste e insegurança, indicando uma percepção indiferenciada destes fatores pelos empregados das duas carreiras. Assim como os demais testes, a análise de variância multivariada (MANOVA), mostrou diferenças significativas entre os dois grupos avaliados e por meio da análise univariada (ANOVA), que se prestou a identificar os fatores das vivências que melhor explicavam os resultados da MANOVA, foi identificado que somente o fator gratificação apresentava diferença significativa entre os grupos. Já o fator liberdade apresentou correlações negativas entre os fatores insegurança e desgaste e o fator insegurança apresentou relação linear positiva entre o fator desgaste, o que apenas confirma a relação dicotômica entre as vivências de prazer e sofrimento, pressuposto 133 da Psicodinâmica do Trabalho, apresentado na seção 2.4. Para Ferreira e Mendes (2003), algumas características das vivências de prazer são a de que elas se manifestam por meio da gratificação, da realização, do reconhecimento e da valorização no trabalho, além disso, possibilitam a construção da identidade e a expressão da subjetividade no trabalho que viabilize as negociações, a formação de compromisso e a ressonância entre a realidade concreta de trabalho. Para estes autores, os indicadores de gratificação são: sentimento de satisfação, realização e orgulho de que o trabalho tem sentido e valor por si mesmo, de que é importante e significativo para a pessoa, para a organização e para a sociedade. Pelos resultados encontrados, pode-se concluir que os empregados da carreira de pesquisa possuíam um maior sentimento de gratificação, haja vista a natureza do trabalho que realizavam que lhes permitiam vivenciar sentimentos de orgulho pelo trabalho realizado e identificação e compatibilidade profissional com as tarefas desenvolvidas. Ao se comparar conjuntamente os resultados apresentados nas duas escalas, os testes de correlação apontaram relações positivas significativas da escala EACT entre o fator condições de trabalho, o fator relações sociais e o fator organização do trabalho para as duas carreiras. Assim, os achados indicam que as três dimensões estudadas são relevantes na percepção dos respondentes. Mostraram relações lineares positivas também os fatores: condições de trabalho e insegurança e desgaste; relações sociais de trabalho entre organização do trabalho, insegurança e desgaste e entre organização do trabalho e gratificação, insegurança e desgaste. Os dados corroboraram as abordagens teóricas da Ergonomia da atividade (seção 2.3) e da Psicodinâmica do Trabalho (seção 2.4) que enfatizam que quanto piores as condições de trabalho, as relações sociais e a organização do trabalho, maiores os sentimentos de insegurança e desgaste. Foram encontradas relações lineares negativas entre os fatores: condições de trabalho e liberdade; relações sociais de trabalho, gratificação e liberdade e organização do trabalho e liberdade. Os resultados indicaram, ainda de acordo com o arcabouço teórico apresentado, que condições de trabalho ruins, relações sociais mal estabelecidas e uma organização do trabalho divergente das expectativas apresentadas pelos empregados, interferem de modo significativo nos sentimentos de liberdade, caracterizando a rigidez das normas e procedimentos e a restrição para pensar, organizar e expressar sua individualidade (FERREIRA; MENDES, 2003). 134 Estes achados reforçam as pesquisas desenvolvidas por Mendes (1999), Ribeiro e Mendes (2000), Diniz e Mendes (2000), Antloga (2003), Ferreira e Mendes (2001) e Mendes e Tamayo (2001) que confirmaram a influência da organização do trabalho no prazersofrimento, tanto no que diz respeito aos aspectos da racionalidade do trabalho quanto dos atuais paradigmas de organização do trabalho. Não foi encontrada correlação linear significativa entre o fator relações sociais para as duas carreiras e gratificação, ou seja, independentemente das relações de trabalho oferecidas pela empresa, os empregados mantém os sentimentos de gratificação. Silva, Campos e Mendes (2004) em pesquisa realizada com líderes religiosos neopentacostais e tradicionais, apontaram resultados que ratificaram esses resultados, concluindo que pode haver predominância de prazer em um contexto de trabalho insatisfatório, embora existissem diferenças de estruturas e concepções de trabalho totalmente diferentes, indicando que outras variáveis poderiam ter maior influência sobre as atividades. Os resultados da MANOVA em relação à todos os fatores pesquisados e às duas carreiras indicaram resultados significativos no que diz respeito ao objetivo geral deste estudo, mostrando que existem diferenças de percepção entre duas carreiras distintas de uma mesma organização sobre a influência que o contexto de trabalho exerce nas vivências de prazer e sofrimento. Em relação aos dados demográficos, identificam-se algumas diferenças para os fatores constantes das escalas aplicadas. Os sujeitos do sexo feminino perceberam diminuição do fator liberdade em relação aos sujeitos do sexo masculino. Para Dejours (1999a), o prazer no trabalho é mais difícil de ser alcançado pelas mulheres devido à dominação histórica e cultural do sexo masculino. No que se refere ao estado civil, os casados têm melhores vivências de liberdade e gratificação do que os solteiros e divorciados. Este dado também foi encontrado em pesquisas realizadas por Antloga (2003) e Facas et al. (2004), que afirmaram que os casados, ao contrário dos solteiros e separados, ao saírem do trabalho, encontram um meio propício para elaborar as insatisfações oriundas do contexto de trabalho. Entretanto, seriam necessários maiores estudos para corroborar estes achados. Os empregados lotados nas unidades descentralizadas da empresa perceberam mais negativamente o contexto de trabalho do que os lotados nas unidades centrais em todos os fatores da escala de contexto e nos fatores insegurança e desgaste, embora percebessem mais positivamente o fator gratificação, o que revelou que as unidades descentralizadas apresentam mais sentimentos de mal-estar e de sofrimento do que as unidades centrais. Isto possivelmente 135 deveu-se ao fato de que, por estarem às unidades descentralizadas distantes do centro decisório da Empresa e operando com planos diretores distintos, tinham dificuldade de acesso à informação e a recursos que fluíam com mais facilidade na sede da organização. Também em pesquisa realizada por Tillman (1996) com grupos de operários rurais, a autora identificou que dentro de uma mesma empresa, em diversos grupos com atividades similares, podem-se encontrar diferentes modelos de organização do trabalho. Essas distinções são claramente percebidas pelos trabalhadores e cada um as interpreta de acordo com a própria subjetividade. Em relação aos empregados com e sem cargo de chefia, foram encontradas diferenças de médias nos fatores organização do trabalho e gratificação, que indicaram que os empregados com cargo de chefia possuíam melhor percepção sobre os indicadores de organização do trabalho e vivenciavam mais sentimentos de prazer. Posto que, a priori, são os gestores que definem questões sobre a organização do trabalho é esperado também que vivenciem maior gratificação como sentimentos de satisfação, realização e orgulho de que o trabalho tem sentido e valor por si mesmo. Estes escores se deveram também, possivelmente, ao fato de estarem em uma posição mais confortável em relação à empresa em termos financeiros, de progressão na carreira, de conhecimento do ambiente e das pessoas com as quais se relacionavam. Estes resultados confirmaram os dados obtidos em estudos anteriores conduzidos por Diniz e Mendes (2000), que realizaram pesquisa com chefes e não chefes de uma instituição pública, observando que a vivência de sofrimento é mais representativa em profissionais que não exercem função de chefia. Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994) também afirmam que quanto mais se sobe na hierarquia das empresas, mais há lugar para o prazer e para o sujeito. Os resultados positivos na correlação entre os fatores de prazer e idade revelaram que quanto maior idade possuíam os respondentes, mais estes vivenciavam sentimentos prazer, assim como também no fator insegurança (conotação negativa), foi encontrada correlação positiva, mostrando que quanto maior a idade, menor o sentimento de insegurança. Estes dados permitiram concluir que o aspecto cultural de se valorizar mais as pessoas com menor idade, não foi percebido pelos respondentes. Vale lembrar que a empresa era de caráter público e incentivava o desenvolvimento profissional, fator este que corroborou a diminuição dos sentimentos de insegurança em relação ao aumento da faixa etária. Facas et al. (2004), que realizaram estudos com empregados terceirizados do setor bancário, em seus achados, confirmaram estes dados. 