UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUEOLOGIA
TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS DAS FORTIFICAÇÕES PORTUGUESAS
DA CAPITANIA DE PERNAMBUCO, BRASIL, NOS SÉCULOS XVI E XVII
MANUELA XAVIER GOMES DE MATOS
Recife
2016
MANUELA XAVIER GOMES DE MATOS
TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS DAS FORTIFICAÇÕES PORTUGUESAS
DA CAPITANIA DE PERNAMBUCO, BRASIL, NOS SÉCULOS XVI E XVII
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Arqueologia da UFPE, Departamento de Arqueologia,
como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor
em Arqueologia.
Orientador: Profº. Drº. Paulo Martin Souto Maior
Co-orientador: Profº. Drº. Carlos Celestino Rios e Souza
Recife
2016
Catalogação na fonte
Bibliotecária Maria Janeide Pereira da Silva, CRB4-1262
M433t
Matos, Manuela Xavier Gomes de.
Transformações tecnológicas das fortificações portuguesas da Capitania de
Pernambuco, Brasil, nos séculos XVI e XVII / Manuela Xavier Gomes de Matos.
– 2016.
243 f. : il. ; 30 cm.
Orientador: Prof. Dr. Paulo Martin Souto Maior.
Coorientador: Prof. Dr. Carlos Celestino Rios e Souza.
Tese (doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, CFCH. Programa de
Pós-graduação em Arqueologia, 2016.
Inclui Referências.
1. Arqueologia. 2. Arqueologia e história. 3. Fortificações. 4. Arqueometria. 5. Arqueologia
da arquitetura. I. Souto Maior, Paulo Martin (Orientador). II. Souza, Carlos
Celestino Rios e (Coorientador). III. Título.
930.1 CDD (22. ed.)
UFPE (BCFCH2017-022)
MANUELA XAVIER GOMES DE MATOS
TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS DAS FORTIFICAÇÕES PORTUGUESAS
DA CAPITANIA DE PERNAMBUCO, BRASIL, NOS SÉCULOS XVI E XVII
Dissertação ou Tese apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Arqueologia da Universidade Federal de
Pernambuco, como requisito parcial para
a obtenção do título de Doutor em
Arqueologia.
Aprovada em: 14/03/2016.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________________
Profª Drª Ana Catarina Peregrino Torres Ramos (Examinador Interno)
Universidade Federal de Pernambuco
___________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Celestino Rios e Souza (Examinador Interno)
Universidade Federal de Pernambuco
_________________________________________________
Prof. Dr. Henry Socrates Lavalle Sullasi(Examinador Interno)
Universidade Federal de Pernambuco
_________________________________________________
Prof. Dr. José Luiz Mota Menezes (Examinador Externo)
Universidade Federal de Pernambuco
______________________________________________________
Prof. Dr. Rômulo Luiz Xavier do Nascimento (Examinador Externo)
Universidade Federal de Pernambuco
A Walkiria e Aécio, meus pais.
AGRADECIMENTOS
A todos que contribuíram com a realização desse desafio.
RESUMO
Esta tese está focada na análise dos processos construtivos das fortificações que compuseram
os sistemas defensivos da Capitania de Pernambuco nos séculos XVI e XVII, antes, durante e
depois da ocupação holandesa. A análise das fortificações, enquanto objeto de pesquisa que
materializou em seu processo construtivo as posturas colonizadoras portuguesas, se
desenvolveram no âmbito da arqueologia histórica. Neste sentido, este estudo pode ser
considerado um esforço teórico para se compreender o modelo de colonização implantado na
Capitania. O desafio maior foi, portanto, desvendar os processos construtivos das fortificações
à luz das referências europeias e dos tratados sobre fortificação, buscando identificar as
tecnologias de fortificação utilizadas ao longo dos dois primeiros séculos e constatar a
articulação entre a cultura portuguesa e o real aporte tecnológico holandês. A partir destas
constatações técnicas, buscaram-se explicar as razões que motivaram os portugueses a escolher
determinadas tecnologias, inclusive aquelas relacionadas aos contextos políticos, econômicos
e culturais. As principais conclusões das análises realizadas, nesta perspectiva, indicam que, ao
longo de dois séculos, ocorreram transformações tecnológicas nas fortificações de Pernambuco
e que estas transformações sofreram influência da escola holandesa de fortificação, aumentando
seu nível de eficácia bélica.
Palavras-chave:
Arqueologia.
Arqueologia da Arquitetura.
Arqueologia
e
história.
Fortificações.
Arqueometria.
RÉSUMÉ
Cette thèse se concentre sur l'analyse des processus de construction des fortifications qui
composent les systèmes défensifs de la Capitania de Pernambuco au cours des XVIe et XVIIe
siècles, avant, pendant et après l'occupation hollandaise. L'analyse des fortifications, comme un
objet de recherche qui se matérialisa dans son processus de construction, les postures coloniales
portugaises, développé sous l'archéologie historique. Ainsi, cette étude peut être considérée
comme un effort théorique pour comprendre le modèle de la colonisation implanté dans la
Capitania. Le plus grand défi a été donc de découvrir les processus de construction des
fortifications à la lumière des références européennes et traités sur les fortifications, en
cherchant à identifier les technologies de fortification utilisées au cours des deux premiers
siècles, et d'établir le lien entre la culture portugaise et le réel soutien technologique
Néerlandais. Finalement, à partir de ces constatations techniques, on a cherché à expliquer les
motivations pour lesquelles les Portugais ont choisis certaines technologies, y compris celles
liées à des contextes politiques, économiques et culturels. Les principales conclusions des
analyses effectuées dans cette perspective plus complexe, indiquent que, au cours de ces deux
siècles, il ya eu des changements technologiques dans les fortifications de Pernambuco et que
ces changements ont été influencés par l'école néerlandaise de fortifications, en augmentant le
niveau d'efficacité défensif.
Mots-clés: Archéologie. Archéologie et histoire. Fortification. Archéométrie. Archéologie de
l'Architecture.
ABSTRACT
This thesis is focused on analysis of construction processes of the fortifications that made up
the defensive systems of the Capitania of Pernambuco during the sixteenth and seventeenth
centuries, before, during and after the Dutch occupation. The analysis of the fortifications, as
an object of research that materialized in its construction process the Portuguese colonial
postures, developed under the historical archeology. Thus, this study can be considered a
theoretical effort to understand the colonization model implanted in the Captaincy. The biggest
challenge was therefore uncover the construction processes of the fortifications in the light of
European and treated references on fortification, seeking to identify the fortification
technologies used over the first two centuries, and establish the link between Portuguese culture
and the real technological support Dutch. Finally, from these technical findings, it sought to
explain the reasons for the Portuguese to choose certain technologies, including those related
to political, economic and cultural contexts. The main conclusions of the analyzes performed
in this more complex perspective, indicate that, during these two centuries, there have been
technological changes in the fortifications of Pernambuco and that these changes were
influenced by the Dutch school of fortifications, increasing their level of effectiveness war.
Keywords: Archaeology. Archaeology and history. Fortification. Archeometry. Archaeology
of Architecture.
LISTA DE SIGLAS
CAD
Computer Aided Design
DRX
Difração de Raios-X
ET
Estação Total
FRX
Fluorescência de Raios-X
PPArq
Programa de Pós-Graduação em Arqueologia
UFPE
Universidade Federal de Pernambuco
WIC
West-Indische
Compagnie
(Companhia
das
Índias
Ocidentais)
VOC
Vereenigde Oost-Indische Compagnie (Companhia das
Índias Orientais)
LISTA DE FIGURAS
Figura 1.
Fortaleza de Mazagão, no litoral norte da África, foi construída em 1514 e
melhorada em 1541 pelos portugueses. Observa-se a utilização de elementos que virão a
compor no século
XVII o tipo de Fortificação Moderna, abaluartada.
Fonte:
historiasdeportugalemarrocos.files.wordpress.com.................................................................. 44
Figura 2.
Fortaleza de São Sebastião, da Ilha de Moçambique, construída pelos portugueses
a partir de 1554 apresentava planta de formato retangular com quatro baluartes angulares, já
apresentando o formato pentagonal. Fonte: site mundo.guru e fortalezas.org. ........................ 45
Figura 3.
Fortaleza de São Lourenço construída a partir de 1581 em Funchal, na Ilha da
Madeira, onde se observa que apesar da construção contar com altas muralhas, de herança
medieval, foram inseridos baluartes. Esses baluartes, no entanto, eram ainda pouco salientes e
tinham as faces paralelas às cortinas. Portugal. Fonte: site fortaleza.org. ................................ 46
Figura 4.
Fortaleza de São Filipe do Monte Brasil construída a partir de 1593, em Angra do
Heroísmo, Açores, Portugal, onde foram utilizados baluartes poligonais, com formato mais
próximo dos baluartes modernos. Fonte: site pt.wikipedia.org e Carlos Luis MC da Cruz o site
pt.wikipedia.org. ....................................................................................................................... 47
Figura 5.
Forte de São Lourenço da Cabeça Seca, construído 1607 na foz do rio Tejo, na
União das freguesias de Oeiras e São Julião da Barra, Paço de Arcos e Caxias, concelho de
Oeiras, distrito de Lisboa, em Portugal. Esse projeto, apesar de não utilizar baluartes, representa
o processo de experimentação para construção de modelos modernos na medida em que propõe
uma estrutura sólida para se defender das armas de fogo. Fontes: fortalezas.org e wikimedia.org.
48
Figura 6.
Esquema de uma fortificação moderna, abaluartada, com seus elementos básicos:
cortina e baluarte. ..................................................................................................................... 67
Figura 7.
Representação das linhas flancantes e das faixas de defesa de uma fortificação
moderna, abaluartada, que partem do flanco e passam paralelas à face do baluarte contíguo. 67
Figura 8.
Esquema de uma fortificação moderna, abaluartada, com seus principais
elementos: 7.Esplanada; 8.Caminho coberto; 9.Contra escarpa do fosso; 10.Fosso; 11.Refocete;
12. Escarpa do fosso; 13.Berma; 14.Escarpa externa do reparo; 15.Parapeito; 16.Banqueta;
17.Terrapleno; 18. Escarpa interna do reparo; 19.Esplanada; 20.Tenalha; 21.Revelim em meialua; 22.Hornaveque; 23.Fosso; 24.Baluarte com orelhões; 25.Revelim; 26. Baluarte regular; 27.
Tenalha composta - Chapéu de bispo; 28. Praça de Armas; 29.Caminho coberto;
30.Contraguarda; 31.Cortina; 32.Tenalha; 33.Chapéu de bispo; 34. Coroada; 35. Cavaleiro.
Fonte: modificado de Chambers, 1728. .................................................................................... 71
Figura 9.
Extensão do Império colonial português e espanhol no século XVI. Fonte: site
fichasmarra.files.wordpress.com. ............................................................................................. 77
Figura 10.
Representação holandesa de 1630 da Vila de Olinda onde se vêem as fortificações
que compunham o sistema defensivo português nessa vila: a Guarita de João Albuquerque.
1620 e o Forte de São Francisco de Olinda. Original manuscrito do Algemeen Rijcksarchief.
(REIS, 2000. p. 83). .................................................................................................................. 85
Figura 11.
Representação holandesa de 1617 do sistema defensivo português na Capitania
de Pernambuco onde se vêem 1. Forte de São Francisco da Barra e 2. Forte de São Jorge.. “Ont
voerp van stadt parnambuco| D. Ruit.s fecit”. Original manuscrito do Algemeen Rijksarchief,
Haia. Ca. 1617. (REIS, 2000. p. 75). ........................................................................................ 85
Figura 12.
Localização das fortificações construídas pelo colonizador português antes da
invasão holandesa. (modificado do site Google Earth). ........................................................... 86
Figura 13.
Localização das fortificações construídas por Matias de Albuquerque na
eminência da invasão holandesa. (modificado do site Google Earth). ..................................... 87
Figura 14.
Localização das fortificações construídas pelo colonizador português durante a
invasão holandesa. (modificado do site Google Earth). ........................................................... 94
Figura 15.
Ilustração
denominada
“CAERTE
VANDE
HAVEN
VAN
PHARNAMBOCQUE”, de 1639. Fonte: REIS, 2000. p. 86. .................................................. 97
Figura 16.
Localização das fortificações construídas pelo invasor holandês durante a invasão
holandesa. (modificado do site Google Earth). ........................................................................ 99
Figura 17.
Localização das fortificações construídas pelos portugueses após a capitulação
holandesa (modificado do site Google Earth). ...................................................................... 104
Figura 18.
Localização das fortificações selecionadas para serem objeto de estudo desta
pesquisa (modificado do site Google Earth)........................................................................... 105
Figura 19.
Representação dos três tipos de torreão, segundo o tratado de Albretch Dürer
(Dürer, 1527. p. 8, 32 e 37). ................................................................................................... 111
Figura 20.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Cataneo, do
tipo Cidadela ou Castelo, que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas
em Pernambuco. Modificado de Cataneo, 1567: p.17-21. ..................................................... 117
Figura 21.
Identificação das partes de uma fortificação listadas por Scamozzi como sendo as
principais partes de uma fortificação Real. Fonte: modificado de SCAMOZZI, 1615, p.
194/195. Disegno della meta della fortezza d’otto lati com tutto le sue parti e diffese reali. 119
Figura 22.
Simulação do formato das fortificações de quatro e cinco lados a partir de
polígonos regulares de 180 passa de lado, com indicação do ângulo do baluarte resultante.
Fonte: modificado de Scamozzi, 1615. p. 185. ...................................................................... 120
Figura 23.
Apresentação dos nomes de linhas a partir do tipo Castelo e Cidadela usando
formato de polígono regular de cinco lados. Fonte: modificado de Scamozzi, 1615............. 121
Figura 24.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Scamozzi, do
tipo Castelo ou Cidadela, que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas
em Pernambuco. modificado de Scamozzi, 1615. .................................................................. 122
Figura 25.
Apresentação dos nomes de linhas nas fortificações abaluartadas usando formato
de polígono regular de quatro lados. Baseado em Figura XV, Goldman, 1645. p. 14. .......... 125
Figura 26.
Apresentação dos nomes de linhas a partir nos tipos redutos e estrela usando
formato de polígono regular de quatro lados. Baseado em Goldman, 1645. p. 3-12. ............ 127
Figura 27.
Representação dos perfis das obras de fortificação com indicação da inclinação
da escarpa exterior do Reparo, segundo o tratado de Nicolas Goldman (Goldman, 1645. p. 5255).
129
Figura 28.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Goldman, do
tipo Forte Quadrantal, que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em
Pernambuco. Modificado de Goldman, 1615. ........................................................................ 130
Figura 29.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Goldman, do
tipo Meio Forte, que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em
Pernambuco. Modificado de Goldman, 1615. ........................................................................ 131
Figura 30.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Goldman, do
tipo Reduto e Estrela que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em
Pernambuco. Modificado de Goldman, 1615. ........................................................................ 131
Figura 31.
Representação localizando linhas e ângulos nas fortificações. Baseado em Figura
XIV, Dogen, 1648. p. 26. ....................................................................................................... 134
Figura 32.
Representação do perfil de uma fortificação com indicação das alturas EF da
muralha exterior. As medidas são em Verges Rhynlandiques que equivale a 10 pièds de Rhein,
que equivale a 0,31385 metros, ou seja, uma verge Rhynlandique equivale a 3,1385 metros.
Baseado em Figura LVIII, Dogen, 1648. p. 82 e 83............................................................... 137
Figura 33.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Dogen, do tipo
Fortaleza que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em Pernambuco.
Modificado de Dogen, 1648. .................................................................................................. 138
Figura 34.
Compartimentação estratigráfica de Pernambuco identificando, em vermelho, a
área onde estão localizadas as fortificações portuguesas construídas nos séculos XVI e XVII.
Fonte: modificado de Gomes et al. (2001) em Dantas & Lima Filho, 2006. ......................... 143
Figura 35.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para
construção, através de raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como pontos centrais o Forte
de Santa Cruz de Itamaracá, Forte de São Francisco de Olinda e Forte Real do Bom Jesus. 144
Figura 36.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para
construção, através de raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como pontos centrais o Forte
do Brum, Forte São Francisco da Barra e Forte São Tiago das Cinco Pontas. ...................... 146
Figura 37.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para
construção, através de raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como pontos centrais o Forte
de São Francisco Xavier de Gaibú e Forte de Nossa Senhora de Nazaré. ............................. 147
Figura 38.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para
construção, através de raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como ponto central o Forte
Santo Inácio de Loyola de Tamandaré. .................................................................................. 147
Figura 39.
Duas diferentes representações do Forte de São Jorge, construído no Istmo de
Recife e Olinda, em 1590. Vista do Recife de Peeter Gillis, 1637, onde está identificado o Forte
de São Jorge. 2. Recorte de estampa e folheto holandês de 1630: “de Stadt Olinda de
Pharnambuco...”. .................................................................................................................... 150
Figura 40.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Francisco da Barra, com indicação das
linhas e ângulos e suas medidas. ............................................................................................ 154
Figura 41.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Francisco de Olinda, com indicação das
linhas e ângulos e suas medidas. ............................................................................................ 160
Figura 42.
Planta do Forte Real do Bom Jesus (1635). Arquivo Geral do Reino (Haia).
Buitenlandse Kaarten n. 2.160 do Inventário Leupe. Publicada por Gonçalves de Mello, 1961.
163
Figura 43.
Planta Baixa da Muralha do Fortim Arraial do Bom Jesus, com indicação das
linhas e ângulos e suas medidas relativas, retiradas a partir de um projeto presente na
iconografia histórica. .............................................................................................................. 164
Figura 44.
Forte de Nossa Senhora de Nazaré. Fonte: MENEZES. 1986. p. 106. ............ 168
Figura 45.
Planta Baixa da Muralha do Forte Nossa Senhora de Nazaré, com indicação das
linhas e ângulos e suas medidas. ............................................................................................ 169
Figura 46.
Planta de 1799 do Forte de São Francisco Xavier de Gaibu e sua localização.
Fonte: MENEZES. 1986. p. 105. ........................................................................................... 174
Figura 47.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Francisco Xavier de Gaibú, com indicação
das linhas e ângulos e suas medidas. ...................................................................................... 175
Figura 48.
Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Planta de 1763. .......................................... 181
Figura 49.
Planta com mapa de danos de 1788. Fonte: Arquivo do Exército do Rio de Janeiro
(Código da mídia: 01.01.0023). .............................................................................................. 182
Figura 50.
Espacialização do estado de conservação do Forte de Santa Cruz de Itamaracá em
1969/73. Fonte: autora, a partir de fotos existentes no Acervo do IPHAN, Forte Orange, Caixa
8 de A a H. 183
Figura 51.
Obra realizada em 1999. Recomposição da muralha leste, no encontro com o
baluarte 2. Fonte: autora, a partir de fotos existentes no Acervo do IPHAN, Forte Orange, Caixa
8 de A a H. 184
Figura 52.
Planta Baixa da Muralha do Forte de Santa Cruz de Itamaracá, com indicação das
linhas e ângulos e suas medidas. ............................................................................................ 185
Figura 53.
Espacialização dos Sistemas construtivos (SC) identificados no Forte de Santa
Cruz de Itamaracá. .................................................................................................................. 187
Figura 54.
Planta do Forte do Brum, após a capitulação dos holandeses. Fonte: MENEZES.
1986. p. 102. 191
Figura 55.
Planta Baixa da Muralha do Forte do Brum, com indicação das linhas e ângulos
e suas medidas. ....................................................................................................................... 192
Figura 56.
Espacialização dos Sistemas construtivos identificados no Forte do Brum. .... 194
Figura 57.
Ilustração
denominada
“CAERTE
VANDE
HAVEN
VAN
PHARNAMBOCQUE”, de 1639. Legenda: 2.Forte das Cinco Pontas. 5. Forte Ernesto. 6.
Reduto da Boa Vista. 7. Forte Emilia. .................................................................................... 196
Figura 58.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Tiago das Cinco Pontas, com indicação
das linhas e ângulos e suas medidas. ...................................................................................... 197
Figura 59.
Planta Baixa da Muralha do Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, com
indicação das linhas e ângulos e suas medidas. ...................................................................... 202
Figura 60.
Análise da Configuração Geométrica do Forte Real do Bom Jesus, para realizar a
sua classificação tipológica, entre Fortificação de Transição e Fortificação Moderna. ......... 208
Figura 61.
Análise da Configuração Geométrica do Forte de Nossa Senhora de Nazaré, para
realizar a sua classificação tipológica, entre Fortificação de Transição e Fortificação Moderna.
Fonte da imagem: site cidadeinformacao.pt. .......................................................................... 210
Figura 62.
Planta de fortificação genérica com nomes de linhas e ângulos que compõe a sua
Configuração Geométrica. ...................................................................................................... 213
Figura 63.
Quadro-síntese, com plantas apresentadas na mesma escala, dos modelos
idealizados selecionados dos Tratados de Fortificação e das Fortificações Modernas construídas
em Pernambuco que serão objeto de análise comparativa entre si. ........................................ 214
Figura 64.
Sobreposição da planta do Forte de Santa Cruz de Itamaracá com a planta do
modelo de Matthias Dogen selecionado a partir da comparação dos valores das suas medidas
lineares e angulares. ................................................................................................................ 216
Figura 65.
Sobreposição da planta do Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré com a
planta do modelo de Matthias Dogen selecionado a partir da comparação dos valores das suas
medidas lineares e angulares. ................................................................................................. 219
Figura 66.
Sobreposição da planta do Forte de São Tiago das Cinco Pontas com a planta do
modelo de Matthias Dogen selecionado a partir da comparação dos valores das suas medidas
lineares e angulares ................................................................................................................. 220
Figura 67.
Representação das faixas de defesa nos modelos europeus e nas fortificações de
Pernambuco, utilizando as plantas com a mesma medida do lado externo para poder comparar
a largura das faixas e consequentemente, verificar quais plantas apresentam maior capacidade
de defesa.
224
Figura 68.
Sobreposição Tratado x fortificações. .............................................................. 226
Figura 69.
Simulação da evolução das fortificações construídas em Pernambuco antes da
invasão holandesa: Fortificação de Transição; e após a saída dos holandeses, Fortificação
moderna abaluartada, que reuniu o Modelo holandês, material construtivo italiano e inclinação
do século XVI. ........................................................................................................................ 234
LISTA DE FOTOS
Foto 1.
Fortaleza dos Reis Magos construída pelos portugueses, a partir de 1598, na
capitania do Rio Grande no Norte, Nordeste do Brasil. O projeto contava com muralha contendo
dois meio-baluartes e um cavaleiro na cortina oposta. Fonte: site fortaleza.org. ..................... 48
Foto 2.
Praça-forte de Elvas, modernizada a partir de 1641 com projeto de Cosmander,
sob o governo de Matias de Albuquerque. Fonte: The Garrison Border Town of Elvas and its
Fortifications, 2010. .................................................................................................................. 50
Foto 3.
Castelo de Algoso (Conselho de Vimioso, Bragança) que materializa as
adaptações sofridas pelas Fortificações Medievais na primeira fase da Fortificação de
Transição. A antiga Torre de Menagem foi incorporada num dos ângulos da nova fortificação.
Fonte: site welcomenordeste.net. ............................................................................................. 62
Foto 4.
Castelo Portel Alentejo, modificado pelo Engenheiro Francisco de Arruda em
1510. Seis dos oito tambores foram rasgados por canhoneiras em dois níveis de tiro. Fonte: site
c2.staticflickr.com. ................................................................................................................... 63
Foto 5.
Castelo de Cerca Nova de Lagos, localizado em Lagos, distrito de Faro no
Algarve, foi modificado de 1520 a 1544. Apresenta muralha ainda no estilo medieval, sem
canhoneiras. Mas tem baluarte atípico onde a estrutura é pouco saliente e paralela à muralha
com grandes orelhões onde estão posicionadas as armas de fogo. Fonte: site
museudigitalafroportugues.files.wordpress.com. ..................................................................... 64
Foto 6.
Castelo de Évoramonte,, localizado no município de Evoramonte, concelho de
Estremoz, distrito de Évora, no Alentejo, apresenta planta quadrangular com quatro tambores.
Fonte: site pt.wikipedia.org. ..................................................................................................... 65
Foto 7.
Possível localização do Forte de São Jorge, na área central do Recife (modificado
do Google earth, em 26.01.2017). .......................................................................................... 149
Foto 8.
Ruinas do Forte de São Francisco da Barra, porção leste. ............................... 151
Foto 9.
Localização do Forte de São Francisco da Barra, na área central do Recife
(modificado do Google earth, em 19.09.2014). ...................................................................... 152
Foto 10.
Forte São Francisco da Barra na fotografia de Marc Ferrez de 1875. Fonte:
MENEZES. 1986. p. 114. ....................................................................................................... 153
Foto 11.
Remanescentes do Forte de São Francisco da Barra. Observa-se parte da
configuração geométrica em formato de um polígono regular de nove lados e a forma de sua
estrutura construtiva, em raios partindo dos vértices em direção ao centro. .......................... 155
Foto 12.
Perfil leste do Forte de São Francisco da Barra onde se evidenciam os materiais
construtivos utilizados. ........................................................................................................... 156
Foto 13.
Tipos de rocha do Forte de São Francisco da Barra. Rocha tipo 1. Rocha da
alvenaria estrutural, do anel exterior que delimita a fortificação. e Rocha tipo 2. Rocha da
alvenaria estrutural, especificamente, dos raios que partem dos vértices em direção ao centro.
Imagem extraída a partir do Microscópio Digital portátil Dino-Lite PLUS, com aumento de
55x.
156
Foto 14.
Forte de São Francisco de Olinda, construído pelos portugueses em 1620. .... 158
Foto 15.
Localização do Forte de São Francisco de Olinda, Olinda, no Estado de
Pernambuco (modificado do Google earth, em 19.09.2014). ................................................. 159
Foto 16.
Cortina leste do Forte de São Francisco de Olinda onde há uma rachadura com
exposição de argamassa. ......................................................................................................... 161
Foto 17.
Localização do Forte Real do Bom Jesus, no município de Recife, no Estado de
Pernambuco (modificado do Google earth, em 04.10.2014). ................................................. 162
Foto 18.
Remanescentes do fosso duplo do Forte Real do Bom Jesus depois da realização
de escavações arqueológicas, nas décadas de 60, 80 e anos 2000. Fonte: site 2.bp.blogspot.com.
165
Foto 19.
Forte Nossa Senhora de Nazaré, no Cabo de Santo Agostinho, litoral sul do
Estado de Pernambuco............................................................................................................ 166
Foto 20.
Localização do Forte Nossa Senhora de Nazaré, localizado na Vila de Nazaré,
município de Cabo de Santo Agostinho no Estado de Pernambuco (modificado do Google earth,
em 18.09.2014). ...................................................................................................................... 166
Foto 21.
Cortina Oeste do Forte de Nossa Senhora de Nazaré onde se vêem os diferentes
formatos e dimensões de rocha das alvenarias de pedra que compõe a fortificação. ............. 170
Foto 22.
Cortina Leste do Forte de Nossa Senhora de Nazaré onde se vê a alvenarias de
pedra cujas rochas apresentam formato irregular e dois tipos de dimensões. ........................ 170
Foto 23.
Rocha do Forte de Nossa Senhora de Nazaré. 1. Rocha tipo 1; 2. Rocha tipo 2.
Rocha do afloramento rochoso. Imagem extraída a partir do Microscópio Digital portátil DinoLite PLUS, com aumento de 55x............................................................................................ 171
Foto 24.
Forte de São Francisco Xavier de Gaibu. ......................................................... 173
Foto 25.
Localização do Forte de São Francisco Xavier de Gaibu, localizado na Praia de
Gaibu, município de Cabo de Santo Agostinho no Estado de Pernambuco (modificado do
Google earth, em 04.10.2014). ............................................................................................... 174
Foto 26.
Cortina Sul do Forte de São Francisco Xavier de Gaibú onde se vê a
homogeneidade do sistema construtivo utilizado. .................................................................. 176
Foto 27.
Rochas do Forte de São Francisco Xavier de Gaibú. 1. Rocha do afloramento
rochoso; 2. Rocha tipo 1 do encontro entre as cortinas 2 e 3 (Nordeste e Noroeste). 3. Rocha do
tipo 2, da cortina 4 (Oeste). Imagem extraída a partir do Microscópio Digital portátil Dino-Lite
PLUS, com aumento de 55x. .................................................................................................. 177
Foto 28.
Fachada Sul do Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Baluarte 1, esquerda; Baluarte
2, direita.
179
Foto 29.
Localização do Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Ilha de Itamaracá, Estado de
Pernambuco (modificado do Google earth, em 25.08.2014). ................................................. 180
Foto 30.
Tipos de rocha do Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Rocha 1 (SC1); Rocha 2
(SC2); Rocha 3 (SC3); Rocha 4 (SC4); e Rocha 6 (SC6). Imagem extraída a partir do
Microscópio Digital portátil Dino-Lite PLUS, com aumento de 55x. ................................... 188
Foto 31.
Forte do Brum. Fonte:site turismonorecife.com.br. ......................................... 190
Foto 32.
Localização do Forte do Brum, localizado na Ilha do Recife, bairro do Recife, no
Estado de Pernambuco (modificado do Google earth, em 04.10.2014). ................................ 190
Foto 33.
Forte de São Tiago das Cinco Pontas, localizado no bairro de São José, no centro
do Recife.
195
Foto 34.
Localização do Forte de São Tiago das Cinco Pontas, no bairro de São José, no
centro do Recife, Estado de Pernambuco (modificado do Google earth, em 04.10.2014)..... 196
Foto 35.
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, localizado no município de
Tamandaré, litoral sul do Estado de Pernambuco. ................................................................. 200
Foto 36.
Localização do Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, município de
Tamandaré, litoral sul do Estado de Pernambuco (modificado do Google earth, em 04.10.2014).
200
Foto 37.
Estrutura em alvenaria de pedra com restos de madeira, posicionadas nos locais
demarcados na imagem. A estrutura esta localizada ao longo da cortina sudeste do Forte de
Santa Cruz de Itamaracá. ........................................................................................................ 222
LISTA DE QUADROS
Quadro 1.
Simplificação da distribuição dos tipos de fortificação em relação aos tratados
europeus publicados ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII. .............................................. 41
Quadro 2.
Quadro-síntese das características físicas das fortificações de Pernambuco para
classificação tipológica. .......................................................................................................... 206
Quadro 3.
Quadro-síntese da classificação tipológica das fortificações de Pernambuco. . 206
Quadro 4.
Classificação tipológica das fortificações de Pernambuco construídas nos séculos
XVI e XVII. 211
Quadro 5.
Quadro-síntese da capacidade de defesa das fortificações de Pernambuco
relacionada à existência de linhas flancantes. ........................................................................ 225
Quadro 6.
Quadro-síntese da eficácia bélica das fortificações de Pernambuco. ............... 226
Quadro 7.
Quadro-síntese indicando a classificação tipológica, os modelos de fortificação
Moderna utilizados, a capacidade de defesa relacionada à existência de linhas flancantes e a
eficácia bélica das fortificações de Pernambuco durante as três fases bélicas desde o final do
século XVII até a primeira metade do século XVII. .............................................................. 232
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha
utilizados no Forte de São Francisco da Barra. A Rocha pertencem a alvenaria estrutural do
anel exterior que delimite a fortificação e as estruturas forma de raios que partem dos vértices
em direção ao centro. .............................................................................................................. 157
Gráfico 2.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha
utilizados no Forte de Nossa Senhora de Nazaré. 1. Rocha tipo 1; 2. Rocha tipo 2. Rocha do
afloramento rochoso. .............................................................................................................. 172
Gráfico 3.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha
utilizados no Forte de São Francisco Xavier de Gaibu. ......................................................... 178
Gráfico 4.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha
utilizados no Forte de Santa Cruz de Itamaracá. .................................................................... 189
Gráfico 5.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha
utilizados no Forte do Brum. A Rocha 1 (SC 1), Rocha 3 (SC 2), Rocha 5 (SC 3), Rocha 7 (SC
4) e Rocha 9 (SC 5). ............................................................................................................... 195
Gráfico 6.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada no tipo de rocha
utilizado no Forte São Tiago das Cinco Pontas. A Rocha 1 é referente a alvenaria localizada
nos encontros da muralha. ...................................................................................................... 199
LISTA DE TABELAS
Tabela 1.
Valores das tabelas de redução de medidas para o sistema métrico-decimal dos
tratados estudados e apresentados neste capítulo. Fonte: Da Graça, 1964. p. 155-188. ........ 108
Tabela 2.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Francisco da Barra. .............. 154
Tabela 3.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Francisco da Barra. ........... 154
Tabela 4.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Francisco de Olinda. ............ 160
Tabela 5.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Francisco de Olinda. ......... 160
Tabela 6.
Medidas lineares aferidas em campo. Fortim Arraial do Bom Jesus. .............. 164
Tabela 7.
Medidas angulares aferidas em campo. Fortim Arraial do Bom Jesus. ........... 164
Tabela 8.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte Nossa Senhora de Nazaré. .......... 169
Tabela 9.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte Nossa Senhora de Nazaré. ....... 169
Tabela 10.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Francisco Xavier de Gaibú. . 175
Tabela 11.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Francisco Xavier de Gaibú.
176
Tabela 12.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte Santa Cruz de Itamaracá. ............ 186
Tabela 13.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte Santa Cruz de Itamaracá. ......... 186
Tabela 14.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte do Brum. ..................................... 193
Tabela 15.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte do Brum. .................................. 193
Tabela 16.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Tiago das Cinco Pontas. ...... 198
Tabela 17.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Tiago das Cinco Pontas..... 198
Tabela 18.
Medidas lineares aferidas em campo e média. Forte Santo Inácio de Loyola de
Tamandaré. 202
Tabela 19.
Medidas angulares aferidas em campo e média. Forte Santo Inácio de Loyola de
Tamandaré. 203
Tabela 20.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas da fortificação. Forte Santa Cruz de
Itamaracá, 1654. ..................................................................................................................... 215
Tabela 21.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas da fortificação. Forte Santa Cruz de
Itamaracá, 1654. ..................................................................................................................... 216
Tabela 22.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas da fortificação. Forte do Brum, 1654. .. 217
Tabela 23.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas da fortificação. Forte do Brum, 1654. .. 217
Tabela 24.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas do Forte de Santo Inácio de Loyola de
Tamandaré, 1654. ................................................................................................................... 218
Tabela 25.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas do Forte de Santo Inácio de Loyola de
Tamandaré, 1654. ................................................................................................................... 218
Tabela 26.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas do Forte de São Tiago das Cinco Pontas,
1654.
220
Tabela 27.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados
do século XVII com o valor da média das medidas do Forte de São Tiago das Cinco Pontas,
1654.
220
Tabela 28.
Valores dos ângulos entre flanco e cortina do Forte de Santa Cruz de Itamaracá,
Forte de São Tiago das Cinco Pontas, Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré e Forte
do Brum obtidos no levantamento de campo para verificar sua proximidade com o ângulo de
90°.
222
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 27
CAPÍTULO 1.CONCEITOS
E
FERRAMENTAS
DE
ANÁLISE
............................................................................................................................ 34
1.1
TRATADÍSTICA DOS SÉCULOS XVI, XVII E XVIII COMO REFERÊNCIA
TECNOLÓGICA DE FORTIFICAÇÃO ....................................................................................... 34
1.1.1
Tratados do século XVI................................................................................................ 35
1.1.2
Tratados do século XVII .............................................................................................. 36
1.1.3
Tratados do século XVIII ............................................................................................. 39
1.1.4
Utilização dos tratados sobre fortificação pelos portugueses ....................................... 41
1.1.5
colônias
Exemplos de aplicação dos tratados em fortificações portuguesas em portugal e nas suas
...................................................................................................................................... 44
1.2
METODOLOGIA DE ANÁLISE .................................................................................. 51
1.2.1
Conceitos e ferramentas de análise .............................................................................. 52
1.2.2
Tratamento de dados e manipulação dos conceitos...................................................... 57
CAPÍTULO 2.CARACTERIZAÇÃO DAS FORTIFICAÇÕES EUROPEIAS DOS
SÉCULOS XVI E XVII QUE SERVEM DE REFERÊNCIA PARA PERNAMBUCO .. 60
2.1
A FORTIFICAÇÃO DE TRANSIÇÃO ......................................................................... 60
2.1.1
Configuração geométrica ............................................................................................. 61
2.1.1
Materiais construtivos .................................................................................................. 65
2.2
A FORTIFICAÇÃO MODERNA, ABALUARTADA ............................................................... 66
2.2.1
Configuração geométrica ............................................................................................. 68
2.2.2
Materiais construtivos .................................................................................................. 73
CAPÍTULO 3.FASES DOS SISTEMAS DEFENSIVOS DE PERNAMBUCO NOS
SÉCULOS XVI E XVII.......................................................................................................... 75
3.1
ANTECEDENTES HISTÓRICOS ................................................................................ 76
3.2
PRIMEIRA FASE BÉLICA (DO SÉCULO XVI ATÉ 1630) ........................................ 78
3.2.1
3.3
Fortificações do primeiro sistema defensivo português ............................................... 83
SEGUNDA FASE BÉLICA (1630-1654) ...................................................................... 87
3.3.1
Fortificações do segundo sistema defensivo português ............................................... 91
3.3.2
Fortificações do sistema defensivo holandês ............................................................... 94
3.4
3.4.1
TERCEIRA FASE BÉLICA (APÓS 1654) .................................................................... 99
Fortificações do terceiro sistema defensivo português............................................... 101
CAPÍTULO 4.COLETA DE DADOS DE REFERÊNCIA DE TRATADOS DOS
SÉCULOS
XVI
E
XVII
PARA
QUALIFICAÇÃO
DOS
MODELOS
DE
FORTIFICAÇÃO EM PERNAMBUCO ........................................................................... 106
4.1
TRATADOS DO SÉCULO XVI .................................................................................. 109
4.1.1
Instruction sur la fortification des villes, bourgs et chateaux ..................................... 109
4.1.2
L’architettura. ............................................................................................................. 113
4.2
TRATADOS DO SÉCULO XVII ................................................................................ 118
4.2.1
L’ idea della architettura universale ........................................................................... 118
4.2.2
La nouvelle fortification ............................................................................................. 124
4.2.3
L’architectura militair e moderne ou fortification ...................................................... 132
CAPÍTULO 5.LEVANTAMENTO DE DADOS FÍSICOS DAS FORTIFICAÇÕES
PORTUGUESAS DE PERNAMBUCO DOS SÉCULOS XVI E XVII ........................... 140
5.1
CONTEXTO GEOLÓGICO DE PERNAMBUCO PARA IDENTIFICAÇÃO DE FONTES
DE MATÉRIA-PRIMA UTILIZADA NAS FORTIFICAÇÕES ................................................. 141
5.1.1
Bacia sedimentar Recife-João Pessoa ........................................................................ 143
5.1.2
Bacia vulcano-sedimentar do Cabo ............................................................................ 145
5.2
FORTIFICAÇÕES DE PERNAMBUCO DOS SÉCULOS XVI E XVII..................... 148
5.2.1
Fortificações do primeiro sistema defensivo .............................................................. 148
5.2.2
Fortificações do segundo sistema defensivo .............................................................. 161
5.2.3
Fortificações do terceiro sistema defensivo ............................................................... 178
CAPÍTULO 6.COMPARAÇÃO ENTRE AS REFERÊNCIAS EUROPEIAS, OS
TRATADOS E AS FORTIFICAÇÕES DE PERNAMBUCO ......................................... 204
6.1
CLASSIFICAÇÃO TIPOLÓGICA .............................................................................. 204
6.2
IDENTIFICAÇÃO DE MODELOS EUROPEUS ....................................................... 211
6.3
VERIFICAÇÃO DA EFICÁCIA BÉLICA .................................................................. 223
CAPÍTULO 7.CONSIDERAÇÕES
FINAIS
.......................................................................................................................... 227
7.1
TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS ................................................................. 227
7.2
AS ESCOLHAS TECNOLÓGICAS COMO RESULTADO DAS POSTURAS
COLONIZADORAS .................................................................................................................... 235
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................. 238
27
INTRODUÇÃO
O tema que motivou este trabalho e o processo de investigação que foi trilhado buscou
contribuir para a construção do conhecimento sobre posturas colonizadoras portuguesas em
Pernambuco, Brasil. O foco da análise foi a dinâmica dos processos construtivos das
fortificações aqui localizadas, considerando as referências tipológicas europeias e os Tratados
sobre fortificação como base para verificar transformações tecnológicas.
Essa pesquisa se desenvolveu no âmbito da arqueologia histórica, onde se defende que a cultura
material reflete a maneira como os homens do passado compreendiam seu mundo. O vestígio
arqueológico foi, portanto, entendido como um símbolo. Segundo Renfrew, “... um símbolo é
algo que significa ou representa algo mais: um sinal visível de uma ideia, ou de qualidade, ou
de outro objeto” (Renfrew, 2001). Para este autor é possível interpretar o comportamento
humano através desses símbolos, e para tanto estabeleceu categorias para auxiliar na
estruturação da análise1.
No âmbito deste trabalho são analisados os comportamentos: projetivo, planejador e medidor
(Renfrew, 1993: p.453). Considerou-se assim, de partida, que as fortificações de Pernambuco,
objeto de pesquisa neste trabalho, materializam esses comportamentos nos processos
construtivos utilizados pelo colonizador português, portanto, são fontes fecundas de informação
sobre a cultura da região, no período colonial brasileiro. No conjunto e nas partes que compõem
uma edificação está concretizado o seu processo construtivo, ou seja, a seleção dos recursos
disponíveis e o domínio dos conhecimentos transmitidos por gerações que se sucedem.
Trabalhou-se, ainda, na perspectiva de que a análise de um edifício seja uma fortificação, uma
igreja, um palácio, ou mesmo, uma residência singela, é uma fonte confiável para se estudar
aspectos da cultura de uma sociedade. Segundo Gallay, dentre os enfoques através dos quais se
podem estudar os vestígios da cultura material, o enfoque tecnológico é um dos mais
susceptíveis de aprofundamento, pois apresenta um grau de incerteza menor sobre os resultados
alcançados, possibilitando, de maneira mais confiável, a reconstituição do passado (Gallay,
1986: p.38).
1
Segundo Renfrew as categorias do comportamento humano são seis: comportamento projetivo, planejador,
medidor, social, sobrenatural e representativo.
28
Defende-se, ainda, que a identificação de processos construtivos em vários momentos
temporais possibilitaria o estudo da dinâmica desses processos, permitindo conhecer as
transformações culturais de uma sociedade. Neste sentido, o estudo das fortificações
construídas em Pernambuco, e as transformações tecnológicas dos seus processos construtivos
ao longo dos séculos, podem ser considerados, portanto, como ferramenta de análise para
entender aspectos da colonização portuguesa em Pernambuco.
Em um primeiro olhar, todas as dez fortificações remanescentes na Capitania parecem,
tecnologicamente, semelhantes entre si. Contudo, em um olhar mais aprofundado, pode-se
verificar que, ao longo do segundo século de colonização portuguesa (segundo XVII), a
presença holandesa no território pernambucano aportou uma nova tecnologia de fortificação
que pode ter influenciado uma transformação tecnológica nas fortificações construídas pelo
colonizador português.
Os holandeses da Companhia das Índias Ocidentais (West-Indische Compagnie ou WIC)
invadiram Pernambuco em 1630 e permaneceram até 1654. A princípio, acreditava-se que a
diferença tecnológica estava no material construtivo utilizado pelos holandeses: a terra. Mas, a
partir do levantamento dos dados documentais e físicos, foi possível perceber uma realidade
mais complexa. Historicamente, a construção de uma fortificação teve como objetivo integrarse a um sistema defensivo. Essa estrutura era o resultado da experiência prática dos homens de
guerra, normatizada a partir de conhecimentos matemáticos, geométricos e trigonométricos,
com o objetivo de propor fortificações ideais, capazes de resistir ao ataque das novas armas: as
armas de fogo. A primeira fase da artilharia pirobalística (canhões de efeito moral) promoveu
mudanças na Fortificação Medieval, surgindo a de Transição; a segunda fase (canhões de efeito
de destruição) promoveu mudanças nas de Transição, fazendo surgir, então, a Fortificação
Moderna.
O desafio desse estudo foi, portanto, desvendar os processos construtivos das fortificações de
Pernambuco, construídas nos séculos XVI e XVII, à luz das referências tipológicas europeias e
dos Tratados sobre fortificação, buscando identificar as tecnologias de fortificação utilizadas
ao longo desses séculos e constatar se houve articulação entre a cultura portuguesa e o aporte
tecnológico holandês.
As fortificações estudadas foram aquelas que apresentaram remanescentes de estruturas
acessíveis, projetos de arquitetura quantificáveis ou iconografia representativa. As referências
29
europeias são os tipos de fortificações construídos na Europa desde o final o século XV até o
século XVIII: fortificação de Transição e Moderna. E os Tratados sobre fortificação referemse aos modelos de fortificação apresentados nesses documentos, publicados nos séculos XVI e
XVII.
As fortificações estudadas foram:
O Forte de São Jorge, localizado no bairro do Recife, região central da cidade,
construído pelos colonizadores portugueses a partir de 1590. Estudos confirmam sua
localização sob a Igreja de Nossa Senhora do Pilar, mas o Forte ainda não foi objeto de
pesquisas arqueológicas sistemáticas;
O Forte de São Francisco da Barra, localizado sobre os arrecifes na entrada do Porto, na
área central do Recife, construído pelos colonizadores portugueses a partir de 1606 e
que se encontra em estado de ruínas;
O Forte de São Francisco de Olinda, localizado na Praia de São Francisco, em Olinda,
construído pelos colonizadores portugueses entre 1620/1622;
O Forte Real do Bom Jesus, localizado no bairro de Casa Amarela, na cidade do Recife,
construído pelos colonizadores portugueses a partir de 1630. Da fortificação resta
apenas parte do fosso, identificado em pesquisas arqueológicas, que está preparado para
visitação. Conta, no entanto, com projeto de arquitetura a partir do qual foi possível
identificar características do seu processo construtivo;
O Forte de Nossa Senhora de Nazaré, localizado na Vila de Nazaré, município de Cabo
de Santo Agostinho, litoral sul do Estado de Pernambuco, construído pelos
colonizadores portugueses em 1630. Foi recuperado há algumas décadas pelo IPHAN e
está preparado para visitação;
O Forte de São Francisco Xavier de Gaibu, localizado na praia de Gaibu, também no
município de Cabo de Santo Agostinho, construído pelos colonizadores portugueses em
1630. Foi recuperado há algumas décadas pelo IPHAN e está preparado para visitação;
O Forte de Santa Cruz de Itamaracá, localizado na extremidade sul da Ilha de Itamaracá,
litoral norte do Estado, construído pelos colonizadores portugueses a partir de 1654,
30
sobre o Forte Orange, de origem holandesa. Já foi objeto de pesquisas arqueológicas,
sofreu reformas recentes e está preparado para visitação;
O Forte do Brum, localizado no bairro do Recife, região central da cidade, construído
pelos colonizadores portugueses a partir de 1654, sobre o forte holandês (de mesmo
nome). Já foi objeto de pesquisas arqueológicas, encontra-se recuperado e funciona
como Museu Militar;
O Forte de São Tiago das Cinco Pontas, localizado no bairro de São José, no centro do
Recife, construído pelos colonizadores portugueses a partir de 1654, sobre o Forte
holandês Frederich Heinrich. Encontra-se recuperado e é a sede do Museu da Cidade do
Recife; e,
O Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, localizado no município de
Tamandaré, no litoral sul do Estado, construído pelos colonizadores portugueses a partir
de 1654. Encontra-se em reforma pelo Governo do Estado de Pernambuco.
O levantamento físico efetuado nessas estruturas foi realizado através de levantamento
topográfico com utilização de Estação Total (ET) para garantir elevado grau de precisão nas
medidas de comprimento, altura e ângulos. O levantamento abrangeu apenas a parte externa da
fortificação, ou seja, sua muralha2. Foram registrados com a ET pontos topográficos a cada dois
metros ao longo de toda extensão das muralhas, na sua parte superior (entre a muralha e o
parapeito) e inferior (entre a muralha e o solo atual). A grande quantidade de pontos justificouse pela necessidade de aumentar o grau de precisão dos resultados3.
Os levantamentos topográficos resultaram em arquivos digitais para serem acessados através
de programas tipo CAD (Computer Aided Design). Os arquivos apresentam dados
tridimensionais a partir dos quais foi possível identificar a configuração geométrica das
fortificações incluindo linhas e ângulos, horizontais e verticais. O registro imagético foi
2
3
Não foi realizado levantamento da contra muralha.
No entanto, em função das irregularidades nos vértices das fortificações, optou-se por não tirar pontos
topográficos desses encontros. Os vértices foram identificados graficamente como resultado do encontro das linhas
de muralha. Essas linhas da muralha, por sua vez, foram formadas pela ligação de apenas dois pontos extremos,
escolhidos de maneira que a relação dos demais pontos demarcados apresentasse a menor dispersão com a linha
definida.
31
realizado com fotografias em alta resolução e desenhos de campo, utilizando equipamento
fotográfico e material de desenho tradicional.
O levantamento de dados das referências tipológicas europeias e Tratados sobre fortificação
consistiu no levantamento documental de fontes secundárias e primárias, respectivamente. A
partir das referências europeias procurou-se caracterizar os tipos de Fortificação de Transição
e Moderna, com base nos seus atributos físicos. A partir dos Tratados buscou-se caracterizar os
modelos de fortificação apresentados por diversos autores, com base, também, nos seus
atributos físicos.
A partir dos dados de campo, por sua vez, foi elaborada uma base gráfica para cada fortificação
remanescente, composta por Planta Baixa, que serviu de fundamento para realizar a comparação
das características físicas entre essas estruturas, as referências tipológicas europeias e os
modelos apresentados nos Tratados.
A comparação foi realizada a partir de um mesmo conjunto de variáveis que abrangeu a
configuração geométrica e os materiais construtivos utilizados, são elas: (1) principais itens que
compõem uma fortificação (tambores, canhoneiras, torres, reparo, baluarte, cortina, fosso, ...);
(2) formato da planta baixa (poligonal irregular, poligonal regular, ...); (3) dimensões
horizontais e verticais e suas proporções; (4) modelo de fortificação apresentados nos Tratados
semelhantes às fortificações de Pernambuco; (5) a inclinação da muralha; e (6) tipos de
materiais construtivos (terra, pedra, com ou sem encamisamento, ...). A análise comparativa
dos dados físicos e documentais levantados seguiu uma abordagem sincrônica, pois não se
considerou a evolução no tempo, uma vez que o objetivo era identificar as referências utilizadas
e se os Tratados foram consultados.
Além dessas análises, buscou-se verificar se as fortificações de Pernambuco apresentavam
eficácia bélica, ou seja, se tinham a capacidade de se defender e defender um determinado lugar.
