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Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Diretor da série: Prof. Dr. Francisco Gilson Rebouças Porto Junior Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil Comitê Editorial e Científico: Profa. Dra. Cynthia Mara Miranda Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil Prof. Dr. João Nunes da Silva Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil Prof. Dr. Luis Carlos Martins de Almeida Mota Instituto Politécnico de Coimbra, Portugal Prof. Dr. Nelson Russo de Moraes UNESP - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil Prof. Dr. Rodrigo Barbosa e Silva Universidade do Tocantins (UNITINS), Brasil Prof. Dr. Rogério Christofoletti Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil Prof. Dra. Maria Luiza Cardinale Baptista Universidade de Caxias do Sul:Universidade Federal do Amazonas, Brasil Profa. Dra. Thais de Mendonça Jorge Universidade de Brasília (UnB), Brasil Profa. Dra. Verônica Dantas Menezes Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil Prof. Dr. Fagno da Silva Soares CLIO & MNEMÓSINE Centro de Estudos e Pesq. em História Oral e Memória Instituto Federal do Maranhão (IFMA) Dr. Luís Francisco Munaro Universidade Federal de Roraima (UFRR) Dr. José Manuel Peláez Universidade do Minho, Portugal Prof. Dr. Geraldo da Silva Gomes Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional do Ministério Público do Tocantins, CESAF/MPTO Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Elaine Jesus Alves Diagramação: Marcelo A. S. Alves Capa: Carole Kümmecke - https://www.behance.net/CaroleKummecke O padrão ortográfico e o sistema de citações e referências bibliográficas são prerrogativas de cada autor. Da mesma forma, o conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade de seu respectivo autor. Todos os livros publicados pela Editora Fi estão sob os direitos da Creative Commons 4.0 https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR http://www.abecbrasil.org.br Série Comunicação, Jornalismo e Educação - 30 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) ALVES, Elaine Jesus Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? [recurso eletrônico] / Elaine Jesus Alves -- Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2020. 115 p. ISBN - 978-85-5696-750-3 Disponível em: http://www.editorafi.org 1. Tecnologia; 2. Educação; 3. Pedagogia; 4. Ensino; 5. Docência; I. Título. CDD: 371 Índices para catálogo sistemático: 1. Professores, métodos e disciplinas 371 Sumário Prefácio...................................................................................................................... 9 Ganhar confiança para usar as TDIC na Práticas Pedagógicas Bento Duarte da Silva 1 Introdução ................................................................................................................ 16 Capítulo 1 .................................................................................................................. 21 Porque a resistência do professor? 1.1 Do quadro-negro ao tablet: concepções pedagógicas dos professores acerca das tecnologias .............................................................................................................................. 25 1.2 Caminhos percorridos pelas tecnologias dentro da escola .......................................... 39 Capítulo 2 ................................................................................................................ 46 Estudantes nativos digitais X professores imigrantes digitais 2.1 Rótulos e analogias sobre usuários das TDIC ............................................................... 47 2.1.1 Os Nativos e imigrantes digitais ............................................................................... 48 2.1.2 A Geração Net ............................................................................................................ 49 2.1.3 As Gerações X, Y, Z .................................................................................................... 50 2.1.4 Os residentes e os visitantes..................................................................................... 51 2.1.5 O homo zappiens ....................................................................................................... 52 2.2. Controvérsias sobre o perfil do usuário da internet ................................................... 53 2.3 Estudantes nativos digitais versus professores imigrantes digitais? ......................... 58 1 Professor Catedrático do Instituto de Educação da Universidade do Minho (Braga, Portugal) Capítulo 3 ................................................................................................................. 61 Modelo de formação docente do século XIX para professores do século XXI 3.1 Conceito de literacia digital ............................................................................................. 62 3.2 A formação do professor do século XXI ........................................................................ 66 3.3. Modelos de formação voltados para a integração das tecnologias no currículo escolar ..................................................................................................................................... 70 3.4 Uma proposta de formação docente voltada para a literacia digital .......................... 74 3.5 Aplicação prática do modelo FIPELD .............................................................................. 81 Capítulo 4 .................................................................................................................95 Você pode integrar tecnologias nas suas aulas! 1ª Compreenda o porquê os estudantes precisam aprender com tecnologias ................ 96 2º Esteja disposto a aprender sobre tecnologias ................................................................ 98 3º Experimente com um aplicativo que lhe seja mais familiar ...................................... 100 4º Após os testes, experimente ensinar com tecnologias junto a seus estudantes ........ 101 5º Avalie a experiência e reflita sobre pontos fortes e fracos...........................................102 6º Repita a experiência usando a avaliação anterior ........................................................103 7º Compartilhe suas experiências com os pares ...............................................................103 8º Ajude outros professores ............................................................................................... 104 9º Publique suas experiências ............................................................................................ 104 10º Nunca pare de aprender................................................................................................ 105 Considerações contínuas... ................................................................................................... 105 Referências ............................................................................................................. 107 Anexo ...................................................................................................................... 114 Regulamento do uso do smartphone/tablet na aula de Português Prefácio Ganhar confiança para usar as TDIC na Práticas Pedagógicas Bento Duarte da Silva 1 Como refere a autora, Elaine Alves, este livro é resultante dos seus estudos de doutoramento em Ciências da Educação, especialidade de Tecnologia Educativa, realizado no Instituto de Educação da Universidade do Minho (Braga, Portugal) e, também, de um pós-doutoramento na mesma especialidade realizado pouco tempo depois com a finalidade de afinar e testar o modelo proposto para a formação continuada de professores em literacia digital, intitulado “Formação Integrada, Permanente e Integrada para a Literacia Digital” (FIPELD). Na qualidade de orientador destes estudos, pretendo, desde já, atestar a excelência dos trabalhos acadêmicos realizados, como também foi reconhecido pelos membros do júri das provas públicas de doutoramento que aprovaram, por unanimidade, a tese de doutoramento com a nota máxima atribuída na Universidade do Minho: Muito Bom. Os leitores deste livro, depois de o lerem e analisarem as ideias nele expressas, poderão formular os seus juízos, mas estou certo que no final o veredito será idêntico aos dos membros da banca. Em meu entender, trata-se de uma obra muito útil e valiosa, que merece ser lida para comentarmos e nos apropriarmos de suas ideias, pois o propósito é apoiar os professores, sobretudo os mais resistentes, na integração das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação na Educação (TDICE) nas 1 Professor Catedrático do Instituto de Educação da Universidade do Minho (Braga, Portugal) 10 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? suas práticas pedagógicas. Decorrendo dessa finalidade, a autora intitula o livro com título sugestivo ─ Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? ─ e dá imediato resposta à questão: Porque os professores são fruto de uma geração que viu as tecnologias na escola como instrumentos para transmitir conhecimentos. Com efeito, não estamos num tempo em que o quadro negro e o manual escolar estruturavam o ambiente escolar, da sala de aula e marcavam o ritmo da ação pedagógica dos professores, como a autora tão bem reflete no ponto do livro que narra a passagem “do quadro-negro ao tablet”. Hoje em dia, na entrada da década 20 do século XXI, torna-se inquestionável que vivemos um momento societal de aprofundamento da cultura digital (cibercultura) marcado pelo forte pendor da mobilidade e ubiquidade. Desde o início do século XXI que assistimos a uma aceleração de várias transformações inéditas nas Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC), desde logo com as mudanças verificadas no sistema de informação Web, pois, se na primeira fase (década de 90 do século passado) esteve muito focalizada em dispositivos da pesquisa de informação (Web 1.0), já estamos a vivenciar a existência de uma Web Ubíqua (Web 4.0), cujo pleno funcionamento se estima para a próxima década (2020-2030). Simultaneamente, as inovações tecnológicas introduzidas nos dispositivos móveis (smartphones e tablets), desde 2010, passaram a possibilitar a convergência de uma grande variedade de serviços que potenciam o uso da plasticidade da linguagem hipermédia, materializada na produção de textos, imagens, vídeos, entre outras, estando dotados de sinal digital 4G (4ª geração móvel) adaptado à internet de banda larga, acessíveis em qualquer local e a qualquer momento. É esse cenário de inovação tecnológica que permite o aprofundamento da cultura digital, a chegada a uma “cibercultura móvel e ubíqua” que revoluciona a forma de estar no mundo e, naturalmente, deveria (e vai) provocar profundas mudanças nas formas de ensinar e aprender. Neste novo cenário a ação curricular tem nas TDIC um forte aliado para potencializar práticas de inovação pedagógica para, através de me- Bento Duarte da Silva | 11 todologias ativas, interativas e hipertextuais, inverter a lógica transmissiva da comunicação pedagógica de modo a possibilitar aprendizagens colaborativas e personalizadas. Neste movimento, a ação dos professores é crucial, pois, enquanto agente último na concretização do que a escola oferece aos alunos, acabam por ser um pilar fundamental do compromisso que tem de operar-se com a sociedade em que a escola está inserida. Acresce, ainda, que os estudantes que frequentam o ensino fundamental e médio, jovens do século XXI desenvolveram um verdadeiro “caso de amor” com as TDIC, em particular com as tecnologias móveis (smartphones e tablets), aspeto que não pode ser negligenciado pela escola e pelos professores. A autora dedica uma reflexão muito relevante sobre estes jovens do século XXI, ávidos usuários das TDIC, sendo cunhados com vários rótulos por diversos autores, contrapondo com as gerações anteriores à década de 80 do seculo XX, como: “nativos digitais” versus “imigrantes digitais”; “residentes” versus “visitantes” e “Gerações X, Y e Z”. Os professores integrariam a geração X (imigrantes digitais) ao passo que os jovens seriam os “nativos digitais”, integrantes da geração Y e Z, possuindo habilidades excecionais no uso das TDIC. A autora chama a atenção para vários equívocos que podem advir destas rotulagens. Diversos estudos dão razão à autora. Desde logo, porque nem todos os jovens são altamente engajados com as tecnologias e sabem tudo sobre o uso das informações disponíveis na internet, são um grupo muito minoritário dentro do universo de todos jovens do mundo. Ou seja, não é pelo fato de se ter nascido no século XXI que é se automaticamente “nativo digital”, pois a generalidade acede dum ponto de vista básico, meramente instrumental, usam de forma incorreta os buscadores de pesquisa, fazem uso inadequado das imagens, têm a criatividade limitada e, sobretudo, têm pouca capacidade crítica perante as tecnologias. Estas considerações constam em diversos estudos sobre a relação dos jovens com as tecnologias, em livro coordenado por Susana Lluna e Javier Pereira, intitulado 12 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? com a seguinte frase emblemática “los nativos digitales no existem”2. Segundo os autores competiria, assim, aos pais e aos professores educar seus filhos e alunos para um mundo digital, de forma a torná-los cidadãos críticos e autônomos capacitando-os para produzir o conhecimento e aplicá-lo corretamente na vida acadêmica e mais tarde, nas suas vidas profissionais. A publicação recente (2018) pela IEA (International Association for the Evaluation of Educational Achievement) do relatório sobre a literacia digital dos jovens (Preparing for Life in a Digital World3) vem corroborar as considerações feitas sobre a reduzida literária digital dos jovens. O relatório pretendeu avaliar duas áreas “Literacia em Computadores e Informação (CIL)” e “Pensamento Computacional (CT)”, com base num inquérito aplicado a 46 mil alunos do 8.º ano de escolaridade (entre 13 e 14 anos) e 26 mil professores, em 12 países, com o objetivo de perceber se os alunos de hoje estão preparados para estudar, trabalhar e viver num mundo digital. O estudo demonstra que apenas 2% dos alunos tem capacidade para aceder de forma critica à informação online. Ou seja, a grande maioria da apelidada geração Z dos nativos digitais não consegue avaliar se a informação online é fiável. No estudo demostra-se também que cerca de 25% dos alunos só consegue executar "tarefas elementares" de recolha e gestão de informação e têm um conhecimento funcional dos computadores enquanto ferramentas de trabalho, ficando no nível 1 "básico/funcional" (numa escala que vai até ao nível quatro). Dezanove por cento (19%) dos alunos estavam no nível 3, demonstrando capacidade de trabalho independente no uso de computadores, ferramentas de coleta e gerenciamento de informações, e apenas 2% estavam no nível 4, ou seja, tinham capacidade para avaliar criticamente as informações coletadas bem como criar produtos de informação. Estes dados dão inteira razão à autora Elaine Alves quando refere que os jovens altamente engajados 2 LLUNA, S. & PEDREIRA, J.. Los nativos digitales no existen. Como educar a tua hijos para un mundo digital. Barcelona: Planeta, 2017. 3 Fraillon, J., Ainley, J., Schulz, W., Friedman, T. & Duckworth, D. Preparing for Life in a Digital World. IEA International Computer and Information Literacy Study 2018. International Report. Amsterdam: IEA, 2018. Bento Duarte da Silva | 13 com as tecnologias são um grupo bem minoritário no universo de todos jovens. Por outro lado, o relatório põe em destaque o papel das escolas e dos professores, já que 74% dos países inquiridos admitem ter sido na escola que os alunos aprenderam a procurar informação na Internet, perceber se era credível ou se era relevante para incluir num trabalho. Ora, isto dá às escolas e aos professores uma grande responsabilidade, sendo importante assegurar que os professores se sintam “mais confiantes” em ensinar os alunos a lidar com as TDIC. Dar aos estudantes (e aos professores) acesso a equipamentos tecnológicos não resulta automaticamente no desenvolvimento de aptidões de literacia digital sofisticada. Os alunos precisam de ser ensinados a usar as TDIC de forma eficiente e os professores precisam de ser apoiados para as usar no ensino, nas suas práticas pedagógicas. Tornar os professores mais confiantes no uso pedagógico das TDIC é precisamente o principal propósito deste livro. Elaine Alves, ao constatar (empiricamente, no seu estudo de doutoramento) que o modelo de formação dos professores não é o mais adequado para responder aos desafios que a Sociedade da Informação coloca à escola e aos professores, porque, como diz, as instituições formadoras continuam a reproduzir nos cursos de formação docente um “modelo tradicional, vertical, rígido, voltado à transmissão de conhecimento”, quando os jovens do século XXI aprendem, agem e pensam diferente dos jovens do século XX. A pesquisa empírica do estudo do doutoramento, realizada com um grupo de professores participantes de uma formação a distância, revelou um baixo nível de literacia digital dos professores participantes, constatando, também, que seguem conceções tradicionais (conteudista e transmissiva) de ensino com expressa resistência à presença dos dispositivos móveis na escola (Alves, 2017)4. 4 ALVES, E. Formação de professores, Literacia Digital e Inclusão Sociodigital: Estudo de caso em curso a distância da Universidade Federal do Tocantins (tese de doutoramento. Braga: Universidade do Minho, 2017. Disponível em: http://hdl.handle.net/1822/48657. 14 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Em consequência, a autora, depois de analisar alguns modelos de formação docente desenhados para este novo contexto, como o modelo TPACK (Technological Pedagogical Content Knowledge) proposto por Punya Mishra e Matthew Koehler (da Universidade de Michigan, EUA)5, e o modelo F@R (Formação - Ação, Reflexão) proposto por Fernando Costa e Sofia Viseu (da Universidade de Lisboa, Portugal)6, avança com a sua proposta de formação docente em literacia digital, designada “Formação Integrada, Permanente e Integrada para a Literacia Digital”, cunhada com o acrónimo FIPELD. A compreensão do conceito de literacia digital é fundamental para elaboração deste modelo, entendendo-o autora em três vertentes: i) acesso à informação e à comunicação (“o saber procurar, guardar, arrumar, partilhar, citar, tratar e avaliar criticamente a informação pertinente, atentando também à credibilidade das fontes”); ii) compreensão crítica da TDIC e seus conteúdos (“quem produz, o quê, porquê, para quê, por que meios”); iii) uso criativo e responsável das TDIC para expressar e comunicar ideias e delas fazer um uso eficaz de participação cívica. É voltado para a reflexão e aplicação destas três vertentes que o modelo FIPELD está direcionado, de modo a dar confiança aos professores em integrar as TDIC nas suas práticas pedagógicas. Tem um funcionamento cíclico (reflexivo) em cincos fases: Motivação – Preparação – Ação – Avaliação – Reação. Há a recomendação que o modelo seja proposto em oficinas, pois nesta modalidade de formação os professores poderão vivenciar as cinco fases do modelo acompanhados do/a formador/a de forma que possam experimentar as tecnologias nas suas práticas letivas. O livro é enriquecido com os resultados da aplicação do modelo FIPELD em duas situações de formação. Uma, que decorreu numa modalidade de formação hibrida (com uma componente presencial e outra 5 MISHRA, P., & KOEHLER, M.. Technological pedagogical content knowledge: A new framework for teacher knowledge. Teachers College Record, 6 (108), pp.1017-1054, 2006. 6 COSTA, F., & VISEU, S. (2008). Formação-Acção-Reflexão: um modelo de preparação de professores para a integração curricular das TIC. In: F. Costa, H. Peralta, & S. Costa, As TIC na Educação em Portugal. Concepções e Práticas. Porto: Porto Editora, pp. 238-259, 2008. Bento Duarte da Silva | 15 online), e a outra que decorreu totalmente a distância. Em ambas, os resultados apontam para benefícios da formação, fazendo que os professores participantes refletissem sobre os ganhos e perdas que o uso das TDIC proporcionaram nas atividades de ensino-aprendizagem com os seus alunos. Estas aplicações possibilitaram que a autora terminasse seu livro com um decálogo de recomendações (dez passos) para que os professores ganhem confiança, ao alcançar proficiência em literacia digital, para integrar as TDIC nas práticas pedagógicas de forma eficaz e inovadora. Como o leitor deve ter já reparado, este livro tem como público-alvo os professores, sobretudo os mais resistentes em integrar as TDIC nas práticas pedagógicas. É um livro com grande riqueza teórica, assente em reflexões sobre estes novos tempos de aprofundamento da cibercultura (móvel e ubíqua) e seus desafios à educação e aos professores, trazendo ao debate ideias de autores com reconhecida investigação de mérito sobre estes temas, mas também de grande riqueza prática pois apresenta uma proposta de formação docente que visa dar confiança aos professores para integrarem as TDIC nas suas práticas pedagógicas. Porém, entendemos que o livro não se destina apenas aos professores resistentes, mas também aos mais entusiastas, os da geração Y (Internet) e mesmo os que estarão a chegar à profissão (os da geração Z), pois num tempo em que “Humanidade está perante revoluções inéditas”, na “Educação, a mudança é única constante”, como expressa o filósofo Yuval Harari7. Concordando com o filósofo, mais do que nunca se torna necessário a formação continuada, ao longo da vida. O modelo FIPELD é uma proposta de formação que responde aos desafios de Ser Professor no Século XXI. Braga, 23 dezembro de 2019. 7 HARARI, Y. 21 Lições para o Século XXI. Amadora: Elsinore, 2018. Introdução A ideia de escrever um livro com esse tema nasceu dos meus estudos doutorais cuja questão central era se os professores que se formam em cursos a distância e têm contato com as tecnologias durante essa formação, usam posteriormente suportes tecnológicos de forma interativa com seus estudantes. Foi realizado um estudo de caso com estudantes de um curso de licenciatura em Física numa universidade pública, sendo a maioria profissionais que já atuavam em sala de aula, e constatou-se que os estudantes da amostra pesquisada fazem uso das tecnologias no seu cotidiano, não são excluídos digitalmente. Porém, o faz de forma elementar e instrumental, o que denota que são marginalizados digitalmente no tocante à literacia digital1. A investigação mostrou que esta situação se reproduz na prática pedagógica deste professor que subutiliza as tecnologias em atividades de reprodução de conteúdos (ALVES, 2017). Logo, na nossa investigação percebemos que a raiz do problema encontra-se na formação deste professor que baseada na pedagogia tradicional de transmissão de conteúdos, reproduz essa prática quando vão lecionar. Usam as tecnologias, mas para reproduzir conteúdos como lhes foi ensinado nos cursos de formação. Por muitos anos isso ocorreu sem demais consequências, porém, nos últimos vinte e cinco anos com a expansão das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) algo mudou significamente no cenário mundial: os aparatos tecnológicos da escola não estão mais presos nos laboratórios e acessíveis apenas quando o professor leva os estudantes para “aulas de informática”, mas estão nas mãos dos seus estudantes (tablets, smartphones, notebooks, entre outros). 1 Literacia digital ou mediática que trata este livro diz respeito à capacidade do indivíduo de acessar, analisar, compreender e avaliar de modo crítico as mídias e ainda criar comunicações em diferentes contextos (LOPES, 2013). Elaine Jesus Alves | 17 Michael Serres (2013), filósofo francês, na sua obra A Polegarzinha, descreve o perfil do indivíduo inserido no mundo digital. O autor usou a expressão “Polegarzinha” para retratar a agilidade dos dedos das crianças e jovens quando utilizam seus dispositivos móveis para acessar a internet e os conhecimentos que ali se encontram disponíveis. Eles manipulam inúmeras informações ao mesmo tempo e em qualquer lugar: “por celular tem acesso a todas as pessoas, por GPS a todos os lugares, pela internet a todo saber” (idem, p. 19). As mudanças ocorridas nesta geração de “dedos velozes” não são apenas nas habilidades com o uso dos celulares e tablets conectados à internet. Serres cita a mudança na constituição familiar, no aumento da expectativa de vida, na convivência cotidiana com a pluralidade religiosa, cultural e étnica, e na informação baseada na mídia como elementos constitutivos deste novo ser que tem mente mais vazia por confiar o depósito das informações que precisa nos dispositivos tecnológicos. Muito se produziu na literatura sobre o fenômeno do uso exacerbado das mídias digitais pelas gerações mais jovens, o que gerou diferentes rótulos ou estereótipos para os usuários destas tecnologias: Geração Net (TAPSCOTT, 1998), nativos digitais versus imigrantes digitais (PRENSKY, 2001), residentes versus visitantes (WHITE & CORNU, 2011), Gerações X, Y e Z (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007) dentre outros. Em todos estes estereótipos, os adultos em meio à geração dos nativos digitais são caracterizados como indivíduos com dificuldades de incorporar informações rapidamente e se adaptarem ao manuseio dos aparatos tecnológico. Na analogia de Prensky, são chamados de imigrantes digitais. Estes precisam aprender a linguagem digital para não se sentirem marginalizados se inferiorizados em relação aos nativos. Prensky afirma ainda que mesmo que os imigrantes digitais aprendam a linguagem digital, eles ainda manifestam certo “sotaque” que pode ser observado quando usam as tecnologias. Um exemplo desta situação seria o hábito dos adultos (com mais de 40 anos) ao comprar um item, buscarem informações de seu uso em manuais impressos, e só em último caso recorrem a internet (ALVES, 2014). 