136 Os escores encontrados no teste "t", quanto ao contexto de trabalho, quando comparou-se empregados com tempo de empresa entre um e cinco anos e entre vinte e um e vinte e cinco anos (valores extremos da escala), foram significativos nos fatores gratificação, liberdade e insegurança, o que mostrou que os empregados mais antigos na empresa vivenciavam mais prazer do que os empregados mais recentes. Alguns destes resultados foram também corroborados no cálculo da correlação entre estes fatores. O fator insegurança revelou correlação negativa entre tempo na empresa, entretanto, como o fator insegurança tem conotação negativa, os dados mostraram que quanto mais tempo na empresa os empregados possuíam, o sentimento de insegurança diminuía. Pôde-se atribuir estes resultados ao fato de ser a organização uma empresa pública, que dificilmente desligava os empregados de carreira do quadro de pessoal, o que diminuía a insegurança quanto à permanência no cargo. Os resultados das correlações entre os fatores liberdade, gratificação e insegurança indicaram correlações significativas entre tempo no cargo (para empresas públicas cargo e função têm conotação distinta. Consecutivamente, o primeiro refere-se à carreira e o segundo, às funções de chefia), ou seja, quanto maior tempo no cargo possuíam os respondentes, mais estes vivenciavam sentimentos prazer e menos insegurança sentiam. Os resultados referentes a tempo de empresa, tempo no cargo e alguns referentes à idade foram contraditórios em relação à pesquisa realizada por Facas et al. (2004), que realizaram estudos com empregados terceirizados do setor bancário. Para estes pesquisadores, quanto maior a idade do trabalhador, menor a vivência de liberdade, quanto ao tempo de empresa, a liberdade e a realização profissional diminuíam com o passar dos anos e quanto ao tempo no cargo, a falta de reconhecimento aumentava. Os resultados quantitativos obtidos indicaram a influência do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento e predominância da presença de vivências moderadas de prazer e sofrimento. Concluiu-se, mediante os dados apresentados, que os empregados da empresa poderiam estar utilizando estratégias defensivas, como a negação, racionalização e a compensação para lidar com o sofrimento e manter a integridade física, psíquica e social. A diferença de percepção dos empregados da carreira de suporte à pesquisa e dos empregados da carreira de pesquisa quanto à influência do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento também foram identificadas. 137 5.2 Qualitativos Na análise dos dados qualitativos, ao comparar-se a relação entre as categorias das duas carreiras, foram identificadas diferenças e semelhanças de percepção do contexto de trabalho e a influência deste nas vivências de prazer e sofrimento, bem como as estratégias de enfrentamento e mediação do sofrimento, utilizadas pelos sujeitos. Quanto à organização do trabalho no que tange aos aspectos de fluxo, normas, procedimentos e rotinas, nas categorias 1S – “A gente tem que dar conta de tudo” e 1P- “Você deixa muita coisa para fazer, tudo é pra ontem”, percebeu-se que para os empregados da carreira de suporte, a demanda era grande e rígida, com uma rotina bem definida. Já para os pesquisadores, a demanda também era grande, porém existe maior flexibilidade na organização das tarefas. Ambas as carreiras indicaram que o fluxo de trabalho era comprometido pelo excessivo número de procedimentos burocráticos e pela falta de diretrizes consistentes, que norteassem o planejamento das tarefas. A carga psíquica do trabalho ou custo humano do trabalho tem relação com o conteúdo significativo do trabalho, portanto, os componentes da carga de trabalho são responsáveis por manifestações de saúde, prazer e sofrimento físicos e psíquicos (WISNER, 1994; ABRAHÃO, 1993). Em relação a categorias que possuem mais autonomia e espaço para criar frente à organização do trabalho e outras que não, os achados de Mendes (1995), Mendes e Linhares (1996) e Mendes e Abrahão (1996) indicaram que o prazer é vivenciado quando o trabalho favorece a valorização e reconhecimento, especialmente, pela realização de uma tarefa significativa e importante para a organização e a sociedade. O uso da criatividade e a possibilidade de expressar uma marca pessoal pelo uso desta, também são fontes de prazer e, ainda, o orgulho e admiração pelo que se faz, aliados ao reconhecimento da chefia e dos colegas. Tais pesquisas revelam que situações de medo e de tédio são responsáveis pela emergência do sofrimento, que se reflete em sintomas como a ansiedade e a insatisfação, situações estas também identificadas nos dois grupos sujeitos desta pesquisa. Nestes dois grupos, percebeu-se a existência de uma organização rígida do trabalho, pautada por normas e regras que podem cercear os sentimentos de gratificação e de liberdade e levar ao trabalho fatigante, ao sofrimento e consequentemente, ao adoecimento. No que se refere às condições de trabalho, os resultados indicaram diferenças entre as duas carreiras, o que demonstram as categorias 2S – “As condições de trabalho não são boas“ e 2P - "Em geral acho que as condições de trabalho são tranqüilas, o ambiente bem tranqüilo". 138 Para os pesquisadores as condições são boas e o ambiente é tranqüilo e para o suporte, o ambiente físico é barulhento, quente e inadequado, sendo que os equipamentos não atendem às necessidades de trabalho e às de segurança. Assim, identificou-se que havia elementos que interferiam negativamente no bem-estar do pessoal de suporte à pesquisa, assim como havia elementos que denotavam satisfação com as condições de trabalho por parte do pessoal de pesquisa. As condições de trabalho são tidas como elementos estruturais de suporte ao posto de trabalho. De acordo com Ferreira e Mendes (2003), a precariedade das condições de trabalho gera sentimentos de indignação, insatisfação, inutilidade e desvalorização nos operários, que constituem indicadores de sofrimento. Quando as condições de trabalho não são satisfatórias problemas como desgaste físico, cansaço intenso, desmotivação e vivências de mal-estar no trabalho podem ocorrer. Assim, quanto mais precárias as condições, maior o sofrimento no trabalho e o risco à saúde, o que pode interferir negativamente na qualidade de vida no trabalho. Porém, quando suficientes, são de certa forma estruturantes psíquicas para que o funcionário possa trabalhar. É uma forma de valorização do trabalhador, como se ele tivesse um valor para a organização. E é esse sentimento de valia que faz das condições de trabalho um elemento estruturante do trabalho (FERREIRA; MENDES, 2003). Pesquisa realizada por Rocha (2003) identificou, em estudo com bancários acometidos de Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORTS), que o ambiente para realização da atividade era inadequado, tendo em vista a existência de ruídos, gavetas pesadas, desconforto térmico. Isto favoreceu um quadro de sofrimento no trabalho. Também Ferreira e Mendes (2003), em estudo com auditores fiscais, corroboraram os achados quando observaram que frequentemente as condições de trabalho desses profissionais eram precárias. Esta falta de apoio institucional, segundo os pesquisadores, gerava um aumento do custo humano do trabalho. Para Ferreira e Mendes (2003), a construção de modos de trabalho com vistas a dar conta da discrepância entre o prescrito e o real pode funcionar como mecanismos defensivos de negação do sofrimento, podendo gerar uma não-reação diante das condições de trabalho. Segundo os autores, se não houver melhoria das condições de trabalho, bem como a organização do trabalho com a finalidade de evitar o uso excessivo de estratégias, no futuro podem aparecer distúrbios graves de saúde. As relações socioprofissionais são identificadas nas categorias 3S – “Você sabe com quem você está falando?” e 3P - "O problema todo está nas relações interpessoais". Para o 139 pessoal de suporte à pesquisa, o relacionamento era visto como distante e formal. Existiam casos de discriminação em relação ao tempo de trabalho, titulação e à ocupação funcional dentro da empresa, principalmente por parte do pessoal da carreira