Germinal
De Emile Zola
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Sobre este e-book
Emile Zola
Nació en París en 1840. Hijo de un ingeniero italiano que murió cuando él apenas tenía siete años, nunca fue muy brillante en los estudios, trabajó durante un tiempo en la administración de aduanas, y a los veintidós años se hizo cargo del departamento de publicidad del editor Hachette. Gracias a este empleo conoció a la sociedad literaria del momento y empezó a escribir. Thérèse Raquin (1867; ALBA CLÁSICA núm. LVIII; ALBA MINUS núm. 33) fue su primera novela «naturalista», que él gustaba de definir como «un trozo de vida». En 1871, La fortuna de los Rougon y La jauría iniciaron el ciclo de Los Rougon-Macquart, una serie de veinte novelas cuyo propósito era trazar la «historia natural y social de una familia bajo el Segundo Imperio»; a él pertenecen, entre otras, El vientre de París (1873), La conquista de Plassans (1874) (editadas conjuntamente en ALBA CLÁSICA MAIOR núm. XXXV), La caída del padre Mouret (1875), La taberna (1877), Nana (1880) y El Paraíso de las Damas (1883; ALBA CLÁSICA núm. XXVII; ALBA MINUS núm. 29); la última fue El doctor Pascal (1893). Zola seguiría posteriormente con el sistema de ciclos con las novelas que componen Las tres ciudades (1894-97) y Los cuatro Evangelios (1899-1902). En 1897 su célebre intervención en el caso Dreyfuss le valió un proceso y el exilio. «Digo lo que veo –escribió una vez–, narro sencillamente y dejo al moralista el cuidado de sacar lecciones de ello. Puse al desnudo las llagas de los de abajo. Mi obra no es una obra de partido ni de propaganda; es una obra de verdad.» Murió en París en 1902.
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Germinal - Emile Zola
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PRIMEIRA PARTE
Capítulo 1
Na planície rasa, sob a noite sem estrelas, de uma escuridão e espessura de tinta, um homem caminhava sozinho pela estrada real que vai de Marchiennes a Montsou, dez quilômetros retos de calçamento cortando os campos de beterraba. A sua frente, não enxergava nem mesmo o solo negro e somente sentia o imenso horizonte achatado através do sopro do vento de março, rajadas largas como sobre um mar, geladas por terem varrido léguas de pântanos e terras nuas. Nem sombra de árvore manchava o céu; a estrada desenrolava-se reta como um quebra-mar em meio à cerração ofuscante das trevas.
O homem partira de Marchiennes lá pelas duas horas. Caminhava a passos largos, tiritando sob o algodão puído de sua jaqueta e da calça de veludo. Um pequeno embrulho, feito com um lenço de quadrados, incomodava-o bastante; ora o mantinha apertado debaixo de um braço, ora de outro, para poder assim enfiar no fundo dos bolsos as mãos entorpecidas que o açoite do vento leste fazia sangrar. Uma única idéia lhe ocupava o cérebro vazio de operário sem trabalho e sem teto, a esperança de que o frio se tornasse menos agudo com o romper do dia. Havia uma hora que ele caminhava assim, quando percebeu à esquerda, a dois quilômetros de Montsou, uns clarões vermelhos, três braseiros queimando ao ar livre, e como suspensos. A princípio hesitou, tomado de receio; mas logo após não pôde resistir à necessidade dolorosa de aquecer por um instante as mãos.
Entrou por um atalho que se afundava campo adentro. Tudo desapareceu. À sua direita o homem tinha uma paliçada, um pedaço de tapume feito de pranchas grossas protegendo uma via férrea, enquanto à esquerda se elevava um talude de erva encimado por empenas confusas, visão de uma aldeia de tetos baixos e uniformes. Percorrera uma distância aproximada de duzentos passos quando, bruscamente, numa volta do caminho, os fogos reapareceram próximos dele sem que o homem chegasse a compreender como podiam elevar-se tão alto no céu morto, iguais a luas enevoadas. Mas, ao nível do solo, outro espetáculo o fazia parar. Era uma massa pesada, um amontoado de construções de onde se levantava a silhueta da chaminé de uma fábrica. Raros clarões saíam das janelas sujas, cinco ou seis lampiões tristes pendiam do lado de fora das vigas de madeira enegrecidas do edifício, alinhando vagamente perfis de cavaletes gigantescos. E, dessa aparição fantástica, engolfada na noite e na fumaça, um único ruído se elevava: o arfar grosso e prolongado de um escapamento de vapor, que não se via.
Só então o homem se deu conta de que aquilo era uma mina e a vergonha tomou conta dele. Para que tentar? Não haveria trabalho... Em vez de se dirigir para o edifício, decidiu escalar o terreno onde ardiam os três fogos de hulha em tachos de ferro fundido que serviam para alumiar e aquecer os homens no trabalho. Os operários encarregados do desaterro certamente tinham trabalhado até tarde, ainda estavam retirando o entulho. Agora ouvia os carregadores empurrando os vagonetes sobre os trilhos montados nos cavaletes, divisava sombras que se moviam descarregando os carros ao lado das fogueiras.
— Bom dia — disse ele aproximando-se de um dos fogos.
Em pé, de costas para o fogo, encontrava-se o carroceiro, um velho com uma blusa de malha de lã violeta e gorro de pele de coelho; enquanto seu cavalo, um cavalo baio e gordo esperava, numa imobilidade de pedra, que esvaziassem os seis vagonetes puxados por ele. O trabalhador encarregado da descarga, um rapagão ruivo e esguio, parecia não ter pressa, e pressionava a alavanca com gestos lentos. No alto, o vento redobrava de intensidade, um sopro glacial feito de grandes golfadas regulares que cortavam como golpes de foice.
— Bom dia — respondeu o velho.
E de novo o silêncio. O homem, que se sentia olhado com desconfiança, disse logo o nome:
— Eu me chamo Etienne Lantier e sou operador de máquinas. Não haverá trabalho por aqui?
As chamas o iluminavam: devia ter vinte e um anos, bem moreno, belo homem, de aspeto vigoroso, apesar de os membros serem pouco desenvolvidos.
Tranqüilizado, o carroceiro abanou a cabeça.
— Trabalho para operador de máquinas, não, não há. Ainda ontem apareceram dois, mas não há nada.
Uma rajada de vento impediu-os de falar. Mas, em seguida, Etienne, indicando o amontoado sombrio das construções ao pé do aterro, perguntou
— É uma mina, não é?
Desta vez o velho não pôde responder imediatamente, um violento acesso de tosse o sufocava. Por fim escarrou, e seu escarro fez uma mancha negra no chão avermelhado.