18 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Acrescenta-se a este cenário o fato de que 97% da informação mundial estão digitalizadas e 80% estão disponíveis na internet (CASTELLS, 2014). O que falta aos jovens, segundo Castells, não são informações, mas critérios para buscá-las e combiná-las com projetos intelectuais. As redes de comunicação digital são atualmente a “Biblioteca de Alexandria”, que entre os séculos III a.C. e IV d.C. continha praticamente todo o saber da Antiguidade, em cerca de 700 mil rolos de papiro e pergaminhos. Lévy (2015) analisa que o acesso imediato a dicionários, enciclopédias, livros, vídeos educativos e outros dispositivos fornece ao usuário da internet acesso às imensas bibliotecas do mundo. É possível ser assinante de sites especializados e contar com a ajuda de redes de pessoas com assuntos de interesse em comum constituindo um saber colaborativo. Neste sentido, o usuário da internet tem diante de si um universo abundante de informação nunca antes disponibilizado na história da humanidade, basta-lhe apenas a capacidade de buscar, filtrar, analisar e fazer conexões críticas com os saberes que já possui. Possuir “a cabeça fora do corpo” implica em buscar as informações sem necessidade de memorizá-las como na época do ensino pela oralidade. Na analogia de Serres seria o mundo nas mãos destes seres conectados à internet. Portanto, estamos diante de uma situação nunca antes vivida na história da humanidade: as informações estão disponíveis na rede de internet e a escola não é mais o lócus privilegiado do saber. As pessoas, inclusive as crianças e jovens, têm em mãos a fonte das informações e podem além de acessá-las, editar, criar e compartilhar os dados, produzindo conhecimento. Mas, podem também ser meros reprodutores e compartilhadores de informações equivocadas, boatos e debates funestos. A diferença está no que DiMaggio e Hargitai (2001) questionaram: o que as pessoas estão fazendo e o que elas são capazes de fazer quando estão online? Levando ao campo educacional, o que o professor e os estudantes podem fazer aproveitando o potencial das tecnologias? Este livro tem como objetivo colocar em pauta o debate sobre o uso das TDIC no contexto educativo. Qual a razão para a resistência dos pro- Elaine Jesus Alves | 19 fessores em usarem as tecnologias numa proposta interativa com seus estudantes? Que mitos existem nos estereótipos nativos digitais, Geração X,Y,Z...e outros rótulos que denominam os jovens da atualidade? Como os professores podem se “atreverem” a sair da condição de imigrantes digitais e tornarem os mentores e orientadores dos chamados “nativos digitais”? Que modelos de formação docente possibilitaria a mudança para o protagonismo dos professores na integração das tecnologias nas suas práticas pedagógicas? Se você leitor está preocupado com essa situação e se pergunta porque ainda considera desafiador propor uma atividade com os estudantes que implique em usar um aplicativo em sala de aula, ou usar uma rede social para debates acadêmicos fora das paredes da escola, sem dúvida esta é uma leitura que te interessa. Ressaltamos que o termo “ensinar com tecnologias” presente no tema do livro e no decorrer dos capítulos vai à mesma direção do que Costa (2012, p. 43) chamou de <aprender com tecnologias>: “é assumir as tecnologias como instrumentos de trabalho do aluno que potenciam as formas de pensar, criar e representar o conhecimento, sobretudo quando a sua utilização é deliberadamente equacionada”. Assim, usar tecnologia com o aluno delibera estudo, preparação, domínio da ferramenta e motivação do professor para ir além da tecnologia como suporte para reprodução de conteúdos. Trata-se, portanto de uma perspectiva ambiciosa porque exige muito do professor uma vez que implica em sair da zona de conforto e enfrentar desafios e mudanças de atitudes e crenças. No primeiro capítulo, convidamos o leitor a fazer uma viagem histórica para retomarmos ao início da história da escola para compreendermos as raízes da inserção das tecnologias na escola, motivações e interesses imbricados. Este retrospecto responde a pergunta: Por que não consigo usar tecnologias interativas com meus estudantes? Fique calmo. A culpa não é sua. Na verdade você é um produto de toda uma geração que foi formada nos moldes tradicionais de “formação bancária” como discutia o sábio educador Paulo Freire. 20 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? No capítulo 2 apresentamos a desmitificação dos rótulos dados aos jovens da geração atual – nem todos são nativos digitais. Após a descrição dos principais rótulos que especialistas deram aos jovens que estão em permanente contato com as tecnologias, são apresentados estudos que comprovam que embora estes jovens tenham facilidade no manuseio das ferramentas web, eles manifestam baixa capacidade de análise crítica das informações acessadas e necessitam de ajuda para filtrar, sintetizar e construir conhecimento. Estes estudos também constituem um alívio para os professores que buscam usar tecnologias com seus alunos. O capítulo 3 tem como objetivo discutir sobre o modelo de formação hoje vigente nas faculdades e institutos formadores de professores. Os professores do nosso século estão sendo formados nos mesmos moldes dos professores do século XIX – numa concepção de transmissão de conteúdos em que o uso da tecnologia serve apenas como suporte para reproduzir informações ou repositórios de PDFs. Este cenário é fértil para a reprodução deste modelo às futuras gerações de professores considerando que a instituição escola/universidade resiste a mudanças. O capítulo apresenta modelos de formação de professores que podem contemplar a preparação destes para a integração das tecnologias em suas práticas docente. No capítulo 4 apresentamos dez passos que o professor interessado em usar o potencial das tecnologias em suas aulas pode tomar para iniciar uma mudança de postura e atitudes. Esperamos que este livro, produto de uma tese de doutoramento, possa cumprir seu objetivo de contagiar o maior número de professores possível a tirar proveito das tecnologias que já estão nas mãos dos seus estudantes. Temíamos que a tese, de leitura extensa e exaustiva, ficasse apenas nas prateleiras das bibliotecas ou nos repositórios sem aplicação prática. Portanto, desejamos que a leitura deste livro seja agradável e motivadora para os professores que almejam se preparar para ensinar/aprender com tecnologias junto a seus estudantes. Capítulo 1 Porque a resistência do professor? Se entregarmos um kit a um professor com uma câmera fotográfica, uma câmera de vídeo, um gravador de som, um reprodutor de áudio e um dispositivo que possibilita a navegação na internet para cada aluno e garantirmos ao professor que não terá de ensinar aos estudantes a manuseá-lo, será realidade ou ficção? (MOURA, 2009, p.74) A educadora Adelina Moura ao fazer esta reflexão, concluiu que o celular possui todos os aparelhos citados acima dentro do dispositivo. Acrescenta que o mais espantoso é que isso tudo é possível sem custos para a escola. “Por pouco hábil que o professor seja, poderá ver as enormes possibilidades que estas funcionalidades podem ter numa qualquer aula” (MOURA, 2009, p. 74), conclui a autora que é doutora na área das tecnologias educativas, professora do ensino básico e secundário e usa tecnologias interativas com seus estudantes. Refletindo nas palavras de Moura, seria óbvio que todas as escolas pedissem que seus estudantes levassem seus celulares para a escola. Seria um Kit multi-função gratuito que potencializaria as aulas com suas funcionalidades. Mas, sabemos que esta não é visão do professor e nem da escola em relação ao uso de celulares em sala de aula. No Brasil, existe uma proposta em análise na Câmara dos Deputados (PL 104/15[1]) que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis como celulares e tablets nas salas de aula da educação básica e superior de todo o país. O projeto prevê que os aparelhos somente serão admitidos em sala se integrar as atividades didático-pedagógicas e forem autorizados pelos professores. A justificativa do deputado autor do projeto é que “os equipamentos eletrônicos portáteis desviam a atenção do aluno do trabalho didático 22 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? desenvolvido pelo professor”. Certamente, se o professor não tiver um objetivo e um plano direcionado para usar o celular em uma determinada aula, os estudantes irão se dispersar. Na visão de Moura (2009), as causas da proibição do uso de celulares na escola parte dos professores que reclamam da falta de atenção e dispersão dos estudantes provocados pelos aparelhos. Segundo a autora, os pais dão celulares aos filhos na expectativa que tenham controle sobre eles, mas o que ocorre é que nem os pais, tampouco os filhos, que portam o celular na escola, usam-no com respeito; os pais ficam ligando para os filhos por motivos banais no horário das aulas, e os filhos conversando e trocando mensagens com os colegas na aula. Em consequência, o celular é “demonizado” pela escola e pelos órgãos reguladores da educação. A inserção de equipamentos tecnológicos nas escolas desprovida de uma discussão teórica e metodológica com os envolvidos (professores, técnicos educacionais, gestores escolares e estudantes) tem constituído outra barreira para a integração das tecnologias no ambiente escolar. Em 2005 foi realizado um estudo investigativo (SILVA & SILVA, 2005) nas escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico no Norte de Portugal, em que foram dirigidos questionários a todos coordenadores das 39 escolas da rede recolhendo dados sobre a integração das TDIC e as condições de funcionamento dos equipamentos. Também foi dirigido um questionário a todos os professores que lecionam nessas escolas sobre a utilização das TDIC. Segundo os autores da pesquisa, constatou-se um “choque tecnológico” advindo dos programas de aparelhamento das escolas com computadores, periféricos, softwares e internet e a consequente falta de integração dos professores com essas parafernálias tecnológicas. No tocante ao conhecimento dos professores na área das TDIC, Silva e Silva (idem, p. 2712) verificaram após tabulação dos questionários que “muitos possuem conhecimentos suficientes para poderem utilizar de forma adequada, pedagógica e comunicacional, o computador, o vídeo e, principalmente, a internet”. Sobre formação nesta área, apenas 17% a 15% mencionaram ter realizado. Elaine Jesus Alves | 23 No aspecto da utilização das TDIC, o estudo constatou que apenas um número reduzido de professores utiliza alguma tecnologia na preparação das aulas ou na sala de aula com os estudantes. Os professores com menos de 40 anos se destacaram como usuários mais frequentes das tecnologias, em especial o computador. Na dimensão sobre a atitude dos professores diante o uso das TDIC, as constatações, segundo autores são contraditórias: A análise da informação revela alguma contradição, pois, se a maioria dos professores discorda da ideia de que trabalhar com as TIC os põe tensos, o mesmo não se passa perante o facto consumado em que apenas uma minoria afirma que se sente bem a trabalhar com tecnologias. Se, por um lado, a maioria dos professores revela que tem prazer na utilização das TIC, por outro lado, também afirmam que não são de lidar bem com as tecnologias. O consenso é atingido quando a grande maioria dos professores (acima dos 90%) manifesta interesse e a intenção em aprender mais sobre aplicações das TIC na aprendizagem (idem, 2173). Assim, explica-se o termo “choque tecnológico”, pois ao mesmo tempo em que estes professores revelam sentir prazer quando utilizam as TDIC, eles não se sentem habilitados a lidar bem com elas. Embora o estudo tenha averiguado que as escolas possuam equipamentos multimídia como computador ligado à internet, verificou-se que esta prerrogativa não é suficiente para a utilização destes pelos professores. O referido estudo aponta para a formação dos professores como uma estratégia para vencer os obstáculos para qualquer inovação tecnológica inserida na escola. No Ensino Superior, num estudo realizado no Brasil, Mazurkievicz (2012) constatou que os professores recém-formados estão mais dispostos a usarem as tecnologias digitais na sua prática pedagógica. Entrevistas e relatos de experiências com professores universitários revelaram que os professores mais experientes no Ensino Superior demonstram ser mais relutantes em incorporar a tecnologia em suas aulas e na interação com os estudantes fora dos espaços escolares. Sobre a concepção de literacia digital para os docentes, o autor concluiu: 24 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Neste contexto, a concepção de literacia digital é desconhecida pelo maioria dos docentes, bem como o processo e também a utilização de TIC e ainda as atividades dos professores, dentro do AVA institucional, restringe-se a ferramentas “engessadas” visto que a utilização de outras ferramentas de interação com os estudantes não são estimuladas (idem p.173). Mazurkievicz aponta a formação continuada articulada com práticas de literacia digital no âmbito escolar como fundamental para a agregação dos professores aos recursos tecnológicos que estão nas mãos dos estudantes. Diante do exposto, parece contraditório que as tecnologias possam causar tensões nas escolas, considerando o seu potencial. Até mesmo, o leitor esteja se vendo nessa situação com seus estudantes dispersos com uso dos celulares em sala de aula, e talvez se sinta atônito sem saber como reagir diante deste cenário. Não se pode questionar que o uso de tecnologias em sala de aula com os estudantes requer habilidades e competências do professor. Além disso, a integração das tecnologias nas aulas deve estar inserida dentro de um plano de ensino com objetivos de aprendizagem claros. Para tanto, os professores precisam aprender e apreender as tecnologias para então as trabalharem com seus estudantes, levando-os a entender os dispositivos móveis como potencializadores da comunicação e construção de conhecimento, e que há momentos e ocasiões apropriadas para seu uso. Esclarecemos que neste livro, quando falamos do “uso das tecnologias nas aulas”, não estamos tratando de usar o Datashow e projetar suas aulas em forma de slides de forma expositiva. Você está usando uma tecnologia? Sim, o projetor de slides é uma tecnologia. No entanto, tratamos aqui de usar a tecnologia com os estudantes. Possibilitar que estes utilizem seus próprios dispositivos nas atividades em sala de aula ou mesmo interajam em redes sociais com objetivos educacionais. Nesta visão, as tecnologias são ferramentas de aprender e não apenas de ensinar como quando foram introduzidas nas escolas. Elaine Jesus Alves | 25 Mas antes de apresentarmos algumas formas de como você pode usar as tecnologias a seu favor com seus estudantes, vamos descobrir porque as tecnologias não são tão bem aceitas na área da educação como ocorre na área da medicina, por exemplo. 1.1 Do quadro-negro ao tablet: concepções pedagógicas dos professores acerca das tecnologias A tecnologia sempre esteve presente no âmbito escolar. Desde a invenção da escrita aos dias atuais com o uso de lousas digitais. O termo tecnologia vem do grego technê (arte, ofício) e logos (estudo de) e referiase a “termos técnicos, designando os utensílios, as máquinas, as suas partes e as operações dos ofícios” (BLANCO E SILVA, 1993, p. 37). Silva (2001, p. 842), esclarecendo sobre o mesmo termo, argumenta que tecnologia pressupõe “mais do que a familiarização com o saber técnico, uma formulação discursiva reflectida e teórica. Ao integrar os elementos básicos do fazer e a reflexão teórica do saber, a tecnologia pode ser considerada como a teoria da técnica”. O autor afirma que a escola foi herdeira do uso da linguagem escrita, que exigia do escriba além do conhecimento da técnica de cozer as tábuas de argilas ou preparar o papel (pergaminho ou papiro) e a tinta para escrever, demandava também uma formulação discursiva mais elaborada, o entendimento dos signos alfabéticos e sua posição correta, regras e códigos específicos. Assim, a escrita exigia do escriba um local, preparação, instrumentos, suportes e tintas. Igualmente, com a invenção das prensas tipográficas por Gutemberg, além das técnicas e do conhecimento para imprimir livros em série, eram necessárias máquinas e instrumentos específicos para realizar. Logo, as tecnologias são ligadas a instrumentos ou artefatos que possibilitam sua existência. Silva (2001, p. 842) chama esses instrumentos de máquina. Em suas palavras: “máquina apresenta-se como um objecto concreto, um instrumento, certamente produto da técnica e que necessita dela para a sua concepção, produção e utilização”. Silva explica que nem 26 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? sempre a técnica exige a existência de uma máquina, mas toda máquina ou instrumento é produto de uma técnica. Neste sentido, os objetos, instrumentos, ou artefatos tecnológicos usados na escola desde os primórdios da invenção da escrita são produtos de uma técnica e como tal não são neutros. De tal modo, a tecnologia e os artefatos produzidos por ela refletem os planos, propósitos e valores de uma sociedade. Considerando estes pressupostos, no âmbito da escola, a inserção de determinado artefato, mobiliário, instrumentos e outros acessórios de uso pedagógico estão imbuídos da concepção pedagógica da política educacional vigente. A tecnologia da escrita foi concebida no ensino baseado na oralidade e possuía instrumentos específicos que validaram essa concepção. Mais tarde com a invenção da tecnologia da imprensa e a produção de livros o foco era a pedagogia da transmissão. O quadro-negro e o giz foram, por muito tempo, a tecnologia mais usada pelo professor para “transmitir” o conhecimento a seus estudantes. Segundo Blanco e Silva (1993, p. 41) foi somente após a primeira guerra mundial que as escolas, sob pressão da indústria de instrumentação óptica, começaram a receber aparelhos audiovisuais que, de acordo com os autores, foram adquiridos precipitadamente "sem atender as necessidades de produção de documentos pedagogicamente adequados e à formação de professores para sua utilização técnica e didática". Na década de 1960 do século XX, com o avanço dos meios de comunicação em massa como a TV e o rádio, a discussão sobre o uso das tecnologias entrou na pauta dos elaboradores de currículo. A esta altura já se usava nas escolas mimeógrafos, retroprojetores, televisão, filmes e outros artefatos tecnológicos. No entanto, muito antes de se chegar às escolas a informática e outras inovações, um objeto simples, o quadro-negro, presente em todas as salas de aulas contribuiria para uma revolução pedagógica. Nóvoa (2014) chega a afirmar que o quadro-negro inventou o modelo escolar que perdura até os nossos dias. Também Hébrard (1995, p. 7) compartilha a mesma visão: Elaine Jesus Alves | 27 A invenção do quadro-negro é, portanto uma revolução pedagógica de grandes proporções. Permite a classes numerosas aprender a escrever e a contar. Permite também substituir a tradicional aprendizagem única da leitura pelo tripé do ler–escrever–contar, sem o qual, a partir do século XVIII, não existe mais escola, no sentido que esta palavra então adquiriu. Assim, segundo esses autores a introdução do quadro-negro (um dispositivo de ensino coletivo) nas escolas marcou a discussão sobre o modo de organizar a escola (organização das classes, mobiliário, currículo) e redefiniu a simultaneidade do ensino (BARRA, 2001). Para uma melhor compreensão de como isso ocorreu retomamos a Idade Média para conhecer o método de ensino daquele período e as mudanças trazidas com a introdução do quadro-negro nas salas de aulas. Entre os séculos XV e XVIII, o ensino era elitista e individual. As famílias aristocráticas contavam com um preceptor que atendia à educação moral e intelectual da criança ou jovem na sua própria casa. A educação nesse período era reservada a poucos privilegiados que tinham acesso aos mestres preceptores. A escola pública, gratuita e universal surge na Europa no fim do século XVIII, na égide da conflagração dos ideais iluministas. O contexto econômico dos países europeus era a crescente industrialização. Sousa e Fino (2008) afirmam que a expansão das fábricas provocou a migração do campo para a cidade de grandes massas de operários que passaram a viver em condições precárias e insalubres. As jornadas de trabalho excessivas em troca de salários míseros fizeram com que as pessoas se unissem em sindicatos trabalhistas para se fortaleceram em busca de melhores condições de trabalho. A instituição da escola pública para todos surge então como o espaço que poderia promover a pacificação social e formar um novo tipo de homem adaptado ao modelo de produção da fábrica. Assim, as escolas foram organizadas no modelo parecido os das fábricas: com sirenes, salas divididas para diferentes matérias, crianças separadas por grupos por faixa etária e testes padronizados para testar a “qualidade” dos mesmos. 