de pesquisa, o que acarretava sentimentos de menos-valia, caracterizando o sofrimento. Para os pesquisadores este fator também não se mostrava favorável, pois embora as relações travadas com pessoas que ocupavam cargo de chefia fossem boas, mostrava-se desfavorável quando se dava entre os pares, indicando conflitos, competitividade exacerbada e formalismo. Havia indicação de que os sistemas de avaliação de desempenho da empresa contribuíam com este status quo. As verbalizações revelaram que a relação com a chefia era considerada satisfatória, entretanto, com os pares, as relações encontravam-se comprometidas nas duas carreiras, acarretando a inexistência de um suporte socioafetivo, essencial para a construção do coletivo de trabalho. Havia manifestações de individualismo e conflitos no modo de gestão do trabalho, denotando relações socioprofissionais desarticuladas. Na unidade a gente tem mais dificuldade de relacionamento com o público interno. O relacionamento é difícil com relação aos pesquisadores. Mesmo não sendo isso uma prática geral, quando o relacionamento não é bom, mesmo sendo pouco ele afeta muito. No contexto de trabalho (DEJOURS, 2004c), o conteúdo das tarefas e a qualidade das relações com os pares e a hierarquia podem ser fonte tanto de prazer quanto de sofrimento para o trabalhador. Dejours, Dessors e Desriaux (1993) indicam que o hiato entre a organização prescrita e a organização real do trabalho pode tornar-se fontes geradoras de desconforto e angústia para os trabalhadores e, como defesa contra estes sentimentos, eles encobrem os ajustamentos realizados pelo segredo, pelo sigilo sobre os modos operatórios adotados por cada uma das equipes. Esta tática defensiva do segredo no mesmo local de trabalho provoca desconfiança, entre os próprios trabalhadores, deteriorando a atmosfera e as relações de trabalho e, em última instância, acaba fragilizando as próprias bases da cooperação. Para Dejours (1999), a dinâmica de reconhecimento só é possível, se no coletivo de trabalho houver cooperação e confiança. Se as relações estão enfraquecidas, extingue-se esta possibilidade. O reconhecimento, mesmo que seja por meio de estratégias defensivas, prescinde de cooperação e é corroído pela competição. Tanto para Dejours (2004) quanto para Ferreira e Mendes (2003), as relações socioprofissionais são essenciais para se construir um coletivo de trabalho ocorrendo assim a 140 promoção da dinâmica do reconhecimento no trabalho, dinâmica esta que permite a transformação do sofrimento em prazer e que mantém a integridade biopsicossocial do trabalhador. Sendo assim, o individualismo é tido como desestruturante psíquico. Segundo Dejours (2005, 2007), quando as relações subjetivas com o trabalho são desarticuladas, o trabalho perde o sentido e surge o sofrimento no trabalho. Esse sofrimento está relacionado à desestabilização das relações de solidariedade, muitas vezes relativas aos processos de avaliação de desempenho. Algumas verbalizações citadas, confirmaram estes aspectos abordados pelo autor. Tem um outro programa, também, de avaliação dentro das unidades da Embrapa, que é um sistema predatório, e só estimula a predação. As unidades estão preocupadas em fazer pontos, para se ratear cada vez mais dentro da Embrapa. O que eu sinto um pouco que o próprio SAAD (Sistema de Acompanhamento e Avaliação do Desempenho), ele acabou gerando uma competição, aí você, poxa...Às vezes tem uma pessoa, que as vezes você faz um a coisinha...né? Que gera alguns atritos, às vezes tá fazendo, acho que por conta que tem meio uma competiçãozinha, então eu acho que o sistema atual está gerando uma competição entre os pesquisadores da mesma unidade, como também entre unidades diferentes. Algum tempo atrás, tinha muita gente que tinha o "nariz muito empinado", então cria até um certo ranço, que ainda meio que existe. Quando existe uma predominância da compatibilidade entre tarefa prescrita e atividade real, ou uma flexibilidade na organização do trabalho que permita a negociação ou ajustamento do sujeito às condições adversas da situação, tem lugar vivências de prazer, caso contrário, imperam as vivências de sofrimento (FERREIRA, 2003). Ferreira e Mendes (2003) definem o prazer como uma vivência individual ou de um grupo de trabalhadores de experiências de gratificação oriundas da mediação entre as necessidades do indivíduo e as exigências do contexto de trabalho. Em contrapartida, o sofrimento é uma vivência de sentimentos dolorosos como angústia, medo e insegurança provenientes dos conflitos entre o indivíduo e o contexto de trabalho. Mendes (2004) sintetiza que o prazer manifesta-se por meio de sentimentos de gratificação, orgulho e identificação com determinado trabalho que atenda às necessidades profissionais, sentimento de estar livre para pensar, organizar e falar sobre o trabalho. Enquanto que o sofrimento se expressa por sentimentos de desânimo, cansaço, ansiedade, frustração, tensão emocional, sobrecarga, estresse no trabalho e sentimento de incompetência diante das pressões para atender as exigências de desempenho e produtividade. 141 As vivências de prazer e sofrimento, oriundas do contexto de trabalho, puderam ser identificadas nas categorias 4S – "É complicado. Tá achando que tá agradando e não está” e 4P - "Eu me sinto feliz no trabalho, gosto da Embrapa". Tanto o pessoal de suporte à pesquisa quanto o de pesquisa vivenciavam sentimentos de desvalorização, insegurança e frustração, entretanto estes sentimentos mostraram-se mais acirrados no pessoal de suporte. Embora estes últimos indicassem também sentimentos de gratificação, reconhecimento, liberdade, autonomia e espaço para criar no contexto de trabalho, foram sentimentos menos expressados do que em relação aos pesquisadores, onde se pôde inferir que as vivências de reconhecimento e gratificação com o trabalho se sobrepõem às demais nesta última carreira. Assim, o pessoal de suporte vivencia mais sofrimento enquanto o de pesquisa demonstra mais sentimentos de prazer, haja vista a maior possibilidade de se realizar no trabalho, desenvolvendo atividades prazerosas e que fazem sentido para eles. Os estudos em Psicodinâmica do Trabalho constaram que o sofrimento é inerente à relação do homem com o trabalho, estando presente em todas as situações da vida, como uma conseqüência natural da frustração do desejo. Por outro lado, passaram a observar, também, que as vivências de prazer e sofrimento não são excludentes entre si, sendo que normalmente há uma predominância de uma sobre a outra. São poucas as situações em que os trabalhadores vivenciam apenas prazer ou apenas sofrimento. Há, portanto, a presença de uma dicotomia de possibilidades de vivências que nasce da interação com os contextos de trabalhos. A dicotomia existente entre as vivências de prazer e sofrimento, de acordo com a abordagem da Psicodinâmica, foi confirmada no contexto de trabalho estudado. Embora com predominância de uma ou outra perante as duas carreiras estudadas, tanto vivências de prazer, quanto de sofrimento foram identificadas nos dois grupos. Foi encontrada predominância de vivência de sentimentos de sofrimento na carreira do pessoal de suporte à pesquisa, ratificando os indicadores apontados, dentre outros autores, também por Jayet (1994), para quem: as vivências de sofrimento aparecem associadas à divisão e à padronização de tarefas com subutilização do potencial técnico e da criatividade; rigidez hierárquica, com excesso de procedimentos burocráticos, ingerências políticas, centralização de informações, falta de participação nas decisões e não-reconhecimento; pouca perspectiva de crescimento profissional, dentre outros. Os resultados encontrados na categoria 4S, pessoal da carreira de suporte à pesquisa, foram consoantes com Barros e Mendes (2003), que investigaram as vivências de sofrimento utilizadas por trabalhadores terceirizados de uma construtora, utilizando como referencial teórico-metodológico a Psicodinâmica do Trabalho. Os resultados apontaram que o 142 sofrimento tornava-se visível por meio de indicadores de mal-estar tais como: desgaste físico e mental e falta de reconhecimento. Os resultados encontrados na categoria 4P, pessoal da carreira de pesquisa, foram similares aos de Mendes e Abrahão (1996), em resultados empíricos obtidos em pesquisa realizada com engenheiros de telecomunicação. Para as autoras, o prazer também é vivenciado, quando o trabalhador sente reconhecimento e valorização, tendo em vista: visualização dos resultados da