— É, sim, é uma mina, a Voreux. E veja, lá bem próximo está o conjunto habitacional dos mineiros.
Por sua vez, com o braço estendido, indicava no escuro a aldeia cujos telhados o jovem já vira. Mas os seis vagonetes acabavam de ser descarregados e o homem os seguiu sem mesmo fazer estalar o chicote, as pernas rígidas pelo reumatismo, enquanto o cavalo baio partia sozinho, puxando-os a custo entre os varais, debaixo de uma nova rajada de vento que lhe eriçava os pelos.
Agora a Voreux tornava-se realidade. Etienne, que continuava em frente ao braseiro aquecendo as pobres mãos escalavradas, olhava, começava a perceber cada uma das partes da mina, o galpão preto onde o carvão é peneirado, a torre do sino do poço, a vasta casa da máquina de extração, o torreão quadrado da bomba de esgoto. Esta mina, apertada no fundo de um buraco, com suas construções de tijolo atarracadas, de onde sobressaía uma chaminé que mais parecia um chifre ameaçador, dava-lhe a impressão de um animal voraz e feroz, agachado à espreita para devorar o mundo. Examinando-a, pensava em si, na sua existência de vagabundo que havia oito dias procurava trabalho; via-se na oficina da estrada de ferro, esbofeteando o chefe, expulso de Lille, expulso de toda parte; sábado tinha chegado a Marchiennes, onde se dizia que havia trabalho nas Forjas, e nada, nem nas Forjas nem em Sonneville: tivera de passar o domingo escondido sob as madeiras de uma fábrica de carroças, de onde o vigia acabava de expulsá-lo, às duas horas da madrugada. Nada, nem mais um tostão, nem mesmo uma côdea. Como continuar assim pelos caminhos, sem destino, não sabendo sequer onde abrigar-se do vento frio? Sim, era de fato uma mina, os raros lampiões iluminavam o pátio, uma porta subitamente aberta permitira-lhe vislumbrar as fornalhas das caldeiras das máquinas envoltas numa claridade viva. Encontrava explicação até para o escapamento da bomba, essa respiração grossa e ampla, resfolegando sem descanso, e que era como a respiração obstruída do monstro.
O encarregado da descarga dos vagonetes, de costas curvadas, nem mesmo levantara os olhos para Etienne. No momento em que este ia apanhar seu pequeno embrulho que estava no chão, um acesso de tosse anunciou-lhe a volta do carroceiro. Lentamente ele surgiu do escuro, seguido pelo cavalo baio que puxava outros seis vagonetes cheios.
— Há fábricas em Montsou? — perguntou o rapaz.
O velho escarrou preto antes de responder em meio à ventania:
— Fábricas é o que não falta. Você precisava ver há três ou quatro anos: tudo produzindo, faltava mão de obra, nunca se ganhou tanto. E, de repente, começa-se a apertar o cinto. Uma verdadeira desgraça cai sobre a região, o pessoal é despedido, as oficinas começam a fechar uma após outra. Talvez não seja culpa do imperador, mas que necessidade tem ele de ir lutar na América? E isso tudo sem contar os animais que morrem de cólera, como as pessoas.
E, em frases curtas, com a respiração entrecortada, ambos continuaram a lamentar-se. Etienne falou sobre seus passos inúteis que já duravam uma semana. Então havia-se de morrer de fome? Dentro em pouco as estradas estariam cheias de mendigos. Sim, retrucava o velho, tudo isso ia terminar mal, Deus não tinha o direito de jogar tantos cristãos na desgraça.
— Nem todo dia se tem carne.
— Se ao menos houvesse pão!
— É verdade, se ao menos houvesse pão!
Suas vozes se perdiam, rajadas de vento transformavam as palavras num lamento melancólico.
— Veja! — disse em voz alta o carroceiro, voltando-se para o sul. — Montsou fica para lá.
E com a mão novamente estendida designou nas trevas pontos invisíveis, à medida que os nomeava. Lá, em Montsou, a refinaria de açúcar Fauvelle ainda trabalhava, mas a Hoton reduzira o pessoal. As únicas que ainda se agüentavam: a fábrica de moagem Dutilleul e a cordoaria Bleuze, que fazia cabos de mina. Depois, com um gesto largo, indicou, ao norte, a metade do horizonte: as oficinas de construção de Sonneville não tinham recebido nem dois terços das encomendas habituais; dos três altos-fornos das Forjas de Marchiennes, só dois estavam em serviço; e, finalmente, na fábrica de vidros Gagebois havia ameaça de greve porque se falava em redução de salário.
— Sei, sei — repetia o rapaz a cada indicação. — De lá venho eu.
— Para nós aqui, as coisas até agora estão indo — continuou o carroceiro. — Contudo, as minas diminuíram a extração. E repare, em frente, na Victoire, há apenas duas baterias de fornos de coque acesas.
Escarrou, e seguiu de novo atrás do cavalo sonolento, depois de o ter atrelado aos vagonetes vazios.
Agora Etienne dominava toda a região. As trevas continuavam profundas, mas a mão do velho como que as povoara de grandes misérias, que o jovem, inconscientemente, sentia naquela hora à sua volta, por toda parte, na amplidão sem termo. Não era um grito de fome que rolava com o vento de março através destes campos nus? As rajadas do vento haviam aumentado e pareciam trazer consigo a morte do trabalho, uma escassez que mataria muitos homens. E, com os olhos errando de um ponto a outro, ele se esforçava por furar as sombras, atormentado pelo desejo e pelo medo de ver.
Tudo se aniquilava no fundo desconhecido das noites obscuras; só percebia, muito ao longe, os altos-fornos e as fornalhas de coque. Estas, baterias de cem chaminés erguidas obliquamente, alinhavam rampas de chamas rubras, enquanto as duas torres, mais à esquerda, ardiam, azuis, em pleno céu, como tochas gigantescas. Era uma tristeza de incêndio, não havia no horizonte ameaçador outros astros elevando-se a não ser esses fogos noturnos dos países da hulha e do ferro.
— Você é da Bélgica, não é? — perguntou por trás de Etienne o carroceiro, que estava de volta.
Desta vez ele trouxera apenas três vagonetes. Um acidente na gávea de extração, uma porca quebrada, iria retardar o trabalho por um bom quarto de hora, mas estes vagonetes ainda podiam ser descarregados. Ao pé do aterro reinava silêncio, os carregadores não estavam mais sacudindo os cavaletes com uma rotação prolongada. Ouvia-se apenas sair de dentro da mina o ruído longínquo de um martelo batendo o ferro.
— Não, sou do sul — respondeu o jovem.