28 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? A disposição do mobiliário da escola com lugares fixos individuais, quadro-negro na base da sala e mesa do professor à frente das carteiras dos estudantes promovia uma disciplina rígida que possibilitava a vigilância incansável do professor inflexível. Sobre este modelo de ensino em massa, Tofller (1970, p. 396) afirma: A solução só podia ser um sistema educacional que, na sua própria estrutura, simulasse esse mundo novo. Tal sistema não surgiu logo; ainda hoje conserva elementos retrógrados da sociedade pré-industrial. No entanto, a ideia geral de reunir multidões de estudantes (matéria-prima) destinados a ser processados por professores (operários) numa escola central (fábrica), foi uma demonstração de génio industrial. De tal modo, ensinar e treinar várias pessoas ao mesmo tempo constituía uma necessidade urgente naqueles tempos de expansão industrial. Emergiam as “escolas mútuas”, que de acordo com Cardoso (1999), surgiram na Inglaterra, no final do século XVIII e tiveram como mentores Joseph Lancaster e André Bell. A proposta consistia na divisão dos estudantes em pequenos grupos que recebiam a lição do professor. O aluno que se sobressaísse seria o “agente principal” e era previamente preparado pelo professor para ensinar os demais. Assim, um professor poderia “instruir muitas centenas de crianças” (EBY, 1978, p. 325) O “método mútuo ou simultâneo”, como foi chamado o ensino dirigido a muitos estudantes numa sala de aula, foi facilitado com a chegada do quadronegro nas escolas no início do século XIX. Sobre este novo método, Luzuriaga (2001, pp. 54-55) escreveu: [...] se instruía ao mesmo tempo a muitos estudantes com poucos professores, ficando os primeiros sob o cuidado dos chamados monitores. O sistema se estendeu rapidamente pelo aumento da população devido à Revolução Industrial e à necessidade de atender rapidamente ao seu ensino. Logo, o quadro-negro constituiu uma tecnologia inovadora que possibilitava ensinar mais pessoas ao mesmo tempo com baixo custo. Elaine Jesus Alves | 29 Segundo Bastos (2005), inicialmente, não só o professor tinha seu quadro, mas também os estudantes. A princípio, o quadro usado era feito de um pedra chamada ardósia, comum na Europa, cuja a vantagem era seu baixo custo, mas que por outro lado relatam-se suas desvantagens: era dura, pesada e fria. Barra (2013) relata que diante destes inconvenientes criaram-se novas formas de aperfeiçoamento da ardósia: fixação na mesa e enquadramento de madeira. Cada aluno possuía sua lousa de ardósia individual. Esta constituía de uma fina placa de xisto de ardósia retangular de 20 centímetros de cumprimento por 30 centímetros de largura protegido por uma moldura em madeira. Os estudantes usavam um lápis com ponta de ardósia para escrever na lousa, para apagar usavam um pedaço de couro parecido com sola de sapato ou mesmo cuspe (este último era proibido). Somente depois que os estudantes aperfeiçoassem a escrita usando a sua pedra de lousa, é que lhes era permitido começar a escrever com tinta e pena de aço. Figura 1 - Lousa de ardósia individual do aluno com lápis de ardósia Fonte: https://acervo.fe.ufg.br/index.php/lousa-de-ardosia-tendo-abaixo-lapis-1945) Segundo o autor, “a utilização de materiais como o papel ou a pena de ganso era inviável do ponto de vista econômico; o preparo da pena exigia habilidade e era tarefa do professor” (BARRA, 2013, p. 122). Também o papel era caro e exigia uma mesa com vários acessórios como tinteiro, pena, régua e lápis. Foi no final do século XIX com a consolidação dos sistemas públicos de instrução elementar e crescimento das exigências de um mínimo de mobiliário e material escolar que o uso do quadro-negro pelo professor 30 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? voltando ao ensino de muitos estudantes instala-se nas escolas e começa a ocupar um espaço central na sala de aula. Bastos (2005, p. 136) explica: O ensino mútuo/monitorial inaugura uma arquitetura do espaço escolar, em que mobiliário e material passam a ser dispositivos fundamentais para o sucesso do método. Os quadros-negros são sistematicamente utilizados, especialmente, para o desenho linear e para a aritmética – medem 1m de comprimento por 0,70 de largura; na parte superior, têm um metro móvel e são colocados no interior de cada semicírculo, sendo de uso constante dos monitores dos estudantes. Neste contexto, o quadro-negro, não mais era de ardósia, assumiu a forma de uma prancha de madeira com dimensões maiores, suportada por cavaletes, com superfície pintada de cor escura para ser usada com giz. Segundo Barra (2013), os primeiros quadros eram portáteis, reguláveis e móveis. Considerando que o livro naquele período era caro, a sua substituição por quadros com lições de leitura disponíveis nas paredes das salas de aulas conferiu um caráter social e coletivo a estas cartas murais que mais tarde foram substituídas pelo quadro-negro. Bastos ( 2005, p. 136) descreve as funcionalidades do quadro naquele contexto: As vantagens do uso do quadro-negro residiam na possibilidade de o professor utilizar-se desse dispositivo para o ensino simultâneo das primeiras lições de leitura e de escrita. O quadro-negro para o professor e a lousa para o aluno eram meios pelos quais seria conhecido o alfabeto e seriam desenhadas as letras. Além disso, era um excelente meio de ensinar em pouco tempo os estudantes a ler e escrever. Um auxiliar indispensável para a lição oral, um suporte de escrita – um ritual diário de escrita para fixar discursos e práticas pedagógicas. Assim, o quadro-negro era uma novidade bem aceita pelos estudantes e professores e marcou o vínculo entre o método (ensino simultâneo) e o material/instrumento (quadro-negro). O seu atrativo residia na possibilidade do professor escrever sua aula uma vez para que dezenas de estudantes simultaneamente pudessem ler e escrever nos seus cadernos. Este feito não era possível no modelo da instrução oral antes da introdução do quadro-negro nas escolas. Elaine Jesus Alves | 31 Figura 2 – Sala de aula com suporte do quadro-negro nos anos de 1930. Fonte: Arquivo do Pedagogical Museum of J. A. Comenius, Praga, Rep. Tcheca. O método mútuo, segundo Bastos (1999, p. 212) concretizou-se como “uma proposta redentora para os setores da produção, que anseiam por um operário dócil, disciplinado e limitado em sua capacidade humana aos rudimentos da leitura, escrita e aritmética”. Outro objetivo do método era reduzir custos e despesas, considerando que um professor podia ensinar vários estudantes ao mesmo tempo. Estudos realizados em diferentes partes do mundo sobre a difusão do método de ensino simultâneo identificaram sua ampla aceitação e revelou ainda que o quadro-negro foi absorvido sem ressalvas como parte integrante do método (LESAGE, 1999; CARDOSO, 1999; BARRA, 2001). Surge, portanto, a questão: por que o quadro-negro não encontrou resistência entre os professores daquele período? A resposta pode ser encontrada na concepção pedagógica vigente na época: instrucionista e conteudista. Nas palavras de Paulo Freire (1987), era uma concepção “bancária” de educação, em que a única margem de ação que se oferecia aos educandos era de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. O quadro-negro constituía um excelente retroprojetor deste método, visto que ao escrever no quadro, o professor projetava a todos os estudantes simultaneamente o conteúdo que desejava “depositar” nas suas mentes. Nóvoa (2014) analisa que a presença do quadro-negro na sala de aula há 150 anos instituiu um modelo de educação verticalizada centrada 32 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? no professor. Atribui ao quadro-negro três adjetivos que, na sua visão, definem a concepção pedagógica em torno deste dispositivo: vazio, fixo e vertical. O quadro-negro é um dispositivo vazio, tem utilidade pedagógica apenas se tiver um professor (pressuposto detentor do conhecimento) para lhe dar sentido ao escrever nele os conteúdos. Um quadro-negro sem nada escrito constitui tão somente um quadro com moldura pendurado na parede. Neste sentido, o quadro-negro vazio centralizava no professor a posse do conhecimento, fortalecendo a pedagogia transmissiva ou instrucionista vigente naquele período. Nóvoa atenta para o fato de o quadro-negro ser fixo e assim definir o espaço onde devem ocorrer os processos educativos - na sala de aula. Segundo o autor, “os prédios escolares, o mobiliário escolar e a organização dos estudantes são feitos para uso do quadro-negro” (Nóvoa, 2014, p. 1). O quadro-negro, permanecendo inerte na parede à espera do professor para preenchê-lo de conteúdos, constituía um instrumento simbólico da espacialidade em que deveriam ocorrer os processos educativos. Frago e Escolano (1998) ao tratarem dos simbolismos que a linguagem arquitetônica expressa, apresentam a disposição da arquitetura escolar como um espaço fixo estável e fixo determinado para o ensino. Assim, o espaço da aprendizagem era delimitado para a sala de aula especificamente a partir do professor à frente da sala fazendo uso do quadro-negro para transmitir/depositar conhecimentos aos estudantes. Ao descrever o quadro-negro como um dispositivo vertical, Nóvoa tratava da posição hierárquica que a disposição do quadro-negro à frente da sala de aula confere ao professor o papel de principal regente que submetia o saber aos estudantes sentados e em silêncio. Citando os estudos de Anthony Giddens, os autores Frago e Escolano (1998) mostraram que a separação das salas de aulas (graus, sexo, características dos estudantes) e a disposição das carteiras uma atrás da outra, separadas por pequenos corredores, tinha a função do professor exercer o poder disciplinador. Bastos (2005) cita um trecho de Ziraldo (1995, p. 98) que descreve uma sala de aula nos fins do século XIX: “Quando as aulas co- Elaine Jesus Alves | 33 meçaram, no ano seguinte, não era ela que estava sentada na cadeira, atrás da mesa, sobre o estrado, diante do quadro-negro”. O estrado mencionado no trecho de Ziraldo era uma elevação de madeira colocada logo abaixo do quadro-negro. No estrado encontrava-se a mesa do professor marcando o distanciamento e autoridade deste em relação aos estudantes. Neste sentido, o mestre à frente dos estudantes na sala de aula, posicionado sobre o estrado, munido do seu giz e quadro-negro carregava uma conotação de poder e autoridade cuja imagem era de detentor da instrução e do conhecimento. Ainda segundo Bastos (idem), no imaginário de muitos estudantes o quadro-negro configurava um instrumento de constrangimento quando tinham que ir à frente dos colegas resolver contas aritméticas ou pelo castigo de escreverem no quadro várias vezes as mesmas frases. Também era cansativo para os estudantes escreverem em pouco tempo disponível extensas lições e deveres para casa que o professor escrevia no quadro e rapidamente apagava para adicionar novas atividades. Portanto, o quadro-negro enquanto mobiliário escolar garantia ao professor sua autoridade máxima na sala de aula numa posição estratégica que permitia o controle e a vigilância sobre os estudantes. Figura 4 - Disposição do mobiliário escolar de uma sala de aula no início do século XX Fonte: imagem de internet. Disponível em http://www.fitini.net/escolacomercial/historia.html 34 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Nóvoa usou a metáfora destes três atributos do quadro-negro para mostrar que este foi facilmente aceite pelos professores porque validava o modelo de educação instrucionista e conteudista daquele período. O autor conclui que este ainda é o modelo vigente de educação na maior parte das escolas atualmente, mas que não condiz com a cultura contemporânea em que predomina o acesso dos jovens às tecnologias digitais de informação e comunicação. O que mudou? Nóvoa responde esta pergunta com outra metáfora, usando o tablet. Fazendo analogia sobre a aparência de formato de ambos os dispositivos (o quadro-negro e o tablet), o autor descreve três adjetivos antagônicos do tablet em relação ao quadro-negro que direcionam para uma nova concepção de educação: o tablet é cheio, móvel e horizontal. Figura 5 - Analogia do quadro-negro com o tablet Fonte: Bento Silva – palestra no I SEMEAD/RN, 2012 O tablet é cheio. Segundo Nóvoa, pode-se afirmar que o tablet é um dispositivo cheio, pois conectado à internet dá acesso a incontáveis informações e dados dos quais os estudantes têm acesso instantâneo. Portanto, “ele induz práticas pedagógicas centradas no estudo individual e na investigação, na relação, no trabalho conjunto e na cooperação” (NÓVOA, 2015, p. 24). Apesar da semelhança física no seu formato com as pedras de ardósias individuais, o tablet apresenta diferenças abissais Elaine Jesus Alves | 35 destas primeiras a começar pela sua possibilidade de armazenamento de dados, conexão às redes móveis de internet e comunicação/interação com outros usuários em tempo e espaços diferentes. O tablet é móvel. Ao trazer atenção da mobilidade do tablet, Nóvoa traça um antagonismo com o quadro-negro que é fixo. Ao contrário do quadro que delimita o espaço de sala de aula, o tablet possibilita a mobilidade do usuário permitindo que a aprendizagem ocorra em tempos e espaços diferentes dos preconizados pela escola. A mobilidade do dispositivo vai além do seu deslocamento físico, pois as pedras de ardósias individuais também eram móveis. O tablet permite a ubiquidade, portabilidade, conectividade, convergência de várias mídias, memória e armazenamento de dados. O usuário mesmo em deslocamento pode estar presente em vários lugares, realizando diversos tipos de atividades e interagindo com outras pessoas que também estejam conectadas. O tablet é horizontal. Nóvoa (2014, p. 1) argumenta: “enquanto o quadro-negro provoca formas ‘verticais’ de comunicação, a partir de um centro, o tablet sugere formas individualizadas de estudo e relações ‘horizontais’ entre estudantes, entre estudantes e professores, entre pessoas que estão dentro e fora da escola”. Assim, mesmo sendo um dispositivo individual, o tablet permite conexões com outras pessoas contribuindo para o trabalho colaborativo e a coautoria tornando a aprendizagem horizontal. O quadro-negro centralizava o processo educativo no professor, enquanto o tablet fornece diferentes fontes de pesquisas, possibilita contato com grupos de pesquisas em diferentes áreas, disponibiliza cursos e materiais didáticos de diferentes formatos (áudio, vídeo, texto) e permite a interação em comunidades de aprendizagem com especialistas e profissionais dos mais diferentes segmentos. Ao fazer essas metáforas Nóvoa argumenta sobre as mudanças que a revolução digital causou nas estruturas econômicas, sociais, culturais e educacionais. A transição na metáfora do quadro-negro para o tablet nos dá pistas de que os novos objetos tecnológicos rompem com a lógica instituída: o professor não mais é o detentor do conhecimento. Nas pala- 36 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? vras de Nóvoa (2015, p. 24), os saberes “já não são dominados primordialmente pelo professor, são mutáveis e apresentam várias possibilidades de utilização, que permitem obter respostas a perguntas várias, favorecem a autonomia do aluno, reforçam a sua capacidade de ação e fazem apelo a uma nova atitude do professor”. O autor destaca que não é a tecnologia instrumental em si que revoluciona as estruturas educacionais, nem os artefatos tecnológicos, mas a relação do homem com estes. A partir do momento em que o homem se apropria de uma tecnologia, esta o condiciona a novos hábitos, valores e interesses. Neste sentido, o descompasso que ocorre no âmbito educacional constitui o fato de que as crianças e jovens apropriaram-se rapidamente das tecnologias e os professores ainda resistem a elas. Seymor Papert (1993), argumentando sobre o modelo retrógrado do sistema educacional vigente na introdução do livro A máquina das Crianças, usa uma parábola para ilustrar que a escola precisa de mudanças estruturais para atender a este novo cenário. Na parábola, Papert descreve a reação de um grupo de viajantes do tempo advindos do século XIX que viajaram para o final do século XX. O grupo era composto de médicos e professores do ensino básico. Sobre o grupo de médicos visitando os hospitais do futuro, o autor relata que estes ficariam espantadíssimos com o avanço da medicina comparando a seu tempo e concluiriam que seria difícil para eles exercerem sua profissão diante de demasiado avanço no conhecimento, nas técnicas e nos aparelhos modernos. Por outro lado, Papert diz que o grupo de professores ao visitarem as escolas adentrariam na sala de aula e desconheceriam alguns poucos materiais novos, mas não teriam dificuldade de darem uma aula tradicional já que o quadro, o giz ou outro suporte para escrita estaria disponível. Assim, os professores sentir-se-iam à vontade para “transmitir” conhecimento na sua aula. Nesta perspectiva, Papert (1993) critica o papel conservador da escola, em que os objetos do cenário são mudados: tira-se o quadronegro e os trocam por lousas digitais, mas o professor continua sendo o Elaine Jesus Alves | 37 “transmissor” do conhecimento. Mas o que fazer se agora os estudantes têm em mãos suas próprias lousas em formato de tablets? O quadro-negro não constitui mais o artefato em que os jovens esperavam que o professor depositasse o conhecimento. Para os jovens de hoje, o quadro-negro não tem o mesmo significado que tinha para os jovens dos anos de 1950, que se não copiassem a lição do quadro teriam que pegar o caderno com o colega. Hoje, o jovem pode fazer uma pesquisa na rede de internet sobre qualquer área de conhecimento e conseguir as informações que não copiou. O colega pode tirar uma foto do quadro e enviar ao seu e-mail ou por mensagem instantânea. Pode-se até filmar a aula pelo celular e o colega assistir ao vivo. Não têm mais paciência de escrever no caderno, tiram foto do quadro-negro para estudarem em seus tablets. Fazem estudos com os colegas pelo Skype ou Hangouts, se comunicam por aplicativos rápidos de mensagem (whatsapp, messenger, imo). Portanto, é inegável que ocorreram mudanças significativas nas formas de aprender das pessoas, em especial dos jovens em idade escolar. Porém, continuar a educar esses jovens no mesmo modelo do século XIX com aulas expositivas, centradas no conteúdo do livro e escrita no quadro-negro não é eficaz, assim como não seria eficaz, retomando os termos de Papert sobre a evolução dos tempos, usar aparelhos e equipamentos médicos do século XIX em hospitais modernos. Seguindo esse argumento Nóvoa acrescenta (2014, p. 1): Há cerca de 150 anos, em meados do século XIX, inventou-se a escola tal como a conhecemos. Foi uma enorme transformação. Depois disso, houve muitas tentativas de mudança e de inovação, mas os seus traços fundamentais não se alteraram [...] uma coisa é certa: nada será como antes. Desde meados do século XIX, a educação foi pensada a partir de uma matriz escolar. Hoje tem de ser “desescolarizada”, tem de valorizar outros espaços sociais e culturais. Precisamos de um novo contrato social pela educação, que explore todas as possibilidades educativas da cidade e da sociedade (grifo nosso). 38 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Neste novo paradigma, o conhecimento ultrapassa os muros da escola e por meio das redes do ciberespaço passa a ser reelaborado, redesenhado e compartilhado para qualquer usuário. O papel do professor passa de detentor para condutor/orientador do conhecimento. Considerando que as informações estão disponíveis na rede, o professor passa a ter o papel de orientar os estudantes a acessar, organizar, sistematizar as informações relevantes dando um significado crítico a elas, transformando-as em conhecimento. Contudo, as tecnologias digitais não têm a mesma aceitação no âmbito da escola pelos professores e gestores como tiveram o quadro-negro. Este último foi aceite sem restrições porque seu uso reforçava a pedagogia bancária de transmissão de conteúdos centrada no professor. As TDIC, por sua vez, vão de encontro a esta pedagogia por retirar do professor o poder da informação e do conhecimento e disponibilizando estes gratuitamente nas redes de internet. No entanto, o papel do professor continua sendo fundamental. “É preciso compreender a importância do novo papel do professor. Os estudantes têm acesso direto, individual, às informações que estão na teia (web), porém necessitam da mediação do professor para transformá-las em conhecimento e aprendizagem”, disse Nóvoa (2014, p. 2). Muda-se a forma de se obter o conhecimento e consequentemente muda o papel do professor. Obviamente, outras tecnologias surgirão e o tablet como conhecemos hoje poderá ter se tornado um dispositivo ultrapassado e vire peça de museu como os quadros de ardósia individuais que os estudantes usavam no século passado. Embora não existam mais nas escolas, estes quadros cumpriram seu papel dentro do projeto pedagógico que estavam inseridos. Igualmente as tecnologias digitais presentes nas escolas não estão a concorrer com o professor e nem deverão substituí-lo, antes podem ser importantes aliadas no desenvolvimento de projetos de aprendizagem colaborativa. Ignorar as tecnologias no processo pedagógico seria um retrocesso às concepções de educação baseada na Elaine Jesus Alves | 39 transmissão de conteúdos introduzidos na idade média. O professor desconectado da rede perde infinitas possibilidades de interagir com seus estudantes no compartilhamento de informações, lugares, interesses e conhecimento. 1.2 Caminhos percorridos pelas tecnologias dentro da escola Quando as tecnologias ganharam força nos início dos anos de 1970 e muitos funcionários eram despedidos das fábricas e indústrias porque foram substituídos por máquinas, muitos professores temeram perder seus postos de trabalho para uma máquina, como já estavam em experimento máquinas de ensinar (SKINNER, 1972). No entanto, de acordo com Borba e Penteado (2001), com o passar do tempo através de diversos estudos, ficou provado que o fenômeno da substituição do professor pelos computadores não era algo a se preocupar, antes, a figura do professor ganhou destaque neste cenário, com o papel de tomar partido destas tecnologias para atuar na prática docente. Todavia, o medo de perder seus empregos cedeu lugar ao desconforto destes professores frente às mudanças que estavam ocorrendo com a introdução das tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) nas escolas. No Brasil, políticas públicas voltadas para a modernização das escolas investiram no aparelhamento tecnológico no âmbito de projetos como o Programa Nacional de Tecnologia Educacional (Proinfo) que tinha como objetivo no seu projeto inicial desenvolver ações de capacitação de professores e técnicos, implantar centros de informática na educação, apoiar a aquisição de equipamentos computacionais e a produção, aquisição, adaptação e avaliação de software. No entanto, estas iniciativas esbarravam na questão básica: o professor estava sendo formado para saber manusear a tecnologia instrumentalmente, com detrimento a ser preparado para trabalhar com a TDIC junto a seus estudantes aproveitando todo seu potencial. E esta situação sempre foi uma constante nas demais políticas de formação de professores para o uso das TDICS, con- 40 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? forme outros estudos revelam (ANDRADE, 2009; MORAES, 2003; FREITAS 2007). Neste período inicial em que os computadores eram alocados nos laboratórios de informática das escolas e nem todos os estudantes tinham acesso a uma máquina em suas residências, para o professor, mesmo não conhecendo muito bem a máquina, era relativamente mais fácil preparar uma atividade para os estudantes usarem os computadores dos laboratórios, nos dias designados, com a ajuda do suporte técnico de tecnologia da escola. Estas atividades muitas vezes envolviam uma pesquisa no buscador sobre um tema, redigir um texto no Word, assistir um vídeo, participar de jogos educativos ou visitar sites de museus, dentre outras. Como eram atividades simples, não demandavam do professor uma fluência tecnológica mais aguçada, mas conhecer alguns comandos e ter noção de navegação na internet. Os cursos de formação em informática educativa abarcava esta perspectiva tecnológica e capacitava o professor a usar instrumentalmente as tecnologias disponíveis. Além disso, quando foram introduzidas nas escolas, as tecnologias eram ferramentas do professor para dar suporte às atividades de ensino (COSTA, 2013).O mimiógrafo, retroprojetor, aparelho multimídia (datashow) foram concebidos para auxiliar o professor a reproduzir/transmitir informação a muitos estudantes ao mesmo tempo – mesma lógica em que foram difundidos os quadros-negros – para o ensino simultâneo (BASTOS, 2005). Enquanto as tecnologias se prestavam a esta finalidade nas escolas, estas foram bem aceitas pelos professores. Ocorre que as tecnologias que hoje “invadem” as escolas estão nas mãos dos estudantes – seus smartphones e tabletes. Hoje, as TDIC, antes “domesticadas” nos laboratórios de informática estão livres, móveis e conectadas. Esta “invasão” não tem a mesma receptividade que o quadro-negro, retroprojetores ou aparelhos datashow tiveram nas escolas. COSTA (2013, p.49) explica a razão: Ora, é precisamente aí que reside a diferença essencial das tecnologias de informação e comunicação hoje acessíveis: não são ferramentas destinadas Elaine Jesus Alves | 41 principalmente aos professores, mas sim ferramentas do aluno; não são ferramentas para apoiar a transmissão do conhecimento, mas sim ferramentas que permitem e implicam a participação ativa, por cada um, na construção do seu próprio conhecimento (idem, p.49). As tecnologias móveis, digitais e conectadas são também ferramentas do aluno, como argumenta Costa, não servem a transmitir conhecimento, mas potencializam as possibilidades do aluno, bem orientado pelo professor, a acessar informações que podem ajudá-lo a construir seu próprio conhecimento. Como já considerando anteriormente, no decorrer da história da humanidade o ser humano sempre utilizou da tecnologia disponível, em cada era, para comunicar e fez uso dela nos processos de ensinoaprendizagem, seja por meio das remotas pinturas rupestres, tabuinhas de argilas, rolos de papiros, manuscritos, livros, quadro-negro, mimeógrafo, retroprojetor, entre outros artefatos (SILVA, 2005). Todos estes artefatos constituíam “meios” para ajudar o professor a atingir um determinado objetivo didático, cumpriam o seu papel de apoio na transmissão da informação e reprodução do conteúdo de determinada área do conhecimento. No entanto, as atuais tecnologias presentes nos dispositivos digitais conectados à internet (como computador, notebook, tablet ou celular) não são apenas um meio para ajudar o professor a transmitir um determinado conteúdo, estão muito para além dessa função de apoio, pois, se usadas de forma adequada, potencializam e empoderam intelectualmente professores e estudantes. Por exemplo, o quadro-negro é especificamente um meio que o professor utiliza para dar (transmitir) determinado conteúdo nas suas aulas. Assim como o é o mais moderno Datashow ou qualquer dispositivo utilizado na sala de aula para apresentar um conteúdo, assumindo, de uma forma geral, a natureza de um documento em PowerPoint. Porém, na vida cotidiana o aluno não vai precisar aprender usar o quadro-negro ou o aparelho de Datashow para resolução de problemas ou tomadas de decisões. A Sociedade da Cibercultura, que 42 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? vivenciamos hoje, vai sim requerer que o que o jovem aluno aprenda é a acessar à informação na internet, a selecionar e filtrar informações relevante, a produzir um trabalho colaborativo em rede, a compartilhar o conhecimento produzido, ou seja, são estas as ações que os jovens devem aprender com o uso das TDIC e que serão úteis para a vida acadêmica, pessoal e profissional futura. Outra concepção equivocada é que as tecnologias não devem ser encaradas pelo professor como ferramentas para ensinar, mas como ferramentas cognitivas – para aprender (JONASSEN, 1996). Assim, o ato de ensinar deve consistir em atividades que proporcionem experiências interpretativas e facilitam a construção do conhecimento dos aprendentes. Jonassem cunhou o termo mind tools – ferramentas mentais ou cognitivas para definir um conceito de ferramentas de construção de conhecimento e facilitação que podem ser aplicadas a uma variedade de domínios de assunto. Jonassen diferencia entre “aprender de computadores”, como acontece na instrução assistida por computador; “aprender sobre computadores”, que trata do domínio da alfabetização na parte técnica