produção; descentralização das decisões; autonomia técnica; controle do processo produtivo; possibilidade de aprender e desenvolver-se profissionalmente e liberdade de expressão. Também corrobora, pesquisa realizada por Fook e Silva-Júnior (2004) em um estudo sobre sofrimento psíquico com profissionais de transportes públicos coletivos. Concluíram que, considerando-se a organização do trabalho no setor de transportes coletivos, era pequena a incidência de sofrimento psíquico na população estudada. Sugeriram que os resultados foram provenientes de um alto índice que indicava que os trabalhadores executavam atividades das quais gostavam. De acordo com a abordagem da Psicodinâmica do Trabalho (seção 2.4), o equilíbrio psicodinâmico entre prazer e sofrimento (operador tanto da saúde quanto do adoecimento) depende da margem de liberdade oferecida aos trabalhadores e da qualidade da dinâmica do reconhecimento da contribuição pessoal que o sujeito dá à organização do trabalho. Para Ferreira e Mendes (2003), as estratégias de mediação individual e coletiva figuram como o modo construído pelos trabalhadores para dar conta da diversidade de contradições presentes no contexto de trabalho, que podem resultar em sofrimento. Desse modo, objetivam instaurar o predomínio de vivências de prazer e bem-estar e transformar o contexto de trabalho, de maneira a assegurar a integridade física, psicológica e social. Nesse sentido, observou-se que os empregados das duas carreiras pesquisadas, tenham construído estratégias para enfrentar o sofrimento e manter a saúde. Comparando-se às estratégias de mediação para enfrentar o sofrimento, nas duas carreiras, por meio das categorias 5S – "Procuro racionalizar para não deixar chegar no emocional” e 5P - "E não vou pro enfrentamento, raramente eu vou pro enfrentamento", não foram encontradas estratégias de mobilização coletivas, embora um entrevistado da área de suporte tenha se referido à “burla” e um entrevistado da carreira de pesquisa tenha citado o “jeitinho”, indícios destas estratégias, mas que não foram suficientemente explicitados ou corroborados pelos outros sujeitos, o que impossibilitou uma conclusão definitiva, posto que a Psicodinâmica do Trabalho está fundamentada no pressuposto de que as estratégias de 143 mobilização coletiva são mais adequadas para o enfrentamento do que o confronto dos resultados da inter-relação dos trabalhadores com o contexto de trabalho, haja vista que este pode ser fonte de prazer ou de sofrimento e que, por sua vez, dependem das estratégias utilizadas pelos trabalhadores para ressignificar o sofrimento e transformá-lo em prazer. De acordo com Dejours (1993 a 2004), a saúde e o prazer no trabalho são processos que estão sempre a ser conquistados, não estão em nenhum lugar adquiridos definidamente. A conquista da saúde no trabalho passa, por conseguinte, pela forma como os trabalhadores enfrentam a diversidade do contexto de trabalho. Assim, o uso de estratégias de mediação do sofrimento é fundamental para a busca da saúde e o prazer no contexto de trabalho. Foram identificadas estratégias de defesa individuais de modo indistinto nos dois grupos, tais como racionalização, negação, evitação, acomodação, dentre outras e indícios de enfrentamento direto da situação, mas apenas na carreira de suporte à pesquisa foram encontrados relatos de adoecimento relativos ao contexto de trabalho. Estratégias defensivas individuais também foram encontradas em pesquisas realizadas por Mendes (1994,1996) e Mendes e Linhares (1996) que identificam que os indicadores de comportamentos defensivos podem ser diferenciados em profissões específicas. Foram verificados como indicadores de comportamentos defensivos a racionalização ou passividade e aceitação diante do elemento que faz sofrer, o individualismo e trabalho solitário diante de situações como falta de cooperação, de confiança, de compartilhamento de regras no grupo de trabalho impulsoras de sofrimento. Outras pesquisas realizadas por Vieira (2005), Resende e Mendes (2004) e Silva e Mendes (2004), que investigaram as estratégias defensivas e de mobilização subjetiva de enfrentamento do sofrimento, apontaram conclusões semelhantes às encontradas no presente estudo, pois os resultados apontaram que para enfrentar o sofrimento são utilizadas defesas de negação e controle por meio de mecanismos de racionalização e de compensação para lidar com o sofrimento e manter a integridade física, psíquica e social. Quanto à questão da "burla", Dejours, Dessors e Desriaux (1993) asseguram que a contradição entre organização prescrita e organização real conduz a que os vários grupos de trabalhadores elaborem maneiras variadas de burlar a organização prescrita e construir uma ou várias organizações reais. Para esses autores, situações de reajustes da organização do trabalho prescrito, que implicam driblar os mecanismos de controle, tornam-se inevitáveis, mas são fontes geradoras de desconforto e angústia para os trabalhadores. Como defesa contra estes sentimentos, eles 144 encobrem os ajustamentos realizados por meio do sigilo sobre os modos operatórios adotados por cada uma das equipes. Esta tática defensiva do segredo no mesmo local de trabalho provoca desconfiança entre os próprios trabalhadores, prejudicando o clima e as relações de trabalho, o que se coaduna com as verbalizações refletidas nas categorias 3S e3P. 5.3 Quantitativos e qualitativos Prazer e sofrimento no contexto de trabalho fazem parte de uma dinâmica própria à vida. Sofrer pode ser também uma oportunidade para a obtenção do prazer, segundo a abordagem da Psicodinâmica (seção 2.4). Contudo, como lidar com esse sofrimento é o que definirá a tendência para uma descompensação ou equilíbrio psicológicos. Os dados quantitativos e qualitativos apresentados neste estudo, reforçaram o período de rápidas mudanças e adaptações que perpassam o mundo do trabalho e a consequente busca de equilíbrio físico, psíquico e social que os empregados das empresas vêm enfrentando. Ao comparar-se os dados quantitativos e qualitativos que foram coletados e analisados, percebeu-se, em grande parte, similaridades e contradições entre ambos, talvez fruto da contemporaneidade, mas com certeza confirmadas pelo arcabouço teórico da Psicodinâmica. Dejours (1987;1996, 1999a; 1999b, 2004, 2005; 2007), Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994), Mendes (1999; 2002; 2004; 2007), Ferreira e Mendes (2003) e outros estudiosos do tema, concluíram que o trabalho, por si só, não é capaz de produzir desequilíbrios de ordem física, psíquica e social. Além disso, constataram que as pessoas têm uma tendência natural a buscar o prazer e evitar o sofrimento, mediante o desenvolvimento de estratégias (individuais e coletivas), para atenuar a consciência do sofrimento. Neste estudo, a dicotomia entre prazer e sofrimento se revelou em uma seqüência de possibilidades de vivências que nascem da imersão do ser humano nos contextos de trabalhos e a comparação entre os resultados dos dados quantitativos e qualitativos demonstraram esta afirmação. Em relação à escala do contexto de trabalho, os resultados apresentaram-se com média moderada (crítica) para os dois grupos pesquisados, resultados semelhantes foram encontrados por meio da MANOVA. Entretanto, pela análise do teste "t", foi possível verificar que os pesquisadores apresentaram escores maiores nos fatores da escala de contexto. 