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Introdução À Regra de São Bento

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INTRODUO REGRA DE SO BENTO

PARTE I
(Sntese extraida de S. Benito su vida y su Regla p.
264.
Ver tambm ALa Regla de San Benito@ p.
12ss)

I - AUTENTICIDADE DA REGRA DE SO BENTO

II - REDAO: (datas)

III - DESTINATRIOS

IV - LNGUA E ESTILO

V - FONTES: $ Sagrada Escritura


$ Tradio Monstica

VI - A REGRA DE SO BENTO E A REGRA DO MESTRE

VII - HISTRIA DO TEXTO DA REGRA BENEDITINA

1 - Tipo puro ou Aoriginal@


2 - Tipo interpolado
3 - Tipo misto ou receptus

VIII - COMENTRIOS DA REGRA DE SO BENTO

1 - Comentrios antigos
2 - Comentrios medievais
3 - Comentrios dos sculos XVII e XVIII
4 - Comentrios modernos

IX - OUTRAS OBRAS MODERNAS SOBRE A REGRA DE SO BENTO

PARTE II

I - SITUANDO SO BENTO

II - MANIFESTAES MONSTICAS PR-CRISTS:

A - Hindusmo
Budismo
Jainismo
B - Filosofia grega

C - Monaquismo judaico:
Os essnios
Os monges do Antigo Testamento: Elias
Eliseu
Joo Batista
Ado antes do pecado
Os levitas

III - OS VERDADEIROS PRECURSORES DO MONAQUISMO CRISTO

A - Jesus
B - Os mrtires
C - Os Ascetas e as Virgens da Igreja primitiva

IV - TRANSIO DO CARISMA DO ASCETISMO KOINONIA - Sc III / IV

V - O SURGIMENTO DAS REGRAS MONSTICAS E SEU ENRAIZAMENTO


NA
TRADIO - Sc. IV

1 - Pacmio
2 - Baslio
3 - Agostinho
PARTE I

I - AUTENTICIDADE DA REGRA DE SO BENTO


Desde S. Gregrio Magno at Paulo VI inumerveis Papas, Bispos, Abades,
monges, reis e prncipes, tm expressado sua admirao e elogiado a Regra de So
Bento, considerando-a como um dos textos mais notveis e venerveis da tradio
crist.
A autenticidade da Regra beneditina no passado foi contestada e posta em dvida
primeiramente por um jesuta francs o Pe. Hardouin, um dos eruditos mais insignes
do sculo XVII, porm, o mais paradoxal dos homens. Autor de uma coleo de atas
conciliares, afirma ele prprio que todas as suas obras so apcrifas. Afirma ainda
que a Eneida de Virglio uma alegoria da viagem de S. Pedro a Roma. Bastam estes
exemplos para nos dar uma idia de seu temperamento e de seu ceticismo literrio
universal e fantstico.
Outro autor, Oudin, no se atrevendo a negar de todo a paternidade de So Bento,
afirma baseado no fato do uso que na Regra se faz da primeira pessoa do plural, que
So Bento a redigiu em conjunto com seus monges.
Em nossos dias, em que se duvida de tudo, inclusive da existncia histrica de So
Bento, a questo volta tona com relao autenticidade da RB. Basta citar uma s
opinio, a de D. Jacques Froger (monge de Solesmes) que lana a seguinte hiptese
em 1954: So Bento comps a Regula Magistri. Diz que o que chamamos de Regra
de So Bento, na realidade, um resumo posterior da Regula Magistri feita por um
discpulo seu no sul da Frana, em fins do sculo VI ou princpio do VII. Estas
afirmaes causaram grande escndalo e houve muitas contestaes. D. Froger quis
apresentar seus argumentos, mas no o deixaram publicar.
Esta hiptese, porm, obrigou D.A. Mund a submeter a novo e rigoroso exame
toda a questo da autenticidade do cdigo beneditino, aps o que chegou s seguintes
concluses:
$ A anlise da linguagem da Regra beneditina
$ As fontes literrias que nela contriburam
$ O testemunho de S.Gregrio Magno (Livro II Dilogos, cap 36 e seguintes)
provam que no pode ser um documento redigido no sul da Frana a princpio do
sculo VII, mas provm da Itlia Central e foi redigido em meados do sculo VI. S.
Gregrio cita ALa Regula S.Benedicti@ e no ALa Regula Magistri@ em seu
comentrio ao II Reis e esta mesma Regra que ele elogia nos Dilogos e atribui a
So Bento.

II - REDAO

S. Gregrio no menciona quando So Bento escreveu a Regra. Todos os autores


admitem, porm, que ela foi escrita no fim da vida de So Bento em Monte Cassino
porque j supe uma vida plenamente cenobtica e a organizao do cenbio no
corresponde de modo algum ao sistema vigente em Subiaco. Quanto data, nada
sabemos ao certo. Deve ter sido escrita antes de 547 que foi a data
(aproximadamente) em que So Bento morreu, porm, ningum pode assegurar que o
Legislador no possusse muito antes de sua morte, a experincia que revela sua obra.
H. Schmmitz cr que a RB foi redigida depois de 534, data da composio da
ARegula Sanctarum Virginum@ de S. Cesrio de Arles, pois que, segundo ele, So
Bento a usa como fonte. A. Lentini, porm, cr que muito difcil saber se realmente
So Bento teve conhecimento da Regra de S. Cesrio, seu contemporneo.
Parece seguro, portanto, que a obra de So Bento data dos ltimos anos de sua
vida. Provavelmente, So Bento no escreveu sua Regra de uma s vez. O texto
apresenta retoques, correes, acrscimos que lhe foram sugeridos pelas
circunstncias e pela experincia. Sobretudo os captulos:
$ 67 - Dos irmos mandados em viagem
$ 68 - Se so ordenadas a um irmo coisas impossveis
$ 69 - No mosteiro no presuma um defender outro
$ 70 - No presuma algum bater em outrem a prprio arbtrio
$ 71 -Sejam obedientes uns aos outros
$ 72 - Do bom zelo que os monges devem ter
$ 73 - De que nem toda a observncia da justia se acha estabelecida nesta Regra
apresentam-se como um apndice, como escritos depois.
O captulo 64 (Da Ordenao do Abade) um complemento do 21 (Como deve ser
o
Abade)
O captulo 65 (Do Prior do mosteiro) modifica o 21 (Dos Decanos do mosteiro)
possvel, tambm, que o Cdigo Litrgico (caps. 8 a 19) e o Cdigo Penal (23-
30) tenham sido inseridos na Regra beneditina posteriormente. Antes formavam dois
fascculos parte. quase foroso admitir esta hiptese, obrigados pela existncia de
algumas divergncias entre os manuscritos mais importantes e o confronto com a
Regula Magistri: existiu uma outra redao da RB anterior que possumos e que
provavelmente chegaria at o captulo 66.

III - DESTINATRIOS

So Bento no se limita a legislar s para seu prprio cenbio de Monte Cassino.


Numerosos textos que supem regies diferentes de aplicao, por exemplo o caso do
hbito, do trabalho, do vinho, mostram que a RB foi escrita para ser praticada em
diversos mosteiros, grandes ou pequenos (cf. 21,1; 31,17; 40,5; 48,7; 55,1ss etc.).
Surgiram, porm, algumas hipteses, com relao aos destinatrios da Regra
beneditina:

1 - So Bento teria escrito por ocasio da fundao de Terracina, mosteiro


fundado por ele. Enquanto estavam todos em Monte Cassino So Bento era a
Regra viva. Agora que alguns monges iam sair de Monte Cassino, tornava-se
necessrio um resumo dos seus ensinamentos.

2 - Segundo Chapman, So Bento teria redigido a Regra a pedido do Papa


Ormidas e o mesmo Papa imporia a RB a todo o Ocidente. O cardeal
Schuster levanta a mesma hiptese, mas no do pedido de Ormidas, que acha
cedo demais, mas a de que So Bento escreveu a Regra a pedido da S
Apostlica ou Agapito I, ou ainda do Papa Silvrio, a fim de unificar a
disciplina monstica do Ocidente.

Todas estas hipteses, porm, so improvveis. Muito mais razovel que So


Bento tenha escrito por iniciativa pessoal, para seu mosteiro e a pedido de outros
abades desejosos de ter um cdigo completo da vida monstica para seus respectivos
cenbios. No improvvel, porm, que consciente da oportunidade da obra que
empreendera, So Bento tenha pensado em um crculo monstico muito mais vasto,
como se pode notar no cap. 1,13: ADeixando-os de parte, vamos dispor, com o
auxlio do Senhor, sobre o poderosssimo gnero dos cenobitas@. Portanto, toda a
legislao de So Bento susceptvel de ser praticada em qualquer cenbio.

IV - LNGUA E ESTILO

Segundo Cristina Morman (conhecida como a melhor latinista da Idade Mdia), no


sculo VI o latim se achava de tal modo em plena evoluo que nas escolas aprendia-
se o latim clssico, por demais precioso, mas artificial, e que ningum falava. Assim,
aprendia-se o latim clssico e falava-se o latim vulgar. So Bento que desejava
escrever para todas as pessoas que quisessem entrar na Vida Monstica, cultas ou
incultas, optou pelo latim vulgar, o que lhe valeu o elogio de S. Gregrio Magno ao
mencionar a clareza como uma das caractersticas da RB. A Regra Apertence a esta
categoria de escritos que preferem a clareza da lngua viva e contempornea aos
artifcios de um estilo tradicional e classicista@. ASo Bento fala a lngua de sua
poca, lngua que se achava em pleno desenvolvimento, nada queria saber de um
produto lingstico artificial propagado pelas escolas@(C. Morman).
F. Ermini diz que o latim da Regra Ao bom latim dos homens cultos, simples e
corretos na pureza e uso dos vocbulos, porm, livre de afetaes de qualquer
classe@. Quanto ao estilo no encontramos na RB nada de rebuscado, ao contrrio,
ela se distingue por sua grande naturalidade. Seus vocbulos so simples, porm, ao
mesmo tempo exatos, claros, penetrantes. A clareza de expresso no sacrificada
retrica, embora realmente muitas das frases de So Bento sejam elegantes, retricas,
rtmicas e adaptadas ao estilo conforme o assunto tratado:

$ Quando vai falar sobre a Vida Monstica no Prlogo um pouco mais oratrio,
retrico.
$ Quando trata das normas espirituais apresenta um estilo conciso, lapidar.
$ Quando se trata de determinar a ordem na comunidade usa um estilo mais cho,
um tanto jurdico.
Dono da expresso de seu pensamento, o santo se adapta natureza do tema que
est tratando e o tom de seu discurso s vezes enrgico, severo, s vezes mais
tranqilo, paternal e persuasivo. Usa um estilo cho nos captulos que ordenam o
Ofcio Divino, mas se faz vivo e fecundo no captulo 65.

Outra particularidade da RB que revela a maestria literria e a tmpora intelectual


de seu autor o modo de fazer uso de suas fontes. Os numerosos fragmentos mais ou
menos literais que So Bento toma de outros autores so citados sem pedantismo mas
com uma naturalidade e desprendimento que supe uma assimilao completa. Com
os elementos que outros lhe proporcionam expressa So Bento, o seu prprio
pensamento.
Ainda duas particularidades importantes completam esta observao em torno da
lngua e estilo de So Bento: seu carter jurdico e seu cunho litrrgico.

V - FONTES

So Bento no pretendeu de modo algum fundar uma nova Ordem ou uma escola
de espiritualidade original e inovadora. No quer separar-se da tradio, ao contrrio,
adere a ela cordial e estreitamente. evidente, porm, que So Bento se preparou
para escrever sua obra com um intenso estudo da literatura monstica, que na poca
era possvel proporcionar-se em latim, e estudou tambm vastas obras dos Padres. O
que leva D. Delatte a afirmar que a Regra beneditina aparece na metade do sculo VI
como o fruto maduro de todo um passado monstico e da espiritualidade dos Padres.
So Bento, portanto, teve o propsito deliberado de apoiar seu pensamento sobre o
dos antigos, ou ao menos, de falar sua linguagem e tomar emprestado seus vocbulos.
Entre as fontes utilizadas por So Bento ocupam um lugar preeminente:
$ A SAGRADA ESCRITURA:
O uso que dela faz So Bento nos revela seu conhecimento familiar profundo e
completo dos livros santos:
do Antigo Testamento so citados sobretudo:
- Os Salmos
- Os Livros Sapienciais, particularmente os Provrbios
- Os Livros Profticos
do Novo Testamento cita quase todos os livros, mas sobretudo:
- Epstolas de S. Paulo
- Evangelho de S. Mateus

So raros os casos em que So Bento cita literalmente a Bblia. A maior parte das
vezes trata-se de simples reminiscncias ou aluses, e tais citaes se unem to
perfeitamente ao pensamento que ilustram, a ponto de formar um s corpo com ele.
AA Sagrada Escritura constitui a substncia mesma da Regra de So Bento@.
$ A TRADIO MONSTICA
Na tradio monstica So Bento encontrou um imenso tesouro de doutrina e
experincia que soube aproveitar. O Patriarca conhece atravs de verses latinas,
diversas Regras do Oriente, tais como:

- a chamada de S. Macrio
- a Regra dos Quatro Padres; Segunda Regra dos Quatro Padres
- a ARegula Orientalis@
- a de S. Pacmio (traduzida por S. Jernimo)
- a de S. Baslio;
e do Ocidente:
- a de Santo Agostinho
- a de S. Cesrio de Arles, seu comtemporneo.

Alm destas Regras, So Bento utilizou tambm como fonte:


- AVitae Patrum@: Apotegmas
- Escritos dos Santos Padres: Agostinho, Leo Magno, Jernimo, Cipriano, e
talvez Sulpcio Severo
- Algumas reminiscncias de autores gregos
- e as duas celebrrimas obras de Cassiano: As INSTITUIES e as
CONFERNCIAS

De todos os autores monsticos, Cassiano, Santo Agostinho, S. Pacmio e S.