da informática; e “aprender com computadores”, que constitui o domínio das ferramentas cognitivas (JONASSEN, 1996). Exemplos do que o autor considerava ferramentas cognitivas incluem mapas mentais, bancos de dados, mecanismos de pesquisa inteligente, hipermídia, redes semânticas, ambientes de construção de conhecimento colaborativo e ferramentas de apresentação. Jonassen não quis limitar o conceito de ferramentas cognitivas aos exemplos que descreveu, a ideia conceitual era mais importante do que as ferramentas em si. Desta forma, antes do surgimento da Web 2.0, este autor já tratava de aplicações que fomentavam a comunicação e a colaboração. Jonassen e Reeves (1996) categorizam aplicações de computador usadas como ferramentas cognitivas em várias classes: ferramentas de organização semântica, ferramentas de modelagem dinâmica, ferramentas de interpretação de informações, ferramentas de construção do Elaine Jesus Alves | 43 conhecimento e comunicação e ferramentas de colaboração e conversação. As ferramentas da organização semântica permitem que os aprendentes analisem e organizem o que eles conhecem ou o que estão aprendendo. A ferramenta mais usada neste aspecto são os mapas conceituais que são representações gráficas com nós (pontos e vértices) que representam conceitos e links, bem como a relações entre eles. Existem inúmeras ferramentas online que desenvolvem mapas conceituais: Mind Meister, Mind Node, Free Mind, X Mind, Mind Manager, Coggle, dentre outros. Essas ferramentas gráficas têm vários usos relevantes para a instrução e Aprendizagem - desenvolvimento da compreensão, análise e resolução de problemas. As ferramentas de modelagem dinâmica auxiliam os estudantess a explorar as conexões entre os conceitos. Inserem-se nesta categoria os spread-sheets (planilha interativa para organização, análise e armazenamento de dados em forma de tabela) experts systems (sistema informático que imita a capacidade de tomada de decisão de um especialista humano), microworlds ( linguagem de programação Lego), ferramentas dinâmicas de modelagem (simuladores. As ferramentas de interpretação da informação tem o objetivo de ajudar o aprendente a acessar e interpretar informações. Como, por exemplo, objetos de aprendizagem que fornecem modelos visuais de fenômenos complexos. As ferramentas de construção de conhecimento incluem as hipermídias e hipertexto como os wiki, programas de web design e de edição de vídeo que auxiliam os aprendentes na construção do conhecimento. Na categoria de ferramentas de colaboração e conversação estão as webconferências, aplicativos de mensagens instantâneas, blogs, redes sociais e outras aplicações que permitem que os usuários conversem entre si e troquem experiências com professores e especialistas (SANTROCK, 2010). Considerando o caminho que as tecnologias percorreram na escola, percebe-se que esta foi inserida por questões ideológicas para reforçar a autoridade do professor como o único detentor do co- 44 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? nhecimento. Vimos que o quadro-negro foi aceito pelos professores porque este reforçava esta concepção de educação bancária e conteudista. Quando as tecnologias digitais foram inseridas, a escola buscou domestica-la colocando os computadores nos laboratórios de informática com controle de professores e técnicos. Mas, a partir da expansão das redes de internet, do barateamento dos smartphones e a difusão de redes wifi, os dispositivos móveis ficaram mais acessíveis e adentraram as paredes da escola impossibilitando o controle da escola sobre o uso dos dispositivos. Em termos gerais, a instituição escolar não estava preparada para esta “invasão”. Tradicional e normativa, a escola estranhou a mobilidade, o acesso infinito a informações e a possibilidade de dispersão que os dispositivos móveis provocam. Quanto aos professores, a escola os enviou a cursos de capacitação técnica para que compreendessem a máquina. Mas não os preparou para usar as tecnologias pedagogicamente com seus estudantes. E chegamos à resposta deste capítulo: Por que a resistência do professor em integrar as tecnologias em suas aulas? Porque não foram preparados para isso. Porque são frutos de uma geração que viu as tecnologias na escola como instrumentos para transmitir conhecimentos (vide porque os slides no datashow são tão aceitos em aulas expositivas). Porque os professores ainda veem as tecnologias como ferramentas de ensinar e não de aprender colaborativamente. Todas estas razões justificam a resistência dos professores nessa questão do uso de tecnologia interativa com seus estudantes. Se você leitor, se identificou em algumas destas situações, não se sinta constrangido. Você faz parte do maior grupo de professores na mesma situação. Esta reconstrução de como as tecnologias foram inseridas nas escolas é importante para que você possa compreender as razões do porque a escola ainda resiste a mudanças. Mas você pode fazer a diferença! O primeiro passo já tomou ao ler este livro, pois significa que está interessado a fazer parte do grupo de professores que ousam integrar as tecnologias nas suas aulas. Elaine Jesus Alves | 45 No entanto, além das razões apresentadas nesse capítulo, há um fator de peso que impedem os professores de tomarem a iniciativa em usar tecnologias com seus estudantes: o choque de gerações. Com a difusão da teoria de que TODOS os jovens de uma determinada geração são super especialistas em tecnologias ou “nativos digitais”, muitos professores se inibem de usar qualquer aplicativo com seus estudantes, achando que eles têm mais conhecimento da tecnologia e algo pode dar errado. No próximo capítulo vamos considerar este embate: são TODOS os jovens nativos digitais? Capítulo 2 Estudantes nativos digitais X professores imigrantes digitais O cenário é uma sala de aula cheia de estudantes. Célia, uma professora do ensino fundamental de uma turma do nono ano planejou fazer uma atividade com os estudantes da qual eles possam consultar os celulares e fazer pesquisa para responder às questões de uma revisão. Embora sempre tivesse relutado em usar qualquer tecnologia com seus estudantes, Célia tinha feito um curso no fim de semana promovido pela secretaria da educação e aprendeu que tem muitos aplicativos que podem ser usados na sala de aula. Ela sentiu insegura em usar aplicativos, mas pensou em usar os motores de buscas para pesquisa nos celulares. Na hora da aula, Célia disse aos estudantes que aquela aula seria diferente. Os celulares não estavam proibidos e eles podiam usar para pesquisar e responder o questionário da revisão. Os estudantes gostaram da nova proposta e ficaram animados. Os questionários foram distribuídos e todos os estudantes pegaram seus celulares para consulta. Aqueles que não tinham internet reclamaram e a professora os deixou responderem em duplas. Iniciou um alvoroço entre os que iam responder sozinhos, e então Célia deixou todos em duplas. Os estudantes começaram a dispersar e a enviar mensagens uns aos outros com gifs, figuras e fotos. A professora inquieta ameaçava parar a atividade caso eles não se comportassem. Alguns estudantes tinham dificuldade de fazerem busca no celular e Célia tinha que os auxiliar. Outros terminaram as atividades rápidos e estavam ociosos. Ao final da aula, Célia estava exausta e prometeu a si mesma que nunca mais ia “inventar moda” e que seguiria com sua aula tradicional mesmo e que estes cursos da secretaria era tudo ilusão e que na prática não funcionavam. “Os celulares devem mesmo ser proibidos na aula”, concluiu Célia. Ao ler a descrição deste cenário, talvez você professor tenha se identificado com alguma das situações que a professora Célia passou. A sensação de que os estudantes vão se dispersar, ou de que vão fazer perguntas sobre a tecnologia da qual você não vai conseguir ajudar. E ainda existem as diferenças entre eles: alguns têm dispositivos com mais funci- Elaine Jesus Alves | 47 onalidades, outros nem possuem celulares; alguns têm mais habilidade com as tecnologias, pois sempre tiveram contato em casa, outros tiveram uma formação em casa restrita de tecnologias e têm dificuldades de manejá-las. Realmente, pensar em tudo isso causa um pânico inicial e talvez você se sinta um dinossauro perto dos estudantes que estão sempre a digitar com seus “dedos velozes” (SERRES, 2013). Neste capítulo vamos trazer argumentos que podem tranquilizar os professores que de alguma forma já tentaram usar tecnologias com seus estudantes e ficaram frustrados. E também vamos apresentar razões pelas quais você não precisa ter medo da geração chamada nativos digitais, Geração Z, Milenials e outros rótulos dados aos jovens da geração atual. O objetivo deste capítulo é abordar estes diferentes rótulos apresentados na literatura recente com o intuito de levantar provocações sobre algumas lacunas existentes nestes modelos prontos de rótulos descritivos dos usuários das tecnologias. Na primeira seção apresentamos as analogias mais conhecidas atualmente contrapondo com críticas de autores contemporâneos que divergem entre si no que diz respeito a esta temática. Na segunda seção discutimos como essas analogias tomadas como verdades absolutas geram “pânico moral” nos adultos mais velhos, principalmente nos professores. A terceira seção trata da desconstrução destas analogias e do novo papel dos professores diante do cenário da era digital. 2.1 Rótulos e analogias sobre usuários das TDIC O fenômeno do uso exacerbado das mídias digitais gerou diferentes rótulos ou estereótipos para os usuários destas tecnologias: “nativos digitais” versus “imigrantes digitais” (PRESKI, 2001), “residentes” versus “visitantes”(WHITE e CORNU, 2011), “Geração X, Y e Z” (TAPSCOTT, 2010), dentre outros. Todos esses rótulos e analogias buscam descrever o comportamento dos usuários da internet e outras mídias encaixando-os 48 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? em algum perfil que defina suas competências e habilidades quanto ao o uso das TDIC (ALVES, 2014). Nesta seção apresentamos os principais rótulos e analogias direcionados aos jovens da geração atual. Não podemos esgotar aqui todos os rótulos, mas apresentamos os principais. 2.1.1 Os Nativos e imigrantes digitais Nativos digitais e imigrantes digitais são dois conceitos desenvolvidos por Marc Prensky em um ensaio desenvolvido em 2001, no início do século XXI, com o objetivo de caracterizar, desde suas observações sobre o comportamento de estudantess e professores nas universidades, a maneira como que novas tecnologias foram integradas nos Estados Unidos, especialmente aquelas ligadas ao mundo digital e redes sociais. Segundo Prensky, se você nasceu depois de uma data por volta de 1984, você entra na categoria “nativo digital”. Prensky (2001) ao chamar a Geração Net de nativos digitais faz analogia da linguagem digital como se fosse um segundo idioma que o indivíduo tem que aprender ao imigrar para um país estrangeiro. Assim, para o autor, os indivíduos podem ser “nativos digitais” ou “imigrantes digitais”. Estes primeiros são, portanto, os jovens adultos que “nasceram no mundo digital” e cresceram usando a internet e são acostumados a obter informações de forma rápida e interagem diversas mídias ao mesmo tempo em função do contato diário e contínuo com computadores, videogame, áudio e vídeo digital desde quando eram crianças. Nesta analogia, estes jovens pensam e processam informações de forma diferentes dos seus pais de uma geração anterior. Por outro lado, a geração que nasceu no período anterior a 1980, o autor a classifica como imigrantes digitais. Estes precisam aprender a linguagem digital para não se sentirem marginalizados ou inferiorizados em relação aos nativos. Prensky afirma, ainda, que mesmo que os imigrantes digitais aprendam a linguagem digital, eles ainda manifestam Elaine Jesus Alves | 49 um certo “sotaque” que pode ser observado quando usam as tecnologias, um exemplo seria o hábito destes que, ao comprar um item, buscam informações de seu uso em manuais impressos e só em último caso recorrem a internet. 2.1.2 A Geração Net A expressão Geração Net foi usada pela primeira vez por Tapscott (1998) e refere-se a crianças nascidas depois do ano de 1985 do século passado. Nesta altura, a utilização da internet estava apenas emergindo como um fenômeno mundial. A principal premissa da teoria da Geração Net é a familiaridade. Para Tapscott, as crianças nascidas nessa geração não têm medo de tecnologias, adquirem naturalmente as habilidades necessárias para usar as informações coletadas na rede, e usam os recursos digitais como se a tecnologia fosse parte do seu cotidiano e da paisagem que os rodeia (COMBES, 2009). Seguidores desta teoria descrevem os pertencentes à Geração Net como indivíduos com maior acesso à internet e recursos eletrônicos o que confere a esta geração uma base de conhecimento maior que possibilita maior independência e capacidade de questionar e confrontar informações. Afirmam que, por intuição, os membros da geração net são comunicadores visuais por excelência, têm fortes habilidades visuais-espaciais e facilidade de integrar o mundo físico com o virtual (OBLINGER & OBLINGER, 2005). São considerados aprendizes exploradores que retêm as informações descobertas e as usam de forma inovadora. Para Tapscott (1998), a Geração Net está reconfigurando a forma de trabalho, tornando-a mais colaborativa, quebrando a hierarquia rígida das organizações, forçando-as a repensarem outras formas de recrutar, desenvolver e supervisionar talentos. O autor cita a mudança no perfil dos consumidores desta geração, exigem produtos melhores, reclamam na rede quando não estão satisfeitos e avaliam os produtos e lojas compartilhando informações úteis a outros consumidores. Na família, são 50 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? especialistas em internet e ajudam os pais e outros parentes mais velhos a usar os dispositivos tecnológicos. Tapscott conclui que a Geração Net está transformando a maneira como os serviços do governo são concebidos e está produzindo cidadãos mais engajados civicamente promovendo um poderoso ativismo social. 2.1.3 As Gerações X, Y, Z Na mesma linha de divisão por gerações, Tapscott e Wilians (2007), detalhando sobre a Geração Net, dividem os indivíduos em gerações, subdivido-os e classificando-os por letras do alfabeto. São a Geração X (nascidos entre 1965 e 1976), Geração Y (nascidos entre 1977 e 1997) e Geração Z (nascidos após 1998 até os dias atuais). A Geração X foi marcada principalmente por vivenciar a tensão e o fim da guerra fria, e hoje correspondem aos adultos com média de 40 anos de idade. Considerando que naquele período os aparelhos voltados ás mídias, como o computador, ainda estavam em aprimoramento e não era algo comum para a população, os da geração X caracterizam-se pela sua capacidade de incorporar informações rapidamente e se adaptarem. Constitui na visão dos autores, a geração que viveu a chegada dos jogos de vídeo, a televisão a cabo e via satélite, e do vídeo cassete (aparelho que permitia assistir filmes locados em casa). A Geração Y é classificada por Tapscott e Wilians (idem, p.29), como a geração que vivenciou a ascensão exponencial do computador pessoal, da internet e criação de comunidades e redes sociais. Os autores argumentam: “enquanto as crianças da Geração Internet assimilaram a tecnologias porque cresceram com ela, nós como adultos, tivemos de nos adaptar a ela – um tipo diferente e muito mais difícil de processo de aprendizado”. Assim como a Geração X, os da Geração Y tiveram que assimilar o uso das tecnologias no seu cotidiano. No entanto, mesclam a mídia impressa com a eletrônica, são mais seletivos no uso das TDIC, prezam a segurança na internet tomando precauções no uso de senhas e Elaine Jesus Alves | 51 compras eletrônicas. Usam a internet para fins práticos como estudo, busca de informação, pagamento de contas, entretenimento e outras atividades (Oliveira, 2009). No entanto, Tapscott e Wilians (2007) avançam na descrição das gerações e apresenta a Geração Z, também conhecida como Geração Next. Nascida após 1998, presenciaram a inserção de diversos aplicativos de mídias como o YouTube (2005), My Space (2003), Twitter (2003) e ainda redes sociais como o Orkut (2004), Facebook (2006), Linkedin (2003) entre outros. A geração Z acompanhou o boom do uso de celulares smartphones e tablets com acesso a internet. O conceito de Geração Z propagado por Tapscott e Wilians tem similaridades com os nativos digitais de Prensky. Ambas as gerações são caracterizadas por terem crescido em um mundo digital e que estão desde sempre familiarizados com as parafernálias das TDIC como dispositivos móveis de comunicação em tempo real, tocadores de músicas e de vídeos, comunidades e redes virtuais. 2.1.4 Os residentes e os visitantes White e Cornu (2011) propõem uma metáfora baseada na analogia da ferramenta, espaço e lugar para descreverem os usuários das tecnologias, desconstruindo a ideia de geração de Prensky e Tapscott. White e Cornu argumentam que a natureza virtual da web proporciona aos seus usuários estarem “presentes” em diferentes lugares ao mesmo tempo e que, assim como os locais físicos em que é possível percorrer ou navegar, os softwares são criados para navegabilidade em plataformas e através de ferramentas, como redes sociais e fóruns, proporcionam encontros virtuais entre os indivíduos. Portanto, os autores classificam os usuários das TDIC não em função do período de nascimento, mas do perfil de utilização das ferramentas e das formas de acesso no espaço virtual. Nessa classificação os usuários da internet são classificados como “visitantes” ou “residentes”. O visitante utiliza a internet para resolver questões prá- 52 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? ticas e se desconectam evitando deixar uma identidade digital. Não são utilizadores intensivos das aplicações da internet, nem participam de redes sociais porque não sentem necessidade de pertencer a este espaço. Para os autores, os utilizadores apenas utilizam as ferramentas que lhe são úteis durante o tempo e espaço necessário e “saem” da internet como se fossem apenas visitantes deste espaço. Os residentes, por sua vez, na classificação de White e Cornu (2011), vivem uma parte significativa do seu tempo conectado. Usam a internet não apenas para realizar serviços práticos como atividades bancárias, compras ou pesquisa, eles veem a web como um espaço para expressar sua opinião. Os residentes utilizam as ferramentas da web como parte integrante de suas vidas, para eles a internet e todos os aparelhos conectados a ela são cruciais no seu dia-dia. No entanto, White e Cornu explicam que a analogia de tempo e espaço permite que os indivíduos transitem da posição de residentes para visitantes e vice e versa sem rotulá-los. 2.1.5 O homo zappiens O homo zappiens é outro rótulo para os usuários especializados em tecnologia. O termo foi utilizado pelo professor Wim Veen, da Universidade de tecnologia de Delft, na Holanda, e Bem Vrakking, aluno e pesquisador de pós-graduação em Engenharia de Sistemas. Para os autores, a expressão homo zappiens diz respeito à geração emergente confrontada pela globalização que conectada à rede processa uma sobrecarga de informação procedente de diversas mídias e tecnologias (VEEN & VRAKKING, 2009). Para os autores, três aparelhos tiveram grande importância a influenciar estes indivíduos: o controle remoto, o mouse do computador e o telefone celular. De posse do controle remoto, as crianças aprendem precocemente a “zappear” por vários canais de TV e interpretar imagens antes mesmo de aprenderem a ler. Com o mouse do computador, nave- Elaine Jesus Alves | 53 gam em vários sites da internet, clicam em ícones, abrem e fecham janelas, fazem buscas de palavras desconhecidas, assistem vídeos, jogam e conversam com outros jovens em redes sociais. E com o aparelho celular conectado à internet acessam à rede em qualquer lugar, ouvem músicas, jogam enquanto digitam mensagens e enviam fotos nos aplicativos de mensagem instantânea. Veen e Vrakking (2011, p. 2) descrevem a diferença destes com as gerações anteriores: O Homo zappiens vive em um mundo cujos recursos de informação são muito ricos. Ele ado-tou o computador e a tecnologia tal como as antigas gerações fizeram com a eletricidade: a informação e a tecnologia da informação tornaram-se parte integrante de sua vida. As gerações anteriores consideravam a tecnologia, como câmeras de vídeo e aparelhos eletrônicos, algo difícil de dominar. O Homo zappiens, porém, trata a tecnologia como um amigo e, quando um novo aparelho surge no merca-do, pergunta por seu funcionamento e quer entender como tal aparelho poderia ajudá-lo em seu cotidiano. Para ele, o principal critério para adotar a tecnologia não é o fato de o software ou programa ter boa usabilidade, mas o fato de dar conta ou não de suas exigências e necessidades. Assim, para esses indivíduos a tecnologia faz parte do seu cotidiano e não pensam nelas como aparelhos dos quais devem aprender a usar, eles primeiro os usam e aprendem a utilizá-los com a experiência. Os autores concluem que os recursos tecnológicos disponíveis fornecem ao usuário o controle de uma ampla variedade de informações. O simples apertar de um botão pode ativar, acessar, navegar, interromper o uso destes recursos. Teoricamente, o usuário teria o poder e controle de decisão sobre qual informação escolher com eficiência e utilizá-la para seu benefício. 2.2. Controvérsias sobre o perfil do usuário da internet Embora alguns dos rótulos apresentados neste capítulo tenham se popularizado ao ponto de tornarem-se senso comum, há uma linha de teóricos que argumentam contra a existência de uma “geração” de nati- 54 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? vos digitais, ou geração Net evoluída e altamente especializada na internet (BENNETT, MATON, E KERVIN, 2008; COMBES, 2009; LAGE E DIAS, 2012; BROWN E CZERNIEWICZ, 2010). Estes teóricos afirmam que embora exista jovens altamente engajados com as tecnologias, este grupo é minoritário dentro do universo de todos jovens do mundo. Esperamos que os estudos apresentados aqui possam confortar os professores que até hoje acreditavam que todos os jovens são altamente engajados com as tecnologias e que já sabem tudo sobre o manejo das informações disponíveis na net. Benett, Maton e Kervin (2008) citam estudo realizado em larga escala com 4.374 estudantes nos Estados Unidos, onde se constatou que, embora a maioria possuísse computadores pessoais e telefones celulares, o uso mais comum pelos jovens era a navegação em redes sociais, processadores de texto, sites de buscas e e-mail. Apenas uma pequena proporção dos entrevistados (cerca de 21%) estavam envolvidos na criação do próprio conteúdo e multimídias para a Web. Outro estudo citado pelos autores, realizado na Austrália com estudantes universitários, também revelou que, apesar dos estudantes estarem usando uma ampla gama de tecnologias no seu cotidiano, existem áreas onde o uso e a familiaridade com as ferramentas tecnológicas estão longe de serem universais. Bennett et al. (2008) afirmam que existe em maior escala jovens que não têm as habilidades e competências para o uso crítico das mídias do que os jovens “nativos digitais”. Os autores chamam a atenção para o perigo das generalizações designando toda uma geração nascida a partir de uma data como pessoas altamente especializadas no uso da internet, o que poderia levar aos formuladores de políticas públicas negligenciarem um largo contingente de pessoas que, mesmo nascidas no período de boom das tecnologias, continuam à margem delas e não possuem habilidades e competências para seu uso em benefício próprio. Na análise de Combes (2009), a teoria da Geração Net ou Geração Y de que os indivíduos nascidos depois de 1985 têm uma compreensão em Elaine Jesus Alves | 55 profundidade e quase um conhecimento intuitivo de como usar a tecnologia simplesmente porque eles não conheceram o mundo sem internet, não tem base empírica e teórica. Na sua pesquisa de doutorado, a autora realizou estudo com 533 estudantes do primeiro ano do ensino médio (entre 18 e 22 anos) de duas universidades. A primeira fase da pesquisa consistiu num inquérito com perguntas para determinar os níveis de confiança e o uso da tecnologia dos participantes. A terceira fase do estudo incluiu entrevista semiestruturada com 40 estudantes que se destacaram com uma gama de atributos da Geração Net. Os mesmos foram convidados a realizar duas tarefas: uma informal, em que o participante deveria coletar dados e informações na Web para uma viagem de férias, e outra acadêmica, em que o participante deveria buscar informações na rede, interpretá-las e preparar uma apresentação. Ao observar os participantes realizarem as atividades, a autora constatou que estes se mostraram bastante confiantes, realizaram multitarefas, mas eram dependentes de motores de buscas e não iam além do primeiro resultado que encontravam na sua pesquisa. Na pesquisa acadêmica, não consultaram bibliotecas digitais especializadas, e a maioria usou apenas a Wikipédia. Igualmente, Lage e Dias (2012) apontam para estudos realizados em amostras alargadas da população europeia que revelam a fragilidade das habilidades e competências destes jovens