145 Analisou-se cada fator da escala de contexto separadamente. Para o fator condições de trabalho, as médias localizadas no nível satisfatório também foram semelhantes para os dois grupos, ou seja, permitia a manutenção do equilíbrio. O teste "t" identificou condições piores para os pesquisadores neste fator, entretanto, a MANOVA não apontou diferenças significativas. O predomínio de indicadores que denotam percepção de condições no trabalho piores para os pesquisadores, conforme ilustrado pelos dados quantitativos, é contraposto nos resultados qualitativos, pois se pôde perceber que as condições de trabalho para o pessoal de suporte à pesquisa são bastante insatisfatórias, eles manifestaram possuir um ambiente de trabalho quente e barulhento, problemas de concentração em função da disposição do mobiliário em “ilhas”, falta de equipamentos adequados e demora, em função de ausência de verbas ou de burocracia, para a aquisição de material. Já os pesquisadores indicaram possuir um ambiente de trabalho tranquilo e silencioso e os equipamentos necessários para suprir as necessidades. Quanto ao fator organização do trabalho, as duas carreiras apontaram médias moderadas, com os itens "o ritmo de trabalho é acelerado" e "a cobrança por resultados é presente" com os valores mais críticos. Porém também mais insatisfatórios aos pesquisadores quando analisados os testes "t", embora sem diferenças significativas quando foram analisados por meio da MANOVA. A análise qualitativa confirma os resultados da quantitativa para os dois grupos pesquisados. Tanto o pessoal da carreira de suporte, quanto o pessoal da carreira de pesquisa verbalizaram haver um fluxo de trabalho grande, excesso de burocracia e indefinições nas tomadas de decisão e diretrizes, que prejudicavam a fluidez das atividades. O fator relações socioprofissionais no ambiente de trabalho revelou média moderada para os dois grupos e resultados mais negativos para os pesquisadores no teste "t", mas sem diferenças entre os grupos para a MANOVA. Ao analisar-se os dados qualitativos, percebeu-se que as relações no ambiente laboral estão mais comprometidas do que se apresentaram nos dados quantitativos. Para o pessoal de suporte, os relacionamentos se davam de forma distante e formal. Sofriam discriminação em relação ao tempo de trabalho, à titulação e à ocupação funcional dentro da empresa, o que gerava sentimentos de desprezo e humilhação. Os trabalhadores se sentiam desgastados emocionalmente em razão da falta de respeito e das grosserias constantes, embora houvesse indícios de tentativa de mudança dessa situação por parte da organização. 146 Já os pesquisadores mostraram relações ambivalentes. Embora se agrupassem para atingir metas e objetivos, existiam disputas profissionais no local de trabalho, nem sempre veladas, entre dois grupos bem distintos de pesquisadores, o dos mais antigos e o dos mais recentes na empresa. Os pesquisadores creditavam esta situação também ao sistema de avaliação da unidade e de desempenho dos profissionais. Corroborando as verbalizações do pessoal de suporte à pesquisa, os pesquisadores relataram que os relacionamentos com o pessoal da carreira de suporte quase não aconteciam e quando existiam, de modo geral não eram satisfatórios. Em relação à escala de prazer e sofrimento no trabalho, os resultados apresentaramse, com média moderada (critica) para o pessoal de suporte e positiva (satisfatória) para o pessoal de pesquisa para o fator gratificação, moderadas (críticas) para as duas carreiras nos fatores liberdade e desgaste e as médias apontaram avaliação menos negativa (satisfatória) para os empregados das duas carreiras no fator insegurança. Assim, para os fatores liberdade e desgaste que se encontravam no nível moderado (crítico) para as duas carreiras, pode-se inferir que provavelmente as estratégias de mediação do sofrimento, estavam se mantendo de modo equilibrado. Para o fator insegurança, os itens "sinto-me ameaçado de demissão", "tenho receio de ser demitido ao cometer erros" e "sintome inseguro diante da ameaça de perder meu emprego" foram preponderantes para o estabelecimento dos resultados satisfatórios. Como os empregados são de um órgão público, estes resultados já eram esperados. Também no teste "t", não foram encontrados escores significativos nos fatores constituintes da escala de sofrimento em relação às duas carreiras, sendo encontrados resultados diferenciados apenas no fator gratificação, mais favorável aos pesquisadores. Quanto ao fator gratificação, vale a pena deter-se mais nos resultados encontrados. Em relação às médias, os seguintes itens foram preponderantes para a diferença de resultados encontrados entre os dois grupos, onde as maiores médias foram para os pesquisadores: "sinto-me identificado com as tarefas que realizo", "sinto disposição mental para realizar minhas tarefas", "meu trabalho é gratificante" e "meu trabalho é compatível com as minhas aspirações profissionais". Os testes "t" realizados entre os fatores e as duas carreiras, confirmaram os achados encontrados nas médias dos fatores e indicaram que o pessoal da carreira de pesquisa vivenciou mais sentimentos de gratificação do que o pessoal da carreira de suporte. Também a MANOVA, confirmou esta diferença, revelando que somente o fator gratificação apresentava diferença significativa entre os grupos. 147 Mediante os dados qualitativos, pôde-se inferir que tanto o pessoal da carreira de suporte à pesquisa quanto o da carreira de pesquisa evidenciavam sentimentos de desgaste, frustração, desvalorização, ansiedade e insegurança, bem como os de reconhecimento, gratificação e liberdade no trabalho, mostrando uma dualidade de reações frente à organização do trabalho. De certa forma, a maioria dos resultados quantitativos moderados encontrados nas médias, confirmou os dados qualitativos. Como afirma Dejours (1999b), o sofrimento é também resultante da falta de reconhecimento, pois, o reconhecimento se dá por intermédio do julgamento de beleza e de utilidade proveniente da chefia, pares de trabalho e comunidade. A falta de reconhecimento por parte da empresa também aparece como outra fonte de sofrimento. Seligman-Silva (1997), em estudo com ferroviários, identificaram, como neste estudo, sofrimento devido à falta de reconhecimento, da desvalorização do trabalho, injustiça e perda de orgulho pelo trabalho. Os dados quantitativos apenas mediram o grau das diferenças significativas no fator gratificação. Este resultado foi compreensível, haja vista a peculiaridade do conteúdo da tarefa que os pesquisadores desenvolviam. Nem sempre o pessoal de suporte à pesquisa, por motivos diversos, podia desenvolver atividades que se coadunassem com suas aspirações pessoais e profissionais, como era o caso do pessoal da carreira de pesquisa. Junta-se a isso, o fato de que a carreira de pesquisa fazia parte da área finalística da empresa, e, cultural e economicamente, as empresas reservam investimentos maiores para as pessoas alocadas na área fim da organização. Algumas diferenças entre dados quantitativos e dados qualitativos encontradas, puderam ser explicadas pelas técnicas de coleta utilizadas. A literatura da área aponta que, ao se coletar dados por meio de questionário, há sempre o receio, por parte de um grande número de respondentes, de que a empresa o identifique, mesmo garantindo-se de que este fato não ocorrerá. Este receio pode mascarar, de alguma forma os resultados, pois os empregados tendem a responder ao questionário de forma defensiva. Percebeu-se que de modo geral, este não foi um agravante nos dados quantitativos pesquisados, mas pode ter influenciado na discrepância de algum resultado encontrado. Embora na pesquisa qualitativa os sujeitos também sejam identificados pelo pesquisador, há uma permissão declarada do sujeito para que os dados sejam coletados e um "contrato" entre entrevistado e pesquisador, de que a identidade do respondente não será revelada. 148 Não se pretendeu aqui, valorizar mais uma técnica do que outra. Ambas foram igualmente importantes para os resultados finais encontrados, posto que, a quantitativa permitiu a coleta de dados sobre a percepção de uma população de maior tamanho e a qualitativa, permitiu explorar outros aspectos não contemplados nos referidos instrumentos. Exemplo preponderante destas afirmações calcou-se tanto na literatura da Ergonomia da Atividade, quanto na da Psicodinâmica do trabalho, que compartilham pressupostos a respeito de estratégias defensivas de mediação individuais ou coletivas e de mobilização individual ou coletiva. As escalas aplicadas, a não ser pela questão da reserva ao se expor à empresa, anteriormente citada, não contemplaram as estratégias defensivas ou de mobilização utilizadas pelas duas carreiras. Já nos dados qualitativos, puderam ser pesquisadas as estratégias defensivas para transformar ou mitigar o sofrimento oriundo do contexto de trabalho. Assim, reforça-se mais uma vez a necessidade de utilizarem-se duas técnicas distintas de coleta de dados para que se possa traçar com mais fidedignidade, a descrição da realidade dos fenômenos pesquisados. Relevou-se ainda que, tanto os empregados da carreira de suporte quanto os da carreira de pesquisa, de modo geral, utilizavam-se basicamente de estratégias individuais como racionalização e negação. Algumas estratégias de mobilização coletiva chegaram a ser explicitadas, como a "burla" à organização do trabalho, mas não foram tão contundentes para que se pudesse afirmar, apenas pelos dados coletados, de que elas realmente atuavam no coletivo de trabalho. Ressalta-se, entretanto, que a