Frei Luís de Sousa - Análise
Frei Luís de Sousa - Análise
Frei Luís de Sousa - Análise
de Almeida Garrett
Contextualização histórico-literária
• Século XVIII - aburguesamento da poesia, a qual, dirigindo-se a um público mais lato, tem de
criar condições de adaptação a esse público de cultura inferior, sem preparação literária.
• O escritor românCco, dadas as influências histórico-políCcas que possui, anseia pela liberdade
individual e cole&va, o que o leva a insurgir-se contra os opressores. Esta luta deriva,
frequentemente, na solidão, sofrimento, melancolia, pessimismo e frustração de não
conseguir a&ngir o infinito, que tanto almeja, mas que é impossível de alcançar, provocando-
lhe a insa&sfação e o sen&mento de incompreensão por parte da sociedade, que o oprime e
com a qual está em permanente conflito, o que o conduz à obsessão pela morte. Tendo em
conta este estado de espírito, o homem é profundamente religioso, acreditando que o
cris&anismo possibilita a sua redenção e salvação.
• Pretendem reaver as origens do país, interessando-se por tudo o que é nacional e popular,
sobretudo os costumes e manifestações culturais da Idade Média, a fim de elevar o país
recorrendo ao que lhe é próprio.
• Livre expressão do mundo interior do indivíduo, das preocupações e senCmentos que
dominam a sua vida e que o fazem sofrer pela impossibilidade de aCngir o absoluto, moCvos
pelos quais ele uCliza todas as formas de arte para o expressar.
Classificação da obra
Tragédia Drama
(“pela índole”) (“na forma”)
. Utilização da prosa;
. Organização em três atos;
. Assunto de carácter histórico e nacional;
. Ausência do coro (embora as personagens Telmo e Frei Jorge
comentem, por vezes, a ação);
. Incumprimento estrito da lei das três unidades (não existe
homogeneidade de ação, de tempo e de espaço);
. Presença da religião cristã, de agouros e superstições populares
(manifestações da cultura portuguesa);
. Exaltação de valores patrióticos e da ideia de liberdade,
sobretudo por Manuel de Sousa Coutinho;
. Morte de Maria em palco.
Estrutura externa e interna da obra
A dimensão trágica do tempo
Tempo da diegese
Ato I - no dia 28 de Julho de 1599 (oito dias antes do segundo ato, cuja ação se passa
no dia em que faz anos que desapareceu D. SebasCão):
Ao fim da tarde: «É no fim da tarde.» (didascálias no início do ato);
«- Mas para onde iremos nós, de repente, a estas horas? » (Madalena) Cena VI;
Ato II- no dia 4 de Agosto de 1599: «[ ... ] faz hoje anos que ... casei a primeira vez, faz
anos que se perdeu el-rei D. SebasCão, e faz anos também que ... vi pela primeira vez a
Manuel de Sousa.» (Madalena) Cena X;
oito dias depois do Ato I: «[ ... ] Há oito dias que aqui estamos nesta casa [ ... ].
(Maria) Cena I;
durante o dia: «[ ... ] Ainda bem que viestes; mas de dia!...» (Maria) Cena 11;
numa sexta-feira: «-Sexta-feira!... Ai que é sexta-feira!» (Madalena) Cena V.
• A permanência do número 7:
• 7 anos de procura de D. João;
• 14 anos de casamento com Manuel de Sousa CouCnho (7+7)
• 21 anos desde o desaparecimento de D. João (7+7+7)
Ä 7 é o símbolo de uma totalidade: 7 foram os dias da criação do mundo, 7 são
os pecados mortais e as virtudes que se lhe opõem, 7 são os dias da semana, 7 são as cores
do arco-íris...
A dimensão trágica do espaço físico
Ato I – Palácio de Manuel de Ato II- Palácio de D. João de Ato III - Parte baixa do palácio de D. João
Sousa CouCnho, em Almada: Portugal: de Portugal:
Luxo e elegância da época; Salão an&go de gosto Lugar vasto e sem ornato algum;
Porcelanas, charões, sedas, melancólico e pesado; comunica com a capela da S.ª da
flores, etc; retratos de família e, em Piedade;
Duas grandes janelas de onde destaque, os de D. Sebas&ão, D. decorado com símbolos de morte
se avista o Tejo e Lisboa; João de Portugal e de Camões; (esquife) e de dor (cruz, ornamentos
Retrato de Manuel de Sousa reposteiros que impedem a vista caracterísCcos da Semana Santa);
Cou&nho vesCdo com o hábito para o exterior e a entrada de luz; existência de um hábito religioso.
da Ordem de S. João de comunica com a capela da S.ª da Ä os espaços foram-se progressivamente
Jerusalém; Piedade. obscurecendo e afunilando, tornando-se
Comunicação com o exterior e Ä Este salão está imbuído de uma severos e despojados. Este úlCmo local é
o interior do palácio. forte carga simbólica, não só pela bem o símbolo da morte, e da
Ä Este espaço simboliza a paz quase ausência de luz impossibilidade de a superar, já que é a
e a aparente harmonia que pressagiadora da catástrofe final, única saída para uma família católica que
dominam a família. No mas também pelos retratos que, assume as suas convicções religiosas e
entanto o incêndio (final do I para além do aspecto nacionalista sociais de forma clara e rígida, é a
ato) e a destruição do retrato que transmitem (D. SebasCão e renúncia ao mundo e à luz.
de Manuel de Sousa CouCnho Camões), evocam um passado Ä o espaço assume desde o início um
são já um prenúncio da ameaçador que inviabiliza o carácter pressagiador do desenlace final,
catástrofe final. presente e, também o futuro. contribuindo também para a
intensificação progressiva da tensão
dramá&ca.