em relação ao manuseio das TDIC. As autoras citam um estudo publicado em 2008 (Google Generation Project), realizado pela University College of London, em que se desmistificou a aparente familiaridade com computadores da “geração Google” realçando a sua dependência dos motores de busca e a baixa capacidade analítica crítica de avaliação das fontes de informação. Lage e Dias (2012, p. 7) analisam o perfil destes jovens: Os estudantes não valorizam suficientemente as questões de relevância e pertinência da fonte, mesmo no ensino superior, selecionando na sua maioria, as primeiras soluções apresentadas, tendo preferência em textos resumidos. Preferem utilizar plataformas interativas de informação em vez 56 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? de consumo passivo dos dados e utilizam com frequência o “copy/paste” sem referenciar as fontes, revelando alguma incapacidade em interpretar corretamente referências bibliográficas. Portanto, é precipitado presumir que o jovem conectado na internet através de tablets, smartphones, notebook ou outros dispositivos, sejam “nativos”, “residentes” ou das gerações X,Y,Z possuam habilidades excepcionais no uso das TDIC. Lage e Dias (idem, p. 7) concluem: “as pessoas passaram utilizar a Web de forma natural, pois foram alfabetizadas digitalmente”, mas não sabem organizar as pesquisas e utilizar as informações obtidas. Também Demo (2011, p. 16) corrobora que existe uma “euforia” em torno desta nova geração, sendo vista quase como uma nova espécie, e difundem-se mitos que generalizam em excesso inovações que ainda nem foram consumadas. Acrescenta que “a nova geração nem sempre se mostra tão hábil assim, em especial no que se refere a potencialidades de aprendizagem” (p. 16). Trata-se de um “campo transitório”, finaliza Demo, embora os estudantes transitem pelo campo informal das tecnologias, uma considerável parte não possui competências e habilidades para o manejo crítico das mídias. Brown e Czerniewicz (2010) realizaram estudos entre jovens no ensino superior do Sul Africano e constataram que não se pode assumir uma homogeneidade quando se trata das experiências dos jovens com as tecnologias e que dentro de cada grupo etário existem estudantes com baixo, médio e alto nível de experiência. Os autores contestam que haja uma geração de nativos digitais, mas que existe apenas uma pequena porcentagem de estudantss que preenchem os critérios da Geração Net, antes o maior contingente são de jovens que têm baixa literacia digital. O rótulo “nativo” é criticado pelos pesquisadores como alusivo a colonização – lembrando a colonização europeia a alguns países e ilhas do continente africano. Para Brown e Czerniewicz, os nativos digitais são os povos colonizados e foram forçados a adotar normas, atitudes, valores culturais dos colonizadores (grandes corporações de tecnologia). Levando à analogia de Prensky dos nativos digitais, os autores questionam se os Elaine Jesus Alves | 57 nativos digitais não são uma categoria mais valorizada ou especializada, antes são frutos da colonização ocidental que usa os meios de informação e comunicação para ditar a linguagem, pensamento, cultura e valores que devem ser adotados no cenário emergente de tecnologias. Ainda conforme Luna e Pedreira (2017) constitui um erro considerar que os nativos digitais são competentes no uso das TDIC porque nasceram cercados por elas. Assim como é absurdo pensar que uma criança já sabe dirigir porque nasceu numa casa que tem vários carros. Os autores argumentam que embora os jovens usem os aplicativos dos smartphones e acessem redes sociais, postam fotos, assistam vídeos e outras atividades com tecnologias, em geral usam errado buscadores de pesquisa, fazem uso inadequado das imagens, têm a criatividade limitada (até porque os aplicativos facilitam ao máximo as ações), têm pouca capacidade crítica e fazem uso inseguro das tecnologias (perigo com vírus, exposição de dados pessoais, etc). Neste sentido, Luna e Pedreira concluem que os chamados “nativos digitais” precisam ser educados, preparados e orientados para aproveitar todo o potencial que as tecnologias têm para emancipá-los, torná-los cidadãos críticos e autônomos capacitando-os para produzir o conhecimento e aplicá-lo corretamente na vida acadêmica e mais tarde, nas suas vidas profissionais. Do exposto, fica evidente que nem todos estão conectados à rede, e tampouco todos jovens são altamente especializados em tecnologias. Mesmo os que têm facilidades com o manuseio de tecnologias digitais carecem de senso crítico para selecionar as informações realmente relevantes e filtrar conteúdos fúteis. Em proporção de quantidade, existem mais pessoas com dificuldades em lidar com a tecnologia do que especialistas. Logo, classificar uma geração que nasceu depois de um determinado ano como nativos digitais, ou geração net e outros rótulos, não tem base teórica comprovada. 58 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? 2.3 Estudantes nativos digitais versus professores imigrantes digitais? A discussão que desmistifica o rótulo de estudantes super especialistas em tecnologias constitui um alívio para nós professores. Isso significa que não precisamos ter medo de usar tecnologias com eles, pois embora tenham conhecimento técnico, na sua maioria, não possuem habilidades de literacia digital ( capacidade de acessar, analisar, compreender e avaliar de modo crítico as mídias e ainda criar comunicações em diferentes contextos). Porém, considerando que estes jovens têm pouco senso crítico para acessar, filtrar, selecionar, sintetizar as informações de forma a produzir conhecimento, na posição de educadores, precisamos estar preparados para ajudar estes jovens a terem o acesso necessário e depois adquirirem literacia digital para navegarem no oceano de informações da rede de forma a tirarem proveito disso na sua vida acadêmica, profissional, social e política. Nas palavras de Almeida e Valente (2011, p. 93): O professor que se reconhece como protagonista de sua prática e usa as TDIC de modo crítico e criativo, voltando-se para a aprendizagem significativa do aluno coloca-se em sintonia com linguagens e símbolos que fazem parte do mundo do aluno, respeita seu processo de aprendizagem e procura conhecer seu universo de conhecimentos por meio das representações que os estudantes fazem em um suporte tecnológico. Neste sentido, o professor na era digital há de entender que não compete a ele ser o “difusor do conhecimento”, pois os meios tecnológicos já o fazem com certa eficácia. Antes precisa aprender a manipular a tecnologia e orientar os estudantes a manipularem para que ambos não sejam manipulados por ela. Nas palavras de Gadotti (2003, p. 32) o professor “deixará de ser um lecionador, para ser um organizador do conhecimento e da aprendizagem (...) um mediador do conhecimento, um aprendiz permanente, um construtor de sentidos, um cooperador”. Este novo perfil de professor, demandado pela expansão das tecnologias, Elaine Jesus Alves | 59 requer das instituições de ensino (da escola à universidade) que revisem os processos de aprendizagem com vista à formação de sujeitos com visão crítica das mídias, com capacidade de produzirem e difundirem conhecimento na web e portadores de competências para o trabalho colaborativo. Portanto, nesse cenário o papel do professor ganha destaque no tocante a ser o farol neste oceano de informações em que seus estudantes estão a navegar. Mas para isso o professor precisa conhecer as rotas, os procedimentos e as informações relevantes que possam conduzir seus estudantes com êxito a terras firmes do conhecimento. Os estudantes podem ter em mãos os mapas (celulares conectados na internet), mas existem ali muitos roteiros, muitos atalhos, um labirinto de informações por vezes desnecessárias e não confiáveis. Cabe ao professor orientar, designar critérios de buscas, exigir uma leitura crítica do aluno, questionar, provocar, fazê-lo pensar e então construir seu arcabouço de conhecimento seja sozinho ou trabalhando colaborativamente em grupos. No entanto, estudos revelam que os professores ainda encontram dificuldades no manuseio instrumental das tecnologias, são desprovidos de habilidades para o tratamento crítico das mídias, produção e compartilhamento nas redes e necessitam de formação voltada para a literacia digital em contextos educativos (MELÃO, 2011; LOPES, 2013; LAGE E DIAS, 2012). Trata-se, portanto, de um problema ambíguo: de um lado temos jovens que têm permanente contato com as mídias e tecnologias, mas que carecem de ajuda e orientação para conduzir, nortear e mediar a construção do conhecimento em face da enxurrada de informações disponíveis na rede; e de outro lado está o professor que deveria fazer esse papel de condução e orientação destes jovens, mas que falta-lhe também a capacidade de filtrar, selecionar, avaliar e criticar responsavelmente os conteúdos midiáticos que acessa. Mais agravante se torna o quadro, quando o professor nem mesmo tem acesso à rede seja por vontade própria, ou por circunstâncias alheias a sua vontade, e isto o deixa à 60 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? margem da rede e impotente para lidar com os estudantes usuários de tecnologias. Como poderia o professor, personagem fundamental no processo de formação dos estudantess, ser inserido na rede de forma a integrar-se com as tecnologias, usando-as como aliadas nos processos de construção do conhecimento dos seus estudantes? Posta essa problemática, este livro aponta para a promoção da literacia digital ou mediática nos cursos de formação inicial e continuada de professores no intuito de ajudá-los a usar as tecnologias para além da posição de consumidores de programas e informações, mas que venham a atingir os patamares da análise crítica, autoria, compartilhamento e interação com seus estudantes dentro e fora dos espaços físicos da escola. Neste sentido, práticas de literacia digital desde a formação inicial dos professores e a integração desta com a atividade docente são recomendadas como importante passo para acompanhar os novos rumos que a educação tem tomado nos últimos 25 anos com a expansão das tecnologias de informação e comunicação digitais. No capítulo 4 apresentaremos modelos de formação de professores que podem contemplar as habilidades consideradas nesta seção. No próximo capítulo, propomos uma reflexão sobre como o professor tem sido formado hoje e como isso influencia na sua decisão de usar tecnologias interativas com seus estudantes. Capítulo 3 Modelo de formação docente do século XIX para professores do século XXI É preciso haver três respostas que são três prioridades: primeira, os professores; segunda, os professores; terceira, os professores. É preciso reforçar a autonomia e a centralidade dos professores, valorizar o magistério. É inútil procurar outras soluções. Os professores são a peça central de qualquer mudança, mas não podemos exigir-lhes tudo e dar-lhes quase nada. Antonio Nóvoa Explanamos no capítulo 2 que os jovens da geração atual embora estejam conectados à rede e tenham habilidades técnicas apuradas no manuseio dos dispositivos tecnológicos, carecem de orientação para fazer uso seletivo, crítico, responsável e proveitoso das informações que coletam. Colocamos as mudanças no papel do professor ocorridas no campo educacional: este não é mais o detentor do conhecimento, mas o orientador, mediador e articulador junto aos estudantes de forma a ajudá-los a selecionar e filtrar as informações relevantes para a construção do conhecimento. No entanto, como o educador Antônio Nóvoa (2014) afirma não podemos exigir-lhes tudo e dar-lhes quase nada. O autor enfatiza a necessidade de colocar em prática uma “verdadeira revolução” na formação de professores. Nóvoa conclui: “não podemos continuar a reproduzir e a justificar modelos escolares e pedagógicos que fazem parte de um tempo que já não é o nosso, que se dirigem a jovens que já não pensam, nem agem, nem aprendem como nós” (idem, p. 2). Concordamos que não existe uma geração de nativos digitais super especializados na internet, apenas porque nasceram depois de 1990, no entanto, é inegável que 62 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? os jovens do século XXI aprendem, agem e pensam diferente dos jovens do início do século XX quando se criou o modelo de escola como conhecemos hoje. No entanto, este modelo tradicional, vertical, rígido, voltado à transmissão de conhecimento continua a ser reproduzido nos cursos de formação docente. Assim uma questão central se levanta: estão os professores sendo preparados adequadamente nos cursos de formação inicial ou continuada a integrar as tecnologias nas suas práticas pedagógicas? Posta essa problemática, este capítulo aponta para a promoção da literacia digital nos cursos de formação inicial e continuada de professores no intuito de ajudá-los a usar as tecnologias para além da posição de consumidores de programas e informações, mas que venham a atingir os patamares da análise crítica, autoria, compartilhamento e interação com seus estudantes dentro e fora dos espaços físicos da escola. Considerando a importância de compreender o conceito de literacia digital no âmbito das tecnologias educativas com vistas à inserção do professor na rede, a primeira seção deste capítulo apresenta uma revisão bibliográfica sobre este aspecto conceitual. Na seção seguinte aprofundamos a discussão sobre os desafios enfrentados pelos professores que estão na vanguarda das mudanças ocorridas na era moderna, com base em estudos que revelam como lidam com a presença das tecnologias na sala de aula. Nas duas últimas seções dedicamos a apresentar modelos de formação que podem atender às demandas de preparação dos professores para usarem a potencialidade das TDIC nas suas aulas. 3.1 Conceito de literacia digital A compreensão do conceito de literacia digital é fundamental para a elaboração e fomento de políticas públicas efetivas de formação de professores com integração das tecnologias ao currículo da escola, não somente como uma ferramenta instrumental, mas um “fenômeno da cibercultura” que pode potencializar práticas comunicacionais hipertextuais, a mobilida- Elaine Jesus Alves | 63 de e a interação mediada por interfaces digitais (Santos, 2014). Silva e Pereira (2011, p. 9) afirmam que são “os usos e as competências que interferem no grau de literacia digital, passível de condicionar as oportunidades que as tecnologias podem propiciar no desenvolvimento de capacidades e de conhecimento”. As práticas de literacia digital, de acordo com Petrella (2012, p. 208), deveriam ser “um caminho que passe pela aprendizagem das competências culturais e das habilidades sociais e cognitivas que permitam às novas gerações agir crítica e criativamente no panorama dos novos medias e de participar como protagonistas na cultura contemporânea”. Assim, a temática literacia digital é pertinente e urgente dentro das escolas, lócus privilegiado da formação educacional. Neste cenário o papel do professor é fundamental. Nóvoa (2009, p. 11) justifica: Os professores reaparecem, neste início do século XXI, como elementos insubstituíveis não só na promoção das aprendizagens, mas também na construção de processos de inclusão que respondam aos desafios da diversidade e no desenvolvimento de métodos apropriados de utilização das novas tecnologias. Considerando estes pressupostos, defendemos a tese de que a formação dos professores voltada para a literacia digital constitui um passo fundamental para a inserção destes na sociedade em rede. Por sua vez, o professor integrado às tecnologias sente-se motivado a usar as suas potencialidades na sua prática pedagógica provocando mudanças visíveis na escola. Para Almeida e Valente (2011, p. 9), essas mudanças vão além de “práticas esporádicas em espaços delimitados e laboratórios de informática”, mas devem alcançar mudanças nas relações com o conhecimento e o currículo. De acordo com Belonni (1998), qualquer melhoria ou inovação em educação passa necessariamente pela melhoria e inovação na formação de formadores. Afirma a autora que “os professores formam um grupo prioritário e estratégico para qualquer melhoria dos sistemas educacionais” (idem, p. 16).No entanto, a formação de professores voltada para a literacia digital significa mais que disponibilizar 64 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? computadores e tablets nas escolas e/ou promover oficinas de capacitação para o uso instrumental das tecnologias. Utilizamos neste livro a concepção de literacia digital ou mediática transcrita no documento “Recomendações sobre a Educação para Literacia Mediática” (CNE, 2011) do Conselho Nacional de Educação, de Portugal. O referido documento aborda três tipos de aprendizagens necessárias para noção integrada de literacia digital: ·O acesso à informação e à comunicação — o saber procurar, guardar, arrumar, partilhar, citar, tratar e avaliar criticamente a informação pertinente, atentando também à credibilidade das fontes; ·A compreensão crítica dos media e da mensagem mediática — quem produz, o quê, porquê, para quê, por que meios; ·O uso criativo e responsável dos media para expressar e comunicar ideias para deles fazer um uso eficaz de participação cívica. Assim, a literacia digital ou mediática que trata este estudo diz respeito à capacidade do indivíduo de acessar, analisar, compreender e avaliar de modo crítico as mídias e ainda criar comunicações em diferentes contextos (LOPES, 2013). No caso dos professores, está envolvido, além do uso instrumental cotidiano das tecnologias, a sua apropriação crítica, usando-a de modo adequado na realização de projetos multidisciplinares e colaborativos. A literacia digital envolve mais que a mera capacidade de operar um dispositivo digital ou usar um software, inclui um complexo cognitivo, motor, sociológico, emocional e sociológico do usuário. De acordo com Luke (2000), no contexto da cibercultura, especialista não é quem está a par de todas noticias e informações, mas aquele que, tomando conhecimento dos fatos descontextualizados, procura a conexão entre os recortes de informações, associa outras informações relevantes e consegue fazer uma leitura crítica da situação. Potter (2004) define literacia digital como um conjunto de perspectivas a partir da qual expomo-nos para os meios de comunicação e interpretamos o significado das mensagens encontradas. Além disso, o autor explica que as pessoas para serem capazes de classificar a informa- Elaine Jesus Alves | 65 ção e organizá-la, precisam de habilidades de análise, avaliação, agrupamento, indução, dedução, síntese e abstração. Lage e Dias (2011, p. 3) relacionam três objetivos fundamentais da literacia digital nos processos formativos para o uso das mídias: 1) Promover o acesso às TIC – A literacia mediática parte da premissa de que todos tenham acesso às mídias com fins de reduzir os obstáculos à mobilidade profissional e as dificuldades da vida cotidiana. Cabe ao governo garantir o acesso de todos às TIC diminuindo a exclusão digital e a desigualdade social. 2) Capacitar o cidadão a avaliar criticamente em que medida o teor e a forma dos conteúdos difundidos são influenciados por interesses dos produtores mediáticos. Ou seja, a capacidade de seleção crítica para ler nas entrelinhas e decodificar imagens e sons avaliando assim os conteúdos. 3) Habilitar o cidadão a produzir seus próprios textos informativos e mediáticos utilizando de forma segura as TIC. A produção mediática deve estar associada a uma reflexão crítica sobre o processo de produção e atender os princípios relativos a direitos autorais e segurança dos dados. Assim, formar o cidadão para a literacia digital significa torná-lo apto para acessar, avaliar criticamente, compreender plenamente e ainda criar mídias. Fazendo uma analogia da literacia com o letramento (termo mais conhecido no Brasil), Bakhtin (1992) analisa que um sujeito letrado é alguém que conhece e pratica diferentes formas de falar, ler e escrever que são construídas socialmente e culturalmente. Nas diferentes esferas da vida (escolar, artística, política, profissional) este sujeito é capaz de acionar modelos correspondentes a situações específicas para interpretar, prever, criar, questionar, avaliar e escolher atitudes. Levando para o campo do uso das tecnologias é importante que os professores integrem o computador e suas parafernálias à sua prática docente, transformandoa para serem inseridos no contexto de sociedade em rede. Assim, a literacia digital dos professores constitui uma política pública fundamental para a inserção destes na sociedade em rede e a chave de ignição para a promoção de mudanças na escola. 66 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? 3.2 A formação do professor do século XXI Por quase dois séculos, o modelo instrucionista, vertical e avaliativo permeia as escolas com poucas mudanças na sua estrutura desde a revolução industrial no século XIX. Os cursos de formação de professores reproduzem essa lógica aos futuros docentes. No entanto, algumas propostas de cursos de formação on-line apresentam-se como uma reprodução do modelo tradicional de educação voltado para a transmissão e recepção de conteúdos. De acordo com Papert (1993, p. 127), as tecnologias digitais nestas propostas constituem “uma nova roupagem aos artefatos tecnológicos tradicionais (quadro, livros, cadernos) que serviam para transmitir ou replicar conhecimento”. Programas de formação calcados em repositório de conteúdos e provas objetivas impedem a inventividade e a construção de sentidos dos professores sobre o trabalho coletivo e limitam suas possibilidades de trabalhar com mídias integradas em projetos pedagógicos. Para além de usar as TDIC para formar professores, urge a necessidade de preparar os professores para integrar as tecnologias nas suas práticas pedagógicas. Entretanto, professores formados na modalidade a distância ou na presencial, em moldes tradicionais como foram formados os professores no início do século XX, cujo quadro-negro e o livro eram a única tecnologia que dispunham para “transmitir” os saberes, serão professores que vão reproduzir esta prática com seus estudantes do século XXI que são expostos à internet e precisam de orientação para transformarem informação em conhecimento. Almeida e Valente (2011) apontam a abordagem instrucionista dos cursos de formação on-line como um dos fatores para o insucesso da integração e apropriação das mídias pelos professores atendendo a grande massa de estudantes por meio de transmissão de conteúdos via mídias tradicionais. Assim, os cursos são realizados em plataformas virtuais estáticas que constituem depositórios de conteúdos com pouca ou nenhuma interação. Estudos recentes revelam que mesmo em formação Elaine Jesus Alves | 67 on-line nesses programas, alguns professores encontram dificuldade com a fluência tecnológica, não apenas no uso instrumental das tecnologias, mas também seu campo social e coletivo levando muitos a evadirem das formações (ALVES E FARIA, 2011; ATAÍDE, 2012; MENESES, 2011). Pesquisas no campo da formação de professores (no Brasil) para o uso das tecnologias na prática docente revelam resultados pouco animadores. Um breve retrospecto histórico com base em estudos das iniciativas e programas voltados para integrar as mídias na prática cotidiana dos professores destaca que por vezes estes programas tinha foco na formação para o uso instrumental das tecnologias (parte técnica), em detrimento da formação para o pedagógico das TDIC (GONÇALVES, 2014; ATAÍDE, 2012); esbarra em problemas relacionados com a infraestrutura de internet e falta de técnicos no suporte programas nas escolas (DRAIBE E PEREZ, 1999; PRETTO, 2002; BARRETO, 2004); outras fragilidades encontradas nestes programas eram o aligeiramento da formação com a incorporação da prática do professor na carga horária do curso; a baixa possibilidade de comunicação do professor cursista com o professor formador, que gerava limitações na apreensão e aprofundamento de conceitos teóricos, dentre outras (ANDRADE, 2009; MORAES, 2003). O Projeto de pesquisa Currículo da escola do século XXI – Integração das TIC ao currículo: inovação, conhecimento científico e aprendizagem, coordenado pela professora Elizabeth Almeida no âmbito do Programa de Pós-graduação em Educação: currículo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) nos anos 2011 a 2013 teve como objetivo principal identificar as contribuições e dificuldades das ações de formação e das práticas realizadas nas escolas participantes do Projeto Um computador por Aluno. No âmbito do referido projeto, foram publicados diversos trabalhos acadêmicos que evidenciaram as contribuições do uso do laptop nas práticas pedagógicas em que os professores e estudantes participantes desenvolveram atividades como pesquisas em diversas fontes, também fizeram uso de recursos de multimídia, produziram texto com uso de palavras, imagens, áudios, vídeos e uso de jogos. No que diz respeito à 68 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? formação dos professores para lidarem com as tecnologias na escola, foram apontadas as necessidades de momentos presenciais com oficinas práticas e reflexão das ações realizadas nas salas de aulas com uso do laptop do programa. Porém, embora a