Revista de Direitos Difusos
VOLUME 5 7 - 5 8
Janeiro-Dezembro/2012
Ano XIII
Coordenadores
Guilherme José Purvin de Figueiredo
Marcelo Abelha Rodrigues
Revista de Direitos Difusos
ISSN 1517-9192
Diretor Executivo:
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AS COTAS RACIAIS PARA ACESSO À EDUCAÇÃO
SUPERIOR EM INSTITUIÇõES PÚBLICAS DE
ENSINO NO BRASIL: ESTUDOS SOB UMA
PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR
Fernando Gaburri1
RESUMO
O presente artigo tem o propósito de debater temas relevantes e
atuais sobre as cotas para ingresso de grupos vulneráveis em instituições públicas de ensino superior.
O estudo leva em consideração a situação de vulnerabilidade em
razão da pigmentação da pele, da situação socioeconômica e da pertença à etnia indígena.
O enfoque da matéria central seguirá as determinações constitucionais brasileiras, dentre as quais citam-se o princípio da igualdade
material e da autonomia universitária, bem como as recentes inovações
legislativas levadas a cabo pela Lei Federal n. 12.711, de 29.08.2012 e do
Decreto do Poder Executivo Federal n. 7.824, de 11.10.2012. Também
serão levados em consideração os recentes pronunciamentos e entendimentos do Supremo Tribunal Federal acerca das cotas para ingresso
nas universidades.
1 Mestre em direito civil comparado pela PUC/SP e doutorando em direitos humanos pela USP; Diretor Nacional do Núcleo de Estudos dos Direitos da Pessoa com deficiência do IBAP; Professor de direito civil da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN e do Centro Universitário do Rio Grande do Norte – Uni-RN;
Procurador do Município do Natal/RN.
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Após debatidos e enfrentados os principais pontos sobre o assunto, chegar-se-á à conclusão de que as cotas, em si mesmas, são constitucionais, embora a inovação da Lei n. 12.711 de 2012 possa interferir
na autonomia universitária.
Palavras-chave: Educação. Grupos Vulneráveis – Cotas para Ingresso em Instituições Públicas de Ensino Superior. Autonomia Universitária. Constitucionalidade da Reserva de Vagas.
RéSUMé
Cet article est destiné à étudier des questions pertinentes et
actuelles sur les quotas d’entrée des groupes vulnérables dans les
établissements publics d’enseignement supérieur.
L’étude prend en compte la situation de vulnérabilité en raison de
la pigmentation de la peau, le statut socioéconomique et l’appartenance
à un groupe ethnique indigène.
La mise au point de la question centrale suivra les décisions
constitutionnelles brésiliennes, parmi qui comprennent le principe
de l’égalité et de l’autonomie des universités, ainsi que les récentes
innovations législatives entreprises par le fédéral Loi no 12 711,
29.08.2012 et le fédéral fédéral décret exécutif no 7 824, 11.10.2012. Sont
également pris en considération les récentes prises de position et les
interprétations de la Cour suprême concernant le reserve d’admission
dans les universités.
Après avoir discuté et abordé les points principaux sur le
sujet, viendra à la conclusion que Le reserve, em elle-même, est
constitutionnelle, même si l’innovation de la loi n. 12 711 2012 peut
interférer avec l’autonomie des universités.
Mots Clés: L’éducation. Reserve D’entrée des Groupes
Vulnérables Dans les Établissements Publics D’enseignement Supérieur.
Autonomie des Universités. Constitutionnalité des Reserves.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem o propósito de analisar a questão da constitucionalidade das cotas raciais para ingresso de minorias em instituições públicas de ensino superior, o que será feito por meio de um estudo interdisciplinar entre o direito e alguns ramos das ciências humanas,
como a sociologia, filosofia e antropologia.
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Durante os anos 80 e 90 o conhecimento de campos vizinhos do
direito e sociedade vem adotando menor formalismo e mais rica interpretação, aproximando a vida social do direito, levando a um resultado
de maior efetividade, com uma menor instrumentalidade. Na linha da
interdisciplinaridade, documentos de humanidades, estudos interpretativos sociolegais e antropologia legal constituem, primariamente, o
corpo dos estudos culturais legais.2
O estudo cultural do direito é uma atividade interdisciplinar, envolvendo sociólogos, antropólogos, conhecimentos literários e de acadêmicos de direito. Isto traça, nitidamente, a distinção entre o estudo
cultural e o tradicional conhecimento jurídico. Neste diapasão, na coleção Law Histories, o editor Paul Gewirtz afirma que livros tradicionais
de direito tratam-no como um conjunto de regras e obrigações sociais.
O livro Histórias do Direito, diferentemente, encara o direito não como
regras e obrigações, mas como histórias, explanações, performances e
mudanças linguísticas – como narrativas e retórica.3
1. A DICOTOMIA OCIDENTE VERSOS RESTO
A dicotomia West and rest pode ser concebida em alguns sentidos,
como a) no de permitir caracterizar e classificar sociedades em diferentes categorias; b) de uma imagem que condensa diferentes e variadas
características (diferentes sociedades, culturas, povos e lugares); c) modelo de comparação, que permite observar como as diversas sociedades
assemelham-se, ou diferenciam-se, umas das outras: as sociedades do
rest são consideradas como fechadas, ou distantes ou não pertencente às
sociedades do West, o que permite explicar certas distinções de valores
(por exemplo, West adjetiva-se como desenvolvido, bom, desejável, e
non-west adjetiva-se como subdesenvolvido, ruim, indesejável).4
A América foi o primeiro espaço constitutivo de um novo padrão de poder de vocação mundial. A codificação das diferenças entre
conquistadores e conquistados deu-se com base na ideia de raça, vale
dizer, de uma suposta diferença biológica que colocava uns em situação
2 COOMBE, Rosemary. Is there a Cultural Studies of Law? IN: MILLER, Toby (Ed.).
A companion to Cultural Studies. Cambridge: Basil Blackwell, 2001. p. 36.