Essa constatação estaria relacionada a três fatores. O primeiro dizia respeito ao tipo de
fortificação usado: o de Transição se defenderia da artilharia de efeito moral; e o Moderno, da
artilharia de efeito de destruição. O segundo fator foi o modelo de Fortificação Moderna
utilizado: se este era um modelo simples, com formato de polígono puro, ou se era um modelo
abaluartado, que contava com linhas flancantes. E, o terceiro fator foi a obediência ao modelo,
considerando a capacidade precípua do modelo de se defender. Ou seja, o grau de semelhança
da configuração geométrica entre a fortificação construída e o modelo.
32
Na continuidade da pesquisa foi preciso realizar novas análises comparativas, contudo seguindo
uma abordagem diacrônica, considerando os processos construtivos das fortificações existentes
ao longo dos séculos XVI e XVII. Essas análises objetivaram verificar as transformações
tecnológicas dos processos construtivos, considerando a possível influência holandesa na
construção de fortificações. A presença holandesa em Pernambuco, entre 1630 e 1654, foi
determinante para a delimitação do recorte temporal desse estudo, ou seja, o estudo abrangeu
três diferentes períodos: antes, durante e depois da presença holandesa.
A partir dos dados identificados e analisados verificou-se que as transformações tecnológicas
nas fortificações de Pernambuco consistiram: no incremento da eficácia bélica em fortificações
do tipo de Transição; no incremento da eficácia bélica pela troca do tipo de Transição pelo tipo
Moderno simples; e, ainda, no incremento da eficácia bélica em fortificações do tipo Moderno
pela utilização de modelos abaluartados e não mais modelos simples. Mas essas transformações
não ocorreram numa ordem crescente e acumulativa.
Quanto à utilização de modelo retirados de Tratados para construção de fortificação em
Pernambuco, verificou-se que estes foram utilizados, mas não houve obediência a um único
Tratado. A consulta a Tratados do século XVI e XVII acabou por sugerir a criação de um novo
modelo de fortificação, que pode ser chamado de híbrido, mas pode também insinuar um
modelo original português em Pernambuco.
A partir das constatações acima realizadas, buscou-se explicar as razões que motivaram os
portugueses a escolher as citadas tecnologias. Essa explicação também seguiu uma abordagem
diacrônica para poder elucidar as diferentes escolhas ao longo do tempo. Verificou-se que as
escolhas tecnológicas do colonizador português, nos séculos XVI e XVII, em Pernambuco
refletem uma diferente compreensão do conceito de ‘Sistema Defensivo’ daquela que se utiliza
na atualidade. Compreende-se, portanto, que a Metrópole não disponibilizou os elementos
necessários à instalação de um Sistema Defensivo eficaz em Pernambuco, ao longo do século
XVI e primeira metade do século XVII. Os investimentos necessários só foram realizados após
a capitulação holandesa (1654). Nesse momento, Portugal teria voltado sua atenção para as
colônias do Atlântico e o Brasil passou a contar com as fortificações, tropas e navios necessários
à defesa da Capitania.
Pode-se concluir, portanto, que a construção de fortificações em Pernambuco significou, ao
mesmo tempo, uma obsolescência e uma evolução tecnológica. Observando essas fortificações
33
em relação às fortificações que se construíam no mundo, naquele momento, aquelas de
Pernambuco utilizaram tipos ultrapassados considerando sua capacidade de se defender da
artilharia pirobalística com efeito de destruição. No entanto, observando essas fortificações no
âmbito de própria Capitania, verificou-se uma evolução tecnológica na medida em que se
observa a tendência de aumento de sua eficácia bélica, desde o século XVI e durante o século
XVII.
34
CONCEITOS E FERRAMENTAS DE ANÁLISE
Neste capítulo apresenta-se o referencial teórico para análise das fortificações de Pernambuco,
objeto de trabalho desta pesquisa e, na sequência, serão evidenciadas as metodologias de
análise, com ênfase na manipulação dos conceitos e no tratamento dos dados.
1.1
TRATADÍSTICA DOS SÉCULOS XVI, XVII E XVIII COMO REFERÊNCIA TECNOLÓGICA
DE FORTIFICAÇÃO
Como já se falou na introdução, a realização de um estudo sobre as transformações tecnológicas
nas fortificações de Pernambuco dos séculos XVI e XVII teve o intuito de identificar se houve
influência tecnológica holandesa na escolha por uma determinada tecnologia de fortificação,
em detrimento de outra(s). Esse estudo só foi possível porque foram produzidos Tratados desde
o século XV; alguns dos quais foram utilizados no âmbito dessa pesquisa como referencial
teórico.
A verificação dos princípios e regras da tratadística com influência na construção de
fortificações em Pernambuco precisa considerar as mudanças feitas na concepção das
fortificações europeias em função do uso de canhões de guerra. Com a introdução da pólvora,
na Europa, houve um progressivo desenvolvimento das armas de fogo que produziu uma
revolução da arte na guerra e, consequentemente, provocaram a necessidade do
aperfeiçoamento das fortificações para fazer frente às novas armas em vigor, a cada tempo.
Esse aperfeiçoamento resultou no desenvolvimento de diferentes fortificações. Os Tratados
foram instrumentos de disseminação desta nova tecnologia de fortificação e podem ter servido
de referência para a construção de fortificações pelos colonos portugueses na Capitania de
Pernambuco, já no final do século XVI e no século XVII.
Na Europa, de fato, as transformações tecnológicas nas fortificações militares tiveram início a
partir do uso da pólvora, que impulsionou o desenvolvimento de uma artilharia pirobalística.
Até aquele momento as armas de guerra eram as brancas, para guerra corpo-a-corpo e as de
arremesso, para o combate à distância (Ailleret, 1948: p.11). Os primeiros engenhos de guerra
utilizavam a ação da gravidade como força-motriz e a elasticidade de fibras de origem animal
ou vegetal. Essa artilharia denominada neurobalística era utilizada para projetar flechas ou
pedras a grandes distâncias (Alves, 1959: p.25). Com o desenvolvimento das armas de fogo
houve uma revolução nas técnicas de guerra e, consequentemente, nas fortificações, pois a
35
pólvora é uma substância produtora de grande energia com capacidade propulsiva (Castro,
1991: p. 28 e 29). Diante dessa nova realidade da guerra, a Fortificação Medieval tornou-se
ineficaz, pois não conseguia resistir às armas de fogo da artilharia pirobalistica, e precisou
sofrer um processo de adaptação nas suas estruturas e de incorporação de novos elementos. Um
novo tipo de fortificação começou a ser desenvolvido em meados do século XV para defender
os sítios dos efeitos dessa artilharia.
1.1.1 TRATADOS DO SÉCULO XVI
A partir do século XV e durante o século XVI, na Itália, começaram a surgir Tratados voltados
para a arquitetura e alguns que buscavam, também, o aprimoramento das estruturas de defesa a
partir do conhecimento da matemática e geometria. Procuravam encontrar as dimensões ideais
de uma fortificação e a melhor relação entre suas partes. O objetivo era se defender dos efeitos
da artilharia pirobalística desenvolvida desde o século XIII, a partir do uso da pólvora. Os
princípios e regras explicitados nesses Tratados acabaram por definir um novo tipo de
fortificação, que hoje nas referências sobre o tema, foi denominado Fortificação de Transição
(ou seja, da transição entre um tipo anterior - medieval e um tipo posterior denominado, na
atualidade, de moderno).
Neste período, verifica-se uma grande quantidade de Tratados publicados, principalmente de
autores italianos. Segue uma sucinta lista, sendo que alguns destes serão apresentados no
capítulo referente à Tratadística:
o Tratado do arquiteto italiano Leon Battista Alberti (1404-1472), “De Re
Aedificatoria”, escrito entre 1443 e 1452 e publicado após sua morte;
o do arquiteto e engenheiro italiano Antonio Averlino, Filarete (1400-1569), “Tratato
d’Architectura”, publicado entre 1457 e 1464;
o do arquiteto italiano Francesco di Giorgio Martini (1439-1501), “Trattato di
architettura, Civilli e militare”, publicado em 1492;
o do pintor e escultor alemão Albrecht Dürer (1471-1528), “Instruction sur la
fortification des villes, bourgs et chateaux”, publicado em 1527;
o do arquiteto italiano e engenheiro militar Sebastiano Serlio (1475-1554), “I sette libri
dell'architettura”, publicado em 1537;
o do arquiteto e engenheiro militar italiano Pietro Cataneo (1510-1574), L’Architettura,
publicado em 1567;
36
o do arquiteto e engenheiro militar italiano Girolamo Maggi (1523-1572), “Della
fortificazione delle città”, publicado em 1564; e
o do engenheiro português Antônio Rodrigues, “Tratados de arquitectura”, manuscritos
publicado em 1576 e em 1579 (Orense, 2012: p.15 e 37-38; Valla, 2007: p.190 e 196).
Dentre as obras construídas sob a influência de tais Tratados, observa-se um processo de
experimentação na construção de fortificações, resultante da tentativa de congregar a
experiência prática da guerra aos conhecimentos matemáticos e geométricos.
Podem ser citados, na Itália, o Forte de Nettuno e o Sistema Fortificado de Verona. O Forte de
Nettuno (Nettuno, Itália) foi construído em 1501, com projeto de Antonio da Sangallo, o velho
(1455-1534) e seu irmão Giuliano Giamberti da Sangallo (1445-1516). É uma fortificação onde
as muralhas ainda apresentavam características medievais, mas seu projeto já contava com
baluartes angulares de tendência moderna (Valadares, 2014: p. 18-19). O Sistema Fortificado
de Verona (Verona, Itália), por sua vez, apresentava a mesma tendência. Com projeto do
arquiteto italiano Michele Sanmichele, foi implantado em 1530 e já contava com baluartes
pentagonais (1484-1559). Esse projeto vem sendo considerado, por autores da atualidade como
Carlos Díaz Capmany, como sendo a primeira expressão do baluarte moderno (Valadares, 2014:
p. 20; Valla, 2007: p. 189-210).
1.1.2 TRATADOS DO SÉCULO XVII
No século XVI, as armas de fogo não superaram a artilharia neurobalística. As primeiras armas
da artilharia pirobalística ainda não eram seguras (havia risco de explosão na manipulação da
pólvora e de rompimento do tubo no disparo), nem fáceis de serem manuseadas (não
apresentavam boa mobilidade e o tempo de recarga era muito longo, cerca de um disparo/hora),
eram imprecisas e não alcançavam grandes distâncias (cerca de 400 metros, igualando-se à
artilharia neurobalística). Além de tudo, os gases e chamas liberados durante os disparos
ofereciam perigo; o efeito do barulho e do clarão produzidos na detonação eram maiores que o
seu efeito de destruição real. Havia, de fato, muito mais um efeito moral do que destrutivo.
A partir de 1520, surge uma nova artilharia pirobalística, cujo efeito de destruição era maior
(Guia de inventário, 2015: p. 21). As mudanças consistiram na organização da artilharia em
termos de material e de pessoal e na problematização científica do tiro, que passou a ser
analisado matematicamente. Em 1530, a partir de novos estudos, os calibres dos canhões, ou
seja, o diâmetro do projétil ou diâmetro interno do cano da arma foram padronizados e se buscou
37
a proporção metálica adequada, entre cobre e estanho, para a produção das armas de fogo
(Alves, 1959: p. 97, 104-109 e 193). A padronização dos calibres foi realizada a partir de
estudos que identificaram a melhor relação entre o comprimento e o diâmetro, de maneira a se
obter o maior alcance. Nesse novo contexto, o tipo de fortificação (Fortificação de Transição)
que havia sido desenvolvido para resistir às armas de fogo não era mais eficaz diante do
aprimoramento da artilharia pirobalística.
Após um século de experimentações com base em conhecimento científico, os Tratados
voltados para a arquitetura deram lugar aos Tratados específicos de fortificação, publicados no
século XVII. Esses Tratados aproveitaram as referências do século anterior e estruturaram a
cidade como uma praça-forte, que não estava apenas voltada para sua exclusiva defesa, mas
para a defesa de um território. A partir de tais referências foram construídas novas cidades na
Itália, França, Alemanha e Holanda.
Palmanova (Itália) era uma cidade fortaleza, fundada em 1593, que definiu o espaço urbano
como um espaço cultural. Seu traçado regular, estruturado a partir de ruas que partiam de uma
praça central, estava inserido em uma estrela de nove lados. Henrichemont (França) era também
uma cidade renascentista. Foi fundada em 1608 por Charles Gonzaga (Duque de Mantua e
Montferrat). Seu plano foi estruturado a partir de uma praça central, de formato quadrado, de
onde saiam quatro ruas ortogonais entre si, dividindo a cidade em quatro quarteirões. Da praça
central saem ainda quatro ruas em diagonal que interligam os quarteirões à praça central.
Coevordan (Holanda), por sua vez, foi reformulada, em 1597, por Maurício de Nassau4. Essa
cidade apresentava traçado radial inserido num polígono de sete lados (Valla, 2007: p. 200202).
Nesse contexto, consolidou-se o tipo de fortificação denominado, pelas referências atuais sobre
o tema, Fortificação Moderna, abaluartada, que incorporou nas suas formas os cálculos
matemáticos e os conhecimentos de geometria e trigonometria. O objetivo desse novo tipo era
se defender dos efeitos da artilharia pirobalística da primeira metade do século XVI, já mais
amadurecida e com maior poder de destruição. Esse tipo de fortificação atingiu seu auge em
4
Maurício de Nassau (1567-1625) era militar alemão, filho do líder holandês Guillermo de Orange-Nassau, o
Taciturno. Não deve ser confundido com João Maurício de Nassau (1604-1679) militar alemão que administrou
os domínios da WIC no Nordeste brasileiro.
38
1650, com a utilização de um elemento denominado baluarte5, de formato pentagonal, cujo
sistema de defesa passou a ser também uma forma de ataque (Valla, 2007: p. 200-205).
Nesse período, século XVII, também foi publicada uma grande quantidade de Tratados que
ficaram conhecidos nas referências documentais como Tratados de Fortificação e se
caracterizaram pela especialização da construção de fortificações. A fortificação passou a ser
parte integrante e fundamental de um sistema que pretendia a defesa de um território e não mais
de uma cidade. O resultado teórico, desse momento, foi o desenvolvimento de modelos de
praças-forte, enquanto símbolo da cidade moderna, que desenvolvia funções civis e militares.
Essa nova base normativa explicitada nos Tratados do século XVII acabou por definir um novo
tipo de fortificação, que foi denominado Fortificação Moderna.
No início do século XVII, começou a diminuir a influência dos italianos, pela ineficiência
prática das suas regras diante do fato da guerra, pois suas regras eram consideradas rígidas.
Outros autores, diferentemente, buscavam aplicar as regras a partir dos dados da realidade,
propondo adaptações (Valla, 2007: p.204). Alguns dos Tratados publicados no século XVII
estão listados abaixo, dentre estes, alguns Tratados serão apresentados no capítulo referente à
Tratadística.
o Tratados italianos do arquiteto Vicenzo Scamozzi (1548-1616), “L’ Idea della
Architettura Universale”, publicado em 1615; e o de Pietro Sardi, “Corona imperiale
della architectura militare”, publicado em 1618;
dentre os Tratados holandeses estão aqueles do engenheiro militar Samuel Marolois
(1572-1627), “opera mathematica” e “Géometrie nécessaire à la fortification”,
publicados em 1614 e 1628; do engenheiro Simon Stevin (1548-1620), “Les oeuvres
mathématiques”, publicado em 1634; de Adam Freitag, “L’ Architecture militaire ou
La fortification Nouvelle: Augmentée et enrichie de forteresses régulieres, irrégulières,
et de dehors; le tout à la practique moderne“, publicado em 1640; de Nicolas Goldman,
“La Nouvelle Fortification”, publicado em 1645; de Matthias Dogen, L’Architecture
Militaire et Moderne ou Fortification”, publicado em 1647;
5
O baluarte é um elemento característico da Fortificação Moderna, que se configurava como uma estrutura
construtiva de planta pentagonal irregular, situada nos seus ângulos e saliente à fortificação. É composto por
flancos, onde a artilharia se concentrava para defender a fortificação (através do tiro flanqueado); e pelas faces,
por onde eram feitos os ataques aos inimigos (Guia de inventário, 2015: p.67).
39
dentre os Tratados franceses de Antoine Deville, “Les fortifications ou l’ingénieur
parfait“, publicado em 1628; e de Blaise-François Pagan, “Les Fortifications“,
publicado em 1645.
Todos esses Tratados e referências do século XVII agrupavam-se em diferentes escolas de
fortificação por apresentarem especificidades nacionais dos países de origem, como por
exemplo, as escolas italiana, alemã, holandesa, francesa e espanhola. As escolas de fortificação
se baseavam em diferentes princípios orientadores, com características específicas, em função
de estarem territorialmente e politicamente sujeitas a diferentes condicionantes.
A Escola Italiana, pioneira, surgiu no final do século XV, dominou todo o século XVI e ainda
exerceu influência sobre as demais escolas no início do século XVII. A escola Alemã,
descendente da escola italiana, iniciada por Albertch Dürer, foi a segunda escola de fortificação
da Europa. A Escola Holandesa surgiu em 1600, com a instalação do curso Duytsche
Mathematique, na Universidade de Leiden, para cartógrafos, engenheiros militares e mestresde-obras. Surgiu a partir da escola italiana, mas desenvolveu características próprias,
estimulada pela Guerra dos Oitenta Anos contra a Espanha (Valla, 2007: p.421; Moreau, 2011:
p. 45). A Escola Francesa teve início em 1604, com a publicação do Tratado “La fortification
démontrée et réduite en art” de Errard Le-Bar-Le-Duc (1554-1610). Inspirada na escola italiana
também recebeu influência da escola holandesa (Moreau, 2011: p.46). A Escola Espanhola, por
sua vez, surgiu com a publicação, em 1598, do Tratado “Teórica y practica de fortificación” do
engenheiro Cristóbal Rojas (Valla, 2007: p.199).
1.1.3 TRATADOS DO SÉCULO XVIII
Finalmente, no final do século XVII e durante o século XVIII, foram publicados Tratados sobre
fortificação onde se observam estudos críticos de diferentes Tratados do século XVII,
configurando uma historiografia da arte da fortificação. O objetivo de cada autor era apresentar
as propostas de diferentes Tratados, identificar as melhores soluções, independentemente das
escolas de origem e sistematizá-las em uma nova obra (Valla, 2007: p.224).
Os Tratados sobre fortificação desse período não serviram de referência para a construção de
fortificações em Pernambuco, pois foram publicados após sua construção, por isso não vão ser
analisados. Eles estão sendo aqui citados por duas razões: primeiro, porque ao utilizar o
conteúdo dos Tratados do século XVII, estão confirmando a importância desses Tratados como
fonte de dados para identificar modelos de Fortificação Moderna; segundo, porque seria preciso
40
selecionar alguns Tratados para aprofundar a análise no âmbito desta pesquisa e essa seleção
baseou-se num Tratado historicista. O Tratado de referência escolhido foi o do português Luís
Serrão Pimentel, considerado um dos responsáveis pela formação da escola portuguesa de
fortificação, criada no final do século XVII; e porque o seu conteúdo é a compilação de
manuscritos elaborados pelo autor, enquanto professor da Aula de Fortificação e Arquitectura
Militar, entre 1647 e 1678, formando engenheiros militares que podem, até mesmo, ter atuado
em Pernambuco (Valla, 2007: p. 231).
Nesse período, os Tratados não foram escritos apenas por autores italianos, mas por holandeses,
franceses, espanhóis e portugueses. Essa disseminação demonstrava que o domínio da arte da
fortificação não era mais exclusivo dos italianos, como tinha sido desde o final do século XV.
Dentre os Tratados publicados em tal período, segue uma lista sucinta:
o de Allain Manesson Mallet, “Les Travaux de Mars”, publicado em 1671; o de François
Blondel (1618-1686), “Nouvelles Manières de Fortifier les places”, publicado em 1683;
o de Luís Serrão Pimentel, “Methodo lusitano de desenhar as fortificações das praças
regulares e irregulares”, publicado em 1680;
o de Sebastien le Preste Vauban (1633-1707), “Traité de l’attaque des places” e “Traité
sur la défense des places”, publicados em 1685;
o de Menno Baron van Coehoorn (1641-1704), “Nieuwe Vestingbouw”, publicado em
1685; o de Manuel de Azevedo Fortes, “O engenheiro portuguez” publicado em 1728;
o de Bernard de Forest Bélidor (1698-1761), “La Science des Ingénieurs”, publicado
em 1729;
os de Sebastian Fernandez de Medrano (1646-1705), “Rudimentos geométricos y
militares”, publicado em 1677, dentre outros;
e o de Louis Cormontaingne (1696-1752), “Architecture Militaire ou l’ Art de Foritifier,
Qui enseigne de toutes fortes de Fortifications Régulières & Irrégulières”, publicado em
1741 (Valla, 2007: p.219-225; Moreau, 2011: p. 21).
A título de síntese, segue abaixo um quadro simplificado da distribuição de Tratados e Tipos
de fortificação ao longo dos séculos, para melhorar a compreensão da base de referências
apresentadas acima.
41
Quadro 1.
Simplificação da distribuição dos tipos de fortificação em relação aos tratados europeus
publicados ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII.
1.1.4 UTILIZAÇÃO DOS TRATADOS SOBRE FORTIFICAÇÃO PELOS PORTUGUESES
A partir das referências apresentadas, ao longo deste trabalho, procurar-se-á entender até que
ponto as fortificações construídas em Pernambuco podem ter resultado da aplicação de modelos
renascentistas desenvolvidos na Europa. Modelos estes que foram sistematizados, registrados
e divulgados através de Tratados de Arquitetura e de Fortificação e que refletiam a busca de
normatização da experiência prática da guerra a partir de princípios teóricos trazidos da
matemática, da geometria e da trigonometria. A partir da estruturação desses modelos,
pretendia-se garantir a construção de fortificações que, diferentemente das fortificações
medievais, fossem capazes de se defender das armas de fogo (Valla, 2007: p.205-206).
Diante do exposto, há que se questionar se os modelos de fortificação apresentados nos Tratados
puderam servir de referência para a construção das fortificações em Pernambuco. Considere-se
que tais modelos foram o resultado das mudanças ocorridas ao longo dos séculos, desde a
Fortificação Medieval, passando pela de Transição e chegando à Moderna, buscando aumentar
sua capacidade defensiva, em função das transformações na arte da guerra, principalmente, pela
descoberta da pólvora e o desenvolvimento da pirobalística e da sua capacidade de destruição.
A partir desse ponto, pretende-se identificar se o colonizador tinha conhecimento técnico para
construção de fortificações do tipo Moderno, buscando averiguar se a opção por determinado
tipo de fortificação (de Transição ou Moderna) estava limitada pelo desconhecimento das
diferentes técnicas. Busca-se, assim, dar subsídio à discussão para identificar os fatores que
contribuíram na escolha de uma determinada técnica construtiva, de maneira coerente com o
42
modelo de colonização, ou seja, o vestígio material como registro físico das posturas
colonizadoras.
A Fortificação Moderna, abaluartada, enquanto desenvolvimento do tipo de fortificação de
Transição, ocorreu na Itália entre o final do século XV e início do século XVI e, segundo as
referências apresentadas acima, não foi resultado de uma ação individual. Esses tipos de
fortificação foram produtos de uma transformação gradual, não linear, de experimentos práticos
associados a conhecimentos científicos oriundos da matemática, geometria e trigonometria.
Inicialmente, com base na bibliografia histórica, verificou-se que o conhecimento técnico da
construção de fortificações passou a ser divulgado por toda a Europa através de três vias:
disseminação e tradução de Tratados; contratação de engenheiros italianos e envio de
profissionais para a Itália para aprenderem o ofício.
Sobre a primeira via de divulgação, em Portugal, a circulação de Tratados ocorreu desde o
século XV e os primeiros Tratados portugueses foram publicados na segunda metade do século
XVI. Em 1576 e 1579, Antônio Rodrigues, publicou “Tratados de Arquitectura”, manuscrito
baseado nos Tratados de Serlio e Cataneo. Em 1680, o Tratado de Luís Serrão Pimentel,
“Methodo lusitano de desenhar as fortificações das praças regulares e irregulares” foi publicado
postumamente6. Em 1728, Manuel de Azevedo Fortes7, publicou seu Tratado “O engenheiro
portuguez”. E, em 1743, Diogo da Sylveyra Vellozo8, publicou seu Tratado “Arquitetura militar
ou fortificação moderna” (Moreau, 2011: p. 16-57).
Por ordem do Rei de Portugal, D. João III, vários dos Tratados em circulação na Europa foram
traduzidos para o português. Dentre eles, o Tratado “Os Dez livros de Arquitectura”, de
Vitrúvio, foi traduzido por Pedro Nunes, em 1541; o Tratado de Alberti, “De Re Aedificatoria”,
por André Resende, em 1543. E o Tratado de Albrecht Dürer, “Instruction sur la fortification
6
O Tratado de Luís Serrão Pimentel foi o primeiro Tratado português impresso. Tinham como base um conjunto
de Tratados de autores da escola holandesa e francesa, como Antoine Ville (1628), Conde de Pagan (1645), Adam
Fritach (1640), Marolois (1614 e 1628), Mathias Dogen (1645), Nicolas Goldman (1648), Simon Stevin (1645).
Pimentel defendia a adaptação dos modelos às condições do terreno, pois acreditava que a utilização dos Tratados
não devia ser como uma regra absoluta, mas como uma orientação (Moreau, 2011: p. 21 e 46 e 57).
7
O Tratado de Manuel de Azevedo Fortes tinham como base os Tratados da escola francesa Além de citar o
Tratado de Luís Serrão Pimentel, cita os franceses Antoine de Ville, Conde de Pagan e Vauban (Moreau, 2011: p.
43 e 60)
8
Diogo da Sylveyra Vellozo, engenheiro militar português, foi professor em PE (Moreau, 2011: p. 16).
43
des villes, bourgs et chateaux” , foi traduzido por Isidoro de Almeida, também em 1543 (Valla,
2007: p. 192-193).
No que concerne à segunda via, a contratação de arquitetos italianos para executar obras
militares em Portugal e colônias foi outra forma de circulação das novas teorias. Durante o
século XVI, Diogo Torralva (1566) e Benedetto de Ravenna (1485-1556)9 atuaram em Portugal
e no Norte da África (Valla, 2007: p. 193). Filipe Térzio atuou na metrópole e Além Mar,
incluindo no Brasil, a partir de 1577, e se tornou Arquiteto-mor do Reino em 1590. No final do
século XVI, houve um aumento da circulação de italianos em Portugal: Tiburcio Spanochi foi
nomeado, em 1597, Engenheiro-mor de Espanha10; Leonardo Turriano foi nomeado, em 1601,
Engenheiro-mor do Reino; Giovanni Battista Antonelli foi para o Brasil, em 1582; Baccio di
Filicaia, em 1588, foi enviado como fortificador para o Brasil; Francisco Frias de Mesquita11
foi nomeado Engenheiro-mor do Brasil, em 1603, e executou o Forte São Francisco da Barra,
em Pernambuco, em 1608 (Valla, 2007: p. 193-194; Valadares, 2014: p. 78).
Finalmente, a terceira via de divulgação do conhecimento técnico da construção de
fortificações em Portugal, consistiu no enviou de engenheiros para a Itália com o objetivo de
aprender a nova tecnologia, através da prática do trabalho. Os engenheiros ou mestres
acompanhavam engenheiros italianos na execução de projetos e aprendiam a tecnologia da
Fortificação Moderna, abaluartada. Dentre os profissionais enviados para a Itália estão:
Francisco de Holanda (1518-1584), que foi para a Itália em 1531 e entrou em contato com o
Tratado de Vitrúvio, com as obras de Michelangelo, Bramante e Serlio (Valla, 2007: p. 191).
O mestre de obras Antônio Rodrigues passou quatro anos na Itália para estudar a Fortificação
Moderna e publicou, em 1576 e 1579, Tratados de Arquitetura, manuscritos. O arquiteto João
Castilho, depois de sua experiência na Itália, regressou a Portugal e se tornou mestre-de-obras
9
Benedetto de Ravenna, engenheiro italiano chamado a Portugal por D. João III, trabalhou na nova fortificação
de Ceuta e no planeamento de cidades como Mazagão, na primeira década do século XVI (Valla, s/d: p.2).
10
Tiburzio Spannocchi (1543-1606), arquiteto e engenheiro militar italiano. Junto com Felippo Terzi foi o mais
celebre arquiteto e engenheiro militar atuante da Península Ibérica, a serviço do Rei de Espanha. Em 1601, assumiu
o cargo de Engenheiro-mor dos Reinos de Espanha, o que lhe deu autoridade sobre as fortificações da Península
Ibérica e de Ultramar. Entre 1591 e 1606, trabalhou no projeto do Forte São Francisco da Barra, em Pernambuco.
11
Francisco Frias de Mesquita (1578-1645), sob o título de Capitão Engenheiro/ Engenheiro-mor, foi Engenheiro
Militar e Arquiteto muito atuante no território brasileiro. Nasceu em 1578, em Portugal, e chegou ao Brasil, em
1603. Esteve primeiro em Pernambuco, em 1605, foi para Salvador, mas em 1608 voltou para Pernambuco.
44
dos mosteiros de Belém, de Tomar e da Batalha, e em 1542 foi enviado para o Norte da África
para fiscalizar obras de fortificações em execução (Valla, s/d: p. 2).
1.1.5 EXEMPLOS DE APLICAÇÃO DOS TRATADOS
PORTUGAL E NAS SUAS COLÔNIAS
EM FORTIFICAÇÕES PORTUGUESAS EM
O resultado prático do conhecimento técnico sobre Fortificação de Transição e Fortificação
Moderna aprendido pelos profissionais portugueses, a partir das vias de divulgação acima
apresentadas, pode ser visto nas obras efetivamente construídas em Portugal e suas colônias.
Portanto, conclui-se que eles utilizaram os Tratados nas suas fortificações.
Na África, em 1514, os portugueses construíram a Fortaleza de Mazagão. Nesse primeiro
momento, foi construída uma fortificação do tipo de Transição, composta por um quadrado com
quatro tambores, projeto dos mestres Diogo e Francisco de Arruda. Em função da necessidade
de fazer melhorias, houve uma remodelação em 1541. Essa nova fortificação em Mazagão,
juntamente com as de Ceuta (no Norte da África) e a de Diu (na Índia), foram as primeiras
estruturas abaluartadas construídas pelos portugueses no âmbito da expansão marítima
portuguesa (Matos, 2012: p. 1).
Figura 1.
Fortaleza de Mazagão, no litoral norte da África, foi construída em 1514 e melhorada em 1541
pelos portugueses. Observa-se a utilização de elementos que virão a compor no século XVII o tipo de Fortificação
Moderna, abaluartada. Fonte: historiasdeportugalemarrocos.files.wordpress.com.
45
A nova fortificação, abaluartada, de Mazagão foi projeto dos arquitetos Benedetto da Ravenna,
Miguel de Arruda e Diogo de Torralva com execução de João de Castilho (Correia, 2007: p.189
e 194). Verifica-se, já na primeira metade do século XVI, a utilização pelos portugueses de
elementos que virão a compor no século XVII o tipo de Fortificação Moderna, abaluartada.
Essas fortificações podem ser compreendidas como parte de um longo processo de
experimentação de novos formatos, buscando a verificação de sua eficácia bélica, para auxiliar
na elaboração dos modelos modernos.
Na Ilha de Moçambique (África oriental), colônia portuguesa desde 1507, foram dois os
momentos de estruturação de sua defesa. No primeiro momento, durante o início da ocupação,
foi construída a Torre de São Gabriel, fortificação do tipo medieval, que não era mais capaz de
defender o sítio em função da artilharia pirobalística e da inadequação da estrutura de suportar
o impacto das balas de canhão. Essa fortificação foi, então, substituída por uma de projeto mais
moderno. A Fortaleza de São Sebastião, da Ilha de Moçambique, construída a partir de 1554,
com projeto do arquiteto português Miguel de Arruda, apresentava planta de formato retangular
com quatro baluartes angulares. Nesse projeto continua o processo de experimentação de novos
formatos, onde já se observa que todos os baluartes são pentagonais, contando com flancos para
permitir a proteção das cortinas.
Figura 2.
Fortaleza de São Sebastião, da Ilha de Moçambique, construída pelos portugueses a partir de
1554 apresentava planta de formato retangular com quatro baluartes angulares, já apresentando o formato
pentagonal. Fonte: site mundo.guru e fortalezas.org.
Na ilha da Madeira12 foi construída uma monumental fortaleza projetada pelo Mestre das Obras
Reais, Mateus Fernandes. O projeto era composto por muralhas na frente do mar e ao longo da
ribeira e pela Fortaleza de São Lourenço incluindo dois baluartes pentagonais e um retangular.
12
A ilha da Madeira, região autônoma de Portugal, é a principal ilha do arquipélago da Madeira, situado no oceano
Atlântico, a sudoeste da costa portuguesa.
46
As obras foram executadas a partir de 1581, por ordem do Rei Filipe I (Carita, 1989: p. 194).
Neste caso, apesar da construção de altas muralhas, de herança medieval, observa-se a
utilização de baluartes na tentativa de encontrar o seu melhor formato. Esses baluartes, no
entanto, ainda são pouco salientes e suas faces estão paralelas às cortinas (características do
tipo de Transição), mesmo assim percebe-se a recorrência do baluarte, confirmando o processo
de experimentação de novos formatos.
Figura 3.
Fortaleza de São Lourenço construída a partir de 1581 em Funchal, na Ilha da Madeira, onde se
observa que apesar da construção contar com altas muralhas, de herança medieval, foram inseridos baluartes. Esses
baluartes, no entanto, eram ainda pouco salientes e tinham as faces paralelas às cortinas. Portugal. Fonte: site
fortaleza.org.
Na Ilha Terceira dos Açores13, especificamente em Angra do Heroísmo, foi construída a
Fortaleza de São Filipe do Monte Brasil14, composta por uma extensa muralha e cinco baluartes
poligonais. O projeto foi elaborado, em 1572, pelos engenheiros militares italianos Giovanni
Vicenzo Casale15 e seus discípulos, Tiburzio Spannocchi e Anton Coll, mas a fortaleza foi
efetivamente construída a partir de 1590 (Carita, 1989: p. 198). No projeto foram utilizados
baluartes poligonais, com formato mais próximo dos baluartes modernos. Observa-se que as
faces já não estão mais paralelas às cortinas, e há orelhões, para a proteção dos flancos recuados.
13
A Ilha Terceira, região autônoma de Portugal, integra o arquipélago dos Açores situado no oceano Atlântico, a
noroeste da costa portuguesa.
14
Conhecida também por Fortaleza de São João Baptista da Ilha Terceira.
15
Giovanni Vicenzo Casale (15??-1593), engenheiro militar italiano.
47
Figura 4.
Fortaleza de São Filipe do Monte Brasil construída a partir de 1593, em Angra do Heroísmo,
Açores, Portugal, onde foram utilizados baluartes poligonais, com formato mais próximo dos baluartes modernos.
Fonte: site pt.wikipedia.org e Carlos Luis MC da Cruz o site pt.wikipedia.org.
No Brasil, na Capitania do Rio Grande no Norte, foi iniciada a construção da Fortaleza dos Três
Reis Magos, em 1598, sob a direção do engenheiro-mor do Brasil, Francisco Frias de Mesquita.
O projeto contava com muralha contendo dois meio-baluartes e um cavaleiro na cortina oposta
(Menezes, 1986: p. 65-67). No projeto, além do baluarte, experimenta-se outro elemento da
Fortificação Moderna, o cavaleiro, demonstrando o conhecimento técnico dos portugueses que
estão participando da colonização do Brasil, no mesmo período em que foram construídas as
fortificações de Pernambuco.
48
Foto 1. Fortaleza dos Reis Magos construída pelos portugueses, a partir de 1598, na capitania do Rio Grande no
Norte, Nordeste do Brasil. O projeto contava com muralha contendo dois meio-baluartes e um cavaleiro na cortina
oposta. Fonte: site fortaleza.org.
Na barra do rio Tejo, em Lisboa (Portugal), o Forte de São Lourenço da Cabeça Seca foi
projetado pelo Frei Giovanni Vicenzo Casale, em 1589, para compor o sistema defensivo da
barra. Era uma fortificação de planta circular, por ser um formato considerado sólido para
suportar a dinâmica das águas. Sua construção foi realizada por Leonardo Turiano, engenheiromor do Reino, e foi finalizada em 1607 (Soromenho, 1997-1998: p. 202). O projeto, apesar de
não utilizar baluartes, representa o processo de experimentação para construção de modelos
modernos na medida em que propõe uma estrutura sólida para defender-se das armas de fogo.
Figura 5.
Forte de São Lourenço da Cabeça Seca, construído 1607 na foz do rio Tejo, na União das
freguesias de Oeiras e São Julião da Barra, Paço de Arcos e Caxias, concelho de Oeiras, distrito de Lisboa, em
Portugal. Esse projeto, apesar de não utilizar baluartes, representa o processo de experimentação para construção
de modelos modernos na medida em que propõe uma estrutura sólida para se defender das armas de fogo. Fontes:
fortalezas.org e wikimedia.org.
49
Ainda em Portugal, a praça-forte de Elvas é o exemplo mais significativo de que os portugueses
dominavam o conhecimento técnico sobre a Fortificação Moderna. Em 1641, a estrutura
defensiva sofreu mudanças porque a cidade, localizada a cerca de 15 km da cidade de Badajoz,
na Espanha, era considerada ponto estratégico de defesa das fronteiras portuguesas. Em função
da Restauração da independência portuguesa, em 1640, Elvas passou a ser alvo de investidas
espanholas. Sob o comando de Matias de Albuquerque, militar experiente nas campanhas do
Brasil, especialmente em Pernambuco, o Rei de Portugal, D. João IV ordenou a remodelação
das suas fortificações. Matias de Albuquerque havia sido Governador de Pernambuco, a partir
de 1620, depois de adquirir experiência trabalhando nas colônias do Norte da África por três
anos, entre 1617 e 1620.
As mudanças ocorreram de 1641 a 1653. A cidade contava com fortificações do século VIII,
construída por muçulmanos; e entre o século XIII e o século XVI, foram construídas,
reconstruídas e ampliadas suas estruturas defensivas que eram compostas por castelo, cercas,
muralhas e torres. A estruturação no século XVII era, portanto, necessária para preparar Elvas
para a guerra moderna.
Neste contexto, com projeto de João Piscácio Cosmander, jesuíta holandês, foi construído um
conjunto de estruturas de defesa: uma fortificação moderna, abaluartada, com formato de
polígono irregular, com sete baluartes, quatro meios baluartes e 12 cortinas, que envolveu a
cidade como um grande quartel. Essa fortificação ainda contava com obras externas. Sua defesa
ainda foi complementada por quatro redutos e fortins, e ainda pelo Forte de Santa Luzia,
também construídos em 1641.
O sistema defensivo planejado e executado baseou-se no posicionamento estratégico do
conjunto das estruturas de defesa por toda a região, para forçar o inimigo a dispersar suas forças
dificultando um ataque direto (The Garrison Border Town of Elvas and its Fortifications, 2010).
50
Foto 2. Praça-forte de Elvas, modernizada a partir de 1641 com projeto de Cosmander, sob o governo de Matias
de Albuquerque. Fonte: The Garrison Border Town of Elvas and its Fortifications, 2010.
A Batalha das Linhas de Elvas, foi como ficou conhecido o grande sucesso militar da
Restauração portuguesa. Contou não apenas com todo conjunto de estruturas de defesa, mais
ainda com uma guarnição, da própria cidade, composta de 8 mil homens, e com um exército de
campanha que reuniu toda a força bélica portuguesa, composto por 22 mil homens. Alguns
autores contabilizam que 30 mil homens foram recrutados para lutar pela independência de
Portugal (Duarte, 2006: p.2-3), outros dão notícias de que a cidade chegou a alojar mais de 34
mil militares (Guia de inventário, 2015: p. 27). Entretanto, independente do número exato de
homens de guerra, deve-se registrar o investimento feito pelos portugueses e os resultados
alcançados. Durante cerca de 225 anos, a população pagou taxas criadas pelo Rei para custear
a guerra. Toda a população de Portugal pagou impostos para o financiamento das obras de
fortificação, produção de armas, pólvora, organização do sistema defensivo etc. (Guia de
inventário, 2015: p. 27). A vitória na Batalha das Linhas de Elvas, no entanto, demostrou aos
espanhóis que os portugueses estavam organizados militarmente e, portanto, não seria possível
reconquistar Portugal tão facilmente, aumentando o prestígio de Portugal na Europa.
Fica evidenciado a partir de todas essas fortificações construídas por portugueses, em Portugal
e em suas colônias pelo mundo, que ao longo do século XVI, Portugal investiu no aprendizado
51
e experimentação da arte da fortificação moderna a partir da aplicação das teorias
renascentistas, confirmando o domínio da arte da fortificação pelos portugueses (Valla, 2007:
p. 194-195). A construção de Elvas no século XVII, vem confirmar o domínio da arte da
fortificação: que desde 2012 teve reconhecido o valor da “Cidade Fronteiriça e de Guarnição e
as suas fortificações” como Patrimônio Mundial pela Unesco.
Em função dos dados acima apresentados, o domínio dos portugueses do conhecimento técnico
para construção de fortificações do tipo moderno passou a ser também pressuposto dessa
pesquisa, assim como a necessidade de se defender do ataque inimigo passou a ser considerada
função precípua da escolha por uma técnica de fortificação (seja do tipo de Transição seja do
tipo Moderno). Esta escolha, portanto, deve ser explicada por outras razões que estão
evidenciadas no decorrer do trabalho.
1.2
METODOLOGIA DE ANÁLISE
Uma vez identificado na bibliografia histórica que os portugueses conheciam e utilizaram os
Tratados sobre fortificações, o objeto de pesquisa (as fortificações de Pernambuco) foi
abordado para se entender o modelo de colonização implantado na Capitania, a partir da análise
das fortificações. Surge daí o primeiro questionamento desta pesquisa com foco na verificação
geométrica das fortificações, a partir dos princípios e regras dos Tratados. Indaga-se até que
ponto esses modelos foram utilizados aqui.
Como uma particularidade de Pernambuco, registre-se que, entre 1630 e 1654, a Capitania foi
dominada pelos holandeses da Companhia das Índias Ocidentais. Então, levando em
consideração que havia uma escola holandesa de fortificação e que os holandeses, em função
da Guerra dos Oitenta Anos, com a Espanha, tinham experiência na construção de fortificações
na Holanda, há um segundo questionamento, indagando se em Pernambuco foram introduzidos
os princípios e regras na construção de fortificações diferentes daqueles usados pelos
portugueses antes da invasão.
Uma terceira indagação diz respeito à matéria-prima utilizada pelos portugueses, pois conforme
a bibliografia consultada, as fortificações portuguesas eram construídas em pedra, enquanto as
holandesas, em terra. Então, indaga-se se houve alguma solução híbrida desses dois modelos
em Pernambuco, ou se prevaleceu um sobre o outro.
52
Antes da coleta de dados, se fez necessário definir alguns conceitos encontrados na bibliografia
e que foram utilizados na qualificação do objeto de pesquisa.
1.2.1 CONCEITOS E FERRAMENTAS DE ANÁLISE
Nesse capítulo, estão apresentadas referências sobre os conceitos de técnica e tecnologia que
foram utilizados no trabalho; assim como estão listados os possíveis fatores que puderam
contribuir para a manutenção de uma técnica ou transformação tecnológica; e as possíveis
hipóteses para explicação das transformações tecnológicas; e, finalmente, foi apresentada a
capacidade do aspecto tecnológico em fornecer resultados plausíveis para a identificação de
processos cognitivos.
TÉCNICA E TECNOLOGIA
Em primeiro lugar, foi necessário estabelecer as diferenças conceituais e as relações de
complementaridade entre as referências tecnológicas, atribuídas aos Tratados, seus tipos e
modelos, e as referências técnicas, relativas aos processos construtivos aplicados nas
fortificações estudadas. Considerou-se, de partida, que a escolha de uma determinada técnica
atende aos seguintes critérios práticos de:
Factibilidade, leva em consideração os materiais e a operacionalidade, ou seja, o
projeto é materialmente factível se não contraria as leis naturais conhecidas e é
operacionalmente realizável se, para sua implementação, dispõe do sistema técnico,
conhecimentos e habilidades necessárias;
numa visão em termos econômicos;
desenhado;
Eficiência, considerada como a maximização dos resultados e minimização dos custos,
Efetividade ou eficácia quando um projeto atinge os objetivos para os quais foi
Confiabilidade, que diz respeito à estabilidade da eficiência ao longo do tempo.
(Quintanilla, 2005: p.126-128 e 131).
Segundo Quintanilla, esses também são os critérios para a análise dos processos de
transformação tecnológica pela adoção de uma técnica diferente. Vale a pena, aqui, explicitar a
diferença conceitual entre técnica e tecnologia utilizada neste trabalho. Esses dois conceitos se
diferenciam pela atitude de quem realiza a ação, pois estariam relacionados ao processo de
produção e não ao objeto final. Enquanto o termo técnica diz respeito à repetição de um sistema
53
de ações, o termo tecnologia se refere ao desenvolvimento de soluções de problemas específicos
e práticos decorrentes de uma técnica já ineficaz (Quintanilla, 2005: p.139). A diferença entre
técnica e tecnologia está, portanto, no caráter inovador da tecnologia versus o caráter repetitivo
da técnica. Neste sentido, a mudança de uma técnica para outra consiste numa transformação
tecnológica, que pode ser percebida quando se faz uma análise sincrônica, ou seja, quando a
variável temporal é incluída no processo de análise (Gama, 1986: p.37-39).
Os conceitos de técnica e tecnologia vêm, portanto, ao encontro do objetivo desse trabalho, o
de identificar as transformações tecnológicas das fortificações de Pernambuco em função do
aporte tecnológico holandês. As escolhas técnicas feitas pelo colonizador português dizem
respeito à escolha de um tipo ou modelo para a construção das fortificações. Essas escolhas,
percebidas ao longo de dois séculos, podem evidenciar a busca pela manutenção ou mudança
da técnica pressupondo que o objetivo do colonizador é sempre utilizar uma técnica mais eficaz
do ponto de vista bélico. As transformações tecnológicas, portanto, também estão sendo
utilizadas enquanto referencial teórico no âmbito dessa pesquisa.
Para se compreender a necessidade de mudança de técnica e, no caso das fortificações
analisadas, a ideia de transformação tecnológica, essa mudança pode ser explicada pelo
conceito de intencionalidade. Segundo Quintanilla, um sistema de ações intencionais pressupõe
um conjunto de referências cognitivas necessárias à realização de ações que obedece a regras e
normas pré-estabelecidas com o objetivo de alcançar um determinado fim. Nesta perspectiva, a
intencionalidade intrínseca ao domínio de uma técnica considera, portanto, (Quintanilla, 2005:
p.50-53):
(i) conhecer os materiais a serem utilizados e seus condicionantes físicos,
(ii) conhecer os objetivos a serem alcançados,
e
(iii) dominar o manual de operações a ser realizado com a ordem de aplicação das regras
(iv) ter a habilidade para por em prática o sistema de ações.
A transformação tecnológica, por sua vez, significa a modificação de uma técnica ou o
desenvolvimento de uma nova técnica, tudo com uma perspectiva intencional. Essa
transformação pode ocorrer por composição de diferentes técnicas existentes ou pela reunião
de novos conhecimentos, ou mesmo pela definição de novos objetivos. Segundo Quintanilla, a
transformação pode ser cumulativa ou dispersa; gradual ou em saltos; rápida ou lenta, caótica
54
ou progressiva; não devendo ser entendida como uma transformação linear (Quintanilla, 2005:
p.37-39). Basalla ainda complementa que as transformações tecnológicas devem ser estudadas
em cada caso específico, pois as razões dessa mudança podem ser múltiplas e particulares, não
sendo possível fazer generalizações (Basalla 1991: p. 40).
Para as fortificações de Pernambuco, a identificação de mudança ou permanência de uma
técnica pressupõe uma escolha que foi investigada no âmbito desse trabalho, por ser um dos
objetivos dessa pesquisa. Essa escolha técnica ainda supõe um conjunto de restrições e de
possibilidades impostas por critérios de utilidade da técnica. A avaliação desta utilidade
pressupõe ainda a intenção de se atingir certo nível de eficiência (Quintanilla, 2005: p. 51 e
125-131).
A partir da avaliação da utilidade, é possível, portanto, comparar várias técnicas e suas origens
tecnológicas para identificar se uma é mais eficaz que a outra. Essa avaliação permite identificar
se uma técnica consegue atingir o seu objetivo. A avaliação da eficácia, a rigor, busca saber em
que grau os resultados do sistema de ações coincidem com os objetivos que intencionalmente
se pretendiam alcançar.
TRANSFORMAÇÃO TECNOLÓGICA
O desenvolvimento de um projeto técnico visa estabelecer as referências tecnológicas
estabelecidas por um tipo ou modelo de fortificação que atenda às necessidades defensivas de
um território e de realidades sociais, econômicas e políticas específicas. Existe, porém, uma
necessidade permanente de ajustes entre um modelo de projeto técnico e sua aplicação a uma
determinada situação, em função das condições específicas de custos, disponibilidade de
material, conhecimento técnico e científico, de integração social.
Nesta linha metodológica, para se compreender a manutenção da técnica de fortificação, ou
seja, do tipo ou modelo de fortificação utilizado, ou suas transformações tecnológicas, há que
se considerar dois tipos de motores desta dinâmica: os internos e os externos.
Os motores das transformações tecnológicas de caráter interno dizem respeito aos aspectos
diretamente relacionados à fortificação, como a melhoria da eficácia, por exemplo. Por sua vez,
os motores de caráter externo consideram os fatores sociais, políticos, econômicos e culturais
como determinantes para as decisões e processos construtivos (Quintanilla, 2005: p. 61-62).
55
Embora autores como Oliveira considere que a historiografia tem enfocado as técnicas e
descrito suas inovações como um fenômeno interno, progressivo e benéfico, deixando de lado
a sua relação com as mudanças sociais e culturais, essa não foi a orientação desta pesquisa. Ao
contrário, considerou-se aqui que os fatores externos podem sim, ajudar na análise das
transformações tecnológicas, como elementos de negociação dentro de seus contextos
(Oliveira, 2002: p.46-47).
A identificação do grau de contribuição de um caráter interno passa pela análise de eficácia da
técnica, ou seja, no caso das fortificações de Pernambuco, do tipo ou modelo. Para a verificação
do grau de contribuição dos caracteres externos, deve-se considerar cada fator, como, por
exemplo, o cultural; ou seja, um conjunto de crenças, ideais valores, regras e pautas de
comportamento que caracterizam uma sociedade e contribuem para configurar sua cultura
(Quintanilla, 2005: p. 27).