Baslio, foram os que mais inspiraram So Bento. Sobretudo Cassiano, (cf. RB 42,3 e
73,5) a quem So Bento menciona expressamente na Santa Regra. Excetuando a
Sagrada Escritura, foram os escritos de Cassiano, os mais familiares a So Bento.

A leitura dos Padres da Igreja, aconselhada por So Bento no Ofcio Divino e na


formao monstica (RB 9,8 e 73,4) so tambm utilizadas como fonte da RB. Por
exemplo, de Santo Agostinho, h citaes de seus sermes (algumas seguras, outras
provveis). So Leo Magno inspirou literalmente o princpio do captulo 49 (Da
observncia da Quaresma).
S. Jernimo com suas cartas, S. Cipriano com sua obra ADe oratione dominica@,
Sulpcio Severo com seus Dilogos, e as Atas dos Mrtires, so tambm fontes
utilizadas por So Bento na redao de sua Regra.

VI - A REGRA DE SO BENTO e a REGRA DO MESTRE

Utilizou diretamente So Bento todas as fontes que indicamos acima? Ou, ao


contrrio, estas citaes e reminiscncias de outros autores que encontramos na Regra
de So Bento, so na realidade de segunda mo, tomadas junto com muitos outros
elementos, de uma s obra, a chamada ARegula Magistri@?
Eis aqui um assunto seriamente controvertido entre os eruditos. As Adiscusses em
torno a este ponto so, s vezes, to vivas e trepidantes que se tem podido falar, de
uma verdadeira guerra literria@.

REGULA MAGISTRI

A ARegula Magistri@ encontra-se na Patrologia Latina como documento do


sculo VII ou VIII e na AConcordia Regularum@de Bento de Aniane, vol. 103. Foi
Bento de Aniane quem deu ao documento este nome, porque se apresenta sob a forma
de perguntas e respostas.
A Regra do Mestre era um tanto desprezada por causa do seu tamanho, por causa
de sua doutrina francamente semi-pelagiana e porque era considerada como um
simples comentrio da Regra de So Bento.
Conhecia-se h muito tempo os laos estreitos que uniam a Regra de So Bento e a
do afamado Mestre annimo e considerava-se geralmente que, visto estar bem
comprovada a autenticidade da Regra de So Bento, a Regra do Mestre, cuja origem
parecia muito mais incerta, no passava de uma repetio mais difusa e portanto
evidentemente posterior. Contudo, desde vinte anos todas essas pseudo-certezas tm
sido fortemente abaladas e a anterioridade da Regra do Mestre parece cada vez mais
admitida mesmo pelos sbios beneditinos.

Anterioridade da ARegula Magistri@ Regra de So Bento

Em 1934 D. Genestou publicou um artigo dizendo que a Regra do Mestre devia ser
anterior a So Bento. Depois dele Froger, outro monge de Solesmes que estudou
profundamente o problema, sustentou tal afirmao (cf. Introduo - Autenticidade).
Os fatos provam, com efeito, que uma das duas regras plgio da outra. Qual?
Examinemos dois casos possveis e suas conseqncias do ponto de vista de sua
composio literria e de seu contedo espiritual.

$ 11 caso: - ANTERIORIDADE DA REGRA DE SO BENTO

O Mestre tem sob seus olhos a Regra de So Bento. Copia quase textualmente:

a) - O Prlogo
b) - Os sete primeiros captulos. (Todavia omite fragmentos importantes). E
acrescenta ainda numerosas pginas, com uma prolixidade que caracterstica de seu
estilo, aos captulos 1, 2 e 6, e ao Prlogo da RB. Tal acrscimo torna-se
particularmente picante quando no cap. 1 aps dizer que sobre o misrrimo
procedimento dos girvagos mais vale calar do que dizer alguma coisa, comea a
fazer uma descrio interminvel. Quanto ao sbrio captulo sexto de So Bento
sobre o silncio a Regra do Mestre substitui por dois captulos (8 e 9).
A partir do captulo 101 o Mestre se baseia mais totalmente na RB. No entanto,
ficamos surpresos ao ver que ele parece evitar reproduzir as palavras luminosas e
lapidares por meio das quais So Bento gosta de condensar seu pensamento
sobretudo no princpio ou no fim de um captulo. No mais, captulos inteiros de So
Bento desaparecem e entre eles os de grande valor espiritual como o cap. 34 sobre a
pobreza, 63 e 64 sobre a Ordem na Comunidade e sobre a escolha de seu chefe, os
captulos 68 a 73 que contm o segredo da unio perfeita de todos entre si e com
Deus.
Para explicar o fato de no se encontrar nenhum trao dos captulos 68 a 73 da RB
na Regra do Mestre supe-se que o Mestre s tenha conhecido a redao primitiva da
RB que continha 66 captulos. Realmente o assunto do captulo 66 (Dos Porteiros do
Mosteiro) em So Bento o mesmo do ltimo captulo do Mestre. Entretanto, nada
fundamenta esta hiptese.

$ 21 Caso: - ANTERIORIDADE DA REGRA DO MESTRE

So Bento tem a Regra do Mestre sob seus olhos. Como ele a conhecera? Seria ela
a Regra praticada no Mosteiro do monge Romano, com quem So Bento travara
conhecimento? (cf. cap.I Livro II dos Dilogos).
Ns ignoramos como So Bento conheceu a Regra do Mestre. No entanto,
sabemos que ele se serviu dela e a apreciava, de modo especial o seu princpio, onde
se encontrava uma sntese de vida espiritual que o Mestre havia intitulado: ADo
exerccio do combate espiritual e do modo de fugir do pecado por meio do temor de
Deus@ (cf. RM cap. I a X).
Chega, ento, o momento em que So Bento quis fixar por escrito o fruto de sua
experincia. Ele poderia ter redigido tudo novo dispensando basear-se no Mestre, da
mesma forma que se inspirara em Cassiano e nos Padres, dando, porm, um cunho
prprio aos seus escritos. Teramos, assim, uma Regra cujo estilo seria de ponta a
ponta aquele que ns encontramos nas duas primeiras frases do Prlogo e nos ltimos
captulos da Regra, este estilo sbrio e vigoroso que ns conhecemos bem. Teramos,
sem dvida, tambm, uma Regra melhor construda, os captulos que tratam do
mesmo assunto seriam agrupados se no fundidos, tais como os captulos 2 e 64 sobre
o Abade.
So Bento, porm, seguiu uma outra linha de conduta e a se revela sua humildade.
No ltimo captulo de sua Regra ele qualifica sua obra de Aesboozinho de Regra
para principiantes@. j um modo de falar modesto, humilde. No entanto, prova
bem mais profunda de humildade o fato de ter querido manifestar sua dependncia
e ao mesmo tempo seu reconhecimento face ao Mestre:

a) - utilizando em parte o texto de sua Regra

b) - seguindo no conjunto de sua Regra a ordem da do Mestre. Nesta Regra que ele
conhece a fundo, discerniu o melhor. So Bento reconhece que o Mestre prolixo,
mesmo nas suas melhores pginas, mas sua experincia espiritual profunda e sua
exposio exprime bem a doutrina tradicional. No teme So Bento assumir o estilo
do Mestre para atestar aquilo que deve ser atestado. Eis por que encontramos alguma
redundncia no Prlogo e no captulo da humildade notadamente no primeiro grau.
Entretanto, no hesita, mesmo quando conserva o texto, em suprimir o que acha
desnecessrio. Tal o caso que assinalamos ao comentar que no Prlogo, aps ter
dito que sobre o misrrimo procedimento dos girvagos melhor calar, o Mestre faz
uma longa exposio sobre os mesmos. J So Bento observa o conselho do silncio
e realmente nada diz, suprimindo o intil desenvolvimento dado na Regra do Mestre.
Uma vez chegado ao termo do captulo 101 que aquele da sntese espiritual do
Mestre, So Bento retoma sua liberdade de redao, mas continua seguindo a Regra
do Mestre quanto ordem das questes a tratar. Aqui ou ali adota So Bento os
princpios ou usos que lhe parecem vlidos na RM, mas estes pontos de contato entre
as duas redaes no fazem mais que colocar em relevo a independncia profunda de
So Bento, porque se para tratar do mesmo assunto ele se apropria de alguns
elementos do Mestre, estes elementos aparecem assimilados por uma sabedoria que
ultrapassa e muito, aquela do Mestre. O estilo, como o pensamento profundo revelam
a originalidade do discpulo, tornado ele mesmo, um Mestre.
Mas isto no tudo. Aps ter esgotado os assuntos tratados pelo Mestre, So Bento
tem ainda alguma coisa a dizer. No somente ele renovou a legislao do Mestre por
um esprito novo, mas completou-a escrevendo os ltimos captulos de sua Regra: 68
a 73. Nestas pginas, do estilo rigoroso passamos ao sopro do Esprito que animava
So Bento e que dirigia sua pena: esprito de caridade e de obedincia, de humilde
fidelidade Verdade, de medida e de paz, em uma palavra o esprito de Cristo que
Bento ama ACIMA DE TUDO.

Tais so as semelhanas entre So Bento e o Mestre neste caso ou no anterior.


Nesta segunda hiptese a obra do Mestre apresenta certas imperfeies, mas ela
permanece meritria; em lugar de ser um plagirio que degrada a obra da qual se
serve, o Mestre um precursor que elabora dados tradicionais, dos quais So Bento
se servir com domnio, para edificar um monumento acabado e durvel. Sem Bento,
as melhores pginas do Mestre cairiam, como as outras, no esquecimento. Mas elas
eram dignas de ser salvas e uma vez inseridas na RB, alimentar geraes de monges.

VII - HISTRIA DO TEXTO DA REGRA BENEDITINA

De So Bento at os nossos dias

Nenhuma obra da antiguidade, exceto a Bblia, chegou at ns em nmero to


grande de cdices quanto a Regra de So Bento. importante salientar aqui que no
foi a Regra do Mestre e sim a Regra de So Bento, a que se difundiu em todo o
Ocidente na medida em que ia aumentando o nmero de mosteiros beneditinos.
Mais de trinta cdices se encontram na Biblioteca de Paris, mas nem todos estes
manuscritos oferecem-nos um texto idntico em todas as partes. O primeiro a
empreender o trabalho de estabelecer a histria do texto da Santa Regra, foi o sbio
beneditino Daniel Haneberg, Abade de S. Bonifcio, Munique. Ele reuniu as
variantes de um certo nmero de manuscritos do sc. XI, mas no podendo acabar
sozinho este trabalho, confia seu material a D. Edmundo Schmidt, na Baviera, que em
1880 fez aparecer o primeiro ensaio de estudo crtico do texto da Regra de So Bento.
Haneberg demonstra que os mais antigos manuscritos anteriores ao sc. X se
dividem em dois grupos ou famlias, representando dois tipos de textos claramente
determinados. As diferenas na maioria dos casos no so grandes e raramente afetam
a substncia da Regra, mas elas so suficientes para estabelecer uma dupla tradio
do texto. A interpretao que d Schmidt deste fenmeno que um dos grupos, dos
quais o manuscrito de Oxford o mais antigo de todos,(segundo Traube o documento
mais antigo do texto interpolado), o prottipo, representa a primeira redao da
Regra por So Bento e que o outro grupo representa sua redao definitiva.
O Dr. L. Traube, alemo, que quem mais tem feito para elucidar a Histria do
texto da Regra de So Bento, contesta esta soluo. Seu Tratado sobre a histria do
texto uma obra de erudio consumada, resultado de um conhecimento sem rival da
poca carolngea.
Traube demonstra que o primeiro grupo de manuscritos de Schmidt representado
principalmente pelo manuscrito de Oxford, contm um tipo de texto difundido em
toda a Europa ocidental no VII e VIII sculos; era o texto universalmente admitido na
Itlia, Frana, Inglaterra e Germnia at ao sculo IX.
No comeo do sculo IX outro texto esteve em voga sob a influncia da
Renascena carolngea. Traube demonstra que ele provinha de um cdigo ento em
Monte Cassino, o qual cr-se ser o autgrafo de So Bento cuja cpia foi enviada a
Carlos Magno e que tornou-se o modelo das cpias da Regra de So Bento difundidas
nos mosteiros de seu imprio.
Uma das cpias feitas deste exemplar existe ainda: o manuscrito de Saint Gall
que se separa do Cdigo de Monte Cassino por somente um intermedirio.
evidente que se o Cdigo de Monte Cassino era realmente um autgrafo de So
Bento, o Saint Gall 914 , como autoridade para o texto da Regra, um caso
provavelmente nico, quando se trata de uma obra dos seis ou sete primeiros sculos.
Pode-se perguntar com efeito, se para algum outro livro desta poca, possumos ns
uma cpia separada do original somente por um intermedirio.
- Que foi feito do texto de uso quase universal durante os VII e VIII sculos?
Pode-se aceitar a hiptese de Schmidt de que este tipo era uma primeira redao da
Regra?
Traube mostra em mais de vinte lugares ao longo de toda a Regra que as variantes
do primeiro grupo de Schmidt comparadas quelas que derivam do Cdigo de Monte
Cassino, tm na maior parte dos casos, caractersticas, no de primitivas, mas de
variantes de segunda ordem. Elas so ensaios de correes, ou mesmo simples
alteraes do texto de Monte Cassino. possvel explicar o primeiro grupo como
reviso falsificada do texto de Monte Cassino, mas no possvel olhar o segundo
grupo como sendo a reviso do primeiro pelo autor.
Eis um resumo dos resultados destes estudos, particularmente da tese de L. Traube,
hoje geralmente aceita entre os eruditos.
a) - Em Monte Cassino: O texto escrito por So Bento foi religiosamente
conservado em Monte Cassino at o dia da primeira destruio deste
Mosteiro em 577 pelos lombardos. Os monges fugiram para Roma.
b) - Em ROMA: Os monges fugitivos levaram o texto da Regra de So Bento
para Roma, onde ficou, na Biblioteca Papal Lateranense, at 750.
c) - Novamente em Monte Cassino: Em 741-752, quando Petronax de Brscia
restaurou a vida monstica em Monte Cassino, o Papa Zacarias enviou a este
Mosteiro, junto com um exemplar da Bblia, a Regra que o bem-aventurado
Pai Bento escreveu com suas prprias mos. Isso nos narrado por Paulo
Dicono. A permaneceu o texto at 883 quando os sarracenos destruram
pela segunda vez aquele cenbio.
d) - Em TEANO: Os monges que fugiram dos sarracenos, levaram o texto da
Regra de So Bento para o mosteiro de Teano.
e) - O texto permanece em Teano, at 896, quando ento DESTRUDO num
simples incndio ocorrido naquele mosteiro.
Somente no fim do sculo passado foi que se estudou de modo cientfico a histria
do manuscrito da Regra de So Bento at o texto atual. Em resumo, eis os resultados
das investigaes:
Podemos reduzir todos os manuscritos existentes da Santa Regra em trs grupos ou
trs famlias:
1 - TIPO PURO ou ORIGINAL
a) - O Cdice representado pelo autgrafo de So Bento conservado em
Monte Cassino e Roma e depois destrudo em 896 no mosteiro de Teano,
conforme resumo acima.
b) - O Cdice - Por sorte, Carlos Magno,uns cem anos antes da destruio do
autgrafo de So Bento no mosteiro de Teano, em 787, desejoso de unificar
todo o monaquismo do seu imprio sob o texto exato da Regra de So Bento,
solicitou ao Abade de Monte Cassino, Teodemaro, uma cpia do referido
autgrafo, pois nos mosteiros existiam vrios e diferentes textos da RB (o
interpolado). O abade atendeu a este pedido conforme atesta um documento
de Paulo Dicono fazendo a entrega da referida cpia ao Imperador atravs
de uma carta onde o Abade Teodemaro diz: ASegundo a vossa ordem eis a
Regra do bem-aventurado Pai Bento que transcrevemos do prprio cdice
que ele escreveu com sua mo@. Este cdice foi enviado a Aquisgrano
(Archen) sendo guardado na biblioteca falaciana do Imperador e deveria,
mais tarde, servir de fundamento para a reforma dos Mosteiros empreendida
por Bento de Aniane que, para tanto transformou a Abadia de INDEN em
uma espcie de mosteiro-modelo para todo o Imprio. O Cdigo de Monte
Cassino conservado por muito tempo neste mosteiro acabou por perder-se.
Felizmente antes que tal acontecesse foram feitas muitas cpias deste cdice,
como veremos a seguir.