3 COOMBE, Rosemary. Is there a Cultural Studies of Law?. Cit., p. 37.
4 HALL, Stuart. The West and the rest: discourse and Power. disponível em: www.
colorado.edu/.../HallWest&Rest.pdf Acesso em 05.08.2012. p. 186.
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de inferioridade em relação a outros, asssumida como o principal elemento fundante das relações de dominação que a conquista imporia.5
No período colonial a drenagem de renda e a monopolização do
mercado de consumo era mais ou menos elevada, quer se tenha por
base o ciclo do açúcar (drenagem quase que total) ou o do ouro (um
pouco menor) e do café (ainda mais reduzida). O sistema monopolista
cria uma legião de pessoas subordinadas às vigentes estruturas econômicas, porque não teriam outra alternativa a não ser vincularem-se à
atividade dominante em cada período. Como a inexistência de fluxo de
renda ligava-se ao desistímulo do empreendedorismo, a única alternativa remanescente para a ascensão social seria algum tipo de educação,
a ser buscada na Europa (excluídos os escravos e servis). Sem educação
não poderia haver ascensão social, nem a consequente formação de renda, o que impossibilitava a formação de uma classe média sólida com
acesso à educação e à informação (era uma estrutura social com topo e
base, mas sem parcelas intermediárias).6
A falta de acesso à terra, à educação e à distribuição de renda
tornava o trabalhador escravo sempre dependente. Esses péssimos padrões de distribuição de renda traduzir-se-ão em pobreza para os descendentes de servis, negros e indígenas, de tal modo que exclusão social
e discriminação racial não mais se dissociariam, provocando marginalização e dificuldade de ascensão social a imensa parcela da população.7
De fato, antes da II Guerra Mundial, o racismo ao redor do mundo era socialmente aceito, politicamente apoiado, economicamente suportado, intelectualmente justificado e legalmente tolerado.8
Embora formalmente extinto, o racismo faz-se sentir ainda nos
tempos atuais. A mídia televisada seria, talvez, uma das grandes colaboradoras para a manutenção da injustiça, já que os negros são representados como criminosos, prostitutas, criadas, traficantes; raramente aparecem em papéis de autoridades, de glamour ou virtude. Essa
5 QUIJANO, Aníbal. Colonialidad del Poder, Eurocentrismo y América Latina. In:
LANDER [Comp.]. La Colonialidad del Saber: Eurocentrismo y ciencias sociales:
perspectivas latinoamericanas. Buenos Aires: CLACSO, 2000. p. 202.
6 SALOMÃO FILHO, Calixto; FERRÃO, Brisa; RIBEIRO, Ivan. Concentração, estruturas e desigualdade: as origens coloniais da pobreza e da má distribuição de renda. São Paulo: Idcid, 2006. p. 45-46.
7 SALOMÃO FILHO, Calixto; FERRÃO, Brisa; RIBEIRO, Ivan. Concentração, estruturas e desigualdade: as origens coloniais da pobreza e da má distribuição de
renda. Cit., p. 49.
8 KYMLICKA, Will. Multicultural Odysseys. Oxford: Oxford University Press, 2007.
p. 89.
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estereotipagem não se dá apenas na distribuição material, mas também
na imagem cultural.9
O processo de mudança desses paradigmas, no sentido de se
construir um conhecimento por meio do qual a história e a cultura dos
negros sejam valorizadas e sua autoestima aumentada, iniciar-se-ia, talvez, com seu ingresso nas universidades, possibilitando o estabelecimento de uma relação direta entre a implementação do sistema de cotas
e a alteração do conhecimento tradicionalmente produzido e transmitido pelas instituições de ensino e pesquisa.10
2. DIREITO À EDUCAÇÃO NO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS
Desde a Declaração dos Direitos dos Homens e dos Cidadãos, de
1789, já se externava a preocupação com o direito à educação. No preâmbulo daquele documento já se ostilizava a ignorância, a saber: “Les
Représentants du Peuple Français, constitués en Assemblée nationale,
considérant que l’ignorance, l’oubli ou le mépris des droits de l’homme
sont les seules causes des malheurs publics et de la corruption des Gouvernements, ont résolu d’exposer, dans une Déclaration solennelle, les
droits naturels, inaliénables et sacrés de l’homme [...]”11
Na mesma linha se posicionou a Declaração Jacobina, de 1793,
em cujo art. 22 podia se encontrar a seguinte disposição: “Article 22. L’instruction est le besoin de tous. La société doit favoriser de tout son
pouvoir les progrès de la raison publique, et mettre l’instruction à la
portée de tous les citoyens.”12
Ainda valendo-se de textos franceses, a Constituição de 1848, em
duas oportunidades, referia-se ao direito à educação, em seus arts. 9º e 13.