O encarregado de despejar os vagonetes sentara-se no chão, feliz com o acidente. E continuava no seu mutismo selvagem, erguera apenas os grandes olhos mortiços para o carroceiro, como incomodado com toda aquela conversa. Na verdade, este último, de hábito, não falava muito. Era preciso que o rosto de um desconhecido lhe agradasse e que ele estivesse tomado por um desses desejos imperiosos de confidencias que fazem, às vezes, as pessoas idosas falarem sozinhas, em voz alta.
— Eu — disse ele — sou de Montsou e chamo-me Boa-Morte.
— E apelido? — perguntou Etienne admirado.
O velho riu com gosto e, apontando para Voreux, respondeu:
— É, é... Retiraram-me três vezes lá de dentro, em pedaços. Uma vez com o cabelo todo chamuscado, outra com terra até o bucho e a terceira com a barriga cheia de água, como uma rã... Foi então que eles viram que eu não queria morrer mesmo e começaram a me chamar Boa-Morte, de troça.
Sua alegria redobrou — rangido de roldana mal azeitada que degenerou num terrível ataque de tosse. O fogo iluminava-lhe agora a grande cabeça de cabelos brancos e ralos, o rosto achatado, de uma palidez cadavérica, cheio de manchas azuladas. Era baixo, pescoço enorme, a barriga da perna e os calcanhares salientes, com braços compridos e mãos quadradas que batiam nos joelhos. E, como o cavalo que permanecia imóvel em pé, sem dar mostras de estar sofrendo com o vento, ele parecia de pedra, insensível ao frio e às rajadas que assobiavam em seus ouvidos. Depois de tossir, a garganta escoriada por um rascar profundo, escarrou para o lado do fogo e a terra enegreceu.
Etienne olhou-o para em seguida examinar a nódoa no chão.
— Há muito tempo que você trabalha na mina? Boa-Morte abriu muito os braços:
— Ah! Sim... Há muito tempo. Não tinha ainda oito anos quando desci, imagine justamente na Voreux, e agora tenho cinqüenta e oito. Veja bem, fiz de tudo lá dentro: primeiro como aprendiz; depois, quando tive forças para puxar, fui operador de vagonetes e, mais tarde, durante dezoito anos, britador. Em seguida, por causa destas malditas pernas, puseram-me para desaterrar, aterrar, consertar... Isso até o momento em que tiveram de me tirar lá de baixo porque o médico disse que um dia eu não voltaria mais. E faz cinco anos que sou carroceiro... Que tal? Não é bonito? Cinqüenta anos de mina, sendo que quarenta e cinco no fundo!
Enquanto falava, pedaços de hulha incandescentes, que, a espaços, caíam do tacho, punham reflexos sangrentos em seu rosto lívido.
— Mandam-me descansar — continuou ele. — E, como não quero, julgam que sou idiota. Faltam só dois anos para eu completar sessenta, e aí terei direito à pensão de cento e oitenta francos. Se eu lhes desse boa-noite hoje, concediam-me imediatamente a de cento e cinqüenta. Esses velhacos são vivos!... De resto, tirante as pernas, sou forte. Foi a água, isso é certo, que me entrou na pele; durante a extração a gente fica todo o tempo dentro dela. Há dias em que não posso mexer um pé sem gritar.
Outro acesso de tosse veio interrompê-lo.
— E a tosse vem disso também? — perguntou Etienne.
O velho respondeu que não, violentamente, com a cabeça. Depois, quando pôde falar, disse:
— Não, não. Desde o mês passado que ando resfriado. Nunca tossia, agora não consigo mais livrar-me desta tosse... E o mais engraçado é como escarro, como escarro...
Pigarreou novamente e cuspiu negro.
— É sangue? — Etienne ousou perguntar.
Boa-Morte limpava lentamente a boca com as costas da mão.
— É carvão. Tenho tanto carvão no corpo que chega para aquecer o resto dos meus dias. E já faz cinco anos que não ponho os pés lá embaixo. Tinha tudo isso armazenado, parece-me, sem saber. Melhor, até conserva!
Houve um silêncio. Longínquo, o martelo batia regularmente na mina, e o velho era como uma queixa, como um grito de fome e de cansaço vindo das profundezas da noite. Diante das chamas enfurecidas o velho continuou, mais baixo, a remoer suas lembranças. Ah! Certo, não era de ontem que ele e os seus cavavam no veio. A família trabalhava para a companhia das minas de Montsou desde a sua criação; e isso já vinha de muito longe, cento e seis anos. Seu avô, Guillaume Maheu, na época um garoto de quinze anos, fora o descobridor da hulha em Réquillart, a primeira mina da companhia, uma velha galeria atualmente abandonada, lá longe, perto da refinaria de açúcar Fauvelle. Toda a região sabia disso, e a prova é que o veio descoberto se chamava Guillaume, do nome de batismo do seu avô. Não o conhecera, mas diziam que fora um latagão; morrera de velhice aos sessenta anos. Depois, seu pai, Nicolas Maheu, conhecido como o Ruivo, com apenas quarenta anos de idade, ficara na Voreux, que nesse tempo estava sendo aberta: um desabamento e ele ficara completamente achatado, com o sangue bebido e os ossos engolidos pelas rochas. Dois dos seus tios e seus três irmãos ali também haviam deixado a pele, mais tarde. Ele, Vincent Maheu, que conseguira sair mais ou menos inteiro, apenas com as pernas em mau estado, passava por astucioso. Mas que fazer? Era preciso trabalhar. Isso já vinha sendo feito de pai para filho, como bem podia ser outra coisa. Seu filho, Toussaint Maheu, já se matava no mesmo ofício, assim como seus netos e toda a família, que morava em frente, no conjunto habitacional. Cento e seis anos de trabalho para o mesmo patrão, as crianças após os velhos: que tal? Muitos burgueses não saberiam contar tão bem a sua história!
— Quando ainda se pode comer... — murmurou novamente Etienne.
— É isso que eu digo: enquanto há pão para comer, vai-se vivendo.
Boa-Morte calou-se, os olhos voltados para o conjunto habitacional, onde as luzes se acendiam uma a uma.
O campanário de Montsou deu quatro horas; o frio aumentava.
— E essa sua companhia é rica? — voltou à carga Etienne.
O velho levantou os ombros para, em seguida, deixá-los cair, como que esmagado sob um monte de moedas.