c) - O Cdice [Sangallensis 914] - Uma das cpias do Cdice (de Carlos


Magno) e, por certo, muito esmerada, chegou at ns: a clebre Sangallensis
914 (= ) que foi realizada meticulosamente por dois monges do Mosteiro de
Reichenau, Taton e Grimaldo enviados para tal encargo, pouco depois de 817
ao mosteiro de INDEN a pedido do Bibliotecrio de Reichenau. Esta cpia se
encontra hoje na Biblioteca do Mosteiro de So Gallo (na Suia) para onde
foi levada por Grimaldo que se tornou abade desse mosteiro em 841. Deste
modo, entre o autgrafo de So Bento e o Sangallensis 914 s existe um
intermedirio que o Cdice de Carlos Magno. Contudo no podem afirmar
com absoluta certeza que encontraram no Sangallensis 914 a verso original
exata de So Bento. Como toda cpia de um texto da antiguidade conhecido
por outras testemunhas tambm o Sangallensis estava exposto a erros e de
fato contm algumas falhas. Por isso, como diz D. Colombs, necessrio,
para quem quer fazer um trabalho de erudio, confront-lo com outros
manuscritos. o que faz, por exemplo, D. Baslio Steidle ao assinalar na sua
edio da Santa Regra (utilizada por D. Joo E. Enout) as variantes que no
texto de Oxford (o mais antigo manuscrito da RB que possumos) do que
falaremos em seguida, esto em desacordo com o Cdigo Sangallensis 914.

Segundo D. Colombs Aainda que se ponha em dvida a tradio Cassinense e


Carolngea, de que s existe um intermedirio entre o Sangallesis 914 e o
autgrafo de So Bento o valor deste manuscrito realmente nico. Nenhum
dos outros Cdigos que nos conservaram o Atexto puro@ pode-se-lhe
comparar (Cf. La Regula de S. Benito p. 23).

2 - TIPO INTERPOLADO
Junto tradio precedente existe outro tipo de texto muito difundido na Itlia,
Frana, Inglaterra e Alemanha durante os sculos VII e VIII.
Traube considerou como interpolaes as diferenas que este tipo apresenta
com relao Atradio pura@ que acabamos de ver. Estas interpolaes
devem ter sido feitas naturalmente: Primeiro erro dos copistas, dificuldade
em copiar letra por letra sem errar. Depois havia tambm o problema prtico:
uma coisa que havia cado em desuso era omitida. Assim, foram surgindo
acrscimos e modificaes e tambm adaptaes s regras da gramtica
clssica. Da seu nome de texto interpolado. A este grupo pertencem os mais
antigos manuscritos da RB:
$ $ O Oxoniensis - Hattor 48 (= O) escrito em Canturia pelo ano 700. o MAIS
ANTIGO no s do tipo interpolado, mas de todos os outros manuscritos da
RB que possumos.
$ $ O Veronensis (= V) do sculo VIII - IX.
$ $ O Sangallensis 916 (= S) da mesma poca.
Estes trs Cdices procedem de uma fonte comum.

3 - TIPO MISTO ou RECEPTUS

Existe, finalmente, um terceiro tipo do texto beneditino. Reproduzido j no


sculo VIII por Paulo Dicono e no IX por Hildemaro em seus respectivos
comentrios Regra, representa o resultado das tentativas dos copistas de
Anormalizar@o latim de Sculo VI segundo as leis da gramtica clssica que
os bons copistas haviam aprendido nas florescentes escolas carolngeas. Este
texto, a partir do sculo X comeou a ter tal xito que acabou por ser recebido
em toda a parte. Dai o seu nome RECEPTUS (TR). Constituindo uma espcie
de AVulgata@ da RB perdendo, no entanto, nas ltimas dcadas, para o texto
Sangallensis 914 em que se baseiam geralmente as edies crticas.
D. Cultbert BUTLER no seu livro ALe Monachisme Bndictin@ p. 186ss.
afirma que so numerosas as diferenas entre o texto RECEPTUS e o
SANGALLENSIS 914 e enumera alguns que reproduzimos aqui a ttulo de
exemplo:
1 - No captulo 9 v.1
O texto Sangallensis diz: AHiemis tempore suprascripto, in primis versu tertio
dicerdum >Domine labia mea aperis et os meum adnuatiabit laudem tuam.
O Receptus: AHyemis tempore praemisso im primis verso: Deus in adjuntorium
meum intende, Domine adjuvandum me festina. In secundum dicendum est:
Domine labia mea et os meum annuntiabit laudem tuam@.

2 - No captulo 41, v.5


O texto Sangalensis diz: Afacum frates absque justa murmuratione faciant@.
O Receptus: absque ulla murmuratione...
Assim, segundo o Sangalensis, o Abade deve governar de forma a no dar aos
monges ocasio de uma justa murmurao. O Receptus, porm, diz que o
Abade deve governar de tal modo que os monges no possam murmurar
nunca.
3 - No captulo 58,17
O texto Sangalensis diz: A... in oratorio coram omnibus promittat de stabilitate
sua et conversatione morum suorum et oboedientia@.
O Receptus: Apromittat de stabilitate sua et conversione morum suorum et
oboedientia...@
*
Enumeram at aqui os esforos empreendidos por L. Traube e outros para se
aproximarem o mais possvel do texto original de So Bento uma vez que
como j se comprovou o Aoriginal mesmo@, se perdeu definitivamente. Esta
a meta a que se propoem os estudiosos. Ainda que algumas das teorias de
Traube possam ser hoje discutidas, na prtica o Cdice Sangallensis 914,
continua gozando de maior prestgio e constitue a base das recentes edies.
Por isso, segundo diz, Garcia Columbs no seu livro ALa Regla de San
Benito@ (pg 24), causa estranhesa o fato de que F. Masai e E. Manning
ainda atribuem maior valor ao Oxiniense Hatton 48 que consideram como
representante do estado primeiro da RB. Quanto mais quando se sabe que A.
de Vgue inseriu na sua magna obra ALa Rgle de Saint Benoit, t. 1 e 2 da
Source Chretiennes@ a edio devida a J. Neufville baseada em primeiro
lugar no Sangalenses 914 s com algumas variantes do Oxoniense Hatton 48
no aparato crtico!
Podemos acrescentar ainda que esta mesma teoria de Traube tambm aceita
por Batler. Para ele fato estabelecido que o Cdice Sangallensis 914 contm
o melhor texto da RB que ns conhecemos. quanto questo de saber se ele
realmente da mo de So Bento, D. Butler se mostra mais ctico.
O fato , conclui o prprio D. Butler que, embora esta questo desperte vivo
interesse, ela no tem grande importncia prtica porque autgrafo ou no o
Sangallensis 914 oferece o melhor de todos os textos de So Bento j
conhecidos.

***

VIII - COMENTRIOS DA REGRA DE SO BENTO

Pouqussimos livros tiveram tantos comentrios, atravs dos tempos, como a Regra
de So Bento. Nenhuma Regra teve uma tradio manuscrita to copiosa, poucas,
tantas edies e tradues. Nenhuma formou como a Regra de So Bento a base do
ensino espiritual de uma ordem religiosa em tantos sculos. Outras Regras mais
antigas como a de Santo Agostinho, ficaram fora de uso durante sculos. A de So
Bento foi observada e sempre serviu de norma espiritual desde o sculo VI at hoje
ininterruptamente. Compreende-se assim que tenha tido muitos comentrios.
Os comentrios podem ser assim classificados:

1) - Comentrios antigos
2) - Comentrios medievais
3) - Comentrios dos sculos XVII e XVIII
4) - Comentrios modernos

1) - COMENTRIOS ANTIGOS

1.1. O de PAULO DICONO (Sculo VIII)

O mais antigo dos comentrios conhecidos (segundo D. Butler, um dos melhores),


devido a Paulo Dicono: AExpositio Pauli diaconi super Regulam S. Benedicti
abbatis@, editado em Monte Cassino. Este Paulo Dicono identificado com Paulo
Warnefrido, um dos homens mais sbios de seu tempo, lombardo, familiar no
somente dos ltimos reis lombardos na Itlia, mas tambm de Carlos Magno. Aps a
queda do reino lombardo Paulo Warnefrido retira-se ao Monte Cassino e se torna
monge de 780 a 799.
Supunha-se que este comentrio tivesse sido escrito em Monte Cassino, mas
Traube, no seu ensaio de investigao crtica do texto faz ressaltar, aps indicaes
que parecem concludentes, que ele foi composto na Itlia setentrional na provncia de
Milo, antes de 776, (quando ento Paulo vivia, provavelmente, no mosteiro de
Civate, antes portanto de ir para Monte Cassino). H, com efeito, muitos anos de sua
vida sobre os quais no temos nenhum documento.
Esta suposio de Traube foi admitida unanimemente, at que P. Paschini voltou a
advogar por Monte Cassino. Segundo este autor, Paulo Dicono redigiu seu
comentrio no ano 786 aps seu regresso da Frana.

Se, de fato, esse comentrio de Paulo Dicono, escrito nesse ano (em Civate ou
Monte Cassino; as opinies divergem) ele vai exprimir, ento, a observncia
beneditina antes da primeira grande reforma associada ao nome de Bento de Aniane,
pois o comentrio fornece materiais para elaborao de um quadro muito interessante
e muito vivo da comunidade onde viveu o escritor. Exprimiria ento, a vida
monstica beneditina tal como foi vivida nos anos que se seguiram imediatamente
morte de So Bento, antes de qualquer reforma de grande vulto, dando-nos assim
uma noo da fase mais antiga da vida beneditina, antes que ela fosse invadida pelas
idias e usos dos primeiros tempos da Idade Mdia. Evidentemente que seu interesse
seria grandemente realado se ns pudssemos aceit-lo como sendo um quadro da
vida no interior de Monte Cassino.

No entanto, recentemente, um monge suo escreveu uma tese em que procura


provar que esse comentrio atribudo a Paulo Dicono data do ano 850, portanto, j
no tempo de Bento de Aniane. Assim, j no seria mais a observncia primitiva da
Regra beneditina que ela exprimiria, mas sob Bento de Aniane. Segundo D. Baslio
Steidle o trabalho era definitivo e, de fato, no deve ser considerado o comentrio de
Paulo Dicono como o primeiro da Santa Regra. O comentrio segue o texto
Areceptus@. Sendo assim, ns teramos como comentrio mais antigo da Santa
Regra, o de Smaragdo.
1.2. O de SMARAGDO: - AExpositio in Regulam Sancti Benedicti@, destinada a
uma
grande difuso.

Smaragdo, Abade de S. Miguel, escreveu seu comentrio entre 817-820.


animado pelo esprito do movimento monstico carolngeo e foi escrito para secundar
a reforma de Bento de Aniane do qual Smaragdo era grande admirador.
Este comentrio formado em grande parte de extratos de Regras monsticas e de
Obras Patrsticas e aplica-se em aclarar as passagens mais difceis da Regra de So
Bento, oferecendo inclusive notcias acerca dos usos monsticos na Frana, nos
princpios do sculo IX. Smaragdo segue o texto da classe pura.

1.3. A CONCRDIA REGULARUM

A Concrdia Regularum composta por S. Bento de Aniane pode considerar-se


tambm um comentrio porque confrontando os textos de So Bento com o das
outras Regras anteriores e posteriores, explica e esclarece o sentido da Regra
Cassinense.

1.4. O de HILDEMARO - ATractatus in Regulam S. Benedicti@, editado em 1880

Hildemaro era um franco que se tornou monge em Civate, perto de Milo, em 850.
Seu ATractatus@ sobre a Regra de So Bento uma srie de conferncias (que ele
mesmo no publicou - mas seus discpulos recolheram notas). Emprega o comentrio
de Paulo para seu texto, mencionando-o quase por inteiro, mas acrescentando aqui e
ali ligeiras modificaes. Estas modificaes do a este comentrio o nico interesse
particular que ele possui.
Hildemaro afirma que o comentrio atribudo a Paulo Dicono no de Monte
Cassino, mas de Civate.