9 YOUNG, Iris Marion. Structural Injustice and the Politics of Difference. In: LENZ,
Günter H; DALLMANN, Antje [Orgs.]. Justice, Governance, Cosmopolitanism,
and the Politics of Difference: reconfigurations in a Transnational World. Berlin:
Humboldt-Universität, 2007. p. 20.
10 SANTOS, Gislene Aparecida dos. Reconhecimento, utopia, distopia: os sentidos
da política de cotas raciais. São Paulo: Annablume, 2012. p. 145.
11 “Os representantes do povo francês, constituídos em ASSEMBLEIA NACIONAL,
considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do
homem são as únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos Governos,
resolveram expor em declaração solene os Direitos naturais, inalienáveis e sagrados
do Homem [...]” (Tradução livre).
12 “Artigo 22 – A instrução é a necessidade de todos. A sociedade deve favorecer,
com todas as suas forças, os progressos da razão pública e colocar a instrução ao
alcance de todos os cidadãos.” (Tradução livre).
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A Declaração Universal dos Direitos Humanos contemplou o
direito à educação tanto em sua forma clássica, individualista, como
também segundo sua função social, como se infere da alínea 2, de seu
art. 26 a seguir transcrito:
“2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos
direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e
grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.”
Em 1960 foi celebrada pela UNESCO a convenção sobre a luta
contra a discriminação na educação, aprovada internamente pelo Decreto Legislativo n. 40 de 1967 e ratificada pelo Brasil pelo Decreto n.
63.223, de 06.07.1968. Segundo Erick Santos13, é a mais antiga norma
internacional concernente, especificamente, ao direito à educação e,
passado quase meio século de sua vigência interna no Brasil, a maior
parte de seus dispositivos permanece atual e aplicável aos problemas
educacionais.
Em seguida veio o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, internalizado pelo Brasil mediante o
Decreto n. 591, de 06.07.1992, cujo art. 13 determina que os Estados-partes reconhecem o direito de toda pessoa à educação; concordam que
a educação deverá visar ao pleno desenvolvimento da personalidade
humana; que a educação deverá capacitar a todos a participarem efetivamente de uma sociedade livre, favorecer a compreensão, a tolerância
e a amizade entre todas as nações e grupos raciais, étnicos ou religiosos.
Em 1974 foi realizada a Conferência Geral da Organização Geral
das Nações Unidas, quando resultou a Recomendação sobre a Educação para a Compreensão, a Cooperação e a Paz Internacional e a Educação relativa aos Direitos Humanos e às Liberdades Fundamentais.
Em 1989 foi aprovada a Convenção sobre os Direitos da Criança
e em 1990, por ocasião da Conferência Mundial da Tailândia, a Declaração Mundial sobre Educação para Todos. Essa Declaração, ao reclamar
a interveniência da sociedade, no tocante aos suportes para a educação,
evidencia o espírito participativo, que implica no reconhecimento de
13 SANTOS, Erick. A educação especial em face da Convenção da UNESCO contra a
discriminação no ensino. In: RANIERI, Nina [Coord.]. Direito à educação: igualdade
e discriminação no ensino. São Paulo: EDUSP, 2010. p. 213.
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que não há como atribuir isoladamente ao Estado a responsabilidade
prioritária na prestação da educação.14
A esse respeito, Mônica Herman S. Caggiano15 observa que: “O
campo da educação, portanto, sob forte influência do impacto participativo, passa a demandar ações concretas de índole coletiva direcionadas
à garantia de melhores condições para o aprendizado. E, para tanto, são
convocadas todas as forças sociais. Sob essa nova roupagem, especial
atenção é atribuída ao papel desempenhado pelos educadores e pela
família. A instrução e o preparo desses representa fator de realce, que
não pode ser ignorado, conduzindo a sociedade a um repensar coletivo quanto à garantia de meios adequados a oferecer um nível de ensino
compatível com as exigências do século XXI e, notadamente, com as recomendações da ONU que já anteviam os desafios desses novos tempos.”
Com base nos documentos acima mencionados é possível apresentar uma primeira conclusão, de que a educação, como direito humano, não pode ser vista como caridade, nem como uma commodity cuja
distribuição é determinada pelo mercado, mas como uma prerrogativa
especialmente forte que os indivíduos possuem como uma questão de
direito. E como prerrogativa, o direito à educação reveste-se do atributo
da justiciabilidade, vale dizer, da possibilidade de ser invocado perante
o Poder Judiciário (ou outro órgão com funções análogas) e aplicado
pelos juizes em benefício de seus titulares.16
3. DIREITO À EDUCAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE
1988
A atual Constituição afirma a educação como direito social de
todos em seu art. 6º, fazendo com que figure como direito civil e político
e dever do Estado, da família e da sociedade, nos arts. 205 a 214. Sob sua
égide foi aprovada a Lei n. 9.394, de 20.12.1996, segunda e atual Lei de
Diretrizes e Bases da Educação brasileira.
A Constituição Federal abre o Capítulo III de seu Título VIII com
a seguinte disposição:
14 CAGGIANO, Mônica Herman S. Educaçção. Direito fundamental. In: RANIERI,
Nina [Coord.]. Direito à educação. São Paulo: EDUSP, 2009. p. 27-28.
15 CAGGIANO, Mônica Herman S. A educação. Direito fundamental. In: RANIERI,
Nina. Direito à educação. Cit., p. 28.