HIPÓTESES DAS TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS
Segundo Quintanilla, a inovação é um processo que consiste na produção ou assimilação de
conhecimentos recém produzidos e na sua aplicação para gerar um novo produto que atende às
novas exigências. O conhecimento criado ou assimilado é de dois tipos: o representacional e o
operacional. O conhecimento representacional envolve o ‘saber o que fazer’ e o operacional
abrange o ‘como fazer’. (Quintanilla, 2005: p. 251). No âmbito deste trabalho, o conhecimento
representacional diz respeito ao conteúdo dos Tratados de Fortificação, ao conhecimento
técnico dos portugueses (adquirido pela participação da execução de obras de fortificação
modernas portuguesas nas colônias portugueses na Índia, África etc), e à presença de
profissionais estrangeiros atuando em Pernambuco ou, até mesmo, em obras holandesas em
Pernambuco. Já o conhecimento operacional, relativo à prática, pode ser assimilado através da
presença de profissionais estrangeiros, da experiência adquirida por profissionais lusobrasileiros e mesmo daqueles tratados de fortificação que tenham um viés mais prático,
ensinando o ‘como fazer’.
Quando se trata especificamente de inovação tecnológica, o conhecimento a ser utilizado é o
tecnológico e, na sua aplicação, além da inovação de produto, há a inovação de processo, ou
seja, pode surgir uma nova forma de produzir um produto já existente. Segundo Quintanilla, o
processo de inovação se desenvolve num contexto tecnológico e social. Do ponto de vista
tecnológico, esse contexto é caracterizado pelo conhecimento tecnológico já disponível e por
56
aquele gerado durante a execução do novo processo; e do ponto de vista social, desse contexto
vêm informações que podem condicionar, possibilitar e dirigir a inovação, ou sejam, as novas
necessidades, demandas e oportunidades (Quintanilla, 2005: p. 253 e 254). Na Capitania de
Pernambuco, o contexto tecnológico está relacionado ao conhecimento tecnológico do
colonizador. O contexto social, por sua vez, ou seja, as necessidades e demandas dos lusobrasileiros passavam pela aplicação do conhecimento tecnológico mais atual para se gerar um
novo produto que atendesse às novas exigências de defesa geradas pela artilharia pirobalística
de efeito de destruição que estava em uso.
Quintanilla assinala ainda outros fatores que contribuem no processo de inovação. A capacidade
técnica necessária à aplicação do novo conhecimento para gerar o novo produto, avaliando sua
eficácia e utilidade; assim como os meios adequados e suficientes em termos, por exemplo, de
capital, matéria-prima, força de trabalho qualificada. Quanto aos fatores culturais, considera-se
o conhecimento uma parte da cultura, também contribuindo no processo de inovação. A
capacidade de inovar e a propensão de inovar são elementos culturais dos grupos sociais, na
medida em que o domínio de uma nova tecnologia não é condição suficiente para garantir que
esta será usada. A capacidade de inovação tecnológica de um grupo depende dos conhecimentos
tecnológicos que estão disponíveis e que foram incorporados, já a propensão a inovar depende
das atitudes, valores e pautas desse grupo. Por isso, não basta poder inovar, é preciso querer
inovar, usar suas capacidades para gerar novos produtos (Quintanilla, 2005: p. 255 e 256). Uma
situação de guerra, por exemplo, pode contribuir com a propensão para a inovação.
IDENTIFICAÇÃO DE PROCESSOS COGNITIVOS A PARTIR DO ENFOQUE TECNOLÓGICO
Os processos técnicos e tecnológicos compostos por ações intencionais complexas pressupõe a
existência de componentes cognitivos e de habilidades práticas (Quintanilla, 2005: p. 56).
Segundo Renfrew, os símbolos construídos pelo homem a partir dos componentes cognitivos e
de suas habilidades práticas materializam a sua visão de mundo. Por isso, através dos símbolos,
que no âmbito deste trabalho são os objetos resultantes de processos técnicos ou de
transformações tecnológicas, podem ser obtidos dados sobre o funcionamento da mente do
homem e também sobre as suas ações (Renfrew. 2001: p.5). A escolha por utilizar uma
abordagem de processos técnicos ou de transformações tecnológicas se fundamentou na
capacidade do enfoque tecnológico, no âmbito da pesquisa arqueológica, de aportar
conhecimento bem fundamentado, com baixo grau de incerteza dos seus resultados, em função
da íntima relação entre técnica x matéria-prima x Leis da física (Gallay, 1986: p.38).
57
Nesse contexto, essa pesquisa considerou as categorias estabelecidas por Renfrew para a
estruturação da análise de símbolos, são elas: do comportamento humano: projetivo, planejador,
medidor, social, sobrenatural e representativo. No âmbito deste trabalho, a primeira categoria
considerada foi a do comportamento humano projetivo, onde se verifica a intencionalidade na
preparação do objeto e a consequente estrutura coerente de ações realizadas. A segunda
categoria foi a do comportamento humano planejador, que reflete a existência de uma
programação no tempo para a realização da ação. Trata-se, portanto, da reflexão sobre as ações
a serem feitas e o seu encadeamento. A última categoria considerada foi a do comportamento
medidor, que considera a concepção de instrumentos e sua utilização. Essa categoria pressupõe
a realização de ações sequenciadas e repetitivas, e um pensamento quantitativo junto com a
prática de realizar medições (Renfrew, 2001: p.6).
1.2.2 TRATAMENTO DE DADOS E MANIPULAÇÃO DOS CONCEITOS
Para responder as indagações acima apresentadas, os procedimentos de análises previstos nessa
pesquisa buscam identificar as referências europeias de fortificação, assim como, os princípios
e regras dos Tratados materializados nas fortificações de Pernambuco, considerando as
fortificações construídas antes, durante e depois da presença holandesa. Com foco na eficácia
bélica de todo esse conjunto de fortificações, pretende-se analisar os processos de
transformação ou permanência tecnológica das fortificações, cujo foco está nos motores
internos da transformação tecnológica. E pretende-se abordar as constatações relativas às
opções por determinadas tecnologias à luz dos fatos históricos, ou seja, dos motores externos,
buscando explicar as razões que motivaram essas escolhas.
As análises a serem feitas sobre os motores internos estão considerando:
as referências da caracterização física dos tipos de fortificação europeias, a serem
obtidas a partir de fontes documentais secundárias;
os Tratados sobre fortificação; e,
os dados da caracterização física das fortificações construídas por portugueses nos
século XVI e XVII em Pernambuco (a serem obtidos a partir de levantamento físico e
levantamento documental em fontes primárias iconográficas).
O processo de análise se inicia pela verificação dos tipos de fortificações construídos em
Pernambuco: Fortificação de Transição ou Fortificação Moderna com base nas referências
europeias. Como não há referências de Fortificações Medievais no Brasil, como vimos no
58
Capítulo 1, esse tipo não foi considerado. Nesta primeira análise, que segue uma abordagem
sincrônica, as características físicas dos dois tipos de fortificação foram comparadas às
características físicas das fortificações encontradas em Pernambuco para permitir a
classificação dessas fortificações em dois tipos: Fortificação de Transição e Fortificação
Moderna. Conforme já referido, esses serão os dois focos de análise para os quais se dispõe de
informações confiáveis.
A segunda etapa do processo de análise foi a verificação de que os Tratados foram utilizados
como referência para as fortificações de Pernambuco. Num primeiro momento, às
características físicas das fortificações de Pernambuco e a características físicas dos Tratados
serão comparadas, numa abordagem sincrônica. Essa análise só foi possível de ser realizada
porque os Tratados de Fortificação estão sendo considerados nesta pesquisa como referência
confiável. Essa confiabilidade identificada a partir das referências teóricas apresentadas no
Capítulo 1.
Uma segunda etapa da análise foi a verificação da eficácia bélica das fortificações de
Pernambuco. Esta análise está considerando as referências europeias e os Tratados. Lembrando
que as Fortificações Modernas são mais eficazes que as fortificações de Transição, pois estas
últimas não estão preparadas para resistir às armas de fogo da artilharia pirobalística, já
amadurecida e com alto poder de destruição. Considera-se que o grau de semelhança das
fortificações com os Tratados elevam a eficácia bélica, uma vez que os Tratados propõem
modelos ideais.
Finalmente, a terceira, e última, etapa de análise consistiu na identificação da transformação ou
permanência tecnológica dos processos construtivos das fortificações de Pernambuco,
considerando sua eficácia bélica, a partir da constatação de que ao longo do tempo - antes,
durante e depois da ocupação holandesa -, houve mudança entre os tipos e modelos de
fortificação. Assim foi possivel verificar a origem do real aporte tecnológico às fortificações de
Pernambuco. O resultado foi um quadro localizando os tipos e modelos de fortificações
construídas em Pernambuco, ao longo do tempo: antes, durante e depois da presença holandesa,
identificando o seu grau de eficácia bélica.
Para finalizar o processo de análise, as constatações feitas a partir do cruzamento dos dados
tecnológicos como descrito acima, serão em seguida trabalhadas considerando os fatores sociais
envolvidos na realidade política, econômica, religiosa e comunitária, como forma de medir a
59
influência do meio comunitário e da hierarquia de poder nas decisões sobre a construção e
utilização dos fortes estudados.
Em síntese, o processo de análise proposto neste trabalho se alicerça a partir do aprofundamento
do enfoque tecnológico das estruturas construtivas, pela sua capacidade diferenciada para
realizar constatações plausíveis. Entende-se que este enfoque tecnológico, dentre os demais
(econômico, demográfico, sociológico, religioso e simbólico), é um dos mais passíveis de
aprofundamento (Gallay, 1986: p.38). A diminuição do grau de incerteza das constatações
também foi resultado da utilização de procedimentos operacionais emprestados da
arqueometria, pela sua capacidade de fornecer dados quantificáveis e aptos de serem
contrastados.
60
CARACTERIZAÇÃO
DAS FORTIFICAÇÕES EUROPEIAS DOS SÉCULOS
XVI E XVII QUE SERVEM DE REFERÊNCIA PARA PERNAMBUCO
Neste capítulo, procurou-se caracterizar os tipos de fortificação desenvolvidos na Europa nos
séculos XVI e XVII considerados como Fortificação de Transição e Fortificação Moderna, a
partir da identificação de seus atributos físicos. Essa caracterização foi usada mais adiante para
construir as referências necessárias para a análise comparativa realizada. Essa análise, buscando
as articulações entre as referências documentais e os dados das fortificações levantados em
campo (dados apresentados no Capítulo 5), permitiu classificar tipologicamente as fortificações
de Pernambuco.
Não foram detalhados os atributos da Fortificação Medieval, no âmbito desse trabalho, porque
não há referências documentais, nem físicas, da existência desse tipo de fortificação na
Capitania de Pernambuco. Um esforço sem utilidade prática nessa pesquisa.
A caracterização física dos tipos de fortificação aqui estudados considera um conjunto de
variáveis, enquanto categorias de entrada, tais como:
os principais itens que compõem a fortificação (baluarte, cortina, fosso, ...),
o seu formato,
as dimensões e suas proporções,
os modelos de fortificação, e
a inclinação.
Essas variáveis são as mesmas que foram utilizadas nos Capítulos 4 e 5, quando foi realizada a
caracterização física das fortificações apresentadas nos Tratados e das fortificações construídas
em Pernambuco.
2.1
A FORTIFICAÇÃO DE TRANSIÇÃO
Esse tipo de fortificação fez parte do processo de evolução da Fortificação Medieval para o tipo
de Fortificação Moderna, tendo em vista as transformações das armas de fogo. O termo
evolução está aqui sendo usado, propositalmente, para evidenciar que a passagem do tipo
Medieval para o Moderno promoveu um incremento qualitativo positivo no que concerne à
capacidade de se defender. A partir dessa caracterização, foi possível verificar se as
fortificações construídas em Pernambuco, nos séculos XVI e XVII, eram do tipo de Transição
ou se já estavam preparadas para se defender das armas de fogo.
61
Como já foi apresentado no Capítulo 1, a Fortificação de Transição tinha o objetivo de defender
um sítio do poder de fogo da artilharia pirobalística criada no século XIII, pois a Fortificação
Medieval tornou-se ineficaz a esse tipo de armamento. Desenvolveu-se, assim, um processo de
adaptação de suas estruturas e de incorporação de novos elementos considerados precursores
da Fortificação Moderna, abaluartada, configurando duas fases, respectivamente (Guia de
inventário, 2015: p. 16 e 21).
A adaptação das estruturas medievais foi considerada uma primeira fase da Fortificação de
Transição. Em Portugal, essa primeira fase ocorreu de 1481 a 1509, durante o reinado de D.
João II (de 1481 a 1495) e a primeira metade do reinado de D. Manuel I (de 1508 a 1510). As
adaptações consistiram em mudanças pontuais para instalação das novas armas de fogo na
estrutura da fortificação.
Na segunda fase, que ocorreu de 1509 a 1531, durante a segunda metade do reinado de D.
Manuel I (de 1508 a 1510) e até 1531, no reinado de D. João III, foram feitas reformas mais
profundas e construídas novas fortificações. Essa fase foi influenciada pelas discussões
ocorridas na Itália, desde no final do século XV, incluindo o amadurecimento do projeto do
baluarte das primeiras décadas do século XVI (Guia de inventário, 2015: p. 16).
A seguir, estão detalhadas as características físicas da Fortificação de Transição, a partir da sua
Configuração Geométrica e dos materiais construtivos. O detalhamento das características
físicas da Fortificação Moderna foi apresentado em sequência, completando as referências
necessárias à posterior análise.
2.1.1
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
A Fortificação de Transição da primeira fase era formada pelas muralhas16 medievais
construídas com a mesma espessura, porém com menor altura e base reforçada, em talude. As
torres e muralhas medievais ganharam troneiras17 e canhoneiras18 permitindo o tiro flanqueado
16
Muralha é uma parede possante construída em pedra, taipa ou ladrilho no período medieval (Guia de inventário,
2015: p.91).
17
Troneiras são aberturas arredondadas e longas rasgadas na muralha para permitir o tiro (Guia de inventário,
2015: p.106).
18
Canhoneiras são troneiras retangulares onde se colocam as armas de fogo, da artilharia pirobalistica (Guia de
inventário, 2015: p.71).
62
com armas de fogo, além de barbacãs19 e couraça20 que são estruturas externas para aumentar a
defesa da fortificação. Verificou-se ainda a tendência de criar fortificações com o formato
geometrizado (Guia de inventário, 2015: p.16-18).
A seguir, observa-se no Castelo de Algoso, em Bragança, norte de Portugal, a incorporação de
uma muralha mais baixa, compondo com a primitiva Torre de Menagem, de origem medieval,
uma fortificação mais adaptada às armas de fogo. Na parte nova da fortificação, observam-se
as canhoneiras no terraço, indicando a existência de uma plataforma onde estaria posicionada a
artilharia. Essa mesma preparação foi feita na torre de Menagem, incluindo a abertura de
troneiras em níveis mais baixos para possibilitar o tiro rasante, ou seja, mais próximo do nível
do solo, onde está o inimigo.
Foto 3. Castelo de Algoso (Conselho de Vimioso, Bragança) que materializa as adaptações sofridas pelas
Fortificações Medievais na primeira fase da Fortificação de Transição. A antiga Torre de Menagem foi incorporada
num dos ângulos da nova fortificação. Fonte: site welcomenordeste.net.
Observa-se ainda o reforço da base da Torre de Menagem para melhorar a estabilidade da
estrutura diante das armas de fogo, além da construção ter sido feita sobre um terreno
montanhoso, a estrutura com muralha estreita e alta, com abertura em vários níveis. Conforme
19
Barbacã são muralhas baixas localizadas no exterior da fortificação, formando uma segunda muralha (Guia de
inventário, 2015: p.68).
20
Couraça são muralhas avançadas, com ou sem torre integrada, para evitar a tomada de pontos significativos
(Guia de inventário, 2015: p.17).
63
se verá mais adiante, este tipo de estrutura não é encontrado em nenhuma fortificação existente
em Pernambuco, nem mesmo na iconografia.
Na segunda fase, a Fortificação de Transição era marcada pelo surgimento do tambor, ou seja,
uma ampla torre circular, oca, posicionada nos ângulos da muralha e enterrada no fosso. As
troneiras da fase anterior desapareceram e as canhoneiras aumentaram de tamanho, para o tiro
flanqueado (Guia de inventário, 2015: p.18). Essas transformações podem ser visualizadas no
Castelo Portel Alentejo, em Portugal, onde há vários tambores, cujos terraços, preparados com
canhoneiras, apresentam dimensão suficiente para o posicionamento de armas de fogo. As
canhoneiras também foram abertas nas paredes dos tambores, para permitir tanto o tiro rasante
quanto o flanqueamento da cortina.
Foto 4. Castelo Portel Alentejo, modificado pelo Engenheiro Francisco de Arruda em 1510. Seis dos oito
tambores foram rasgados por canhoneiras em dois níveis de tiro. Fonte: site c2.staticflickr.com.
Em Pernambuco, há duas diferentes representações do Forte de São Jorge (Vista do Recife de
Peeter Gillis, 1637, e estampa e folheto holandês, de 1630, “de Stadt Olinda de
Pharnambuco...”), que foi construído em 1590, no istmo entre a Vila de Olinda e seu porto,
onde o forte aparece com quatro tambores posicionados nos ângulos da fortificação, que tem
formato quadrangular, e canhoneiras abertas em dois níveis na muralha. As imagens foram
objeto de análise, mais adiante, para permitir identificar a que tipo de fortificação o Forte
poderia pertencer.
64
Na continuação do processo de desenvolvimento da segunda fase do tipo de Fortificação de
Transição, surgiram baluartes atípicos, ou seja, embrionários dos baluartes modernos. Eram
estruturas pouco salientes, com defesa frontal paralela à muralha e com grandes orelhões onde
eram colocadas as armas de fogo. Esses baluartes, no entanto, deixavam zonas mortas junto aos
orelhões, onde o inimigo não poderia ser atingido pela artilharia (Guia de inventário, 2015:
p.18). No Castelo de Cerca Nova de Lagos, no Algarve, em Portugal, a adaptação da estrutura
às novas necessidades abrangeu a construção de baluartes atípicos, onde foram abertas
canhoneiras no terraço e em um nível mais baixo. Esses baluartes apresentam faces paralelas
às cortinas e orelhões, protegendo os flancos, mas acabaram criando zonas mortas.
Foto 5. Castelo de Cerca Nova de Lagos, localizado em Lagos, distrito de Faro no Algarve, foi modificado de
1520 a 1544. Apresenta muralha ainda no estilo medieval, sem canhoneiras. Mas tem baluarte atípico onde a
estrutura é pouco saliente e paralela à muralha com grandes orelhões onde estão posicionadas as armas de fogo.
Fonte: site museudigitalafroportugues.files.wordpress.com.
Paralelamente às adaptações em estruturas existentes, surgiram novas fortificações do modelo
de Transição, com formatos inovadores. A Torre de Belém, torre marítima construída de 1514
a 1519, com projeto de Francisco de Arruda, se configurou como uma torre medieval
quadrangular conjugada a um baluarte moderno, baixo, de planta poligonal. O castelo de Évora
Monte, por sua vez, construído de 1531 a 1535 com projeto de Francisco de Arruda, também é
um exemplo de uma nova fortificação. Apresentou planta quadrangular com quatro tambores
rasgados por canhoneiras em vários níveis (Guia de inventário, 2015: p.19-20).
65
Foto 6. Castelo de Évoramonte,, localizado no município de Evoramonte, concelho de Estremoz, distrito de
Évora, no Alentejo, apresenta planta quadrangular com quatro tambores. Fonte: site pt.wikipedia.org.
A Fortificação de Transição não tinha formato pré-definido. Caracterizou-se por muralhas que
circundavam a cidade, com tendência para geometrização. Na segunda fase, podiam ser
identificadas fortificações com algum formato regular, mas não havia padrão a ser seguido,
cada autor definia o formato segundo condicionantes específicos.
No que diz respeito a dimensões e proporções, assim como no estabelecimento do formato,
cada fortificação apresentava uma dimensão própria. De uma maneira geral, estavam sujeitas
às necessidades de defesa, ao sítio, à decisão do profissional responsável ou proprietário e aos
recursos financeiros, materiais e de pessoal disponíveis.
Quanto a tipos, verifica-se que as Fortificações de Transição eram resultado de reformas em
Fortificações Medievais, por isso não contava com tipos pré-definidos. Em alguns Tratados,
como, por exemplo, o Tratado “Instructions sur la fortification des villes, bourgs et chateaux”
de Albrecht Dürer, havia tipos de tambores, mas não de fortificações. Finalmente, quanto à
inclinação da muralha, verificou-se que a parte inferior da muralha medieval, passou a ser
inclinada para propiciar o reforço da base.
2.1.1 MATERIAIS CONSTRUTIVOS
No que concerne aos materiais construtivos, como parte das fortificações do tipo de Transição
eram reformas realizadas em Fortificações Medievais existentes, os novos elementos eram
construídos com os mesmos materiais da fortificação. Quando uma nova fortificação era
construída, a escolha do material cabia ao responsável pela obra ou ao proprietário, segundo:
66
preferência pessoal, herança cultural, disponibilidade no local, recursos disponíveis, orientação
de determinado Tratado e, ainda, limitações de recursos financeiros e pessoal capacitado
(Moreau, 2011: p, 44).
Não havia nenhuma regra explícita. No entanto, como foi observado no Tratado manuscrito de
Antônio Rodrigues, apesar de sugerir que a matéria-prima utilizada fosse ou a terra ou a
alvenaria, detalhando como se deveria proceder em cada caso, lembrava que a versão definitiva
da obra deveria ser feita em alvenaria de pedra ou tijolo. O próprio autor justificava que a
alvenaria apresentava maior custo e maiores riscos aos defensores, pelo ricocheteamento dos
projéteis e estilhaços das pedras, mas que esse material garantiria maior durabilidade à estrutura
(Moreau, 2011: p. 20).
A partir das referências acima apresentadas, pode-se verificar que o tipo de Fortificação de
Transição não conta com modelos padronizados, pois esse tipo, na sua maior parte, foi o
resultado de adaptações das estruturas medievais, num primeiro momento; e de reformas mais
profundas dessas estruturas, num segundo momento. Apesar de terem sido construídas novas
fortificações ainda nesse segundo período, estas não chegaram a configurar modelos
padronizados com formatos e medidas pré-estabelecidos.
2.2
A FORTIFICAÇÃO MODERNA, ABALUARTADA
O conhecimento das caraterísticas físicas da Fortificação Moderna, abaluartada, assim como
foi feito no item anterior para a Fortificação de Transição, subsidiará as análises a serem
realizadas no Capítulo 6 para verificar se as fortificações construídas em Pernambuco, nos
séculos XVI e XVII, são do tipo de Transição ou Moderno.
Com base nas referências documentais, apresentadas no Capítulo 1, sabe-se que a Fortificação
Moderna foi desenvolvida na primeira metade do século XVI para defender os sítios da nova
artilharia pirobalística que se desenvolveu desde 1520, resultando numa artilharia cujo efeito
de destruição passou a superar o efeito moral (Guia de inventário, 2015: p. 21).
Um dos principais elementos da Fortificação Moderna era o baluarte angular que junto com a
cortina compunha a sua estrutura básica. A importância do baluarte estava no fato de ter
resolvido o problema de defesa da fortificação em função da artilharia de destruição e de espaço
para permitir dispor a nova artilharia sobre a fortificação para atacar o inimigo.
67
Figura 6.
baluarte.
Esquema de uma fortificação moderna, abaluartada, com seus elementos básicos: cortina e
No que concerne à defesa da fortificação, o baluarte, enquanto uma estrutura saliente que se
articulava com toda a fortificação, possibilitava que se atirasse no inimigo que tentasse se
aproximar (Moreau, 2011: p.35). A defesa era feita através de linhas flancantes, que partiam
dos flancos, paralelamente à face do baluarte contíguo. Essas linhas eram indicativas dos tiros
de canhões que a fortificação poderia efetuar a partir dos flancos e juntas formavam faixas de
defesa. É a largura da faixa de defesa que demonstraria a boa qualidade defensiva de uma
fortificação: quanto mais larga essa faixa, melhor defendida estaria a fortificação (Goldman,
1645. p. 2-3).
Figura 7.
Representação das linhas flancantes e das faixas de defesa de uma fortificação moderna,
abaluartada, que partem do flanco e passam paralelas à face do baluarte contíguo.
68
Seu formato pentagonal ainda evitava zonas mortas onde os inimigos poderiam se esconder,
sem ser atingidos. Nesse formato não havia ponto que não pudesse ser visto a partir da própria
construção, e, consequentemente, que não pudesse ser defendido (Guia de inventário, 2015:
p.84; Calabuig, 2007: p.4).
Quanto à disposição da artilharia sobre a fortificação, além dos baluartes terem grandes
dimensões com espaço para realizar manobras, o formato pentagonal, e não mais circular 21,
permitia uma melhor organização das armas de fogos 22. As bocas de fogo passaram a ser
posicionadas, lado a lado, concentrando o ataque de frente para o inimigo, aumentando as
chances de sucesso (Orense, 2012: p.33; Guerra, 2012: p.21-22). O traçado abaluartado atingiu
seu auge em 1650 e por todas as razões acima apresentadas, passou a ser a escolha dominante
para a construção de fortificações até o século XIX (Guia de inventário, 2015: p.84).
A seguir, foram detalhadas as características físicas da Fortificação Moderna, a partir da sua
Configuração Geométrica e dos materiais construtivos O detalhamento de suas características
físicas foram reunidos com aqueles da Fortificação de Transição para completar as informações
necessárias à posterior análise das fortificações de Pernambuco.
2.2.1
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
Conceitualmente, uma Fortificação Moderna era uma estrutura formada por um maciço de terra
denominado Reparo, que funcionava como uma gigantesca trincheira, e tinha o objetivo de
amortecer o impacto dos projéteis das armas de fogo. As partes exterior e interior do Reparo
eram escarpadas, em talude, podendo ou não, serem encamisadas23 (Guia de inventário, 2015:
p.100).
Apesar do conceito de Fortificação Moderna, utilizado acima, fazer referência ao material
construtivo, a terra, esse tema foi aprofundado mais adiante, onde estão apresentadas opções
dos materiais construtivos utilizados. Vale a pena salientar, no entanto, que do ponto de vista
conceitual não foi, de todo, inadequada a referência à terra, pois a Fortificação Moderna
apresenta um pressuposto de eficácia bélica em função, dentre outros, da sua capacidade de, se
21
As torres circulares, ovaladas e triangulares eram utilizadas nos tipos de fortificação medieval e de transição
(Orense, 2012: p.33; Guerra, 2012: p.21-22).
22
Nas torres de formato circular, as bocas de fogo são posicionadas radialmente, independente da localização do
inimigo.
23
Encamisar significa revestir a escarpa pelo assentamento uniforme de pedras ou outro material.
69
atingida pelas armas de fogo, não ter sua estrutura danificada. A terra, enquanto material
construtivo, incondicionalmente, dá suporte a esse pressuposto.
Figura 8.
Relação de esbeltez entre uma parede vertical e o reparo de uma fortificação para demonstrar a
maior capacidade do reparo de amortecer o impacto dos projéteis das armas de fogo.
Os principais itens de Fortificação Moderna, abaluartada, podem ser vistos na imagem que
segue; esses itens eram (Guia de inventário, 2015: p.62-109):
Baluarte regular e com orelhões (os baluartes de uma maneira geral eram compostos de
faces, flancos e gola24. O baluarte com orelhões, porém, apesar de ter planta poligonal
moderna, apresentava as faces mais alongadas e os flancos resguardados por detrás de
robustas curvas denominadas orelhões (Matos, 2012: p. 111; Galbeño, 2007: p. 35));
Cortina (parte do reparo que liga os baluartes entre si);
Terrapleno (parte superior do Reparo onde se colocavam as armas de fogo e onde havia
circulação da tropa de artilheiros);
Parapeito com banqueta e canhoneiras (muro feito sobre o reparo para proteger os
defensores contendo um degrau (banqueta) sobre o qual o defensor poderia observar o
inimigo e aberturas (canhoneiras) para posicionamento das armas de fogo);
Cavaleiro (estrutura construída sobre o baluarte ou cortina, mais elevada, para o reforço
da defesa do reparo, aumentando também a área de posicionamento da artilharia);
24
Gola é uma linha imaginária que liga os flancos.
70
Praça de armas (espaço de reunião dos defensores, localizado no centro da fortificação
e no caminho coberto);
Fosso (escavação ao redor de todo o perímetro da fortificação para dificultar o acesso,
composto de escarpa e contra escarpa, podendo ter refosete25);
Contraguarda (obra exterior contendo face e flanco, mais baixo que o reparo, para
proteger a escarpa exterior da artilharia);
Revelim (Contraguarda de formato triangular ou de meia-lua, mais baixa que o reparo,
que oculta sua escarpa exterior, protegendo-a da artilharia);
Tenalha (Contraguarda de formato de rabo de andorinha ou chapéu de bispo, mais baixa
que o reparo, para proteger a escarpa exterior entre dois flancos);
Horneveque (Contraguarda tipo Tenalha, contendo dois meio-baluartes, mais baixa que
o reparo, para proteger a escarpa exterior entre dois flancos);
Coroada (Contraguarda tipo Tenalha, contendo dois meio-baluartes e um baluarte, mais
baixa que o reparo, para proteger a escarpa exterior entre dois flancos);
Caminho coberto (caminho de circulação ao redor do fosso que servia para atacar o
inimigo que se aproximava do reparo);
Parapeito do Caminho coberto (muro feito sobre a esplanada26 para proteger os
defensores); e,
Paliçada (cerca feita com estacas de madeira cravadas verticalmente no terreno e
interligadas entre si, posicionadas ao redor do caminho coberto).
25
Refosete é um fosso construído no centro do fosso principal para servir de mais um obstáculo e permitir a
evacuação das águas quando o fosso é seco (Galbeño, 2007: p. 36)
26
Esplanada é a área externa à fortificação, após a paliçada. Trata-se de um terreno regularizado, que passa a ter
um declive suave, de onde foi retirado todo e qualquer elemento, como árvores, construções etc. que possa ser
utilizado pelo inimigo como anteparo. O tamanho da esplanada é definido pela distância de um tiro de mosquete,
cerca de 250m (Guia de inventário, 2015: p.81-82).
71
Figura 9.
Esquema de uma fortificação moderna, abaluartada, com seus principais elementos:
7.Esplanada; 8.Caminho coberto; 9.Contra escarpa do fosso; 10.Fosso; 11.Refocete; 12. Escarpa do fosso;
13.Berma; 14.Escarpa externa do reparo; 15.Parapeito; 16.Banqueta; 17.Terrapleno; 18. Escarpa interna do reparo;
19.Esplanada; 20.Tenalha; 21.Revelim em meia-lua; 22.Hornaveque; 23.Fosso; 24.Baluarte com orelhões;
25.Revelim; 26. Baluarte regular; 27. Tenalha composta - Chapéu de bispo; 28. Praça de Armas; 29.Caminho
coberto; 30.Contraguarda; 31.Cortina; 32.Tenalha; 33.Chapéu de bispo; 34. Coroada; 35. Cavaleiro. Fonte:
modificado de Chambers, 1728.
Junto à fortificação poderia ser construída, ainda, uma Cidadela. Fortificação de menores
proporções, também do tipo moderno, normalmente com planta no formato de polígono
pentagonal ou hexagonal. Ficava implantada na zona dominante da fortificação para
complementar a defesa do sítio (Guia de inventário, 2015: p.74).
72
A fortificação moderna tinha formato de polígono regular, podendo ser irregular para adaptá-la
ao terreno ou à forma da cidade que estaria envolvendo. Seu contorno poderia ser circular,
facetado ou tenalhado27, ou poderia ser de formato poligonal, como um triângulo, quadrilátero,
pentágono etc. (Guia de inventário, 2015: p.28).
No que diz respeito a dimensões e proporções, cada fortificação apresentava uma dimensão
própria. De uma maneira geral, estavam sujeitas ao tamanho e formato do sítio e à decisão do
profissional responsável por sua construção. Outros condicionantes eram as limitações de
recursos financeiros, materiais e de pessoal. Ainda havia tabelas, disponíveis em Tratados de
fortificações, que sugeriam formatos pré-estabelecidos com dimensões de referência.
Quanto aos modelos de fortificação moderna disponíveis, estes variavam de acordo com sua
função. Num sistema defensivo eram construídas fortificações que se complementavam na
tarefa de defender um sítio. Fortificação era uma expressão genérica para designar um conjunto
de edifícios, estruturas, movimentos de terra etc.. Fortaleza, por sua vez, se referia a uma
poderosa obra fortificada que além de abrigar uma guarnição deveria defender uma povoação.
As fortalezas podiam ser Reais, quando tinham a capacidade de se defender de uma Armada
Real28, e podiam ser Ordinárias. Fortes eram pequenas fortificações isoladas, autônomas ou
dependentes de uma fortificação central. Cidadela ou Castelo eram fortificações menores,
implantadas na zona dominante de uma fortificação maior. (Guia de inventário, 2015: p.74 e
84). Redutos e Fortins eram obras pequenas, de formato quadrangular, que não conseguiam se
defender apropriadamente pela falta de flanco, portanto, eram conquistadas pelo inimigo sem
grande resistência (Goldman, 1645: p. 3-12; Galbeño, 2007: p. 34-36). Trincheiras eram obras
temporárias, resultado na movimentação de terra, feitas por tropas durante uma ação militar,
para servir de obstáculo aos ataques do inimigo. Finalizada a contenda, eram abandonadas
(Guia de inventário, 2015: p.85).
Finalmente, quanto à inclinação da escarpa do reparo, o projeto de fortificação moderna,
abaluartada, tinha as seguintes características. Diferentemente das Fortificações Medievais, e
em função do uso disseminado da artilharia pirobalistica de destruição, a partir de 1520, a
27
Fortificação de formato facetado significa que tem formato de polígono irregular com ângulos e lados diferentes
entre si. Uma Fortificação de formato em tenalha apresenta um ou mais lados fletidos, com ângulo reentrante (Guia
de inventário, 2015: p.28).
28
Armada é o conjunto de navios armados que navegavam juntos com a mesma missão, sob o comando de um
capitão-mor (Grande Dicionário Houaiss Beta da Língua Portuguesa, 2001). Numa Armada Real, a missão atende
aos interesses do Rei.
73
inclinação do reparo foi utilizada como recurso de defesa. Com a inclinação, a estrutura do
reparo era maior na base e menor no topo, melhorando sua estabilidade. Essa condição ainda
permitia uma melhor absorção do impacto dos projéteis (Valadares, 2014: p. 23). A inclinação
do reparo, no entanto, não podia ser excessiva, caso contrário poderia haver desmoronamento
do material utilizado na sua construção (Galbeño, 2007: p. 24).
2.2.2 MATERIAIS CONSTRUTIVOS
Quanto aos materiais construtivos utilizados na construção de uma fortificação moderna, não
havia uma regra única. A escolha cabia ao responsável pela obra ou ao proprietário, segundo:
preferência pessoal, herança cultural, disponibilidade no local, recursos disponíveis, orientação
de determinado Tratado e, ainda, limitações de recursos financeiros e pessoal capacitado.
Alguns tratadistas defendiam, por exemplo, que a matéria-prima precisava estar disponível no
lugar onde a obra seria feita e precisaria ser adequada ao uso a que se propunha (Scamozzi,
1615: p.44).
A partir das características físicas dos materiais, havia diferentes opiniões registradas entre os
engenheiros militares. Para uns, os melhores materiais eram solos firmes, tijolos secos ao sol e
ao vento e outros materiais semelhantes que não faziam resistência ao tiro dos canhões. Esses
materiais absorviam o impacto dos projéteis, sem maiores danos à estrutura (Scamozzi, 1615:
p.205). Porém, era dada a opção de encamisar o reparo utilizando pedras macias ou tijolos
cozidos, com argamassa de cal. O objetivo do encamisamento era conferir beleza à construção
e proteger a estrutura das intempéries, em tempos de paz (Scamozzi, 1615: p.210).
Para outros, a melhor escolha era construir o reparo em terra. Em períodos de guerra, a terra
poderia ser encontrada em todos os lugares, as ferramentas necessárias eram simples, era um
material que não precisava de preparação, já que estava sempre pronto a ser usado e, ainda,
tinha baixo custo. A terra era também considerada o material mais adequado por alguns, pois
não pega fogo e consegue absorver e segurar os projéteis. E quando uma muralha em terra era
destruída, seria possível facilmente reconstruí-la (Dogen, 1648. p. 85-86).
Neste contexto, não foi definido pelos tratadistas um único material construtivo para a
construção de fortificações, mas foi possível observar que para a edificação de uma Fortificação
Moderna, cuja eficácia bélica é considerada pressuposto básico, o material escolhido deveria, a
74
partir de suas características físicas e mecânicas, permitir defender a estrutura dos tiros das
armas de fogo sem maiores danos.
Uma vez identificadas às características físicas dos tipos de Fortificação de Transição e
Moderna, foi possível, no Capítulo 6, das análises, classificar as fortificações construídas em
Pernambuco em um desses dois tipos.
Finalmente, a partir das referências acima apresentadas, pode-se verificar que o tipo de
Fortificação Moderna conta com modelos padronizados onde estão estabelecidos os principais
itens, formatos e medidas. Esses modelos foram identificados nos Tratados de Fortificação do
século XVII, no Capítulo 4, e utilizados para continuar o processo de análise, no intuito de
verificar se dentre as fortificações modernas construídas em Pernambuco há modelos
identificáveis.
75
FASES DOS SISTEMAS DEFENSIVOS DE PERNAMBUCO NOS SÉCULOS
XVI E XVII
Neste capítulo, procurou-se fazer uma revisão bibliográfica identificando as fortificações
construídas em Pernambuco, pelo colonizador português e pelos holandeses da Companhia das
Índias Ocidentais, nos séculos XVI e XVII, localizando-as no tempo e no espaço, assim como
a contextualização histórica da Capitania neste período.
As referências apresentadas, a seguir, pretenderam demonstrar, por um lado, que houve três
conjuntos de fortificações, cada um pertencente a uma fase bélica delimitada a partir da
presença holandesa na Capitania de Pernambuco:
1º) até 1630, quando os holandeses invadiram Pernambuco; de 1630 até 1654,
2º) quando os holandeses se retiraram de Pernambuco; e,
3º) após 1654, até a assinatura do Tratado de Haia, quando foram resolvidas as disputas
territoriais e financeiras entre Portugal e a República Unida dos Países Baixos e
cessaram as ameaças de nova invasão.
A partir da divisão em fases foi possível fazer a revisão bibliográfica considerando dados
econômicos, políticos e culturais para cada uma das fases. Através desse contexto, pretendeuse verificar possíveis justificativas para as decisões portuguesas, no que concerne à construção
de suas fortificações.
Pretendeu-se evidenciar, ainda, que as diferentes fases bélicas são compostas por um Sistema
Defensivo próprio. No intervalo de tempo entre os séculos XVI e XVII, Pernambuco contou
com três Sistemas Defensivos, estruturados para atender as necessidades defensivas da
Capitania, em cada fase bélica.
Ao termo Sistema Defensivo são atribuídos dois significados, um mais amplo que o outro. O
mais utilizado na bibliografia consultada considera que um sistema defensivo é um conjunto de
fortificações e estruturas de defesa, cuja função precípua é garantir a proteção de um sítio29.
Verifica-se, no entanto, o surgimento de discussões sobre uma ampliação desse conceito.
Alguns autores já trabalham na perspectiva de que um Sistema Defensivo pressupõe “... uma
29
Cotta, s/d: p. 3; Matos, 2012: p. 5; Orense, 2012: p.11; Galbeño, 2007: p.29; Almeida, 2003: p.172; Valadares,
2014: p.54 e 95; Guia de inventário, 2015: p.22; Moreau, p.42 e 200
76
ação combinada e concomitante entre fortificações, tropas e, principalmente, embarcações
(devendo-se levar em conta ainda a quantidade e qualidade dos armamentos que dispunham
cada um dos elementos desta tríade).” (Tonera, 2005: p.2). Diferentemente da anterior, nessa
definição a eficácia de um sistema defensivo não depende apenas das fortificações, mesmo
consideradas em conjunto, mas da união dessas três forças. O presente trabalho considerará o
conceito mais amplo, numa perspectiva investigativa.
3.1
ANTECEDENTES HISTÓRICOS
Antes de tratar, especificamente, das questões relativas às fases bélicas, foi necessário situar
Pernambuco no âmbito do projeto de Portugal de Expansão Ultramarina e na formação do
Império Colonial Português, de extensão transcontinental, onde a exploração comercial se
mesclava com redes de poder e com instituições de governo secular e religioso (Vainfas, 2007:
p. 299). Deve-se registrar, no entanto, que a utilização do conceito ‘Império’ teve o objetivo de
ampliar a visão da existência de uma relação apenas entre colônia-metrópole e de uma
‘economia colonial’ que buscava a acumulação primitiva de capital para permitir a
industrialização europeia (VITORINO. 2008: p.2) sem, no entanto, o intuito de defender
posturas historiográficas institucionais ou imperiais.
Essa abordagem foi escolhida na perspectiva de poder compreender as transformações culturais
processadas numa sociedade, no caso especifico deste trabalho, as transformações tecnológicas
das fortificações, a partir de seus fatores internos (relativos à fortificação em si, como eficácia,
por exemplo), mas também através de seus fatores externos, econômicos, políticos, culturais e
religiosos (Quintanilla, 2005: p. 61-62).
A mesma dinâmica está sendo considerada na análise da expansão marítima portuguesa no
século XV, na qual está inserida a descoberta do Brasil. Do ponto de vista econômico, a Europa
vivenciava a escassez de ouro e Portugal investia na busca do ouro africano, da Guiné.
Politicamente, a consolidação da Dinastia de Avis no poder, permitiu a Portugal investir nos
meios para se buscar o reino mítico de Preste João30. Em toda a Europa, acreditava-se que
Preste João poderia ser um aliado numa possível expedição à Índia, contra os mulçumanos. E
30
Preste João foi o governante de um mítico reino cristão poderoso nas Índias, possivelmente na Etiópia, na África
Oriental. Boxer, 1969: p.43.
77
do ponto de vista religioso, Portugal incorporou o espírito de cruzada e assumiu a tarefa de
converter os muçulmanos ao cristianismo (Boxer. 1969: p. 41).
As fortificações construídas em Pernambuco estão sendo, portanto, entendidas dentro de um
contexto histórico mais amplo, que incorporou um conjunto amplo de fatores, deixando de lado
as explicações puramente econômicas; e estão sendo vistas também dentro de um panorama
transcontinental, onde se percebem relações entre metrópole, colônias e demais nações
europeias, evitando uma visão isolada do ambiente colonial.
Figura 10.
Extensão do Império colonial português e espanhol no século XVI. Fonte: site
fichasmarra.files.wordpress.com.
A extensão do Império colonial Português, por si só, sugere a amplitude e complexidade das
relações entre Portugal, suas colônias e demais nações do ocidente. Conforme se pode observar
no mapa apresentado a seguir, a partir do século XV o Império abrangia uma grande quantidade
de territórios em várias partes do mundo, como no litoral africano (São Jorge da Mina, Axim,
Moçambique, Ceuta, Tanger, Mazagão, Luanda); nas Ilhas do Atlântico (Madeira, Açores,
Cabo Verde, São Tomé e Príncipe); passando pelo Oriente (Índia/Goa, Damão, Diu, Malaca,
Chaul, Ternate, Meliapor, Hughli, Baçaim) e pelo Golfo Pérsico (Sofala, Ormuz). Seguia ainda
78
pela África oriental, Malásia e Japão e outros locais como, Columbo, Molucas, Ceilão e Macau;
finalmente, continuando pela costa brasileira (Wehling. 1999: p. 63 e Boxer, 1969: p. 69 e 70).
3.2
PRIMEIRA FASE BÉLICA (DO SÉCULO XVI ATÉ 1630)
ASPECTO POLÍTICO
Para a reconstrução do contexto colonial nesse período, a partir do século XVI até 1630, iniciou
pela consideração dos aspectos políticos envolvidos, mais precisamente, do baixo interesse
político de Portugal no Brasil. Não é difícil demonstrar que, no século XVI, as decisões relativas
ao território brasileiro, e, consequentemente, às suas capitanias, não faziam parte das
prioridades de Portugal. Durante todo o século XVI os portugueses estavam concentrados na
sustentação do Império Português como um todo, enquanto as questões relativas à colônia
brasileira poderiam recair sobre a administração local (Doré, 2009: p. 169).
Nesse período, verificou-se que a prioridade de Portugal estava no Oriente, como demonstra a
rápida expansão portuguesa, no início do século XVI, através da implantação de colônias e
entrepostos comerciais (Doré, 2009: p. 169; Wehling. 1999: p. 44). O Brasil, naquele momento,
não representava nem um grande peso econômico, nem simbólico na sustentação do Império
Português. É patente o desinteresse pelo Brasil, quando se observa a diferença de investimentos
entre a colônia brasileira e as demais. De fato, enquanto na costa africana e na Índia foi
implantado um sistema de cidades, fortalezas e feitorias; no Brasil, como não havia produtos
facilmente comercializáveis, foi instalado um sistema de feitorias, protegidas por cercas de
madeira (paliçadas), sem artilharia, com sistemas construtivos de terra apiloada, e operado por
agentes comerciais, funcionários e militares (Menezes. 1986: p. 22; Prado Júnior, 1972: p.1516).
A situação secundária da colônia brasileira perdurou por todo o século XVI, inclusive porque
Portugal, a partir de 1550, começou a enfrentar grandes desafios para a manutenção de seu
Império no Oriente. Neste processo, começaram a ensaiar mudanças na política imperial para
driblar as adversidades e aproveitar oportunidades comerciais, com baixo nível de investimento
político e financeiro. Dentre as medidas dessa nova política, estava o incentivo ao comércio no
Atlântico e Índico com produtos até então considerados pouco relevantes (escravos e açúcar,
no Atlântico; prata, cobre, seda e porcelanas no Oriente; cereais nos Açores; e vinhos na Ilha
79
da Madeira). Também foram feitas mudanças na condução dos negócios: a operação do
comércio passou a ser feito por particulares, diminuindo os gastos da Coroa com a instalação
de feitorias, cidades e fortalezas; e houve modificações no incentivo Real aos investimentos
particulares: ao invés de nomeações e rendas vitalícias, foram concedidos direitos comerciais,
obrigando o interessado a investir seus recursos para obter lucros posteriores (Siqueira. 2009:
p. 115-116).
A colonização do território brasileiro, através do sistema de Capitanias Hereditárias, fez parte
desse conjunto de novas medidas portuguesas, que se baseava em concessões comerciais para
quem empreendesse no território colonial. Pelas regras de concessões, ao donatário caberiam
as despesas de transporte e de estabelecimento dos colonos no novo território, e quando o
interessado não tivesse recursos para empreender, levantaria fundos em Portugal e na Holanda.
Grandes valores foram gastos nas primeiras empresas colonizadoras no Brasil (Prado Júnior.
1972: p. 31-32). A Coroa ainda transferiu ao donatário, a título de deveres, prover a defesa do
território com o auxílio dos colonos. Cabendo-lhe, ainda, a responsabilidade de construir as
estruturas defensivas e fornecer as armas e apetrechos bélicos. No entanto, toda ação deveria
ser autorizada pelo Rei (Albuquerque. 2006: p. 108).
Registra-se, portanto, que apesar da colônia brasileira não estar dentre as prioridades de
Portugal, o Rei não abria mão de ter o controle da colônia e de dar a palavra final sobre as
decisões a serem tomadas. Lembrando, no entanto, que a resposta com a decisão do Rei podia
demorar mais tempo do que a colônia poderia esperar. No caso da construção de fortificações
e implantação do Sistema Defensivo em Pernambuco, os projetos a serem construídos foram
enviados de Portugal, após aprovação do Rei.
ASPECTO ECONÔMICO
Do ponto de vista econômico, por sua vez, pretende-se demonstrar que o interesse de Portugal
também estava nas regiões do Oceano Índico. Portugal acreditava que as receitas oriundas do
Brasil não contribuíam significativamente para aumentar suas riquezas, por isso não eram feitos
investimentos no território brasileiro. Alguns dados demonstram, no entanto, que apesar de não
superar o montante da receita gerada com o comércio das Índias, as riquezas produzidas, no
Brasil, principalmente em Pernambuco, não eram desprezíveis.
Enquanto o Estado da Índia, do início do século XVII, era responsável por 67% das receitas, o
Brasil e Angola eram responsáveis por 12% e 14%, respectivamente. Mas a contribuição
80
financeira das colônias para o Império não estava nas receitas das colônias, estava nos contratos
e direitos referentes aos negócios produzidos. As receitas eram dispendidas com os gastos da
própria colônia: na Índia 44% das receitas eram usadas para manter suas atividades ordinárias
e extraordinárias, no Brasil era 5,5% e em Angola 1% da receita. O restante era considerado
receita excedente (Matos, p.201).
Das riquezas produzidas no Brasil, o sistema de fiscalização da Coroa controlava e cobrava
taxas referentes ao dízimo apenas do açúcar e dos direitos dos escravos (Costa. 2006: p. 11 e
12). O açúcar produzido no Nordeste brasileiro era de qualidade superior àquele produzido na
Ilha da Madeira e com custos inferiores. Entre 1570 e 1583, o número de engenhos em
Pernambuco cresceu de 23 para 66 e no ano de 1612, havia 90 engenhos na Capitania. Nesse
mesmo ano, em todo o Nordeste, havia 192 unidades produtivas de diferentes dimensões e com
diversificado potencial produtivo. Em 1629, o número de engenhos no Nordeste totalizou 346
unidades e nesse mesmo ano a produção da Capitania de Pernambuco foi responsável por 1/3
das exportações de açúcar de toda colônia (Costa. 2006: p. 11 e 12).
Esses dados vêm demonstrar que Pernambuco tinha um peso financeiro significativo quando se
observavam as riquezas produzidas na colônia brasileira, mas que não rivalizava com o
montante produzido nas outras colônias portuguesas. Essa situação vai começar a mudar a partir
do século XVII. As colônias do Atlântico começam a se sobrepor ao Índico, tendo o Brasil um
maior peso através da produção de açúcar e exportação do pau-brasil, além do comércio
negreiro. O fundamento por detrás desse crescente fator econômico pode ser entendido pela
comparação entre as relações econômicas estabelecidas por Portugal com as colônias da Índia
e com o Brasil. Na Índia, os portugueses eram intermediários: deveriam adquirir as mercadorias,
transportar e vendê-las na Europa; no Brasil os portugueses controlavam todas as fases do
processo econômico: produziam, transportavam e vendiam. A posição frágil dos portugueses
na Índia, em função da concorrência, fez aumentar a importância do Brasil (Matos, s/d: p. 203204). A partir de 1630, a pressão exercida por holandeses, ingleses e franceses às feitorias
portuguesas no Oriente provocaram grandes perdas para Portugal.