reflexão sobre a prática seja fundamental, o professor precisa reconhecer os pressupostos teóricos que embasam suas novas práticas de trabalho com uso das tecnologias. Almeida e Prado (2012) refletem que a integração das tecnologias no currículo dos cursos de formação de professores no Brasil ainda é deficitária e na maioria das vezes é relegada ao plano da formação continuada. As autoras defendem a formação de professores voltada para a integração das TDIC ao currículo por meio de projetos. Nesse modelo, elas explicam: É preciso propiciar ao professor cursista situações nas quais ele possa experienciar o trabalho com projetos com o uso dessas tecnologias e, ao mesmo tempo, refletir sobre essas práticas, para que possa identificar tanto as contribuições das TIC à própria aprendizagem e ao desenvolvimento do currículo, como criar com os estudantes situações de uso das TIC voltadas à melhoria da aprendizagem. Segundo Silva e Cilento (2014), o professor formado numa perspectiva de transmissão de saberes irá reproduzir esse modus operandi na sua prática docente. A coerência entre as exigências que se requer do professor: para que seja antenado, conectado e expert na integração das mídias no contexto escolar deve estar em sintonia com a sua formação. Portanto, os cursos de formação on-line deveriam constituir um espaço privilegiado para possibilitar ao professor vivenciar as tecnologias e apropriar-se delas de modo reflexivo na sua prática pedagógica. Petrella (2012, p. 216) afirma que a literacia digital deveria perpassar o currículo das escolas de modo que os professores devem fazer a “ligação entre as competências mediáticas dos estudantes e operando uma avaliação do contributo que estas podem dar ao processo de aquisição de competências”. O uso de jogos, simuladores, laboratórios virtuais, atividade de análise de conteúdos de blog, sites, outras mídias, são atividades pedagógicas que podem ser utilizadas para uma capacitação em Elaine Jesus Alves | 69 literacia mediática. O desenvolvimento da capacidade crítica pode ser realizado por incentivar os estudantes procurarem na web as várias versões da mesma notícia e relatar as diferentes abordagens utilizadas e o contexto em que foram produzidas. Outras experiências como uso do rádio, construção de redes de aprendizagem, webquest, blogs, e outras mídias podem se constituir propostas para a construção do pensamento crítico sobre as mídias. Ocorre, portanto, um choque de intencionalidades com a presença das TDIC na sala de aula: o professor continua a usá-la como um suporte para reproduzir o conteúdo a todos os estudantes ao mesmo tempo (uso de e-mail, datashow, vídeos, lousa digital) e este é o modelo que o professor conhece nos cursos de formação inicial e continuada, o que reproduz naturalmente com seus estudantes. Todavia, como revelam alguns estudos na área, os estudantes não se interessam mais por estas tecnologias, já lhe parecem ultrapassadas, entediantes, retundantes e podem causar efeitos negativos na carga cognitiva dos mesmos (AGOSTINHO, TINDALL-FORD & SWELLER, 2006). Considerando este cenário, os formuladores de cursos de formação docente devem repensar novos enfoques que não sejam apenas o de transmitir/reproduzir conteúdos ao se trabalhar usando tecnologias com os estudantes (futuros professores). Costa (2003, p.2) justifica esta necessidade: Devido às exigências colocadas pelo desenvolvimento tecnológico a que se tem assistido nos últimos anos e à grande difusão dos computadores nos diferentes sectores da sociedade, pode afirmar-se que uma das mais flagrantes lacunas dos cursos de formação inicial nos dias de hoje talvez seja não considerarem como absolutamente indispensável a preparação dos futuros professores para a utilização educativa das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). O autor explica que esta qualificação deve significar para os professores ganhos não apenas em termos do seu próprio desenvolvimento profissional, mas, sobretudo, utilizar as tecnologias para proporcionar 70 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? situações de aprendizagem inovadores, envolventes, colaborativas junto a seus estudantes. Ainda Costa (2012, p. 136), em seus estudos constatou que existem fortes evidências de que as estratégias de formação profissional docente para o uso das TDIC carecem de eficácia do ponto de vista metodológico: “mesmo depois de frequentarem os programas de formação que lhe são oferecidos, os professores continuam com fortes dúvidas sobre o que fazer de forma a melhorarem a aprendizagem dos estudantes”. Contudo falta um acompanhamento posterior dos resultados destas formações para que o professor se sinta seguro na integração das tecnologias na sua prática pedagógica. Portanto, que modelo de formação docente melhor atenderia ao contexto de expansão das tecnologias digitais móveis como celulares e tabletes na sala de aula? 3.3. Modelos de formação voltados para a integração das tecnologias no currículo escolar No início do século XXI os professores voltaram a ocupar um lugar estratégico nas políticas públicas educacionais com foco no futuro da escola frente à crescente disseminação e apropriação das tecnologias pelos estudantes. Autores contemporâneos têm investido discussão da necessidade de mudanças nas estruturas educacionais em face das mudanças que as tecnologias de comunicação e informação provocaram na sociedade (NÓVOA, 2015; SILVA E CILENTO, 2014; SANTOS, 2014; CASTELLS, 2014; COSTA, 2013). Como toda formação, a docente tem objetivos, metas e intencionalidades. Neste sentido, segundo Nóvoa (1991), as instituições de formação docente ocupam um lugar central na produção e reprodução do corpo de saberes e do sistema de normas da profissão docente e desempenham um papel fundamental na elaboração dos conhecimentos pedagógicos e de uma ideologia comum entre os profissionais da educação. Para Costa (2013, p. 54), as instituições responsáveis pela formação inicial são o Elaine Jesus Alves | 71 “centro nevrálgico da decisão” sobre as estratégias de integração das tecnologias digitais no currículo. A discussão sobre as competências dos professores para o uso das tecnologias na prática pedagógica não é recente. Em meados dos anos de 1980 com o desenvolvimento e expansão da informática surgiu o termo "Novas Tecnologias de Informação". A aplicação destas tecnologias no contexto educativo, segundo Blanco e Silva (1993), reforçou as pesquisas sobre esta relação homem máquina e a análise de ambientes tecnológicos voltados para a educação. No entanto, atualmente esta discussão se torna cada vez mais relevante e pertinente considerando o contexto da crescente penetração da internet no cotidiano das pessoas. Ao mesmo tempo em que cursos de formação inicial e continuada mediados por tecnologias são ofertados aos professores para seu aperfeiçoamento, estudos recentes apontam para um déficit de literacia digital destes em relação ao uso social e crítico das tecnologias e sua eventual inserção na era digital (Silva & Cilento, 2014). Que modelo de formação docente melhor atenderia ao contexto de expansão das tecnologias digitais móveis como celulares e tabletes na sala de aula? Certamente não existe um modelo, ou uma receita pronta e aplicável a todos os casos. No entanto, existem podemos pontuar referenciais, pontos críticos que devem ser levados em consideração ao formular uma formação docente voltada para a literacia digital. Retomamos ao professor Nóvoa (2014) que aponta três aspectos importantes para a formação do professor: Primeiro, uma organização mais aberta e diversificada dos espaços e dos tempos escolares. Segundo, um currículo centrado nos estudantes e em suas aprendizagens, e não em listas intermináveis de conhecimentos ou competências. Terceiro, uma pedagogia com dimensão fortemente colaborativa, que utilize a relação (as redes) como dispositivo de comunicação e aprendizagem. No primeiro elemento citado, o autor defende que a formação de professores a priori deve ocorrer nos espaços escolares. Em outro artigo, Nóvoa (2009, p. 6) cita o exemplo dos futuros médicos que durante a formação atuam como residentes em hospitais universitários observam os 72 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? pacientes, fazem relatórios de acompanhamento, supõem um diagnóstico e terapia e discutem com os colegas e com médico que os supervisionam, e ainda participam de seminários temáticos sobre as experiências. O autor sugere uma dinâmica parecida nos cursos de formação de professores: (i) estudo aprofundado de cada caso, sobretudo dos casos de insucesso escolar; (ii) análise colectiva das práticas pedagógicas; (iii) obstinação e persistência profissional para responder às necessidades e anseios dos estudantes; (iv) compromisso social e vontade de mudança. No segundo elemento, Nóvoa (p. 7) defende uma escola e currículo centrado nos estudantes e suas aprendizagens. O autor explica: É preciso insistir na ideia de centrar o foco na aprendizagem e que essa aprendizagem implica em estudantes e conhecimentos. Ela não se faz sem pessoas e uma referência às suas subjetividades, sem referências aos seus contextos sociais, suas sociabilidades. Mas ela também não se faz sem conhecimentos e sem a aprendizagem desses conhecimentos, sem o domínio das ferramentas do saber que são essenciais para as sociedades do século XXI, que todos querem ver definidas como sociedades do conhecimento. Assim, Nóvoa, destaca a importância do professor ser formado com foco na aprendizagem do aluno, com interesse em seu desenvolvimento cognitivo, emocional e social. Em termos práticos, o autor cita as descobertas recentes das neurociências, sobre o funcionamento do cérebro, das questões do sentimento e da aprendizagem, dos processos de produção de memória, que constituem ciências contemporâneas que não são estudadas nos cursos de formação inicial e que são de forte relevância para se compreender como os estudantes aprendem e que estratégias o professor poderá adotar para ajudá-lo. O terceiro movimento citado por Nóvoa está relacionado com as práticas de literacia digital do professor. A literacia digital deveria perpassar o currículo das escolas de modo que os professores devem fazer a ligação entre as competências mediáticas dos estudantes e operando uma avaliação do contributo que estas podem dar ao processo de aquisição de competências. O uso de jogos, simuladores, laboratórios virtuais, atividade de análise Elaine Jesus Alves | 73 de conteúdos de blog, sites, outras mídias, são atividades pedagógicas que podem ser utilizadas para uma capacitação em literacia mediática. O desenvolvimento da capacidade crítica pode ser realizado por incentivar os estudantes procurarem na web as várias versões da mesma notícia e relatar as diferentes abordagens utilizadas e o contexto em que foram produzidas. Outras experiências como uso do rádio, construção de redes de aprendizagem, webquest, blogs, e outras mídias podem se constituir propostas para a construção do pensamento crítico sobre as mídias (ALVES, 2017). No sentido de propor um referencial teórico que fundamente a investigação na área de formação de professores na área de tecnologia educativa, Mishra e Koehler (2006) apresentaram um referencial teórico que denominaram de Technological Pedagogical Content Knowledge também chamado abreviadamente de TPACK. O pressuposto teórico do conceito do TPACK é que a atitude do professor no tocante às tecnologias depende da combinação de conhecimentos a nível científico ou dos conteúdos, a nível pedagógico e a nível tecnológico. Sampaio e Coutinho (2010) explicam que em termos teóricos, o TPACK resulta da intersecção de três tipos diferentes de conhecimento: • Pedagogical Content Knowledge : Capacidade de ensinar um determinado conteúdo curricular; • Technological Content Knowledge : Habilidade de selecionar os recursos tecnológicos mais adequados para comunicar um determinado conteúdo curricular; • Technological Pedagogical Knowledge : Competência para esses recursos no processo de ensino e aprendizagem. Misrha e Koehler (2008) argumentam que os professores que têm este tipo de conhecimento integrado são caracterizados como criativos, flexíveis e adaptáveis a quaisquer circunstâncias didática apoiada por tecnologias. No âmbito TPACK, a literacia do professor surge a partir de múltiplas interações entre conteúdo, visão pedagógica e conhecimento tecnológico./ Sampaio e Coutinho (2010, p. 3983) que realizaram uma investigação com professores de duas turmas de diferentes escolas, áreas disciplinares, idades, tempos de serviço e níveis de ensino, no âmbito da 74 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? formação contínua em contexto de prática efetiva (oficina de formação), cujo pressuposto teórico era baseado no TPACK, concluiram: Os resultados do nosso estudo apontam nesse sentido: para um professor integrar as TIC na sala de aula deve ter tempo para frequentar formação no uso das tecnologias, tempo para planear actividades curriculares inovadoras onde se integrem as TIC e conhecimentos ao nível do potencial educativo das tecnologias de informação e comunicação. Trata-se, portanto, de uma formação processual, num estágio contínuo e evolutivo, pois o processo de apropriação tecnológica acontece em fases e que deve levar em consideração o contexto em que vive o professor, a escola que trabalha, sua carga horária de trabalho, a disciplina que leciona, seus conhecimentos prévios, a cultura, situação econômica, sua relação com a tecnologia no cotidiano e na escola, e outros fatores que devem ser considerados. Considerando estes pressupostos teóricos, em consequência dos resultados do estudos Formação de professores, Literacia Digital e Inclusão Sociodigital: Estudo de caso em curso a distância da Universidade Federal do Tocantins (Alves, 2017), propomos um modelo de formação cujas diretrizes apontam para a importância da atitude favorável do professor e de sua apropriação das tecnologias para que o mesmo mobilize energias para integrá-las na sua prática docente. 3.4 Uma proposta de formação docente voltada para a literacia digital Como apresentado na Introdução, as discussões apresentadas neste livro fazem parte da pesquisa Formação de professores, Literacia se Digital e Inclusão Sociodigital: Estudo de caso em curso a distância da Universidade Federal do Tocantins (Alves, 2017), no âmbito do programa de doutorado de Ciências da Educação da Universidade do Minho, área Tecnologia Educativa. Esta teve como objetivo investigar os impactos dos cursos de formação a distância de professores sobre as suas habilidades e competências para o uso das tecnologias digitais no seu cotidiano e práti- Elaine Jesus Alves | 75 cas pedagógicas. A pesquisa empírica constatou um baixo nível de literacia digital do grupo de professores participantes de uma formação a distância. O estudo ainda constatou que os participantes seguem concepções tradicionais (conteudista e transmissiva) de ensino com expressa resistência à presença dos dispositivos móveis na escola. Por outro lado, observou-se também que o referido curso de formação não contempla no seus currículo atividades que integrem as tecnologias às práticas pedagógicas dos professores em formação. Também a plataforma virtual em que o curso está hospedado apresenta um formato estático com poucas atividades interativas e discussões entre os participantes. Verificou-se, portanto, que mesmo participando desta formação na modalidade a distância os professores não adquiriam competências para a literacia digital na vida cotidiana e muito menos nas suas práticas pedagógica. Ao final da análise nos perguntamos se este resultado seria diferente se o modelo de formação dos participantes contemplasse como um dos objetivos a formação dos docentes para aquisição de competências para a literacia digital e integração das tecnologias na sua atividade pedagógica. Considerando que um dos objetivos da pesquisa era propor um modelo de formação docente voltada para a literacia digital que contemple a integração das TDIC na prática pedagógica, após a análise dos resultados constatamos que esta constitui uma necessidade emergente das formações de professores (presenciais ou a distância). Assim, com base nos referenciais teóricos que discutem esta temática formulamos o modelo de Formação Integrada, Permanente e Integrada para a Literacia Digital (FIPELD). Fundamentamos a FIPELD com base nos estudos de Mishra e Koehler (2006) e Costa et. al (2012). Mishra e Koehler apresentaram um referencial teórico que denominaram de Technological Pedagogical Content Knowledge também chamado abreviadamente de TPACK. O pressuposto teórico do conceito do TPACK é que a atitude do professor no tocante às tecnologias depende da combinação de conhecimentos a nível científico ou dos conteúdos, a nível pedagógico e a nível tecnológico. Misrha e Koehler (2008) argumentam que os professores que têm este 76 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? tipo de conhecimento integrado são caracterizados como criativos, flexíveis e adaptáveis a quaisquer circunstâncias didática apoiada por tecnologias. No âmbito TPACK, a literacia do professor surge a partir de múltiplas interações entre conteúdo, visão pedagógica e conhecimento tecnológico. Assim o modelo pressupõe que o uso das tecnologias deve ser estruturado a partir das tecnologias que o professor já conhece, e a medida que desenvolve competências tecnológicas e pedagógicas, este poderá evoluir para aplicações mais complexas. No modelo apresentado por Costa et al. (2012), a proposta pressupõe a vivência do professor com as tecnologias num processo cíclico de apropriação individual estruturada em cinco etapas: Visão: o professor é levado a questionar sobre porquê, para quê e como utilizar as tecnologias. A partir das respostas que obtém nesta autoanálise este pode estabelecer um conjunto de metas sobre o que pretende, o que é possível e o que é adequado fazer com as tecnologias num determinado contexto; Plano: A partir dos objetivos de aprendizagem estabelecidos no currículo da sua disciplina, o professor decide, também com a ajuda dos formadores e colegas, as atividades que os estudantes realizarão com recurso às tecnologias disponíveis na escola. Prática: Momento em que experimenta com os estudantes o que foi planificado e que são postos a prova as ideias e procedimentos do plano. Interação: o professor interage e discute com o formador ou com os colegas sobre o processo e os resultados para receber orientação de como resolver problemas e superar obstáculos. Reflexão: o professor reflete individualmente sobre o modo como as atividades decorreram, sobre o que obteve bons resultados e o que poderia ser melhorado. Ainda momento de refletir sobre os ganhos resultantes da utilização das tecnologias naquela atividade. Este último modelo apresenta três pressupostos importantes: (1) o professor precisa entender porque usar as tecnologias e em que contexto; (2) é fundamental “pôr a mão na massa”, ou seja experimentar as tecnologias na sala de aula com seus estudantes acompanhado do formador para ver ele mesmo os resultados; (3) a partilha com os pares e com o formador proporciona uma riqueza Elaine Jesus Alves | 77 de troca de experiências que são muito importantes para seu amadurecimento. O que ambos os modelos têm em comum é o fato de que a integração das tecnologias na prática pedagógica do professor constitui uma espiral que ascendente que evolui a medida que o professor experimenta e adquire novas competências de literacia digital. O modelo FIPELD parte da premissa de que o professor deve tomar partido das TDIC para sua autoformação, mas com foco na aplicação destas na sua prática pedagógica junto a seus estudantes de forma integrada. A FIPELD sugere que os professores compreendam que as TDIC não são apenas ferramentas para se chegar a um meio, mas “processos a serem desenvolvidos” (CASTELLS, 1999, p. 51). Quando se fala em evolução, pensa-se em processo. Portanto, a formação para a literacia digital deve ser evolutiva e processual tendo em vista que o processo de apropriação das tecnologias pelos professores é gradual, sujeita a diferentes variáveis e requer tempo para ser assimilado nas práticas docentes. Não se trata de um curso específico de formação de professores para o uso das tecnologias. A proposta FIPELD corresponde a um modelo referencial que pode ser adaptado para oficinas em grupos de professores de uma escola ou mesmo uma formação maior para uma rede de ensino. O modelo FIPELD é cíclico, portanto, evolutivo e permanente, conforme representado na figura 6. Figura 6: Modelo FIPELD Fonte: Alves, 2017. 78 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Na prática, a recomendação é que o modelo seja proposto em oficinas com um grupo de professores. Nestas oficinas, eles poderão vivenciar as cinco fases do modelo acompanhados do formador de forma que possam experimentar as tecnologias. A formação consiste em quatro encontros presenciais (duração de 3 horas cada – total 12h) a serem realizados um por semana, encontros a distância em fóruns assíncronos no ambiente virtual Moodle (carga horária de 40h) e atividade prática na turma que leciona (carga horária de 8h para preparação e aplicação). A primeira fase do modelo é denominada Motivação. De acordo com Costa et al. (2012), embora existam múltiplos fatores envolvidos na concepção de condições necessárias ao uso das TDIC, a decisão individual de cada educador constitui o fator mais determinante neste processo. Portanto, antes de tudo o professor precisa sentir-se motivado a usar as tecnologias na sua prática pedagógica. Assim, na primeira oficina os professores em formação terão a oportunidade de conhecer e experimentar aplicativos que podem potencializar as suas aulas. Este também constitui um momento em que discutem com seus pares e o formador sobre a questão: porque usar as tecnologias nas aulas? Quais ganhos terão, quais dificuldades enfrentam e que desafios esperam superar. Costa (2013) aponta o desconhecimento do potencial das TDIC da parte dos docentes como um dos fatores que levam estes a não tirarem partido do potencial pedagógico didático das tecnologias. Outro fator apontado pelo autor é o despreparo dos docentes que em geral tiveram uma “preparação de cariz predominantemente técnico com claro prejuízo para uma preparação metodológica assente na reflexão sobre os benefícios e sobre os modos adequados de utilização das TIC no currículo” (idem, p.48). Assim, a Preparação constitui a segunda fase da FIPELD. Portanto, na segunda oficina, os participantes vão ser apresentados a aplicativos que poderão usar e serão capacitados a criar uma atividade num aplicativo escolhido. Na oficina, em conjunto com seus pares vão elaborar um plano de aula que contemple o uso de um aplicativo que deverá ser aplicado na prática com seus estudantes. Elaine Jesus Alves | 79 A atividade prática será acompanhada pelo formador que irá agendar os horários de modo que possa acompanhar todos os professores. Esta atividade, denominada Ação constitui a terceira fase da FIPELD. Trata-se do momento em que o professor irá por em prática o plano de ação do uso das TDIC alinhado aos objetivos de aprendizagem. Nesta fase as ideias projetadas são executadas e postas à prova, ficando sujeitas a imprevistos, dificuldades e gargalos. Depois da aplicação da atividade, os professores deverão fazer um cuidadoso registro de como a atividade ocorreu, os pontos fortes e fracos, os imprevistos, a reação dos estudantes, a sua percepção pessoal: dificuldades e perspectivas de acordo com um modelo de diário de bordo que será fornecido. Este registro será considerado na oficina seguinte e servirá de base para que os participantes possam apresentar seus resultados. A possibilidade de tirar fotos, ou fazer alguns vídeos das atividades realizadas também poderá ser importante para a visualização dos resultados. Na quarta fase da FIPELD, a Avaliação, deve ocorrer a terceira oficina em que os professores, após terem realizado a aplicação prática, se reúnem com o formador e seus pares para avaliar as atividades decorridas. Costa et. al (2012, p. 99), no seu modelo, denominaram esta fase com o termo “interação”, na qual “espera-se precisamente que o professor interaja e discuta com o formador ou com os colegas sobre o processo e os resultados, de forma a partilhar o que foi feito e assim poder receber achegas sobre como resolver problemas e superar obstáculos”. Também neste encontro, pode-se ocorrer um seminário de apresentação dos resultados para que os participantes possam trocar experiências e conhecimentos. A Reação, quinta fase da FIPELD, esta se relaciona à tomada de decisão que o professor, diante do feedback da etapa anterior, terá que adotar diante das constatações que a experiência proporcionou. Ao fazer esta análise do percurso, sobre como as atividades decorreram, o que foi bem sucedido e o que houve de gargalo, o professor vai refletir sobre os ganhos e perdas que o uso das TDIC proporcionou na atividade com os estudantes. 