16 PANNUNZIO, Eduardo. O Poder Judiciário e o direito à educação. In: RANIERI,
Nina [Coord.]. Direito à educação: aspectos fundamentais. Cit., p. 63-65.
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“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
Após observar os avanços do direito à educação na Constituição
Federal de 1988 em relação às ordens constitucionais anteriores, Nina
Ranieri17 anota que essa proteção produz importantes consequências
jurídicas e políticas, que podem ser identificadas, pelo menos, em dois
principais aspectos:
a) no concernente ao pacto federativo, no qual se instala uma forma de cooperação efetiva e eficaz no campo educacional. Assim
18
é que o art. 208, I e § 1º , da Constituição, preveem a obrigatoriedade do ensino fundamental e seu inciso II19 a universalização
progressiva do ensino médio, o que vem complementado pela
norma de colaboração entre União, Estados e Municípios, nos
termos do art. 21120. O mecanismo adequado para o atingimento
desse desiderato é a vinculação de receitas provenientes de impostos (algo excepcional no sistema tributário brasileiro, já que
impostos são tributos cuja receita não é vinculada) nos termos do
caput do art. 21221.
17 RANIERI, Nina. Os Estados e o direito à educação na Constituição de 1988: comentários acerca da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. in: RANIERI, Nina
[Coord]. Direito à educação. Cit., p. 39.
18“Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de
idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram
acesso na idade própria; [...]
§ 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.”
19 “Art. 208 [...]
II - progressiva universalização do ensino médio gratuito”.
20 “Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em
regime de colaboração seus sistemas de ensino.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as
instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função
redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e
financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental
e médio.
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório.
§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.”
21 “Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados,
o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita
100
v. 57-58 – Janeiro-Dezembro/2012
b) a afirmação democrática do direito à educação, que pressupõe
a possibilidade de acesso aos diversos níveis da educação formal
àqueles que preencham os requisitos legais para tanto previamente estabelecidos.
4. AS COTAS PARA ACESSO DE MINORIAS
AO ENSINO PÚBLICO UNIVERSITÁRIO E A
LEI FEDERAL 12.711/2012
Na busca de uma igualdade muito mais material do que formal,
os Poderes Legislativo e Executivo vêm se preocupando em estabelecer
critérios diferenciados para o acesso de grupos vulneráveis à educação,
frente à insuficiência dos critérios tradicionais na garantia daquele amplo acesso.
Nesta linha, o Poder Legislativo, por meio do Projeto de Lei n.
73/99 adotou, pela primeira vez, medidas de inclusão, propondo reserva de 50% das vagas em universidades federais e estaduais.
O Projeto de Lei n. 3.627/2004, já arquivado, versava sobre reserva de vagas para ingresso em instituições públicas federais de ensino de
egressos de escolas públicas, em especial negros e indígenas.
No âmbito do Poder Executivo, destaca-se a Universidade Federal de Brasília – UnB, como a primeira instituição federal de ensino a
aprovar reserva de vagas, muito embora não o tenha feito por lei, mas
por ato administrativo de 2003. Essa ação afirmativa baseia-se no critério racial e étnico.22
Em 2004 a Universidade Federal da Bahia – UFBA, também por
ato administrativo, instituiu política de cotas combinando os critérios
de raça e de proveniência do ensino médio.
Em 2004, a Universidade Federal de São Paulo – Unifesp, instituiu um sistema de cotas para autodeclarados negros e indígenas, que
tenham cursado ensino médio em escola pública. A diferença das demais universidades é que a Unifesp criou vagas adicionais para esses
candidatos, ao invés de fazê-los concorrer nas vagas já existentes, destinadas à ampla concorrência.
resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.”
22 Em relação à medida inclusiva adotada pela UnB, o Partido Democratas ajuizou
a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF – n. 186/DF, questionando a reserva de 20% das vagas oferecidas no vestibular daquela instituição para
candidatos negros.
101
Revista de Direitos Difusos
Daí por diante, inúmeras instituições públicas de ensino, federais e estaduais, aderiram, por atos administrativos próprios, o sistema
de cotas para ingresso de estudantes, na quase totalidade dos casos,
provenientes de escolas públicas, de raça negra ou de etnia indígena.
Com a vigência da Lei n. 12.711, de 29.08.2012, publicada no Diário Oficial da União de 30.08.2012, com cláusula de vigência imediata23,
houve uma uniformização dos critérios de acesso às instituições federais
de ensino, de modo que causaria estranheza a convivência da Lei Federal com as diversas resoluções aprovadas por cada universidade federal,
pois, seguramente, os critérios eleitos pela administração de cada uma
daquelas instituições não coincidirão com os adotados pela nova Lei.
De outro lado, embora a uniformização possa sair prejudicada,
não se pode olvidar que as universidades públicas são dotadas de autonomia nos termos do art. 20724 da Constituição e, talvez, nesta estaria
compreendido o poder-dever de aprovar ações afirmativas por meio de
resoluções, pois estas atenderiam melhor do que uma lei genérica, às
especificidades da região em que a instituição está localizada.
Ao apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 186, o Ministro Marco Aurélio, posicionando-se favoravelmente, considerou que a prática das ações afirmativas pelas universidades públicas brasileiras estaria baseada em diversos princípios e
regras constitucionais; que a implementação de ação afirmativa por ato
administrativo de cada universidade pública decorreria da autonomia
universitária prevista no caput do art. 207 da Constituição.