— Sim, sim... Talvez não tanto como sua vizinha, a Companhia d'Anzin. Mas assim mesmo tem milhões e milhões. Nem se pode contar. Dezenove galerias, sendo que treze para exploração: Voreux, Victoire, Crèvecoeur, Mirou, Saint-Thomas, Madeleine, Feutry-Cantel e outras, e seis para esgoto ou ventilação, como a Réquillart... Dez mil operários, concessões que se estendem por sessenta e sete comunas, uma extração de cinco mil toneladas por dia, uma estrada de ferro ligando todas as galerias, e oficinas, e fábricas! Se é rica! Dinheiro é o que não falta.
Um rolar de carros sobre os cavaletes pôs em pé as orelhas do grande cavalo baio. Embaixo, o elevador já devia estar consertado, os carregadores tinham voltado ao serviço. Enquanto atrelava o animal para voltar a descer, o carroceiro falava-lhe com carinho:
— E agora não vais habituar-te a tagarelar, preguiçoso! Se o Sr. Hennebeau soubesse em que tu perdes o tempo!
Etienne, pensativo, contemplava a noite. Perguntou:
— Então, esta mina é do Sr. Hennebeau?
— Não — explicou o velho —, o Sr. Hennebeau é apenas o diretor-geral. Ele é pago como nós.
O jovem mostrou com um gesto a imensidão das trevas.
— Então, de quem é tudo isto?
Boa-Morte, no entanto, ficou por um instante sufocado com nova crise, de tal violência que não lhe permitia respirar. Por fim, tendo escarrado e limpado a espuma preta dos lábios, disse, em meio à ventania cada vez mais violenta:
— O quê? De quem é tudo isso? Não se sabe. É de umas pessoas. E com a mão designou no escuro um ponto vago, um lugar ignorado e remoto, povoado por essas pessoas para quem os Maheu cavavam no veio havia mais de um século.
Sua voz elevava-se com uma espécie de medo religioso, era como se estivesse falando a respeito de um tabernáculo inacessível onde se escondia o deus farto e acocorado, a quem todos eles davam a sua própria carne e que nunca tinham visto.
— Se ao menos se comesse o pão necessário para viver! — repetiu pela terceira vez Etienne, sem transição aparente.
— Pois é! Se a gente pudesse comer sempre pão! Mas isso é impossível.
O cavalo partiu e o carroceiro seguiu-o com passo arrastado, de inválido. Sempre próximo do basculante, o operário encarregado de manobrá-lo não se mexera, todo curvado, com o queixo fincado nos joelhos, os grandes olhos mortiços fixos no vácuo.
Apesar de já ter apanhado o embrulho, Etienne permaneceu onde estava. Sentia as rajadas de vento gelando-lhe as costas, enquanto seu peito queimava, devido à fogueira. Talvez devesse tentar a mina, o velho podia não saber; e depois, estava resignado, aceitaria qualquer trabalho. Onde ir e em que transformar-se nesta região faminta devido ao desemprego? Esconder atrás de algum muro sua carcaça de cão vadio? No entanto, hesitava ainda; era medo, medo da Voreux no meio desta planície rasa, mergulhada numa noite tão profunda. A cada nova rajada o vento parecia aumentar, como se soprasse de um horizonte distendendo-se cada vez mais. Nenhum sinal de alvorada clareava o céu morto, apenas os altos-fornos e as fornalhas de coque ensangüentavam as trevas, sem alumiar seu mistério. E a Voreux, do fundo do seu buraco, com sua postura de bicho maligno parecendo cada vez mais retraído, respirava agora mais grossa e amplamente, como que sofrendo com sua dolorosa digestão de carne humana.
Capítulo 2
No meio dos campos de trigo e beterraba, o conjunto habitacional dos Deux-Cent-Quarante dormia sob a noite negra. Distinguiam-se vagamente os quatro imensos corpos de pequenas casas encostadas umas às outras, corpos de caserna ou de hospital, geométricos, paralelos, que separavam as três largas avenidas divididas em jardins iguais. E, no planalto deserto, ouvia-se apenas a queixa do vento por entre as sebes arrancadas.
Em casa dos Maheu, no número dezesseis do segundo grupo de casas, tudo era sossego. O único quarto do primeiro andar estava imerso nas trevas, como se estas quisessem esmagar com seu peso o sono das pessoas que se pressentiam lá, amontoadas, boca aberta, mortas de cansaço. Apesar do frio mordente do exterior, o ar pesado desse quarto tinha um calor vivo, esse calor rançoso dos dormitórios, que, mesmo asseados, cheiram a gado humano.
O cuco da sala do térreo deu quatro horas, mas ninguém se moveu. As respirações fracas continuaram a soprar, acompanhadas de dois roncos sonoros. Bruscamente, Catherine levantou-se. No seu cansaço, tinha ela, pela força do hábito, contado as quatro badaladas que atravessaram o soalho, mas continuara sem o ânimo necessário para acordar de todo. Depois, com as pernas para fora das cobertas, apalpou, riscou um fósforo e acendeu a vela. Mas continuou sentada, a cabeça tão pesada que tombava nos ombros, cedendo ao desejo invencível de voltar ao travesseiro.
Agora, a vela iluminava o quarto, quadrado, com duas janelas, atravancado com três camas. Havia um armário, uma mesa e duas cadeiras de nogueira velha, cujo tom escuro manchava duramente as paredes pintadas de amarelo-claro. E nada mais, a não ser roupa de uso diário pendurada em pregos, uma moringa no chão ao lado de um tacho vermelho que servia de bacia. Na cama da esquerda, Zacharie, o mais velho, um rapaz de vinte e um anos, estava deitado com o irmão, Jeanlin, com quase doze anos; na da direita, dois pequenos, Lénore e Henri, a primeira de seis anos, o segundo de quatro, dormiam abraçados; Catherine partilhava a terceira cama com a irmã Alzire, tão fraca para os seus nove anos, que ela nem a sentiria ao seu lado, não fosse a corcunda que deformava as costas da pequena enferma. A porta envidraçada estava aberta, podiam-se ver o corredor do patamar e o cubículo onde pai e mãe ocupavam uma quarta cama, contra a qual tiveram de instalar o berço da recém-nascida, Estelle, de apenas três meses.
Entretanto, Catherine fez um esforço desesperado. Espreguiçava-se, crispava as mãos nos cabelos ruivos que se emaranhavam na testa e na nuca. Franzina para os seus quinze anos, não mostrava dos membros senão uns pés azulados, como tatuados com carvão, que saíam da bainha da camisola estreita, e braços delicados, alvos como leite, contrastando com a cor pálida do rosto, já estragado pelas contínuas lavagens com sabão preto. Um último bocejo abriu-lhe a boca um pouco grande, com dentes magníficos incrustados na palidez clorótica das gengivas, enquanto seus olhos cinzentos choravam de tanto combater o sono. Era uma expressão dolorosa e abatida que parecia encher de cansaço toda a sua nudez.