80 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Na prática, ocorre a última oficina em que os participantes responderão a um questionário de auto avaliação em que poderão analisar como se saíram na ação e refletir em como podem fazer mais nesta área do uso das tecnologias na educação. Também serão convidados a fazer uma reflexão crítica sobre como veem as tecnologias na escola e como a formação os ajudou em algum aspecto. O encontro termina com a construção coletiva de uma carta de intenções em que os participantes poderão fazer um prospecto das potencialidades das tecnologias nas suas aulas e projetarem anos a frente visualizando seu progresso no campo da literacia digital. A proposta do modelo é que ao final do ciclo de oficinas os professores participantes: · • • • • • • • Estejam motivados a criar e aplicar materiais educativos interativos na sala de aula - potenciadores da construção colaborativa do conhecimento; Aprendam a produzir, utilizar e avaliar recursos digitais para o ensino e aprendizagem de diferentes matérias curriculares, acessíveis em diferentes dispositivos; Sejam capazes de gerenciar o envolvimento dos estudantes e aumentar a sua participação dentro e fora da sala de aula através dos dispositivos móveis; Estejam aptos a desenvolver projetos e atividades que potenciem a utilização de diferentes tecnologias e conteúdos educativos em contextos transdisciplinares. Compreendam os benefícios da tecnologia em reais mudanças de práticas educacionais; Estabeleçam vínculos sociais juntos a seus pares para partilha de informação, novos conhecimentos, recursos inovadoras e experiências com as ferramentas emergentes; Se apropriem de diferentes ferramentas passando de utilizador a produtor de conteúdos educativos Continuem avançando no ciclo da FIPELD, ganhando experiência e competências de literacia digital com fins de preparar seus estudantes para navegarem com êxito no oceano da internet. Assim, a cada ciclo de ação da FIPELD com a docência integrada às TDIC, o professor ganha experiência, confiança e autonomia para continuar evoluindo seus níveis de literacia digital e, por conseguinte orientar Elaine Jesus Alves | 81 os estudantes nesta mesma direção. Costa et al . (2012) explicam que ao fazer esta reflexão contínua sobre como as atividades decorreram, o professor estará apto para, em atividades futuras, antecipar as dificuldades, distribuir melhor o tempo, organizar os espaços (virtuais ou físicos) e, por fim, terá condições de ponderar se o uso das TDIC implicou em mudanças concretas na sua prática. 3.5 Aplicação prática do modelo FIPELD O modelo Formação Integrada, Permanente e Evolutiva para a Literacia Digital (FIPELD) desenvolvido no âmbito do doutoramento (2017) e pós-doutoramento em Educação na Universidade do Minho em 2018, tratase de uma proposta de formação independente de cursos e capacitações específicas para o uso das tecnologias. Na aplicação do modelo num projeto piloto com um grupo de professores de uma escola pública foram propostas oficinas de motivação e preparação com o intuito de possibilitar o desenvolvimento de competências para a literacia digital de professores mobilizando-os a integrar as ferramentas digitais nas suas atividades didáticas junto aos estudantes. Os resultados deste projeto piloto foram publicados em dois artigos (ALVES & SILVA, 2018; ALVES, SILVA, GILIOLI & BRITO, 2018) apresentados em congressos científicos cujos dados revelam que o modelo FIPELD foi eficaz no que diz respeito à motivação dos professores em experimentar usar tecnologias com seus estudantes. A metodologia FIPELD foi aplicada experimentalmente pela primeira vez com professores do ensino fundamental das séries finais de uma escola pública em Palmas, Tocantins. O projeto experimental foi realizado no âmbito do estágio pós-doutoral em Educação na Universidade do Minho cujo tema era Proposta de formação de professores voltada para a literacia digital. No entanto, o modelo FIPELD teve que ser adaptado à realidade local. Como se trata de uma escola de tempo integral, e os professores dispunham de pouco tempo para participar das oficinas, o diretor da escola providenciou um tempo dentro da reunião de 82 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? planejamento pedagógico da equipe de professores para a formação. Foram organizadas duas oficinas: a primeira para a realização das fases Motivação e Preparação e a segunda (com intervalo de um mês) para as fases Avaliação e Reação, ficando este intervalo para os professores realizarem a fase da Ação. Na primeira oficina, os professores puderam experimentar as tecnologias em duas situações: no papel de estudantes e no papel de professores. Na primeira situação, a formadora simulou que os participantes eram seus estudantes e preparou um game no aplicativo Kaoout em que todos foram incentivados a baixar nos seus celulares e participar. O Kahoot é uma plataforma de ensino gratuita que funciona como um gameshow. Os professores criam questionários de múltipla escolha (sempre com 4 opções) e os estudantes participam online, cada um com seu dispositivo (computador, tablet ou celular). O Kahoot classifica os participantes que acertaram mais questões em menos tempo, assim quem participa da atividade sente-se motivado a competir por uma posição melhor, principio da gamificação da qual os estudantes em geral sentem-se motivados a participar. Os resultados com estes professores foram surpreendentes, eles ficaram muito interessados no aplicativo e em como poderiam usar com seus estudantes. Figura 7 - Oficina de Motivação e preparação Fonte: Elaboração própria Elaine Jesus Alves | 83 Ainda foi apresentado aos participantes o aplicativo Plickers1 e a Webquest, que também experimentaram na função de estudantes. Ambas as ferramentas motivaram os participantes a quererem aprender como utilizá-las com seus estudantes. A segunda parte desta oficina inicial foi a experimentação das ferramentas enquanto professores. Os participantes queriam aprender a usar todas três ferramentas (Kahoot, Plickers e Webquest), mas devido ao tempo limitado teriam que optar por uma apenas, neste caso decidiuse pela Webquest. Esta é uma metodologia de pesquisa na internet, voltada para o processo educacional, estimulando a procura da informação e o pensamento crítico. A praticidade da Webquest para usuários iniciantes é que esta não exige softwares específicos além dos utilizados comumente para navegar na rede, produzir páginas, textos e imagens. Nesta formação os professores foram capacitados para criar uma Webquest no Google sites. Orientados pela formadora, eles colocaram a “mão na massa” utilizando seus computadores portáteis e outros três computadores disponíveis na sala de professores. O Google sites é bastante intuitivo e fácil de manusear, assim os professores encontraram pouca dificuldade ao fazer o treinamento com a Webquest. A formadora acompanhou cada participante até que todos tivessem feito uma Webquest experimental com os passos básicos, para não saírem da oficina com dúvidas a respeito. A atividade que deviam realizar no intervalo de um mês até à próxima oficina constituía a criação de uma Webquest para trabalhar em sala de aula com seus estudantes, também deviam anotar os resultados e preparar uma apresentação da experiência no próximo encontro (oficina). Também foi criado um grupo fechado no Facebook intitulado Desbravadores das tecnologias na sala de aula em que todos foram convidados a participar com postagens sobre recursos e tecnologias que 1 Ferramenta disponível na versão web e aplicativo para dispositivos móveis, de administração de testes rápidos, que permite o professor escanear as respostas e conhecer em tempo real o nível da turma quanto ao entendimento de conceitos e pontos chaves de uma aula. A vantagem do Plickers é que os estudantes não precisam ter internet para responder as atividades, o que facilita a aplicação de tecnologias com estudantes de baixo poder aquisitivo que não possuem smartphone. 84 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? consideravam interessantes para compartilhar com colegas. Considerando a pesada carga horária de trabalho destes professores, a participação neste grupo foi mínima. No entanto, todos os dias a formadora compartilhava novos recursos, metodologias e ferramentas web voltadas para a tecnologia educacional e observava que os participantes visualizavam as postagens. O objetivo do grupo na rede social foi criar um espaço informal de troca de experiências e cultivar uma cultura de compartilhamento de conteúdos que discuta as tecnologias educativas entre os professores. Figura 8 - Grupo fechado criado no Facebook para interação Fonte: Elaboração própria Na segunda oficina, realizada um mês depois com os mesmos professores, os participantes foram convidados a apresentar para os colegas (usando o datashow) a sua Webquest. Dos dezoito participantes, apenas cinco criaram a Webquest conforme foi solicitado. Os professores foram incentivados a falar dos desafios enfrentados e como lidaram com eles, o que foi bastante positivo para o grupo. Apesar de ter sido uma minoria que realmente enfrentou o desafio, após a apresentação destes, o grupo se empolgou a ver que seus colegas tinham conseguido criar um site em formato de Webquest. Desta forma ficaram motivados a fazer também as suas Webquest. Elaine Jesus Alves | 85 Figura 5 – Participante apresentando a sua Webquest ao grupo Fonte: Elaboração própria. No final da oficina, os participantes responderam a um formulário com questões abertas sobre as suas percepções da experiência (possíveis benefícios e dificuldades). Aos que não realizaram a atividade da Webquest foi pedido que justificassem e expressassem suas dificuldades. Dentre os motivos apresentados sobre a não realização da atividade, destacamos a falta de tempo (carga horária de trabalho pesada e outros projetos na escola) e a falta de um laboratório de informática na escola com computadores suficientes para todos os professores (alguns alegaram não ter computador ou notebook pessoal). Outras questões do questionário buscavam contemplar a fase da Reação nos participantes: Qual a sua percepção atual do uso das tecnologias na escola? Acha que esta formação o ajudou a ver as tecnologias como aliadas na formação dos seus estudantes? Em que aspectos? O que achou deste modelo de formação realizada na escola com a troca de experiência entre os colegas professores? Pretende continuar usando alguma tecnologia com seus estudantes? Quais aplicativos têm em mente? Sobre a questão ─ acha que esta formação o ajudou a ver as tecnologias como aliadas na formação dos seus estudantes? ─ algumas respostas indicaram que o modelo foi bem aceite: 86 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Animada, pois estimula nossa visão para as ferramentas na área da tecnologia com possibilidade de mudar nossos planejamentos no interior da sala de aula. Prof. 12 Sim, pois vi que há muitas possibilidades de socializar os conteúdos de forma diferente. Prof.1 Excelente oportunidade de formação. Fez com que todos educadores percebessem que é possível utilizar. Prof. 3 Sim, certamente. Objetivamente formos desafiados a sair de uma rotina e isso é importante e necessário. Prof. 5 Excelente. Uma formação com teoria e prática, além de acompanhamento. Prof. 15 Podemos inferir destes comentários dos participantes que a metodologia FIPELD cumpriu seu objetivo principal, que estava centrado em motivar os professores e fazê-los crer que conseguem usar as tecnologias como uma aliada para potencializar a inovaçao de suas práticas pedagógicas, colocando os seus estudantes como atores da construção do conhecimento. Destacamos nesta experiência o apoio institucional do diretor da escola em que foram realizadas as oficinas foi fundamental para o êxito da proposta de formação continuada. Os professores participantes sentiram-se contemplados com a oportunidade de usar o tempo de reuniões pedagógicas para se qualificarem para o uso das tecnologias com seus estudantes. O que Nóvoa (2014) preconiza como fundamental para a formação dos professores – que esta ocorra nos espaços escolares com discussão entre os pares. Conforme já exposto, o modelo FIPELD é adaptável a diferentes situações. No caso do projeto piloto aplicado a professores de uma escola pública em Palmas-TO relatado acima, as quatro oficinas propostas foram aglutinadas em duas e contemplavam os cinco passos da metodologia (Alves & Silva, 2018). A segunda experiência com aplicação do modelo foi realizada com apoio de webconferência via Skype. A formadora estava em Palmas Tocantins e a outra professora formadora em São Francisco de Paula, interior do Estado do Rio Grande do Sul. A proposta era realizar as oficinas online com os estudantes do curso de Elaine Jesus Alves | 87 Pedagogia da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS). Assim mais uma vez o modelo FIPELD teve que ser adaptado para realização via web conferência A primeira conferência foi realizada dia 29/10/2018 numa sala do polo com uma participação expressiva de estudantes (figura 6). Figura 6 - Oficina do dia 29/10/2018 (via Skype) Fonte: Elaboração própria. De acordo com os pressupostos do modelo FILPED, o primeiro momento foi dedicado a motivar os participantes a usarem as tecnologias com seus estudantes. Com o suporte do aplicativo Prezi, criamos uma apresentação instigadora e motivadora. A pergunta inicial foi “como você se sente quando seu aluno está usando o celular na sua aula?”. A questão foi realmente para que os participantes tivessem empatia e colocassem no lugar de um professor que precisa gerenciar o uso dos celulares dos estudantes na hora da sua aula. Os participantes foram convidados a se expressar e manifestaram preocupação com a situação. O restante da apresentação do Prezi foi com o intuito de expor motivos para os professores aproveitarem as múltiplas funcionalidades dos celulares a seu favor nas suas aulas. O argumento inicial foi discutir sobre a resistência da escola e dos educadores em sua grande maioria em usar as tecnologias com os estudantes. 88 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Realizada essa reflexão, outra questão foi levantada: E se você professor, tivesse um kit que pudesse te auxiliar nas suas aulas, motivar os estudantes a pesquisar informações, analisar dados, tirar fotos, GPS, editor de texto, planilhas e facilitar a interação? Argumentamos que os estudantes possuem este kit em suas mãos e que os professores precisam explorar as potencialidades das ferramentas disponíveis nos smartphones e tablets dos seus estudantes. A partir desta explanação mostramos vários aplicativos que podem ser usados como ferramentas na sala de aula, com destaque para o Kahoot, Plickers e a Webquest. Considerando que um dos pressupostos do modelo FIPELD é a necessidade do professor “experimentar” as tecnologias para acenderem a chama da motivação, propomos que os participantes se colocassem em lugar de estudantes para experimentarem um aplicativo e então falassem sobre as suas percepções da experiência. Assim, como fizemos na primeira experiência, preparamos com antecedência uma atividade no Kahoot em que os professores participantes exerceriam a função de “estudantes”. Com ajuda do projetor de slides foi possível projetar as questões do jogo para os participantes e eles puderam responder as perguntas do aplicativo Kahoot. O aplicativo mostra as respostas corretas em tempo real e classificam os melhores colocados. Todos participaram de forma bastante animada e houve até torcida pelos que estavam mais pontuados. Depois de experimentarem o aplicativo, demonstramos como este é intuitivo e fácil de trabalhar com os estudantes. Percebemos que os participantes ficaram de fato empolgados com a ferramenta e que mesmo a formadora projetando o jogo no slide do Skype foi possível realizar a atividade. Depois, remotamente usando o Skype apresentamos aos participantes a ferramenta Webquest. Esta é uma metodologia de pesquisa na internet, voltada para o processo educacional, estimulando a procura da informação e o pensamento crítico. A praticidade da Webquest para usuários iniciantes é que esta não exige softwares específicos além dos utilizados comumente para navegar na rede, produzir páginas, textos e imagens. A formadora Elaine Jesus Alves | 89 criou uma Webquest com antecedência e mostrou aos participantes as suas funcionalidades. Esta foi uma ferramenta muito apreciada pelos participantes e quando perguntamos se gostariam de aprender o passo a passo da Webquest ou do Kahoot, a maioria optou pela primeira. Assim, os participantes foram capacitados para criar uma Webquest no Google sites usando seus próprios laptops, com a ajuda das professoras que estavam presentes no polo e foram suportes presenciais no evento. O Google sites é bastante intuitivo e fácil de manusear, assim os professores encontraram pouca dificuldade ao fazer o treinamento com a Webquest. A atividade que deveriam realizar no intervalo de um mês até à próxima oficina constituía na criação de uma Webquest para trabalhar em sala de aula com seus estudantes, também deviam anotar os resultados e preparar uma apresentação da experiência no próximo encontro (oficina). A segunda oficina via Skype foi realizada no dia 26 de novembro de 2018 nas mesmas dependências do polo UAB de São Francisco de Paula. Após uma breve introdução, os participantes foram incentivados a apresentarem os seus trabalhos referentes a criação da Webquest. Foi surpreendente o envolvimento dos participantes. Ao contrário da aplicação do modelo FIPELD na forma presencial realizada numa escola pública em Palmas-TO, em que apenas cinco de dezenove professores apresentaram seus trabalhos, os participantes desta formação via Skype se organizaram em grupos e apresentaram suas Webquest à turma. A formadora assistia online as apresentações tecendo comentários e apreciando o esforço e criatividade dos excelentes trabalhos apresentados (figura 7). 90 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Figura 7 – Apresentação de trabalhos dos estudantes via Skype Fonte: Elaboração própria. Além das apresentações de Webquest, um grupo nos surpreendeu porque criaram uma atividade no aplicativo Kahoot e aplicaram com os participantes da formação. Verificamos nessa experiência que os participantes após participarem como estudantes de algum aplicativo expressam mais interesse naqueles experimentados do que em outros que apenas lhe são apresentados. A fase da Avaliação e Reação da FIPELD nessa formação foi realizada por meio de questionário entregue aos participantes para que pudessem expressar em palavras as suas percepções sobre a formação e se esta de alguma forma contribuiu para motiva-los a usarem as tecnologias na sua (futura) prática docente. Os participantes ficaram de responder os questionários e depois os enviarem digitalizados para a formadora. O questionário foi dividido em duas seções (I) Avaliação participantes se auto avaliariam com respeito os resultados da formação, se esta realmente foi válida e/ou os motivou a usarem as tecnologias nas suas práticas pedagógicas; (II) Reação – participantes refletem sobre os resultados da formação e são levados a pensar em projetos futuros com uso de tecnologias com seus estudantes. Elaine Jesus Alves | 91 Foram coletados 18 questionários dos participantes cujas respostas demonstram que a formação foi uma interessante experiência para eles enquanto ainda em formação na universidade. Seguem no quadro abaixo algumas respostas dos participantes (quadro 2) com relação à primeira pergunta da seção I (identificamos os participantes no texto de acordo com a ordem que os questionários foram tabulados usando numeração crescente e a letra “p” como abreviatura de participante). Quadro 2 – percepção de alguns participantes sobre a sua motivação após a formação FIPELD. Sim, apesar de estar sem computador resolvi usar a máquina da escola e motivei alguns estudantes a realizarem a tarefa (p. 2). Após a participação desta formação, você se sentiu motivado (a) a usar as tecnologias na sua prática pedagógica? Justifique. Sim acredito que é necessário o uso de recursos de tecnologias tendo em vista a grande demanda dos estudantes por aulas criativas e que facilitam a aprendizagem (p.3) Sim, pois é bastante atrativo o mundo tecnológico para estudantes e professores (p. 5) Sim, é uma ferramenta que dinamiza e motiva mais os estudantes (p. 11) Após essa de 29 de novembro me sinto motivada, pois é uma ferramenta fundamental visto que não dá para separar as tecnologias da sala de aula (p. 12) Eu já usava as tecnologias nas minhas práticas e após esta dada me senti mais motivado ainda (p. 14) Alguns participantes justificaram a razão de não terem realizado a atividade da Webquest. Os motivos relacionados nos questionários foram desde a falta de computador em casa e restrição do uso na escola bem como dificuldades em relação ao tempo para realização das atividades (carga horária na escola excessiva). Sobre as dificuldades encontradas para realizar a atividade da Webquest, alguns alegaram falta de tempo devido ser algo novo, falta de recursos tecnológicos e dúvidas em relação ao uso das ferramentas. Por outro lado, quando questionados sobre os benefícios da experiência, os participantes mostraram-se animados com o leque de oportunidades que a ferramenta proporciona, outro afirmou que foi um recurso novo e muito divertido e ainda outros citaram os desafios impostos pela Webquest como um chamariz dos estudantes para motivá-los a realizar as atividades de pesquisa. A segunda seção do questionário solicitou dos participantes a percepção que tiveram do modelo FIPELD, segue algumas respostas: 92 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Muito válida ajudou muito a troca de experiências, abrindo novas janelas de conhecimento (p.1); Excelente oportunidade de formação. Fez com que todos educadores percebessem que é possível realizar (p. 3); Excelente. Uma formação com teoria e prática, além de acompanhamento (p.5); Trabalho muito bom de interação, só veio a somar (p.7) Achei muito legal, percebo que não podemos fugir dos aplicativos e da tecnologia (p.8); Este modelo de formação é muito dinâmico e envolvente, mesmo não tendo participação das outras formações fiquei bastante interessada (p.9); Animada, pois estimula nossa visão para as ferramentas na área de tecnologia com possibilidade de mudar nossos planejamentos no interior da sala de aula (p.10); Muito bom e válido. É oportunidade dos professores socializarem experiências positivas e negativas em busca de soluções para o que deu errado (p.13). Este recorte das respostas de alguns dos participantes revela que o modelo foi bem aceito e considerado prático para a realidade dos professores. Percebemos pela participação expressiva do grupo que os mesmos ficaram de fato motivados a usarem as tecnologias com seus futuros estudantes quando já estiverem em sala de aula. A próxima pergunta do questionário foi: Pretende continuar usando as tecnologias com seus estudantes? Quais aplicativos têm em mente? As respostas variaram entre os aplicativos que experimentamos na formação (Kahoot, Webquest, Edmod), e ainda Whatsapp e blogs; Estas respostas sustentam o pressuposto da FIPELD de que os professores sentem-se mais motivados a utilizarem aplicativos que experimentaram e tiveram contato direto no manuseio. Nesta experiência, realizada com estudantes de Pedagogia nos revela que estes futuros professores estão conscientes da importância de integrarem as tecnologias nas suas práticas pedagógicas. O modo em que estes professores estão sendo formados faz muita diferença nos profissionais que serão. Portanto, como Nóvoa (2009) defende, o período mais fértil para se semear e disseminar valores sobre a importância de se integrar as tecnologias ás práticas pedagógicas é na universidade nos Elaine Jesus Alves | 93 cursos de licenciatura em que o aprendiz ainda está formando suas crenças e aberto a novos comportamentos e práticas. No artigo de relato da experiência (ALVES, FALAVIGNA & FARIA, 2018), as autoras pontuaram alguns aprendizados da da relato da experiência da aplicação do modelo FIPELD usando web conferência: • • • • • O modelo FIPELD pode ser utilizado em formações realizadas a distância, considerando que o fator motivação presente na primeira oficina se trabalhado com eficácia produz resultados; Para que o modelo tenha bons resultados é necessário que os participantes experimentem na posição de estudantes alguma ferramenta ou aplicativo que os faça sentir como seus estudantes sentiriam se também a experimentassem (empatia); Na formação FIPELD a distância ou presencial, é fundamental deixar uma tarefa/atividade para o participante fazer que envolva o uso de uma ferramenta ou aplicativo com seus estudantes ou mesmo simulação de uso; A escolha de um aplicativo que seja intuitivo e de fácil aprendizagem é o ideal para iniciar os participantes com as tecnologias; Muito importante ressaltar que a ferramenta será o meio para chegar a atingir um objetivo pedagógico, logo, o plano de aula precisa ter claro que objetivos se pretende atingir com a integração de determinada tecnologia. Portanto, modelos de formação docente para a integração das tecnologias, para serem eficazes, de acordo com os estudos desta pesquisa podem resumidamente assumir estas características: • • • • • • • • Contemplem os espaços escolares com os pares; Motivem os professores a usar tecnologias com os estudantes; Possibilitem que o professor se coloque na posição de estudantes