Neste mesmo sentido o Supremo Tribunal Federal se pronunciou ao apreciar o Recurso Extraordinário n. 597285/RS, rechaçando o
argumento de ausência de lei formal autorizadora da ação afirmativa
de reserva de vagas levada a cabo pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul – UFRS, ao fundamento de que a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação, Lei n. 9.394, de 20.121996, por seu art. 5125, deixaria
para as universidades a fixação dos critérios a serem utilizados na seleção de estudantes.26
23 “Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
24 “Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa
e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade
entre ensino, pesquisa e extensão.”
25 “Art. 51. As instituições de educação superior credenciadas como universidades,
ao deliberar sobre critérios e normas de seleção e admissão de estudantes, levarão em
conta os efeitos desses critérios sobre a orientação do ensino médio, articulando-se
com os órgãos normativos dos sistemas de ensino.”
26 Conferir informativo n. 665, disponível em: HTTP://www.stf.jus.br. Acesso em
25.09.2012.
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Assim sendo, a constitucionalidade da Lei Federal n. 12.711/2012
é duvidosa, não pelo conteúdo da ação afirmativa que traz, mas talvez
por malferir o princípio da autonomia universitária das instituições federais de ensino que, a partir de 30.08.2012 não mais poderiam continuar praticando seus sistemas próprios de ações afirmativas – muito mais
condizentes com as especificidades regionais do campo de abrangência
de cada instituição – pela razão mesma de a matéria ter sido unificada
no âmbito federal.
4.1. AS COTAS NAS INSTITUIÇõES FEDERAIS
DE ENSINO
Em âmbito federal, com a superveniência da Lei n. 12.711, de
29.08.2012, regulamentada pelo Decreto n. 7.824, de 11.10.2012, a matéria restou uniformizada.
Pelo art. 1º da Lei, as instituições federais de ensino reservarão,
em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por
cada turno e curso, o mínimo de 50% das vagas ofertadas para estudantes que tenham cursado, integralmente, o ensino médio em escolas
públicas27.
Assim, a exemplo de uma universidade federal que disponibiliza
40 vagas para o curso de direito no período noturno, deve-se fazer uma
cisão das vagas ofertadas, sendo 20 destinadas à ampla concorrência e
20 aos egressos de escolas públicas. Deixadas de lado as vagas da ampla concorrência e dirigindo a atenção às Vagas reservadas, o parágrafo
único do art. 1º determina que dessas 20 vagas hipotéticas a metade (ou
seja, 10 vagas), deve ser destinada a estudantes oriundos de famílias
com renda igual ou inferior a 1,5 salário mínimo per capita. As outras 10
vagas da porção de que trata o caput do art. 1º (ou seja, apenas considerando o universo das vagas reservadas) serão preenchidas por egressos
de escolas públicas, qualquer que seja a renda familiar.
O art. 3º da Lei traz um complicador, pois vale-se daquele mesmo universo do art. 1º para destinar as vagas reservadas a outras classes
de estudantes, que podem ou não ser coincidentes com a de egressos de
escolas públicas. Pelo art. 3º, em cada instituição federal de ensino superior as vagas reservadas para ingresso na graduação serão preenchidas,
27 Pelo disposto no parágrafo único do art. 4º do Decreto n. 7.824/2012, não poderão
concorrer às vagas reservadas os estudantes que, em algum momento, tenham
cursado parte do ensino fundamental ou médio em escolas particulares. .
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Revista de Direitos Difusos
por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em
proporção no mínimo igual de pretos, pardos e indígenas da população
da unidade da federação onde está instalada a instituição, com base no
último senso do IBGE. O parágrafo único do art. 3º determina que no
caso de não preenchimento das vagas por pretos, pardos e indígenas,
as remanescentes (considerando-se apenas o universo das vagas reservadas) serão preenchidas pelos estudantes tratados no art. 1º da Lei, ou
seja, pelos egressos de escolas públicas.
Ao que parece, a Lei buscou priorizar os pretos, pardos e indígenas, de sorte que o art. 3º deveria estar topograficamente antes do art.
1º. Em outras palavras, se sobrarem vagas após chamados os pretos,
pardos e indígenas, serão convocados os egressos de escolas públicas,
sendo que destes, a metade das vagas remanescentes serão destinadas
aos estudantes oriundos de famílias de baixa renda (assim consideradas
aquelas com 1,5 salários mínimos per capita, nos termos do parágrafo
único do art. 1º da Lei e do art. 2º, I, do Decreto) e, a outra metade das
vagas remanescentes será destinada aos egressos de escolas públicas,
qualquer que seja a renda familiar.
Esquematizando, para aquela universidade federal hipotética
que oferece 40 vagas para o curso noturno de direito, cuja proporção de
pretos, pardos e indígenas no estado federado em que está inserida seja
de 50%, as vagas serão assim distribuídas:
a) 20 vagas para a ampla concorrência;
b) 20 vagas reservadas que serão assim distribuídas:
b.1: 10 vagas (50%, que é a proporção de pretos, pardos e indígenas naquele estado) destinadas aos inscritos pretos, pardos e
indígenas;
b.2) das 10 remanescentes 5 vagas serão destinadas a estudantes
de baixa renda que tenham cursado o ensino médio integralmente em escolas públicas;
b.3) as demais 5 vagas serão destinadas a estudantes que tenham
cursado integralmente o ensino médio em escola pública, qualquer que seja a renda familiar.