Mas um grunhido veio do patamar; era a voz de Maheu que gaguejava, empastada:
— Raio! Já está na hora... Foste tu que acendeste a luz, Catherine?
— Fui, sim, senhor... O relógio acaba de dar horas.
— Então apressa-te, vagabunda! Se tivesses dançado menos ontem, domingo, ter-nos-ias acordado mais cedo. Que vida de malandros!
Continuou a ralhar, mas foi vencido pelo sono, suas repreensões embaralharam-se, extinguindo-se em novo ressonar.
A moça, de camisola, descalça, andava no quarto de um lado para outro. Ao passar pela cama de Henri e Lénore, cobriu-os novamente. As crianças não acordaram, mergulhadas no pesado sono da infância. Alzire, de olhos abertos, sem dizer palavra, pusera-se do outro lado, tomando o lugar aquecido pela irmã mais velha.
— Vamos, Zacharie! Vamos, Jeanlin! Levantem! — repetia Catherine, em pé diante dos dois irmãos, que continuavam refocilados, o nariz enfiado no travesseiro.
Teve de agarrar o mais velho pelos ombros e sacudi-lo; e, enquanto ele a injuriava com voz pastosa, ela resolveu descobri-los, arrancando o lençol. Isto divertiu-a, e pôs-se a rir, vendo os dois rapazes debater-se, pernas nuas.
— Idiota! Deixa-me em paz! — grunhiu Zacharie, mal-humorado, ao sentar-se. — Não gosto de brincadeiras... Porcaria! Já tenho que levantar...
Era magro, desengonçado, rosto comprido, barba rala, louro e com a palidez anêmica de toda a família. A camisola estava enrolada até a altura da barriga; baixou-a, não por pudor, mas por estar com frio.
— Vamos, de pé, o relógio já bateu — repetia Catherine. — Assim o pai se zanga.
Jeanlin, que se havia enroscado, fechou novamente os olhos, dizendo:
— Não chateies, estou dormindo.
Ela riu outra vez, um riso de coração aberto. O irmão era tão pequeno, de membros franzinos e articulações enormes, deformadas por escrófulas, que ela o pegou no colo. Mas o rapaz esperneou e sua cara de macaco desbotado e cabeludo, esburacada por dois olhos verdes e alargada pelas orelhas grandes, empalideceu de raiva por ser fraco. Sem dizer palavra, mordeu-a no seio direito.
— Animal malvado! — murmurou ela, contendo um grito e colocando-o no chão.
Alzire, silenciosa, com o lençol até o queixo, não voltara a dormir; seguia com seus olhos inteligentes de inválida a irmã e os dois irmãos que se vestiam. Outra discussão teve lugar em volta do tacho, e os rapazes começaram a empurrar a moça porque esta levava muito tempo lavando-se. As camisolas voavam, enquanto eles, ainda cheios de sono, urinavam sem vergonha, com a sem-cerimônia tranqüila de uma ninhada de cachorros criada junta. Em todo caso, Catherine foi a primeira a ficar pronta; enfiou as calças de mineiro, vestiu a jaqueta de algodão, amarrou a coifa azul em torno do cabelo preso na nuca; nessa roupa limpa de segunda-feira, mais parecia um homenzinho. Do seu sexo ficava apenas o ligeiro meneio dos quadris.
— Quando o velho voltar — disse maldosamente Zacharie —, ficará contente de encontrar a cama desarrumada... E vou dizer a ele que foste tu.
O velho era o avô, Boa-Morte, que trabalhava de noite e dormia de dia. Para que a cama não esfriasse, havia sempre nela alguém a roncar.
Sem responder, Catherine começou a alisar as cobertas, pondo as pontas para baixo do colchão. Há um momento que se ouviam ruídos do outro lado da parede, na casa vizinha. Essas construções de tijolos, feitas o mais economicamente possível pela companhia, tinham paredes tão finas que a respiração mais delicada as atravessava. As pessoas viviam tão chegadas, de um extremo a outro, que nenhuma parcela de vida íntima se conservava oculta, mesmo para as crianças. Um passo mais pesado sacudiu uma escada, depois houve como que uma queda suave, seguida de um suspiro de satisfação.
— Bem — disse Catherine —, Levaque desce, e lá vai Bouteloup para a cama da mulher dele. Jeanlin deu uma risada de escárnio, os próprios olhos de Alzire brilharam. Toda manhã eles troçavam assim daquele triângulo de vizinhos, um cortador que hospedava um operário do desaterro, o que dava à mulher dois homens, um de noite, outro de dia.
— Philomène está tossindo — continuou Catherine, após ter apurado o ouvido.
Falava da filha mais velha dos Levaque, moça alta de dezenove anos, amante de Zacharie, de quem já tinha dois filhos. Era tão fraca do peito que nunca pudera trabalhar no fundo da mina, permanecendo como separadora do carvão.
— Ora, Philomène! — respondeu Zacharie. — Ela nem se importa com isso; e depois, tem sorte, pode dormir até às seis horas...
Enquanto vestia as calças, tomado de um pensamento repentino, foi abrir uma janela. Lá fora, nas trevas, o conjunto habitacional acordava; réstias de luz escapavam por entre as frinchas das persianas. E outra contenda teve lugar: o rapaz debruçava-se à janela para espreitar a casa dos Pierron, que ficava em frente, para ver se não sairia de lá o capataz da Voreux, que era acusado de dormir com a mulher de Pierron; enquanto a irmã lhe gritava que o marido desta voltara, desde a véspera, ao seu trabalho diurno na embocadura de uma das galerias com o poço de extração, e que portanto Dansaert não podia ter dormido lá naquela noite. Rajadas glaciais entravam pela janela aberta; os irmãos, exaltados, sustentavam a exatidão de suas próprias informações. Nesse momento, Estelle, de seu berço, incomodada pelo frio, começou a chorar em altos brados.
Com isso Maheu acordou de vez. Será que já não tinha mais tutano nos ossos, para voltar a dormir assim, como um vagabundo? E começou a praguejar tão alto, que os filhos, ao lado, nem ousavam respirar. Zacharie e Jeanlin acabaram de se lavar com uma lentidão que já era cansaço. Alzire, com os olhos bem abertos, continuava a observar. Os dois pequenos, Lénore e Henri, abraçados, continuavam imóveis, a respiração leve, apesar de toda a gritaria.
— Catherine, traz a vela! — gritou Maheu.