2) - COMENTRIOS MEDIEVAIS

Os comentrios medievais so mais de edificao do que comentrios que


procurem determinar o esprito de So Bento. Foram escritos para ajudar a vida
pessoal dos monges.
Depois do de RUPERT DE DEUTZ, de SANTA HILDEGARDA e de alguns
outros destacamos:

2.1. O de BERNARD AYGLERIO: AExpositio in Regulam@, editada em Monte


Cassino,
em 1894.
Bernard era da Borgonha e aps exercer notvel profisso, tornou-se Abade de
Monte Cassino. Pode ser contado entre os grandes Abades do fim da Idade Mdia.
Sua obra um comentrio real e de grande valor como quadro da vida de Monte
Cassino no sculo XIII, nos belos dias de prosperidade e de influncia daquele
mosteiro. Ele conhece e emprega em larga medida os comentrios de Paulo e de
Smaragdo, mas a sua obra completamente original. Cita livremente os Padres e
telogos. Escreveu tambm uma obra intitulada ASpeculum Monachorum@,
excelente Tratado sobre as obrigaes do estado monstico.

2.2. Os de NICOLA DE FRATTURA e RICARDO DE S. ANGELO


Interessantes especialmente sobre o aspecto jurdico, so os dois comentrios, um
pouco posteriores dos cassinenses Nicola de Frattura e Ricardo de S. Angelo. Esses
porm, se conservam ainda hoje inditos, em Monte Cassino.

2.3. O de PEDRO BOHIER: AIn Regulam S. Benedicti apparatus@, editado em


SUBIACO, no ano de 1908.
Pedro Bohier era um monge francs que chegou a ser Bispo de Orvietto. Sua obra
pretende antes de tudo iluminar a Regra de So Bento mediante escritos de Cassiano,
S. Jernimo e outros. Apia-se em grande parte sobre Bernard Ayglerio, mas sua obra
muito inferior.

2.4. O de JOO DE TORQUEMADA: AExpositio in Regulam S. Benedicti@


De muito valor e bastante conhecido hoje este comentrio do clebre cardeal
dominicano Joo de Torquemada, escrito em 1441 e impresso muitas vezes. Nele se
fala das tendncias reformadoras associadas ao nome dos Conclios de Constncia e
Basilia, nos quais Joo de Torquemada tomou parte.

2.5. O de JOO TRITMIO


Tambm o douto Abade Joo Tritmio, um dos mais vlidos restauradores do
esprito religioso e beneditino nos incios do Renascimento deve citar-se entre os
melhores comentadores da Regra, porque o seu comentrio, embora limitado aos sete
primeiros captulos uma excelente exposio sobre a doutrina asctica de So
Bento.
Escreveu ainda um Enquiridio que Aexiste ainda quase em estado de manuscrito,
destinado a iniciar os novios da Congregao de Bursfeld aos exerccios cotidianos
da piedade monstica; no se pode sem emoo imaginar o que devia ser a vida do
monge que animava os seus mnimos atos com a fora da compuno que vibra em
cada pgina desse seu manual devido em grande parte ao Abade Joo Tritmio@
(Ideal Monstico e a vida crist dos primeiros dias).

2.6. O de ANTNIO PEREZ: - ACometaria in Regulam S. Patris Benedicti@


Vrios foram os comentrios que vieram luz na Espanha no decurso do sculo
XVII. O mais valioso deles sem dvida, o devido a Antnio Perez, monge e Geral
da Congregao de So Bento de Valladolid e arcebispo de Tarragona. Sua obra
revela as idias e as tendncias que seguiram ao Conclio de Trento, ao lado das
prprias da grande Congregao beneditina espanhola.

2.7. O de AGOSTINHO BAKER: - AExposition of the Rule@, composta em 1632.


Agostinho Baker utilizou consideravelmente a obra de Torquemada, de Tritmio e
tambm de Smaragdo e de Perez. Seu fim essencialmente prtico: uma simples
explicao das prescries da Regra de So Bento, apropriada s necessidades das
beneditinas inglesas de Cambrai, sob a dupla relao: observncia exterior e instruo
espiritual.
Esta obra no foi impressa mas uma cpia manuscrita conservada na Abadia de
Downside.

3 - COMENTRIOS DOS SCULOS XVII E XVIII

Os comentrios anteriores, compostos dos primeiros tempos at o sculo XVI


tiveram como suprema finalidade, a edificao espiritual e a vida prtica do mosteiro.
Com o sculo XVII penetra tambm nos comentrios da Regra o interesse cientfico e
erudito prprio daquela poca, que levou indagao e ao exame dos elementos
arqueolgicos, histricos e literrios, que valeram certamente para dar uma mais
profunda e vasta compreenso do cdigo de So Bento. Como primeiro em ordem
cronolgica assinala-se:

3.1. O de H. MNARD: - ANotae et observationes@


O maurino H. Mnard, publicando em 1638 a AConcordia Regularum de So
Bento de Aniane@, acrescentou muitas e eruditas notas e observaes. A obra do
grande reformador do monaquismo carolngeo, ainda que unicamente base de
passagens tiradas de outras regras antigas, constitui um verdadeiro comentrio da
Santa Regra; por isso as notas de Mnard, eruditas, porm um tanto confusas, devem
classificar-se entre as melhores explicaes do cdigo beneditino.
3.2. O de B. VAN HAEFTEN: - ADisquisitionum monasticarum libri XII@
A obra de Haeften contm primeiramente um comentrio ao Livro II dos Dilogos
de S. Gregrio Magno;mas o corpo da obra est dedicado a explicar a Santa Regra,
no seguindo a ordem dos captulos, mas agrupando seu contedo por matrias.
uma obra extraordinria se se considera que ela foi composta antes que a
Congregao de S. Mauro tivesse aberto suas fontes de informao. As grandes
questes concernentes Regra e a vida mesma da histria beneditina a so tratadas
com uma vasta erudio e um julgamento muito seguro. Mas o autor se inclina
habitualmente para interpretaes rigoristas, refletindo nisto a poca de reforma
durante a qual ele vivia. D. Butler julga ser este o livro mais proveitoso entre todos os
que comentam a Regra beneditina.

3.3. O de A. J. MGE: - ACommentaire sur la Rgle de Saint Benot@ publicado


em
Paris no ano de 1687.

D. Mge pertence Congregao de S. Mauro e seu comentrio nos introduz no


mais forte da controvrsia entre o famoso Abade e reformador da Trapa, de Ranc e
os beneditinos negros. Este comentrio , por uma grande parte, uma rplica ao livro
de Ranc ADevoirs de la Vie Monastique@ (1683) onde ele havia exposto uma viso
da vida beneditina com extremo rigor e onde sublinhava a obrigao do retorno o
mais literal possvel, s condies fsicas e intelectuais da vida, tais como elas
existiam no prprio mosteiro de So Bento, e mesmo o retorno aos ideais dos Padres
do deserto egpcios. Mge combateu as opinies de Ranc sobre um certo nmero de
pontos: sobre a observncia do silncio completo, sobre os estudos, sobre as
Ahumilhaes fictcias@ e sobre a caracterstica geral de sua teoria monstica. De
uma ponta a outra de seu comentrio respira-se uma interpretao mais doce do
esprito e idias de So Bento. Mas o autor no estava em harmonia com o mundo
religioso de sua poca. Como costume, nos perodos de moralidade relaxada, os
bons eram inclinados a se mostrar impecveis e tinham uma idia bastante severa da
vida religiosa. O jansenismo e o puritanismo estavam no ar e a converso sensacional
de Ranc, tinha causado imensa impresso.

O comentrio de Mge se oferece, pois, a um pblico que no lhe era simptico e


mesmo - por incrvel que possa parecer, - a Corte de Luiz XIV tomou grande
interesse pelas controvrsias monsticas, exercendo presso sobre os superiores da
Congregao de S. Mauro, que acabaram por desaprovar o comentrio de Mge,
proibindo-o por causa do laxismo.

3.4. O de RANC: - ALa Rgle de Saint Benot explique selon son vritable
esprit@
editado em 1689.
Este comentrio uma resposta a D. Mge, no qual de Ranc expe uma vez mais
suas idias de uma austeridade extremada.
3.5. O de E. MARTNE: - ACommentarius in Regulam Sancti Benedicti...@
publicado
em Paris 1690.
No tardou em aparecer este comentrio em que o autor procura exatamente ver o
esprito de So Bento, evitando adaptao muito laxista, como a de Mge ou muito
rigorista como a de Ranc. Este comentrio de D. Martne um tesouro imenso de
conhecimento monstico, histrico, arqueolgico, litrgico e durante muito tempo foi
o comentrio oficial da Congregao de So Mauro e tido como ltima palavra em
comentrio da Regra beneditina.

3.6. O de A. CALMET: - ACommentaire sur la Rgle de Saint Benot@, Paris 1732


Augustin Calmet, monge da Congregao de St. Vanne em Lorena, procura em seu
comentrio prescrutar o sentido literal, apresentando slida doutrina e fazendo
conhecer o pensamento e o esprito do Patriarca. menos arqueolgico que o de D.
Martne e parece fazer ressaltar melhor o esprito e o sentido da Regra. precedido
de um admirvel Prefcio sobre a Regra e sobre certos aspectos de histria monstica
e seu desenvolvimento. Segundo D. Butler, este Prefcio de um tal valor que
merecia ser impresso parte como Introduo Regra.
De todos estes comentrios acima mencionados, D. Butler destaca como sendo os
melhores, sob diferentes pontos de vista, os seguintes: o de PAULO DICONO, o de
HAEFTEN, de CALMET.

4) - COMENTRIOS MODERNOS

O sculo passado no viu novos comentrios da Regra de So Bento; mas a


florao de estudos cientficos sobre a Regra, iniciada nos seus ltimos decnios,
levou a uma nova exposio o texto de So Bento. So dignos de meno:
4.1. Os de SAUTER (1899-1901), de D. SYMPHORIEN (1909) e especialmente o
de L=HUILLIER (Explicao asctica e histrica da Regra de So Bento - 1901) que
tem observaes profundas e originais.

4.2. Os de D. DELATTE: - ACommentaire sur la Rgle de Saint Benot@ - 1913


Em D. Delatte, Abade de Solesmes a preocupao sobretudo espiritual. A
profunda doutrina teolgica, o conhecimento e o amor das tradies monsticas, a
uno e a clareza da exposio fazem dele uma obra excelente para a edificao e
para o estudo dos monges. Mas ele estava ainda muito pouco documentado nas
fontes.

4.3. O de D. BUTLER: - AMonachisme Bndictin@ - Paris 1924


A obra de D. Cutberto Butler, Abade de Downside, no propriamente um
comentrio da Regra, mas d muito o esprito de So Bento. Hoje, com as
modificaes surgidas na parte filolgica e histrica da Santa Regra, sobretudo depois
da Regra do Mestre, poder-se-ia fazer algumas restries.

4.4. O de B. LINDERBAUER: - A S. Benedicti Regula monachorum philologisch


erklart@ - Metten 1922.
De ndole exclusivamente literria o comentrio filolgico de Linderbauer. O
exame minuncioso da lngua, da forma, do lxico torna utilssimo para a exata
compreenso do pensamento de So Bento. O diligentssimo trabalho permanece
fundamental para a exegese da Regra e para ulterior estudo filolgico da matria.

4.5. O de D. HERWEGEN: - ASinn und Geist der Benediktinerregel@ - 1944


O comentrio de D. Herwegen, venervel Abade de Maria Laach, segue
detalhadamente o texto. A sua originalidade est no realce que ele d a natureza
pneumtica e carismtica da vida monstica. Procura refazer a atmosfera em que
vivia So Bento para colher o seu genuno sentido e esprito. Nem sempre suas idias
parecem aceitveis de todo, pois muitas vezes mais D. Herwegen que So Bento.

4.6. O de LENTINI: - S. Benedetto, La Reolga@ - Monte Cassino 1947


D. Lentini, monge de Monte Cassino, o autor de uma edio bilinge da Regra de
So Bento, qual acrescenta um comentrio que, se no tem grande originalidade,
possui indubitveis dotes de seleo e de ponderao, observaes muito boas, muito
sensatas. Foi ele o primeiro a fazer a diviso da Regra em versculos.

4.7. O de D. SCHUSTER: - AS. B. Regula monasteriorum@ - 1942


O Cardeal D. Schuster, apresentou em 1942 um comentrio da Regra de So
Bento, fruto da sua experincia de governo e de seus precedentes estudos. O autor
no segue passo a passo o texto, mas no fim de cada captulo procura colher os traos
essenciais e pe as suas observaes de carter arqueolgico, histrico ou asctico.
Procura esclarecer a Regra com as leis do tempo e costumes do tempo de So Bento,
mas tira concluses muito foradas.

4.8. O de D. BASLIO STEIDLE: - ADie Regel St. Benedikts@ - Beuron 1952


O comentrio de D. Baslio Steidle, monge de Beuron, tem duas finalidades:
- a) rejeitar a tendncia de introduzir na Regra idias alheias a So Bento.
- b) mostrar as verdadeiras fontes de So Bento no monaquismo anterior,
principalmente no monaquismo oriental. Este seu comentrio, porm, anterior ao
problema da Regra do Mestre, e portanto, precisa ser completado.

4.9. O de SIMON: - ARgle de S. Benot comente@


Muito til este comentrio destinado edificao dos oblatos em geral e de todos
os seculares.

4.10. O dos MONGES DE MONTSERRAT: - ASan Benito su vida y su Regla@


Este comentrio dos monges de Montserrat aproveita de tudo o que veio antes dele.
Tem uma parte espiritual e uma parte histrica.