ASPECTO BÉLICO
Do ponto de vista bélico, pretende-se situar o leitor nas disputas e alianças que as nações
europeias estabeleceram entre si com relação à colônia brasileira, e Pernambuco, em particular.
De um lado, as ameaças, do outro a consequente necessidade de se defender. Pretende-se,
81
também, dar uma ideia dos investimentos necessários e apresentar a infraestrutura bélica de que
dispunha a Capitania. Desde o final do século XVI e início do século XVII, a necessidade de
defesa da colônia brasileira aumentou e passou a solicitar trabalhos de fortificação. Em
Pernambuco, as despesas com essas obras eram elevadas, chegando a gastar cerca de 64% dos
recursos próprios com infraestrutura, armas e pessoal, pesando no orçamento da Capitania,
assim como ocorria em todas as partes do Brasil. Mas, apesar dos elevados custos, as condições
de defesa ainda eram precárias: havia guarnições militares remuneradas, mas não era
quantitativamente suficiente. Pernambuco vivenciava a escassez de homens de guerra e forçava
o recrutamento de civis, para compor a estrutura militar, a serem chamados para defender a
Capitania, quando necessário (Matos: s/d: p. 186).
Continuando a composição do panorama bélico da Capitania, não se pode deixar de citar as
consequências nefastas para Portugal e suas colônias, da crise dinástica no reinado de D. João
III, em 1557, que culminou com a união das Coroas portuguesa e espanhola, em 1580. A
chamada União Ibérica, resultado da invasão da Espanha apoiada pela nobreza portuguesa,
significou o controle da Espanha sobre Portugal e suas colônias, e a apropriação das riquezas
produzidas nesses lugares. De 1580 a 1640, durante a união das Coroas, Portugal manteve seu
governo próprio, mas estava subordinado a Madri (Wehling. 1999: p.64).
Um importante desdobramento da União Ibérica para Pernambuco, foi a invasão da Capitania
pela Companhia das Índias Ocidentais, de 1630 a 1654. Antes da União Ibérica, Portugal
mantinha intenso relacionamento comercial com os Países Baixos. No Brasil, os holandeses
haviam feito grandes investimentos e tinham instalado, na Holanda, estruturas de refinamento
de açúcar. No entanto, com a união das Coroas, os inimigos de Espanha passaram a ser inimigos
de Portugal. Desde 1568, os Países Baixos estavam em guerra contra a Espanha pela sua
independência. Em 1581, se autodeclararam independentes, mas a Espanha só reconheceu sua
independência depois de oitenta anos de guerra, em 1648. Esse conflito motivou o governo
espanhol, Nação mais poderoso da Europa naquele momento, a instituir sanções comerciais aos
navios holandeses, inclusive nas possessões portuguesas, dentre elas o Brasil (Wehling. 1999:
p. 126).
Num período de trégua entre Espanha e as províncias unidas dos Países Baixos que durou 12
anos, entre 1609 e 1621, o comércio entre Holanda e Portugal foi reestabelecido. Nesse ano de
1621 foi criada, por um grupo de holandeses, a Companhia das Índias Ocidentais que recebeu
dos Estados Gerais da Holanda o monopólio da navegação, comércio e transporte e das
82
conquistas de países ao longo do Oceano Atlântico, na América e na África. Nessa época eram
os holandeses da Companhia das Índias Ocidentais que transportavam a maioria das
mercadorias entre Brasil e Europa. Com o fim da trégua, voltaram as sanções comerciais e os
portos brasileiros foram novamente fechados aos navios holandeses. Mas, pela importância do
açúcar brasileiro, a Companhia das Índias Ocidentais decidiu ocupar a região produtora. Em
1624, os holandeses invadiram Salvador, mas foram expulsos em 1625, em uma ação bem
coordenada pela frota espanhola, enviada pelo Rei Felipe I, uma frota de 52 navios de guerra
com 12.500 soldados, juntamente com as fortificações que estavam construídas em Salvador
(Moreau, 2011: p.175; Wiesebron, 1994: p.402-406).
Com a mesma motivação, os holandeses da Companhia das Índias Ocidentais, em 1628,
resolvem invadir Pernambuco. Em toda a Europa circulava a notícia de que uma armada
holandesa, composta por setenta navios de guerra, conduzindo treze mil homens, tinha planos
de invadir a região produtora de açúcar. O Rei Filipe I ordenou que o general Matias de
Albuquerque, que tinha sido governador e capitão-geral de Pernambuco até 1620, voltasse a
Pernambuco e providenciasse o necessário para fazer frente ao inimigo. Seria preciso, por
ordem do Rei, visitar e fortificar as quatro praças: Rio Grande, Paraíba, Itamaracá e
Pernambuco. Matias de Albuquerque partiu de Lisboa em agosto de 1629 e chegou ao Recife
em outubro do mesmo ano (Coelho, 1981: p. 33 e 34). Encontrou as fortificações, que ele
mesmo havia mandado construir, quando governador, desmanteladas. Os holandeses chegaram
à Capitania de Pernambuco em março de 1630, permanecendo por vinte e quatro anos. Desta
vez, a frota espanhola enviada pela Coroa para servir de reforço não tinha o mesmo poder que
em 1625, na Bahia e, portanto, não conseguiu impedir a invasão. De 1630 a 1635, a Espanha
não pôde mandar socorro à Capitania de Pernambuco, pois estava em guerra com os Países
Baixos que contavam com a aliança da França. A marinha espanhola estava, portanto, voltada
para essa batalha. Só em 1637, é que o Rei da Espanha enviou a Pernambuco uma armada mais
poderosa, mas que não conseguiu recuperar a Capitania (Mello, 2007: p. 27).
Em síntese, o contexto colonial de Pernambuco até a invasão holandesa, não pode ser entendido
apenas pelos determinismos puramente econômicos. Por isso, além dos fatores econômicos,
foram considerados na pesquisa, os fatores culturais, políticos e bélicos. Do ponto de vista do
conhecimento, os portugueses podem ser considerados cientes das inovações que se
processavam nos séculos XV e XVI e com disposição para inovar. Um protagonismo inovador
que não ficou restrito ao período de expansão ultramarina, mas se manteve atualizado nos
séculos seguintes.
83
Com relação aos fatores políticos, considera-se que o reino de Portugal conseguiu se associar a
interesses privados, sem perder o controle sobre todo o processo. A Capitania tinha autonomia,
mas a palavra final era do Rei. No caso das fortificações, o Donatário tinha liberdade de decidir
sobre a necessidade de se construir uma fortificação, mas era o Rei quem autorizava e
determinava o projeto a ser construído. Do ponto de vista econômico, a diversidade de receitas
oriundas das várias colônias pelo mundo, incluindo de Pernambuco, eram suficientes para
custear a estruturação defensiva de suas colônias, conforme os modelos normatizados da
Fortificação Moderna, abaluartada, vigentes, como fez em locais como Mazagão, na África, e
em Angra do Heroísmo, nos Açores.
3.2.1 FORTIFICAÇÕES DO PRIMEIRO SISTEMA DEFENSIVO PORTUGUÊS
Estudando, portanto, sobre a história da Capitania de Pernambuco, verificou-se que as suas
fortificações só começaram a ser construídas a partir do final do século XVI. Anteriormente,
no início da colonização, em 1535, quando o Donatário, Duarte Coelho, aportou à Feitoria de
Pernambuco, foi fundada a Vila de Igarassu, mas não foram construídas fortificações (Lago,
1862: p.590). Nesse primeiro momento da ocupação de Pernambuco, também não foram
construídas fortificações, nem quando a Vila de Olinda foi fundada, entre 1535 e 1537,
tornando-se a principal vila da Capitania. No momento da sua fundação, contava, apenas, com
a Igreja Matriz e o Castelo do Donatário, que também não era fortificado (Menezes, 1986: p.
23).
De uma maneira geral, no início da colonização em todo território brasileiro, as povoações mais
antigas eram defendidas por cercas e muros. Eram estruturas precárias, levantadas apenas para
atender a uma necessidade imediata e não recebiam manutenção frequente, quando não havia
mais ameaça, eram abandonadas. As antigas povoações eram normalmente construídas em
terrenos elevados, pois a defesa pela altura era parte da estratégia de defesa usualmente adotada.
A Vila de Olinda utilizou desde recurso, assim como Salvador, Rio de Janeiro e outras (Reis,
2000: p. 174-177) e com essa estruturação pretendeu atender às necessidades defensivas do
período.
Só a partir de 1590, é que foram construídas fortificações portuguesas em Pernambuco. O
conjunto de fortificações construídas procurou defender o território de corsários e piratas
estrangeiros que circulavam, sempre em maior número, pela costa brasileira, configurando uma
ameaça constante. Em 1578, tiveram início solicitações ao Rei para construção de fortificações
na Capitania. Cristóvão de Barros, Provedor-mor da Fazenda Real no Brasil, escreveu ao Rei
84
lembrando a necessidade de se fazerem fortificações e solicitando a construção de uma
fortificação na barra do Recife (Cavalcanti, 2009: p. 62). Porém, antes mesmo de receber a
resposta, tamanha era a necessidade de defesa, mandou-se fazer uma fortificação, à custa do
Donatário Jorge de Albuquerque. Era um forte de madeira que caiu logo em ruína, por ser de
estrutura precária. Recebeu o nome de Forte de São Jorge, o velho.
A partir de 1590, com autorização do Rei, começou a ser construído um conjunto de
fortificações que passou a compor o primeiro Sistema Defensivo da Capitania. Essas
fortificações foram construídas para a defesa da Vila de Olinda e seu porto. Na Vila de Olinda,
no extremo norte, foi construído o Forte de São Francisco de Olinda; e no extremo sul, a Guarita
de João Albuquerque. Entre as fortificações havia uma paliçada de pau a pique, construída no
nível da praia e havia, ainda, uma linha de arrecifes naturais, submersa, que impossibilitava o
desembarque de invasores.
A guarita de João de Albuquerque foi mandada fazer por Matias de Albuquerque em 1620 e
executada por Cristóvão Álvares, Mestre-de-obras do Rei. Segundo alguns autores, foi
construída em alvenaria de pedra31, outras fontes dizem ter sido edificado em terra (REIS, 2006:
p 329; e Laboratório de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE). Em
1630, a Guarita foi dominada pelos holandeses, mas recuperada, em 1645, pelos portugueses.
Há notícias que ainda estava de pé, em 1763, mas não há notícias atuais dos seus vestígios.
31
Segundo Menezes, era feito em pedra. MENEZES. 1986: p. 99.
85
Figura 11.
Representação holandesa de 1630 da Vila de Olinda onde se vêem as fortificações que
compunham o sistema defensivo português nessa vila: a Guarita de João Albuquerque. 1620 e o Forte de São
Francisco de Olinda. Original manuscrito do Algemeen Rijcksarchief. (REIS, 2000. p. 83).
No porto de Olinda, conhecido como povoado dos Arrecifes, por sua vez, foi construída uma
cerca de madeira e os Fortes de São Francisco da Barra, assentado nos arrecifes na entrada da
barra, e o de São Jorge, construído sobre o istmo. A estratégia do Sistema de Defesa implantado
estava baseada no fogo cruzado dos fortes e na entrada única e perigosa da barra, resultado da
conformação dos arrecifes naturais (Menezes, 1986: p.32 e 33).
Figura 12.
Representação holandesa de 1617 do sistema defensivo português na Capitania de Pernambuco
onde se vêem 1. Forte de São Francisco da Barra e 2. Forte de São Jorge.. “Ont voerp van stadt parnambuco| D.
Ruit.s fecit”. Original manuscrito do Algemeen Rijksarchief, Haia. Ca. 1617. (REIS, 2000. p. 75).
O Forte de São Jorge foi edificado a partir do final do século XVI e finalizado em 1603. A
primeira referência a um forte construído sobre a terra é de James Lancaster, pirata inglês que
saqueou o porto do Recife, em 1595 (Cavalcanti, 2009: p. 64). Esse forte pode ter sido o Forte
de São Jorge, inclusive porque, segundo Barreto, o Forte foi construído em 1590 (Barreto, 2011:
p. 88).
Alguns autores incluem nesse primeiro sistema defensivo algumas outras fortificações do lado
Norte da Capitania. Há referências a uma fortaleza nas proximidades de Pau Amarelo, Fortaleza
do Rio Tapado, construída para garantir a defesa de desembarque nesse porto (Coelho, 1981:
p. 35). Há referências, ainda, ao Forte Diogo Paes, construído por iniciativa do engenheiro de
mesmo nome, cuja obra foi apenas iniciada, em 1626, mas não foi concluída. A partir de sua
estrutura, incompleta, os holandeses construíram o Forte do Brum (Menezes. 1986: p.100-101).
Ainda nos arredores do Recife, até 1624, Matias de Albuquerque mandou construir o Fortim
86
Alternar32. Localizava-se em uma ilha, na confluência dos rios Capibaribe e Beberibe, quase
em frente ao Forte de São Jorge (Barreto, 2011: p.84-94).
As fortificações citadas estão espacializadas na figura abaixo.
Figura 13.
Localização das fortificações construídas pelo colonizador português antes da invasão
holandesa. (Modificado do site Google Earth).
Quando em 1628, houve a notícia que uma armada holandesa estava se dirigindo ao Brasil para
invadir a região produtora de açúcar, Matias de Albuquerque foi enviado ao Brasil no cargo de
visitador e fortificador das capitanias do Norte para preparar as capitanias e suas fortificações.
Em Pernambuco, constatou que as fortificações, que ele mesmo havia levantado, ou recuperado,
enquanto Governador da Capitania de Pernambuco33, estavam desmanteladas e a Fortaleza do
Rio Tapado estava sem a artilharia. Para a defesa da Capitania mandou artilhar novamente a
Fortaleza do Rio Tapado e recuperar os fortes e baterias existentes, no Recife e em seu porto,
onde fez outras baterias (Coelho, 1981: p. 35 e 42).
As fortificações apresentadas acima estão espacializadas na figura abaixo.
Segundo Barreto, o Fortim Alternar foi mandado fazer em 1629, mas nas ‘Memorias Diárias da guerra do Brasil’,
Duarte de Albuquerque Coelho fez menção a existência de baterias nos arredores do Forte de São Jorge, no período
em que Matias de Albuquerque era Governador da Capitania (1620-1624). Essas baterias poderiam ser as
estruturas incompletas do Forte Diogo Paes e o Fortim Alternar. Inclusive, porque ao descrever a defesa da
Capitania em 1629, na eminência da invasão holandesa, Coelho não faz menção a nenhuma bateria sobre o banco
de areia.
32
33
Matias de Albuquerque foi Governador da Capitania de Pernambuco de 1620 a 1624 e foi Governador-Geral
dos Estados do Brasil de 1624 a 1626.
87
Figura 14.
Localização das fortificações construídas por Matias de Albuquerque na eminência da invasão
holandesa. (Modificado do site Google Earth).
3.3
SEGUNDA FASE BÉLICA (1630-1654)
Continuando o levantamento de informações contextuais, a fim de situar a construção das
fortificações e a instalação dos Sistemas Defensivos de Pernambuco num panorama mais
amplo, segue a apresentação de aspectos financeiros, políticos, culturais e bélicos do período
que engloba o segundo Sistema Defensivo: de 1630 a 1654, durante a ocupação de Pernambuco
pelos holandeses da Companhia das Índias Ocidentais.
ASPECTO POLÍTICO
Iniciando pelo contexto político, devem-se registrar as ações empreendidas por Portugal para
reestabelecer o controle de suas colônias na América, África e Ásia, por ocasião do conflito
entre Espanha e Países Baixos, pois dentre essas ações verifica-se uma demonstração de que
crescia o interesse de Portugal por colônias antes consideradas secundárias. No Brasil, a
Companhia das Índias Ocidentais dominava o litoral do Nordeste entre o Ceará e o rio São
Francisco. Na costa ocidental da África, conquistaram o Castelo da Mina, e no Oriente, a
Companhia das Índias Orientais (VOC) dominavam as ilhas Molucas e metade do litoral oeste
do Ceilão. As ações empreendidas por Portugal tiveram início a partir do fim da União Ibérica
(1580-1640), ou seja, da separação entre Portugal e Espanha, resultado do movimento de
independência liderado pelo Duque de Bragança com o apoio da Corte portuguesa. Em 1640,
D. João IV, Duque de Bragança, foi aclamado Rei de Portugal, com o título de O Restaurador,
mas a Espanha não reconheceu a independência de Portugal e continuou tentando recuperar seu
poder (Wehling. 1999: p. 104). No reestabelecimento do controle por parte de Portugal, o novo
88
monarca português enfrentou desafios, dentre os quais, a recuperação das colônias que foram
perdidas para os holandeses, incluindo Pernambuco; o reconhecimento da independência pela
Europa, assim como dos direitos da Dinastia de Bragança ao trono; e a garantia da defesa das
suas fronteiras contra os ataques espanhóis (Mello. 2011: p.2 e 20).
Um dos atos de Portugal que precisam ser considerados foi a assinatura de um acordo com os
Países Baixos para recuperar suas colônias. Em 1641, Portugal e Holanda assinaram um tratado
de Paz, o Tratado de Haia, através do qual ficava acordada uma trégua de dez anos e a criação
de cooperação militar contra o Reino Espanhol (Procópio, 2014: p. 2). O Tratado, no entanto,
não avançou muito com relação às colônias, Portugal só conseguiu que os holandeses
acordassem, vagamente, uma possível partilha ou troca futura daqueles territórios que foram
portugueses. No entanto, a trégua de dez anos foi rompida pelos holandeses no mesmo ano de
1641. Maurício de Nassau conquistou Angola, incluindo Luanda, Benguela; conquistou os
portos satélites de São Tomé e Ano Bom, e ainda o Maranhão, em território brasileiro. Apesar
das incursões militares holandesas, Portugal continuava tentando, através da diplomacia, fazer
cumprir o acordo, mas as perdas no Atlântico nunca foram tão numerosas nesse momento em
comparação com a época da União Ibérica (Vainfas, 2007: p. 87-90). Se, dentro do acordo, a
dominação da Capitania de Pernambuco permanecia nas mãos dos portugueses, os holandeses
continuavam sendo uma ameaça ao Império Colonial Português, já bastante reduzido em
extensão e importância.
Apesar das dificuldades diplomáticas entre os reinos de Portugal e Países Baixos, há registros
de colaboração entre luso-brasileiros e holandeses em território colonial, durante o governo de
Maurício de Nassau (1637-1644), período denominado pax nassoviana (Vainfas, 2007: p. 87).
No entanto, o panorama de cooperação começou a mudar a partir de 1644, quando diminuíram
os lucros da Companhia e aumentaram as dívidas dos produtores de açúcar. Com relação a esse
período, e considerando a existência de cooperação entre luso-brasileiros e holandeses, podemse levantar hipóteses sobre eventual cooperação para além das questões econômicas,
alcançando, por exemplo, questões militares, especificamente sobre tecnologias para a
construção de fortificações. Todas essas questões e hipóteses serão consideradas durante as
análises que se realizarão no capitulo seguinte.
89
ASPECTO ECONÔMICO
Partindo para a compreensão do contexto econômico, no período de 1630 a 1654, pretende-se
evidenciar por um lado, uma ampla cooperação entre luso-brasileiros e holandeses, num
primeiro momento, durante a pax nassoviana, em função dos mútuos interesses econômicos; e,
por outro lado, num segundo momento, a partir da década de 1640, evidenciar que o negócio
do açúcar no Brasil começava a dar prejuízo financeiro, motivando uma rebelião luso-brasileira
contra os holandeses. Com relação ao primeiro momento, a cooperação entre holandeses e a
população luso-brasileira concernia o negócio do açúcar, pois só essa população dominava a
técnica produtiva e conseguia controlar os trabalhadores escravos. Nessa divisão de
responsabilidades, cabia aos holandeses as atividades voltadas à exportação do açúcar para a
Holanda (Costa, 2006: p. 12).
No que tange ao segundo momento, é preciso evidenciar que o auge do comércio exportador
do Brasil se deu em 1642. Antes, em 1641, o açúcar branco exportado somou quatorze mil
caixas; depois, em 1643, teve início uma diminuição das exportações, somando apenas onze
mil caixas. Essa diminuição consolidou-se como uma tendência e, em 1644, as exportações não
ultrapassaram oito mil caixas. O tráfico de escravos africanos, ao contrário crescia: em 1642
foram vendidos dois mil escravos, em 1643, quatro mil e em 1644, um pouco mais de cinco mil
escravos. Mas, mesmo o Brasil significando apenas um negócio que já começava a dar prejuízo
financeiro, os holandeses não estavam dispostos a devolver a colônia a Portugal (Vainfas, 2007:
p.87-92).
Com a diminuição das exportações de açúcar e o aumento do tráfico de escravos, diminuíram
os lucros da Companhia das Índias Ocidentais e aumentaram as dívidas dos produtores de
açúcar. As relações de cooperação começaram a entrar em conflito e teve início a rebelião lusobrasileira contra os holandeses. O estopim da rebelião foi o anunciou de João Fernandes
Vieira34, um dos mais ricos senhores de engenho de Pernambuco, da nulidade das dívidas que
os luso-brasileiros tinham com os holandeses, obtendo o apoio da nobreza pernambucana,
34
João Fernandes Vieira era mestre-de-campo do terço de infantaria de Pernambuco, líder dos insurretos. Começou
a vida como feitor do engenho do holandês Jacob Stachouwer, de quem ficou sócio e procurador. Pela proximidade
com Maurício de Nassau, adquiriu terras e engenhos. Tornou-se um dos mais ricos senhores de engenho de
Pernambuco, além de membro da Câmara dos Escabinos da Cidade Maurícia. Com o crédito que recebeu da
Companhia das Indias Ocidentais, chegou a possuir cinco engenhos, muitos escravos, bois, cavalos, canaviais e
joias. Sua dívida era de cerca 300 mil florins. Era o segundo maior devedor da Companhia das Indias Ocidentais.
Vainfas, 2006. p. 86.
90
endividada. Não se pode deixar de citar, no entanto, a disputa religiosa entre calvinistas e
católicos também como responsável pelas rebeliões que se iniciavam (Boxer, 1969: p.123).
ASPECTO BÉLICO
Essa situação introduz questões relativas ao contexto bélico da Capitania, entre 1630 e 1654,
que passam pelos descompassos econômicos entre a Companhia das Índias Ocidentais e a
população luso-brasileira, em 1645. Entretanto, para melhor contextualizar o aspecto bélico
nesse período, apresentam-se as dificuldades vivenciadas em Portugal, para se autoafirmar
enquanto nação independente, pela desorganização de sua força militar. A partir de 1640, D.
João IV, iniciou a organização da força militar portuguesa, em Portugal, criando um exército
permanente, corpos auxiliares e o Conselho de Guerra. No entanto, na prática, as forças
permanentes foram marcadas pela falta de soldados e de meios, precisando contar com o auxílio
de Terços auxiliares e Terços pagos (Cotta, s/d: p.9). Conhecendo as dificuldades vividas na
metrópole, podem-se compreender melhor as dificuldades vivenciadas na Capitania, seja pela
falta de homens de guerra, seja pela falta de suporte da Coroa para expulsar os holandeses do
território pernambucano.
Os problemas econômicos entre a Companhia das Índias Ocidentais e a população lusobrasileira, iniciados em 1645, culminaram com uma rebelião, denominada Insurreição
Pernambucana, que alcançou vitórias importantes contra os holandeses, culminando na sua
capitulação, em 1654 (Vainfas, 2007: p. 86). Uma conjunção de fatos contribuiu para o fim do
domínio holandês na Capitania, dentre eles, a dificuldade da Holanda em lutar contra os lusobrasileiros, pois estava em guerra com a Inglaterra, a partir de 1652. A reconquista portuguesa
das colônias de Luanda, Benguela e São Tomé, em 1648, que retirou dos holandeses o controle
do tráfico africano comprometendo suas finanças. E, finalmente, as batalhas e vitórias dos lusobrasileiros, em Pernambuco, de 1645 a 1654 (Vainfas, 2007: p. 99-100).
Em síntese, considerando o contexto colonial de Pernambuco, de 1630 até 1654, quando a
Companhia das Índias Ocidentais deixou a Capitania, devem ser considerados os aspectos
políticos, econômicos e bélicos da colonização para permitir ter uma visão mais ampla do
processo construtivo de fortificações nesse período. Do ponto de vista bélico, esse período foi
marcado por um quase permanente estado de guerra: de 1630 até 1637, os portugueses tentavam
resistir à invasão e, a partir de 1645, teve início a Insurreição Pernambucana. O único período
de paz ocorreu durante o governo de Maurício de Nassau, de 1637 a 1644. Acredita-se que
91
durante períodos de guerra, a construção de fortificações deveria seguir ritmo acelerado, em
função, principalmente do pouco prazo disponível para a execução das obras e ainda observase, em tratados de Fortificação, que durante períodos de guerra o material construtivo mais
adequado seria a terra, pois é fácil de ser encontrada, é rápido de construir e de reconstruir no
caso de ter partes destruídas em combate (Dogen, 1648. p. 85-86). Do ponto de vista político,
por sua vez, observou-se o crescente interesse de Portugal nas colônias do Atlântico, dentre elas
o Brasil, através de um grande investimento diplomático, uma vez que não tinha condições de
iniciar uma guerra contra a Holanda. Finalmente, quanto aos aspectos econômicos, deve-se
considerar que Portugal tinha perdido receitas de colônias na América, África e Ásia, incluindo
da Capitania de Pernambuco, e que a produção de açúcar em Pernambuco começava a não ser
mais tão rentável. Com a diminuição das receitas no nível metropolitano e colonial, deve-se
levar em consideração que, possivelmente, nem Portugal, nem a Capitania poderiam contar com
recursos suficientes para custear a estruturação defensiva de Pernambuco, conforme os modelos
normatizados da Fortificação Moderna, abaluartada, vigentes.
3.3.1 FORTIFICAÇÕES DO SEGUNDO SISTEMA DEFENSIVO PORTUGUÊS
Em 14 de fevereiro de 1630, foram avistadas, desde a vila de Olinda, sessenta e sete pequenas
embarcações holandesas na costa pernambucana. Em 15 de fevereiro, desembarcaram, em Pau
Amarelo, quatro mil homens sob o comando do general holandês Theodoro Waerdenburch
(Coelho, 1981: p. 43 e 48). A partir de 16 de fevereiro, as tropas holandesas avançaram em
direção ao Rio Doce empurrando a resistência luso-brasileira para o Sul. O general Matias de
Albuquerque estava no Forte de São Francisco de Olinda, que protegia uma das principais
entradas da vila. Resistiu por três vezes ao embate levando os inimigos a buscarem outro acesso
para a vila de Olinda. Apesar da resistência, o Forte de São Francisco de Olinda foi tomado e
começaram as investidas sobre a Guarita de João Albuquerque, que também foi tomada pelo
inimigo.
Desembarcaram mais dois mil homens e o general Matias de Albuquerque entrou na povoação
do Recife, que estava esvaziada. A população se retirou levando consigo toda riqueza que
poderia ser saqueada pelo inimigo35. Sem gente para lutar, Matias de Albuquerque juntou toda
a munição e abastecimentos da povoação no Forte de São Jorge e Forte de São Francisco da
35
As riquezas citadas são, por exemplo, vinho, azeite e farinha da Espanha.
92
Barra. No amanhecer do dia 17 de fevereiro queimou toda a povoação e se refugiou com pólvora
e munição do outro lado do rio Beberibe. No incêndio foram destruídos armazéns com açúcar
e outras riquezas, frustrando os holandeses que planejavam o saque à povoação. Ainda foram
queimados os navios disponíveis e alguns outros foram encalhados no canal, para impedir que
o inimigo entrasse pela barra (Coelho, 1981: p.50-53).
Em 20 de fevereiro, o Forte de São Jorge resistiu à investida holandesa de mil e quinhentos
soldados, com oito escadas e granadas e outras armas de fogo. Esse forte era considerado pelos
holandeses de pouca importância, assim como o Forte de São Francisco da Barra, pois, segundo
os holandeses, ambos os fortes não resistiram aos canhões dos navios. Porém, sabiam que o
domínio dos fortes da povoação significava o domínio do porto. Em 24 de fevereiro chegou o
socorro da Paraíba aos colonos portugueses: cem homens e cento e oitenta índios. Em 25 de
fevereiro chegou o reforço aos holandeses: mais oito pequenas embarcações com mais gente e
muitos abastecimentos (Coelho, 1981: p.44-45 e 55-60).
Na tentativa de tomar o Forte de São Jorge, no dia 28 de fevereiro, quatro mil homens
marcharam em sua direção. Apesar de a artilharia inimiga ser muito reforçada, destruindo os
parapeitos, o Forte de São Jorge só foi tomado em primeiro de março, ficando com a muralha
em ruínas e os parapeitos desmantelados. A povoação vazia foi também ocupada pelo inimigo
e, finalmente, o Forte de São Francisco da Barra se rendeu por não poder resistir sozinho, nem
receber socorro (Coelho, 1981: p.60-63).
Avisado dos acontecimentos em Pernambuco, o Rei mandou algumas caravelas de socorro. Em
cada uma, além de munições, vinham de 30 a 40 homens comandados por seus capitães. Em
cartas enviadas ao General Matias de Albuquerque, o Rei agradecia pelo esforço e informava
que, brevemente, seria mandada uma Armada de socorro (Coelho, 1981: p.74).
Depois de perder Olinda, os Fortes de São Jorge, de São Francisco da Barra e a povoação do
Recife, Matias de Albuquerque e suas tropas aliadas se retiraram para tomar as estradas junto à
vila de Olinda e para controlar os acessos à povoação do Recife. A estratégia estabelecida para
conseguir manter esses postos de controle foi a construção de uma fortificação perto do rio
Capibaribe, na confluência dos diversos caminhos que levavam aos engenhos e fazendas
(Coelho, 1981: p.62-64). Um dos mais estratégicos postos de controle foi o passo do rio dos
Afogados que guardava a passagem para a campina onde havia dezesseis engenhos de açúcar
(Coelho, 1981: p. 67).
93
Acomodando-se ao sítio, a fortificação começou a ser construída em 4 de março de 1630 e
recebeu o nome de Forte Real do Bom Jesus. Contava, no início, com quatro peças de ferro de
quatro libras, retiradas dos navios. Também foi construído um reduto, fora do Forte, para
guardar as casas dos moradores. Apesar dos esforços, o Forte Real do Bom Jesus foi tomado,
em 1635, e destruído pelos invasores (Coelho, 1981: p. 65 e 142).
Só em 1645, ainda no entorno da vila de Olinda e da povoação do Recife, João Fernandes
Vieira36, começou um novo forte (Barreto, 1958: p.150). O Forte Novo do Bom Jesus foi
construído no âmbito do movimento de insurreição que se formava em Pernambuco como parte
do processo de resistência aos holandeses (Albuquerque, 1997).
Ainda se incluem no sistema defensivo português, durante a ocupação holandesa, algumas
outras fortificações do lado Norte e Sul da Capitania. Do lado Norte, no primeiro dia de
dezembro de 1632, Matias de Albuquerque solicitou ao Conde de Bagnoulo, mestre-de-campo
no Brasil, que fosse à Ilha de Itamaracá ver a possibilidade de construir uma bateria ou reduto
para bater o forte que os holandeses haviam construído na entrada da barra. O reduto foi
construído próximo à vila da Conceição, na encosta do morro, um pouco distante do forte.
Contava com duas peças de 16 e 20 libras cada uma. Depois de quatro dias o reduto foi
abandonado, pois os resultados das investidas não compensavam os gastos com pólvora e
munição. As peças voltaram para o Forte Real do Bom Jesus (Coelho, 1981: p.128-130).
Para a proteção do lado Sul da Capitania, foi construído um conjunto de estruturas defensivas
no porto do Cabo de Santo Agostinho, considerado o segundo porto de Pernambuco, depois de
Recife. O Conde de Bagnoulo, em 1631, fez na entrada da barra, o Forte de Nossa Senhora de
Nazaré, com três canhões
37
. Foi localizado no sopé do morro, local onde Bagnoulo
36
João Fernandes Vieira, herói da Restauração Pernambucana, era mestre-de-campo do Terço de Infantaria de
Pernambuco, líder dos insurretos, nasceu na Ilha da Madeira em 1610 e chegou a Pernambuco, ainda criança, em
1620. Começou a vida como feitor do engenho do holandês Jacob Stachouwer, de quem ficou sócio e procurador.
Pela proximidade que alcançou de Maurício de Nassau, recebeu crédito da Companhia das Índias Ocidentais e
adquiriu terras e engenhos, tornando-se um dos mais ricos senhores-de-engenho de Pernambuco. Tinha mais de
dezesseis engenhos, em Pernambuco e na Paraíba, e mais de mil escravos. Era membro da Câmara dos Escabinos
da Cidade Maurícia. Apesar do cabedal, era o segundo maior devedor da Companhia das Índias Ocidentais, sua
dívida era de cerca de 300 mil florins. Como recompensa pelos serviços prestados na guerra contra os holandeses,
foi nomeado Governador da Paraíba (1655-1657), capitão general do Reino de Angola (1658-1661) e
Superintendente das Fortificações do Nordeste do Brasil (1661-1681). Morreu em 1681, em Olinda (Vainfas, 2006.
p. 86; Gaspar, 2015).
37
Segundo Barreto, e Albuquerque, o Forte de Nossa Senhora de Nazaré foi construído em 1630, no extremo sul
do Cabo de Santo Agostinho. (Barreto, 1958: p.151; Albuquerque. 1999: p.135).
94
desembarcou e, segundo Barléus, conveniente para impedir a aproximação das embarcações
(Barléus, 1940: p.170). Em terreno mais elevado, foi instalado o Quartel de Nazaré. Nos anos
de 1632, foram construídas as baterias de São Jorge: duas baterias em pedra solta, para dar
suporte à fortificação (Coelho, 1981: p.100, 119 e 120). Em 1633, Bagnoulo iniciou a obra do
Forte do Pontal, em frente da barra do Cabo de Santo Agostinho, para proteger o porto de
Nazaré e toda a movimentação de cargas. Os holandeses tomaram o porto e se apossaram do
reduto antes mesmo de ficar construído (Coelho, 1981: p.119 e 120 e 165 e 166).
Em 1632, na entrada do Rio Formoso, Matias de Albuquerque mandou levantar bateria ou
pequeno reduto. No local havia um porto natural por onde entravam embarcações para o socorro
das tropas. O Reduto do Rio Formoso contava com duas peças de artilharia de 4 e 6 libras.
Finalmente, em 1634, foram, ainda, levantadas trincheiras, mais a Norte do porto de Nazaré,
nas praias de Gaibu e Itapoã, pois eram considerados locais onde era fácil o desembarque
(Coelho, 1981: p.188). Uma dessas trincheiras teria sido o Forte de São Francisco Xavier de
Gaibu. Em 1706, o forte foi recuperado quando João Marinho Falcão é designado seu Capitão
e Cabo. Por outro lado, segundo Barreto, o forte foi construído em 1630 no extremo norte do
Cabo de Santo Agostinho, na praia de nome Gaibu (Barreto, 1958: p.150).
Todas essas fortificações estão espacializadas na figura abaixo.
Figura 15.
Localização das fortificações construídas pelo colonizador português durante a invasão
holandesa. (Modificado do site Google Earth).
3.3.2 FORTIFICAÇÕES DO SISTEMA DEFENSIVO HOLANDÊS
O segundo Sistema Defensivo português, por sua vez, começou a ser construído a partir de
1630, durante a invasão da Companhia das Índias Ocidentais que ocupou Pernambuco durante
95
vinte e quatro anos, marcando decisivamente a história da Capitania. A presença holandesa em
Pernambuco, principalmente durante o governo de João Maurício de Nassau (1637-1644), foi
responsável pela construção de uma nova cidade, pontes, palácios e jardim botânico, pela
instalação de observatórios astronômicos e pela divulgação da paisagem brasileira e publicação
de livros (Dantas, 2012: p.125-139). Na realidade, a permanência batava se configurou um
enclave no território brasileiro: a Capitania era comandada pela Companhia das Índias
Ocidentais, enquanto as demais capitanias brasileiras continuavam sob o domínio português. O
período em que Pernambuco foi governado pelos invasores deixou marcas não apenas no
âmbito militar, como serão apresentadas abaixo, mas também no urbanismo, cultura e religião.
Do ponto de vista urbanístico, em função da falta de habitações e da má qualidade das
existentes, no que diz respeito à saúde pública foi projetada e construída a Cidade Maurícia
(Mauritsstaden). O projeto de urbanização, do arquiteto Pieter Post, contemplou ruas, praças,
mercados, canais, jardins, saneamento e pontes. O projeto foi considerado uma revolução na
paisagem urbana (Dantas, 2012: p.125-139).
Do ponto de vista cultural, sabe-se que junto com a missão militar do Governador-Geral João
Maurício de Nassau (1637-1644), veio a primeira missão científica às Américas: dentre os
integrantes estavam o latinista e poeta Franciscus Plante, o médico e naturalista Willem Piso, o
astrônomo e naturalista Georg Marcgrave, o médico Willem van Milaenen, os paisagistas
flamengos Frans Post e Albert Eckhout (Dantas, 2012: p.125-139). Frans Post e Albert Eckhout
permaneceram em Pernambuco de 1637 a 1644, durante todo o governo de Nassau. Post foi o
primeiro artista estrangeiro a descobrir a paisagem brasileira (LAGO, 2012: p. 67-73), pintou
paisagens, fortificações holandesas e batalhas entre holandeses e portugueses. Albert Eckhout
pintou paisagens, naturezas-mortas, retratos de vários povos e estudos da flora e fauna
brasileiras (Brienen, 2012: p. 75-90).
Do ponto de vista religioso, apesar da igreja Luterana ser a igreja oficial e vinculada ao Estado
Holandês, o Governador-geral João Maurício de Nassau manteve diálogo e tolerância com as
demais religiões, inclusive judeus e católicos (Dantas, 2012: p.125-139).
Como se pode verificar, a presença holandesa em Pernambuco significou um aporte cultural,
urbanístico e religioso para o território pernambucano, assim como, uma contribuição para as
questões militares. Os holandeses construíram fortificações com uma tecnologia diferente
daquele usada pelos portugueses em Pernambuco. As fortificações construídas pelos holandeses
96
na Capitania de Pernambuco, a partir de 1630, foram do tipo Fortificação Moderna,
abaluartada, construídas em terra. O Forte do Brum foi a primeira fortificação abaluartada,
em terra, construída em Pernambuco.
Essas fortificações compuseram um Sistema Defensivo Holandês. A estratégia de defesa da
Companhia baseou-se na construção de fortificações posicionadas em formato de semicírculo
para proteger a povoação do ataque dos portugueses localizados no interior e que ainda faziam
resistência à dominação holandesa. O porto figurava como ponto fulcral da povoação e tinha
sido escolhido como centro do cinturão de defesa. A estratégia holandesa ainda previa a defesa
da costa (Medeiros, 2005: p.24). Foi um Sistema Defensivo próprio baseado nos conhecimentos
práticos e teóricos da escola holandesa de fortificação (Coelho, 1981).
Desde o início da invasão, o general holandês Theodoro Waerdenburch começou a fortificar o
território invadido. Ao tomar a vila de Olinda fez quatro baterias para armar artilharia: uma no
colégio dos Padres, outras nas Igrejas Matriz, da Misericórdia e da Conceição. Fez, ainda,
trincheiras e estacadas no alto da vila e colocou Corpos de Guarda nas principais estradas
(Coelho, 1981: p.59 e 60).
No povoado dos Arrecifes, depois de conquistar o Forte de São Jorge e ocupar a povoação
esvaziada, os invasores fizeram duas trincheiras de areia: uma na frente do Forte de São Jorge,
outra na margem do rio. Também foram colocados seis cestões na frente da barra distante 250
metros do forte, com três peças de 25 libras, e outros três sobre o rio com artilharia de campanha.
Pela parte do mar, ainda havia trinta e duas lanchas com artilharia, marinheiros e artilheiros.
No dia em que os portugueses se renderam os holandeses ainda tinham levantado outra bateria
com duas peças de 16 libras (Coelho, 1981: p.61 e 62).
No local onde estavam as estruturas do forte português Diogo de Paes, foi construído, em terra
e faxina, o Forte do Brum38, para garantir a segurança do povoado e do caminho para a Vila de
Olinda (Coelho, 1981: p.71). Os responsáveis pela obra foram os engenheiros holandeses
Commersteyn, Adréas Drewich e Van Bueren. O forte tinha formato de polígono de quatro
lados com dois baluartes e dois meio-baluartes (Menezes. 1986: p.100-102). Para melhorar
ainda mais a segurança do istmo e permitir o trânsito entre a Vila e a povoação, foi construído
38
Segundo Menezes, o nome Brum, foi uma corruptela do nome Bruyne, uma homenagem a Johan Bruyne,
integrante do Conselho de Comissários que governou o Brasil holandês (Menezes. 1986: p.100-102).
97
o Forte Madame Brum39, uma fortificação com formato de um polígono quadrangular regular,
com quatro meio-baluartes (Coelho, 1981: p.88).
Figura 16.
Ilustração denominada “CAERTE VANDE HAVEN VAN PHARNAMBOCQUE”, de 1639.
Fonte: REIS, 2000. p. 86.
Na ilha de Antônio Vaz, do lado oeste da povoação do Recife, foi edificado o Forte Ernesto
para guardar o rio, as planícies e a vila de Antônio Vaz que estava sendo construída pelos
holandeses. A fortificação contava com três faces, fosso, paliçada e baluartes (Barléu 1940:
p.153). No lado oposto, teve início a construção do Forte Frederich Heinrich, de formato
pentagonal com cinco baluartes. O forte foi construído junto à cacimba na ilha de Santo Antônio
com projeto do engenheiro holandês Tobias Commersteyn e construção do engenheiro Pieter
van Bueren (Coelho, 1981: p.71). O seu armamento constava de dezesseis peças de artilharia
(Menezes. 1986: p.100-102). Durante sua construção, em função da guerra de emboscada
empreendida pelos portugueses da resistência, foi construído um reduto auxiliar, o Forte Emília.
Os holandeses ainda edificaram quatro redutos para guardar a margem do rio, dentre eles o
Reduto da Boa Vista (Coelho, 1981: p.81). Com essa estratégia, contendo a Cidade Maurícia
39
Ainda segundo Menezes, o nome Forte Madame Brum foi em homenagem à esposa de Johan Bruyne (Menezes.
1986: p.100-102).
98
entre os dois fortes e seus redutos auxiliares, os holandeses pretendiam diminuir os assaltos dos
portugueses (Barléu, 1940: p.153).
No encontro dos rios Capibaribe e Beberibe, no local onde os portugueses haviam construído o
Fortim Alternar (1624) foi construído um forte com três baluartes40. O Forte Waerdenburch foi
feito com estacas e pranchões e sobre os baluartes havia guaritas (Coelho, 1981: p. 139; Barléu,
1940: p. 153).
A construção do Forte do Príncipe Guilherme, localizado na várzea do Capibaribe, teve o
objetivo de desestabilizar a resistência luso-brasileira. A estratégia incluiu a tomada de um dos
pontos de controle portugueses mais significativos: rio dos Afogados, que guardava a passagem
para a campina onde havia dezesseis engenhos de açúcar, e a construção da fortificação. O Forte
tinha quatro ângulos, fosso e paliçada e estava armado com seis canhões de bronze (Coelho,
1981: p. 139; Barléu, 1940: p. 153).
Visando ampliar a dominação da Capitania, os holandeses se dirigiram tanto para o lado Sul
como para o lado Norte. Na Ilha de Itamaracá, no lado Norte da Capitania, construíram o Forte
Orange na entrada da barra. O Forte contava com quatro baluartes, fosso e era cercado por uma
estacada. Estava armado com doze canhões, sendo seis de bronze e seis de ferro. Foi construída
ainda a fortaleza da vila de Schkoppe, na entrada do canal, que protegia o porto e a porta da vila
e uma torre quadrada (Coelho, 1981: p. 85 e 86; Barléu, 1940: p. 153 e 154).
Do lado Sul da Capitania, adentrando no porto do Cabo de Santo Agostinho, os holandeses
construíram o Forte de Van der Dussen, sobre as estruturas incompletas do Forte do Pontal, que
estava em construção pelos portugueses. Estava armado com seis bocas de fogo. Para
complementar a estratégia de defesa foi feito, diante do anterior, o Forte Ghijselin, abandonado
após as lutas com os portugueses e destruído pelo mar (Coelho, 1981: p. 89; Barléu, 1940: p.
154; Albuquerque, 1999: p.128-130).
Todas essas fortificações estão espacializadas na figura abaixo.
40
O Forte Waerdenburch foi construído com quatro baluartes, mas a força da maré não permitiu manter o quarto
baluarte, resultando numa fortificação com formato de polígono retangular, mas com três baluartes. Barléu, 1940:
p. 153.
99
Figura 17.
Localização das fortificações construídas pelo invasor holandês durante a invasão holandesa.
(Modificado do site Google Earth).
3.4
TERCEIRA FASE BÉLICA (APÓS 1654)
Continuando o levantamento de informações contextuais, a fim de situar a construção das
fortificações e a instalação dos Sistemas Defensivos de Pernambuco num panorama mais
amplo, segue a apresentação de aspectos financeiros, políticos e bélicos do período que engloba
o terceiro Sistema Defensivo: de 1654 a 1661, ou seja, após a ocupação de Pernambuco pelos
holandeses da Companhia das Índias Ocidentais, até a assinatura do segundo Tratado de Haia,
em 1661, e o reconhecimento da independência de Portugal pela Espanha, em 1668, quando
selou-se, em definitivo, a paz entre Portugal, Países Baixos e Espanha.
ASPECTO POLÍTICO
Iniciando pelo contexto político, deve-se registrar que, em 1660, o Império Português estava
reduzido à costa oriental da África (Moçambique); Índia (poucas cidades e fortalezas); China
(Macau); Indonésia (Timor) e ao Brasil. Portugal voltou-se, portanto, para o Brasil, que passou
a ser considerado como a parte mais importante do Império (Wehling. 1999: p.106). Esse novo
posicionamento explicaria os investimentos de Portugal na negociação de um novo acordo de
paz definitiva com a Holanda, que apesar de ter entregado as colônias do Nordeste brasileiro
aos portugueses, em 1654, passaram a exigir sua devolução, a partir de 1657, junto com a
devolução de outras colônias holandesas em Angola e São Tomé. Essa exigência tem relação
com a morte de D. João IV, Rei de Portugal, em 1656, que deixou um herdeiro ao trono de
Portugal que tinha apenas três anos de idade, fragilizando seu poder politico diante da Europa.
100
A partir de 1657, os holandeses começaram a pressionar Portugal enviando uma esquadra para
bloquear o porto de Lisboa, enquanto os diplomatas negociavam as devoluções. Os holandeses
ainda saquearam navios portugueses que traziam produtos do Brasil. Na tentativa de evitar a
guerra, Portugal, em 1658, sugeriu uma compensação financeira aos Países Baixos e à
Companhia das Índias Ocidentais, porém negou-se a devolver as colônias brasileiras. O
segundo Tratado de Haia só foi assinado em 1661, quando a Holanda foi pressionada pela
Inglaterra, que passou a ser aliada de Portugal, a partir do casamento de Carlos II, herdeiro da
Inglaterra, com Catarina de Bragança. Pelo acordo de paz, Portugal se comprometeu a pagar
uma indenização de quatro milhões de cruzados para a Holanda dentre outras compensações
(Silva, 2011: p. 349-351; Wehling, 1999: p.133).
ASPECTO ECONÔMICO
Do ponto de vista econômico, por sua vez, pretende-se demonstrar a diminuição ainda maior
das receitas portuguesas, deixando o Império em péssima situação econômica. A partir da
década de 1660, a receita de Portugal era proveniente da exportação do açúcar e tabaco
brasileiros e do vinho, sal e frutas de Portugal, sendo que as despesas com a importação de
outros produtos eram praticamente o dobro do que contabilizam as exportações. Esta situação
piorou, ainda mais, quando o açúcar produzido nas Índias Orientais pelos ingleses e franceses
adentrou no mercado europeu. As colônias inglesas e francesas utilizavam métodos de cultivo
e moagem mais aprimorados que os brasileiros. Ainda em 1662, o açúcar brasileiro fazia parte
do melhor açúcar do mercado europeu; porém, em 1671, a venda do açúcar brasileiro não
alcançava maiores receitas. A depressão no mercado do açúcar na Europa, em 1675, acabou
atingindo todos os produtores, incluindo os ingleses e franceses, que reclamavam não só do
baixo valor de mercado, mas também da baixa demanda pelo produto, altos impostos e elevados
custos do trabalho escravo (Boxer, 1969, p. 123 e 155-156).
A partir de 1668, quando a Espanha reconheceu a independência de Portugal, os portugueses
apostavam na recuperação econômica de Portugal, diferentemente, do que ocorreu, seja pela
crise no mercado do açúcar na Europa, a partir de 1675, seja pelas mortes provocadas por
doenças como varíola e febre amarela, no Brasil e em Angola, de 1686 a 1691, que tiraram
muitos trabalhadores dos engenhos (Boxer, 1969, p. 157).
Na última década do século XVII, no entanto, a situação econômica do Brasil, e
consequentemente, de Portugal, começou a mudar. Em 1691, com o fim dos estoques de açúcar
101
na Europa, a demanda pelo açúcar brasileiro, considerado de melhor qualidade que o produzido
nas Índias Orientais, aumentou, trazendo alguma recuperação para a indústria brasileira do
açúcar. Mas, na verdade, a partir de 1690, com a descoberta de ouro aluvial no interior, o Brasil
vivenciou um renascimento além das expectativas (Boxer, 1969, p. 159).
ASPECTO BÉLICO
Finalmente, do ponto de vista bélico, pretende-se chamar a atenção para o estado de tensão
vivenciado pela capitania de Pernambuco, de 1654 a 1661, em função da permanente ameaça
holandesa pela devolução das colônias no Brasil, Angola e São Tomé. Nesse intervalo de
tempo, Portugal ordenou que as fortificações da Capitania de Pernambuco fossem reconstruídas
para fazer frente ao inimigo, no caso de uma invasão.
Em síntese, considerando o contexto colonial de Pernambuco, a partir de 1654, após a retirada
dos holandeses de Pernambuco até a assinatura do segundo Tratado de Haia, em 1661, a
compreensão do processo construtivo de fortificações, nesse período, para ser entendido,
precisa considerar os fatores econômicos, culturais, políticos e bélicos. Do ponto de vista
político, verificou-se que Portugal passou a ter total interesse pelo Brasil pautando suas relações
com as demais nações europeias a partir do reconhecimento dessas nações pela soberania
portuguesa inclusive, propondo compensações financeiras. Quanto aos aspectos econômicos,
deve-se considerar que Portugal dependia das receitas oriundas da indústria açucareira do
Nordeste, mas que essas receitas eram insuficientes, deixando Portugal em estado de penúria.