Tendo acabado de abotoar a jaqueta, ela levou a vela para a outra peça, deixando os irmãos à procura das roupas, apenas com a escassa claridade que vinha da porta. O pai saltou da cama; ela, porém, não parou; desceu, às apalpadelas, calçando apenas grossas meias de lã, para acender na sala uma outra vela e preparar o café. Todos os tamancos da família estavam debaixo do armário.
— Cala, porcaria! — gritou Maheu, exasperado com o choro contínuo de Estelle.
Era baixo como o velho Boa-Morte e parecia-se com ele, só que mais gordo, cabeça grande, rosto chato e lívido sob o cabelo louro, cortado bem curto. A criança berrava cada vez mais, assustada com aqueles grandes braços nodosos que gesticulavam por cima dela.
— Deixa, tu sabes bem que ela não quer calar-se — disse a mulher, estendendo-se no meio da cama.
Também ela acabava de acordar e lamentava-se. Era estúpido, nunca dormia uma noite completa. Por que eles não saíam em silêncio? Enfiada entre as cobertas, só se lhe via o rosto comprido, de traços graúdos, de uma beleza pesada, já disforme aos trinta e nove anos por uma vida de miséria e os sete filhos que tivera. Olhos no teto, começou a falar lentamente, enquanto seu homem se vestia.
— Sabe? Estou sem vintém, e hoje é apenas segunda-feira... Seis dias ainda para a quinzena... O dinheiro não dura nada. Todos vocês juntos trazem nove francos. Somos dez na casa, como é que vai dar?
— Nove francos? — protestou Maheu. — Eu e Zacharie, cada um três, são seis; Catherine e o pai, dois, são quatro; quatro e seis, dez... E Jeanlin, um, que faz onze.
— Sim, onze, mas há os domingos e feriados. Nunca mais de nove, compreende?
Ele não respondeu, procurava no chão o cinto de couro. Levantando-se, disse:
— Não devemos queixar-nos, ainda tenho saúde. Aos quarenta e dois anos muita gente já não presta para mais nada.
— É possível, meu velho, mas nem por isso temos mais pão. O que é que vou fazer? Não tens nada, mesmo?
— Tenho dois soldos.
— Pois podes tomar uma cerveja com eles... Meu Deus! O que é que vou fazer? Esses seis dias não vão terminar nunca! Devemos sessenta francos a Maigrat; anteontem ele me pôs na rua, mas isso não me impede de voltar lá. O caso é se ele continuar recusando...
E a mulher de Maheu continuou a lamentar-se, cabeça imóvel, fechando os olhos de vez em quando, à triste claridade da vela. Falou do guarda-comida vazio, das crianças que pediam pão, do café que faltava, da água que dava cólica e dos longos dias passados a enganar a fome com folhas de couve cozidas. Pouco a pouco foi elevando a voz, já que o berreiro de Estelle cobria suas palavras; seus gritos estavam ficando insuportáveis. De repente, Maheu pareceu ouvi-los e, fora de si, agarrou a criança no berço e atirou-a para junto da mãe, gaguejando de ódio:
— Toma! Pega-a, sou capaz de esmagá-la... Maldita criança... Não lhe falta nada, mama à vontade e queixa-se mais alto que os outros...
Realmente, Estelle pusera-se a mamar. Sumida debaixo das cobertas, sossegada pela tepidez da cama, agora só fazia um ruído guloso com os lábios.
— Os burgueses da Piolaine não disseram que fosses vê-los? — tornou o pai depois de uma pausa.
A mãe franziu a boca numa expressão de dúvida e desânimo.
— Sim, encontraram-me, andam distribuindo roupas às crianças pobres. Enfim, vou até lá esta manhã com Lénore e Henri. Se pelo menos eles me dessem uns cem soldos...
Novo silêncio, Maheu estava pronto; ficou imóvel um momento para, em seguida, encerrar a conversa com sua voz profunda:
— Que queres? Não há outro jeito, arranja a sopa como puderes. Melhor é ir trabalhar do que ficar aqui conversando.
— Claro — respondeu a mulher. — Apaga a vela, não quero ver a cor dos meus pensamentos.
O homem apagou a vela e seguiu Zacharie e Jeanlin, que já estavam descendo. A escada de madeira rangeu sob o peso de seus pés enfiados em meias de lã. O quarto e o cubículo do corredor voltaram às trevas. As crianças dormiam, a própria Alzire fechara novamente as pálpebras. A mãe, no entanto, permanecia de olhos abertos na escuridão, enquanto Estelle sorvia no seu seio murcho de mulher exausta e ronronava como um gatinho.
Embaixo Catherine tratara, em primeiro lugar, de reavivar o fogo no fogão de ferro que tinha uma grelha no centro e dois fornos nos lados e onde a hulha ardia constantemente. A companhia distribuía por mês, a cada família, oito hectolitros de lascas de carvão duro, sobras dos sacos, carvão esse difícil de acender. Toda noite a moça deixava o fogo aceso e coberto de cinzas; pela manhã apenas o reavivava com pedacinhos de carvão tenro, escolhidos com cuidado. Após ter colocado uma vasilha com água sobre a grelha, agachou-se diante do guarda-comida.
Era uma sala bastante grande, ocupando todo o térreo, pintada de verde claro, de um asseio flamengo, com suas lajes muito bem lavadas e espargidas de areia branca. Além do guarda-comida de pinho envernizado, a mobília consistia de uma mesa e cadeiras da mesma madeira. Colados às paredes, reproduções de cores vivas, retratos do imperador e da imperatriz dados pela companhia, figuras de soldados e santos onde o dourado predominava, ressaltavam violentamente na nudez clara da peça, onde não havia outros ornamentos além de uma caixa de cartão cor-de-rosa em cima do guarda-comida e do relógio de cuco, de mostrador sarapintado, cujo tique-taque parecia encher o vazio da sala. Perto da porta da escada, outra porta conduzia ao portão.
Apesar do asseio, um cheiro de cebola cozida e guardada desde a véspera empestava o ar aquecido e pesado, sempre carregado de um cheiro forte de hulha.
Catherine refletia diante do guarda-comida aberto. Só havia um pedaço de pão, suficiente queijo fresco e apenas uma migalha de manteiga. E com isso teria de preparar comida para os quatro. Por fim decidiu-se: cortou o pão, cobriu uma fatia com queijo, a outra untou com manteiga e depois colou-as; era o engana a fome
do mineiro, a fatia dupla que é levada pela manhã para a mina. Num instante os quatro sanduíches estavam enfileirados sobre a mesa, preparados com severa justiça, desde o grande para o pai até o pequeno para Jeanlin.