O art. 2º da Lei 28, que elegera o método da meritocracia unicamente para a seleção dos egressos de escolas públicas (portanto deixando
28 “Art. 2º As universidades públicas deverão selecionar os alunos advindos do
ensino médio em escolas públicas tendo como base o Coeficiente de Rendimento
(CR), obtido por meio de média aritmética das notas ou menções obtidas no período,
considerando-se o currículo comum a ser estabelecido pelo Ministério da Educação.
Parágrafo único. As instituições privadas de ensino superior poderão adotar o procedimento descrito no caput deste artigo em seus exames de ingresso.””
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os pretos, pardos e indígenas de fora desse critério) pfora vetado pela
Presidenta da República, sob o fundamento de que:
“O Coeficiente de Rendimento, formado a partir das notas atribuídas ao longo do ensino médio, não constitui critério adequado para
avaliar os estudantes, uma vez que não se baseia em exame padronizado comum a todos os candidatos e não segue parâmetros uniformes
para a atribuição de nota.”
Procurando demonstrar que essa política de cotas trata-se de
uma medida compensatória, e não estrutural, o art. 10 determina que,
no prazo de 10 anos da vigência da Lei, o Poder Executivo promoverá a
revisão do programa especial para o acesso, às instituições federais superior de ensino, de estudantes pretos, pardos e indígenas e dos egressos de escolas públicas.
O artigo causa espécie. Ora, de que vale uma revisão operada pelo
Poder Executivo se a Lei é atribuição do Poder Legislativo? Talvez o art.
10 pretenda que o Poder Executivo, no decorrer de 10 anos, envie ao Poder Legislativo relatórios sugestivos de manutenção, ou alteração do texto legal vigente29. E ao Poder Legislativo, autônomo que é em relação ao
Executivo nos termos do art. 2º30 da Constituição, será facultado atender,
ou não, àquela singela sugestão, mediante edição de nova lei.
Por fim, o art. 8º da Lei e o art. 8º do Decreto determinam que a
implementação da reserva de vagas se dê paulatinamente, de modo que
no primeiro ano de sua vigência apenas a quarta parte das vagas de que
trata o art. 1º necessitarão ser reservadas.31 No segundo ano serão reservados 2/4 (a metade) das vagas do caput do art. 1º, no terceiro ano ¾
delas e, finalmente, no quarto ano 4/4 (a totalidade) das vagas do caput
do art. 1º, que corresponde a metade da totalidade das vagas oferecidas.
29 O Decreto parece caminhar nesse sentido, ao criar um órgão denominado de Comitê de Acompanhamento e Avaliação das Reservas de Vagas nas Instituições Federais de Educação Superior e de Ensino Técnico de Nível Médio. O art. 7º do Decreto
determina que:
“Art. 7º O Comitê de que trata o art. 6o encaminhará aos Ministros de Estado da
Educação e Chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da
Presidência da República, anualmente, relatório de avaliação da implementação das
reservas de vagas de que trata este Decreto.
30 “Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo,
o Executivo e o Judiciário.”
31 Se o art. 1º determina que a metade das vagas sejam reservadas, e se o art. 8º
faculta às instituições reservarem apenas 25% daquela metade do art. 1º a cada ano,
apenas 25% (ou seja, a quarta parte) da totalidade das vagas oferecidas serão necessariamente reservadas no primeiro ano de vigência da Lei.
105
Revista de Direitos Difusos
Se na aplicação dos percentuais acima referidos resultar em número fracionado, o arredondamento dar-se-á para o número inteiro
imediatamente subseqüente, devendo ser assegurada, no mínimo, uma
vaga em decorrência da reserva de que tratam a Lei e o Decreto. Nestes
termos determina o art. 5º do Decreto:
“Art. 5º Os editais dos concursos seletivos das instituições federais de educação de que trata este Decreto indicarão, de forma
discriminada, por curso e turno, o número de vagas reservadas.
§ 1º Sempre que a aplicação dos percentuais para a apuração da
reserva de vagas de que trata este Decreto implicar resultados com
decimais, será adotado o número inteiro imediatamente superior.
§ 2º Deverá ser assegurada a reserva de, no mínimo, uma vaga
em decorrência da aplicação do inciso II do caput do art. 2o e do
inciso II do caput do art. 3o.
§ 3º Sem prejuízo do disposto neste Decreto, as instituições federais de educação poderão, por meio de políticas específicas de
ações afirmativas, instituir reservas de vagas suplementares ou
de outra modalidade.”
4.2. AS COTAS NAS INSTITUIÇõES ESTADUAIS DE ENSINO
Em relação às instituições estaduais de ensino a Lei n. 12.711 de
2012 não tem incidência, de modo que cada estado federado é autônomo para legislar sobre o assunto, de acordo com as especificidades
regionais ou, se prevalecente a tese da autonomia universitária, cada
universidade estadual, por ato administrativo próprio, é autônoma
para disciplinar sua ação afirmativa por meio de cotas.
No Estado do Rio de Janeiro a reserva de vagas se deu mediante
a promulgação da Lei n. 4.151, de 04.09.2003 (ora revogada pela Lei n.
5.346, de 11.12.200832), que para ingresso na Universidade do Estado do
Rio de Janeiro – UERJ e na Universidade Estadual do Norte Fluminense –
UENF, no mínimo 45% das vagas oferecidas no exame vestibular são reservadas a alunos negros, egressos de escolas públicas do Estado do Rio
de Janeiro e candidatos com deficiência e integrantes de minorias étnicas.