4.11. O de D. GREGRIO PENCO


D. Gregrio Penco estuda o problema: Regra do Mestre x Regra de So Bento. Faz
a comparao entre as duas regras.

4.12. O de D. ADALBERT DE VOG: - Comentrio Histrico e Crtico - ALa


Communaut et L=Abe dans La Rgle de Saint Benot@ -
1961
Entre os comentrios parciais do texto beneditino distingue-se por sua
originalidade e excelente mtodo o livro de D. A. Vog: La Communaut et l=Abe,
onde o autor comenta os captulos em que So Bento mais diretamente refere-se s
relaes entre o Abade e a Comunidade.

IX - OUTRAS OBRAS MODERNAs sobre a regra de s. bento

Tambm deve citar-se entre obras modernas as seguintes:

1. M. D. PHILIPPE, OP: - AAnalyse thologique de la Rgle de Saint Benot@,


Paris
1961

2. WILFRID TUNINK: - AVision of Peace@ - Nova York, 1963 - Meditao


pessoal
sobre pontos essenciais da RB.

3. CLAUDE PEIFER: - AMonastic Spirituality@ - Nova York 1966. De tema mais


amplo, porm pode considerar-se como um
comentrio
sistemtico de espiritualidade da Regra de So Bento.

4. C. MARMION: - AJesus Cristo ideal do monge@ - D uma interpretao do


esprito
de So Bento sob o ponto de vista da vida de
perfeio.

5. G. MORIN: - AL=Ideal monastique et la vie chrtienne des premirs jours@.


Maredsous1927. Original viso da vida beneditina luz da
primitiva comunidade crist de Jerusalm.

6. D. ADALBERT DE VOGE: ALa Rgle de Saint Benot@ (SC 1971) 4 volumes


que
contm apenas os captulos no comentados
em
La Communaute et l=Abb - 1961.
7.IDEM: - ACe que dit Saint Benot - Une lecture de la Rgle@, editada em 1991.

8. D. SIGHARD KLUNER: ADieu, premier servi@ - Entretiens spirituels sur la


Rgle
de S. Benot - 1974

9. GARCIA M. COLUMBS: AEl espritu de S. Benito - Ed. Monte Cassino, 1982.

10. MARCELO BARROS SOUZA: ANa estrada do Evangelho - uma leitura


comunitria
e latino-americana da Regra de S. Bento@,
1993.

11. ESTHER DE WAAL: AA procura de Deus - (a espiritualidade beneditina como


caminho para o cristo)@, 1996

12. IDEM: AVivendo com a contradio@, 1998

13. BERTRAND ROLLIN: - AVivre aujourd=hui la Rgle de Saint Benot. Un


Commen-
taire de la Rgle@, editada em 1983.

Sobre a profisso monstica temos:

14. AGOSTINHO ROBERTS: AVida monstica - elementos bsicos@


- traduo
Lumen Christi, 1980

15. D. JOO EVANGELISTA ENOUT, OSB: S. Bento e a profisso de


monge -
Lumen Christi, 1990

16. D. BASLIO PENIDO, OSB: AA escolha de Deus@, 1997

17. AQUINATA BCKMANN, OSB: APerspectivas da Regra de S.


Bento@. Coment-
rios sobre o Prlogo e eo caps
53, 58,
72 e 73 - Ed. Lumen Christi,
1990
18. TERENCE G. KARDOGAN, OSB: ABenedict=s Rule: A
translation and commen-
tary - Collegeville: Liturgical
Press, 1996

19. JEAN CHITTISTER, OSB: Wisdom distilled fron the daily - living
the Rule of
St. Benedict today

20. IDEM: The Rule of Benedict - Ensights for the Ages, 1992.
Comentrio de acordo
com a diviso da Santa Regra para cada dia; aprofunda
o 11 livro.


PARTE II

I - SITUANDO SO BENTO
Na linha da Histria da Salvao

Cronologicamente a vida de So Bento pode enquadrar-se com


relativa preciso entre duas datas: 480 - 547. Bento viveu
aproximadamente 67 anos.
A Histria do mundo OCIDENTAL fez uma curva violenta passando
da Idade Clssica Idade Mdia. So Bento no apenas figura da
Histria da Igreja, mas pertence Histria Universal. Apareceu na
Histria Monstica precedido de uma longa tradio. Portanto,
Bento no fundador do Monaquismo nem pretendeu criar novo
gnero de vida monstica. Ao redigir sua Regra pensou apenas em
legislar para monges que vivem em COMUNIDADE. No
empreendeu sua obra sem antes consultar os ricos arquivos do
Monacato precedente. Desta consulta Bento saiu totalmente
impregnado da doutrina dos primeiros Padres da Igreja. Constitui,
portanto, grave erro estudar a doutrina de So Bento prescindindo
da TRADIO MONSTICA.
Melhor ainda estudar as manifestaes monsticas que
precederam o monaquismo cristo e o monaquismo beneditino.

II - MANIFESTAES MONSTICAS PR-CRISTS

Muito antes de nascer o monaquismo cristo floresceram certas


aspiraes religiosas e morais que se assemelham ao monaquismo
cristo. So, portanto, manifestaes monsticas que precederam o
monaquismo cristo:

$ HINDUSMO / BUDISMO
$ FILOSOFIA GREGA
$ MONAQUISMO JUDAICO

A) - HINDUSMO / BUDISMO

A ndia conhece estas manifestaes do monaquismo desde


tempos imemorveis, mas os monges hindus preferem andar de um
lugar para o outro mendigando o seu sustento, freqentando os
santurios. Praticam ascese e procuram libertar-se de tudo que os
afasta de Brahman, seu deus (Bramanismo).
Quando estes Amonges@ se congregam para viverem
comunitariamente seus mosteiros so pequenos, extremamente
pobres e subsistem da caridade de leigos piedosos.
No sculo V antes de Cristo aparecem Jainismo e Budismo, seitas
que rompem com o Bramanismo ortodoxo. Estes reagem contra o
ritualismo e especulaes. Para eles o que interessa a libertao
do homem atravs da prtica da ascese e meditao para se livrar
do sofrimento humano e a extino do desejo. Este estado de
tranqila iseno de todo desejo e temor no significa absorver-se
em Deus ou em deus mas no nirvana, isto , Ano nada@.
Principal expoente e fundador desta Adoutrina@: - BUDA pregou
ascetismo moderado -
Budismo
ou
- JINA pregou extremada
mortificao -
Jainismo.
Este com o fim de purificar a alma de tudo o que a mantm
ligada existncia, corporal.
A renncia o caminho monstico Adesta doutrina@. A Regra de
vida destes Amonges@ inclua:
$ meditao
$ orao
$ estudo
$ pobreza
$ ascetismo - em particular uma s refeio ao dia.
Na literatura antiga estes monges so descritos como autnticos
ascetas ou anacoretas que levavam uma vida casta, extremamente
frugal e dedicada por inteiro s Acoisas divinas@. Aos seus
seguidores so impostos uma espcie de noviciado onde so
submetidos a um severo exame moral antes de serem admitidos
em suas fileiras.

B) - FILOSOFIA GREGA
A Filosofia abrange: investigao, busca, cultivo e amor da
sabedoria. No implica somente em conhecimentos abstratos mas
em como traduzi-los na vida concreta. Os filsofos ensinam como
pensar e como viver, por isso no mundo greco-romano
desempenham o ofcio de diretores espirituais.
Alguns filsofos colocavam em relevo certos valores morais que
mais tarde representariam um papel importante no ideal monstico.
Pensavam em encontrar mediante um ascetismo constante, o fim
supremo de libertar-se das paixes para alcanar a perfeita
Aaptheia@ (impassibilidade) e Aantarquia@ (independncia e
autodomnio).
A Aformao@ destes filsofos requer muita solido e retiro.
Muita ascese e Aanacorese@ (viver sozinho). Os mestres desejavam
antes de tudo que seus discpulos alcanassem a contemplao
mstica. Neste sentido se pode falar de AComunidade Pitagrica@ -
Associao religiosa
- Escola de piedade - de moderao
- de obedincia
- de ordem e virtude
Baseava-se no conceito de Akoinonia@: amizade,
companheirismo, amor fraterno. Funcionava como uma espcie de
Asociedade secreta@. Partes essenciais da doutrina pitagrica eram
consideradas como arcanos reservados s aos iniciados. S era
possvel ingressar na comunidade depois de superar um rigoroso
exame de admisso. Uma primeira prova durava trs anos, a
segunda durava cinco anos. No princpio deste segundo noviciado o
candidato renunciava aos seus bens.
Ao longo destes anos de Aformao@:
deviam guardar rigoroso silncio
deviam praticar a obedincia a um mestre
deviam escutar os ensinamentos com grande devoo.
usavam uma roupa que os distinguia
observavam um horrio regular
comiam em comunidade regime extremamente vegetariano
rezavam antes e depois das refeies
enquanto comiam um dos mais jovens devia fazer a leitura
ao final das refeies escutavam os conselhos e instrues dos
ancios
Na AVida de Apolnio de Tiana@ se descreve o monge como
sendo algum completamente desapegado das coisas do mundo,
desprezador do vinho, da carne, das roupas suntuosas. Andava
descalo e deixava crescer a barba, conservava os olhos sempre
baixos tendo prometido castidade perptua. Para estes filsofos
nada tem valor neste mundo a no ser a virtude e a tranqilidade.

C) - MONAQUISMO JUDAICO
OS ESSNIOS
Graas a trs escritos do sculo I d.C., dois judeus e um romano,
ficamos sabendo que existiu antes do cristianismo, uma seita
judaica chamada dos Aessnios@, que teve sua origem no sc. II
a.C. e perdurou at 70 d. C..
$ Plnio, o jovem, escritor romano escreve:
ANa parte ocidental do Mar Morto, distanciados prudentemente
de suas guas malss, vivem os Essnios: povo singular e
admirvel entre todos os povos da terra; sem mulheres, sem amor,
e sem dinheiro. Renovam-se regularmente graas a grande
afluncia daqueles que se encontram entediados pela vida e pelos
revezes da fortuna... deste modo se perpetua atravs dos sculos
este povo, de onde ningum nasce@.

$ Flvio Josefo, escritor judeu, fala sobre o Anoviciado@ dos


essnios:
ASe algum deseja entrar em sua seita, no admitido
imediatamente, mas deve viver fora, pelo espao de um ano,
durante o qual se impe a ele o mesmo gnero de vida que eles
levam (...) Se d provas, durante este tempo de que poder guardar
a requerida continncia, -lhe permitido penetrar um pouco na vida
da comunidade (seita) at participar nos banhos de purificao,
todavia no era permitido ainda conviver com eles. Depois desta
demonstrao de fortaleza, seu temperamento submetido prova
durante mais dois anos. Somente aps este tempo era admitido na
Asociedade@. Mas antes de participar da mesa comum deveria
prestar juramentos entusiastas@.

$ Filon de Alexandria, tambm judeu, escreve sobre a vida


comunitria dos essnios:
ANo tm casa prpria, mas sua casa comum a todos porque,
alm de viver em comunidade, suas casas esto sempre abertas
aos irmos que vm de fora. Tm caixa comum e despensa comum.
Comum so tambm as roupas e os alimentos, pois h entre eles a
prtica da alimentao em comum. Onde encontrar uma
experincia mais perfeita de vida comunitria sob o mesmo teto,
usando as mesmas roupas e participando da mesma mesa? Todos
os salrios que recebem por seu trabalho dirio no os guardam
para si mas depositam em comum, pondo-os disposio daqueles
que querem se servir deles.
Quanto aos enfermos, no ficam abandonados sob o pretexto de
que no produzem (...). Os ancios so respeitados e cuida-se deles
como a pais queridos (...) socorrem-nos com as obras de suas mos
e os rodeiam de atenes@.

As informaes destes trs historiadores foram Acomprovadas@


por escavaes levadas a efeito numa regio de Israel, chamada
QUMRN onde desde 1951 foram desenterradas as runas do que
chamado cada vez com mais freqncia um Mosteiro Essnio.
As escavaes revelaram que o Mosteiro de Qumrm constava de
um conjunto de edifcios destinados a alojar a vida de uma
comunidade: salas de reunio, uma Abiblioteca@, uma cozinha, um
forno, cisternas e Apias@ de ablues rituais, banheiros etc. Foram
encontrados tambm nestas escavaes vrios rolos da Escritura
(mais ou menos 600) e tambm vrios manuscritos prprios da
seita. Como por exemplo:

$ a Regra da Comunidade
$ a Regra da guerra dos filhos da luz contra os filhos das trevas
$ a Regra da Congregao

Um trecho da Regra da Comunidade diz:


A... Nestes preceitos caminharo em todas as suas residncias,
aqueles que se encontram juntos. Obedecero ao superior, no que
concerne ao trabalho e aos bens. Comero em comum, oraro em
comum e deliberaro em comum.
Em todo lugar onde houver dez pessoas do Conselho da
Comunidade no faltar entre eles um homem que seja sacerdote.
Cada um, segundo o seu lugar, se sentar diante dele e por esta
mesma ordem se lhe pedir seu parecer em todos os assuntos.
(...) Onde houver dez, no dever faltar um que se dedique
constantemente ao estudo da Lei, dia e noite, para melhorar o
comportamente mtuo. A multido far viglia em comum um tero
da noite todos os dias do ano, a fim de ler o Livro, estudar e orar
em comum@.

Segundo estas e outras descries da vida comum no Mosteiro de


Qumrn podemos estabelecer a seguinte sntese:

Ingressa-se na comunidade depois de um postulado de durao


indeterminada e dois anos de noviciado.
Ao princpio dos dois anos o candidato tinha que renunciar aos
seus bens.
Ao fim destes dois anos, o candidato era admitido pela
comunidade.
Pronunciava uma frmula de confisso de seus pecados e
emitia um juramento solene em presena de toda a
assemblia.
Depois se integrava em um grupo de dez membros, presididos
por um sacerdote, em que estava estruturado o mosteiro.
O horrio que rege a jornada bastante simples: pouco antes
de sair o sol, se rene toda a comunidade para a Orao da
Manh.
Em seguida inicia-se o trabalho na oficina de cermica, na
biblioteca, na horta, na padaria.
s onze horas banho de purificao ritual e refeio.
tarde trabalham at a hora da Ceia, seguida de orao
vespertina.
Dedicam um tero da noite a ler o Livro, examinar os casos
acontecidos e bendizer a Deus comunitariamente.
Sobram-lhes ainda umas sete horas para descansar.
Os essnios se consideravam os Averdadeiros piedosos@. Eles
so o resto, o verdadeiro Povo de Israel, o Israel dos fins dos
tempos. Pela prtica das virtudes morais, pela sua vida em
comum,pela orao e meditao e tambm pela meticulosa
observncia da Lei e a estrita disciplina de sua ordem, eles se
empenham para ser uma comunidade autenticamente sacerdotal.