A Capitania, portanto, não contava com receitas excedentes como no final do século XVI. Do
ponto de vista bélico, por sua vez, observou-se que Portugal sentindo-se ameaçado pelos
holandeses, priorizou a recuperação das fortificações existentes, apesar das dificuldades
financeiras.
3.4.1 FORTIFICAÇÕES DO TERCEIRO SISTEMA DEFENSIVO PORTUGUÊS
O terceiro Sistema Defensivo português da Capitania começou a ser construído em 1654, após
a retirada dos holandeses de Pernambuco. Esse Sistema Defensivo se justificou pela ameaça
holandesa de voltar a invadir Pernambuco em função da falta de acordo diplomático para
pagamento dos investimentos feitos pela Companhia das Índias Ocidentais, em Pernambuco, e
das dívidas dos colonos portugueses. Enquanto não havia acordo, apesar de ter desocupado o
território, a Companhia continuava exigindo de Portugal a devolução das colônias holandesas
no Brasil, em Angola e em São Tomé (Miranda, 2005: p.99).
102
Em dezembro de 1653, chega a Pernambuco a esquadra da Companhia de Comércio do Brasil
composta por setenta e sete navios com o intento de recuperar Pernambuco aos holandeses. Os
insurrentes já tinham tomado aos holandeses os Fortes Waerdenburch, do Brum, Madame
Brum, Príncipe Guilherme e Frederich Heinrich. Os holandeses que estavam circunscritos à
Cidade Maurícia e ao Recife iniciaram o processo de rendição. Além do cerco a que estavam
submetidos em Recife, a situação de guerra que estavam vivenciando com a Inglaterra, desde
1652, contribuiu para o estabelecimento de um acordo com Portugal em troca da rendição e
entrega das colônias. Pelo acordo, deveriam entregar o Recife Maurícia e todas as fortalezas
que ainda estavam em seu poder, em todo o Brasil, assim como toda a artilharia e munição. Os
luso-brasileiros, por sua vez, deveriam garantir a segurança dos holandeses e seus aliados,
permitindo que voltassem livremente para a Holanda ou que ficassem em Pernambuco, sem
retaliações, se assim desejassem (Silva, 2011: p. 343-345).
A Insurreição Pernambucana, que culminou com a rendição holandesa, contribuiu para
despertar as disputas diplomáticas entre as Províncias Unidas dos Países Baixos e Portugal. A
morte de D. João IV, Rei de Portugal, em 1656, deixando um herdeiro com apenas três anos,
estimulou ainda mais os holandeses a fazerem ameaças a Portugal. Como já foi citado, a partir
de 1657, os holandeses voltaram a exigir a devolução das colônias holandesas no Brasil, Angola
e São Tomé e, enquanto os diplomatas negociavam a devolução, enviaram uma esquadra a
Portugal para bloquear o porto de Lisboa e saquearam navios portugueses que traziam produtos
do Brasil. Em 1658, Portugal sugere uma compensação financeira as Províncias e a Companhia
das Índias Ocidentais, e reafirma que não devolverá as colônias brasileiras. Em 1661, a Holanda
assina o acordo de paz em Haia, pressionada pela Inglaterra, que passou a ser aliada de
Portugal41. No acordo de paz, Portugal se compromete com uma indenização de quatro milhões
de cruzados para a Holanda, dentre outras compensações (Silva, 2011: p. 349-351).
Deve-se registrar que, após o fim da União Ibérica, ainda estavam indefinidas as demarcações
separando o Brasil português da América espanhola, tanto nas terras ao sul, abaixo do atual
Estado de Santa Catarina, quanto as terras do sertão. Só em 1750 é que foi assinado o Tratado
de Madri, estabelecendo a divisa entre as terras de Portugal e Espanha.
41
A aliança de Portugal com a Inglaterra foi feita em função do casamento de Carlos II, herdeiro da Inglaterra,
com Catarina de Bragança (Silva, 2011: p. 349-351).
103
Após a capitulação holandesa, as fortificações da Capitania de Pernambuco, aquelas do litoral,
tanto na povoação do Recife, quanto do lado Norte e Sul da Capitania, começaram a ser
consertadas e remodeladas, e outras foram abandonadas. No Recife, o Forte de São Francisco
da Barra foi reassumido pelos portugueses. O Forte de São Jorge foi abandonado e seus
materiais de construção foram utilizados, a partir de 1680, nas obras de construção da Igreja de
Nossa Senhora do Pilar (Cavalcanti, 1999: p.134-136). Os Fortes holandeses: Forte
Waerdenburch, Forte Ernesto, Reduto da Boa Vista, Forte Emília e Forte Príncipe Guilherme
foram abandonados.
O Forte do Brum foi reconstruído em pedra e cal, a partir de 1654, e as obras ainda estavam
sendo realizadas em 1677, segundo cartas de João Fernandes Vieira ao Rei. O Forte Frederich
Heinrich foi rebatizado de Forte de São Tiago das Cinco Pontas e foi reconstruído em alvenaria
de pedra e cal pelo Engenheiro Militar Francisco Correia Pinto. Suas obras estavam finalizadas
em 1677. O Forte Madame Brum também foi reconstruído em pedra e cal pelos colonos
portugueses, a partir de 1654 (A.H.U., PE, Caixa 6, p. 232; A.H.U., PE, Caixa 12, p. 33-35).
Ainda no Recife, o Forte Real do Bom Jesus, após a rendição, em 1635, foi arrasado e não foi
reedificado (Albuquerque, 1988: p. 9). E o Forte Arraial Novo do Bom Jesus, depois de haver
cumprido sua missão, foi abandonado, caindo em ruinas (Albuquerque, 1997: p.183).
Na vila de Olinda, as trincheiras construídas pelos holandeses foram abandonadas e o Forte de
São Francisco de Olinda foi reconstruído em alvenaria. Na parte norte da capitania, o Forte
Orange foi reconstruído a partir de 1654, em pedra e cal, e foi rebatizado de Forte de Santa Cruz
de Itamaracá. A Fortaleza da vila de Schkoppe e uma Torre, construídas pelos holandeses foram
abandonadas. Em 1702, o governo da capitania solicitou ao Rei a construção de uma fortaleza
para proteção da Barra de Pau Amarelo. Em 1707, o Forte de Nossa Senhora de Pau Amarelo,
em pedra e cal, estava sendo construído.
Na parte sul da capitania, o Forte de Van der Dussen e o Forte Ghijselin também foram
abandonados. Já o Forte de Nossa Senhora de Nazaré, reconquistado em 1645, estava em obras
de arremate em 1677. O Forte de São Francisco Xavier de Gaibu também foi reconquistado aos
holandeses após a capitulação. Em 1654, João Fernandes Vieira manda construir um novo forte,
na praia de Tamandaré, de formato quadrado com 4 baluartes. As obras do Forte de Santo Inácio
de Loyola de Tamandaré foram concluídas em 1677 (A.H.U., PE, Caixa 6, p.232).
104
Todas essas fortificações estão espacializadas na figura abaixo.
Figura 18.
Localização das fortificações construídas pelos portugueses após a capitulação holandesa
(Modificado do site Google Earth).
FORTIFICAÇÕES CONSTRUÍDAS EM PERNAMBUCO UTILIZADAS COMO OBJETO DE ESTUDO
A partir da identificação das fortificações construídas pelos portugueses em Pernambuco, foram
feitas algumas verificações para seleção das fortificações que seriam utilizadas como objeto de
estudo, nesta pesquisa. O primeiro critério foi a existência de vestígios que permitissem um
levantamento físico espacial, com utilização de Estação Total, ou de imagem, que pudesse
evidenciar a configuração geométrica da fortificação sobre a qual pudessem ser feitas medições.
O segundo critério foi a acessibilidade; foram selecionadas fortificações que pudessem ser
acessadas para serem medidas. O terceiro, e último critério, diz respeito à influência holandesa.
Foram selecionadas fortificações construídas no âmbito da ameaça da invasão holandesa, antes
de 1661, assinatura do segundo Tratado de Haia.
A partir dos critérios apresentados foram selecionadas nove fortificações, pertencentes aos três
Sistemas Defensivos, são elas:
105
Figura 19.
Localização das fortificações selecionadas para serem objeto de estudo desta pesquisa
(Modificado do site Google Earth).
106
COLETA
XVI
E
XVII
DE DADOS DE REFERÊNCIA DE
TRATADOS
DOS SÉCULOS
PARA QUALIFICAÇÃO DOS MODELOS DE FORTIFICAÇÃO EM
PERNAMBUCO
Nesse capítulo estão apresentados os modelos de Fortificação Moderna que podem ter sido
utilizados como referências nas fortificações construídas em Pernambuco nos séculos XVI e
XVII. Dos modelos apresentados nos tratados desse período, foram selecionados, aqui, apenas
aqueles que apresentavam a configuração geométrica com formato de polígono quadrangular,
uma vez que esses são os formatos utilizados nas fortificações construídas em Pernambuco.
Esses modelos foram apresentados a partir das suas características físicas, detalhando a
configuração geométrica e o material construtivo sugerido como o mais adequado para a sua
construção.
Os dados técnicos seletivamente levantados e apresentados, nesse capítulo, têm o objetivo de
fundamentar a análise comparativa dos modelos selecionados com as fortificações construídas
em Pernambuco, presente no capítulo 6. Nesta análise comparativa, buscou-se averiguar se na
construção das fortificações de Pernambuco foram seguidos os Tratados europeus.
Para realizar esse levantamento foram selecionados Tratados sobre Arquitetura e Fortificações
publicados nos séculos XVI e XVII. Considerando o grande número de Tratados publicados na
Europa no século XVI, procurou-se trabalhar com diversidade de origem, privilegiando aqueles
disponíveis nas bibliotecas. Para os Tratados do século XVII, a seleção seguiu três orientações.
Alguns tratados foram selecionados a partir das referências encontradas no Tratado de Luiz
Serrão Pimentel, engenheiro português do século XVII; outros foram também selecionados
segundo a diversidade e a disponibilidade nas bibliotecas. Para ampliar a diversidade das fontes,
também foi selecionado um tratado da escola italiana de fortificação 42, que apesar de não ter
sido citado por Pimentel, faz parte da escola precursora dos estudos sobre a Fortificação
Moderna na Europa.
Luíz Serrão Pimentel em seu tratado “O methodo Lusitanico de desenhar as fortificacoens das
praças regulares e irregulares”, publicado, postumamente, em 1680, reuniu o conhecimento
adquirido a partir de tratados estrangeiros, publicados em toda a Europa, para ensinar estudantes
42
O tratado selecionado foi o do engenheiro militar italiano Vicenzo Scamozzi, por ter sido o primeiro tratado
publicado pela escola italiana, no século XVII, no período em que as demais escolas estavam sendo criadas.
107
a projetar fortificações regulares e irregulares, considerando as características do sítio43
(Moreau, 2011: p.57; Valla, 2007: p, 233-234; Cotta, s/d: p.3-6). A escolha por utilizar parte da
mesma seleção de tratados de que se valeu Luís Serrão Pimentel em seu tratado, se justifica
porque, a partir desse tratado, dentre outros, a escola portuguesa de fortificação foi estruturada
(Valla, 2007: p. 231).
Em síntese, dentre os documentos apresentados a seguir, estão tratados das escolas italiana,
alemã e holandesa:
Século XVI
Tratado alemão: “Instruction sur la fortification des villes, bourgs et chateaux”. Albrecht
Dürer. Nuremberga, publicado em 1527; e,
Tratado italiano: “L’Architettura. Pietro Cataneo, publicado em 1567.
Século XVII
Tratado italiano: “L’ Idea della Architettura Universale”, Vicenzo Scamozzi, publicado
em 1615;
Tratados holandeses: “L’Architectura Militair e Moderne ou Fortification”, Matthias
Dogen, publicado em 1648; e “La Nouvelle Fortification”, Nicolas Goldman, publicado
em 1645.
Para a compreensão do conteúdo a ser apresentado, a seguir, foi preciso fazer algumas
observações gerais. Os documentos que foram estudados se configuram como fontes primárias,
pois são os tratados originais que foram publicados no século XVI e XVII, e evidenciam o
diálogo do autor com o seu leitor, muitas vezes numa linguagem direta, na primeira pessoa do
singular.
O conjunto de dados apresentado abaixo foi, portanto, o resultado de uma seleção, realizada a
partir do inteiro teor dos tratados selecionados. Como não havia padronização entre os
conteúdos, foi preciso estabelecer critérios para seleção de dados, a partir de um conjunto
determinado de variáveis, enquanto categorias de entrada, para permitir compreender os
modelos de fortificação apresentados, enquanto categorias de saída. De uma maneira geral, os
43
O conteúdo do Tratado de Pimentel é a compilação de manuscritos elaborados por ele enquanto titular da Aula
de Fortificação e Arquitectura Militar, entre 1647 e 1678 (Valla, 2007: p. 231).
108
tratados não são documentos objetivos; para compreendê-los foram necessárias longas leituras
de textos e desenhos carregados de impressões, crenças e posturas pessoais dos próprios
autores, em busca da construção de dados objetivos que traduzissem as características físicas
dos modelos e seus materiais construtivos.
A apresentação dos tratados foi estruturada, portanto, em duas partes: a descrição da
configuração geométrica dos modelos em geral, com o detalhamento dos modelos possíveis de
terem sido utilizados em Pernambuco; e a apresentação dos materiais construtivos sugeridos.
Neste sentido, conforme já foi referido anteriormente, as variáveis consideradas para a
configuração geométrica dos tipos de fortificação foram:
Principais itens que compõe uma fortificação;
Formatos da fortificação;
Dimensões e proporções;
Tipos de fortificação; e,
Inclinação da escarpa exterior do reparo.
Outra particularidade dos tratados, também considerada nas análises, são as diferentes unidades
de medidas lineares utilizadas em cada tratado, dependendo da cidade de origem do autor. Foi
preciso utilizar tabelas para a conversão das medidas apresentadas. Essas tabelas foram
retiradas do livro Systema Legal de Medidas, publicado em Lisboa, em 1864, onde estão
apresentadas tabelas de redução das medidas das possessões portuguesas na América, Ásia,
África e Oceania, como também de alguns lugares da Alemanha e de outros Estados.
TRATADOS E SUAS UNIDADES DE MEDIDA
REDUÇÃO EM
METROS
L’ Idea della Architettura Universale. Vicenzo Scamozzi.
Medidas de Veneza
Passo= 5 pés
1,7387
Pé agrário = 4 pés
Pé
1,3909
0,37474
L’Architectura Militair e Moderne ou Fortification. Matthias Dogen
Amsterdã
Vara antiga (El)
Pé do Rheno, de 12 pollegadas
0,6878
0,31385
La Nouvelle Fortification. Nicolas Goldman
Amsterdã
Pé = 11 pollegadas = 44 quartos = 88 oitavos
0,2831
Tabela 1.
Valores das tabelas de redução de medidas para o sistema métrico-decimal dos tratados
estudados e apresentados neste capítulo. Fonte: Da Graça, 1964. p. 155-188.
109
A partir do inteiro teor dos tratados, foram extraídos dados mais objetivos que possibilitam a
identificação de modelos de fortificação. No entanto, em função da necessidade de comparação
com as fortificações construídas em Pernambuco, apenas serão apresentados os modelos de
fortificações com configurações geométricas semelhantes às de Pernambuco, que podem ser
assim resumidas:
Fortificações de formato quadrangular, abaluartadas, cujas dimensões dos lados do
polígono interno variam de 48 a 83 m;
Fortificações de formato quadrangular, não abaluartada, cujas dimensões dos lados
variam de 12 a 23 m;
Fortificações de formato quadrangular com os lados fletidos, formando uma estrela,
cujas dimensões dos lados variam de 12 a 23 m.
Em síntese, os dados apresentados foram padronizados a partir das mesmas variáveis para
permitir a comparação com as fortificações construídas em Pernambuco, cujo levantamento
físico para a realização deste estudo, seguiu os mesmos procedimentos para obter o mesmo
padrão de dados. Através da preparação de dados comparáveis foi possível, no capítulo de
análise, verificar se os modelos aqui identificados, afiliados a três diferentes escolas, foram
referência para a construção das fortificações pernambucanas.
4.1
TRATADOS DO SÉCULO XVI
Como já foi apresentado no Capítulo1, os Tratados sobre Arquitetura publicados no século XVI
já buscavam o aprimoramento das estruturas de defesa a partir dos conhecimentos matemáticos
e geométricos, com o objetivo de se defender das armas de fogo. Esses Tratados apresentam
um tipo de fortificação que passou a ser chamado de Fortificação de Transição.
4.1.1 INSTRUCTION SUR LA FORTIFICATION DES VILLES, BOURGS ET CHATEAUX
Albrecht Dürer. Nuremberga, 1527
O tratado de Dürer44 é sobre a maneira de construir fortificações. No entanto, como Durer não
era um homem de guerra, suas ideias sobre como construir uma fortificação foram aprimoradas
44
Albrecht Durer foi pintor e escultor alemão nascido em Nuremberg, em 1471 (onde faleceu em 1528). Realizou
viagens pela Alemanha, Itália e Países Baixos e se interessou pelos aspectos teóricos da arte. Publicou tratados
inspirados nas teorias de Leon Battista Alberti e Vitrúvio. É considerado um grande artista alemão do período
110
com base na experiência prática de homens de longa prática bélica (Dürer, 1527. p. 5). O
Tratado não está divido em partes, trata-se de um texto corrido que apresenta projetos. São eles:
(i)
três projetos de torreões para serem construídos nos cinturões de muralha;
(ii)
projeto de um castelo para servir de residência a um príncipe, contendo três
cinturões de muralha concêntricos, fossos e torreões;
(iii)
projeto de um castelo situado entre uma grande superfície de água e um rochedo
elevado, pensado para poder controlar o acesso a partir dessa estreita passagem;
(iv)
projeto de melhoria de uma antiga vila fortificada, para que esta possa fazer
frente aos ataques com artilharia moderna; e,
(v)
projeto de um suporte em madeira e metal para peças de artilharia moderna.
A. CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
PRINCIPAIS ITENS DE UMA FORTIFICAÇÃO
Os principais itens de uma fortificação, para Dürer, eram as muralhas que envolviam a cidade
como cinturões, os torreões que a flanqueavam e o fosso revestido que a antecedia. Deve-se
registrar que os torreões contavam com espaços internos subterrâneos onde se poderia fazer a
defesa baixa e rasante. Quando o inimigo estivesse mais próximo da muralha, ou mesmo dentro
do fosso, a obras superiores não conseguiriam combatê-lo. Nos espaços internos – casamatas haveria, então, o posicionamento de tropas para atacar o inimigo que estivesse mais próximo,
através de canhoneiras (Dürer, 1527. p. 6 e 23). Nos torreões maciços, por sua vez, só poderia
ser feita a defesa superior para ataques à distância, mas essa foi considerada uma opção somente
nas situações em que era necessário fazer economia na construção da fortificação.
FORMATO
O tratado não apresenta um formato específico para uma fortificação, pois o autor ainda
considera o modelo medieval de muralhas, como cinturões em torno da cidade. No entanto,
quando ele propõe a construção de um castelo, ele sugere o formato quadrado com 4300 pieds
(1.255,6 metros ou m) de comprimento. Em torno do castelo propriamente dito, o autor indica
renascentista, responsável pela modernização da cultura nórdica ao proporcionar o contato entre norte e sul da
Europa (http://www.treccani.it).
111
a construção de outro muro, cercado por fosso. Nesse muro haveria quatro portas que seriam
protegidas por quatro torres circulares e escarpadas, medindo 135 pieds (39,42 m) de altura,
100 pieds (29,20 m) de diâmetro na base e 70 pieds (20,44 m) na parte superior (Dürer, 1527.
p. 40-42).
DIMENSÕES E PROPORÇÕES
No que diz respeito a dimensões e proporções, o autor defende que os torreões devem ter
grandes dimensões, considerando que a capacidade da obra de resistir à violência dos projetis
de alvenaria moderna estaria no elevado tamanho das suas estruturas. No Tratado, foram
apresentados três tipos de fortificações. Em cada um dos tipos há diferentes espessuras dos
muros da muralha e dos torreões. No primeiro tipo, a espessura da muralha e do muro do torreão
do lado voltado para a cidade é de 10 pieds (2,92 m), a mesma espessura da antiga muralha
medieval. Mas, a espessura proposta para os muros que estruturam o torreão do lado do fosso
é de 18 pieds (5,25 m) (Dürer, 1527. p. 6 e 9). Nesse primeiro tipo, o fosso ao redor da cidade
deve ter, no mínimo, 200 pieds (58,40 m) de largura e 55 pieds (16,06 m) de profundidade.
Segundo Joaquim José da Graça, em Systema Legal de Medidas, Lisboa, 1864, página 161, nas
medidas de Munich, na Baviera, um pieds equivale a 0,292 metros.
No segundo tipo, ambas as partes do torreão, têm uma escarpa circular de 15 pieds (4,38 m) de
espessura na parte baixa e vai reduzindo até 10 pieds (2,92 m) na parte alta. Nesse tipo, o fosso
ao redor da cidade deve ter, no mínimo, 250 pieds (73 m) de largura e 50 pieds (14,60 m) de
profundidade. Finalmente, no terceiro tipo, como a plataforma é bem menor que as demais,
cerca de 120 pieds (35,04 m), todos os muros têm a mesma espessura: 10 pieds (2,92 m) em
escarpa (Dürer, 1527. p. 32 e 38).
Figura 20.
32 e 37).
Representação dos três tipos de torreão, segundo o tratado de Albretch Dürer (Dürer, 1527. p. 8,
112
TIPOS DE FORTIFICAÇÃO
Os tipos de fortificação citados no Tratado de Dürer estão relacionados aos tipos de torreões
utilizados. O primeiro tipo apresenta um torreão curvado, razoavelmente avançado do muro da
cidade em direção ao fosso. Esse avanço seria de cerca 90 pieds (26,28 m) a partir de uma linha
de referência no muro. O segundo tipo também apresenta um torreão curvado, mas já mais
avançado do muro da cidade em direção ao fosso. Esse avanço seria de cerca 200 pieds (58,40
m) a partir de uma linha de referência no muro. O terceiro tipo apresenta um torreão mais
quadrado, com uma ligeira curvatura em uma das faces. O avanço desse torreão em direção ao
fosso seria de cerca 80 pieds (23,36 m) a partir de uma linha de referência no muro. Esse tipo
foi considerado, pelo autor, uma opção de projeto cuja execução seria menos onerosa (Dürer,
1527. p. 8 e 37-38).
INCLINAÇÃO DA MURALHA
Quanto à inclinação da muralha, em todos os projetos de fortificação propostos pelo autor, a
muralha apresenta uma base, a prumo, medindo 23 pieds (6,71 m) de altura e sobre esta, um
trecho escarpado medindo 30 pieds (8,76 m) de altura. Não há, no entanto, referência à
inclinação que esta muralha deveria ter. O princípio defendido pelo autor é que uma muralha
construída a prumo não seria capaz de resistir à grossa artilharia, por isso, deveria estar
inclinada (Dürer, 1527. p. 5 e 31).
B. MODELO DE FORTIFICAÇÃO SELECIONADO
Não há referência no Tratado de Dürer sobre modelos de fortificação. Há apenas a descrição de
três tipos de torreão para serem introduzidos nos cinturões das muralhas medievais.
C. ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
Ao descrever as características das fortificações, o autor apresenta sempre a pedra talhada como
o material a ser utilizado na sua construção. “... para uma grande vila, para um castelo
respeitável, cercado de muralhas, flanqueado de torreões e precedido de fossos revestidos,
convém empregar construções de conformidade, quer dizer, obras em alvenaria de pedra.”
(Dürer, 1527. p. 6). Para o autor, uma obra fortemente construída em alvenaria de pedra não
perderia a capacidade de se defender, mesmo em momentos de paz e até quando se voltasse a
precisar dela.
113
No caso de não haver pedra no local da obra, Dürer considera que seriam feitos terraplenos
descobertos e fosso sem cobertura, advertindo, no entanto, que a muralha ficaria fragilizada,
sendo mais fácil para o inimigo fazer buracos e adentrar na vila e destruir a fortificação com
seus canhões. No caso ainda de não haver dinheiro ou se fosse necessário construir uma
fortificação apressadamente, o autor lembra que poderiam ser feitas grandes bases sobre as
quais se colocaria a terra. E ainda, poderiam ser escavados fossos e construídas paliçadas. No
entanto, apesar de não considerar essa opção de má qualidade, lembra que as pessoas práticas
de guerra conheciam esse método, por isso não era preciso explicá-lo em seu Tratado, além de
que seriam obras pouco duráveis que se destruiriam com o tempo, quando sem manutenção
(Dürer, 1527. p. 6 e 73).
A utilização da alvenaria de pedra também seria a opção de Dürer na construção do parapeito
da fortificação sobre os torreões. O autor acreditava que a forma circular e a utilização da pedra
talhada fizessem os projetis ricochetear. Segundo o autor, as pedras a serem usadas dos torreões
circulares deveriam ser cortadas de maneira que suas faces laterais fossem perpendiculares à
superfície curva, ou seja, “em cunha”, reforçando o muro, uma vez que as pedras estariam
pressionando umas as outras em cadeia (Dürer, 1527. p. 16 e 18).
4.1.2 L’ARCHITETTURA.
Pietro Cataneo, Siena, 1567
O tratado de Pietro Cataneo45 sobre arquitetura não trata de fortificações propriamente ditas,
mas sim, de recintos fortificados. Na verdade, são cidades, ou castelos (residência do Príncipe),
ou cidadelas, dependendo de sua extensão, que seriam fortificadas.
O Tratado está dividido em oito livros:
O primeiro livro apresenta a cidade como um lugar político que deve contar com
segurança militar.
45
O segundo livro trata dos materiais de construção.
Pietro Cataneo atuou ativamente como arquiteto militar a serviço da república de Siena, durante dez anos, até
1552. O tratado L’Architettura é fruto da experiência desses anos de campo. Cataneo participou da construção das
fortificações e muralhas em PortoErcole, Orbetello, Talamone, Montano e outros lugares.
114
O terceiro e quarto livros apresentam, respectivamente, projetos de arquitetura religiosa
e projetos de arquitetura de habitações, palácios etc.
O quinto livro aborda a ornamentação e ordens arquitetônicas.
O sexto, discute a relação entre a cidade e a água.
Finalmente, os livros sétimo e oitavo tratam da geometria e perspectiva a partir de um
viés prático.
A. CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
PRINCIPAIS ITENS DE UMA FORTIFICAÇÃO
Os principais itens, segundo Cataneo, para a defesa de um recinto fortificado são baluarte,
cavaleiro, casamata, flanco, plataforma, fosso e terrapleno. Quanto maiores e mais robustos
fossem cada um desses elementos mais seguro seria o lugar. O autor defende, ainda, que as
cidades deveriam ter formato anguloso e não mais circular, como faziam os arquitetos antigos.
Em cada ângulo deveria ser feito um bom baluarte, anguloso, de maneira que todas as partes da
muralha pudessem ser defendidas a partir dos flancos do baluarte. Porém, os baluartes não
deveriam ser diferentes entre si, mesmo quando a condição do terreno demandasse (Cataneo,
1567. p. 9 e 14-15).
FORMATOS
Os formatos sugeridos pelo autor para esses recintos fortificados são aqueles que propiciavam
que o ângulo do baluarte fosse mais obtuso e menos agudo, de maneira que o baluarte pudesse
resistir melhor ao tiro dos canhões. Segundo Cataneo, quanto mais lados tivesse a figura, sendo
os lados iguais, o ângulo do baluarte seria mais obtuso e, portanto, mais robusto. Por isso, a
figura do triângulo deveria ser evitada e a do quadrado perfeito não era aconselhada. No entanto,
o formato quadrado seria aceito quando fosse do tipo cidadela ou castelo, ou seja, um recinto
de menor extensão que estaria coligada à cidade, e também nos casos em que a cortina entre os
baluartes tivesse um comprimento adequado (Cataneo, 1567. p. 17). A partir da figura de
formato pentagonal, as cidades atenderiam às recomendações do autor.
A configuração do terreno também foi considerada por Cataneo na definição do formato da
fortificação. Em terrenos planos, o formato utilizado contaria com lados e ângulos iguais. No
caso do terreno em montanha, a adequação ao sítio acabaria por levar a fortificação a ter lados
115
e ângulos desiguais, gerando figuras irregulares. Nesse caso, o autor orienta que não seria
necessário colocar artilharia, nem precisaria que a muralha fosse robusta, nem tivesse grandes
flancos, nem terrapleno nos trechos do terreno muito acidentado onde o inimigo não conseguiria
atacar, pelas dificuldades de acesso. Nessas circunstâncias, fica registrado que haveria uma
redução dos gastos da obra (Cataneo, 1567. p. 27).
DIMENSÕES E PROPORÇÕES
No que diz respeito a dimensões e proporções, para que o recinto fortificado fosse mais seguro,
os baluartes deveriam ser mais espaçosos e bem ladeados (Cataneo, 1567. p. 14). Por isso, os
menores baluartes que poderiam ser feitos não podiam ter flancos menores que 15 canne (35,01
m)46. No caso dos recintos de menor extensão, as cidadelas ou castelos de formato quadrado,
os flancos mediam 15 canne (35,01 m). Já para os recintos maiores, as cidades, no formato
pentagonal, os flancos mediam 16 canne (37,35 m); e no formato hexagonal, 16,5 canne (38,51
m). Segundo Joaquim José da Graça, em Systema Legal de Medidas, Lisboa, 1864, página 169,
nas medidas de Florença, uma canna de commercio, ou 4 braças, equivale a 2,3344 metros.
A partir das informações descritas no Tratado, é possível reconstituir os modelos sugeridos de
cidadelas ou castelos quadrangulares e os modelos de cidades de formato pentagonal e,
parcialmente, as de formato hexagonal. Na descrição do recinto de muro hexagonal equilátero,
o autor apresenta dois tipos de baluartes, mas não há informação que permita representar o
projeto do baluarte localizado no centro da cortina. Faltam as medidas da largura, face e ângulo
do baluarte. Portanto, não há como projetar esse recinto fortificado. A mesma situação ocorre
com a apresentação do recinto de muro heptagonal e decagonal (Cataneo, 1567. p. 23 e 32).
Não foi apresentada a dimensão dos flancos, nem da linha flancante, por isso não há como
representar esse projeto.
TIPOS DE RECINTO FORTIFICADO
Os tipos de recinto fortificado citados no Tratado de Cataneo são castelos ou cidadelas e
cidades (Cataneo, 1567. p. 32). São projetados seguindo formatos de polígonos regulares,
quando possível, ou resultam em polígonos irregulares quando precisam ser adaptar ao sítio.
46
Cataneo, 1567. p. 17. Segundo o autor, quatro braços equivalem a uma canna. Cada braço toscano tem doze
onças. E cada onça equivale a quatro minutos.
116
As cidadelas e castelos tem menor extensão, já as cidades, de maior extensão, ainda podem
contar com suas próprias cidadelas, coligadas aos seus muros, parte dentro, parte fora.
INCLINAÇÃO DA MURALHA
Quanto à inclinação da muralha, Cataneo não estabelece o seu grau de inclinação, apenas
apresenta-a escarpada até ¾ da sua altura. No entanto, estabeleceu diferentes alturas para cada
formato de recinto fortificado. Para uma cidadela ou castelo de formato quadrado, por exemplo,
cujo lado mede 90 canne (210,09 m), a altura da muralha é de 7,5 canne (17,50 m) ou menos.
Para uma cidade de formato pentagonal, cujo lado mede de 80 a 130 canne (186,75 até 303,47
m) a altura é 5,5 canne (12,83 m) (Cataneo. 1567. p. 19 e 21 e 22). No caso da cidade hexagonal,
com 162,5 canne (379,34 m) de lado, a altura é 6 canne (14,0 m). Finalmente, o autor define
para os recintos fortificados de formatos irregulares, a altura de 5,5 canne (12,83 m) para a
muralha (Cataneo, 1567: p. 30).
B. MODELO DE FORTIFICAÇÃO SELECIONADO
A partir dos dados apresentados acima, foi identificado um modelo de fortificação que podem
ter sido utilizados nas fortificações construídas em Pernambuco. Foi considerado, no entanto,
apenas o formato do polígono quadrangular, que é aquele que deu origem às fortificações
portuguesas existentes na Capitania. Os tipos de fortificações abaluartadas poderiam ter sido a
cidadela ou castelo quadrangulares.
A configuração geométrica dos modelos abaluartados pode ser objeto de comparação com a
configuração geométrica das fortificações construídas em Pernambuco. Trata-se de
fortificações que apresenta a seguinte configuração geométrica: Fortificação Moderna,
abaluartada, composta por reparo, com baluarte e cortina; com formato de polígono de quatro
lados, do tipo cidadela ou castelo quadrangulares, com dimensão do lado do polígono de 210
m, e não estabelece um valor para a inclinação.
117
Figura 21.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Cataneo, do tipo Cidadela ou
Castelo, que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em Pernambuco. Modificado de
Cataneo, 1567: p.17-21.
C. ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
Em seu Tratado, Cataneo apresenta a muralha da fortificação construída em terra e recoberta
com outro material, mas não institui um único material construtivo para encamisar a
fortificação. Orienta que a utilização do tijolo deve ser preferida, justificando que o tijolo é
capaz de melhor proteger a muralha do ataque da artilharia, em relação a outros materiais. Esse
tijolo, no entanto, teria que ser feito de boa terra, no tempo certo, enxuto convenientemente e
cozido. A segunda opção, seria o uso das pedras como, por exemplo, turfa, consideradas pouco
resistentes e de fácil trabalhabilidade. Assim como o tijolo, essas pedras, ditas macias, seriam
capazes de proteger a muralha do impacto dos projetis. A última opção, seria a utilização de
pedra dura. Como essas pedras se fraturam pela ação da artilharia em maior amplitude que as
demais, não são aconselhadas (Cataneo, 1567. p. 14).
No caso de não ser possível circundar a Cidade ou Castelo com muralha revestida, Cataneo
sugere que se fizesse no entorno do sítio terrapleno com fosso, cortina e baluarte. Em um
segundo momento, com mais comodidade poderia, então, ser encamisado o muro.
No caso de, por sua vez, o terreno não comportar grandes baluartes ou terrapleno, dever-se-ia
fazer na parte a ser atacada uma muralha grossa, medindo de 12 a 16 braços (7,00 a 9,33 m)
recoberta interna e externamente com estreito muro de tijolo. Na parte externa, em baixo, a
muralha seria revestida com muro de espessura de cerca 3 braços (1,75 m) e no alto, com 1
118
braço (0,5836 m) de espessura. O material entre os tijolos deveria ser composto de cascalho
fino e cal para resistir ao tiro do canhão (Cataneo, 1567. p. 25).
4.2
TRATADOS DO SÉCULO XVII
Os Tratados sobre Fortificação publicados no século XVII, como já foi apresentado no Capítulo
1, se caracterizaram pela especialização da construção de fortificações. Seu conteúdo apresenta
modelos que definem um tipo de fortificação denominado Fortificação Moderna.
4.2.1 L’ IDEA DELLA ARCHITETTURA UNIVERSALE
Vicenzo Scamozzi. Veneza, 1615
O tratado de Scamozzi, como o próprio título sugere, versa sobre a arquitetura universal,
abrangendo todas as formas de arquitetura, seus atores, processos e materiais. A título de
caracterização do tratado enquanto fonte de pesquisa, o texto está dividido em duas partes. A
primeira é composta de três livros que tratam:
do arquiteto, da arquitetura, das formas arquitetônicas e do modo de desenhar;
da geografia, do sítio e de suas características, faz advertência sobre a forma das
fortalezas Reais e seus elementos e ainda discute o planejamento da execução da obra
e a própria execução; e,
discute sobre os antigos romanos e gregos, suas casas, palácios públicos e privados e
sobre a construção que se faz em outros países e as partes dessas construções, além do
abastecimento de água.
A segunda parte do Tratado, também está dividida em três livros que apresentam:
as Ordens Toscana, Dórica, Jônica e Coríntia, e suas características;
os materiais de construção, seu uso adequado, com ênfase nas pedras nobres,
trabalháveis e outros materiais como a terracota, cal, betume, areia, madeira e metais; e,
discute sobre a execução da obra, desde os profissionais até os materiais e seu
agenciamento. Segue a apresentação dos dados da Configuração Geométrica dos
modelos de fortificação a partir do tratado de Scamozzi.
119
A. CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
PRINCIPAIS ITENS DA FORTIFICAÇÃO
De uma maneira geral, os principais itens de uma fortaleza Real para Scamozzi são: baluarte
(que serve para atacar e se defender), plataforma, revelim, e cavaleiro, e ainda, cortina,
parapeito, terrapleno, fosso e contra escarpa. Após a descrição, o autor reforça que os itens
devem ser localizados e estruturados com muito critério e feitos com muita maestria; e se faltar
algum, toda a obra estaria imperfeita. Da mesma forma, se alguma das partes estiver imperfeita,
toda a obra também estaria. Por isso, defende que não se deve fazer fortificação se alguma parte
ficar imperfeita, seja para manter coisa velha ou fraca, seja por pressa ou economia, seja por
baixa qualidade da matéria-prima (Scamozzi, 1615: p.180 e 190).
Figura 22.
Identificação das partes de uma fortificação listadas por Scamozzi como sendo as principais
partes de uma fortificação Real. Fonte: modificado de SCAMOZZI, 1615, p. 194/195. Disegno della meta della
fortezza d’otto lati com tutto le sue parti e diffese reali.
FORMATO
Para o autor, o formato não deve ser triangular nem quadrangular, porque o ângulo do baluarte
fica muito agudo e, por isso, pouco resistente. A forma mais louvável para uma fortaleza
ordinária seria a de cinco, seis e sete lados e ângulos iguais. Já para a fortaleza Real, a forma
mais adequada deve ser a de um polígono de, no mínimo, oito lados e ângulos iguais (Scamozzi,
1615: p.186-187).
120
DIMENSÕES E PROPORÇÕES
No que diz respeito a dimensões e proporções, o tratado apresenta os polígonos de quatro a
dezesseis lados e ângulos iguais, que são os formatos de referência para a construção de
fortalezas. Todos os polígonos têm a mesma medida de lado, ou seja, 180 passo (312,96 metros
ou m). Segundo Joaquim José da Graça, em Systema Legal de Medidas, Lisboa, 1864, página
173, nas medidas de Veneza, um passo equivale a 1,7387 metros.
Figura 23.
Simulação do formato das fortificações de quatro e cinco lados a partir de polígonos regulares
de 180 passa de lado, com indicação do ângulo do baluarte resultante. Fonte: modificado de Scamozzi, 1615. p.
185.
TIPOS DE FORTIFICAÇÃO
Os tipos de fortificação citados no Tratado de Scamozzi são: a fortaleza Real, a fortaleza
ordinária, o castelo e cidadela e o forte de campanha. Dos tipos apresentados, considerando as
dimensões que são adotadas no tratado, apenas o modelo de castelo e cidadela pode ter sido
utilizado em Pernambuco; no entanto, considerando o formato do polígono, só o modelo de
Forte de campanha se adequaria, por utilizar o polígono quadrangular.
O forte de campanha serve para incomodar o inimigo. Tem formato triangular ou
quadrangular e deve ser construído longe da fortaleza, de maneira que se for ocupado
não cause problemas (Scamozzi, 1615. p. 187).
O castelo e a cidadela são fortificações que defendem parte da cidade, com pouco gasto.
São compostas de fosso, cortina, terrapleno e baluarte robustos, quase como aquele da
cidade Real. Não devem nunca ter formato triangular nem quadrangular, pois o ângulo
do baluarte resulta muito agudo e, portanto, pouco resistente ao ataque. Podem ser feitos
121
com cinco ou seis lados, apesar de terem ainda o ângulo do baluarte agudo. Esse tipo de
fortificação deve ser feito com as suas medidas 1/6 ou até mesmo 1/3 menor do que
aquelas medidas da fortaleza Real, ou seja, polígono com 120 ou 150 passo, cortina com
80 ou 100 passo, garganta com 20 ou 25 passo, flanco com 20 ou 25 passo e
consequentemente, cabeça com 36 ou 45 passo (Scamozzi, 1615. p. 187).
Figura 24.
Apresentação dos nomes de linhas a partir do tipo Castelo e Cidadela usando formato de polígono
regular de cinco lados. Fonte: modificado de Scamozzi, 1615.
Na fortaleza ordinária o formato mais adequado é aquele do polígono de cinco, seis ou
sete ângulos formando uma circunferência.
Na fortaleza Real, o autor afirma que o melhor formato deve começar pelo polígono
regular de oito lados, pois tem capacidade de defesa e despesa convenientes (Scamozzi,
1615. p. 183).
INCLINAÇÃO DA MURALHA
Quanto à inclinação da muralha, o Tratado diz que para todo tipo de fortificação é indicado que
a muralha seja inclinada e que o caimento deve ser de ½ ou mesmo 1/3 da sua altura, que seria
de 4 passo (Scamozzi, 1615. p. 208, prima parte ). Significando dizer que a muralha deve ter
ou 63,43° ou 71,57°.
B. MODELO DE FORTIFICAÇÃO SELECIONADO
A partir dos dados apresentados, foi preciso criar um modelo de fortificação misturando dois
modelos apresentados por Scamozzi. Em função da limitação do formato do polígono das
122
fortificações existentes em Pernambuco, polígono quadrangular, a fortificação poderia ser um
Forte de campanha; mas em função das menores medidas estarem apresentadas no tipo Castelo
e Cidadela, esse modelo pode ter sido utilizado em Pernambuco. O modelo criado é, na verdade,
um Castelo ou Cidadela com formato de polígono quadrangular.
A configuração geométrica desse modelo híbrido pode ser objeto de comparação com a
configuração geométrica das fortificações construídas em Pernambuco. Trata-se de uma
fortificação que apresenta a seguinte configuração geométrica: Fortificação Moderna,
abaluartada, composta por reparo, com baluarte e cortina; com formato de polígono de quatro
lados, do tipo Castelo ou Cidadela, com dimensão menor que a Fortificação Real em até 1/3, e
com inclinação que pode ser de 63,43° ou 71,57°.
Figura 25.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Scamozzi, do tipo Castelo ou
Cidadela, que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em Pernambuco. modificado de
Scamozzi, 1615.
C. ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
Em seu Tratado, Scamozzi defendia que a matéria-prima selecionada para ser utilizada na
construção da fortificação precisava estar disponível no lugar onde a obra seria feita e precisaria
ser adequada ao uso a que se propunha (Scamozzi, 1615. p. 44). O autor considerava que os
melhores materiais para fazer uma fortaleza em terreno plano eram os solos tenazes, como a
turfa; os quadrados de terra seca ao sol e ao vento; e, outros materiais semelhantes que não
faziam muita resistência ao tiro dos canhões, mas que absorviam o seu impacto sem danos à
estrutura (Scamozzi, 1615. p. 205).
123
Considerando que nem sempre seria possível utilizar terreno de melhor qualidade para construir
a muralha, aconselhava-se de utilizá-lo sempre na parte externa, ao menos uma parte com seis
passo de largura. O melhor terreno disponível deveria ser usado no parapeito, pois além de
defender os soldados dos tiros de arcabuz, evitava a destruição pela ação da chuva ou da
artilharia inimiga. Na parte interna do terrapleno, sugeria-se utilizar o terreno de qualidade mais
honesta, e, finalmente, na parte interna, o terreno de menor qualidade.
Antes de executar a obra, a matéria-prima deveria ser preparada. O autor advertia que se deveria
compactar muito bem o terreno e durante o verão molhar o solo, para que estivesse mais bem
unido formando um corpo compactado. O terreno mais fraco deveria ser reservado, com
pedregulhos e outras matérias de pior qualidade para ser utilizado como cobertura do solo da
área externa, onde promoveria incomodo aos inimigos que se aproximassem.
No caso de não haver disponível terreno de melhor qualidade e ter sido preciso utilizar terrenos
mais fracos, para cada mão de terreno deveria utilizar feixes de finos ramos frondosos ou de
vime. Esses conjuntos deveriam ser usados, ao menos, por três ou quatro passo de terrapleno.
Com esse artifício esperava-se que o terreno se coliguasse e a obra resultasse bem sólida. No
caso de ter que usar terrenos encharcados, se utilizaria feixes de ramos frondosos, mais grossos,
de maneira que o terreno fique preso nos galhos até secar. Com esse material seria preciso ainda
entrelaçar galhos frescos, grossos, evitando que o inimigo pudesse fazer buracos na muralha
(Scamozzi, 1615. p. 209.
Finalmente, o autor considerava, ainda, a vontade do construtor de encamisar a muralha, ou
seja, revesti-la externamente com pedras macias ou tijolos cozidos, unidos com argamassa de
cal. Em sua opinião, a “camisa” era feita para tornar a construção mais bela, mas,
principalmente, para que, em tempo de paz, a estrutura não fosse danificada pelas intempéries,
e, em tempo de guerra, para que se pudesse perceber quando o inimigo tentasse escavá-la e para
que houvesse resistência por mais tempo contra a artilharia inimiga. Nas faces e flancos dos
baluartes, a camisa pode ser mais grossa em 1/3 ou até mesmo a metade da espessura utilizada
na cortina, para poderem resistir melhor ao ataque da artilharia do inimigo (Scamozzi, 1615. p.
210).
124
4.2.2 LA NOUVELLE FORTIFICATION
Nicolas Goldman. Leiden, 1645
O Tratado de Nicolas Goldman estava dividido em quatro livros: dos desenhos, dos perfis e
iconografia; da estereotomia47 e sciographia48; e da mecânica e ofensiva:
No primeiro livro estavam apresentados os desenhos das pequenas e grandes obras, das
figuras irregulares e plataformas e das figuras irregulares “pontos ordenados”.
O segundo livro tratava dos perfis de parapeitos e muralhas, assim como da iconografia
dos vários tipos de fortificação.
No terceiro livro, estavam apresentados os sólidos geométricos e os cálculos da
estereotomia dos vários tipos de fortificações, e ainda, expunha tipos de portas, pontes
levadiças, execução do fosso e planejamento do tempo da obra.
Finalmente, no quarto e último livro, sobre mecânica e ofensiva, estavam apresentadas
as maneiras de se executar a obra, além de tratar das obras externas, como o revelin, e
das regras e princípios de guerra.
Esse tratado demonstrou ser mais executivo que o tratado italiano, pois orientava como deveria
ocorrer o trabalho de marcação da fortificação no sítio, passo a passo. Segue a apresentação dos
dados da Configuração Geométrica dos modelos de fortificação a partir do tratado de Goldman.
A. CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
PRINCIPAIS ITENS
Ao invés de estabelecer quais os principais itens de uma fortificação, Nicolas Goldman
estabeleceu algumas máximas, requisitos e regras necessárias a uma fortificação e proporções
comuns e particulares entre suas partes. Seguem apresentadas as máximas e requisitos mais
47
Estereotomia é a técnica de dividir científica e regularmente materiais de construção (pedras, madeiras, cantaias
etc.) (Grande dicionário Houaiss da língua portuguesa).
48
Terme d'architecture. Dessin d'un édifice qu'on représente coupé sur sa longueur ou sa largeur, pour en faire voir
les dedans, c'est-à-dire toute la disposition intérieure, l'épaisseur des murs, les portes, les passages. À présent on
appelle coupe le dessin qui fait voir l'intérieur d'un bâtiment ; et les ombres y donnent une idée de la quantité dont
la coupe est en saillie sur le fond ; sciographie ne s'emploie plus guère qu'en parlant de l'antiquité (Dictionnaire de
français “Littré”. http://littre.reverso.net/dictionnaire-francais/definition/sciographie/67562).
125
representativos, tendo em vista o objetivo deste trabalho que é a identificação de modelos de
fortificação, visando identificar suas aplicações nos fortes em análise. Segue também imagem
que ilustra os itens da fortificação tratada nas máximas, requisitos e regras. São eles (Goldman,
1645. p. 13):
Primeira máxima - o ângulo do baluarte não deveria ser menor de 60° e deveria ter, no
máximo, 90°;
Segunda e última máxima - o projeto de fortificação não deveria considerar a capacidade
defensiva maior que 750 pés; e,
Requisito 1 - o segundo flanco deveria ser o maior que se possa fazer;
Requisito 2 - a garganta deveria ser bem larga;
Requisito 3 - a defesa flancante precisaria ser mais curta; e,
Figura 26.
Apresentação dos nomes de linhas nas fortificações abaluartadas usando formato de polígono
regular de quatro lados. Baseado em Figura XV, Goldman, 1645. p. 14.
Requisito 4 - o uso de flancos grandes era interessante, sem que o segundo flanco fosse
prejudicado pelo seu excessivo comprimento;
126
Regra 1 - a face, nas praças regulares, não deveria ter menos que a metade da cortina,
mas não deveria ser maior que esta.
Regra 2 - o flanco não deveria ser menor que a quarta parte da face, nem maior que a
sua metade;
Regra 3 - a garganta nunca deveria ser mais curta que o flanco (Goldman, 1645. p. 13).
O autor ainda refinou algumas regras já apresentadas, mas para serem utilizadas segundo o
julgamento de cada artesão. Foram três proposições consideradas convenientes:
1. A face deveria ser a metade da cortina, assim o segundo flanco seria maior, e os requisitos
necessários e regras comuns, acima apresentados, seriam obedecidos. Além de se reduzirem as
despesas com a obra.
2. A medida do flanco deveria ser a metade da medida da cortina, ou uma parte desta. O autor
sugeriu seguir uma progressão aritmética de acordo com o polígono utilizado: para um
quadrado, o flanco poderia ser a metade da cortina; para um pentágono, um terço da cortina;
para o polígono seguinte dever-se-ia somar dez pés, e assim por diante. Para o noneágono, a
medida chegava à metade da cortina. Para as figuras seguintes, o flanco seria a metade da face
e a face, a metade da cortina. Dessa maneira, as duas faces e os dois flancos poderiam ser vistos
desde o meio da cortina, ao mesmo tempo; e, ainda
3. As medidas de alguns ângulos não poderiam ser modificadas, pois seriam o resultado dos
polígonos utilizados. Outras medidas, como o ângulo do baluarte devem ter as seguintes
medidas: da figura quadrada até o dodecágono, o ângulo deveria ser maior que a metade do
ângulo da figura em 15°. No dodecágono e nas figuras seguintes, o ângulo do baluarte seria de
90° (Goldman, 1645. p. 13-15).
TIPOS DE FORTIFICAÇÃO
Os tipos de fortificação citados no Tratado estão divididos em pequenas e grandes obras. As
pequenas obras eram aquelas sem baluarte, que não se defenderiam inteiramente, pois
127
apresentavam trechos que não poderiam ser visto da própria obra, e por isso o inimigo poderia
ser aproximar sem ser atacado. São elas:
Redutos;
Estrelas; e,
Fortes de meio baluarte (Goldman, 1645. p. 3-12).
Figura 27.