Catherine, que parecia toda entregue a seu trabalho, devia, contudo, estar pensando nas histórias que Zacharie contava a respeito do capataz com a mulher de Pierron, já que entreabriu a porta da rua e espiou para fora. O vento continuava a soprar, e, nas fachadas baixas do casario do conjunto habitacional, de onde subia uma vaga trepidação de despertar, as luzes eram cada vez mais numerosas. Portas batiam, grupos escuros de operários desapareciam dentro da noite. Era tolice ficar ali, apanhando frio, seguramente Pierron ainda dormia, seu trabalho começava às seis horas. Mas mesmo assim ela ficou olhando a casa do outro lado dos jardins. Tendo alguém aberto a porta, sua curiosidade aumentou. Mas só podia ser a filha dos Pierron, Lydie, que partia para a mina.
Nisto, um assobio de vapor fez que se voltasse; fechou a porta e correu: a água fervia e transbordava, apagando o fogo. Não havia mais café; teve de se contentar em passar a água pela borra da véspera para depois adoçá-la na cafeteira com açúcar preto. Nesse momento o pai e os dois irmãos desceram.
— Puxa! — exclamou Zacharie, enfiando o nariz na tigela. — Com um café deste não há perigo de ficar com dor de cabeça.
Maheu encolheu os ombros com ar resignado.
— Tanto faz! Está quente e até gostoso.
Jeanlin juntara as migalhas do pão e fizera uma papa. Depois de beber, Catherine despejou o que sobrara na cafeteira em cantis de lata. Os quatro em pé, mal iluminados pela vela fumacenta, engoliam às pressas.
— Como é, terminamos? — reclamou o pai. — Até parece que somos ricos!
Nisto uma voz veio da escada, cuja porta tinha deixado aberta; era a mãe que gritava:
— Levem todo o pão, ainda tenho um pouco de aletria para as crianças.
— Sim, sim! — respondeu Catherine.
Havia coberto novamente o fogo e colocado numa ponta da grelha um resto de sopa que o avô encontraria quente ao voltar do trabalho, às seis horas.
Cada um deles apanhou seu par de tamancos debaixo do guarda-comida, passou o cordão do cantil pelo ombro e enfiou o sanduíche nas costas, entre a camisa e a jaqueta. E saíram todos, homens na frente, a moça atrás, depois de soprar a vela e dar uma volta na chave. A casa voltou à escuridão.
— Muito bem, vamos juntos! — disse um homem que fechava a porta da casa vizinha.
Era Levaque com o filho Bébert, menino de doze anos, grande amigo de Jeanlin. Catherine, admirada, sufocou uma risada no ouvido de Zacharie: com que então Bouteloup nem esperava mais que o marido saísse?!
No conjunto habitacional, agora, as luzes se apagavam. Uma última porta bateu, tudo dormia novamente, mulheres e crianças voltavam ao sono em camas mais largas. E do vilarejo no escuro à Voreux que resfolegava houve um lento desfilar de sombras sob o vento impiedoso: a partida dos carvoeiros para o trabalho. Caminhavam balançando os ombros, sem saber o que fazer com os braços, que cruzavam no peito, enquanto, atrás, o farnel se transformara numa corcunda. Vestindo roupas leves, tiritavam de frio, mas nem por isso caminhavam mais depressa, dispersos ao longo da estrada, num tropear de rebanho.
Capítulo 3
Etienne desceu finalmente do aterro e entrou na Voreux. Os homens a quem se dirigia, perguntando se havia trabalho, balançavam a cabeça, respondendo que esperasse pelo capataz. Deixaram-no à vontade dentro das edificações mal iluminadas, cheias de buracos negros, assustadoras mesmo pela complicação de suas salas e andares. Tendo subido uma escada escura, quase em ruínas, encontrou-se numa ponte estreita e oscilante; em seguida, atravessou o galpão da triagem, mergulhado em noite tão profunda que teve de caminhar com as mãos estendidas para não esbarrar. De repente, diante dele, dois olhos amarelos, enormes, furaram as trevas. Estava exatamente sob a torre do sino de rebate, no local onde os elevadores cheios de hulha são içados, à boca do poço.
Um contramestre, o velho e gordo Richomme, com cara de policial bonachão, de bigode grisalho, dirigia-se nesse momento para o escritório do recebedor.
— Não estão precisando por aqui de um operário para qualquer tipo de trabalho? — perguntou novamente Etienne.
Richomme ia dizer não, mas conteve-se e respondeu como os outros, enquanto se afastava:
— Espere pelo Sr. Dansaert, o capataz.
Além de quatro lampiões, havia ainda os refletores com toda a sua luz dirigida para o poço, a iluminar vivamente os corrimões de ferro, as alavancas de sinais e de fechar as guias por onde deslizavam os dois elevadores. O resto, a vasta peça, parecida a uma nave de igreja, continuava no escuro e povoada de grandes sombras que flutuavam. Somente o depósito de lampiões resplandecia ao fundo; e no escritório do recebedor uma lamparina raquítica bruxuleava como uma estrela apagando-se.
O trabalho de extração recomeçara; sobre as chapas de ferro havia um trovejar contínuo, vagonetes de carvão rolavam sem descanso, carregadores corriam e podiam-se distinguir suas longas espinhas curvadas dentro do tumulto de todas aquelas coisas negras e ruidosas que se agitavam.
Por um instante Etienne permaneceu imóvel, ensurdecido e cego. Sentia-se gelado, havia correntes de ar por todos os lados. Em seguida deu alguns passos, atraído pela máquina da qual via reverberar agora aços e cobres. Ela ficava por trás do poço, a vinte e cinco metros, numa peça mais alta e tão solidamente assente sobre seu maciço pedestal de tijolos que mesmo trabalhando a todo vapor, com toda a força dos seus quatrocentos cavalos e com o movimento de sua biela, enorme, emergindo e mergulhando numa suavidade oleosa, não conseguia fazer que as paredes estremecessem. O maquinista, em pé ao lado da alavanca de comando, escutava as campainhas dos sinais, não tirava os olhos do painel indicador, onde o poço, com seus diversos andares, estava figurado numa ranhura vertical que era percorrida por pedaços de chumbo amarrados em barbantes e que representavam os elevadores. E a cada partida, quando a máquina se punha outra vez em movimento, as bobinas, as duas imensas rodas de cinco metros de raio por meio das quais os dois cabos de aço se enrolavam e desenrolavam em sentido inverso, giravam a tal velocidade que mais pareciam uma poeira cinzenta.
— Cuidado! — gritaram três trabalhadores que arrastavam uma escada gigantesca.