coleta de dados por meio de entrevistas individuais e não coletivas, pode ter interferido sobremaneira na identificação de estratégias coletivas. As verbalizações, apenas do pessoal de suporte, relataram que, quando havia falhas nas estratégias de defesa, surgiam casos de estresse, alcoolismo, Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT), dentre outros. Pôde-se inferir que os sentimentos de gratificação mais exacerbados na carreira do pessoal de pesquisa, propiciando mais prazer do que sofrimento, podiam estar minimizando a ocorrência de doenças profissionais como as acima citadas. Esta afirmação contudo, carece de maiores pesquisas para a sua confirmação. Quanto ao objetivo geral da pesquisa, de identificar se havia diferença de percepção entre duas carreiras distintas de uma mesma empresa, quanto à influência no contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento, os testes de correlação permitiram afirmar que as variáveis tanto do contexto, quanto às de prazer e sofrimento, se influenciam umas as outras, ou seja, todas as variáveis de contexto de trabalho investigadas, influenciam as 149 vivências de prazer e sofrimento, pois apresentaram correlações significativas. O teste Manova, permitiu identificar que a influência de todos os fatores do contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento foi percebida de modo significativo para os dois grupos, com predomínio do fator gratificação. Nos dados qualitativos, foram observadas controvérsias. Efetivamente os fatores do contexto de trabalho influenciavam as vivências de prazer e sofrimento nos dois grupos, entretanto, mesmo ao se considerar percepções e realidades distintas, havia diferenças expressivas entre os dois grupos apenas em relação aos fatores condições de trabalho e o fator gratificação. De modo geral, após a verificação de todos os dados, prevaleceram ainda os sentimentos de sofrimento aos de prazer, principalmente para o pessoal de suporte à pesquisa, embora os sentimentos de prazer se mostrassem efetivamente presentes, mesmo que mediados por estratégias defensivas que até à época da coleta dos dados, vinham mostrando-se eficazes. Os dados encontrados foram na contramão da afirmação de Mendes e Tamayo (2001) que apontam que o sofrimento dificilmente tem aparecido nas pesquisas como predominante no contexto organizacional, o que pode ser explicado, também, pela necessidade inerente à condição humana da busca constante do prazer e evitação do sofrimento. Para Ferreira e Mendes (2003), a construção de modos de trabalho com vistas a dar conta da discrepância entre o prescrito e o real pode funcionar como mecanismos defensivos de negação do sofrimento, podendo gerar uma não-reação diante das condições de trabalho. Segundo os autores, se não houver melhoria do contexto de trabalho com a finalidade de evitar o uso excessivo de estratégias, no futuro podem aparecer distúrbios graves de saúde. Os dados desse estudo também foram na mesma direção das afirmações de Dejours (1994b, 1996) e Ferreira e Mendes (2003), que apontam para a interdependência das dimensões do trabalho e o fato de as mesmas serem produtoras de prazer e sofrimento. A prevalência de uma vivência, ou de outra, depende da maneira em que tal contexto de trabalho é constituído e da relação que os trabalhadores estabelecem com este determinado contexto. De acordo com os resultados, foi possível identificar a existência de prazer e sofrimento influenciada pelo contexto de trabalho sob a perspectiva das duas carreiras estudadas, o que confirma os estudos de Dejours (1994); Dejours et al. (1994); Mendes (1999, 2004); Ferreira e Mendes (2001, 2003), Morrone (2001); Antloga (2003); Pereira (2003); Rocha (2003); e Vieira (2005), que afirmam ser o prazer-sofrimento um construto único e dialético, resultado da inter-relação entre os trabalhadores e determinado contexto de trabalho. 150 Vale ainda serem citadas pesquisas que se coadunaram com os resultados encontrados, tais como a realizada por Ribeiro, Leda e Mendes (2005), com profissionais de uma empresa pública, que abordaram a influência da organização do trabalho na vivência de sofrimento. Os autores enfatizaram que o sofrimento no trabalho estava relacionado à percepção da falta de espaço na organização para inovar e criar, à execução de tarefas padronizadas e repetitivas e à existência de relação confusa e conflituosa com a hierarquia. Outra pesquisa importante foi a efetuada por Morrone e Mendes (2003) que investigou o prazer e o sofrimento de trabalhadores em atividades informais sob o prisma da Psicodinâmica do Trabalho. O objetivo foi analisar as relações entre as vivências de prazer e de sofrimento, as características da organização do trabalho e a dinâmica do reconhecimento. Os achados demonstraram características de flexibilidade da organização do trabalho que favoreciam o prazer e a precariedade das condições de trabalho como elemento provocador de sofrimento. Inferiram que esse sofrimento era enfrentado por estratégias defensivas e ressignificado pela dinâmica do reconhecimento, que implicava a valorização da atividade informal como alternativa para sobrevivência e para fazer face ao desemprego. Concluíram que essa categoria profissional tentava encontrar caminhos para manutenção da saúde ao utilizar mecanismos que favoreciam o enfrentamento do sofrimento e a busca do prazer. Como reflexão de todo a análise realizada, algumas considerações tornaram-se relevantes. A visão utilitarista do mundo do trabalho contemporâneo mostra uma nova amplitude e uma necessidade premente de ressignificação do sentido que o trabalho assume para as pessoas, elevada centralidade do trabalho, independente de seu conteúdo. Morin (2001) e Morin, Tonelli e Pliopas (2003), fundamentadas em estudos empíricos, demonstram que o trabalho, além de fonte de sustento, é um meio de se relacionar com pessoas, se sentir como integrante de um grupo e da sociedade, para terem uma ocupação, um objetivo a ser atingido na vida, relevando a assunção deste tanto em uma condição de neutralidade quanto de centralidade na vida dos trabalhadores, assim como na sua identificação com a sociedade. Concluíram ainda que, um trabalho com sentido é aquele que realiza, satisfaz e motiva o sujeito para a execução da atividade. Esta ressignificação real ou simbólica ressuscita a necessidade de agregar-se mais conhecimento à percepção e exposição de sentimentos que as pessoas vivenciam no contexto profissional, posto que, cada vez mais precarizado, a manutenção do emprego em função da 151 necessidade de sobrevivência, acirra ainda mais as modificações de comportamentos e mudanças de atitudes no ambiente laboral, que, se mal administradas tanto subjetivamente quanto pela própria organização, podem levar ao desequilíbrio biopsicossocial. As reflexões de Antunes (2002) sobre as concepções do trabalho contemporâneo, revela a questão sobre a insegurança de manutenção da centralidade do status quo para os trabalhadores. Ribeiro e Leda (2005) reforçam a contextualização quando afirmam que, apesar do trabalho ser central para a maioria das pessoas, é crescente o número de trabalhadores que não reconhecem a esfera profissional como um espaço de realização, de reconhecimento, de poder ser útil à sociedade. Para eles, são poucos os que estão atuando em funções que permitem envolvimento e identificação. As organizações, forçadas pelo mercado econômico e pela competição exacerbada, que obriga à otimização de recursos, vêm percebendo a importância de manter no contexto de trabalho, por um período maior, empregados qualificados e inseridos na cultura já estabelecida pela instituição. As empresas e as pessoas nelas inseridas, ainda carecem de fundamentos que dêem o norte necessário para bem gerir os conflitos e confronto entre as necessidades subjetivas e este novo mundo do trabalho que se descortina. O trabalho é e continuará com sua centralidade na vida das pessoas no que concerne à construção da identidade, da saúde e da realização em quase todos os aspectos da vida do sujeito. Faz-se mister, portanto, a persistência em se analisar os fatores alavancadores, individuais e coletivos, do prazer no trabalho, haja vista que este continua sendo o mediador insubstituível da realização pessoal no campo social. Em seguida, o último capítulo apresentou as conclusões deste estudo. 