OS MONGES DO ANTIGO TESTAMENTO

Autores monsticos da Antiguidade viam seus antecessores nos


grandes personagens do AT: Elias, Eliseu, Joo Batista e outras
grandes figuras do AT como Abrao, Isaac, Jac, Moiss, os Profetas.
Elias, sobretudo se tornou o prottipo do monge no AT (cf. 1Rs 17
e 1Rs 19)
Dele se diz: AElias, o >homem de Deus=, profeta rodeado de uma
aurola de mistrio, que se afasta do mundo e se recolhe no
deserto, casto, austero, homem de orao e contemplao, que fala
e discute com Deus, se converte em prottipo do monge na perfeita
realizao do ideal monstico@.
So Gregrio de Nissa (Padre da Igreja) diz:
AElias que viveu longo tempo nas montanhas de Galaad, foi o
iniciador da vida monstica. E todos os que ordenam sua vida
conforme o exemplo do Profeta so o ornato da Igreja@.

Do mesmo modo, So Joo Batista, considerado o novo Elias,


mostrado por S. Jernimo como prottipo de monge. Dele diz:
AConsiderai, monges, vossa dignidade! Joo o prncipe de
vossa instituio. Ele monge! Apenas nascido, vive no deserto, se
educa no deserto. Espera o Cristo na solido. Cristo ignorado no
Templo e anunciado no deserto. Ditosos (os monges) que imitam a
Joo, o maior dos nascidos de mulher@.
Outros autores monsticos da Antiguidade fazem remontar ainda
sua Arvore genealgica@ s origens do gnero humano. Assim,
por exemplo, S. Joo Crisstomo comparava os monges solitrios da
Sria a Ado quando Aantes de sua desobedincia estava revestido
de glria e conversava familiarmente com Deus@.
Livre de toda preocupao profana, com o pleno domnio sobre si
mesmo, na ntima amizade com Deus, Ado se converte em ideal e
prottipo do monge.
Mencionemos, por fim, toda a tribo de Levi (Nm 3). Os levitas
eram encarregados dos deveres de toda a comunidade na Tenda da
Reunio.
$ cuidavam de todos os utenslios sagrados
$ serviam aos sacerdotes
$ eram Adoados@ ao servio do santurio
A Bblia de Jerusalm coloca uma nota ao texto de Nm 3,6-9:
AOs levitas pertencem a Jav como os primognitos aos quais
substituem (Ex 13,11). O seu estatuto exprime, numa primeira
forma o ideal de consagrao que desabrochar no cristianismo
pelo sacerdcio e instituio monstica@.

III - OS VERDADEIROS PRECURSORES DO MONAQUISMO CRISTO


A) - JESUS
As verdadeiras razes do monaquismo cristo esto no Evangelho.
No Evangelho os monges liam a Palavra de Jesus sobre ele prprio
(Lc 9,23; Mt 16,24).
Os primeiros monges viam em Jesus seu Mestre e Modelo
acabado: Lc 14,26.33; Mt 19,16-22; Mt 19,12.
A vida monstica no outra coisa seno:
$ realizao dos Conselhos evanglicos
$ imitao de Jesus
$ seguimento de Jesus
Que significa seguir Jesus segundo o Evangelho?
Seguir Jesus despojar-se: Mt 8,19-20 / Lc 9,57-62
Seguir Jesus exige resoluo firme no perder tempo: Mt 8,21-
22 / Lc 9,59-62
Seguir Jesus deixar tudo imediatamente:
Mt 9,9 chamado de Mateus
Lc 5,27 chamado de Levi/Mateus
Mc 2,13-17 chamado de Levi
Mt 4,18-22; Mc 1,16-20 chamado de
Pedro
Lc 5,11 chamado de Andr, Tiago e Joo
Seguir Jesus tomar a cruz: Mt 16,24-28; Mc 8,34-38; Lc 9,23-
27 Se algum
quer vir aps mim tome a sua cruz,
renuncie a si mesmo e siga-me.

Todos estes textos mostram que o seguimento de Jesus exige


rupturas radicais. Exige ruptura com o crculo familiar,
despojamento efetivo dos bens (deve adotar o gnero de vida
marcado pela insegurana), ruptura com a profisso (no se
prender por realizaes pessoais e econmicas). Mas, ruptura
maior, despojamento maior, renncia maior a da prpria vida.
Aquele que segue a Jesus deve renunciar at mesmo prpria vida.
A vida de Jesus foi um exemplo vivo de todas estas renncias e
rupturas at a CRUZ. Jesus rompeu com a famlia, abandonou a
profisso, despojou-se de todas as riquezas.
O seguimento de Jesus inaugura um processo em nossa vida.
Comeamos por acertar nossos passos com o d=Ele. Depois a
convivncia com o Evangelho nos faz descobrir as opes de Jesus.
Estas opes se transformam em roteiro de nossa caminhada. Todo
esse processo procede de uma raiz que mergulha nas profundezas
do nosso prprio ser: A F NA PESSOA DE JESUS!
Assim, a pessoa de Jesus, envolve, domina totalmente aqueles
que O seguem e querem viver como Ele viveu!
JESUS

$ viveu castamente ou virginalmente $ viveu


pobremente
$ rezou na solido $ jejuou nos
desertos
$ lutou contra o demnio $ realizou sem
cessar a
vontade do Pai
$ praticou o desprendimento absoluto: da famlia
da profisso
dos bens
Os monges e as monjas querem seguir o exemplo do Senhor. Sem
Cristo o monaquismo no tem sentido. Sem forte experincia de
Deus no se deve aventurar a seguir Jesus.

B) - OS MRTIRES

Nos primeiros dias da Igreja primitiva aps Pentecostes, todos se


empenhavam no seguimento de Cristo. O exemplo e a mensagem
de Cristo foram vividos pelos cristos dos trs primeiros sculos,
antes de existir o monaquismo.
O primeiro ideal de perfeio crist o martrio que se seguiu
logo aps a morte de Cristo. O segundo ideal a virgindade e o
ascetismo.
O mrtir o discpulo perfeito de Cristo; imita o Senhor at a sua
morte cruenta, derramando o prprio sangue. medida em que o
martrio vai desaparecendo vai se espiritualizando tornando-se
martrio incruento que vai ser a vida monstica e vida asctica. A
idia do martrio aparece muito na vida monstica. Ser mrtir ser
considerado algum de prestgio espiritual - uma graa de escolha -
vitria sobre as foras do mal como foi vitria a morte de Cristo na
cruz.
A Igreja venerava seus restos mortais: so as chamadas relquias.
A partir do sculo II eles so sepultados em lugar de honra nas
Catacumbas onde a lei garantia a inviolabilidade e escrevem-se as
Atas que contam o martrio deles.
Como morriam? Os cidados romanos eram decapitados, os
demais eram crucificados, outros eram queimados vivos como por
exemplo, Policarpo de Esmirna, outros ainda eram expostos s feras
nos jogos de circo.
Faziam parte do processo os interrogatrios e as torturas. A partir
do sc. III existiam torturas atrozes: a flagelao, unhas de ferro,
aplicao do ferro em brasas etc.
O testemunho dos cristos diante da morte admirvel. Viviam
literalmente Mt 10,19: ANo vos inquieteis com o que dizer...@.
So mrtires (entre outros destes trs primeiros sculos): S.
Policarpo, Incio de Antioquia, Felicidade e Perptua, Blandina etc.
So corajosas TESTEMUNHAS DE JESUS.
Em meados do sculo III haver um enfraquecimento no fervor do
martrio com o afluxo de novos convertidos menos preparados para
a lista. Muitos compram a preo de ouro atestados falsos de
sacrifcios aos dolos e ao Imperador. Outros recuam e voltam atrs
na hora do martrio. Para sustentar os fiis nasce uma literatura de
exortao ao martrio cujos melhores representantes so: S.
Cipriano de Cartago e Orgenes. Temos em nossa biblioteca duas
Cartas de Cipriano sobre o martrio; delas extramos alguns textos.

CIPRIANO
Cipriano exalta o martrio pela fora e pela f com que refora a
Igreja.
AAlegre exulto e dou graas, irmos fortssimos, sabendo a vossa
f e fora pelas quais ilustrada a Igreja me. Ela foi ainda
ultimamente glorificada quando ao prestardes a confisso
recebestes a sentena que vos fez exilados, confessores de
Cristo@.
AA confisso tanto maior e mais brilhante pela honra, quanto
mais violenta pelo sofrimento. CRESCENDO A LUTA, CRESCE A
GLRIA DOS QUE LUTAM@.

Cipriano exorta os fiis a afrontarem os tormentos para darem


exemplo de fora e fidelidade aos que ainda lutam:
AAlguns, sei, j estarem coroados, outros j prximos da coroa da
vitria; todos, porm, levados ao crcere, qual glorioso exrcito,
esto animados e igualmente ardorosos pela coragem de travar
combate assim como convm ao soldado de Cristo nos
acampamentos divinos, a fim de que nem as sedues desfaam a
firmeza incorrupta de sua f, nem temam eles as ameaas ou sejam
vencidos pelos suplcios e tormentos; porque quem est em ns
maior do que quem est no mundo e porque as penas terrenas so
menos poderosas para fazer cair do que a proteo divina o para
manter em p. Isto foi provado no combate glorioso dos irmos que,
precedendo os outros na vitria sobre os tormentos, deram exemplo
de fora e fidelidade combatendo at que o exrcito inimigo
tombasse vencido@.

Cipriano coloca o exemplo de Paulo como incentivo para a luta e


o martrio:
AEis a luta que travamos por nossa f a qual vencemos e fomos
coroados. Eis a luta que nos mostra o bem-aventurado Paulo na
qual devemos correr para chegar coroa da glria: Ignorais, diz,
que os que correm no estdio, em verdade todos correm. Um s,
porm, recebe a palma. Correi para consegui-la. Eles buscam uma
coroa perecvel, ns, no entanto, uma incorruptvel (1 Cor 9,24-
25)@.
ADe novo, mostrando seu combate e pronunciando que em breve
vai ser oferecido ao Senhor em sacrifcio, fala: J fui imolado, o
momento de minha morte se aproxima. Combati o bom combate,
guardei a f. Resta-me receber a coroa da justia que o Senhor me
conceder naquele dia... (2 Tm 4,6-8)@.

Cipriano exorta os fiis a reparar a falta dos que foram infiis e a


runa daqueles que se entregaram covardemente.
... APara que, com vosso jbilo enxugueis as lgrimas da Igreja
chorando a runa e a perda de muitos e, pela fora de persuaso de
vosso exemplo, consolideis a firmeza dos demais que esto em p.
Se fordes chamados linha de frente, se vier o dia de vossa luta,
combatei varonilmente, pelejai com constncia, cientes de que
lutais sob os olhos do Senhor presente e que haveis de chegar
sua glria pela confisso de seu Nome. Ele no somente assiste a
seus servos mas ainda luta em vs...@

ORGENES

Para Orgenes o mrtir a testemunha por excelncia da Igreja.


Ele diz:
ATodo aquele que d testemunho da verdade, seja em palavras
como em obras, declarando-se-lhe favorvel de algum modo, estes
devem ser chamados com todo o direito de TESTEMUNHAS.
Mas na comunidade dos irmos, tocados pela fora de nimo
daqueles que lutaram pela Verdade e a Virtude at a morte, surgiu
o costume de chamar de MRTIRES em sentido verdadeiro e prprio
somente aqueles que deram testemunho do mistrio da religio
com a efuso do sangue.

C) - OS ASCETAS E AS VIRGENS DA IGREJA PRIMITIVA


A VIRGINDADE como predecessora do monaquismo:
Quando as perseguies foram se tornando mais raras formou-se
a idia de que a vida crist vivida com generosidade e abnegao
uma confisso de f - um martrio incruento!
Aos cristos que levavam uma vida mais perfeita e sacrificada,
mais desprendida das coisas do mundo e mais dedicada imitao
do Senhor foram dados vrios nomes. Os mais correntes foram:
$ Virgens - para as mulheres
$ Ascetas - para os homens
(ambos viviam o celibato)

AS VIRGENS:
As virgens afastavam-se da vida comum, dedicando-se
exclusivamente ao servio de Deus. Os documentos a respeito das
virgens so abundantes a partir do sculo III e so mais numerosos
que os relativos aos ascetas.
Quase todos os Padres da Igreja deixaram tratados sobre as
Virgens consagradas a Deus. Durante os trs primeiros sculos da
Igreja as Virgens de Cristo viveram em seus prprios lares, no
tinham hbito ou distintivo especial, usavam um vu com que
cobriam a cabea, tomavam parte na vida social, assistiam
casamentos e freqentavam festas. No havia indcios de vida
comunitria.
A virgindade era considerada profisso estvel e definitiva, com
conhecimento da comunidade e aprovao do bispo. J existia de
algum modo o voto de virgindade, embora no conheamos a
formulao precisa.
A partir do sculo IV aparece notvel mudana:
$ As virgens crists so cada vez mais numerosas
$ Abraam seu estado em uma cerimnia litrgica.
$ Ocupam um lugar de honra nos ofcios litrgicos
$ Vo exercendo ministrio de diaconisas
Os Padres da Igreja louvam as virgens:
- ASo a parte mais ilustre do rebanho de Cristo@
- So como Avasos consagrados@
- So santurios escolhidos pelo prprio Deus
- So estrelas radiantes do Senhor
Era exigido da virgem: - prtica de uma ascese vigilante
-o cultivo de todas as virtudes
-uma vida inteiramente santa
Os Padres recomendavam que elas evitassem: as reunies
mundanas, as festas ruidosas, as familiaridades perigosas.
E pediam: que se vestissem modestamente, se comportassem
com simplicidade e humildade, praticassem freqentes jejuns, no
descuidassem as viglias noturnas.
A Escritura deve ocupar na sua vida um lugar verdadeiramente
nico, devem l-la, escut-la, aprend-la de memria. Devem
assimilar os seus ensinamentos.
Os Padres da Igreja identificavam a virgindade plenamente vivida
por amor a Cristo com a perfeio de todas as virtudes.
A virgem deveria tambm praticar:
- obras de misericrdia corporal assistiam os rfos, as vivas,
os pobres, os
enfermos.
- e tambm obras de misericrdia espiritual aconselhavam,
exortavam os que
necessitavam
espiritualmente.
Mais tarde os bispos comearam a fomentar o agrupamento das
virgens para se protegerem mutuamente contra os perigos do
mundo. Comearam a existir ento os mosteiros femininos que
viviam sob a tutela do bispo.