Em 2004 a Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, instituiu interessante Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social –
32 A constitucionalidade da Lei Fluminense está sendo questionada pela ADI
n. 3.197/RJ, ajuizada pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino
– COFENEN.
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PAAIS, sem previsão de cotas, destinado aos candidatos autodeclarados negros e indígenas. O PAAIS consiste na atribuição de uma pontuação adicional no vestibular, proporcionalmente ao desempenho obtido
nas provas. Nesta linha, a Universidade de São Paulo – USP instituiu
em 2007 um programa de inclusão – INCLUSP, que conjuga a inclusão
social com o mérito, com base na aplicação de uma bonificação proporcional à nota obtida pelo candidato
Embora a UNESP não conte com um programa de cotas, sua ação
afirmativa é no sentido de manter um cursinho prevestibular gratuito
para candidatos egressos da rede pública, que os prepara para ingresso
em instituições públicas e privadas de ensino.
4.3. O ARGUMENTO COMPENSATóRIO JUSTIFICADOR DAS AÇõES AFIRMATIVAS
Os críticos do argumento compensatório, como é o caso das
ações afirmativas para ingresso de grupos vulneráveis ao ensino público superior, alegam que os beneficiados não são necessariamente aqueles que sofreram a discriminação, além do que os que “pagam” pela
compensação nem sempre seriam os responsáveis pelos erros que estão
sendo corrigidos. É verdadeiro que muitos dos beneficiários das ações
afirmativas podem ser estudantes de minorias de classe média, que não
passaram por dificuldades que afligem as camadas mais pobres da população. É por isso que os críticos das políticas compensatórias afirmam
que se a questão for a de ajudar pessoas em desvantagens, que as políticas compensatórias baseiem-se em critérios sociais e não na raça.33
O critério de identificação dos beneficiários é realmente mais
complexo de se resolver do que o de uma eventual responsabilização
de quem não participou do sistema discriminatório.
A Constituição Federal resolve a segunda questão Em termos diretos e satisfatórios ao determinar que um dos objetivos fundamentais
da República Federativa do Brasil é a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e, ao tratar do direito ao ambiente ecologicamente
sadio e equilibrado, não exita em afirmar que é dever da geração presente defendê-lo e preservá-lo para as futuras gerações. Ou seja, a geração presente situa-se em posição de credora das gerações passadas e, ao
mesmo tempo, de devedora em relação às futuras. Daí conclui-se pela
falaciosidade e fragilidade do argumento de que “inocentes estariam a
pagar pelos pecadores”.
33 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloísa
Matias e Maria Alice Máximo. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012. p. 212.
107
Revista de Direitos Difusos
De outro lado, talvez não haja relação entre à necessidade de
o beneficiário da ação afirmativa ter sofrido direta ou pessoalmente a
discriminação e ter sido contemplado com uma vaga em universidade.
Mas para tanto a ação afirmativa deve ser vista não unicamente como
uma política de recompensa, mas também como um meio de atingir um
objetivo socialmente mais importante.34
Como observa Nina Ranieri35, as decisões prolatadas nos casos
das cotas não representam a jurisprudência atual da Corte. Tratam-se,
ao contrário, de decisões extraordinárias, de natureza política, fortemente influenciadas pela injustiça da exclusão social e do preconceito
racial, religioso, étnico e econômico, a ressaltar a natureza dinâmica da
Constituição, que expressa o seu significado tanto pela evolução interpretativa como pela pressão dos eventos. E prova disso foi a realização
de audiência pública em março de 2010, pelo Ministro Relator da ADPF
n. 186/DF e do RE n. 597.285/RS.
No julgamento da ADPF n. 186/DF, destaca-se o seguinte trecho:
“Por sua vez, no que toca à reserva de vagas ou ao estabelecimento de cotas, entendeu-se que a primeira não seria estranha
à Constituição, nos termos do art. 37, VIII. Afirmou-se, de igual
maneira, que as políticas de ação afirmativa não configurariam
meras concessões do Estado, mas deveres extraídos dos princípios constitucionais. Assim, as cotas encontrariam amparo na
Constituição”.36
5. O DISCURSO SOBRE A VALIDADE DO CRITéRIO RACIAL PARA CONCRETIZAÇÃO DE
POLíTICAS DE COTAS
Segundo Stuart Hall37, discurso seria um modo de falar, pensar
ou de representar um dado assunto ou tópico sobre o qual produz um
significativo conhecimento, que influencia as práticas sociais, com reais
consequências e efeitos. Discursos não são redutíveis a interesses de
34 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Cit., p. 213.
35 RANIERI, Nina [Coord.]. Direito à educação: igualdade e discriminação no
ensino. Cit., p. 38.
36 Trecho da ADPF n. 186/DF publicado no informativo n. 663 do STF, disponível
em HTTP://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo663.
htm#Políticas de ação afirmativa e reserva de vagas em universidades públicas - 1.
Acesso: 04.06.2012.
37 HALL, Stuart. The West and the rest: discourse and Power. Cit., p. 205.
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classes, embora sempre opere em relação de força (são parte do modo
como a força circula e é contestada). A questão se um discurso é verdadeiro ou falso é menos importante do que se ele é efetivo na prática.
Quando o discurso é efetivo (organizando e regulando relações de força) é chamado de regime da verdade.