152 6 Conclusão O objetivo geral deste estudo foi o de investigar se havia diferença na percepção de duas carreiras distintas de uma organização do segmento de pesquisa e desenvolvimento, carreira de suporte à pesquisa e carreira de pesquisa, sobre o contexto de trabalho, nas dimensões da organização, condições e relações socioprofissionais, e as vivências de prazer e de sofrimento advindas deste contexto, nos fatores gratificação, liberdade, insegurança e desgaste. Para tanto, foram utilizadas as abordagens da Ergonomia da Atividade e da Psicodinâmica do Trabalho. Nesse sentido, foram utilizados dois métodos para a coleta de dados. O método quantitativo se valeu da utilização da Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT) e da Escala de Indicadores de Prazer e Sofrimento no Trabalho (EIPST) e o método qualitativo constituiu-se na realização de entrevistas, que depois de transcritas, foram analisadas pela técnica de Análise do Núcleo de Sentido (ANS), elaborada por Mendes (1994), inspirada e adaptada da técnica de análise de conteúdo categorial, desenvolvida por Laurence Bardin em 1970. Nessa perspectiva, os resultados da pesquisa puderam evidenciar a influência existente entre o contexto de trabalho e as vivências de prazer e sofrimento, apontando as diferenças existentes entre as percepções dos dois grupos estudados. Os dois métodos utilizados para coleta de dados permitiram averiguar que os dois grupos apresentavam tanto vivências de prazer como de sofrimento oriundas do contexto de trabalho. Em alguns fatores, estas vivências foram percebidas de modo distinto pelos dois grupos. Foi verificado também que havia o predomínio das vivências de prazer para a carreira de pesquisa. Posto isto, identificaram-se elementos que interferiam negativamente no bem-estar dos empregados, assim como elementos que denotaram gratificação com o trabalho. O enfoque das duas abordagens, Ergonomia da Atividade e da Psicodinâmica do Trabalho, mostrou que as vivências de sofrimento estavam associadas às condições nas quais as atividades eram realizadas, às relações socioprofissionais e à organização do trabalho. Essas vivências eram mediadas por estratégias de defesa individuais, tais como a racionalização e a negação. Desta forma, algumas contribuições puderam ser trazidas por este estudo. Do ponto de vista teórico, esta dissertação apresentou uma ampla revisão de trabalhos publicados no país sobre a temática abordada, assim como, contribuiu para a compreensão da influência do 153 contexto de trabalho nas vivências de prazer e sofrimento, corroborando estudos anteriores e gerando hipóteses para estudos futuros. Os resultados encontrados permitiram diagnosticar como estava sendo mantido o equilíbrio biopsicossocial dos trabalhadores da organização pesquisada, implicando esse diagnóstico na identificação de fatores de riscos para qualidade de vida no trabalho dessas pessoas. Assim, os resultados poderão se constituir em relevantes informações para a definição de ações gerenciais, que devem favorecer a construção e desenvolvimento de políticas de saúde e implantação de programas de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), como estratégias para minimizar o sofrimento e o adoecimento, especialmente, para a organização em que o estudo foi realizado. Cabe ressaltar que ações prementes no sentido de minimizar os efeitos negativos das relações sociais entre as duas carreiras e entre os próprios pesquisadores, devem ser tomadas. Diante do exposto, conclui-se que os objetivos, tanto o geral quanto os específicos, foram atingidos. Este estudo obviamente apresentou certas limitações e lacunas que poderão ser abrangidos de modo a contribuir para pesquisas futuras. Um dos fatores limitantes relacionou-se ao tamanho da empresa. A limitação da abrangência da pesquisa às Unidades Centrais e Descentralizadas do DF, tendo a empresa uma distribuição espacial em várias unidades da federação, dificultou a obtenção de informações regionalizadas, importantes justamente pela distância existente, que minimizam as influências da Sede (Unidades Centrais) sobre as Unidades Descentralizadas. Isso se deu em função do pouco tempo disponível e da limitação de recursos tecnológicos para a realização da pesquisa, o que prejudicou a extensão das conclusões extraídas do estudo, para o restante da organização. Outra limitação diz respeito à coleta de dados que se deu em corte transversal, que só tornou possível descrever fenômenos inerentes a determinados grupos num dado momento. Embora as escalas utilizadas já estivessem validadas, por ser o estudo conduzido em uma única empresa de pesquisa, de um segmento específico, possivelmente os resultados não poderão ser generalizados para outras empresas e até mesmo, para outras Unidades Descentralizadas da Embrapa. No entanto, o estudo ofereceu informações relevantes sobre o contexto da organização pesquisada e sua influência nas vivências de prazer e sofrimento. Relevou-se ainda que, as variáveis do contexto de trabalho e a influência que exercem nas vivências de prazer e sofrimento na organização, captadas em um primeiro momento por 154 procedimento quantitativo, limitaram-se aos fatores constantes da Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho (EACT) e da Escala de Indicadores de Prazer e sofrimento (EIPST), escopo deste estudo, o que consequentemente excluiu outras variáveis, por ventura, identificadas em outros instrumentos. E embora tivesse sido utilizado também o método qualitativo para complementar e aprofundar o estudo, dentro do período de tempo em que a pesquisa se torna exeqüível, não se fez uso de outras técnicas de coletas de dados, como por exemplo, da observação direta, formação de grupos focais, dentre outras. Finalmente, a literatura científica da área aponta outros fatores que afetam as vivências de prazer e sofrimento, que não foram investigados no presente estudo, pela opção de verificar a influência do contexto de trabalho nessas vivências. Portanto, outros fenômenos que compõem o universo das instituições, não foram pesquisados, haja vista os “recortes” ou delimitações definidos. Os fenômenos abarcados nesta pesquisa mostram-se complexos na literatura de gestão de pessoas e das organizações, já tendo recebido, inclusive, a atenção de inúmeros pesquisadores nacionais e internacionais. Portanto, as discussões travadas neste estudo não foram suficientes para esgotar o tema que abrange diferentes outras possibilidades de abordagens. Desta forma e a partir das limitações identificadas, recomendam-se investigações futuras a respeito desse tema. Estudos com maior amplitude espacial geográfica, poderão corroborar ou não os achados e proporcionar outras facetas da temática abordada. A realização de coleta de dados longitudinal poderia permitir uma análise mais aprofundada dos dados encontrados. Por ter sido o estudo conduzido em uma única empresa de pesquisa, visando estabelecer estudos comparativos, constitui-se a possibilidade de futuras pesquisas sobre os fenômenos estudados, em outras organizações do mesmo segmento ou até mesmo em outras Unidades Descentralizadas da Embrapa. Cabe ainda, a utilização de outras técnicas complementares de coleta de dados, como por exemplo, a observação direta e formação de grupos focais, dentre outras, o que poderia agregar novas informações aos resultados. Posto que, outros fenômenos que compõem o universo das instituições, não foram pesquisados, investigar a existência de outras dimensões ou fatores constituintes da Ergonomia da Atividade e da Psicodinâmica que se correlacionem. 155 Assim, os resultados abriram novas fronteiras para contribuir com a constante construção do conhecimento. Fica, portanto, o desafio de futuras investigações empíricas sob diferentes perspectivas teóricas, de forma a avançar no entendimento dos fenômenos estudados. Como finalização de todo o trabalho realizado, algumas sugestões tornaram-se relevantes. Grande parte das organizações brasileiras tem estrategicamente inserida em suas políticas de gestão de pessoas, a implementação de ações que criem um ambiente de criatividade, inovação e harmonia do clima organizacional, por meio de promoção do desenvolvimento humano, valorização e motivação para o trabalho, ou seja, investimento nas pessoas no campo individual e grupal. Quando a cultura organizacional privilegia o sentimento de valorização dos empregados, estes se sentem mais comprometidos com o desempenho e livres para tomar iniciativas e orientar suas habilidades e experiências, contribuindo com a melhoria dos resultados da organização. Os projetos estruturantes, que compõem os pressupostos básicos das organizações, além de construir a identidade organizacional, têm o papel de mediar às contradições oriundas das relações de trabalho. Depreende-se que, para que isso ocorra, as empresas devem estabelecer diretrizes que priorizem o aprimoramento da política de gestão de pessoas; valorizem e ofereçam oportunidades de desenvolvimento educacional; orientem o processo de desenvolvimento profissional numa perspectiva multidimensional; promovam a capacitação de talentos, programem ações que criem um ambiente harmônico, além de buscar o fortalecimento de novas competências e das já existentes e o desenvolvimento de novos valores que incentivem a atualização e a integração intra e interinstitucional das pessoas. Por outro lado, esse não é um processo unilateral. Cabe também aos trabalhadores, a mobilização no sentido de obter resultados de melhoria das condições e organização do trabalho, por meio do exercício da cidadania. 