Apresentação dos nomes de linhas a partir nos tipos redutos e estrela usando formato de polígono
regular de quatro lados. Baseado em Goldman, 1645. p. 3-12.
As grandes obras, por sua vez, já contavam com defesa inteira, pois todos os trechos poderiam
ser vistos da própria obra, mas estavam divididas em dois grupos, os fortes e as fortalezas. Os
fortes eram obras de meia grandeza, que não seriam suficientes para se defender de uma armada
Real. Dentre os fortes, a divisão estava relacionada à capacidade de ataque em relação ao um
Forte Real, que é do alcance do tiro do mosquete. Os tipos de fortes seriam:
Forte Quadrantal, tinha a capacidade de um quarto do forte Real;
Meio Forte, a metade da capacidade do Forte Real;
Forte Dodrantal, tinha três quartos da capacidade de um Forte Real;
Forte Real.
Finalmente, dentre as grandes obras, ainda havia as fortalezas que seriam obras bem
fortificadas, capazes de resistir a uma armada Real. As fortalezas podem ser:
128
Fortalezas acutangulares, quando os ângulos dos baluartes são agudos; e,
Fortalezas retangulares, quando os ângulos dos baluartes têm 90° (Goldman, 1645. p.
1-3).
Conforme se explicitará nas análises, entre os tipos de fortes apresentados acima, e
considerando as dimensões que são adotadas no tratado, apenas os modelos de Forte Quadrantal
e Meio Forte podem ter sido utilizados em Pernambuco, usando o polígono no formato
quadrangular. Considerando os tipos não abaluartados, os tipos possíveis de terem sido usados
foram o Reduto e a Estrela, ambos usando o polígono no formato quadrangular.
DIMENSÕES E PROPORÇÕES
No que diz respeito a dimensões e proporções, o tratado apresentava os polígonos e suas
dimensões para cada tipo de fortificação acima apresentada. Dentre as pequenas obras de
fortificações, o raio da circunferência que circunscrevia os polígonos variava, nos redutos de
33,94 a 84,85 piéds (de 9,61 a 24,02 m), dividindo os Redutos em muito pequenos, pequenos,
medianos e grandes; nas estrelas, o raio da circunferência variava de 70,71 a 100 piéds (de
20,02 a 28,31 m); e nos Fortes de Meio Baluarte, o raio variava de 84,85 a 127,27 piéds (de
24,02 a 36,03 m), dividindo esses fortes em pequenos, médios e grandes. Segundo Joaquim
José da Graça, em Systema Legal de Medidas, Lisboa, 1864, página 165, nas medidas de
Amsterdã, um piéd equivaleria a 0,2831 metros.
Nas grandes obras de fortificações, o raio da circunferência que circunscrevia os polígonos,
variava conforme o tipo de fortificação: nos Fortes Quadrantal, varia de 166,8 a 230 piéds (de
47,22 a 65,11 m); no Meio Forte, de 333,6 a 461,7 piéds (de 94,44 a 130,71 m); no Forte
Dodrantal, varia de 500,4 a 692,6 piéds (de 141,66 a 196,08 m); e, no Forte Real, de 667,2 a
923,4 piéds (de 188,88 a 261,41 m).
Já nas fortalezas, o raio da circunferência que circunscrevia os polígonos variava nas fortalezas
acutangulares de 923,4 piéds no hexágono (261,41 m) até 1.347 piéds no undecágono (381,34
m); e nas fortalezas retangulares, variava de 1.730,3 piéds no dodecágono (489,85 m) até
7.712,6 piéds no hexadcontágono (2183,44 m) (polígono com 60 lados).
129
FORMATO
O formato das fortificações, para Goldman, variava de acordo com o tipo de fortificação. Nos
redutos e fortes de meio baluarte era indicada a utilização do quadrado. Nas estrelas, os
quadrados, pentágonos e hexágonos. Nos fortes, eram sugeridas as figuras não-Reais e figuras
Reais, como o quadrado, pentágono e meio hexágono, Real e não-Real. Nas fortalezas, naquelas
acutangulares, deveriam ser utilizados os formatos a partir do hexágono até o undecágono. Já
nas fortalezas retangulares, deveriam ser os polígonos a partir do dodecágono até o
hexadecontágono (polígono com 60 lados) (Goldman, 1645. p. 1).
INCLINAÇÃO DA MURALHA
Quanto à inclinação da muralha, o Tratado apresentava o perfil de cada tipo de fortificação,
incluindo pequenas e grandes obras. Apesar da variação, em cada fortificação, entre altura e
largura do talude exterior, a inclinação em todas era sempre a mesma, 63,43° (Goldman, 1645.
p. 52-55).
Figura 28.
Representação dos perfis das obras de fortificação com indicação da inclinação da escarpa
exterior do Reparo, segundo o tratado de Nicolas Goldman (Goldman, 1645. p. 52-55).
B. MODELOS DE FORTIFICAÇÃO SELECIONADOS
A partir dos dados apresentados acima, foram identificados modelos de fortificação que podem
ter sido utilizados nas fortificações construídas em Pernambuco. Foi considerado, no entanto,
apenas o formato do polígono quadrangular, que é aquele que deu origem às fortificações
portuguesas existentes na Capitania. Os tipos de fortificações abaluartadas poderiam ter sido o
Forte Quadrantal ou o Meio Forte, e para as fortificações não-abaluartadas, pode ter sido
utilizado os tipos Reduto e Estrela.
130
A configuração geométrica dos modelos abaluartados pode ser objeto de comparação com a
configuração geométrica das fortificações construídas em Pernambuco. Trata-se de
fortificações que apresenta a seguinte configuração geométrica: Fortificação Moderna,
abaluartada, composta por reparo, com baluarte e cortina; com formato de polígono de quatro
lados, do tipo Forte Quadrantal ou o Meio Forte, com dimensão de ¼ e ½ da dimensão do Forte
Real, respectivamente e com inclinação de 63,43°
Figura 29.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Goldman, do tipo Forte
Quadrantal, que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em Pernambuco. Modificado de
Goldman, 1615.
131
Figura 30.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Goldman, do tipo Meio Forte,
que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em Pernambuco. Modificado de Goldman,
1615.
As configurações geométricas dos modelos não-abaluartados podem ser objeto de comparação
com a configuração geométrica das fortificações construídas em Pernambuco. Trata-se de
fortificações que apresentam a seguinte configuração geométrica: Fortificação Moderna,
composta por reparo, com formato de polígono de quatro lados, do tipo Forte Reduto ou Estrela,
com dimensão do lado do polígono que variam de 33,94 piéds e 100 piéds para os redutos e
dimensão de 100 piéds do lado do polígono para a Estrela, com inclinação de 63,43°.
Figura 31.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Goldman, do tipo Reduto e
Estrela que pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em Pernambuco. Modificado de
Goldman, 1615.
132
C. ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
Nicolas Goldman, em seu Tratado, afirmou que a terra era o material construtivo mais adequado
para a construção de fortificações, pois além de “engolir” as balas dos canhões sem causar
danos à estrutura, uma muralha feita de terra poderia ser reparada durante a noite, durante o
período de guerra, conforme a necessidade e interesse (Goldman, 1645. p. IV ).
O autor exemplificou, ainda, ao tratar da execução dos perfis, que poderiam ser feitos ajustes
no projeto da fortificação de acordo com a qualidade da terra disponível. No caso de haver terra
boa e gorda, a largura do talude exterior poderia ter a metade da altura do terrapleno; no caso
de a terra não ser boa, a largura deveria ser 2/3 da altura e, em alguns casos, a largura deveria
ser igual à altura do terrapleno (Goldman, 1645. p.46).
4.2.3 L’ARCHITECTURA MILITAIR E MODERNE OU FORTIFICATION
Matthias Dogen. Amsterdã, 1648
O tratado escrito por Matthias Dogen está dividido em dois livros e ainda tem uma parte
reservada à maneira das fortificações de atacar e se defender. O primeiro livro é reservado às
figuras regulares. Nele estão apresentadas as definições e termos usados em arquitetura militar,
o histórico das fortificações, as regras e máximas de uma fortificação, a maneira de se encontrar
as linhas e ângulos, a determinação das medidas, a maneira de projetar uma fortificação regular
e de traçar uma fortificação no campo.
O segundo livro é reservado às figuras irregulares. Apresenta as máximas aplicáveis à sua
construção, a maneira de escolher o melhor sítio, como corrigir figuras pouco capazes, como
fortificar vilas antigas, lugares montanhosos, insulares, pedregosos, banhados por rio e mar e
trata ainda da distribuição e economia de uma fortificação e do conhecimento dos mestres e
artesãos.
Segundo o autor, a arquitetura militar se propõe a cumprir três objetivos: fortificar um lugar,
com arte, para resistir aos imprevistos da guerra; resistir, com poucas pessoas, às incursões de
grandes tropas inimigas, as combater, retardar ou garantir a segurança de uma quantidade de
habitantes e, sem muitos recursos, prevenir as suas incursões; e, finalmente, com o menor risco,
vencer o inimigo.
133
Esse tratado demonstrou ser ainda mais executivo que o tratado de Nicolas Goldman, pois
orientava como deveria ocorrer o trabalho de marcação da fortificação no sítio, passo a passo,
de maneira que, na atualidade, seria possível realizar o trabalho por ele descrito. Segue a
apresentação dos dados da Configuração Geométrica dos modelos de fortificação a partir do
tratado de Dogen.
A. CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
PRINCIPAIS ITENS DE UMA FORTIFICAÇÃO
Ao invés de estabelecer quais os principais itens de uma fortificação, o autor estabeleceu
dezoito máximas que apresentam a proporção das linhas e ângulos. Dentre elas:
Primeira máxima - não pode haver nenhum ponto em toda fortificação que não possa
ser visto e, consequentemente, defendido de vários lugares da fortificação. Significa
dizer que as linhas de defesa sejam mais longas que aquelas a serem defendidas, caso
contrário são consideradas linhas fracas;
Segunda máxima - um lugar regular é preferível a um irregular, pois o inimigo atacará
sempre o lugar mais fraco, por isso se o lugar é regular, todas as suas partes serão
igualmente fortificadas;
Terceira máxima - um lugar regular é mais forte quanto mais baluartes ele tiver, pela
força dos ângulos dos baluartes, em atacar o inimigo;
Sétima máxima - a linha de defesa fichante não deve exceder 60 varas49 que é a distância
máxima do tiro de mosquete. Essa é a linha mestre da fortificação, pois permite a defesa
da face do baluarte oposto;
Oitava máxima defende que o flanco e a garganta quanto maiores mais fortes serão, pois
poderão receber mais defensores. No entanto, é preciso tomar cuidado para que a
garganta não pode ser menor que o flanco e o flanco não pode ser menor que um quarto
da face nem maior que a sua metade.
49
Segundo Joaquim José da Graça, em Systema Legal de Medidas, Lisboa, 1864, página 165, nas medidas de
Amsterdã, uma vara antiga equivale a 0,6878 metros.
134
Nona máxima diz que o segundo flanco grande é preferível a um menor, pois é a melhor
defesa, por ser a mais próxima e mais obliqua à face. As mais perfeitas fortificações são
aquelas cujos dois flancos contíguos são maiores em comprimento que a face oposta e
cuja linha de defesa fichante tenha a distância do tiro do mosquete e a linha rasante seja
a menor possível;
Figura 32.
1648. p. 26.
Representação localizando linhas e ângulos nas fortificações. Baseado em Figura XIV, Dogen,
Décima máxima trata do ângulo dos baluartes, defendendo que essa abertura deve ser a
mais cômoda para que o flanco, garganta e segundo flanco tenham a grandeza
necessária. Se o ângulo for muito grande, a face e a garganta podem se defender;
Décima primeira máxima defende que o ângulo do baluarte não tenha menos que 60°,
pois não poderiam suportar o esforço do canhão inimigo, nem tenha mais de 90°, pois
ele cria um obstáculo ao segundo flanco, que é peça fortemente utilizada na defesa;
Décima segunda máxima trata do ângulo do polígono, que não deve ser menor que 90°,
pois assim o ângulo do baluarte será menos de 60°;
Décima quarta máxima diz que o ângulo entre cortina e flanco deve ter sempre 90°;
Décima quinta máxima apresenta a exigência de o ângulo flancante exterior ser agudo,
por ser mais adequado para melhor defender as faces;
Décima sexta máxima, o ângulo flancante interior deve ter ao menos 15°;
135
Décima sétima máxima defende que a proporção entre a cortina e face seja de uma vez
e meia, sendo a cortina mais comprida, e medindo 36 varas. A face, por sua vez, além
de não poder ser maior que a cortina, não pode ser menor que a sua metade; e,
finalmente,
Décima oitava máxima defende que haja uma amigável correspondência e conveniente
proporção entre o ângulo do baluarte, flancos, face e garganta para que juntos possam
defender a praça (Dogen, 1648. p. 33-41).
TIPOS DE FORTIFICAÇÃO
Os tipos de fortificação citados no Tratado foram estruturados a partir da capacidade de defesa
do mosquete: fortificações grandes, pequenas ou medianas.
Fortalezas Reais, seriam fortificações grandes cuja linha fichante seria da mesma
medida que a portada do mosquete;
Fortalezas, seriam fortificações pequenas cuja distância entre os baluartes teria a dita
medida;
As fortificações medianas estariam entre essas duas, onde a linha fichante não seria
maior que a portada do mosquete, mas seria maior que a distância entre os baluartes
(Dogen, 1648. p. 56).
Dos tipos apresentados, considerando as dimensões que são adotadas no tratado, apenas o
modelo de Fortalezas (pequenas obras) pode ter sido utilizado em Pernambuco, usando o
polígono no formato quadrangular.
DIMENSÕES E PROPORÇÕES
No que diz respeito a dimensões e proporções, o Tratado apresentou três maneiras de calcular
as medidas para fortificações pequenas e grandes. As três maneiras foram baseadas na
identificação do ângulo do baluarte, nunca podendo superar o ângulo de 90°. Qualquer uma das
três maneiras pode ter sido utilizada para calcular as fortificações construídas em Pernambuco.
Na primeira maneira, deveria se somar 15° à metade do ângulo do polígono para ter o
ângulo do baluarte;
136
Na segunda, se admitiria o ângulo do baluarte como sendo dois terços do ângulo do
polígono; e,
Na terceira, deveria se somar 20° à metade do ângulo do polígono para ter o ângulo do
baluarte (Dogen, 1648. p. 45 e 46).
No tratado, Dogen explicou que eram usadas as medidas em Verges Rhynlandiques e piéds,
mas que ao invés de 01 verge ser equivalente a 12 piéds de Rhein, como em outras localidades,
01 verge equivaleria a 10 piéds de Rhein, Segundo Joaquim José da Graça, em Systema Legal
de Medidas, Lisboa, 1864, página 165, nas medidas de Amsterdã, uma piéds equivale a 0,31385
metros. Consequentemente, 01 verges Rhynlandiques equivaleria a 3,1385 metros.
As medidas utilizadas nesse tratado levaram em consideração o alcance de uma das máquinas
de guerra mais utilizadas no período, o mosquete. O alcance era de 600 piéds ou 60 Verges
Rhynlandiques (Dogen, 1648. p. 51-56).
FORMATO
Não há formato específico para os tipos de fortificações apresentados por Dogen. O Tratado
mostra todas as fortificações utilizando como base os polígonos, desde o formato quadrado até
vinte lados, ou mais. Foram apresentadas várias tabelas com as dimensões e proporções das
fortificações da primeira maneira utilizando os polígonos de quatro a doze lados. Pode-se
verificar, no entanto, a partir da tabela que até o polígono de doze lados, o ângulo do baluarte
permanecia menor ou igual a 90°. Para os polígonos a partir de treze lados, o ângulo do baluarte
passava a ter sempre 90°. Nas fortificações da segunda e terceira maneira, as tabelas
apresentavam o cálculo de fortificações a partir de polígonos desde quatro até mais de vinte
lados, no entanto, a partir do octógono, as fortificações apresentavam o ângulo do baluarte com
90° para todos os formatos (Dogen, 1648. p. 56 e 62). A preocupação de Dogen estava em
fornecer o maior número de opções possíveis, mas garantindo que o ângulo do baluarte tivesse
as medidas adequadas, que conforme a décima primeira máxima era de no mínimo 60°, pois
não poderiam suportar o esforço do canhão inimigo, e no máximo 90°, pois criaria um obstáculo
ao segundo flanco, que era peça fortemente utilizada na defesa.
137
INCLINAÇÃO DA MURALHA
Quanto à inclinação da muralha, o Tratado apresentou uma máxima que chama a atenção para
a necessidade de se buscar uma proporção mediana para a altura e largura da muralha, pois uma
altura excessiva seria prejudicial. A orientação era que a altura da muralha tivesse o dobro da
largura da escarpa exterior do Reparo. Considerava-se, ainda, que a altura deveria estar
relacionada à natureza do terreno, ao polígono utilizado e ainda ao sítio onde a fortificação
estaria assentada. Em função da proporção pré-estabelecida entre altura e largura da escarpa
exterior, a inclinação seria sempre a mesma, medindo 63,43° (Dogen, 1648. p. 86 e 94-95).
Essa inclinação é a mesma sugerida por Scamozzi, da escola italiana, e por Goldman, da escola
holandesa.
Figura 33.
Representação do perfil de uma fortificação com indicação das alturas EF da muralha exterior.
As medidas são em Verges Rhynlandiques que equivale a 10 pièds de Rhein, que equivale a 0,31385 metros, ou
seja, uma verge Rhynlandique equivale a 3,1385 metros. Baseado em Figura LVIII, Dogen, 1648. p. 82 e 83.
B. MODELOS DE FORTIFICAÇÃO SELECIONADOS
A partir dos dados apresentados acima, foi identificado um modelo de fortificação que pode ter
sido utilizado nas fortificações construídas em Pernambuco. Foi considerado, no entanto,
apenas o formato do polígono quadrangular, que é aquele que deu origem às fortificações
portuguesas existentes na Capitania. O tipo de fortificação abaluartada pode ter sido a Fortaleza.
A configuração geométrica do modelo abaluartado pode ser objeto de comparação com a
configuração geométrica das fortificações construídas em Pernambuco. Trata-se de uma
138
fortificação que apresenta a seguinte configuração geométrica: Fortificação Moderna,
abaluartada, composta por reparo, com baluarte e cortina; com formato de polígono de quatro
lados, do tipo Fortaleza com dimensão de ¼ e ½ da dimensão do Forte Real, respectivamente,
e com inclinação de 63,43°.
Figura 34.
Configuração geométrica do modelo de fortificação do tratado de Dogen, do tipo Fortaleza que
pode ser objeto de comparação com as fortificações construídas em Pernambuco. Modificado de Dogen, 1648.
C. ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
Apesar das fortificações apresentadas estarem estruturadas a partir da capacidade de defesa do
mosquete, por sua facilidade e comodidade, o Tratado defendia ainda a necessidade de se
considerar a força dos canhões inimigos sobre os muros. Por isso, a maneira de garantir a
integridade de uma vila era fortificá-la e armá-la de bons muros. Segundo o autor, era preciso
saber escolher o mais adequado e conveniente material para a construção das muralhas, para
que fossem capazes de suportar o impacto das baterias inimigas. Entre madeira, pedra, cerâmica
e terra, o autor escolheu a terra.
139
Segundo Dogen, a terra era a melhor escolha para o uso em períodos de guerra, pois: (i) tinha
em todos os lugares; (ii) com as ferramentas mais simples era possível trabalhá-la; (iii) estava
sempre pronta para ser manuseada; e, (iv) tinha custo baixo. A terra também era adequada para
o uso na guerra, pois não pegava fogo e porque “engolia” e segurava os projetis dos canhões.
Além do que, quando uma muralha em terra era destruída, seria possível facilmente reconstruíla (Dogen, 1648. p. 85-86). O autor complementou que as muralhas em pedra eram muitas
custosas e se destruíam, além de ferir os próprios soldados que a estavam protegendo.
140
LEVANTAMENTO
DE
DADOS
FÍSICOS
DAS
FORTIFICAÇÕES
PORTUGUESAS DE PERNAMBUCO DOS SÉCULOS XVI E XVII
Neste capítulo pretende-se apresentar as fortificações portuguesas que apresentaram
remanescentes de estruturas construtivas acessíveis ou projetos de arquitetura quantificáveis
construídas em Pernambuco, nos séculos XVI e XVII, através das suas características físicas,
detalhando a configuração geométrica e o material construtivo utilizado na sua construção. A
partir da contextualização das fortificações realizada no capítulo 2, foram identificadas dez
fortificações, nos três Sistemas Defensivos, são elas:
Forte de São Jorge, construído a partir de 1590;
Forte de São Francisco da Barra, construído de 1606 a 1612;
Forte de São Francisco de Olinda, construído de 1620 a 1622;
Forte Real do Bom Jesus, construído em 1630;
Forte Nossa Senhora de Nazaré, construído em 1630;
Forte de São Francisco Xavier de Gaibu, construído em 1634;
Forte de Santa Cruz de Itamaracá, construído a partir de 1654;
Forte do Brum, construído a partir de 1654;
Forte de São Tiago das Cinco Pontas, construído a partir de 1654; e,
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, construído a partir de 1654.
Por um lado, foram levantados dados históricos sobre a construção buscando verificar o grau
de originalidade das estruturas remanescentes, para excluir as reformas recentes, a fim de
qualificar o levantamento físico; por outro lado, foram levantados dados arqueométricos
rigorosos, para que também se obtivesse dados, de base métrica e físico-química, qualificados.
Finalmente, ainda foram levantados dados geológicos da costa pernambucana para permitir
identificar as possíveis fontes de matéria-prima e a partir das distâncias entre a fonte e a
fortificação discutir questões relativas aos custos de construção. Os dados levantados nesse
capítulo serão aqui, apenas, apresentados; esses dados servirão de base para a análise
comparativa a ser realizada no próximo capítulo.
141
As fortificações foram agrupadas por Sistema Defensivo, mas a exposição dos dados levantados
considerou cada fortificação individualmente. A partir do agrupamento foi possível, também,
reunir o contexto histórico de Pernambuco, considerando dados econômicos, políticos e
culturais disponíveis na literatura, para cada um dos períodos: até 1630, quando os holandeses
invadiram Pernambuco; de 1630 até 1654, quando os holandeses se retiraram de Pernambuco;
e após 1654 até a assinatura do Tratado de Haia, quando foram resolvidas as disputas territoriais
e financeiras entre Portugal e a República Unida dos Países Baixos e cessaram as ameaças de
nova invasão. Através do contexto histórico de Pernambuco, pretende-se identificar fatos que
justifiquem as decisões portuguesas, no que concerne a construção de suas fortificações e,
consequente, instalação dos seus Sistemas Defensivos.
A partir dos dados levantados, pretende-se compará-los àqueles extraídos dos Tratados de
Fortificação do século XVII para poder constatar se na construção das fortificações de
Pernambuco foram seguidos modelos europeus. No caso de serem verificados modelos
normatizados, os dados devem permitir identificar o grau de eficácia bélica das fortificações de
Pernambuco, a partir do grau de obediência ao modelo (do ponto de vista conceitual, o modelo
está sendo considerado de máximo grau de eficácia bélica); e finalmente, verificar de qual
tratado o modelo foi retirado, para identificar se a afiliação dos modelos escolhidos em
Pernambuco apresenta recorrências.
É preciso relembrar que para a realização de uma comparação confiável, que permita alcançar
às constatações esperadas, o levantamento dos dados físicos das fortificações precisou contar
com recursos tecnológicos que garantissem uma elevada precisão, e com procedimentos de
levantamento rigorosos. Esta decisão considerou que os dados obtidos nos Tratados, sobre a
configuração geométrica dos modelos, apresentam uma precisão de máxima qualidade.
5.1
CONTEXTO
GEOLÓGICO DE
PERNAMBUCO
PARA IDENTIFICAÇÃO DE FONTES DE
MATÉRIA-PRIMA UTILIZADA NAS FORTIFICAÇÕES
A caracterização do contexto geológico do litoral pernambucano, com a identificação dos tipos
de rochas e sua localização, contribuiu para a compreensão do grau de investimento realizado
pelo colonizador português na construção de suas fortificações. A partir da localização de fontes
de matéria-prima adequadas à construção de uma fortificação, foi possível quantificar a
distância entre as fortificações e estas possíveis fontes. Neste trabalho, partiu-se do pressuposto
142
de que o grau de investimento foi diretamente proporcional à distância até as fontes de matériaprima, ou seja, quanto mais longe estava a rocha escolhida para a construção da fortificação,
maior foi o investimento do colonizador, no que diz respeito aos gastos financeiros para o
transporte das rochas e ao tempo dispendido no transporte, aumentando o prazo de construção
da fortificação.
Para a identificação das possíveis fontes de rochas, ainda foi necessário identificar as rochas
consideradas mais adequadas à construção de uma fortificação. A partir dos tratados publicados
nos séculos XVI e XVII, percebe-se que havia um consenso entre os autores sobre as
características físicas que uma rocha deveria ter para ser adequada à construção de uma
fortificação. As rochas deveriam ser macias, pouco resistentes e de fácil trabalhabilidade
(Cataneo, 1527: p.14; Scamozzi, 1615. p. 210; e Goldman, 1645. p. IV). Com essas
características, segundo os tratadistas, as rochas seriam capazes de proteger a muralha do
impacto das balas dos canhões. Argumentava-se, inclusive, que rochas duras, como o mármore,
geravam altas despesas durante sua extração e eram danificadas pela ação da artilharia, não
sendo aconselhadas (Goldman, 1645. p. IV). As características estabelecidas como adequadas
para a escolha de rochas coaduna com as características das rochas calcárias e arenitos,
consideradas brandas e propícias a serem trabalhadas (Pôrto, 2009: 96p).
As fortificações de Pernambuco estão localizadas sobre os sedimentos do Grupo Barreiras e
sobre a Faixa Sedimentar Costeira Pernambuco-Paraíba, localizada na região litorânea, que se
subdivide em Bacia sedimentar Recife/João Pessoa (porção norte do litoral); e Bacia vulcanosedimentar do Cabo (porção sul do litoral) (Dantas & Lima Filho, 2006). Ao longo de toda a
costa, ainda são encontrados arenitos de praia, também chamados Beachrocks, resultado de
sedimentação holocênica (Ferreira Júnior et all, 2011: p. 546).
143
Figura 35.
Compartimentação estratigráfica de Pernambuco identificando, em vermelho, a área onde estão
localizadas as fortificações portuguesas construídas nos séculos XVI e XVII. Fonte: modificado de Gomes et al.
(2001) em Dantas & Lima Filho, 2006.
5.1.1 BACIA SEDIMENTAR RECIFE-JOÃO PESSOA
A Bacia Sedimentar Recife-João Pessoa ocupa a porção norte da costa pernambucana com
extensão de 25 km no sentido Norte-Sul e 400 m de espessura, no sentido Leste-Oeste. É
composta por sedimentos continentais (Formação Beberibe) e marinhos (Formação Gramame
e Formação Marinha Farinha) que estão assentados sobre o embasamento cristalino précambriano. Algumas das fortificações portuguesas estão situadas sobre a Bacia Sedimentar
Recife-João Pessoa, são elas: Forte de Santa Cruz de Itamaracá, Forte de São Francisco de
Olinda e Forte Real do Bom Jesus.
A partir do Forte de Santa Cruz de Itamaracá, num raio de 2,5 até 5 km, existem fontes
abundantes de fosforitos, calcarenitos e calcários de origem marinha da Formação
Gramame; e num raio de cerca 7 km, na outra margem do Canal de Santa Cruz, podem
ser encontrados arenitos finos e ainda arenitos carbonáticos médios a grosseiros, da
Formação Beberibe. Ainda podem ser encontrados arenitos de praia (beachrock) ao
longo da linha de costa;
144
Figura 36.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para construção, através de
raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como pontos centrais o Forte de Santa Cruz de Itamaracá, Forte de São
Francisco de Olinda e Forte Real do Bom Jesus.
A partir do Forte de São Francisco de Olinda, num raio maior que 5 km, podem ser
encontrados calcários dentríticos, da Formação Maria Farinha; num raio maior que 8
km, há ocorrências pontuais de arenitos da Formação Beberibe; e, num raio a partir de
11 km, calcários da formação Gramame. Ainda podem ser encontrados arenitos de praia
(beachrock) ao longo da linha de costa; e,
A partir do Forte Real do Bom Jesus, a oferta de rochas macias para a construção de
fortificações só ocorre a partir de 7,5 km, numa ocorrência pontual, a norte, de arenitos
da Formação Beberibe. Ao redor da fortificação, num raio de até 10 km predominam os
sedimentos areno-argilosos do Grupo Barreiras. E a partir de 10 km, no sentido nordeste,
podem ser encontrados calcários, da Formação Maria Farinha.
145
5.1.2 BACIA VULCANO-SEDIMENTAR DO CABO
Por sua vez, a Bacia Vulcano-Sedimentar do Cabo ocupa a porção sul da costa pernambucana
com extensão de 85km no sentido Norte-Sul. É composta por conglomerados, arcósios, arenitos
grosseiros e siltitos (Formação Cabo); manifestações vulcânicas, subvulcânicas e plutônicas
(Formação Ipojuca); calcários (Formação Estiva); e por conglomerados e arcósios (Formação
Algodoais) (Lafayette, 2006). Algumas das fortificações portuguesas estão situadas sobre a
Bacia Vulcano-Sedimentar do Cabo, são elas: Forte do Brum, Forte de São Jorge, Forte São
Francisco da Barra, Forte São Tiago das Cinco Pontas, Forte de São Francisco Xavier de Gaibu,
Forte de Nossa Senhora de Nazaré e Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré.
A partir do Forte do Brum, Forte de São Jorge, Forte São Francisco da Barra e Forte
São Tiago das Cinco Pontas, o contexto geológico para as três fortificações é o mesmo.
Não há oferta de rochas até um raio de 10 km a partir dessas fortificações. Exceto os
arenitos de praia (beachrock) que podem ser encontrados ao longo da linha de costa.
Encontram-se disponível, apenas, sedimento areno-argiloso do Grupo Barreiras;
A partir do Forte de São Francisco Xavier de Gaibu e Forte de Nossa Senhora de Nazaré
o contexto geológico para as duas fortificações é o mesmo50. Na porção noroeste, de 2
a 8 km de distância, encontra-se uma grande ocorrência de arenitos com presença de
fragmentos de rochas vulcânicas, típico da Formação Algodoais. Observam-se, ainda, a
partir de 5 km de distância das fortificações, a noroeste, arenitos da Formação Cabo, em
ocorrências esparsas; e, em quantidade significativa, a oeste. Ainda podem ser
encontrados arenitos de praia (beachrock) ao longo da linha de costa.
50
Ambos as fortificações, Forte de São Francisco Xavier de Gaibú e Forte de Nossa Senhora de Nazaré, estão
assentadas sobre uma ocorrência de cerca 1 km de diâmetro de rochas da Formação Ipojuca, de origem vulcosedimentar, dentre elas granitos, riolitos, basaltos e traquitos, rochas consideradas duras e de difícil
trabalhabilidade (Pôrto, 2009: 96p). Até 10 km de distância das fortificações ainda são vistas duas ocorrências de
rochas da mesma Formação Ipojuca (Lafayette, 2006).
146
Figura 37.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para construção, através de
raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como pontos centrais o Forte do Brum, Forte São Francisco da Barra e
Forte São Tiago das Cinco Pontas.
A partir do Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, a oferta de rochas da Bacia
Vulcano-Sedimentar para construção não é abundante nem variada 51. Entre 2 e 3 km,
no sentido noroeste, e entre 5 e 7,5 km para norte, observam-se duas ocorrências de
arenito. Ainda podem ser encontrados arenitos de praia (beachrock) ao longo da linha
de costa.
51
A partir de 5 km do Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, de noroeste até o Sudoeste, encontra-se o
embasamento cristalino, do pré-cambriano, que conta com granitos, gnaisses e migmatitos, rochas consideradas
inadequadas para a construção de fortificações (Lafayette, 2006; Pôrto, 2009: 96p).
147
Figura 38.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para construção, através de
raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como pontos centrais o Forte de São Francisco Xavier de Gaibú e Forte
de Nossa Senhora de Nazaré.
Figura 39.
Delimitação das possíveis fontes de rocha, enquanto matéria-prima para construção, através de
raios concêntricos de 5 e 10 km, que tem como ponto central o Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré.
Em posse do mapeamento das fontes de rochas calcárias e areníticas da costa pernambucana,
pretende-se, ainda neste capítulo, partir para o cruzamento do mapa de fontes com o tipo de
148
rocha utilizada na construção de cada fortificação, a fim de identificar as possíveis fontes de
matéria-prima. O tipo de rocha de cada fortificação está indicado nos dossiês de cada
fortificação, que serão apresentados a seguir.
A identificação do grau de investimento realizado pelo colonizador português na construção de
suas fortificações foi considerada não apenas para cada fortificação, individualmente. As
fortificações que compõe cada um dos três Sistemas Defensivos portugueses serão analisadas,
conjuntamente, para permitir verificar se houve um mesmo padrão de escolha. Como essas
fortificações foram reunidas arbitrariamente, em função da presença holandesa que significou
um enclave da história de Pernambuco, com a constatação de padrões de escolhas em cada
Sistema Defensivo, estar-se-á revalidando a divisão temporal, anteriormente feita.
5.2
FORTIFICAÇÕES DE PERNAMBUCO DOS SÉCULOS XVI E XVII
5.2.1 FORTIFICAÇÕES DO PRIMEIRO SISTEMA DEFENSIVO
Considerando os dados acima apresentados, segue-se com a descrição do levantamento de
dados das fortificações do primeiro Sistema Defensivo português em Pernambuco que serão
analisados no capítulo seguinte, em comparação com os dados retirados dos Tratados de
Fortificação do capítulo anterior. As fortificações descritas, neste trecho, são:
Forte de São Jorge, construído a partir de 1590;
Forte de São Francisco da Barra, construído de 1606 a 1608;
Forte de São Francisco de Olinda, construído de 1620 a 1622;
A. FORTE DE SÃO JORGE. 1590
O Forte de São Jorge, localizado no bairro do Recife, região central da cidade, foi construído
pelos colonizadores portugueses a partir de 1590. O Forte foi posicionado na entrada do porto
do Recife, num istmo banhado a leste pelas águas do mar e a oeste, pelo rio Beberibe. Na
atualidade não há vestígios do Forte, acredita-se que suas ruínas estejam localizadas no entorno
ou sob a Igreja de Nossa Senhora do Pilar.
149
Foto 7. Possível localização do Forte de São Jorge, na área central do Recife (modificado do Google earth, em
26.01.2017).
DADOS HISTÓRICOS
O Forte de São Jorge foi edificado, em alvenaria de pedra, a partir do final do século XVI e
finalizado em 1603. A primeira referência a um forte construído sobre a terra é em 1595. Esse
pode ter sido o Forte de São Jorge, inclusive porque, segundo Barreto, o Forte foi construído
em 1590 (Barreto, 2011: p. 88). A partir da iconografia disponível, sugere-se tratar de uma
fortificação de formato quadrado, formada por muralha com quatro torreões nos cantos.
Segundo Menezes, em 1612, estava em ruína. Em 1620, foi restaurado. Em 1630, na invasão
holandesa, teve as muralhas arrasadas. Em 1638, como estava muito arruinado, foi cedido por
Maurício de Nassau para ser utilizado como hospital. Em 1667, depois de ter sido abandonado,
teve parte do seu material construtivo utilizado para restauração do Forte do Brum. Em 1680,
no seu local foi construída a Igreja de Nossa Senhora do Pilar, que também utilizou os materiais
construtivos do velho Forte (Menezes. 1986: p.98).
150
Figura 40.
Duas diferentes representações do Forte de São Jorge, construído no Istmo de Recife e Olinda,
em 1590. Vista do Recife de Peeter Gillis, 1637, onde está identificado o Forte de São Jorge. 2. Recorte de estampa
e folheto holandês de 1630: “de Stadt Olinda de Pharnambuco...”.
Estudos realizados por Menezes apontam para a localização de suas estruturas no entorno ou
sob a Igreja de Nossa Senhora do Pilar, no Bairro do Recife. Escavações arqueológicas
realizadas pela Fundação Seridó no entorno da Igreja, de 2010 a 2014, podem ter revelado
elementos de sua estrutura de fundação. No entanto, é preciso que se realizem trabalhos
arqueológicos mais sistemáticos para poder afirmar se se trata, realmente, do primitivo Forte
de São Jorge.
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte de São Jorge, pelo que se pode observar na iconografia, é uma fortificação maciça com
formato de polígono de quatro lados, retângulo ou mesmo um quadrado. Como suas ruinas não
foram até o momento encontradas, não há dados físicos suficientes para uma descrição
aprofundada. No que concerne uma análise tipológica, no entanto, as referências iconográficas
disponíveis são suficientes. É preciso, no entanto, reconhecer os riscos de se admitir como fato
as formas apresentadas nas representações iconográficas, mas também estão sendo
consideradas referências históricas que admitem que o Forte de São Jorge tinha o formato
representado pelas estampas e demais representações. Essa confirmação, no entanto, só poderá
ser feita em pesquisas arqueológicas futuras.
Os principais itens que compõe a fortificação são muralhas relativamente altas, com tambores
nos ângulos, troneiras e canhoneiras abertas nas muralhas (tanto no terraço, como em níveis
151
mais baixo, para possibilitar o tiro rasante). A partir da iconografia não há como precisar suas
dimensões. Pode-se, no entanto, verificar que sua muralha conta com um reforço na base.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte de São Jorge, segundo os dados históricos, foi construído em alvenaria de pedra. Há
referência ainda de que seus materiais construtivos foram reutilizados para a construção do
Forte do Brum. Informações mais precisas sobre os materiais construtivos utilizados na sua
construção serão obtidas através de uma pesquisa arqueológica detalhada.
B. FORTE DE SÃO FRANCISCO DA BARRA. 1606
O Forte de São Francisco da Barra, localizado sobre os arrecifes na entrada da barra, na área
central do Recife, foi construído pelos colonizadores portugueses de 1606 a 1612. Como a
estrutura da muralha está em ruínas, é possível visualizar, do lado oeste, trechos da fundação e,
do lado leste, remanescentes da muralha, que estão sob a influência do mar.
Foto 8. Ruinas do Forte de São Francisco da Barra, porção leste.
152
Foto 9. Localização do Forte de São Francisco da Barra, na área central do Recife (modificado do Google earth,
em 19.09.2014).
Está localizado em ambiente marinho e sofre influência das águas do mar. As ondas batem com
muita força sobre a muralha e acabam projetando as águas para o lado oeste dos arrecifes. A
influência negativa do mar sobre as estruturas do Forte ocorre durante todo o dia, mesmo em
período de maré baixa.
DADOS HISTÓRICOS
Em 1591, o Forte de São Francisco da Barra teve construção autorizada pelo governador da
Capitania, D. Francisco de Sousa, mas só recebeu aprovação Real para sua construção em maio
de 1606. O desenho do forte foi enviado de Recife e recomendado a Tiburcio Spanochi,
Engenheiro-mor dos Reinos de Espanha. Em 1608, Francisco Frias de Mesquita, estava
trabalhando na fortificação que só foi concluída em 1612. As referências arquitetônicas e
espaciais informam que a fortificação, com formato de noneágono, foi construída em alvenaria
de pedra. O seu armamento constava de sete peças de artilharia (Lago, 1973: p.589).
Em 1620 estava em ruínas em função, inclusive, da ação do mar, e foi reformado. Em 1630, foi
conquistado pelos holandeses e foi recuperado em 1638. Com a capitulação holandesa, em
1654, os colonos portugueses reassumiram a fortificação. Em 1808, o governador da Capitania
mandou reformar o Forte, com projeto do engenheiro Antônio Bernardino Pereira do Lago. Em
1905, serviu de posto fiscal aduaneiro para o Ministério da Fazenda. Em 1906, estava em ruínas
e durante as obras de reforma do Porto do Recife suas ruínas foram encobertas (Menezes. 1986.
p. 98).
153
Foto 10. Forte São Francisco da Barra na fotografia de Marc Ferrez de 1875. Fonte: MENEZES. 1986. p. 114.
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte de São Francisco da Barra é uma fortificação maciça com formato de polígono de nove
lados, noneágono. Por sua configuração foi considerado pelo engenheiro Antônio Bernardino
Pereira do Lago, responsável por sua reforma em 1808, uma Torre. Os principais itens que
compõem a fortificação são cortina, parapeito e terrapleno onde se posicionavam as peças de
artilharia. O projeto inicial, de 1606, foi elaborado pelo engenheiro Francisco Frias de
Mesquita, autor, inclusive, do projeto de fortificação abaluartada da Fortaleza dos três Reis
Magos em 1598. Esse projeto utilizou o formato de polígono regular de nove lados. No século
XX, no entanto, não apresentava mais a configuração de fortificação, afigurava-se uma
edificação civil, provavelmente, relacionada à função de posto fiscal.
Grosso modo, a fortificação está circunscrita numa circunferência com 20,90 metros de
diâmetro e o trecho de muralha remanescente mede cerca de 4 metros de altura (do arrecife
natural até o nível atual do solo). Sua muralha é inclinada, com caimento de cerca 70,71°. Suas
dimensões e proporções estão apresentadas na figura e tabelas abaixo.
154
Figura 41.
suas medidas.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Francisco da Barra, com indicação das linhas e ângulos e
Medidas lineares
(metro)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Média
Raio interior
10,47 10,77 10,46 10,46 10,64 10,21 10,27 10,32 10,41
10,45
Lado da figura
7,43
7,15
Tabela 2.
7,01
7,31
7,15
7,32
6,68
7,04
7,57
6,85
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Francisco da Barra.
Medidas
angulares
(grau decimal)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Média
Ângulo do centro
38,3°
40,9°
38,5°
40,8°
39,5°
41,0°
38,0°
39,9°
42,8°
40,0°
Ângulo da figura 142,0° 135,7° 143,1° 140,4° 135,6° 144,0° 140,9° 138,8° 139,7° 140,0°
Tabela 3.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Francisco da Barra.
Atualmente, em função da sua condição de ruína, foi possível observar sua estrutura construtiva.
O limite externo é formado por um anel, com largura variando de 3,00 a 3,50 metros, de rochas
retangulares talhadas de diferentes dimensões. Internamente, a partir de cada vértice em direção
ao centro da figura, como raios, partem estruturas com cerca 1,00 metro de largura, em rocha
talhada de diferentes dimensões. Essa configuração estrutural é semelhante àquela utilizada
pelo engenheiro Frei Vicenzo Casale no Forte de São Lourenço da Cabeça Seca, em Oeiras/
Portugal, em 1589.
155
Foto 11. Remanescentes do Forte de São Francisco da Barra. Observa-se parte da configuração geométrica em
formato de um polígono regular de nove lados e a forma de sua estrutura construtiva, em raios partindo dos vértices
em direção ao centro.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte de São Francisco da Barra está construído em alvenaria de pedra com argamassa de
barro e cal, interna e externamente, e conta com trechos revestidos em tijolo cerâmico maciço.
A alvenaria interna tem função de preenchimento. É composta por rochas não talhadas, sem
tratamento de superfície, com formato e tamanhos variados. A alvenaria externa tem função
estrutural, tanto conforma um anel que delimita a fortificação, como raios que partem dos
vértices em direção ao centro, descarregando num ponto central os esforços recebidos no anel
externo. É composta por rochas talhadas, com tratamento de superfície, e com formato e
tamanhos variados. O revestimento em tijolo não é uniforme, recobre apenas parte da superfície
da muralha.
156
Foto 12. Perfil leste do Forte de São Francisco da Barra onde se evidenciam os materiais construtivos utilizados.
As rochas utilizadas na sua construção, na alvenaria externa e na alvenaria de preenchimento,
apresentam variação de granulometria, mas composição semelhante, sugerindo tratar-se do
mesmo tipo. O exame macroscópico das rochas revelou que aquela do anel externo é composta
por rocha moderadamente selecionada, com grãos tamanho areia média, sub-arredondados, de
baixa esfericidade, na cor creme acinzentado e que podem ser percebidos sem auxilio de lupa.
A rocha da alvenaria estrutural interna é composta por rocha bem selecionada, com grãos
tamanho areia fina, sub-arredondados, de alta esfericidade, na cor branco acinzentado que
podem ser percebidos sem auxílio de lupa. As duas rochas também reagiram ao Ácido clorídrico
(HCl concentração de 10%) liberando CO2, abundantemente por um longo tempo.
Foto 13. Tipos de rocha do Forte de São Francisco da Barra. Rocha tipo 1. Rocha da alvenaria estrutural, do anel
exterior que delimita a fortificação. e Rocha tipo 2. Rocha da alvenaria estrutural, especificamente, dos raios que
partem dos vértices em direção ao centro. Imagem extraída a partir do Microscópio Digital portátil Dino-Lite
PLUS, com aumento de 55x.
157
A análise de Fluorescência de Raio-X (FRX) permitiu identificar qualitativa e
quantitativamente os elementos químicos que compõe as rochas. Os resultados evidenciaram
que as rochas apresentam elevadas quantidades de Cálcio e Silício com traços de Alumínio e
vestígios de outros elementos, como o ferro.
Gráfico 1.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha utilizados no Forte
de São Francisco da Barra. A Rocha pertencem a alvenaria estrutural do anel exterior que delimite a fortificação e
as estruturas forma de raios que partem dos vértices em direção ao centro.
Considerando a elevada quantidade de Silício presente nas rochas, podemos sugerir que a rocha
utilizada na construção do Forte de São Francisco da Barra não foi o Calcário, pois este mineral
é considerado uma impureza da rocha calcária. Esse tipo de rocha, inclusive, não é adequado
para as construções que ficam sujeitas à ação da água do mar, pois são atacados pela água do
mar e no caso do Forte São Francisco da Barra, esta fortificação está constantemente sujeita a
ação do mar. Infere-se, portanto, que a rocha utilizada foi o arenito quartzoso.
A partir do mapeamento das fontes de rocha realizado verifica-se que a fontes de arenito mais
próximas do Forte de São Francisco da Barra estão a mais de 15 km para Norte da Capitania de
Pernambuco: é uma fonte de arenitos da Formação Beberibe. O Arenito é uma rocha sedimentar
composta pelos minerais Quartzo (SiO2), Mica, Feldspato, além de minerais salinos (como
Halita, Anidrita, Gipso), minerais carbonatados (como calcita (CaCO3) e Aragonita), pela
Dolomita (CaMg(CO3)2), Celestita (SrSO3), além da Estroncianita (SrCO3) e minerais
argilosos. Os Arenitos podem ser quatzosos quando têm mais de 95% de Quartzo; Arcósicos
quando têm mais de 25% de Feldspato; e, líticos quando têm mais de 25% de fragmento de
rocha. Schumann, 1972: p. 34.
158
Há também uma fonte de arenito de praia (beachrocks) que está localizada sob a fortificação.
O estudo petrográfico e geoquímico dos arenitos de praia (beachrocks) da região central da
costa de Pernambuco, que abrangeu os municípios de Paulista, Olinda, Recife e Jaboatão,
revelou que se trata de Arenito médio a muito grosso e Arenito conglomerático, composto por
grãos de Quartzo arredondados, moderadamente selecionados e cimento carbonático composto
de Calcita rica em Magnésio (Mg) (Ferreira Júnior, 2011: p.557-558). Sua composição é de
Quartzo (média 71,6%), Feldspatos – Plagioclásios (média 5%), metais pesados (máximo 4%)
e Bioclastos (média 5%). (Ferreira Júnior, 2011: p.550-558).
C. FORTE DE SÃO FRANCISCO DE OLINDA. 1620
O Forte de São Francisco de Olinda, localizado na Praia de São Francisco, em Olinda, distante
cerca de 8 km do Recife, foi construído pelos colonizadores portugueses entre 1620 e 1622. A
estrutura da muralha está revestida não sendo possível visualizar o sistema construtivo
utilizado. Apresenta bom estado de conservação apesar de haver rachaduras em três diferentes
cortinas. O Forte de São Francisco de Olinda está numa área urbana, antropizada, e não recebe
influência das águas do mar.
Foto 14. Forte de São Francisco de Olinda, construído pelos portugueses em 1620.
159
Foto 15. Localização do Forte de São Francisco de Olinda, Olinda, no Estado de Pernambuco (modificado do
Google earth, em 19.09.2014).
DADOS HISTÓRICOS
Em 1620, Matias de Albuquerque, então governador da Capitania mandou que se construísse o
Forte de São Francisco de Olinda, na porção norte da praia de Olinda e a Guarita de João
Albuquerque na porção sul da mesma praia. A obra foi executada pelo mestre-pedreiro
Cristóvão Alvares52. O seu armamento constava de 4 peças de artilharia. Há referências de que
era feito em alvenaria de pedra (Menezes. 1986: p.100) e estava ligado por uma paliçada à
Guarita de João Albuquerque. Outras fontes também dizem ter sido edificado em faxina e terra
(Barretto, 1858). Foi concluído em setembro de 1622 e em 1630 foi conquistado pelos
holandeses. Não de sabe ao certo a data em que os portugueses o reconquistaram, mas, há
notícias de que foi reconstruído em alvenaria, ainda no século XVII, porém, em 1880, estava
novamente em ruínas.
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte de São Francisco de Olinda é uma fortificação maciça, de pequeno tamanho, isolada,
com formato de polígono quadrangular irregular, sem baluartes. O Forte é composto por quatro
cortinas, parapeito e terrapleno. Sua muralha é inclinada, apresentando caimento médio de
82,19°. Ao longo de toda a muralha, há um cordão em pedra que sinaliza o fim da muralha e
início do parapeito. Grosso modo, a fortificação mede 23 metros de comprimento, 14 metros
52
Cristovão Alvares, português alentejano, construtor experimentado com habilitação para projetar edificações,
inclusive militares. Mello, 1961. p. 10.
160
de largura e 2,70 metros de altura (do solo atual até o cordão em pedra). Suas dimensões e
proporções estão apresentadas nas tabelas e figura abaixo:
Figura 42.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Francisco de Olinda, com indicação das linhas e ângulos
e suas medidas.
Medidas lineares
(metro)
1
2
3
4
Média
Raio interior
13,37 13,68 11,45 13,73
13,06
Lado da figura
22,09 20,61 14,59 14,22
21,80
* O valor da média do lado da figura é referente às medidas 3 e 4. Por tratar-se de uma figura irregular, apenas os
lados da figura que estão paralelos podem ser comparados.
Tabela 4.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Francisco de Olinda.
Medidas angulares
(grau decimal)
Ângulo obtuso do centro
Tabela 5.
1
2
116,36° 109,87
3
4
Média
113,12
Ângulo agudo do centro
70,33
63,43
66,88
Ângulo agudo da figura
88,71
78,81
83,76
Ângulo obtuso da figura
100,9
91,58
96,24
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Francisco de Olinda.