OS ASCETAS:
Sobre os ascetas as informaes so mais reduzidas:
$ Existiram desde os princpios do cristianismo. Praticavam
pobreza herica e o celibato.
$ Formavam grupos em torno de um Mestre, como por exemplo
os grupos de Orgenes, de Jernimo, de Rufino etc.
$ Seu ideal e modo de vida se parecia com o das virgens.
$ No trajavam veste especial, viviam no mundo
$ Davam esmolas aos pobres, tomavam parte nos ofcios
litrgicos
Assim tais grupos ascetas / virgens - aps uma
evoluo homognea - deram origem a este poderoso
movimento de manifestaes to diversas que
chamamos de MONAQUISMO.

IV - TRANSIO DO CARISMA DO ASCETISMO KOINONIA


Sc. III / IV

O desabrochar do monaquismo nas regies da Palestina, Sria,


Egito, sia Menor e Capadcia:

O sculo III v a transio do carisma do ascetismo do sculo II


koinonia. A vida em comunidade se firma. Representa uma forma
estvel de viver (momento de maturao).
Isto aconteceu pelo grande nmero de ascetas que seguiam o
Senhor no celibato e na pobreza com o mesmo entusiasmo dos
mrtires. Os ascetas se reuniam para a orao, para a leitura da
Escritura, para o trabalho. Esta aproximao se fazia en torno de
um ancio tambm chamado Pai, Abba (nome carismtico e
espiritual). Encontramos seus ensinamentos nos Apotegmas.

A vida cenobtica definida como a daqueles que vivem em


comum sob uma s disciplina dos APais@.
Neste sculo, no ano 251, nasce Anto que ser apresentado s
geraes futuras como Pai que atrai discpulos; como norma do
asceta cristo.
Em 356 Sto. Atansio escreve a vida de Sto. Anto como
Areviso@ do ascetismo cristo a caminho do cenobitismo e do
monaquismo. Esta presena de Sto. Atansio ser decisiva quanto
orientao escriturstica e evanglica do monaquismo.

ANTO homem de Deus carismtico e profeta que reconhece


a autoridade de Atansio e a ele se liga como garantia de
ortodoxia.

ATANSIO defende e propaga o monaquismo nascente. Firma-o


definitivamente como movimento de Igreja. O fato histrico
torna-se fato teolgico.

O sculo IV representou para a Igreja momento de slida


formulao teolgica. Enfrentou grandes questes sobre a
TRINDADE, CRISTO, graas ao vigor do pensamento que provinha
de uma f esclarecida e de Santos que lhe foram dados em
abundncia. O que foi este sculo IV para a Teologia da Igreja em
importncia, foi igualmente para o monaquismo.
Os Padres como Telogos formularam este ponto de partida do
monaquismo cristo: Procura de Deus que passa pelo Cristo que
chama e que se realiza na Igreja.
Os mesmos Padres que firmaram as bases da teologia firmaram
ao mesmo tempo as do monaquismo que passou a contar com uma
formulao de grande envergadura do ponto de vista escriturstico
e espiritual.

V - O SURGIMENTO DAS REGRAS MONSTICAS E SEU


ENRAIZAMENTO NA TRADIO - Sc. IV

A formulao da Teologia e das bases teolgicas e eclesiolgicas


do monaquismo preparou o surgimento das primeiras REGRAS
MONSTICAS.
As Regras monsticas nasceram da tradio oral, enraizadas na
Escritura e no ensinamento dos Padres. Os grandes Pais do
monaquismo desta poca so:

$ PACMIO
$ BASLIO no ORIENTE

$ AGOSTINHO} no OCIDENTE

Estes no imaginavam que seus escritos seriam considerados


como primeiras Regras Monsticas.
O que eram estas Regras?
- a colocao por escrito da tradio vivida nos cenbios
- normas concretas de vida
- respostas a questes propostas pelos monges
Pacmio, Baslio e Agostinho no consideravam sua legislao
como uma Regra, para eles este termo s convm plenamente a
Escritura. Julgavam seus escritos como compilao dos preceitos da
Escritura e comentrios sobre eles.

V.1 - PACMIO - (292-346)


Fundador da koinonia, reuniu discpulos e props viver com eles
em comunidade. Tornou-se para eles Pai, venerado pelos seus
milhares de monges. Pacmio nasceu no alto Egito - onde no se
fala o grego mas o copta - em 292, seus pais eram pagos. Seu
primeiro contato com o cristianismo foi em 312 atravs da caridade
dos cristos que o socorreram quando foi prisioneiro. A partir da,
ainda no exrcito quis colocar-se a servio de Deus e dos irmos.
Logo que se viu liberado do exrcito instalou-se numa pequena
aldeia onde encontrou uma comunidade crist, foi batizado e se
colocou a servio da comunidade. Pacmio era um Ahomem bom@
por isso todos o procuravam e se reuniam a ele. Depois de alguns
anos encontrou Palamom, ancio que levava vida asctica com
quem aprendeu prticas de ascese: jejum, viglias, orao
incessante, trabalho, esmola etc.
Pacmio fez experincia dolorosa com discpulos que s queriam
explor-lo, no seguiam suas normas sobre orao, trabalho,
refeies. Pacmio os expulsou e decidiu formar comunidade em
que cada um estaria a servio dos outros (serviu-lhe de lio). O
ideal de servio est na origem das fraternidades pacomianas.
Pacmio torna-se Ao homem de Deus@ que revelou a todos a vida
monstica - o verdadeiro servio de Deus!
Pacmio escreveu para seus discpulos suas admirveis
Catequeses Bblicas que exprimem seu grande conhecimento e
amor s Escrituras. Ao lado das Catequeses elaborou um
Regulamento do dia monstico que consta de quatro colees:
$ 1. PRCPTA = Pr (144 artigos)
$ 2. PRCPTA et INSTITUTA = Inst. (18 artigos)
$ 3. PRCPTA atque JUDICIA = Iud. (16 artigos)
$ 4. PRCPTA ac LEGES = Leg. (15 artigos)
Estas colees vieram a chamar-se REGRA DE PACMIO; a mais
antiga das Regras Monsticas.
Objetivo da Regra:

Pr 1-8, provavelmente so de Orsisio. Outras sees


desenvolveram-se simultaneamente, pois cada uma delas tem um
fim particular.
Prcpta - Provavelmente no incio era o livro do chefe do
mosteiro.

Prcpta et Instituta - Dirigida ao chefe da casa, quando a sua


casa est de servio para todo o mosteiro (por Acasa@ do mosteiro
pacomiano podemos compreender simplesmente as casas do
povoado onde se agrupam os diversos corpos de ofcios.

Prcpta atque Judicia - Um penitencial que adapta as sanes s


faltas

Prcpta ac Leges - Dirigida ao chefe da casa, ordenava o ofcio


vespertino de seis oraes a cada casa.

possvel isolar na Prcpta (Pr) alguns grupos normativos que


nos do uma idia do que seria esse Adiretrio@ do chefe do
mosteiro.

Pr 1-11; 16-19, 141ss: disciplina da sinaxe (reunies comunitrias)


Pr 12-15; 23-27: servio semanal
Pr 19-25: conferncias, leituras
Pr 29-39; 44; 71-77; 80: disciplina alimentar
Pr 40-47; 105; 129: doentes
Pr 49-53: recepo dos postulantes e dos hspedes
Pr 54-57; 118s: viagens
Pr 58-65; 116s: trabalho
Pr 66-70; 98-106: material
Pr 71-83; 106: desapropriao
Pr 84-86; 89-91; 108; 111: restrio de movimentao no
mosteiro
Pr 92-98; 106; 112: pudor, reserva e discrio nas relaes
mtuas
Pr 127-129: obsquios
Pr 122-123; 138-140: memorizao
Pr 133-137: reprimendas e penitncias
Pr 143: virgens
Pacmio tambm fundou um mosteiro para monjas, perto de
Tabennese para sua irm que foi verdadeira me espiritual na vida
monstica
O mosteiro de Maria dispunha de oratrio; as irms eram
tonsuradas e usavam capuz; aos domingos um padre e um dicono
iam l para a celebrao eucarstica. No incio do sculo II eram
cerca de quatrocentas irms, conforme nos informa Paldio.
Um ancio sbio e discreto era designado como pai deste
mosteiro feminino, sua funo era falar s monjas freqentemente
das Escrituras, preparava-lhes o necessrio pa ra o trabalho manual
e agia com energia na correo e no restabelecimento da disciplina.
Como Pacmio providenciou que as irms recebessem uma cpia
da Regra dos irmos, nos mosteiros femininos da koinonia seguia-se
mutatis mutandis, as mesmas leis e costumes que nos masculinos.
V.2 - BASLIO - (330-379)
Baslio nasce na Capadcia, de famlia crist de elevado nvel
social. Fez estudos superiores brilhantes em Cesaria,
Constantinopla e Atenas. Estudou com Gregrio de Nazianzo. Com
28 anos terminaram os estudos e se converteram vida asctica.
Sua famlia era muito crist. Baslio se fez batizar por influncia de
sua irm Macrina.
Famlia de Santos: sua me Emlia era filha de uma santa Macrina,
e de pai mrtir e, irm de um bispo; mais tarde retirou-se para a
solido e vida monstica com a filha Macrina (as duas so santas).
Seus irmos, Gregrio de Nissa e Pedro de Sebaste se tornaram
bispos e santos. O pai de Baslio tambm santo.
Baslio viajou para a Palestina, Egito, Sria e Mesopotmia antes
de abraar a vida monstica, para conhecer os ascetas mais
famosos. Voltando de sua viagem monstica entregou-se vida
asctica. Renunciou s riquezas, honras, posio social, vendeu
seus bens e retirou-se para a solido com seus companheiros. A
vida de Baslio era ento de solido, orao / reflexo / estudo e
trabalho no campo.
Seu amigo, Gregrio de Nazianzo foi morar com ele, mas no
ficou muito tempo. Baslio tambm mais tarde deixa a comunidade
e vai trabalhar com Eusbio que fora eleito bispo. Eusbio ordena
Baslio e o faz seu conselheiro. Depois houve um desentendimento
entre eles e Baslio volta para o Ponto. Parece ter feito nesta poca
uma primeira redao das suas famosas Regras.
Baslio ficou pouco tempo no Ponto e volta a Cesaria. Passa a
dirigir a vasta metrpole eclesistica em nome do velho Eusbio.
Protege e ajuda os pobres, vela pelas virgens consagradas, regula e
propaga o monaquismo, regulamenta a liturgia. Morre Eusbio e
Baslio eleito bispo para suced-lo, mas no abandona as
comunidades monsticas.

Concepo do monaquismo segundo Baslio


Sua atitude forte contra o eremitismo. O eremita no pode
exercer virtudes importantes como a humildade, misericrdia,
pacincia, caridade. O cenobita mais livre de preocupaes
materiais, tem mil ocasies de praticar a caridade fraterna, mais
dificilmente cair e mais facilmente se erguer porque tem o
exemplo e o estmulo dos irmos (direo e correo fraterna do
superior). S o cenobita pode cumprir todos os mandamentos de
Deus atravs no s de sua orao pessoal mas da ao da
comunidade a que pertence. Tem oportunidade de exercer todas as
virtudes crists: humildade, misericrdia, pacincia, amor fraterno e
obedincia.
S. Baslio no queria grandes mosteiros (com dez ou vinte
monges no mximo). Quer que frente do mosteiro haja um chefe,
no quer que se chame a este de Abade; existe a obedincia a ele,
mas para Baslio obedincia realizar a vontade de Deus.
O horrio do mosteiro deve ser dividido entre: orao, trabalho,
leitura e estudo. Baslio exige que o postulante saiba bem o que
est fazendo. No seja aceito como monge sem uma espcie de
noviciado; tenha prtica das virtudes evanglicas. Provavelmente
foi o primeiro a exigir um VOTO - compromisso livre de renncia ao
casamento. Quer que este voto seja pronunciado diante do bispo.

Escritos de Baslio
Como pai espiritual escreve entre outras obras:
$ Regras Morais - (textos do N.T. que dizem respeito vida crist).
No se restringe
aos
monges
$ Regras Monsticas - Tambm chamadas Asceticon, que
compreendem
Regras mais extensas e
Regras menos extensas

So respostas s perguntas que lhe so dirigidas sobre a


interpretao da Escritura, quando visitava as fraternidades.
Graas a estes e outros escritos espirituais com os quais
restaurou a vida monstica conferindo-lhe harmonia, equilbrio e
certa disciplina, Baslio ser chamado Pai (Patriarca) dos monges do
Oriente.