para experimentar a tecnologia; Permitem que o professor coloque as “mãos na massa” – ousem a aprender usar um aplicativo com fins pedagógicos e interativos; Tenham acompanhamento de formadores experientes; Apliquem com seus estudantes aplicativos que tenham maior afinidade e conhecimento técnico; Compartilhem a experiência com os pares refletindo nas dificuldades e avanços alcançados; Repitam a experiência até se tornarem expertises 94 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Assim, modelos de formação docente nestes formatos podem ajudar a você – professor - a ser protagonista da sua formação para a literacia digital. No capítulo a seguir vamos considerar algumas formas práticas para que você possa tirar partido das potencialidades das tecnologias nas suas aulas. Capítulo 4 Você pode integrar tecnologias nas suas aulas! "Se você pensa que pode ou sonha que pode, comece. Ousadia tem genialidade, poder e mágica. Ouse fazer e o poder lhe será dado." Ghoethe Se você avançou a sua leitura até este capítulo, demonstra que tem interesse em fazer das tecnologias a sua aliada na sala de aula junto a seus estudantes. O primeiro passo é ousar, perder o medo. Neste livro refletimos que você não deve se sentir inferior ou fracassado se teve alguma experiência frustrada com uso de tecnologias com seus estudantes. É normal que isso tenha acontecido, pois vários fatores devem ser considerados: • • • • O modelo de curso em que você foi formado provavelmente foi tradicional, com aulas expositivas e o uso das tecnologias era para transmitir conteúdos (retroprojetor de transparências, projetor de slides, dentre outros). O seu professor encarava as tecnologias como ferramentas para ensinar, e não meios para se aprender; Você não foi preparado adequadamente no seu curso de formação inicial; No máximo você teve uma disciplina com nome de tecnologias da informação ou nome parecido da qual tratou as tecnologias de forma genérica e teórica sem contextualização prática; Na formação continuada, você fez alguns cursos de “informática para a educação” ou nomes similares dos quais aprendeu a manusear tecnicamente o computador, navegar na internet e fazer slides no powerpoit para apresentar em suas aulas. Você acreditava no mito de que TODOS os jovens que estão com seus celulares ativos na internet são nativos digitais ou fazem parte de uma geração super especializada em tecnologias e que você não conseguiria usar um aplicativo na aula porque estes jovens poderiam saber mais sobre a ferramenta e desestabilizar sua posição de professor; 96 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? • • Você achava que por estes jovens terem facilidade com o manuseio das tecnologias eles não precisavam ser orientados no que diz respeito ao acesso, a seleção de informações, da segurança na rede e da credibilidade dos dados acessados; Por já ter feito alguma experiência mal sucedida, você chegou a pensar que a tecnologia nas mãos dos estudantes só atrapalha a aula e dispersa os estudantes; Assim, poderíamos enumerar aqui infinitas razões pelas quais você ainda resiste em usar tecnologias nas suas aulas. Prensky (2001) afirmava, de que o imigrante digital nunca se tornaria um nativo digital, ou seja, sempre teria dificuldades como um “sotaque”, levando para o campo educacional, seria como afirmar que o professor nunca poderá ter as mesmas habilidades dos seus estudantes no que diz respeito às tecnologias. No entanto, como vimos no capítulo dois, os professores possuem mais conhecimento crítico e podem orientar os estudantes com mais destreza no tocante à literacia digital. Então, pense por este lado, os seus longos anos de experiência docente e todo seu conhecimento acumulado não são invalidados porque você não consegue configurar um determinado aplicativo. Neste capítulo vamos apresentar dez passos que você poderá tomar para alcançar a literacia digital para então integrar as tecnologias na sua prática pedagógica. 1ª Compreenda o porquê os estudantes precisam aprender com tecnologias O primeiro passo para sua caminhada rumo à literacia digital e boas práticas com tecnologias nas suas aulas, constitui seu entendimento sobre as razões pelas quais os seus estudantes precisam aprender com suporte das tecnologias. Ao longo da sua formação e no decorrer da prática diária na docência, os professores desenvolvem concepções de ensino aprendizagem que vêm a formar a base das suas decisões metodológicas, inclusive se irão fazer uso das tecnologias. Sobre este aspecto, Almeida e Elaine Jesus Alves | 97 Valente (2011, p. 47) comentam que essas concepções vêm a constituir crenças que “ajudam o professor a negociar incertezas do trabalho na escola e, provavelmente a aderir ou não às mudanças para algo que ainda não foi totalmente comprovado”. Os autores concluem que estas crenças não podem ser ignoradas, pois elas podem fazer um efeito contrário e constituírem obstáculos ao processo de mudança: Os estudos mostraram que negligenciar as crenças e teorias pessoais pode acarretar o choque de duas culturas opostas: a cultura transformadora dos proponentes da inovação e a cultura das práticas existentes, que passam a ser críticas, resistentes e defensivas (idem, p. 47). Neste sentido, a formação docente para a literacia digital deve criar condições para que o professor experimente e vivencie novas experiências com as TDIC de forma que ele reflita sobre suas crenças e avalie a necessidade de mudanças e inovações. Portanto pergunte-se: Quais são as minhas crenças sobre as tecnologias no âmbito escolar? Como percebo a presença de celulares nas mãos dos estudantes durante as minhas aulas? Entendo que eles vão precisar usar alguma tecnologia quando forem para o mercado de trabalho? Se eu os privo de trabalharem em projetos colaborativos com suporte de tecnologias como eles vão adquirir habilidades para pesquisar dados, filtrar, selecionar, conferir a credibilidade, sintetizar, produzir e publicar (literacia digital)? Vejo nas tecnologias uma aliada para potencializar as minhas aulas considerando que os estudantes já têm seus dispositivos móveis com internet? Fazer esta autoanálise ajudará a você professor refletir, ler sobre o assunto e repensar suas crenças se necessário for com relação às tecnologias na área educativa. A decisão de usar ou não tecnologias digitais com seus estudantes é pessoal. Embora existam recomendações sobre uso de programas, softwares e aplicativos educativos, cabe ao professor decidir se vai tirar proveito do potencial pedagógico das tecnologias. De acordo com Costa et. al (2012), embora existam múltiplos fatores envol- 98 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? vidos na concepção de condições necessárias ao uso das TDIC, a decisão individual de cada educador constitui o fator mais determinante neste processo. Assim, a decisão de cada professor de integrar as TDIC nas suas práticas pedagógicas passa pelo reconhecimento da importância destas na aprendizagem e uma expectativa positiva diante dos possíveis impactos que as TDIC podem ter no rendimento e desempenho dos estudantes. 2º Esteja disposto a aprender sobre tecnologias Outra afirmação equivocada que Prensky fez sobre os professores no seu livro Enseñar_a_nativos_digitales (2011, p. 13) foi de que os professores não precisam ter conhecimento técnico da tecnologia (embora se quiser possam ter), mas devem apenas saber como a tecnologia pode e deve ser usada pelos estudantes para melhorar seu aprendizado. Embora a técnica não seja o foco da integração da tecnologia no currículo, antes de aproximar-se do nível de ser capaz de trabalhar com tecnologias junto aos estudantes, o professor deverá aprender sobre tecnologia (Jonassen, 1996). Costa (2013, p. 58) explica que “aprender sobre tecnologia” significa tomá-la como objeto de estudo: “a ideia central desta perspectiva é a de que as tecnologias digitais constituem em si mesmas um corpo de conhecimento indispensável para que o aluno possa inserir com sucesso na sociedade digital”. Neste sentido, a formação docente para a literacia digital precede de conhecimento técnico das TDIC. Conhecer com clareza as ferramentas e aplicações das TDIC que irá utilizar com seus estudantes é imprescindível para o sucesso da experiência. Portanto, embora a motivação para usar as tecnologias com os estudantes seja o primeiro passo e muito importante, Costa et. al. (2012) ressaltam que apenas a motivação do professor não é o bastante para que estes possam integrar as TDIC no contexto escolar. Os autores explicam: Elaine Jesus Alves | 99 Esta atitude favorável só faz sentido, no entanto, se cada professor estiver na posse do conhecimento sobre o que pode ser feito com as tecnologias disponíveis, para depois articulá-las com os objetivos curriculares. Digamos que não basta reconhecer a importância das tecnologias e estar motivado para a sua utilização, mas que é imprescindível ter algum conhecimento tecnológico, sem o qual será difícil uma tomada de decisão fundamentada e esclarecida. Tratar-se-ia, neste caso, de procurar saber que tecnologias existem, o que permitem fazer, qual o seu grau de dificuldade em termos de aprendizagem, que requisitos técnicos são necessários para poderem ser utilizadas pelos estudantes, para referirmos apenas alguns dos aspetos essenciais ao seu uso efetivo. (idem, p.24). Costa (2013) aponta o desconhecimento do potencial das TDIC da parte dos docentes como um dos fatores que levam estes a não tirarem partido do potencial pedagógico didático das tecnologias. Outro fator apontado pelo autor é o despreparo dos docentes que em geral tiveram uma “preparação de cariz predominantemente técnico com claro prejuízo para uma preparação metodológica assente na reflexão sobre os benefícios e sobre os modos adequados de utilização das TIC no currículo” (idem, p.48). Diante destes pressupostos, na prática explore o universo de aplicativos, sites, Ambientes Virtuais de Aprendizagens, e tudo relacionado com tecnologias educativas. Existe uma literatura vasta nesta área, além de grupos de pesquisa, sites especializados, comunidades de aprendizagem que tratam desta temática. Que tal começar a ler sobre experiências de outros professores no uso de tecnologias com seus estudantes? Uma recomendação de leitura são os textos de Adelina Moura, professora portuguesa que tem alto gabarito na área de tecnologia educativa. A pesquisadora hospeda um site com suas publicações que tratam do uso de dispositivos móveis na educação. Moura possui também um canal no Youtube onde posta tutoriais práticos de aplicativos educativos. Comece a explorar este universo e veja por si mesmo como pode ser interessante usar o suporte de uma tecnologia na sua aula. 100 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Indicamos também a leitura do livro APPs para dispositivos móveis que contém uma gama de experiências com uso de aplicativos com estudantes em sala de aula. Também o site APPs para educação apresenta diversos aplicativos educacionais para diferentes funções e objetivos pedagógicos. Busque uma comunidade no Facebook que divulgue iniciativas inovadoras de professores de diversas partes do mundo. Uma comunidade interessante chama-se Professores usando tecnologias em sala de aula. Trata-se de um grupo público em que diferentes educadores compartilham experiências próprias ou mesmo compartilhadas na rede de práticas, tendências, inovações e eventos na área de tecnologias educativas. Ao começar a se interessar pela temática, ler e assistir vídeos sobre tecnologias inovadoras na sala de aula, você vai começar o desejo de se preparar para experimentar também com seus estudantes. Outra dica é busque um mentor, uma pessoa que seja referência na área das tecnologias educativas do qual você se inspira. Explore ao máximo todos os trabalhos deste mentor e tenha a meta de alcançar a sua excelência. 3º Experimente com um aplicativo que lhe seja mais familiar Já viu aquela receita gastronômica num vídeo e ficou com vontade de fazer em casa? Você experimentaria fazer essa receita nova num jantar importante com convidados? Obviamente que não. O primeiro experimento de uma receita quase sempre fazemos para nossa família mais próxima e ainda explicamos que é apenas uma experiência, que pode ser melhorada. Em muitos casos, pedimos a opinião deles sobre o que acharam, ou se ainda podemos melhorar ou acrescentar algum ingrediente para aperfeiçoar. O mesmo ocorre nas suas primeiras experiências com manuseio de tecnologias nas suas aulas. Você não deve aplicar uma atividade com suporte de tecnologias sem antes ter testado a ferramenta com um público restrito (pode ser membros da sua família, amigos ou colegas Elaine Jesus Alves | 101 professores). O primeiro passo é seguir a receita. Faça um plano de aula com objetivos claros de aprendizagem. Escolha a tecnologia que será usada como suporte e deixe claro no plano o objetivo pedagógico desta. Este passo é muito importante, porque a tecnologia não deve ser usada como “fetiche” ou para enfeitar sua aula, ou torna-la aula show. A tecnologia deve cumprir um objetivo pedagógico que deve estar explícito no seu plano de aula. De posse do seu plano de aula, prepare a ferramenta que vai usar. Por exemplo, ao escolher a Webquest, procure tutoriais sobre como criala, também será útil conhecer modelos de webquest já elaboradas por outros professores e ler artigos de experiências a respeito. Procure conhecer bem a ferramenta e comece a criar a sua atividade. Após a criação, mostre para alguém que possa te dar um retorno sobre o que achou da atividade, se os enunciados estão claros ou se existe algum entrave tecnológico. Se possível, faça um teste com um grupo de pessoas pequeno para perceber alguma necessidade de aperfeiçoamento. 4º Após os testes, experimente ensinar com tecnologias junto a seus estudantes Você notará o entusiasmo dos seus estudantes quando apresentar uma atividade com suporte de uma tecnologia. Esteja preparado para as possíveis diferenças que eles apresentarão com respeito ao tipo de dispositivos que têm, acesso à internet, conhecimento tecnológico e capacidade de aprender. Por isso ao apresentar a atividade tente minimizar essas diferenças. Pergunte quem possui celular com internet e ao perceber que alguns não possuem designe-os com alguém que tenha o dispositivo para que trabalhem em duplas. Antes de iniciar, faça um “combinado com os estudantes. A professora Adelina Moura utiliza um Regulamento para 102 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? uso de smartphone nas suas aulas1. Este é construído em conjunto com os estudantes e prevê um sistema de pontos, que penaliza o mau uso. A ideia, afirma a autora “é que eles sintam que têm uma ferramenta muito potente, mas que tem que ser usada positivamente”. Disponibilizamos no anexo 1 o modelo de regulamento cujo o princípio geral é apresentado no artigo 3º: “Os estudantes desta turma estão autorizados a utilizar, correctamente, os seus dispositivos móveis na aula de Português quando for essencial e indispensável para apoio e realização das atividades propostas e com a autorização da professora”. Sobre as penalidades previstas caso este princípio básico seja descumprido são expressas no artigo 4ªº do Regulamento: 1. Advertência verbal – Sempre que o aluno prevaricar pela primeira vez. 2. Perda de pontos – O aluno perde 10 pontos sempre que prevaricar depois da primeira advertência. 3. Apreensão do equipamento – Sempre que já se tenha aplicado as medidas anteriores, é apreendida o equipamento que ficará na posse da professora até ao final da aula. 4. Falta disciplinar – Sempre que o aluno perca pontos e continue a prevaricar. 5. Após uma repreensão, o aluno perde 10 pontos, porém se o aluno mostrar arrependimento nas próximas 3 aulas, o aluno recupera 5 pontos, nunca excedendo os 300 pontos. Ressaltamos que o sistema de pontuação de Portugal é diferente do brasileiro, mas a ideia é combinar com os estudantes que é preciso disciplina e obedecer a regras para o uso dos smartphones na aula. 5º Avalie a experiência e reflita sobre pontos fortes e fracos É importante que durante a experiência do uso das tecnologias com os estudantes você anote alguns pontos que considerar importantes. Por exemplo, se notar que um número considerável de estudantes reportam 1 Fonte: https://www.jn.pt/nacional/e-um-desperdicio-pedir-aos-estudantes-que-guardem-os-smartphones-nasaulas---professora-8913470.html Elaine Jesus Alves | 103 a mesma dúvida, ou têm dificuldade em uma atividade específica, pode ser que o enunciado não esteja claro, ou esteja ocorrendo algum “bug” no aparato tecnológico. Estes problemas recorrentes precisam ser anotados para que na próxima vez que usar aquele aplicativo ou ferramenta você possa antever os erros e aperfeiçoar cada vez mais. Igualmente anote os pontos positivos da experiência. Fique atento ao que agrada aos estudantes e como você pode usar outros aplicativos com atributos semelhantes para um resultado parecido. Também é muito importante ao final da atividade perguntar aos estudantes o que acharam da atividade. O feedback deles pode conter informações úteis para uma futura reaplicação da atividade. Reflita se os objetivos de aprendizagem foram alcançados. Se possível faça um diário de bordo para anotar as informações que julgar relevante a cada atividade com suporte de tecnologias com seus estudantes. 6º Repita a experiência usando a avaliação anterior Numa ocasião oportuna, reveja a avaliação da atividade com tecnologias realizada anteriormente e repita a experiência considerando todos os pontos fortes e fracos detectados. Voltando à analogia da receita e o cozinheiro, experimente novas formas de usar a tecnologia/dispositivo. Não se apegue cegamente a modelos prontos disponíveis em vídeos ou artigos. Pense na realidade e perfil dos seus estudantes e adeque as tecnologias e metodologias de trabalhar com elas à sua turma. 7º Compartilhe suas experiências com os pares Nos modelos de formação apresentado neste livro um ponto em comum entre os autores é a importância da interação entre os pares. No modelo de formação proposto por Costa (2012, p.99) , é designado como Interação: 104 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Na quarta etapa (designada como Interação), espera-se precisamente que o professor interaja e discuta com o formador ou com os colegas sobre o processo e os resultados, de forma a partilhar o que foi feito e assim poder receber achegas sobre como resolver problemas e superar obstáculos, ou simplesmente pôr em comum práticas e materiais. No modelo FIPELD, este momento de reflexão com os pares é chamado de Avaliação. Na prática, procure um professor que tenha afinidade e que tenha mais experiência com uso de tecnologias nas aulas e compartilhe sua experiência com ele. Juntos poderão refletir sobre a experiência e ele poderá auxiliá-lo com sugestões práticas. 8º Ajude outros professores Quando você começar a usar tecnologias de forma interativa com seus estudantes logo ficará conhecido na sua instituição de ensino como um professor inovador. Se for consultado para ajudar algum colega professor que tenha baixa literacia digital e que tenha interesse de aperfeiçoar estas habilidades, sinta-se compelido a ajuda-lo. Perceberá que a medida que ensinas, compartilhas seus conhecimento sentirás motivado a seguir inovando e aprenderá mais. Uma proposta multidisciplinar pode ser trabalhada com vários professores e com uso de diferentes suportes tecnológicos. O ideal é que o professor mais experiente no uso de tecnologias com os estudantes coordene os demais e os ajude a realizar as atividades propostas. Em projetos deste porte todos ganham: os professores com o aperfeiçoamento da literacia digital e os estudantes com a aprendizagem potencializada com as tecnologias. 9º Publique suas experiências O professor universitário costuma publicar suas experiências em congressos, artigos e mesmo livros. O professor do ensino básico, em Elaine Jesus Alves | 105 geral, com muita experiência em sala de aula, não tem como costume publicar suas experiências exitosas. É preciso mudar esta realidade. Pesquise eventos especializados na área de tecnologias educativas e publique suas experiências de integração das tecnologias nas suas aulas. Crie seu blog, publique um ebook, compartilhe experiências nas redes sociais, pratique a autoria em redes. O seu engajamento com a integração das tecnologias enriquece sua formação e contagia outros professores a iniciarem os passos para a literacia digital. 10º Nunca pare de aprender As competências de literacia digital não se resumem às atividades acadêmicas, de acordo com Costa (2013, p.44), a literacia digital vai além do simples conhecimentos sobre a tecnologia: O domínio do digital implica ser capaz de utilizar crítica e eficazmente as tecnologias, de modo a fazer algo construtivo e significativo com elas. Esta competência digital tornou-se fundamental na sociedade contemporânea, tendo, inclusive, sido reconhecida como uma das competências-chave para a aprendizagem ao longo da vida. (o grifo é nosso) Portanto, a formação para a literacia digital é constante e evolutiva. Não cessa com uma experiência ou certificado de curso de formação. É um ciclo contínuo que avança a medida que você experimenta novos ambientes virtuais, novas ferramentas e aplicativos. Considerações contínuas... Ao se discutir as tecnologias e suas reconfigurações no âmbito educacional, não há lugar para considerações finais, sempre há o que se aprender, o que se experimentar e publicar. As dinâmicas na era digital são voláteis e mudam constantemente. Incentivamos a você professor, conhecer seu ritmo e buscar avançar dentro das suas possibilidades. 106 | Porque não consigo ensinar com tecnologias nas minhas aulas? Esperamos que este livro tenha cumprido o seu objetivo de motiválo neste processo, ciente de que não se encontra sozinho no desafio de integrar as tecnologias nas suas aulas. Muitos professores foram formados sem preparação para conceberem as TDIC como ferramentas para aprender. Somos frutos dessa geração cujas tecnologias eram designadas como suportes para ensinar (leia-se transmitir conteúdos). Vivemos todos no mesmo mundo em que se prega que os estudantes são nativos digitais e como tal já dominam as tecnologias com propriedade para aprenderem sozinhos. Assim, as suas dificuldades são a de tantos outros professores que vivem a mesma situação dia-dia: confrontar os alunos e seus celulares nas suas aulas. Portanto, sinta-se aliviado de saber que você pode conseguir ensinar com tecnologias de forma interativa com seus alunos! O convite é que comece agora mesmo as suas pesquisas na área, leia artigos com experiências exitosas, procure um mentor para se inspirar e prepare-se para tirar pleno proveito das potencialidades que as tecnologias podem oferecer nas suas aulas. Referências AGOSTINHO, S. T.; TINDALL-FORD, S. & ROODENRYS, K. Using computer-based tools to self manage cognitive load. In: T. Bastiaens, & M. Ebner, World Conference on Educational Multimedia, Hypermedia and Telecommunications 2011, pp. 33743378. ALMEIDA, M. E., & PRADO, M. E. Formação de educadores para o uso dos computadores portáteis: indicadores de mudança na prática e no currículo. 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Artigo 1º Objeto Este regulamento tem como objetivo criar regras para o uso adequado do Smartphone/tablets na aula de Português. Artigo 2º Aplicabilidade Este regulamento aplica-se a todos os alunos do 10º ano da turma TPI da Escola Secundária Carlos Amarante no ano letivo 2017/2018. Artigo 3º Princípio geral Os alunos desta turma estão autorizados a utilizar, correctamente, os seus dispositivos móveis na aula de Português quando for essencial e indispensável para apoio e realização das atividades propostas e com a autorização da professora. Artigo 4º Medidas corretivas Qualquer infração ao Artigo 3º implica a aplicação das seguintes medidas: 1. Advertência verbal – Sempre que o aluno prevaricar pela primeira vez. 2. Perda de pontos – O aluno perde 10 pontos sempre que prevaricar depois da primeira advertência. 3. Apreensão do equipamento – Sempre que já se tenha aplicado as medidas anteriores, é apreendida o equipamento que ficará na posse da professora até ao final da aula. 4. Falta disciplinar – Sempre que o aluno perca pontos e continue a prevaricar. Elaine Jesus Alves | 115 5. Após uma repreensão, o aluno perde 10 pontos, porém se o aluno mostrar arrependimento nas próximas 3 aulas, o aluno recupera 5 pontos, nunca excedendo os 300 pontos. Artigo 5º Exceção Será exceção ao Princípio Geral sempre que se verifique um contacto de emergência. Artigo 6º Captação de imagens É proibida a captação de imagens que não sejam expressamente autorizadas pela professora. Artigo 7º Divulgação de imagens É proibida a divulgação de imagens que não sejam expressamente autorizadas pela professora. Artigo 8º Outras observações Este regulamento pode ser revisto sempre que se julgue necessário. Todos os alunos desta turma concordaram com este regulamento. A Editora Fi é especializada na editoração, publicação e divulgação de pesquisa acadêmica/científica das humanidades, sob acesso aberto, produzida em parceria das mais diversas instituições de ensino superior no Brasil. 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