Os grupos racializados são oprimidos pela exploração capitalista, resultando em um mercado de trabalho segmentado tendente a reservar trabalhos menos importantes, mais mal remunerados.38
Segundo Nina Ranieri39, de um modo geral, a legislação e os projetos de lei sobre a matéria adotam variáveis como renda individual ou
familiar, tempo de permanência na escola pública, raça, etnia, cor da
pele ou local de residência, para estabelecer o discrimen; e conclui que
“Outros diversos atos legislativos e normativos disciplinam, direta ou
indiretamente, matéria conexa, sendo a (sic) idéia de diversidade ou de
igualdade racial marcada, também nesses casos, como indicativa,, ou
relativa» a indivíduos de cor negra, a denotar forte preocupação com o
tema da inclusão.”
Ao rever parcialmente sua posição contrária às cotas educacionais, Nina Ranieri40 ressalva sua discordância em relação ao critério racial como elemento determinador das ações afirmativas. Explica que
apesar da inegável desigualdade social entre brancos e negros e da real
existência de preconceito em relação aos indivíduos de cor negra41, não
podem ser negados os benefícios das ações afirmativas àqueles em situação de desvantagem educacional, devido a causas socioeconômicas,
independentemente da cor, etnia, procedência, religião, cultura ou local
de moradia.
Um outro fator que, normalmente, coloca em cheque a distribuição de vagas pelo critério racial é o de a pessoa, após beneficiada
por esse direito, não se apresentar à sociedade como cotista. Em sua
tese de livre-docência, Gislene Aparecida dos Santos42 constatou que
muitos alunos por ela entrevistados afirmavam que grande quantidade
38 YOUNG, Iris Marion. Structural Injustice and the Politics of Difference. Cit.,
p. 51.
39 RANIERI, Nina [Coord.]. Direito à educação: igualdade e discriminação no ensino. Cit., p. 42.
40 RANIERI, Nina [Coord.]. Direito a educação: igualdade e discriminação no ensino. Cit., p. 48-49.
41 Tecnicamente, não se poderia falar em cor negra, mas em raça negra, pois cores
seriam, por exemplo, pretos e pardos.
42 SANTOS, Gislene Aparecida dos. Reconhecimento, utopia, distopia: os sentidos
da política de cotas raciais. Cit., p. 83.
109
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de estudantes cotistas, após ingressarem em uma universidade pública
por meio das cotas, negavam sua forma de acesso, haja vista que não
se tornam públicos os dados sobre quem ingressou pelas cotas ou pela
ampla concorrência.
6. CONCLUSÃO
Décadas após a II Guerra Mundial a “revolução dos direitos humanos” desencadeou uma gama de ideias acerca de igualdade étnica e
racial, uma série de movimentos contestando “sistemas de hierarquia
étnico-racial, que preenchem a narrativa dos esforços contemporâneos
pelo multiculturalismo e por direitos de minorias.43
Uma efetiva participação dos negros no processo de formação
da vontade política e na elite intelectual do país frearia o processo de
imperialismo cultural, que torna “os diferentes” invisíveis. Essa dominação cultural traz a injustiça da insignificante expressividade em comparação com a cultura dominante, que impõe sua experiência e modo
de vida social.44
Como bem observa Bhikhu Parekh45, em uma sociedade multicultural, às vezes, é preciso ir mais além para garantir a alguns grupos, ou
a indivíduos desses grupos, não só direitos diferentes, mas também direitos adicionais. Se certos grupos foram marginalizados durante muito
tempo, carecem da confiança e das oportunidades necessárias para participarem como iguais na sociedade, de modo que, em certos casos, se
tenha que conceder-lhes direitos que não estejam ao alcance de outros.
À guisa de conclusão, Ronald Dworkin expõe que:
Temos, todos nós, inteira razão ao desconfiarmos das classificações por raça. Elas têm sido usadas para negar, em vez de respeitar, o
direito à igualdade, e todos nós estamos conscientes da injustiça que
daí decorre. Mas se entendermos mal a natureza dessa injustiça, ao não
estabelecermos as distinções simples que são necessárias para o seu entendimento, estaremos correndo o risco de cometer ainda mais injustiças. Pode ser que os programas de admissão preferencial não criem, de
fato, uma sociedade mais igualitária, pois é possível que não tenham
os efeitos imaginados por seus advogados. Essa questão estratégica de43 KYMLICKA, Will. Multicultural Odysseys. Cit., p. 88.
44 YOUNG, Iris Marion. Structural Injustice and the Politics of Difference. Cit.,
p. 60.
45 PAREKH, Bhikhu. Repensando el multiculturalismo: diversidade cultural y
teoria política. Tradução de Sandra Chaparro. Madrid: Istmo, 2005. p. 385.
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veria estar no centro do debate sobre esses programas. Não devemos,
porém, corromper esse debate imaginando que tais programas são injustos mesmo quando funcionam. Precisamos ter o cuidado de não usar
a Cláusula de Igual Proteção para fraudar a igualdade.46
Portanto, acredita-se que as cotas raciais sejam um mecanismo
de reforço ao processo de reconhecimento dos negros como sujeitos de
direito, no sentido emprestado ao termo por Axel Honneth47, ou seja,
em uma perspectiva intersubjetiva em que se relacionam e se confirmam reciprocamente como pessoas individuadas em uma medida cada
vez maior. Essas esferas são o amor, o direito e a solidariedade.
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