V.3 - AGOSTINHO (354-430)

Grande acontecimento do sculo IV no Ocidente a converso de


Sto. Agostinho. As Confisses (escritas aps dez anos de sua
converso) so um grande espelho da alma inquieta e perturbada
de Agostinho. Revelam uma vontade intensa de encontrar a
verdade definitiva, absoluta, que satisfaa sua imensa sede de
saber, de crer, de ser perdoado. (...) O prprio Agostinho, nas
Retractationes II,6, referindo-se a esta obra revela: AOs treze livros
das minhas Confisses louvam o Deus justo e bom por meus males
e bens, e elevam at ele a mente e o corao dos homens; senti
esse efeito enquanto as escrevia, e torno a senti-lo cada vez que as
leio@.
(...) Nascido en Tagaste, aos 13 de novembro de 354, Aurlio
Agostinho filho de Patrcio, africano romanizado, pequeno
proprietrio, pago que s se batizar na hora da morte, e de
Mnica, crist perseverante. Tinha um irmo, Navlio, e uma irm,
Perptua. Na adolescncia estudou em Tagaste e Madaura,
seguindo curso tradicional da educao liberal antiga: clssicos
latinos, retrica, lgica, geometria, msica e matemtica. Deixa
Tagaste pelos fins de 370 e se fixa em Cartago. De um
relacionamento que durou quinze anos lhe nasceu um filho
Adeodato que no ultrapassou os dezesseis anos. Em 373 adere
seita dos maniqueus. Em 383 embarca para Roma. Decepcionando-
se cada vez mais com os maniqueus e suas doutrinas, comeou a
seguir as pregaes do bispo Ambrsio e as orientaes espirituais
do presbtero Simpliciano. Descobre o sentido espiritual que se
ocultava sob o sentido literal das Escrituras.
(...) Em 386 concretiza-se sua converso aos 32 anos. Na viglia
pascal de 387, recebe o batismo das mos do bispo Ambrsio,
juntamente com Alpio e o filho Adeodato. Resolve voltar para sua
terra, a frica. No trajeto, em stia, morre-lhe a me, Mnica. Por
trs anos vive com alguns amigos como cenobita em Tagaste. Em
391, ordenado sacerdote por presso popular e no renuncia ao
projeto de vida monstica, fundando um mosteiro de monges leigos
no jardim da igreja. O bispo Valrio lhe deu um terreno. Em 396,
eleito bispo para a diocese de Hipona j no pode mais viver em
comunidade com os monges; instala-se na casa episcopal. Quando
partiu da comunidade escreve APraeceptm@ para lembrar aos
irmos do mosteiro de leigos os deveres principais e as Regras que
viviam, quando Agostinho era o superior. Sua atividade pastoral e
de escritor torna-se cada vez mais intensa. AA fecundidade literria
de Agostinho e a energia que nela se manifesta, s se comparam s
numerosas obras de Orgenes. Agostinho conta-nos (Retract. 2,76)
ter composto, at 427, nada menos de 93 escritos, distribudos em
232 livros, sem contar os numerosos sermes e as no menos
numerosas cartas, por vezes, bem extensas. Apenas dez das obras
citadas se perderam@.
Testemunha do fim de uma era, de uma civilizao, de uma
cultura, Agostinho viveu intensamente os grandes e decisivos
momentos da histria do Ocidente. Viu o cristianismo tornar-se a
religio oficial do Imprio, por obra de Teodsio I, em 380. Em 410,
viveu a dor do naufrgio da cidade de Roma nas mos de Alarico.
Participou nos grandes debates doutrinais com os donatistas, os
maniqueus e os pelagianos. Jamais se cansou de defender sua f e
suas convices. Aos 28 de agosto de 430, com Hipona assediada
h trs meses por Genserico e seus vndalos, morre aos setenta e
seis anos, aquele que considerado um dos maiores e mais
influentes Padres da Igreja. AAgostinho o mais exmio filsofo
dentre os Padres da Igreja, e, presumivelmente, o mais insigne
telogo de toda a Igreja. (...) exerceu profunda influncia na vida da
Igreja ocidental (...) no s na filosofia, dogmtica, teologia moral e
mstica, mas ainda na vida social e caritativa, na poltica
eclesistica, no direito pblico e na formao da cultura medieval@.
1

Escritos de Agostinho

Entre seus numerosos escritos citamos:


$ As Confisses e as Retrataes - (escritos autobiogrficos)
$ A Cidade de Deus - (espcie de teologia da histria)
$ O Tratado ADa Trindade@
$ Comentrios sobre os Salmos

Itinerrio monstico de Santo Agostinho

Contemporneo de Cassiano, Agostinho de Hipona (359-430)


ocupa um posto de honra na histria do monaquismo cristo.
certo que o seu nome no figura entre os tericos da vida
monstica, pois no escreveu nenhuma obra comparvel s
Instituies e Colaes de Cassiano, nem ao Asceticon, de So
Baslio. Sua pruduo neste campo escassa, ocasional. Reduzem-

11. Altaner, B. - Stuiber, A., Patrologia, 20 ed., S.Paulo: Paulus, 1988.


se sua REGRA, - to breve quanto admirvel - e aos Tratados
sobre o Trabalho dos Monges e a Santa Virgindade. No entanto
Baslio Steidle pode escrever sem hiprbole que o monaquismo
ocidental no teria sido o que foi sem o vivificanteimpulso de santo
Agostinho. Outro autor Y. R. Lorenz diz que: ACom a Regula
Augustini, o monaquismo do ocidente tomou o caminho que conduz
a BENTO.

Casiciaco, Tagaste e Hipona: trs etapas do itinerrio monstico


de Agostinho.
Em Milo onde era titular da ctedra de retrica, nos anos 386-
387, Agostinho ainda no era batizado, ouve com seu amigo Alpio
as pregaes de Ponticiano sobre Anto e os Padres monsticos.
Encanta-se com o modo de vida deles e decide, com alguns amigos,
seu filho Adeodato e sua me Mnica, instalar-se em uma regio,
Casiciaco, perdo de Milo com o fim a que se propusera: Abuscar
juntos e em concrdia a Deus e a nossas almas@. Mas Casiciaco
no era mum mosteiro. Predominava entre eles idias filosficas
possivelmente inspiradas em modelos pitagricos e platnicos de
vida comunitria. Alm disso s Mnica, Agostinho, Alpio e
Adeodato eram cristos e o eram ainda como catecmenos. Foi,
porm, um Aensaio@de vida monstica: mesa frugal, estudo,
orao trabalho, reflexes, canto dos salmos e amveis colquios
entre amigos. A Aexperincia@durou uns seis meses e em
princpios de maro de 387 o Agrupo@se dissolvia.
Em Tagaste, em 388, com Adeodato, Alpio. Evdio e alguns
outros amigos. Agostinho funda um mosteiro que ele estrutura com
elementos tirados da vida monstica que ele vira organizada em
Roma e em Milo. Seu bigrafo diz simplesmente: AAgostinho vivia
em companhia dos que se lhe ajuntavam, com jejuns, oraes e
boas obras, meditando a Lei de Deus, dia e noite@.
Podemos, contudo afirmar que ATagaste considerado ao menos
como o primeiro passo para a realizao do ideal monstico
agostiniano, embora ainda, no plenamente estruturado@. Mas, o
mais peculiar e caracteristicamente essencial de seu pensamento
sobre a vida monstica, aflora em Hipona, como veremos a seguir.
Em 391, a pedido dos habitantes de Hipona, Agostinho
ordenado sacerdote. Ali, em Hipona, Agostinho constri um
mosteiro e vive nele com alguns companheiros, enquanto lhe
permitem seus deveres pastorais. O princpio fundamental do
mosteiro de Hipona que Atodos os irmos devem renunciar a
todas as suas posses particulares para viverem segundo o estilo de
vida dos apstolos@.
Quatro anos mais tarde, quando sucede a Valrio como bispo de
Hipona, Agostinho que no queria perturbar os irmos com o ir e vir
dos hspede que, segundo o costume os bispos deveriam acolher,
se transfere para o palcio episcopal, com verdadeiro pesar. Mas,
sentir sempre uma grande nostalgia de sua comunidade
monstica.
Apesar de todas as dificuldades, Agostinho quer praticar com seu
clero a Avida apostlica@e fundou o Amonasterium clericorum@: os
clrigos de Hipona possuem tudo em comum sem reserva-se
absolutamente nada como propriedade particular.

Escritos monsticos de Santo Agostinho

O principal escrito monstico de santo Agostinho , sem dvida, a


sua REGRA, cuja autenticidade, hoje quase unanimemente
reconhecida. Discute-se ainda sobre a sua forma original -
masculina ou feminina? - e a data de sua composio. Segundo Luc
Verheijen, um dos maiores pesquisadores contemporneos, o
Praeceptus ou Regula ad servos Dei, a verdadeira Regra de santo
Agostinho, escrita, cerca do ano 397 para o mosteiro leigo de
Hipona do qual Agostinho era o nico monge-sacerdote.
A verso feminina da REGRA ou a EPSTOLA 211 at agora tida
como a Regra original uma adaptao do Praeceptus para as
monjas, realizada na primeira metade do sculo V

O Praeceptum agostiniano um texto de densidade


extraordinria. Pode-se indicar suas grandes linhas, porm quase
impossvel resumi-lo porque ele provavelmente como diz T. Van
Bavel a sntese de uma doutrina muito mais desenvolvida. Seguindo
o pensamento do autor, podemos distinguir cinco partes:
1 - Um prefcio extremamente breve: AEstes so os preceitos que
ordenamos que, vivendo no mosteiro, observeis@.
2 - Um captulo fundamental: o primeiro
3 - Outros seis captulos (2 a 7) que regulam aspectos particulares
da vida monstica
4 - Um olhar retrospectivo que resume e aprofunda o que fora
ordenado anteriormente sobre a forma de orao (cap. 8,1)
5 - Uma breve concluso prtica (8,2)
Outro escrito algumas vezes atribuidos a santo Agostinho o
ORDO MONASTERII (Regulamento do Mosteiro), de estilo juridico
que, na verdade de Agostinho s tem uma introduo e uma
concluso. Seria a Regra do Mosteiro de Tagaste, escrita cerca do
ano 395 por Alpio discpulo e sucessor de Agostinho na direo
daquele mosteiro quando ordenado presbtero Agostinho transferiu-
se para Hipona. Mais tarde, j Bispo, Agostinho teria acrescentado a
introduo espiritual e uma aprovao sua oficial, como concluso.
H ainda outros escritos monsticos de santo Agostinho que que
foram traduzidos para o portugus por iniciativa de D. Paulo Rocha,
ento presidente da CIMBRA e que apenas citamos:
ADe opere monachorum@ ou Ao trabalho dos monges@, escrito
entre os anos 399/401 a pedido de Aurlio, bispo de Cartago por
que alguns monges daquela cidade negavam-se ao trabalho manual
apoiados nos textos bblicos de Mt 6,26 e 2Ts 3,10. Este escrito
marcou a tradio monstica posterior, inclusive a RB e
principalmente a Regra de Sto. Isidoro de Servilha

Sermes 355 e 356, onde Sto. Agostinho d o seu ensinamento


sobre outro elemento essencial da vida monstica: a renncia
propriedade e/ou a comunho de bens. Os dois sermes foram
proferidos com pequeno intervalo, o primeiro no dia 18/12/425 e o
segundo depois da Epifania de 426. E ainda para o mesmo
auditrio: os cristos de Hipona convocados por Agostinho. O
motivo da convocao foi a indignao provocada pelo sacerdote
Janurio que vivendo como monge no mosteiro da residncia
episcopal, ousou fazer um testamento, antes de morrer, dispondo
de seus bens, como se ainda os possusse.
Epstola 243, dirigida ao novio Leto que, por motivos familiares
sobretudo por causa das lgrimas de sua me, retornara sua casa
e permanecia indeciso quanto ao caminho a seguir. Agostinho
lembra-lhe entre outras coisas, a deciso radical exigida pelo ideal
monstico e a natureza do verdadeiro amor cristo.

Podemos, portanto, dizer em concluso que:


(...) AAgostinho um gnio universal e profundo, tem uma
inteligncia penetrante, imenso corao. Reelaborou a tradio
teolgica anterior e lhe imprimiu sua marca original. Com seu
carter generoso e simptico, sua sensibilidade, indulgncia e
capacidade de perdoar, uniu a si os prprios adversrios. Sua
espiritualidade e sua Aregra@ religiosa fizeram surgir em todas as
pocas formas de vida religiosa que o consideram pai. Ainda hoje,
alm dos agostinianos, cerca de 20.000 religiosos seguem
fundamentalmente sua regra, e muito mais numerosas so as
instituies femininas que o tm por pai. o maior dos Padres e o
primeiro dos quatro grandes doutores do Ocidente.@2

22. Missal Cotidiano, ed. Paulinas, S. Paulo, 1984


BIBLIOGRAFIA

- S. Benito su vida y su Regla (pg 264)


- La Regla de San Benito (pg 12ss)
- Confisses de Santo Agostinho (Introduo)
- Patrologia - B. Altaner - A Stuiber - (Agostinho)
- Escritos Monsticos de So Cesrio de Arles (Introduo)
- Curso para formadores - Palestras de D. A. De Vogu, OSB (pg
49)
INTRODUO

REGRA DE
SO BENTO

HISTRIA DO TEXTO DA RB

TEXTO INTERPOLADO

TEXTO PURO (OU ORIGINAL)

Texto de Carlos Sangalense Texto Interpolado


So Bento Magno 914 copiado com
sc. vi sc. viii comeo do sc. ix correes
emendas
etc.

Manuscrito Texto Receptus Texto atual da


mais antigo: sc. viii e ix rb de d. b.
Oxford (origem) Steidle
sc. vii ao ix sc. xi e xii
(apogeu) Texto utilizado
por
D. Joo e. Enout,
na Regra por ele
traduzida

Vigorou at pouco tempo Paulo Dicono (viii) Hildemaro (ix)

Itlia
Frana
Inglaterra
Alemanha

Histria - em resumo

1880 Primeiro ensaio de estudo crtico


da rb. B. Edmundo Schmidt

1898 L. Traube publica seu estudo

1900 D. G. Morin - edio diplomtica

1912 D. C. Butler - Edio crtico-prtica


Crtica: reproduz exatamente o texto da RB
Prtica: para ser vivido no mosteiro

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