156 REFERÊNCIAS ABRAHÃO, J.I. Ergonomia: modelo, métodos e técnicas. Brasília: Unb, 1993. ANTLOGA, C.S.X. Estilos de contato da organização com o funcionário e prazersofrimento no trabalho: estudo de caso em empresa de material de construção. 2003. 135 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social e do Trabalho) – Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, Brasília, 2003. ANTUNES, R. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 6 ed. São Paulo: Cortez, 1999. ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2002. BARCELLOS, J.A.P. As condições e a organização de trabalho dos policiais militares que executam o policiamento ostensivo: um estudo de caso na brigada militar em Porto Alegre/RS. 1999. 98 f. 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Na segunda, são apresentadas algumas afirmativas a respeito de sentimentos que você possa ter no seu dia-a-dia de trabalho. Leia atentamente o conteúdo dessas afirmativas e avalie o quanto cada uma delas descreve o que você pensa a respeito dos assuntos acima mencionados. Ao lado das afirmativas encontra-se uma seqüência ordenada em 05 pontos. Para responder a cada afirmativa, escolha o ponto da seqüência que melhor descreve a sua percepção e marque um X nos espaços correspondentes, colocados à esquerda de cada frase. Você só poderá marcar uma opção para cada afirmativa. Por favor, não deixe questões sem resposta. Desde já, agradeço a sua colaboração. ESCALA DE AVALIAÇÃO DE CONTEXTO DE TRABALHO – EACT Leia os itens abaixo e escolha a alternativa que melhor corresponde à avaliação que você faz do seu contexto de trabalho. 1 Nunca 2 Raramente 3 Às vezes 4 Frequentemente 5 Sempre 1. O ritmo de trabalho é acelerado. 1 2 3 4 5 2. As tarefas são cumpridas sob forte pressão temporal. 1 2 3 4 5 3. A cobrança por resultados é presente. 1 2 3 4 5 4. As normas para execução das tarefas são rígidas. 1 2 3 4 5 164 1 Nunca 2 Raramente 3 Às vezes 4 Frequentemente 5 Sempre 5. Existe fiscalização do desempenho. 1 2 3 4 5 6. O número de pessoas é insuficiente para se realizar as tarefas. 1 2 3 4 5 7. Os resultados esperados estão fora da realidade. 1 2 3 4 5 8. As tarefas não estão claramente definidas. 1 2 3 4 5 9. A autonomia é inexistente. 1 2 3 4 5 10. A distribuição das tarefas é injusta. 1 2 3 4 5 11. Os funcionários (servidores, contratados, estagiários) são excluídos 1 2 3 4 5 das decisões. 12. Existem dificuldades na comunicação chefia-subordinado. 1 2 3 4 5 13. Existem disputas profissionais no local de trabalho. 1 2 3 4 5 14. Existe individualismo no ambiente de trabalho. 1 2 3 4 5 15. Existem conflitos no ambiente de trabalho. 1 2 3 4 5 16. A comunicação entre funcionários (servidores, contratados, 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 estagiários) é insatisfatória. 17. Falta apoio das chefias para o meu desenvolvimento profissional. 18. As informações que preciso para executar minhas tarefas são de difícil acesso. 19. O bem-estar dos funcionários (servidores, contratados, estagiários) não é uma prioridade. 20. As condições de trabalho são precárias. 1 2 3 4 5 21. O ambiente físico é desconfortável. 1 2 3 4 5 22. Existe muito barulho no ambiente de trabalho. 1 2 3 4 5 23. O mobiliário existente no local de trabalho é inadequado. 1 2 3 4 5 24. Os instrumentos de trabalho são insuficientes para realizar as tarefas 1 2 3 4 5 25. O posto/estação de trabalho é inadequado para realização das tarefas. 1 2 3 4 5 26. Os equipamentos necessários para realização das tarefas são 1 2 3 4 5 precários. 27. O espaço físico para realizar o trabalho é inadequado. 1 2 3 4 5 28. As condições de trabalho oferecem riscos de acidente. 1 2 3 4 5 165 1 Nunca 29. 2 Raramente 3 Às vezes 4 Frequentemente As condições de trabalho oferecem riscos á segurança física das pessoas. 5 Sempre 1 2 3 4 5 30. Existe divisão entre quem planeja e quem executa. 1 2 3 4 5 31. As tarefas são repetitivas. 1 2 3 4 5 32. Falta tempo para realizar pausas de descanso no trabalho. 1 2 3 4 5 33. O material de consumo é insuficiente. 1 2 3 4 5 166 ANEXO B - Escala de Indicadores de Prazer-Sofrimento no Trabalho EIPST Leia as frases que se seguem analisando cada uma de acordo com o que você sente no seu dia-a- dia de trabalho. Marque, utilizando a escala abaixo, o número que melhor corresponde a sua avaliação. 1 Nunca 2 Raramente 3 Às vezes 4 Frequentemente 5. Sempre 1. Sinto satisfação em executar minhas tarefas. 1 2 3 4 5 2. Quando executo minhas tarefas, realizo-me profissionalmente. 1 2 3 4 5 3. Sinto-me identificado com as tarefas que realizo. 1 2 3 4 5 4. Sinto disposição mental para realizar minhas tarefas. 1 2 3 4 5 5. Tenho liberdade para dizer o que penso sobre meu trabalho. 1 2 3 4 5 6. Tenho espaço para discutir com os colegas as dificuldades com o 1 2 3 4 5 trabalho. 7. Tenho liberdade para organizar meu trabalho da forma que quero. 1 2 3 4 5 8. No meu trabalho posso usar o meu estilo pessoal. 1 2 3 4 5 9. Tenho receio de ser demitido ao cometer erros. 1 2 3 4 5 10. Sinto-me inseguro diante da ameaça de perder meu emprego. 1 2 3 4 5 11. Sinto-me inseguro quando não correspondo às expectativas da 1 2 3 4 5 empresa em relação ao meu trabalho. 12. Sinto-me pressionado no meu trabalho. 1 2 3 4 5 13. Meu trabalho é desgastante. 1 2 3 4 5 14. Sinto-me sobrecarregado no meu trabalho. 1 2 3 4 5 15. Meu trabalho é cansativo. 1 2 3 4 5 16. Sinto desânimo no trabalho. 1 2 3 4 5 17. Meu trabalho é gratificante. 1 2 3 4 5 18. Sinto orgulho do trabalho que realizo. 1 2 3 4 5 19. Meu trabalho é compatível com as minhas aspirações 1 2 3 4 5 profissionais. 20. O tipo de trabalho que faço é admirado pelos outros. 1 2 3 4 5 21. Sinto o reconhecimento da minha chefia pelo trabalho que realizo. 1 2 3 4 5 167 1 Nunca 22. 2 Raramente 3 Às vezes 4 Frequentemente 5 Sempre Sinto-me reconhecido pelos colegas pelo trabalho que realizo. 1 2 3 4 5 23. Sinto meus colegas solidários comigo. 1 2 3 4 5 24. Sinto-me ameaçado de demissão. 1 2 3 4 5 25. Sinto-me inseguro quando não atendo ao ritmo imposto 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 pela minha empresa. 26. Receio não ser capaz de executar minhas tarefas no prazo estipulado pela minha empresa. 27. Meu trabalho me causa estresse. 1 2 3 4 5 28. Meu trabalho me causa tensão emocional. 1 2 3 4 5 29. Meu trabalho me causa ansiedade. 1 2 3 4 5 30. Sinto frustração no meu trabalho. 1 2 3 4 5 Informações Complementares: Dados do Participante Sexo Idade 1( 2( ) Masculino ) Feminino 1( 2( 3( ) Ensino fundamental incompleto ) Ensino fundamental completo ) Ensino médio incompleto Estado civil 1 ( ) de 18 a 25 anos 2 ( ) de 26 a 35 anos 3 ( ) de 36 a 50 anos 4 ( ) acima de 51anos Número de filhos 1 ( ) Solteiro (a) 2 ( ) Casado (a) 3 ( ) Separado (a) 4 ( ) outros 1( 2( 3( 4( 5( ) Nenhum ) Um ) Dois ) Três ) acima de três Formação Tempo de Empresa 1( 2( 3( Cargo ) de 01 a 05 anos 1 ( ) Auxiliar administrativo ) de 06 a 10 anos 2 ( ) Assistente Administrativo ) mais de 10 anos 3 ( ) TNS 4( 1( 2( 3( 4( 5( 6( 4 ( ) Ensino médio completo 5 ( ) Superior incompleto 6 ( ) Superior completo ) Pesquisador 7 ( ) Especialização 8 ( ) Mestrado 9 ( ) Doutorado Tempo no Cargo Função 1( ) de 01 a 05 anos 1( ) Não possuo 2( ) de 06 a 10 anos 2( ) Supervisor 3( ) de 11 a 20 anos 3( ) Coordenador 4( ) mais de 21 anos 4( ) Chefe de Unidade Unidade de lotação 7 ( ) AUD ) Embrapa Café 8 ( ) SGE ) Embrapa Cerrados 9 ( ) GPR ) Embrapa Hortaliças 10 ( ) SPD ) Embrapa Informação Tecnológica ) Embrapa Recursos Genéticos e 11 ( ) AJU ) Embrapa Transferência de Tecnologia 12 ( ) ACS 13 ( 14 ( 15 ( 16 ( 17 ( ) ASP ) DAF ) DGP ) DRM ) DTI