Espaço aludido, social e psicológico
O Sebastianismo
Acontecimento mo&vador: Em sen&do restrito:
desaparecimento de D. SebasCão Crença no regresso de D. SebasCão, para garanCr a
na batalha de Alcácer Quibir. restauração da nacionalidade, depois do domínio filipino.
SebasCanismo
Reflexos na literatura:
Frei Luís de Sousa de Almeida
GarreE, poesia de António Nobre,
Miguel Torga, Manuel Alegre,
Fernando Pessoa...
D. João de Portugal e o Sebastianismo
O Sebas&anismo e Frei Luís de Sousa
• O mito SebasCanista assume uma conotação negaCva corporizada na personagem de Romeiro:
• simboliza o anC-herói e o elemento destruCvo que, só pela sua presença, aniquila a harmonia
de D. Madalena e de Manuel de Sousa e conduz à morte de Maria, que «de vergonha»
sucumbe, tal como Portugal, perante a verdade cruel que significa a perda da idenCdade, ao
ter sido governado, por longos anos, por Filipe de Castela.
• D. João - condição de anCmito – a sua presença não preconiza a salvação da nação, mas a
destruição da hegemonia simbolizada pela união entre D. Madalena e Manuel de Sousa e o
aniquilar de valores incuCdos em Maria.
• com a situação de Maria e a sua morte «de vergonha» são as verdades convencionais
que são quesConadas, à maneira do românCco, que se rebela contra uma sociedade
.
cuja alma se perdera no tempo.
Recorte das personagens principais
D. Madalena
. Nobre
. Romântica
. Emotiva
. Íntegra
. Reta
. Vulnerável
. Frágil
. Supersticiosa
D. Madalena
Manuel de Sousa Coutinho
Maria
. Nobre
. Frágil
. Sentimental
. Emotiva
. Patriota
. Supersticiosa
. Astuta
. Carinhosa
. Nobre
. Íntegro
. Honrado
. Patriota
. Rígido
. Desencantado
Romeiro / D. João de Portugal
Recorte das personagens principais
Telmo Pais
. Nobre de carácter
. Confiável
. Honrado
. Humilde
. Sensível
. Atormentado (com e após o regresso de D. João)
Telmo Pais
Relações entre personagens
Amigo
Fiel escudeiro Telmo
Segue Madalena Irmão
è Leitura que D. Madalena realiza do episódio de Inês de Castro (Os Lusíadas), que moCva a sua
reflexão (ato I), o que alia o seu desCno ao final trágico da figura histórica.
è Os pressenCmentos de D. Madalena de que um acontecimento funesto aCngirá a sua família, o
que não a deixa viver o seu amor por Manuel de Sousa CouCnho de uma forma tranquila, moCvando
a sua insegurança, a sua angúsCa e impedindo a sua felicidade.
è Os agouros de Telmo, que não crê na morte de D. João de Portugal, colocando a hipótese do seu
regresso, e que afirma que uma situação ocorrerá que deixaria claro quem nutria maior amor por
Maria naquela casa.
è O facto de Manuel de Sousa CouCnho, antes de pegar fogo ao próprio palácio, por considerar a
resolução dos governadores espanhóis uma afronta, evocar a morte de seu pai, que caíra «sobre a
sua própria espada», indicando o desCno funesto da sua família; por outro lado, o seu ato irá moCvar
a aproximação da família de um espaço que pertencera a D. João de Portugal e que a ele está ligado
metonimicamente.
è Leitura que Maria faz do início da obra de Bernardim Ribeiro Menina e Moça, «Menina e moça me
levaram da casa de meu pai», que indicia a sua separação da família.
è O sebasCanismo de Maria indica a hipótese de regresso de D. João de Portugal que, tal como D.
SebasCão; desaparecera na Batalha de Alcácer Quibir.
è As visões de Maria (moCvadas pelo seu temperamento românCco, pela imaginação e aguçadas
pela tuberculose), dado o seu carácter negaCvo e o facto de a impedirem de dormir, remetem,
igualmente, para a ocorrência de um acontecimento funesto; às visões da personagem, acrescenta-
se a sua intuição e a sua compreensão precoce das coisas).
è A visita que Maria e Manuel de Sousa CouCnho fazem a Soror Joana que fora casada com D. Luís
de Portugal – o casal decidira, em determinado momento da sua vida, abandonar o mundo e
recolher-se num convento.
èA decoração dos espaços ysicos sofre alterações – no ato I, encontramos um ambiente alegre e
aberto ao sol, que será subsCtuído no II e III atos por uma decoração melancólica e soturna.
è Os elementos simbólicos ao nível do espaço ysico, com relevância para os retratos de Manuel de
Sousa CouCnho e de D. João de Portugal – a subsCtuição do primeiro pelo segundo, aliada à
subsCtuição de espaço, é um sinal que a própria D. Madalena interpreta como fatal; a família muda-
se para o palácio de D. João de Portugal, que anuncia a presença do primeiro marido de D.
Madalena, apagando, simbolicamente, a presença do segundo (cujo retrato é consumido pelo fogo,
apesar das tentaCvas desesperadas de D. Madalena para o salvar).
è O facto de a ação decorrer ao início da noite ou de noite.