161
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte de São Francisco de Olinda parece estar construído em alvenaria de pedra com
argamassa de cal. No entanto, como está rebocado, não foi possível verificar as características
físicas do seu sistema e materiais construtivos. Apesar das rachaduras não se pode afirmar qual
sistema construtivo utilizado.
Foto 16. Cortina leste do Forte de São Francisco de Olinda onde há uma rachadura com exposição de argamassa.
5.2.2 FORTIFICAÇÕES DO SEGUNDO SISTEMA DEFENSIVO
Considerando os dados acima apresentados, segue-se com a descrição do levantamento de
dados das fortificações do segundo Sistema Defensivo português em Pernambuco que também
serão analisados no capítulo seguinte, em comparação com os dados retirados dos Tratados de
Fortificação do capítulo anterior. As fortificações descritas, neste trecho, são:
Forte Real do Bom Jesus, construído em 1630;
Forte Nossa Senhora de Nazaré, construído em 1630;
Forte de São Francisco Xavier de Gaibu, construído em 1634.
D. FORTE REAL DO BOM JESUS. 1630
O Forte Real do Bom Jesus, localizado no atual bairro de Casa Amarela, na cidade do Recife,
foi construído pelos colonizadores portugueses a partir de 1630. Da antiga fortificação há
apenas vestígios arqueológicos. Durante pesquisas arqueológicas nas décadas de 1960 e 1980
162
foram identificados trechos do fosso, a base das muralhas e do terrapleno. Os remanescentes do
Forte estão inseridos em área urbana, totalmente antropizada.
Foto 17. Localização do Forte Real do Bom Jesus, no município de Recife, no Estado de Pernambuco (modificado
do Google earth, em 04.10.2014).
DADOS HISTÓRICOS
Em 1630, depois que todas as fortificações de Olinda e da povoação do Recife foram dominadas
pelos holandeses, Matias de Albuquerque construiu o Forte Real do Bom Jesus. O Forte
representou um campo fortificado de resistência à dominação holandesa e foi construído nas
proximidades da margem do rio Capibaribe, hoje bairro de Casa Amarela. Seu objetivo era
isolar os holandeses no litoral, atrapalhando seu acesso ao interior, onde estavam os produtos
para seu abastecimento e os engenhos que forneciam o açúcar para exportação. O Forte era
pobremente artilhado, mas resistiu a cinco anos de constantes ataques holandeses. Foi
construído em terra, com formato irregular, supostamente com planta de Cristóvão Álvares. Era
uma obra considerada rústica, mas de extraordinária solidez.
No final da década de 1960, o Laboratório de Arqueologia da Universidade Federal de
Pernambuco realizou algumas pesquisas arqueológicas no sítio do Forte. Foram identificados
trechos do fosso, a base das muralhas e do terrapleno (Menezes. 1986:. p. 109-110;
Albuquerque, 1988: p.33).
163
Figura 43.
Planta do Forte Real do Bom Jesus (1635). Arquivo Geral do Reino (Haia). Buitenlandse Kaarten
n. 2.160 do Inventário Leupe. Publicada por Gonçalves de Mello, 1961.
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte Real do Bom Jesus é uma fortificação com planta de formato de polígono irregular. Os
principais itens que compõe a fortificação são: reparo onde estão baluartes, poligonais de
formato irregular (alguns tem faces e flancos, outros, só apresentam faces) e a cortina. O reparo
conforma o terrapleno com parapeito ao redor e entre as obras externas estão fosso e barreiras
em formato de linhas. Suas dimensões e proporções foram retiradas de um desenho geométrico
presente na iconografia histórica, portanto, foram consideradas medidas relativas. Sua muralha
devia ser inclinada, mas não há como inferir o caimento através dos desenhos disponíveis.
Grosso modo, a fortificação mede 150 unidades de comprimento por 115 unidades de largura.
Não sabemos, no entanto, o valor dessa unidade. Suas dimensões e proporções estão
apresentadas nas tabelas e figura abaixo:
164
Figura 44.
Planta Baixa da Muralha do Fortim Arraial do Bom Jesus, com indicação das linhas e ângulos e
suas medidas relativas, retiradas a partir de um projeto presente na iconografia histórica.
Medidas lineares
(unidade)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
Média
Raio interior
59,17 59,17 59,17 59,17 59,17
59,17
Lado da figura
59,56 68,83 64,59 57,26 42,54 61,19
59,00
Garganta
18,41 16,09
26,48 13,63 15,7 11,13 15,03
18,43
Flanco
6,88
8,18
6,68
Face
21,29 20,98 14,58 25,91 27,09 27,65 29,99 37,5 33,44 25,81 19,4
25,79
Cabeça
18,26 15,95
15,53
Cortina
24,88 47,01 19,73 18,58
27,55
Segundo flanco
10,17
0,93
Lado exterior
79,88 85,45 75,69 58,85 66,68 79,36
74,32
Defesa flancante
43,9
42,61
Defesa fichante
53,29 55,93
Tabela 6.
5,68
9,07
5,87
5,67
5,41
14,9 15,44 13,1
0,11
55,82 16,72 52,02 46,31 40,91
54,61
Medidas lineares aferidas em campo. Fortim Arraial do Bom Jesus.
Medidas angulares
(grau decimal)
Tabela 7.
31
1
2
3
4
5
6
Média
Ângulo do centro
71,1°
60,4°
66,2°
57,8°
42,1°
62,3°
60,0°
Ângulo da figura
116,7°
114,2°
113,3°
127,8°
130°
117,9° 120,0°
Ângulo do baluarte
70,7°
69,1°
78,2°
84,9°
81,9°
52,6°
Ângulo flancante
25,0°
12,7°
13,9°
Ângulo cabeça/garganta
125,5°
133,4°
111,1°
125,6°
121,1°
Ângulo face/flanco
106,9°
115,1°
99,7°
119,4°
96,0°
95,1°
105,4°
Ângulo flanco/cortina
94,2°
77,9°
90,1°
82,1°
90°
97,8°
88,7°
72,9°
17,2°
Medidas angulares aferidas em campo. Fortim Arraial do Bom Jesus.
123,3°
165
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
Segundo os dados historiográficos e arqueológicos, o Forte Real do Bom Jesus foi construído
em terra, utilizando o sistema da taipa de pilão. O material retirado do fosso que circundava a
fortificação pode ter sido utilizado na construção da sua muralha (Albuquerque, 1999: p. 4448). Diferentemente do material encontrado na planície litorânea, material arenoso, onde estava
a povoação do Recife, o material disponível no local onde o Forte foi construído era sedimentar,
não consolidado, de textura argilosa, integrante da planície costeira (Albuquerque, 1988: p. 10).
Estudos arqueológicos realizados na década de 1980 revelaram que a única estrutura
arquitetônica conservada foi o fosso e que os principais materiais de construção empregados na
construção da fortificação foram a argila local, madeira, seixos rolados e ferro (na forma de
correntes e cravos) (Albuquerque, 1988: p. 22).
Foto 18. Remanescentes do fosso duplo do Forte Real do Bom Jesus depois da realização de escavações
arqueológicas, nas décadas de 60, 80 e anos 2000. Fonte: site 2.bp.blogspot.com.
E. FORTE DE NOSSA SENHORA DE NAZARÉ. 1631
O Forte Nossa Senhora de Nazaré foi construído pelos colonizadores portugueses em 1631.
Está localizado na Vila de Nazaré, município de Cabo de Santo Agostinho, litoral sul do Estado
de Pernambuco, distante cerca de 35km do Recife. O Forte foi construído na entrada da barra,
166
no sopé do morro, num afloramento rochoso. A estrutura do Forte encontra-se em ruínas, mas
houve intervenções contemporâneas que promoveram sua consolidação.
Foto 19. Forte Nossa Senhora de Nazaré, no Cabo de Santo Agostinho, litoral sul do Estado de Pernambuco.
Foto 20. Localização do Forte Nossa Senhora de Nazaré, localizado na Vila de Nazaré, município de Cabo de
Santo Agostinho no Estado de Pernambuco (modificado do Google earth, em 18.09.2014).
O Forte Nossa Senhora de Nazaré está situado no ponto baixo de uma enseada, numa área
desocupada. Mas como foi construído sobre um trecho do afloramento rochoso, um pouco mais
elevado que seu entorno, bem próximo ao mar. Apesar de não estar sujeito à ação das águas da
chuva que escorrem sobre o afloramento, sua muralha está sujeita a ação das ondas do mar,
principalmente as suas fachadas leste e sul.
167
DADOS HISTÓRICOS
Foi construído em 1631 sobre a base sólida do rochedo, pelo Conde de Bagnoulo53 com o
objetivo de defender a entrada da barra que dava acesso ao porto do Cabo de Santo Agostinho.
Edificado em alvenaria de pedra, seu formato foi chamado de cauda de andorinha. Contava com
sete peças de artilharia, além daquelas posicionadas nas baterias que lhe davam suporte, a partir
de 1632 quando foram construídas. Duas das baterias contavam com duas peças de ferro cada
(Coelho, 1981. p. 100). Em 1634, o Forte foi reparado, também pelo Conde Bagnuolo, e em
1635 foi conquistado pelos holandeses.
Em 1638, Maurício de Nassau avaliou que a fortificação era uma Bateria e que não poderia se
defender no caso de inimigos desembarcarem no outro lado da mesma ponta, pois o forte é
aberto por trás e, além disso, fica na parte baixa de dois montes. No “Relatório sobre o estado
das Capitanias conquistadas no Brasil", de 1640 de Adriaen van der Dussen, o Forte de Nazaré
foi apresentava contendo um hornaveque do lado do morro, em forma de tenalha e estava
circundado por uma paliçada. Não há registro conhecido da existência de vestígios desses
elementos.
Em 1645, a fortificação foi devolvida aos portugueses e em 1677, João Fernandes Vieira dá
noticias ao Rei de que tinha começado obras de arremate na Fortaleza de Nossa Senhora de
Nazaré (A.H.U., PE, Caixa 6, p. 232). Em 1763 estava com uma bateria caída. Em 1799,
documentos defendiam que não se justificavam outros reparos, pois o acesso pela barra já era
difícil para entrada dos inimigos. O forte foi alvo de pesquisa arqueológica pela Fundação do
Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco - Fundarpe e teve suas muralhas consolidadas
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN (Menezes. 1986. p. 107)
53
Giovanni di San Felice, conde Bagnuoli, era um militar italiano. Nasceu em Nápoles em 1575 e morreu em
Salvador em 1640. A serviço do rei da Espanha lutou contra os holandeses no nordeste brasileiro. Chegou ao Brasil
em 1625, participou da retomada da Bahia aos holandeses, em 1631, junto com Matias de Albuquerque resistia
aos holandeses em Pernambuco. Foi encarregado da defesa do Cabo de Santo Agostinho. Em 1640 voltou à Bahia,
onde morreu em 26 de Agosto do mesmo ano. Fonte:geocities.
168
Figura 45.
Forte de Nossa Senhora de Nazaré. Fonte: MENEZES. 1986. p. 106.
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte de Nossa Senhora de Nazaré é uma fortificação maciça, com formato de polígono
irregular, quadrangular. Segundo Goldman, é uma fortificação do tipo Estrela, quando as
cortinas são dobradas para dentro formando ângulos de 15° com o lado da figura. Na sua parte
posterior, há uma estrutura que não cumpre a função de defesa, por isso deve ter funções
complementares, provavelmente uma estrutura voltada a dar suporte indireto às atividades
militares. É composta por terrapleno e cortina, e sobre as cortinas leste, oeste e sul há um
parapeito em pedra com canhoneiras. Sua muralha é inclinada, apresentando caimento médio
de 78,51°. Grosso modo, a fortificação mede 23 metros de comprimento, 26 metros de largura
e de 3,15 a 7 metros de altura, do solo atual até a parte superior da cortina. Suas dimensões e
proporções estão apresentadas nas tabelas e figura abaixo:
169
Figura 46.
Planta Baixa da Muralha do Forte Nossa Senhora de Nazaré, com indicação das linhas e ângulos
e suas medidas.
Medidas lineares
(metro)
Tabela 8.
2
3
4
Média
Raio
15,67 16,44 15,65
16,43
16,05
Lado da figura
22,42 26,42 20,79
20,65
22,57
Garganta
5,62
3,98
4,80
Face
9,71 11,84
10,78
Medidas lineares aferidas em campo. Forte Nossa Senhora de Nazaré.
Medidas angulares
(grau decimal)
Tabela 9.
1
1
2
3
4
Média
Ângulo do centro
88,5°
110,7°
80,7°
80,1°
90,0°
Ângulo da figura
92,6°
82,7°
81,7°
102,9°
90,0°
Ângulo flancante
84,5°
77,6°
81,06°
Ângulo do flanco
15,0°
18,4°
16,72°
Medidas angulares aferidas em campo. Forte Nossa Senhora de Nazaré.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte de Nossa Senhora de Nazaré está construído em alvenaria de pedra com argamassa de
barro e cal. Verifica-se a presença de tijolos, em lugares isolados, possivelmente, fruto de
alguma reforma posterior. Junto às fundações e no vértice entre a cortina Oeste e Sul, a alvenaria
de pedra é composta por rochas talhadas de formato retangular, com tratamento de superfície.
170
Nos demais trechos da fortificação a alvenaria é composta por rochas talhadas e não talhadas,
sem tratamento de superfície, com formato irregular tendendo ao formato poligonal.
Foto 21. Cortina Oeste do Forte de Nossa Senhora de Nazaré onde se vêem os diferentes formatos e dimensões de
rocha das alvenarias de pedra que compõe a fortificação.
Foto 22. Cortina Leste do Forte de Nossa Senhora de Nazaré onde se vê a alvenarias de pedra cujas rochas
apresentam formato irregular e dois tipos de dimensões.
Durante o levantamento físico foram identificados dois tipos de rochas utilizadas nas alvenarias
da fortificação e além da rocha do afloramento rochoso sobre o qual a fortificação foi
construída. Das rochas utilizadas na alvenaria, o primeiro tipo revelou, no exame macroscópico,
ser composta por rocha muito bem selecionada, com grãos tamanho areia fina, sub-angulosos,
de alta esfericidade, na cor creme e que não podem ser percebidos sem auxílio de lupa.
171
Verificou-se ainda que a rocha contem 3% de impurezas. O segundo tipo de rocha é composto
por rocha muito mal selecionada, com grãos tamanho grânulo, e areias grossa, média e fina,
angulosos, de baixa esfericidade, na cor creme que podem ser percebidos sem auxílio de lupa.
Quanto à presença de Carbonato de cálcio, verificou-se que as rochas do tipo 1 reagiu ao Ácido
clorídrico (HCl concentração de 10%) liberando CO2, abundantemente por um curto espaço de
tempo. Porém, a rocha do tipo 2 não reagiu ao Ácido clorídrico.
Finalmente, no exame macroscópico realizado na rocha do afloramento rochoso, foi
identificada uma rocha pobremente selecionada, com grãos tamanho grânulo, e areias grossa e
média, angulosos, de baixa esfericidade, na cor creme que podem ser percebidos sem auxílio
de lupa. Quanto à presença de Carbonato de cálcio, verificou-se que a rocha reagiu ao Ácido
clorídrico (HCl concentração de 10%) liberando CO2, abundantemente num primeiro momento
e pouco num segundo momento.
Foto 23. Rocha do Forte de Nossa Senhora de Nazaré. 1. Rocha tipo 1; 2. Rocha tipo 2. Rocha do afloramento
rochoso. Imagem extraída a partir do Microscópio Digital portátil Dino-Lite PLUS, com aumento de 55x.
A análise de Fluorescência de Raio-X permitiu identificar qualitativa e quantitativamente os
elementos químicos que compõe as rochas identificadas no Forte de Nossa Senhora de Nazaré.
172
Os resultados evidenciaram que a rocha tipo 2 tem características semelhantes àquela do
afloramento rochoso. Ambas as rochas contêm elevadas quantidades de Silício e presença
significativa de Alumínio, Ferro e Potássio, além de vestígios de Cálcio.
Gráfico 2.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha utilizados no Forte
de Nossa Senhora de Nazaré. 1. Rocha tipo 1; 2. Rocha tipo 2. Rocha do afloramento rochoso.
Pelo contexto geológico típico da porção sul do litoral pernambucano, verifica-se que o Forte
de Nossa Senhora de Nazaré foi construído sobre um afloramento de rochas da Formação
Ipojuca, de origem vulco-sedimentar onde se encontram granitos, riolitos, basaltos e traquitos54.
A rocha do afloramento e a rocha tipo 2 podem ser da Formação Ipojuca. A rocha tipo 1, por
sua vez, diferentemente das anteriores, conta com elevadas quantidades de Silício e Cálcio, e
vestígios de Alumínio, Ferro e Potássio, sugerindo tratar-se de arenito. Existem fontes de
arenito que estão distante de dois a oito quilômetros a Noroeste da fortificação. É uma grande
ocorrência de arenitos da Formação Algodoais. Outra ocorrência de arenito são os arenitos da
54
A formação Pojuca é composta por rochas magmáticas extrusivas (vulcânicas) ou intrusivas (plutônicas), ou
seja, ou elas sofreram um resfriamento rápido próximo da superfície, resultando numa mineralização de textura
agranular como o Basalto ou o Riolito; ou elas sofrem um resfriamento lento, em profundidade, resultando em
rochas de textura granular, como o granito. A composição mineralógica desse conjunto de rochas, grosso modo, é
de feldspato potássico (K(AlSi3O8)), feldspato calcossódico (Na(AlSi3O8)) e (Ca(Al2Si2O8)), quartzo (SiO2),
biotita (K(Mg,Fe)3(OH,F)2(Al,Fe)Si3O10), augita (Ca(Mg,Fe,Al)(SiAl)2O6), olivina ((Mg,Fe)2SiO4), e minerais
metalíferos. Dependendo da rocha, as proporções variam significativamente. O granito contem 36% de feldspato
calcossódico e 30% de feldspato potássico, além de 26% de quartzo e 7% de biotita; o Riolito contem 15% de
feldspato calcossódico e 50% de feldspato potássico, além de 30% de quartzo e 5% de biotita e minerais
metalíferos. O traquito contem 10% de feldspato calcossódico e 75% de feldspato potássico, além de 10% de
augita e 5% de minerais metalíferos. Finalmente, o basalto contem 45% de feldspato calcossódico e 50% de augita,
além de 5% de olivina. Schumann, 1972.
173
Formação Cabo, que aparecem em ocorrências esparsas a noroeste e em quantidade
significativa, a oeste (Dantas & Lima Filho, 2006). Há também uma fonte de arenito de praia
(beachrocks) que está localizada ao longo da costa.
F. FORTE DE SÃO FRANCISCO XAVIER DE GAIBU. 1634
O Forte de São Francisco Xavier de Gaibu foi construído pelos colonizadores portugueses em
1634 sobre uma enseada, num afloramento de rocha, junto à praia. Está localizado na praia de
Gaibu, município de Cabo de Santo Agostinho, litoral sul do Estado de Pernambuco, distante
cerca de 33km do Recife. A estrutura do Forte está em ruínas. Observam-se, no entanto,
intervenções contemporâneas que promoveram sua consolidação, deixando dúvidas sobre a
originalidade dos materiais de construção e seu agenciamento. Esta fortificação ainda conta
com um conjunto de muralhas, num nível mais abaixo, que além de garantir a estabilização do
terreno, oferecia outros pontos para colocação de armas de fogo.
Foto 24. Forte de São Francisco Xavier de Gaibu.
174
Foto 25. Localização do Forte de São Francisco Xavier de Gaibu, localizado na Praia de Gaibu, município de Cabo
de Santo Agostinho no Estado de Pernambuco (modificado do Google earth, em 04.10.2014).
DADOS HISTÓRICOS
Em 1634, foram levantadas trincheiras nas praias de Gaibu e Itapoã por serem locais onde era
fácil o desembarque (Coelho, 1981. p. 188). Uma dessas trincheiras teria sido o Forte de São
Francisco Xavier de Gaibu. Em 1775 foi restaurado por ordem do Gov. Luiz Diogo Lobo da
Silva. Em 1797 foi novamente reformado. Encontrava-se em ruínas e foi consolidado na década
de 1970 (Menezes. 1986: p. 106; Albuquerque. 1999: p. 135).
Figura 47.
1986. p. 105.
Planta de 1799 do Forte de São Francisco Xavier de Gaibu e sua localização. Fonte: MENEZES.
175
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte São Francisco Xavier de Gaibu é uma fortificação com formato de polígono de cinco
lados irregular, ou seja, um pentágono irregular. Por sua configuração parece uma Rocca
italiana. Grosso modo, a fortificação mede 25,70 metros de comprimento, 20,90 metros de
largura e de 1,50 a 5,50 metros de altura, do solo atual até a parte superior da cortina. Os
principais itens que compõem a fortificação são cortina e terrapleno. Suas dimensões e
proporções estão detalhadas nas tabelas e figura abaixo. Sua muralha é inclinada, apresentando
caimento médio de 78,68°.
Figura 48.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Francisco Xavier de Gaibú, com indicação das linhas e
ângulos e suas medidas.
Medidas lineares
(Metro)
1
2
3
4
5
Média
Raio interior
13,65 14,37 9,16* 14,01
14,23
14,07
Lado da figura
14,54 16,22 15,26 12,67* 18,64*
15,34
* Essas medidas não estão sendo consideradas no valor da média, pois como é uma figura irregular essas medidas
irão distorcer a média.
Tabela 10.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Francisco Xavier de Gaibú.
176
Medidas angulares
(Grau decimal)
1
2
3
4
5
Média
Ângulo do centro
65,4°
71,1°
58,8°
62,2°
102,4°*
64,4°
Ângulo da figura
109,4°
119,3°
126,9°
86,6°*
97,7°*
118,5°
* Essas medidas não estão sendo consideradas no valor da média, pois como é uma figura irregular essas medidas
irão distorcer a média.
Tabela 11.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Francisco Xavier de Gaibú.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte de São Francisco Xavier de Gaibu está construído em alvenaria de pedra com
argamassa. Apesar de haver dúvida quanto à originalidade de seus materiais construtivos,
durante o levantamento físico foram identificados dois tipos de rochas utilizadas nas alvenarias
da fortificação além da rocha do afloramento rochoso sobre o qual a fortificação foi construída.
Foto 26. Cortina Sul do Forte de São Francisco Xavier de Gaibú onde se vê a homogeneidade do sistema
construtivo utilizado.
Das rochas utilizadas na alvenaria, o primeiro tipo revelou, no exame macroscópico, ser
composta por rocha bem selecionada, com grãos tamanho areia grossa e média, sub-angulosos,
de baixa esfericidade, na cor creme e que podem ser percebidos sem auxílio de lupa. O segundo
tipo de rocha é composto por rocha moderadamente selecionada, com grãos tamanho areia
média e fina, sub-angulosos, de baixa esfericidade, na cor creme que podem ser percebidos sem
auxílio de lupa. Quanto à presença de Carbonato de cálcio, verificou-se que as rochas da
177
fortificação reagiram ao Ácido clorídrico (HCl concentração de 10%) liberando CO 2,
abundantemente por um curto espaço de tempo.
A rocha do afloramento rochoso, por sua vez, é uma rocha muito mal selecionada, com grãos
tamanho grânulo e areias grossa e média, angulosos, de baixa esfericidade, na cor creme que
podem ser percebidos sem auxílio de lupa. Quanto à presença de Carbonato de cálcio, verificouse que a rocha não reagiu ao Ácido clorídrico (HCl concentração de 10%) portanto, não liberou
CO2.
Foto 27. Rochas do Forte de São Francisco Xavier de Gaibú. 1. Rocha do afloramento rochoso; 2. Rocha tipo 1 do
encontro entre as cortinas 2 e 3 (Nordeste e Noroeste). 3. Rocha do tipo 2, da cortina 4 (Oeste). Imagem extraída
a partir do Microscópio Digital portátil Dino-Lite PLUS, com aumento de 55x.
Em análise de Fluorescência de Raio-X foi possível identificar qualitativa e quantitativamente
os elementos químicos que compõe as rochas identificadas. Os resultados evidenciaram que
nenhuma das rochas é compatível com a rocha do afloramento rochoso. Ambas as rochas
contêm elevadas quantidades de Cálcio e a rocha retirada do afloramento não tem quantidade
significativa de Cálcio.
178
Gráfico 3.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha utilizados no Forte
de São Francisco Xavier de Gaibu.
Pelo contexto geológico típico da porção sul do litoral pernambucano, verifica-se que o Forte
de São Francisco Xavier de Gaibu, assim como o Forte de Nossa Senhora de Nazaré, foi
construído sobre um afloramento de rochas da Formação Ipojuca, de origem vulco-sedimentar,
podendo ser granito, riolito, basalto e traquito. Verificou-se, ainda, que foram utilizados dois
diferentes tipos de rocha na alvenaria da fortificação. A rocha localizada no encontro entre as
cortina 2 e 3 conta com elevadas quantidades de Silício e Cálcio, e vestígios de Alumínio,
sugerindo tratar-se de arenito. A rocha da cortina 4 tem elevada quantidade de Cálcio,
significativa presença de Silício e vestígios de Alumínio, Ferro e Potássio. Também parece
trata-se de arenito. A existência de dois tipos de arenito pode ser explicada de algumas
maneiras: durante a sua construção, foram extraídas rochas de duas diferentes fontes de arenito
localizadas no entorno da fortificação: uma delas, da Formação Algodoais, abrange uma área
de 2 a 8 km a Noroeste da fortificação; a outra, da Formação Cabo, que oferece uma grande
ocorrência de arenitos a oeste, e uma ocorrência esparsa a noroeste, uma a partir de 6 km da
fortificação, a outra a partir de 8 km, respectivamente (Dantas & Lima Filho, 2006). Há também
uma fonte de arenito de praia (beachrocks) que está localizada ao longo da costa.
5.2.3 FORTIFICAÇÕES DO TERCEIRO SISTEMA DEFENSIVO
Considerando os dados acima apresentados, segue-se com a descrição do levantamento de
dados das fortificações do terceiro Sistema Defensivo português em Pernambuco que também
179
serão analisados no capítulo seguinte, em comparação com os dados retirados dos Tratados de
Fortificação do capítulo anterior. As fortificações descritas, neste trecho, são:
Forte de Santa Cruz de Itamaracá, construído a partir de 1654;
Forte do Brum, construído a partir de 1654;
Forte de São Tiago das Cinco Pontas, construído a partir de 1684; e,
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, construído a partir de 1654.
G. FORTE DE SANTA CRUZ DE ITAMARACÁ. 1654
O Forte de Santa Cruz de Itamaracá foi construído pelos colonizadores portugueses a partir de
1654, sobre o Forte Orange, de origem holandesa. Está localizado na extremidade sul da Ilha
de Itamaracá, litoral norte do Estado de Pernambuco, distante cerca de 40 km do Recife. Foi
edificado na entrada do canal de Santa Cruz, numa planície costeira, em área de restinga. Suas
fachadas sul e norte são banhadas pela água do mar e de riacho, respectivamente, durante os
períodos de maré alta.
Foto 28. Fachada Sul do Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Baluarte 1, esquerda; Baluarte 2, direita.
180
A fortificação ainda conta com um trecho de fosso ao longo da fachada leste e com uma base
construtiva longitudinal disposta paralelamente à fachada sul, avançada em direção ao mar.
Essa base é uma estrutura de pedras lavradas, com cerca 4m de largura, onde há restos de
madeiras que poderiam pertencer a uma estacada.
Foto 29. Localização do Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Ilha de Itamaracá, Estado de Pernambuco (modificado
do Google earth, em 25.08.2014).
DADOS HISTÓRICOS
Em 1654, com a capitulação holandesa, o Forte Orange construído pelos holandeses foi
abandonado e subsequentemente ocupado e reconstruído pelo colonizador português. A partir
de 1682, passou a ser chamado Forte de Santa Cruz de Itamaracá.
Em carta ao Rei datada de 09 de outubro de 1675, há notícias de que o Governador Fernão de
Souza Coutinho havia mandado arrematar o Forte que estava em ruínas (A.H.U. PE, Caixa 6,
pág. 115). Em 1677, outra carta a El Rei, dá notícias das obras do Forte, informando que ‘a
estacada’ estava sendo finalizada (A.H.U. PE, Caixa 6, pág. 232). Em 1684, El Rei escreve ao
Governador da Capitania de Pernambuco solicitando notícias das obras da ruína da Fortificação
de Santa Cruz e uma planta (A.H.U. PE, Códices 256, fl. 56). Em 1702, o Engenheiro Luiz
Francisco Pimentel, dá parecer sobre o estado em que se encontra a fortificação e o que necessita
para melhorar sua defesa. Segundo Pimentel, na Fortificação de Santa Cruz “não há coisa
alguma que ao presente se possa reputar defensável, por lhe faltarem os terraplenos, os
parapeitos, as esplanadas e todas as mais obras que se costumam fazer em uma fortaleza; ...”.
181
O engenheiro ainda registra que a estrutura se apresentava caída na parte da barra e conclui
que para tornar a fortificação defensável, de tudo precisa (A.H.U. Caixa 11, fls. 213/214/215).
Figura 49.
Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Planta de 1763.
Em 1703, o então Governador da Capitania de Pernambuco, Francisco de Castro Moraes,
escreve a El Rei dando informações da vistoria que fez à ruína do Forte de Santa Cruz. Na
ocasião foi constatado que (i) a fortaleza estava concluída até a altura do cordão, exceto o portal,
onde a obra ainda não havia sido iniciada; e (ii) o baluarte da parte da barra tinha uma face
arruinada no chão e a outra quase na mesma situação por causa da ação do mar sobre a muralha.
Nessa situação, o Governador informa que mandou derrubar o baluarte e reconstruí-lo,
considerando sua importância na defesa da Barra. Na mesma carta, manda dizer que ordenou
fazer uma estacada por fora da fortaleza, com pedra, no intuito de evitar que o mar chegasse à
fortificação (A.H.U. Caixa 11. Pág. 181/183).
182
Figura 50.
Planta com mapa de danos de 1788. Fonte: Arquivo do Exército do Rio de Janeiro (Código da
mídia: 01.01.0023).
Em 1777, por ordem do então Governador de Pernambuco, José César de Menezes, o Forte é
novamente recuperado, considerando planta de 1763 (Acervo do IPHAN. Caixa 8 de A a H ).
Anos mais tarde, em 1788, há desenho da fortificação apresentando mapa de danos. Em 1817,
há notícias de que foi ocupado pelo Padre Tenório, durante a Revolução Pernambucana.Em
1938 o Forte de Santa Cruz de Itamaracá foi tombado pelo atual IPHAN. Em 1968, o IPHAN
e Exército realizaram obras de recuperação e fizeram prospecções arqueológicas na capela e
183
praça de armas. A reforma foi realizada, principalmente, na muralha sul que estava ruindo em
razão da ação do mar.
Figura 51.
Espacialização do estado de conservação do Forte de Santa Cruz de Itamaracá em 1969/73.
Fonte: autora, a partir de fotos existentes no Acervo do IPHAN, Forte Orange, Caixa 8 de A a H.
Em 1972, a fortificação estava em ruínas e foi realizada nova reforma pelo Exército. Segundo
descrição do arqueólogo Marcos Albuquerque, que participou da reforma, (i) a muralha entre
184
os baluartes do lado do mar estava arruinada com as pedras espalhadas pela praia: o baluarte
sudoeste (baluarte 1) estava metade arruinado e o sudeste (baluarte 2) estava inteiro, mas
desarticulado; (ii) a muralha leste estava pouco arruinada, mas com vários pontos
desarticulados: o baluarte nordeste (baluarte 3) estava destruído no lado norte; (iii) a muralha
do lado norte estava arruinada no centro; e, (iv) a muralha oeste, onde está o portal, estava em
bom estado, mas não tinha portão. A obra iniciada em 1973 reconstruiu a fortificação segundo
desenhos do século XVIII e utilizou pedras calcárias existentes ou retiradas do terrapleno ou
trazidas da Paraíba (Acervo do IPHAN. Caixa 8 de A a H. Forte Orange. Itamaracá
Pernambuco. Considerações sobre o projeto de Intervenção ).
Figura 52.
Obra realizada em 1999. Recomposição da muralha leste, no encontro com o baluarte 2. Fonte:
autora, a partir de fotos existentes no Acervo do IPHAN, Forte Orange, Caixa 8 de A a H.
185
Em 1999, foi feita obra para recompor um trecho da muralha leste, no encontro com o baluarte
sudeste. A obra utilizou as pedras soltas existentes no local. A partir do ano 2000 foi realizado
projeto de pesquisa arqueológica pela UFPE, Projeto Forte Orange, em cooperação com
Amsterdams Archeologisch Centrum da Universidade de Amsterdã.
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte de Santa Cruz de Itamaracá é uma fortificação do tipo Fortificação Moderna,
abaluartada, incluída na tipologia de Castelo ou Cidadela, segundo Scamozzi, e Forte
quadrantal, segundo Goldman. Apresenta planta com formato de polígono quadrangular. Os
principais itens que compõe a fortificação são: reparo contendo baluarte, com suas faces e
flancos, e cortina. Sobre o terrapleno, ao longo de todo perímetro da fortificação há parapeito
em alvenaria, com canhoneiras. A fortificação ainda conta vestígios de obras externas: são elas
fosso e base em pedra para paliçada. Suas dimensões e proporções estão detalhadas nas tabelas
e figura abaixo. Sua muralha é inclinada, apresentando caimento médio de 78,72°. Ao longo de
todo reparo, há um cordão em pedra que sinaliza o fim do reparo e início do parapeito, também
em pedra. Grosso modo, a fortificação mede 126 metros de comprimento, 128 metros de largura
e 6,30 metros de altura, do solo atual até o cordão em pedra.
Figura 53.
Planta Baixa da Muralha do Forte de Santa Cruz de Itamaracá, com indicação das linhas e
ângulos e suas medidas.
186
Medidas lineares
(Metro)
1
2
3
4
5
6
7
8
Média
Raio interior
58,87 60,35
58,87
60,35
59,61
Lado da figura
83,83 82,01
86,85
84,48
84,29
Garganta
12,78 12,74
13,33
12,5
9,65 11,58 10,92 10,26
11,72
Flanco
11,87 12,76
12,53
11,43 13,91 13,75 12,35 11,84
12,56
Face
34,44 35,37
35,19
34,38 34,71 34,87 34,67 34,86
34,81
Cabeça
28,87 28,59
32,32
31,05
30,21
Cortina
59,85 61,32
61,46
60,72
60,84
Segundo flanco
8,64
24,32
15,04
Lado exterior
126,2 126,33 128,47 126,88
126,97
Defesa flancante
96,08
Defesa fichante
86,84 86,28
Tabela 12.
9,43
96
1,53 11,57 14,4
8,21
11,64
95,5
95,21 97,36 96,08 97,18 97,06
96,31
88,08
81,99 95,56 85,9 82,87 72,68
85,03
Medidas lineares aferidas em campo. Forte Santa Cruz de Itamaracá.
Medidas angulares
(Grau decimal)
1
2
3
4
Ângulo do centro
91,8°
91,6°
87,6°
88,9°
90,0°
Ângulo da figura
88,8°
89,5°
88,4°
93,3°
90,0°
Ângulo do baluarte
61,9°
61,1°
56,6°
62,8°
60,6°
Ângulo flancante
Ângulo
cabeça/garganta
15,2°
12,8°
17°
18,3°
Ângulo face/flanco
Ângulo
flanco/cortina
Tabela 13.
5
Média
133,6° 133,1° 134,5° 136,7° 135,6° 134,9° 136,2° 135,4°
135,0°
102,5° 103,5° 101,5° 104,4° 101,8° 99,4° 100,8° 101,4°
101,9°
87,3°
87,2°
87,3°
90,5°
83,2°
13,5°
8
14,7°
87,2°
13,9°
7
14,5°
88,5°
12,1°
6
87,3°
86,5°
Medidas angulares aferidas em campo. Forte Santa Cruz de Itamaracá.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte de Santa Cruz de Itamaracá está construído em terra e encamisado em alvenaria de
pedra com argamassa de barro e cal. A partir do levantamento de dados foi possível identificar
seis diferentes sistemas construtivos (SC) distribuídos em 622,39 metros de perímetro de
muralha, com predominância do SC 1, com 33,08% e do SC 3, com 49,25% do perímetro total.
Os demais sistemas construtivos, juntos, somam 17,67%. Deve-se ressaltar, no entanto, que o
SC 3 é resultado das obras de reconstrução da fortificação realizadas em 1972.
187
Figura 54.
Itamaracá.
Espacialização dos Sistemas construtivos (SC) identificados no Forte de Santa Cruz de
No que diz respeito ao exame macroscópico das rochas, foi possível verificar cinco das rochas
dos seis sistemas construtivos (SC), que se apresentam como rochas muito bem selecionadas,
com grãos no tamanho areia fina ou silte, que não podem ser percebidos nem com auxílio de
lupa. Foi identificada a presença de carapaças em três delas – SC 1, SC 4 e SC 6; e há cavidades
na rocha, no SC 1, SC 2e SC 6. Verificou-se, ainda, que todas as rochas reagiram ao Ácido
clorídrico (HCl concentração de 10%) liberando CO2 moderadamente por um longo espaço de
tempo, exceto a rocha do SC 2 que liberou CO2 abundantemente por um longo espaço de tempo.
A análise de Fluorescência de Raio-X permitiu identificar qualitativa e quantitativamente os
elementos químicos que compõe as rochas. Os resultados evidenciaram que todas as rochas
apresentam elevadas quantidades de Cálcio, com pequena quantidade de Silício, Alumínio e
Ferro e traços de Potássio. Com destaque para a rocha do SC 6 que apresentou uma pequena
variação quantitativa quando comparada às demais: a quantidade de Cálcio é ligeiramente
menor e o Silício, ligeiramente maior.
188
Foto 30. Tipos de rocha do Forte de Santa Cruz de Itamaracá. Rocha 1 (SC1); Rocha 2 (SC2); Rocha 3 (SC3);
Rocha 4 (SC4); e Rocha 6 (SC6). Imagem extraída a partir do Microscópio Digital portátil Dino-Lite PLUS, com
aumento de 55x.
As fontes de rocha mais próximas do Forte de Santa Cruz de Itamaracá estão localizadas na
área da Bacia Sedimentar Recife/João Pessoa. Num raio de 2,5 até 5 km a partir do Forte
existem fontes abundantes de fosforitos, calcarenitos e calcários de origem marinha da
Formação Gramame. Na outra margem do Canal de Santa Cruz, a cerca de 7 km, podem ser
encontrados arenitos finos e arenitos carbonáticos médios a grosseiros, da Formação Beberibe.
Considerando em todas as rochas a elevada quantidade de Cálcio e pequena quantidade de
189
Silício, Alumínio e Ferro pode-se sugerir que as rochas utilizadas em todos os sistemas
construtivos do Forte de Santa Cruz de Itamaracá são Calcário. Há também uma fonte de arenito
de praia (beachrocks) que está localizada ao longo da costa.
Gráfico 4.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha utilizados no Forte
de Santa Cruz de Itamaracá.
Foi ainda realizada Difração de Raio-X (DRX).para as rochas do SC 3 e SC 4 com o objetivo
de identificar os minerais presentes e complementar os resultados obtidos com a FRX. Os
resultados obtidos para a rocha do SC 4 mostrou grande quantidade de Dolomita
(CaCO3.MgCO3) e Ankerita (Ca2MgFe(CO3)4 e pequena quantidade de quartzo (SiO2).
Segundo Sampaio e Almeida, esses elementos são aqueles constituintes dos calcários e/ou
dolomitos. Segundo o “Diagnóstico Ambiental do Litoral Norte”, a Formação Gramame
apresenta duas fáceis, uma fosfática e uma calcária. A fácie calcária é composta por arenito
calcífero, calcários arenosos e culminam, no topo, com calcário dolomítico e margoso, muito
fossilífero. Por sua vez, a rocha do SC 3 também apresentou o mesmo resultado: grande
quantidade de Dolomita (CaCO3.MgCO3) e Ankerita (Ca2MgFe(CO3)4 e pequena quantidade
de quartzo (SiO2), sugerindo tratar-se também de calcário ou dolomito. Segundo os dados do
histórico construtivo do Forte, acima apresentados, as rochas utilizadas na reforma de 1973 ou
foram rochas reutilizadas ou rochas trazidas da Paraíba. Devemos lembrar que a Formação
Gramame tem origem no rio de mesmo nome, localizado na Paraíba. Os resultados do DRX
reforçam a hipótese de que as rochas utilizadas na construção e nas reformas do Forte de Santa
Cruz de Itamaracá são rochas calcárias.
190
H. FORTE DO BRUM. 1654
O Forte do Brum, localizado no bairro do Recife, região central da cidade, foi construído pelos
colonizadores portugueses a partir de 1654, sobre o forte holandês de mesmo nome. O Forte foi
construído na entrada do porto do Recife, num istmo banhado a leste pelas águas do mar e a
oeste, pelo rio Beberibe.
Foto 31. Forte do Brum. Fonte:site turismonorecife.com.br.
Foto 32. Localização do Forte do Brum, localizado na Ilha do Recife, bairro do Recife, no Estado de Pernambuco
(modificado do Google earth, em 04.10.2014).
191
DADOS HISTÓRICOS
Em 1654 os portugueses conquistaram o Forte do Brum, construído pelos holandeses, que por
sua vez já foi construído sobre as estruturas do inacabado Forte Diogo Paes. Em cartas de 1672
e 1677, João Fernandes Vieira dá notícias ao Rei de que as obras de pedra e cal do Forte do
Brum continuavam em andamento (A.H.U., PE, Caixa 6, p. 151 e A.H.U., PE, Caixa 6, p. 232).
Em 1702, Luís Francisco Pimentel escreveu ao Rei dando notícias do estado em que se
encontravam as fortalezas da Capitania. Sobre o Forte do Brum, informou que este precisava
de uma estrutura de reforço da fundação ao redor de toda edificação, pois os alicerces estavam
amostra, precisava ainda que o fosso fosse finalizado e o parapeito aumentado. A carta ainda
citava a necessidade de fazer defesa lateral pela parte que olha para a barra (A.H.U., PE, Caixa
11, fls. 213-215). Em 1707, as notícias eram de que as obras já estavam acabadas (A.H.U., PE,
Caixa 12, p. 33-35). Desde 1987 o Forte do Brum foi restaurado e passou a funcionar como
Museu Militar (Menezes. 1986: p. 100-102).
Figura 55.
Planta do Forte do Brum, após a capitulação dos holandeses. Fonte: MENEZES. 1986. p. 102.
192
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte do Brum é uma fortificação do tipo Fortificação Moderna, abaluartada, incluída na
tipologia de Castelo ou Cidadela, segundo Scamozzi, e de Forte quadrantal, segundo Goldman.
Apresenta planta com formato de polígono quadrangular. Os principais itens que compõe a
fortificação são: o reparo composto de baluarte, com suas faces e flancos, e cortina. Ao longo
de todo o perímetro do terrapleno há parapeito em alvenaria com canhoneiras. Também conta
com obras externas como fosso. Suas dimensões e proporções estão detalhadas na figura abaixo.
Sua muralha é inclinada, apresentando caimento médio de 77,19°. Ao longo de toda a muralha,
há um cordão em pedra que sinaliza o fim da muralha e início do parapeito. Grosso modo, a
fortificação mede 109 metros de comprimento, 82 metros de largura e 6 metros de altura, do
solo atual até o cordão.
Figura 56.
Planta Baixa da Muralha do Forte do Brum, com indicação das linhas e ângulos e suas medidas.
Medidas lineares
(Metro)
1
2
3
4
5
6
Média
Raio interior
47,62 46,53
47,62
46,53
47,08
Lado da figura
66,35 69,18
67,14
63,54
66,55
Garganta
10,37 11,53
10,99
10,25
23,19* 21,46*
10,79
Flanco
9,67
10,15
10,15
10,94
10,33
10,02
10,21
Face
25,48 25,44
24,94
26,54
26,16
27,3
25,98
Cabeça
23,35 23,62
Cortina
33,56 33,89
23,49
47,39
33,73
193
Segundo flanco
1,45
0,89
0,91
1,3
14,53* 17,05*
1,14
Lado exterior
82,49 81,37 109,69* 104,98*
Defesa flancante
46,49* 61,8
76,8
76,39
61,34 44,69*
69,08
Defesa fichante
59,68* 62,66
78,08
77,29
62,87 59,79*
70,23
81,93
* Esses valores são referentes aos meios baluartes, que são diferentes dos baluartes, por isso não estão sendo
considerados no cálculo das respectivas médias.
Tabela 14.
Medidas lineares aferidas em campo. Forte do Brum.
Medidas angulares
(Grau decimal)
1
2
3
4
5
Ângulo do centro
84,0°
90,9°
94,6°
89,6°
90,0°
Ângulo da figura
93,4°
85,9°
89,2°
91,36°
90,0°
Ângulo do baluarte
65,0°
58,9°
61,3°
59,2°
61,1°
Ângulo flancante
28,4°*
32,4°*
17,0°
11,45
Ângulo cabeça/garganta
134,9°
139,1°
140,2°
130,5°
Ângulo face/flanco
115,1°
120,3°
119,2°
115,2°
115,4°
115,2°
116,7°
Ângulo flanco/cortina
103,8°
103,6°
99,9°
86,8°
86,7°
103,3°
97,4°
11,4°
6
15,5°
Média
13,8°
136,2°
* Esses valores são referentes aos meios baluartes, que são diferentes dos baluartes, por isso não estão sendo
considerados no cálculo das respectivas médias.
Tabela 15.
Medidas angulares aferidas em campo. Forte do Brum.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte do Brum, provavelmente, está construído em alvenaria de pedra com argamassa de
barro e cal e não em terra, com encamisamento de pedra, como o Forte de Santa Cruz de
Itamaracá. No Forte do Brum, o reparo na área das cortinas norte e sul é vazio, e existem
ambientes interno sendo utilizados com atividades do Museu entre a escarpa e contra escarpa
em pedra.
A partir do levantamento de dados físicos foi possível identificar dos 441,71 metros de reparo,
cinco diferentes sistemas construtivos (SC), com predominância do SC 1 e SC 4. Deve-se
registrar que parte do reparo está revestida com reboco e pintada, não sendo possível visualizar
o sistema construtivo neste trecho que representa 23,9% do perímetro total. Os sistemas
construtivos predominantes, SC 1 e SC 4, somam, respectivamente, 117,04 metros (26,50%) e
124,26 metros (28,14%) do perímetro. Os demais sistemas construtivos, juntos, somam
21,46%. Segue abaixo planta que espacializa os cinco sistemas construtivos.
194
Figura 57.
Espacialização dos Sistemas construtivos identificados no Forte do Brum.
No que diz respeito ao exame macroscópico realizado nas rochas utilizadas na construção de
cada SC, de uma maneira geral, verificou-se que as rochas se apresentam muito bem
selecionadas, com grãos tamanho areia média e fina, sub-arredondados, de baixa esfericidade,
na cor creme e que podem ser percebidos sem auxilio de lupa. Diferentemente das demais, a
rocha do SC 2 apresenta 25% de impurezas em um trecho da rocha. Todas as rochas reagiram
ao Ácido clorídrico (HCl concentração de 10%) liberando CO2 abundantemente por um curto
espaço de tempo.
A análise de Fluorescência de Raio-X permitiu identificar qualitativa e quantitativamente os
elementos químicos que compõe as rochas identificadas. Os resultados evidenciaram que todas
as rochas apresentam elevadas quantidades de Cálcio e Silício com traços de Alumínio, Ferro
e Potássio.
As fontes de rocha mais próximas do Forte do Brum estão a mais de quinze quilômetros para
Norte da Capitania de Pernambuco. Nessas fontes encontram-se calcários dentríticos, da
Formação Maria Farinha; arenitos da Formação Beberibe; e, calcários da formação Gramame.
Considerando a elevada quantidade de Silício presente nas rochas, pode-se sugerir que as rochas
utilizadas na construção e nas reformas do Forte do Brum não foram Calcário, pois como o
Silício é considerado uma impureza na rocha calcária, apareceria em menor quantidade. Inferese, portanto, que as rochas utilizadas foram arenitos quartzosos. Há também uma fonte de
arenito de praia (beachrocks) que está localizada ao longo da costa.
195
Gráfico 5.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha utilizados no Forte
do Brum. A Rocha 1 (SC 1), Rocha 3 (SC 2), Rocha 5 (SC 3), Rocha 7 (SC 4) e Rocha 9 (SC 5).
I.
FORTE DE SÃO TIAGO DAS CINCO PONTAS. 1654
O Forte de São Tiago das Cinco Pontas, localizado no bairro de São José, no centro do Recife,
foi construído pelos colonizadores portugueses a partir de 1654, sobre o Forte holandês
Frederich Heinrich.
Foto 33. Forte de São Tiago das Cinco Pontas, localizado no bairro de São José, no centro do Recife.
196
Foto 34. Localização do Forte de São Tiago das Cinco Pontas, no bairro de São José, no centro do Recife, Estado
de Pernambuco (modificado do Google earth, em 04.10.2014).
DADOS HISTÓRICOS
Em 1654, o Forte de São Tiago dos Cinco Pontas foi construído sobre o Forte holandês
Frederich Heinrich. Esse primitivo forte tinha formato de polígono regular pentagonal, com
cinco baluartes, mas o forte português foi construído com formato de polígono quadrangular,
em alvenaria de pedra e cal, pelo Engenheiro Militar Francisco Correia Pinto.
Figura 58.
Ilustração denominada “CAERTE VANDE HAVEN VAN PHARNAMBOCQUE”, de 1639.
Legenda: 2. Forte das Cinco Pontas. 5. Forte Ernesto. 6. Reduto da Boa Vista. 7. Forte Emilia.
Em 1677, João Fernandes Vieira dá notícias de que a obra do Forte de São Tiago das Cinco
Pontas estava finalizada (A.H.U., PE, Caixa 6, p. 232). Em 1702, Luís Francisco Pimentel em
carta ao Rei dá notícias do estado em que se encontram as fortificações da Capitania. Sobre o
Forte de São Tiago das Cinco Pontas, informa que estão sendo realizadas obras, novamente,
para refazer o parapeito e a ponte levadiça (A.H.U., PE, Caixa 11, fls. 213-215). Em 1707, uma
carta ao Rei informa que as obras do Forte de São Tiago das Cinco Pontas estavam finalizadas
(A.H.U., PE, Caixa 12, p. 33-35).
197
Em 1799 há registros de que haveria necessidade de aterro no fosso da parte do mar. Nesse
momento contava com 34 peças de artilharia. Em 1822 foi reformado. Em 1847 contava com
14 peças de artilharia. Foram feitos novos reparos em 1904. Foi restaurado a partir de 1979,
pela prefeitura do Recife e pelo IPHAN, e aberto ao público em 1982 quando passou a ser sede
do Museu da Cidade do Recife (Menezes. 1986: p. 104 e 105).