Por pouco Etienne não fora esmagado. Seus olhos habituavam-se, já podia ver no ar a corrida dos cabos, mais de trinta metros de fita de aço que subiam velozes à torre, onde passavam em roldanas para, em seguida, descer a pique ao poço e prenderem-se nos elevadores de extração. Uma armação de ferro, igual à dos campanários, sustentava as roldanas. Era como um vôo de pássaro, sem ruído, sem choque, a fuga rápida, o contínuo vaivém de um fio de peso enorme que podia levantar até doze mil quilos com uma velocidade de dez metros por segundo.
— Cuidado, com mil raios! — gritaram novamente os carregadores que empurravam a escada para o outro lado, para vistoriarem a roldana da esquerda.
Lentamente Etienne voltou à boca do poço. Esse vôo, como o perpassar de uma ave gigantesca, aturdia-o. E, tintando devido às correntes de ar, começou a observar o trabalho dos elevadores, os ouvidos zonzos com o rodar dos vagonetes. Perto do poço o sinal estava funcionando, um pesado martelo de alavanca que uma corda puxada do fundo fazia cair sobre uma bigorna. Uma pancada para parar, duas para descer, três para subir; isto sem descanso, como golpes de clava dominando o tumulto e acompanhados do som claro da campainha; ao mesmo tempo, o operário que dirigia o trabalho gritava ordens ao maquinista por um megafone, aumentando o barulho. Os elevadores, no meio de toda essa confusão, apareciam e desapareciam, esvaziavam-se e enchiam-se sem que Etienne compreendesse nada dessas operações tão complicadas.
Só uma coisa ele compreendia perfeitamente: que o poço engolia magotes de vinte e de trinta homens, e com tal facilidade que nem parecia senti-los passar pela goela. Desde as quatro horas os operários começavam a descer; vinham da barraca, descalços, lâmpada na mão, e esperavam em grupos pequenos até formarem número suficiente. Sem ruído, com um pulo macio de animal noturno, o elevador de ferro subia do escuro, enganchava-se nas aldravas, com seus quatro andares, cada um contendo dois vagonetes cheios de carvão. Nos diferentes patamares, os carregadores retiravam os vagonetes, substituindo-os por outros vazios ou carregados antecipadamente com madeira em toros. E era nesses carros vazios que se empilhavam os operários, cinco a cinco, até quarenta de uma vez, quando ocupavam todos os Compartimentos. Uma ordem partia do megafone, um tartamudear grosso e indistinto, enquanto a corda, para dar o sinal embaixo, era puxada quatro vezes, convenção que queria dizer aí vai carne
e que avisava da descida desse carregamento de carne humana. Em seguida, depois de um ligeiro solavanco, o elevador afundava silencioso, caía como uma pedra, deixando atrás de si apenas a fuga vibrante do cabo.
— É muito fundo? — perguntou Etienne a um mineiro com ar sonolento que esperava perto dele.
— Quinhentos e cinqüenta e quatro metros — respondeu o homem. — Mas há quatro paradas, a primeira a trezentos e vinte metros.
Ambos se calaram, os olhos no cabo que subia. Etienne voltou a falar:
— E quando isso quebra?
— Ah! Quando quebra...
O mineiro acabou a frase com um gesto. Chegara a sua vez, o elevador apareceu com seu movimento ágil e repousado. O homem entrou, agachando-se, com os demais companheiros. A máquina desapareceu no poço, para voltar a brotar ao fim de apenas quatro minutos para engolir outro carregamento de pessoas. Durante meia hora o poço devorou essa carga humana com suas fauces mais ou menos glutonas, isto é, de acordo com a profundidade da galeria para onde elas iam, e isso sem descanso, sempre esfomeado, com tripas gigantes, capazes de digerir todo um povo. Elas se enchiam sem descanso, mas as trevas não se desfaziam, estavam mortas, e o elevador continuava a brotar do vazio no mesmo silêncio voraz.
Com o tempo, Etienne voltou a sentir o mal-estar de que já fora acometido no aterro. Valeria a pena insistir? Na certa esse capataz o despediria, como os outros. Um medo vago fez que tomasse uma decisão brusca: caminhou para fora, só parando em frente à casa dos geradores. A porta, aberta de par em par, deixava ver sete caldeiras de duas fornalhas. Em meio ao vapor branco e ao silvo das válvulas, um foguista abastecia uma das fornalhas, cujo calor ardente chegava até a soleira da porta. O rapaz, contente de poder aquecer-se, ia aproximar-se, quando divisou um novo grupo de carvoeiros que vinha chegando à mina. Eram os Maheu e os Levaque. Vendo à frente Catherine, com seu ar meigo de menino, teve a idéia supersticiosa de arriscar uma última pergunta:
— Por favor, camarada... Será que não estão precisando aqui de um operário, para qualquer trabalho?
Ela olhou-o surpreendida, assustada mesmo com aquela voz brusca que saía da sombra. Atrás dela, porém, Maheu tinha ouvido, e foi ele quem respondeu, conversando mesmo, por um momento. Não, não estavam precisando de ninguém... Mas aquele pobre-diabo, aquele operário perdido nas estradas interessava-o. Ao deixá-lo, exclamou para os outros:
— Viram? A gente podia estar na mesma situação... Não devemos queixar-nos, há muita gente sem trabalho.
O grupo entrou e foi direto ao vestiário, uma vasta peça grosseiramente rebocada, rodeada de armários fechados a cadeado. No centro, um fogão de ferro, uma espécie de estufa sem porta, estava em brasa; havia nele tanta hulha incandescente que os pedaços estalavam e rolavam para o chão de terra batida. A peça tinha como única iluminação esse braseiro, cujos reflexos sanguinolentos dançavam pelas paredes revestidas de madeira imunda e pelo teto coberto de fuligem.
No momento da chegada dos Maheu o pessoal estava rindo, afogueado. Uns trinta operários estavam de pé, de costas para o fogo, deixando-se assar com prazer. Antes de descerem, todos vinham aqui para absorver e levar consigo uma provisão de calor dentro do corpo capaz de fazer face à umidade do poço. Naquela manhã estavam rindo mais do que era costume, brincavam com a filha de Mouque, uma operadora de vagonetes, de dezoito anos, boa moça, mas com seios e nádegas tão grandes que furavam a jaqueta e as calças. Ela morava em Réquillart com seu velho pai, que era cavalariço, e com seu irmão, carregador; como as horas de trabalho não coincidiam, ela vinha sozinha para o trabalho. E, no meio dos campos de trigo, no verão, encostada a um muro, no inverno, entregava-se ao prazer com seu namorado da semana. Toda a mina estava passando pelos seus braços, um verdadeiro torneio entre colegas, sem outra conseqüência. Um dia em que alguém reclamou por ter ela andado