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte São Tiago das Cinco Pontas é uma fortificação do tipo Fortificação Moderna,
abaluartada, incluída na tipologia de Castelo ou Cidadela, segundo Scamozzi, e de Forte
quadrantal, segundo Goldman. Apresenta planta com formato de polígono retangular. Os
principais itens que compõe a fortificação são: reparo contendo baluarte, com suas faces e
flancos, e cortina. Sobre o terrapleno, ao longo de todo perímetro da fortificação há parapeito
em alvenaria, com canhoneiras. A fortificação ainda conta com fosso. Suas dimensões e
proporções estão apresentadas nas tabelas e figura abaixo. Sua muralha é inclinada,
apresentando caimento médio de 76,53°. Ao longo de toda a muralha, há um cordão em pedra
que sinaliza o fim da muralha e início do parapeito. Grosso modo, a fortificação mede 83 metros
de comprimento, 76 metros de largura e 3,80 metros de altura, do solo atual até o cordão em
pedra.
Figura 59.
Planta Baixa da Muralha do Forte São Tiago das Cinco Pontas, com indicação das linhas e
ângulos e suas medidas.
198
Medidas lineares
(metro)
1
2
3
4
5
6
7
8
Média
Raio interior
37,72 37,77 37,58 37,64
37,68
Lado da figura
48,19
48
58,03
58
48,10
Garganta
9,11
5,56
5,11
8,95
7,24
7,07
7,44
7,49
Flanco
7,98
7,8
7,93
7,82
8,98
8,86
9,07
9,1
Face
20,71 18,08 18,68 21,72 17,7 17,71 17,48 17,78
18,73
Cabeça
16,42 19,23 20,08 16,7
18,11
Cortina
33,43 37,52 41,8 41,47
35,48
Segundo flanco
10,17 9,26
Lado exterior
71,67 76,62 82,83 83,61
74,15
Defesa flancante
54,56 50,01 55,24 48,7 52,56 52,09 51,6 56,33
52,64
Defesa fichante
65,35 58,54 58,79 66,3 61,84 53,74 53,89 61,55
60,00
Tabela 16.
9,08
4,09 13,46 11,38 1,84
7,25
8,44
1,2
7,56
Medidas lineares aferidas em campo. Forte São Tiago das Cinco Pontas.
Medidas angulares
(grau decimal)
1
2
3
4
5
6
7
8
Média
Ângulo do centro
100,4° 100,8° 79,1°
79,5°
100,6°
Ângulo da figura
89,9°
90,2°
89,9°
89,9°
90,03°
Ângulo do baluarte
64,1°
63,1°
58,5°
61,6°
61,8°
Ângulo flancante
Ângulo
cabeça/garganta
14,3°
13,1°
16,1°
14,0°
133,5° 136,4° 135,5° 134,5° 135,6° 134,1° 136,1°
134°
135°
Ângulo face/flanco
116,9° 117,6° 116,8° 115,6° 117,1° 116,5°
116,5°
117,0°
Ângulo flanco/cortina
104,6° 102,4° 100,7° 102,5° 102,6° 102,7° 103,8° 103,9°
102,9°
Tabela 17.
15,1°
14,2°
12,8°
119°
12,7°
14,0°
Medidas angulares aferidas em campo. Forte São Tiago das Cinco Pontas.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte São Tiago das Cinco Pontas está construído em alvenaria de pedra com argamassa de
barro e cal. Nos cantos da fortificação, verifica-se alvenaria de pedra aparente, composta por
rochas talhadas de formato retangular, com tratamento de superfície. O exame macroscópico
da rocha utilizada na sua construção revelou uma rocha muito bem selecionada, com grãos
tamanho areia média, sub-anguloso, de baixa esfericidade, na cor creme e que podem ser
percebidos sem auxílio de lupa. Verificou-se ainda a presença de impurezas, conchas e
fragmentos de conchas, num percentual que varia de 1% a 50%. A rocha reagiu ao Ácido
clorídrico (HCl concentração de 10%) liberando CO2, abundantemente por um longo tempo.
199
A análise de Fluorescência de Raio-X permitiu identificar qualitativa e quantitativamente os
elementos químicos que compõe a rocha. O resultado evidenciou uma elevada quantidade de
Cálcio e Silício com traços de Alumínio e vestígios de outros elementos, como o ferro.
As fontes de rocha mais próximas do Forte São Tiago das Cinco Pontas estavam a mais de
quinze quilômetros para Norte da Capitania de Pernambuco. Nessas fontes encontravam-se
calcários dentríticos, da Formação Maria Farinha; arenitos da Formação Beberibe; e, calcários
da formação Gramame. Considerando a elevada quantidade de Silício presente na rocha,
sugere-se que a rocha utilizada na construção dessa fortificação não foi o Calcário, pois este
mineral é considerado uma impureza da rocha calcária. Infere-se, portanto, que a rocha utilizada
foi o arenito quartzoso. Há também uma fonte de arenito de praia (beachrocks) que está
localizada ao longo da costa.
Gráfico 6.
Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada no tipo de rocha utilizado no Forte
São Tiago das Cinco Pontas. A Rocha 1 é referente a alvenaria localizada nos encontros da muralha.
200
J. FORTE DE SANTO INÁCIO DE LOYOLA DE TAMANDARÉ. 1654
Foto 35. Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, localizado no município de Tamandaré, litoral sul do
Estado de Pernambuco.
O Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré foi construído pelos colonizadores
portugueses a partir de 1654. Está localizado no município de Tamandaré, no litoral sul do
Estado de Pernambuco, distante cerca de 80km do Recife. O Forte foi construído numa planície
costeira, em área de restinga.
Foto 36. Localização do Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, município de Tamandaré, litoral sul do
Estado de Pernambuco (modificado do Google earth, em 04.10.2014).
201
DADOS HISTÓRICOS
Em 1654, João Fernandes Vieira manda construir um forte de formato quadrado com quatro
baluartes. O seu armamento constava de 28 peças de artilharia. Em 1677, dá notícias de que a
obra da Fortaleza de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré estava finalizada (A.H.U., PE, Caixa
6, p. 232.). As obras contaram com o apoio dos moradores locais em material de construção,
mão-de-obra, carro e animais. A fortificação foi construída em alvenaria de pedra, com rochas
foram trazidas por via marítima de porto calvo, em Alagoas.
De 1683 até 1691 foi novamente reformado pelo mestre Francisco Pinheiro, que em 1702, em
carta ao Rei, dá notícias de que a obra da fortificação estava acabada (A.H.U., PE, Caixa 11,
fls. 213-215). Em 1822 foi alvo de outras obras de reparo. Foi utilizado como prisão política
para prisioneiros em trânsito. Durante a segunda guerra mundial, até 1945, foi quartel para as
tropas do Exército do Brasil. Desde 1978, está sob a guarda da Capitania dos Portos (Ministério
da Marinha) e abriga um farol (Menezes. 1986: p. 103-104).
CONFIGURAÇÃO GEOMÉTRICA
O Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré é uma fortificação do tipo Fortificação Moderna,
abaluartada, incluída na tipologia de Castelo ou Cidadela, segundo Scamozzi, e Forte
quadrantal, segundo Goldman. Apresenta planta com formato de polígono quadrangular. Os
principais itens que compõe a fortificação são: reparo contendo baluarte, com suas faces e
flancos, e cortina. Sobre o terrapleno, ao longo de todo perímetro da fortificação há parapeito
em alvenaria, com canhoneiras. A fortificação ainda conta vestígios do fosso como obras
externa. Suas dimensões e proporções estão detalhadas nas tabelas e figura abaixo. Sua muralha
é inclinada, apresentando caimento médio de 78,03°. Ao longo de toda a muralha, há um cordão
em pedra que sinaliza o fim da muralha e início do parapeito, também em pedra. Grosso modo,
a fortificação mede 98 metros de comprimento, 100 metros de largura e 3,85 metros de altura,
do solo atual até o cordão em pedra.
202
Figura 60.
Planta Baixa da Muralha do Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, com indicação das
linhas e ângulos e suas medidas.
Medidas lineares
(metro)
1
2
3
4
5
6
7
8
Média
Raio interior
47,84 47,49
47,6
47,85
47,70
Lado da figura
67,7 66,69 67,34
68,09
67,46
Garganta
10,58 10,9
10,38
10,75
11,12 10,55
9,89
11,21
9,32*
Flanco
9,82
9,79
9,33
9,67
9,76
7,86*
9,71
Face
26,95 27,1
27,25
27,97
28,85 28,66 27,01* 28,98*
27,80
Cabeça
23,98 22,15 22,18
22,42*
22,77
Cortina
46,04 45,75 46,32
46,29
46,10
Segundo flanco
6,53
5,19
Lado exterior
98,37 100,1 99,42* 100,25*
Defesa flancante
67,42 68,6
71,83
74,39
71,15 65,24 53,32* 70,37*
69,77
Defesa fichante
73,78 73,67 75,61
75,81
74,14 74,63 75,13* 73,73*
74,61
2,35
4,57
0
9,87
10,67
10,91 21,1*
4,86*
6,94
99,24
* Esses valores são hipotéticos. São referentes ao baluarte que não existe mais, por isso não estão sendo
considerados no cálculo das respectivas médias.
Tabela 18.
Medidas lineares aferidas em campo e média. Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré.
203
Medidas angulares
(grau decimal)
1
2
3
4
Ângulo do centro
91,0°
90,4°
88,7°
89,7°
90,0°
Ângulo da figura
88,8°
90,8°
90,3°
89,9°
90,0°
Ângulo do baluarte
63,9°
64,9°
61,3° 59,6°*
63,4°
Ângulo flancante
13,8°
12,7°
13,3°
Média
13,2°
Ângulo face/flanco
102,5° 102,2° 104,2° 103,5° 97,3° 101,5° 96,2°* 106,6°*
101,9°
Ângulo flanco/cortina
88,7°
87,5°
83,3°
89,2°
17,3°*
8
134,9°
86,1°
11,1°
7
12,9°*
88,7°
15,6°
6
Ângulo cabeça/garganta 132,7° 136,8° 133,3° 135,8° 134,1° 136,9° 134,7°* 135,3°*
89,2°
12,9°
5
87,8°*
90,9°*
* Esses valores são hipotéticos. São referentes ao baluarte que não existe mais, por isso não estão sendo
considerados no cálculo das respectivas médias.
Tabela 19.
Medidas angulares aferidas em campo e média. Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré.
ESCOLHA DOS MATERIAIS CONSTRUTIVOS
O Forte Santo Inácio de Loyola de Tamandaré está construído em terra e encamisado em
alvenaria de pedra com argamassa de barro e cal. É composto por rochas aparelhadas, com
tratamento de superfície, e formato irregular, mas tendendo a polígonos de tamanhos variados.
204
COMPARAÇÃO ENTRE AS REFERÊNCIAS EUROPEIAS, OS TRATADOS E
AS FORTIFICAÇÕES DE PERNAMBUCO
Neste capítulo foram realizadas análises a partir dos dados e das referências identificadas ao
longo deste trabalho a fim de permitir fazer constatações relativas às fortificações no que diz
respeito aos tipos de fortificações construídos segundo as referências europeias (de transição
ou moderna), aos modelos que podem ter sido utilizados para a construção das fortificações do
tipo moderno antes, durante e depois da presença holandesa, à eficácia bélica de todo esse
conjunto de fortificações, e consequentemente, fazer constatações sobre a transformação ou
permanência tecnológica dos processos construtivos. No próximo capítulo, das conclusões, as
constatações aqui alcançadas relativas às escolhas por determinada tecnologia (tipos e
modelos), antes, durante e depois da presença holandesa, foram analisadas à luz dos fatos
históricos, buscando explicar as razões que motivaram essas escolhas.
6.1
CLASSIFICAÇÃO TIPOLÓGICA
As fortificações construídas em Pernambuco nos séculos XVI e XVII podem ser classificadas
como Fortificação de Transição ou Fortificação Moderna, considerando, com já foi
devidamente explicitado no Capítulo 1, que não há alusão a fortificações medievais no Brasil.
Essa análise foi realizada a partir da comparação entre as referências da caracterização física de
ambos os tipos de fortificação europeias com os dados da caracterização física das fortificações
construídas em Pernambuco. Através desta análise pretendeu-se fornecer informações para as
demais análises programadas.
Como já foi justificado no Capítulo 3, dentre os aspectos da caracterização física das
fortificações serão considerados aqueles referentes à sua Configuração Geométrica,
especificamente: seus principais itens, formato, dimensões e proporções, modelos e inclinação
dos muros. Estes aspectos vêm sendo considerados ao longo de todo o trabalho, servindo de
variável para o levantamento dos dados.
No intuito de dar suporte ao processo de análise, optou-se por retomar as referências aos tipos
de fortificação, já descritos no Capítulo 1; assim com os dados das fortificações apresentados
no Capítulo 5, em formato de quadro-síntese. Como ficou demonstrado no Capítulo 1, as
características físicas de ambos os tipos foram o resultado de processos de experimentação, a
partir de conhecimentos teóricos da matemática, geometria e trigonometria, para tornar a
205
construção mais defensável. A Fortificação de Transição, ainda segundo as referências
documentais, deveria ser capaz de se defender da artilharia pirobalística da primeira fase, cujo
efeito moral ainda era maior que o efeito de destruição; e a Fortificação Moderna deveria ser
capaz de se defender da artilharia pirobalística de destruição. Portanto, quando os dados da
caracterização física das fortificações não forem suficientes para permitir uma clara
classificação, dever-se-á realizar a verificação da capacidade de defesa da estrutura analisada a
partir de referências complementares que podem ser encontrados no Capítulo 1, onde essas
tipologias foram discutidas.
Segue abaixo o quadro-síntese onde estão evidentes as características físicas das fortificações
de Pernambuco, apresentadas no Capítulo 5, situando cada fortificação no modelo
correspondente.
206
Quadro 2.
tipológica.
Quadro-síntese das características físicas das fortificações de Pernambuco para classificação
Quadro 3.
Quadro-síntese da classificação tipológica das fortificações de Pernambuco.
Na análise, verificou-se que algumas fortificações apresentam características que permitem
uma clara classificação, tanto na tipologia de Transição, como na Moderna. Dentre as dez
fortificações em estudo, o Forte de São Jorge é o único que pode ser classificado, de antemão,
como Fortificação de Transição. Sua classificação está amparada pela identificação, no modelo
de Fortificação de Transição apresentado no Capítulo 1, dos principais itens que compõe esse
tipo: muralhas relativamente altas, com tambores nos ângulos e canhoneiras abertas nas
muralhas (tanto no terraço, como em níveis mais baixo, para possibilitar o tiro rasante). Quanto
às fortificações que podem, previamente, ser consideradas do tipo Moderno estão o Forte de
Santa Cruz de Itamaracá, Forte de São Tiago das Cinco Pontas, Forte do Brum e Forte de Santo
Inácio de Loyola de Tamandaré. Em todas essas fortificações, a partir das variáveis da
207
Configuração Geométrica: principais itens, formato, modelo e inclinação do Reparo, verificouse que os conteúdos são homólogos àqueles do tipo Moderno.
As demais fortificações, como não apresentam as características mais marcantes dos tipos em
questão: tambores e muralhas altas (no entanto, mais baixas que as medievais) (para o tipo de
transição) e baluartes pentagonais (para o tipo moderno) devem ser consideradas uma a uma,
para permitir um olhar mais aprofundado. As fortificações que ainda deverão ser classificadas
são: Forte de São Francisco da Barra, Forte de São Francisco Olinda, Forte Real do Bom Jesus,
Forte Nossa Senhora de Nazaré e Forte de São Francisco Xavier de Gaibu.
Iniciando pelo Forte de São Francisco da Barra, verifica-se que esta é uma fortificação com
formato de eneágono regular, cujas cortinas inclinadas conformam o terrapleno. Essa
configuração, além de não apresentar baluartes modernos, pentagonais, também não apresenta
altas muralhas ou tambores. Deve-se, portanto, considerar seus outros atributos físicos: trata-se
de uma fortificação maciça, com escarpa em talude, logo, menos frágil, e consequentemente,
favorável à defesa do ataque com armas de fogo, pois se configura como um corpo sólido; e
ainda, é uma fortificação com formas geométricas claras (é um polígono regular), e de maior
complexidade geométrica, pois conta com nove lados, demonstrando um maior domínio das
regras geométricas para dividir um círculo em nove partes iguais (essa é uma característica que
vai se consolidando desde o momento de Transição até o Moderno). A partir do exposto, o Forte
de São Francisco da Barra pode ser considerado uma Fortificação Moderna, de pequenas
dimensões: como um fortim ou reduto.
O Forte de São Francisco Olinda, apresenta formato de polígono irregular, quadrangular, e
assim como, o Forte de São Francisco da Barra, não conta com baluartes modernos, nem com
altas muralhas e tambores. Nesse caso também devem ser considerados seus outros atributos
físicos. Trata-se de uma fortificação maciça, com escarpa em talude, portanto, menos frágil,
estando mais bem preparada para se defender do ataque com armas de fogo, pois se configura
como um corpo sólido. Quanto ao seu formato, apesar de não contar com formas geométricas
complexas, como no Forte de São Francisco da Barra, tem formato poligonal, mesmo irregular,
que é uma característica que vai se consolidando no Moderno. A partir do exposto, o Forte de
São Francisco Olinda também pode ser considerado uma Fortificação Moderna, de pequenas
dimensões: como um fortim ou reduto.
208
O Forte Real do Bom Jesus, por sua vez, conta com baluartes na sua configuração geométrica,
e não apresenta altas muralhas ou tambores. No entanto não é evidente que possa ser
considerado, de antemão, uma Fortificação Moderna. Dos seis baluartes existentes, como está
esquematicamente desenhado na figura abaixo, apenas o baluarte 06 apresenta formato
pentagonal (o baluarte 01 é hexagonal; os baluartes 02 e 04 têm quatro lados; e, os baluartes 02
e 05 apresentam três lados, formato que pode categorizá-lo, inclusive, como um cavaleiro e não
baluarte). Deve-se considerar ainda que não é possível afirmar, com clareza, qual o polígono
regular ou irregular que deu origem à fortificação: polígono quadrangular, pentagonal ou
hexagonal.
Figura 61.
Análise da Configuração Geométrica do Forte Real do Bom Jesus, para realizar a sua
classificação tipológica, entre Fortificação de Transição e Fortificação Moderna.
Observando a figura abaixo, pode-se ver que a ortogonalidade da cortina inferior em relação às
cortinas lateral esquerda e lateral direita pode sugerir um polígono quadrangular; no entanto, o
posicionamento dos baluartes 03 e 04 na parte superior da imagem, indicam um pentágono
irregular; finalmente, se a figura original fosse um hexágono, seria um polígono mais próximo
209
de um polígono regular. A incerteza sobre o formato geométrico não é uma característica da
Fortificação Moderna, o formato irregular resultado da adaptação a condicionantes locais, sim,
mas não parece ter sido o caso. No processo adaptativo, há indícios de regularidade no formato,
nessa fortificação não há regularidade na sua configuração geométrica.
Continuando a análise do Forte Real do Bom Jesus, pode-se verificar que dentre as suas obras
externas, as barreiras em formato de linhas que acompanham o recorte do Reparo, identificadas
na iconografia, se parecem estruturalmente com barbacãs55. Estruturas desenvolvidas no âmbito
das Fortificações de Transição. Finalmente, do ponto de vista da capacidade de defesa do Forte,
o formato dos baluartes não propiciou a existência da defesa flancante plena, ou seja, nem todos
os pontos da fortificação poderiam ser defendidos a partir dos flancos, pela ausência de flancos
em alguns baluartes, como pode ser vista na figura acima. Enfim, por todos os argumentos
construídos acima, não é possível classificar o Forte Real do Jesus como uma Fortificação
Moderna; sua configuração geométrica tem semelhanças com aquelas fortificações construídas
por portugueses nas suas colônias africanas, como por exemplo, na remodelação da fortaleza
de Mazagão, em 1541, lembrando o processo de experimentação típico da Fortificação de
Transição.
No que diz respeito ao Forte de Nossa Senhora de Nazaré e Forte de São Francisco Xavier
de Gaibu, o primeiro apresenta uma configuração semelhante às torres marítimas típicas das
Fortificações de Transição, como a Torre de Belém (torre medieval quadrangular conjugada a
um baluarte moderno). A fortificação, em questão, apresenta um conjunto de espaços
compartimentados, na sua parte posterior, agrupados num formato quadrangular, e desta
estrutura partem muros inclinados, em direção ao mar, onde há canhoneiras. Como se pode
observar pela figura abaixo, sua configuração geométrica não conta com baluartes modernos,
conta apenas com a cortina fletida, proporcionando a defesa flancante de uma parte da
fortificação. A partir do exposto, o Forte de Nossa Senhora de Nazaré pode ser considerado
uma Fortificação de Transição.
55
Barbacã são muralhas baixas localizadas no exterior da fortificação, formando uma segunda muralha.
210
Figura 62.
Análise da Configuração Geométrica do Forte de Nossa Senhora de Nazaré, para realizar a sua
classificação tipológica, entre Fortificação de Transição e Fortificação Moderna. Fonte da imagem: site
cidadeinformacao.pt.
Finalmente, a respeito do Forte de São Francisco Xavier de Gaibu, verifica-se que esta é uma
fortificação com formato de pentágono irregular, cujas cortinas inclinadas conformam o
terrapleno. Essa configuração apesar de não apresentar baluartes modernos, pentagonais,
também não apresenta altas muralhas ou tambores. Deve-se, portanto, considerar seus outros
atributos físicos: trata-se de uma fortificação maciça, com escarpa em talude, portanto, menos
frágil, e consequentemente, mais favorável à defesa do ataque com armas de fogo, pois se
configura como um corpo sólido. Conformação característica das Fortificações Modernas. No
entanto, pela sua posição geográfica, no alto de uma escarpa, não está ao alcance dos tiros dos
canhões de nenhuma embarcação inimiga, para atacá-la seria preciso vir por trás, pela terra.
Continuando a análise, observa-se, ainda, que é uma fortificação com formas geométricas
claras, apesar de ser um polígono irregular. Pela exiguidade do terreno, pode-se concluir que
sua irregularidade foi resultado da adaptação ao terreno. Em síntese, pela ausência de elementos
que a caracterizem como uma fortificação de Transição e pela sua estrutura de corpo solido,
211
com reparo em talude, essa fortificação, pode ser classificada como uma Fortificação Moderna,
de pequenas dimensões: como um fortim ou reduto.
Segue abaixo o quadro-síntese do resultado da classificação tipológica das fortificações
construídas em Pernambuco nos séculos XVI e XVII.
Forte de São Jorge;
Forte Real do Bom Jesus;
Forte de Nossa Senhora de Nazaré.
Forte de Santa Cruz de Itamaracá;
Forte de São Tiago das cinco Pontas;
Tamandaré;
Forte de São Francisco de Olinda;
Quadro 4.
6.2
Forte do Brum;
Forte de Santo Inácio de Loyola de
Forte de São Francisco da Barra;
Forte São Francisco Xavier de Gaibu.
Classificação tipológica das fortificações de Pernambuco construídas nos séculos XVI e XVII.
IDENTIFICAÇÃO DE MODELOS EUROPEUS
A partir dos resultados da classificação tipológica, primeira etapa do processo de análise, segue
o processo de análise para identificação de modelos europeus nas fortificações classificadas
como do Tipo Moderno, buscando verificar quais modelos foram utilizados para a construção
dessas fortificações, inclusive para identificar a afiliação a alguma escola de fortificação.
Nos próximos itens serão realizadas análises para verificação do grau de eficácia bélica de todas
as Fortificações (de Transição e Modernas) e, ainda, identificação da transformação ou
permanência tecnológica dos processos construtivos das fortificações de Pernambuco, a partir
da análise sincrônica dos resultados até aqui identificados.
212
A título de facilitar a argumentação, segue a lista de fortificações classificadas como
Fortificação Moderna para serem aqui, analisadas a luz dos modelos normativos publicados nos
Tratados apresentados no Capítulo 4.
Forte de Santa Cruz de Itamaracá;
Forte de São Tiago das cinco Pontas;
Forte de São Francisco da Barra;
Forte do Brum;
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré;
Forte de São Francisco de Olinda; e,
Forte de São Francisco Xavier de Gaibu.
É preciso lembrar, como já foi discutido no Capítulo 4, que os Tratados utilizados para
identificação de modelos são uma amostragem do conjunto de Tratados de Fortificação do
século XVII. Essa amostragem se fundamentou na seleção feita pelo engenheiro português Luís
Serrão Pimentel considerado, nas referências históricas, como um dos autores que representam
a escola portuguesa de fortificação. A essa primeira seleção foi adicionado, ainda, um tratado
da Escola Italiana de Fortificação, por ser a escola precursora dos estudos sobre a Fortificação
Moderna na Europa.
Das fortificações acima listadas, classificadas Modernas, no entanto, algumas não apresentam
modelos que podem ser identificados em um único Tratado, como é o caso do Forte de São
Francisco da Barra, Forte de São Francisco de Olinda, e, Forte de São Francisco Xavier de
Gaibu. Todos esses fortes apresentam um modelo simplificado, com formato poligonal (regular
ou irregular), composto apenas por reparo, terrapleno e cortina. Esse modelo é citado por todos
os autores, como, por exemplo, Scamozzi que apresenta o forte de campanha com formato
triangular ou quadrangular a ser construído longe da fortaleza, de maneira que se for ocupado
não cause problemas (Scamozzi, 1615. p. 187); e, Goldman que trata das pequenas obras, como
os redutos, que são fortificações sem baluarte, que não se defenderiam inteiramente, pois
apresentavam trechos que não poderiam ser vistos da própria obra (Goldman, 1645. p. 3-12).
213
Excluídas essas três fortificações, a análise para identificação dos modelos foi realizada,
portanto, nas seguintes Fortificações Modernas:
Forte de Santa Cruz de Itamaracá;
Forte de São Tiago das cinco Pontas;
Forte do Brum;
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré.
A análise foi feita pela comparação da Configuração Geométrica entre fortificações e modelos
normatizados. Os elementos que a compõe são os mesmos utilizados nos Tratados para
apresentar seus modelos. Na figura abaixo, observa-se uma planta com a nominação e
localização das linhas e ângulos que compõe a Configuração Geométrica de uma fortificação.
Essa planta serviu de mapa para subsidiar as análises seguintes.
Figura 63.
Geométrica.
Planta de fortificação genérica com nomes de linhas e ângulos que compõe a sua Configuração
As plantas de cada uma das quatro fortificações objeto de análise, assim como aquelas de cada
um dos cinco modelos, foram organizadas nesse mesmo padrão, e estão apresentadas no
Capítulo 5 e Capítulo 4, respectivamente. Neste presente capítulo, optou-se por apresentar um
quadro-síntese com as plantas dos modelos e das fortificações estudadas, numa mesma escala,
no intuito de evidenciar, inclusive, as diferenças de dimensão das fortificações construídas e
dos modelos idealizados.
214
Figura 64.
Quadro-síntese, com plantas apresentadas na mesma escala, dos modelos idealizados
selecionados dos Tratados de Fortificação e das Fortificações Modernas construídas em Pernambuco que serão
objeto de análise comparativa entre si.
Observando o quadro-síntese acima, vê-se a pequena dimensão das fortificações, em
comparação com os modelos idealizados, evidenciando a necessidade de reduzir a escala dos
modelos para a escala das fortificações. Foram criadas, portanto, tabelas de redução para cada
fortificação. Essa redução, no entanto, não seguiu o mesmo padrão para cada modelo.
Nos modelos criados por Scamozzi todos os polígonos, que são os formatos de
referência para a construção das fortificações, têm a mesma medida de lado, ou seja,
180 passa (312,96 m). Sendo assim, a redução do modelo de Scamozzi partiu da medida
do lado do polígono (Scamozzi, 1615: p. 185);
Nos modelos criados por Goldman para as grandes obras, todas as fortificações (Forte
Quadrantal, Meio Forte, Forte Dodrantal e Forte Real), têm a medida da cortina fixada,
proporcionalmente, em relação a cortina do Forte Real que é de 480 pieds (135,88 m):
Forte Dodrantal é ¾ do Forte Real (360 pieds ou 101,91 m); Meio Forte é ½ do Forte
Real (240 pieds ou 67,94 m) e Forte Quadrantal é ¼ do Forte Real (120 pieds ou 33,97
m). Sendo assim, a redução dos modelos de Goldman partiu da medida da cortina
(Goldman, 1645: p.13-15); e,
Nos modelos criados por Dogen todas as fortificações apresentam a mesma medida do
lado externo, considerando o alcance do mosquete entre dois baluartes contíguos, ou
215
seja, 60 Verges Rhynlandiques (188,31 m). Sendo assim, a redução do modelo de Dogen
partiu da medida do lado externo (Dogen, 1648: p. 54-55);
A partir dessas considerações iniciais, as análises foram realizadas pela comparação das
medidas lineares e angulares dos elementos que compõe uma fortificação com as medidas
lineares e angulares de todos os modelos procurando identificar o modelo a que mais se
aproximavam. Num segundo momento, foi realizada a comparação entre a planta da fortificação
e a planta do modelo selecionado para confirmar a constatação realizada a partir das medidas.
No caso da verificação se confirmar, pode-se atribuir o modelo selecionado como modelo de
referência utilizado para a construção da fortificação. Segue abaixo as análises para cada uma
das quatro fortificações selecionadas.
FORTE DE SANTA CRUZ DE ITAMARACÁ, 1654
As medidas lineares e angulares dos elementos que compõe a Configuração Geométrica do
Forte de Santa Cruz de Itamaracá e as medidas dos elementos que compõe os modelos de
fortificação estão apresentadas nas tabelas abaixo. Na comparação verifica-se que as medidas
lineares e angulares estão mais próximas aos valores das medidas do modelo denominado
Fortaleza, de formato quadrangular, cujas dimensões e proporções são da 1ª. e 2ª. maneira de
calcular as medidas das fortificações criado por Mathias Dogen.
Medidas
lineares
(Metro)
Fortificação
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e
Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
GOLDMAN
Meio Forte
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 1a e
2a
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 3a
Raio interior
59,61
59,60
55,31
58,25
59,24
65,43
Lado da figura
84,29
84,29
78,22
82,38
83,79
92,56
Garganta
11,72
12,46
8,69
10,77
12,03
16,66
Flanco
12,56
14,47
7,56
7,58
12,55
9,70
Face
34,81
30,82
22,99
25,96
34,79
34,70
Cabeça
30,21
25,66
19,11
20,22
30,52
24,34
Cortina
60,84
59,38
60,84
60,84
59,74
59,23
Segundo flanco
11,64
0,00
32,59
32,54
12,90
15,29
126,97
120,58
105,25
110,99
126,97
126,97
Defesa flancante
96,31
90,63
52,23
55,25
95,82
94,67
Defesa fichante
85,03
0,00
84,13
87,09
83,29
79,68
Lado exterior
Tabela 20.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas da fortificação. Forte Santa Cruz de Itamaracá, 1654.
216
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
GOLDMAN
Meio Forte
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da
1a e 2a
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 3a
Ângulo do centro
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo da figura
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo do baluarte
60,6°
76,31°
60,0°
60,0°
60,0°
60,0°
Ângulo flancante
14,6°
6,84°
15,0°
15,0°
15,0°
15,0°
Ângulo cabeça/garganta
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
Ângulo face/flanco
101,9°
96,84°
105,0°
105,0°
105,0°
105,0°
Ângulo flanco/cortina
87,2°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Inclinação
78,7°
63,43° a 71,57°
63,43°
63,43°
63,43°
63,43°
Medidas angulares
(Graus decimais)
Fortificação
Tabela 21.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas da fortificação. Forte Santa Cruz de Itamaracá, 1654.
Essa constatação também pode ser observada a partir da sobreposição da planta da fortificação
pela planta do modelo de Dogen, apresentada abaixo.
Figura 65.
Sobreposição da planta do Forte de Santa Cruz de Itamaracá com a planta do modelo de Matthias
Dogen selecionado a partir da comparação dos valores das suas medidas lineares e angulares.
217
FORTE DO BRUM, 1654
As medidas lineares e angulares dos elementos que compõe a Configuração Geométrica do
Forte do Brum e as medidas dos elementos que compõe os modelos de fortificação estão
apresentadas nas tabelas abaixo. Na comparação desses valores verifica-se que as medidas
lineares da fortificação estão mais próximas aos valores das medidas do modelo denominado
Castelo e Cidadela, de formato quadrangular, criado por Vicenzo Scamozzi. No entanto, na
comparação dos valores das medidas angulares verifica-se que os valores das medidas da
fortificação estão mais próximos aos valores das medidas de todos os outros modelos.
Significando que nenhum dos modelos utilizados na análise foi empregado para construção do
Forte do Brum.
Medidas
lineares
(Metro)
Fortificação
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e
Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
GOLDMAN
Meio Forte
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 1a e
2a
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 3a
Raio interior
47,08
47,06
30,66
32,29
38,22
42,22
Lado da figura
66,55
66,55
43,36
45,67
54,07
59,72
Garganta
10,79
9,83
4,82
5,97
7,76
10,75
Flanco
10,21
11,43
4,19
4,20
8,10
6,26
Face
25,98
24,33
12,74
14,39
22,45
22,39
Cabeça
23,49
20,26
10,60
11,21
19,70
15,71
Cortina
33,73
46,88
33,73
33,73
38,55
38,22
Segundo flanco
1,14
0,00
18,07
18,04
8,32
9,87
Lado exterior
81,93
95,21
58,35
61,52
81,93
81,93
Defesa flancante
69,08
71,55
28,95
30,63
61,83
61,09
Defesa fichante
70,23
0,00
46,64
48,28
53,74
51,42
Tabela 22.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas da fortificação. Forte do Brum, 1654.
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
GOLDMAN
Meio Forte
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 1a
e 2a
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 3a
Ângulo do centro
90,00°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo da figura
90,00°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo do baluarte
61,13°
76,31°
60,0°
60,0°
60,0°
60,0°
Ângulo flancante
Ângulo
cabeça/garganta
13,86°
6,84°
15,0°
15,0°
15,0°
15,0°
136,21°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
Ângulo face/flanco
Ângulo
flanco/cortina
116,75°
96,84°
105,0°
105,0°
105,0°
105,0°
97,37°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Inclinação
77,19°
63,43° a 71,57°
63,43°
63,43°
63,43°
63,43°
Medidas
angulares
(Graus decimais)
Fortificação
Tabela 23.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas da fortificação. Forte do Brum, 1654.
218
FORTE DE SANTO INÁCIO DE LOYOLA DE TAMANDARÉ, 1654
As medidas lineares e angulares dos elementos que compõe a Configuração Geométrica do
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré e as medidas dos elementos que compõe os
modelos de fortificação estão apresentadas nas tabelas abaixo. Na comparação desses valores
verifica-se que as medidas da fortificação estão mais próximos aqueles do modelo denominado
Fortaleza, de formato quadrangular, cujas dimensões e proporções são da 1ª. e 2ª. maneira de
calcular as medidas das fortificações criado por Dogen.
Medidas
lineares
(metro)
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
GOLDMAN
Meio Forte
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 1a e 2a
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 3a
Raio interior
47,70
47,70
41,91
44,14
46,30
51,14
Lado da figura
67,46
67,46
59,27
62,43
65,49
72,34
Garganta
10,67
9,97
6,58
8,16
9,40
13,02
Flanco
9,71
11,58
5,73
5,75
9,81
7,58
Face
27,80
24,66
17,42
19,67
27,19
27,12
Cabeça
22,77
20,53
14,48
15,32
23,86
19,02
Cortina
46,10
47,52
46,10
46,10
46,69
46,29
Segundo flanco
6,94
0,00
24,70
24,66
10,08
11,95
Lado exterior
99,24
96,50
79,76
84,10
99,24
99,24
Defesa flancante
69,77
72,53
39,58
41,87
74,89
73,99
Defesa fichante
74,61
0,00
63,75
66,00
65,10
62,27
Fortificação
Tabela 24.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas do Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, 1654.
Medidas angulares
(graus decimais)
Fortificação
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e
Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
Valor teórico
DOGEN
GOLDMAN
Fortaleza da 1a
½ Forte
e 2a
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 3a
Ângulo do centro
90,00°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo da figura
90,00°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo do baluarte
63,44°
76,31°
60,0°
60,0°
60,0°
60,0°
Ângulo flancante
13,29°
6,84°
15,0°
15,0°
15,0°
15,0°
Ângulo cabeça/garganta
134,99°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
Ângulo face/flanco
101,91°
96,84°
105,0°
105,0°
105,0°
105,0°
Ângulo flanco/cortina
87,58°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Inclinação
78,03°
63,43° a 71,57°
63,43°
63,43°
63,43°
63,43°
Tabela 25.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas do Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, 1654.
Essa constatação também pode ser observada a partir da sobreposição da planta da fortificação
pela planta do modelo de Dogen, apresentada abaixo.
219
Figura 66.
Sobreposição da planta do Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré com a planta do
modelo de Matthias Dogen selecionado a partir da comparação dos valores das suas medidas lineares e angulares.
FORTE SÃO TIAGO DAS CINCO PONTAS, 1684
As medidas lineares e angulares dos elementos que compõe a Configuração Geométrica do
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré e as medidas dos elementos que compõe os
modelos de fortificação estão apresentadas nas tabelas abaixo. Na comparação desses valores
verifica-se que as medidas lineares e angulares da fortificação estão mais próximas aquelas do
modelo denominado Fortaleza, de formato quadrangular, cujas dimensões e proporções são da
1ª. e 2ª. maneira de calcular as medidas das fortificações criado por Mathias Dogen.
Medidas
lineares
(Metro)
Fortificação
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e
Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
GOLDMAN
Meio Forte
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 1a e
2a
Valor teórico
DOGEN
Fortaleza da 3a
Raio interior
37,68
34,01
32,25
33,97
34,59
38,21
Lado da figura
48,10
48,10
45,61
48,04
48,93
54,05
Garganta
7,25
7,11
5,07
6,28
7,02
9,73
Flanco
8,44
8,26
4,41
4,42
7,33
5,67
Face
18,73
17,58
13,41
15,14
20,32
20,26
Cabeça
18,11
14,64
11,15
11,79
17,82
14,21
Cortina
35,48
33,88
35,48
35,48
34,88
34,59
220
Segundo flanco
7,56
0,00
19,01
18,97
7,53
8,93
Lado exterior
74,15
68,80
61,37
64,72
74,15
74,15
Defesa flancante
52,64
51,71
30,46
32,22
55,95
55,28
Defesa fichante
60,00
0,00
49,06
50,79
48,64
46,53
Tabela 26.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas do Forte de São Tiago das Cinco Pontas, 1654.
Medidas angulares
(Graus decimais)
Fortificação
Média
Valor teórico
SCAMOZZI
Castelo e
Cidadela
Valor teórico
GOLDMAN
F.Quadrantal
Valor teórico
GOLDMAN
Meio Forte
Valor teórico
DOGEN
Fortes da 1a e 2a
Valor teórico
DOGEN
Fortes da 3a
Ângulo do centro
100,69°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo da figura
90,03°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Ângulo do baluarte
61,84°
76,31°
60,0°
60,0°
60,0°
60,0°
Ângulo flancante
14,08°
6,84°
15,0°
15,0°
15,0°
15,0°
Ângulo cabeça/garganta
135,00°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
135,0°
Ângulo face/flanco
117,03°
96,84°
105,0°
105,0°
105,0°
105,0°
Ângulo flanco/cortina
102,95°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
90,0°
Inclinação
76,53°
63,43° a 71,57°
63,43°
63,43°
63,43°
63,43°
Tabela 27.
Comparação entre valor teórico dos modelos de fortificação a partir dos Tratados do século XVII
com o valor da média das medidas do Forte de São Tiago das Cinco Pontas, 1654.
Figura 67.
Sobreposição da planta do Forte de São Tiago das Cinco Pontas com a planta do modelo de
Matthias Dogen selecionado a partir da comparação dos valores das suas medidas lineares e angulares
____…___
221
A partir das análises realizadas pela comparação dos valores das medidas lineares e angulares
entre fortificações construídas e modelos idealizados constata-se que o modelo de fortificação
denominado Fortaleza, de formato quadrangular, cujas dimensões e proporções são da 1ª. e 2ª.
maneira de calcular as medidas das fortificações, criado por Mathias Dogen, foi
recorrentemente utilizado para construir fortificações em Pernambuco. Das quatro fortificações
analisadas, em três delas, as medidas são semelhantes: Forte de Santa Cruz de Itamaracá, Forte
de São Tiago das Cinco Pontas e o Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré. Apenas no
Forte do Brum, não foi possível identificar o modelo que deu origem à fortificação, pois
nenhum dos modelos selecionados apresentou os valores das medidas lineares e angulares
semelhantes aos valores da fortificação.
Matthias Dogen (1605-1672), arquiteto militar, foi o autor do modelo que foi utilizado em três
das quatro fortificações construídas em Pernambuco no século XVII. Um dos teóricos que
representava a Escola holandesa de fortificação, Dogen projetou na muralha e nos baluartes,
em terra, para serem muito largos e muito baixos, como montanhas numa planície. A simetria,
as medidas e a relação das partes da fortificação entre si eram, para Dogen, instrumentos para
construir uma fortificação perfeita. A escola de fortificação holandesa se diferenciava das
demais pela utilização de fosso largo, muralhas em terra, falsabraga (estrutura que substituiu o
barbacã da Fortificação Medieval no reforço da proteção da cortina), caminho coberto e
esplanada, e ainda pela utilização do ângulo reto entre flancos e cortinas nos seus baluartes
(Valla, 2007: p. 209 e 211-212).
Nas fortificações construídas em Pernambuco foram encontrados vestígios de fosso em todos
os fortes analisados, porém não há vestígios da falsabraga, nem de caminho coberto e
esplanada. No Forte de Santa Cruz de Itamaracá observa-se apenas uma estrutura em alvenaria
de pedra com restos de madeira, espaçadamente posicionadas, que poderiam ser a fundação de
uma paliçada de madeira.
Quanto aos ângulos dos flancos e cortinas nas fortificações de Pernambuco, em duas das
fortificações que seguiram o modelo holandês verifica-se a intensão da utilização do ângulo
reto, e em uma delas, observa-se a utilização intencional de um ângulo obtuso, cujo valor médio
é 103,9°.
222
Foto 37. Estrutura em alvenaria de pedra com restos de madeira, posicionadas nos locais demarcados na imagem.
A estrutura esta localizada ao longo da cortina sudeste do Forte de Santa Cruz de Itamaracá.
Fortificações Modernas de Pernambuco
Forte de Santa Cruz de Itamaracá
Forte do Brum
Forte de São Tiago das cinco Pontas
Forte de Sto Inácio de Loyola de
Tamandaré
Ângulo flanco/ cortina
Média
87,3°
103,7°
104,6°
88,5°
103,6°
102,4°
87,2°
99,9°
100,7°
87,3°
86,8°
102,5°
90,5°
86,7°
102,6°
83,2°
103,2°
102,7°
87,3°
86,5°
103,8°
103,9°
86,5°
97,3°
103,9°
88,7°
89,2°
88,7°
86,1°
83,3°
89,2°
87,8°
90,9°
90,9°
Tabela 28.
Valores dos ângulos entre flanco e cortina do Forte de Santa Cruz de Itamaracá, Forte de São
Tiago das Cinco Pontas, Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré e Forte do Brum obtidos no levantamento
de campo para verificar sua proximidade com o ângulo de 90°.
Pela tabela apresentada acima, pode-se observar que no Forte de Santa Cruz de Itamaracá e
Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré, os ângulos entre flanco e cortina variam de
83,2° a 90,5° e de 83,3° a 90,9°, respetivamente, seguindo a preocupação da escola holandesa
e demonstrando a obediência ao modelo. Já no Forte de São Tiago das Cinco Pontas, no entanto,
a variação é de 100,7° a 104,6°, apesar desse forte ter seguido o modelo de fortificação de
Matthias Dogen, membro da Escola Holandesa de Fortificação. O Forte do Brum, pelo
contrário, apesar de não poder se associado ao modelo holandês apresentou a intenção em
utilizar o ângulo de 90° entre cortina e flanco, como se pode observar na tabela abaixo.
223
6.3
VERIFICAÇÃO DA EFICÁCIA BÉLICA
Dando prosseguimento ao processo de análise, busca-se verificar o grau de eficácia bélica das
fortificações construídas em Pernambuco nos séculos XVI e XVII. Retomando o conceito
apresentado no Capítulo 3, eficácia bélica diz respeito à capacidade que tem uma fortificação
de cumprir sua função precípua: se defender e defender um determinado lugar. No âmbito dessa
pesquisa, a constatação da capacidade de se defender está relacionada:
ao tipo de fortificação construída, no caso de Pernambuco, ou Fortificação de
Transição ou Fortificação Moderna, haja vista não haver referências da existência de
Fortificação medieval na Capitania;
ao modelo de fortificação moderna utilizado, se este conta com linhas flancantes e,
consequentemente, com largas faixas de defesa; e,
com a obediência ao modelo, considerando a capacidade intrínseca do modelo de se
defender, portanto, quanto mais semelhante ao modelo maior sua eficácia bélica.
EFICÁCIA BÉLICA X TIPOLOGIA
Do ponto de vista da eficácia bélica relacionada à tipologia de fortificação, é preciso retomar
as referências apresentadas no Capítulo 1, para facilitar a análise. Como já foi apresentado, a
Fortificação de Transição era um tipo de fortificação intermediário, entre a Fortificação
Medieval e a Fortificação Moderna, que foi desenvolvido porque a Fortificação Medieval
tornou-se ineficaz diante das armas de fogo da artilharia pirobalistica. No entanto, com o
aprimoramento da artilharia, a partir do surgimento de canhões com elevado poder de
destruição, a partir de 1530, esse tipo de fortificação, por sua vez, tornou-se ineficaz diante do
aumento de poder das armas de fogo da artilharia pirobalistica. A Fortificação de Transição,
grosso modo, era formada por muralhas altas, intercaladas por tambores vazios, uma estrutura
frágil diante dos canhões de alto calibre em uso desde 1530, em toda a Europa. Esse tipo de
fortificação, portanto, tinha reduzida capacidade de se defender das armas de fogo em utilização
no século XVI e XVII, sua eficácia bélica nesse período, diante da artilharia pirobalística com
poder de destruição, era baixa. As Fortificações Modernas, diferentemente, foram
desenvolvidas para resistir ao impacto das balas dos canhões, com suas muralhas formadas por
reparos baixos, largos e maciços. A eficácia bélica de uma Fortificação Moderna, portanto, já
é maior que a de uma Fortificação de Transição, independente do modelo utilizado.
224
EFICÁCIA BÉLICA X LINHAS FLANCANTES
No que concerne à eficácia bélica relacionada ao modelo de fortificação moderna, também se
deve retomar as referências apresentadas no Capítulo 1, relativas à capacidade que tem uma
fortificação de se defender observando as linhas flancantes e, consequentes, faixas de defesa.
Figura 68.
Representação das faixas de defesa nos modelos europeus e nas fortificações de Pernambuco,
utilizando as plantas com a mesma medida do lado externo para poder comparar a largura das faixas e
consequentemente, verificar quais plantas apresentam maior capacidade de defesa.
Retomando o argumento da importância do baluarte para o desenvolvimento da Fortificação
Moderna, foi apresentado no referido capítulo que o baluarte, por ser uma estrutura que se
projetava para fora da muralha, permitiria atirar no inimigo que tentasse se aproximar da
fortificação. Essa defesa era feita através de tiros de canhões cuja trajetória desenharia uma
linha que foi denominada, linhas flancantes: linhas que partiam dos flancos em direção à face
do baluarte contíguo, paralela à face. Cada linha poderia significar um canhão e o conjunto de
225
linhas formava uma faixa de defesa, por isso, quanto mais larga fosse a faixa de defesa, maior
a capacidade de defesa da fortificação.
Na figura acima é possível observar a diferentes larguras de faixas de defesa dos modelos
identificados nos Tratados e nas fortificações construídas em Pernambuco. Observa-se que o
modelo de Scamozzi é o que apresenta faixa de defesa mais estreita e o modelo de Dogen,
fortaleza da 3ª. maneira de calcular as medidas de uma fortificação é o que apresenta a faixa de
defesa mais larga. Os demais modelos apresentam faixa de defesa de largura mediana.
No caso das fortificações de Pernambuco, todas as fortificações abaluartadas apresentam faixas
de defesa, praticamente, da mesma largura apresentando uma largura mediana. Com exceção
para o Forte Real do Bom Jesus, que faixa de defesa apresenta uma largura diferente. Destaque
para o Forte de Nossa Senhora de Nazaré que apresenta duas faixas de defesa muita largas, mas
apenas em uma cortina, aquela voltada para o mar. As demais cortinas não têm, portanto, como
se defender. Deve-se chamar a atenção, no entanto, para a inexistência de faixas de defesa no
lado não abaluartado do Forte do Brum e nas demais fortificações não-abaluartadas. Nessas
fortificações e nesse lado do Forte do Brum, não é possível defender a estrutura, deixando-a
suscetível ao ataque do inimigo, reduzindo sua eficácia bélica.
Quadro 5.
Quadro-síntese da capacidade de defesa das fortificações de Pernambuco relacionada à
existência de linhas flancantes.
EFICÁCIA BÉLICA X OBEDIÊNCIA AO MODELO (TRATADO X FORTIFICAÇÃO)
Finalmente, quanto à identificação da eficácia bélica das fortificações pela fidelidade ao
modelo, precisa ser observado o grau de semelhança entre as duas Configurações Geométricas:
das fortificações e do modelo. Essa análise considera o pressuposto de eficácia bélica intrínseca
ao modelo, haja vista que a função de se defender é função precípua de uma fortificação. Essa
análise só pode ser feita nas fortificações para as quais foram identificados modelos de
referência, foram elas: Forte de Santa Cruz de Itamaracá, Forte de São Tiago das Cinco Pontas
e Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré.
226
Figura 69.
Sobreposição Tratado x fortificações.
A semelhança foi identificada a partir da sobreposição do modelo sobre a fortificação, como se
observa na figura abaixo. A partir da sobreposição, constata-se que o Forte de São Francisco da
Barra, Forte de Santa Cruz de Itamaracá, Forte de São Tiago das Cinco Pontas e Forte de Santo
Inácio de Loyola de Tamandaré são semelhantes aos modelos. Já o Forte de São Francisco de
Olinda, Forte de São Francisco Xavier de Gaibu tem formato diferente dos modelos
quadrangular e pentagonal, respectivamente.
Á título de sínteses, a tabela abaixo apresenta os resultados das análises referentes à eficácia
bélica das fortificações de Pernambuco.
Quadro 6.
Quadro-síntese da eficácia bélica das fortificações de Pernambuco.
227
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das informações que resultaram das análises apresentadas no capítulo anterior, podem
ser fazer algumas reflexões sobre a efetiva transformação tecnológica nos processos
construtivos das fortificações de Pernambuco, principalmente após a invasão holandesa.
7.1
TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS
Essas transformações consistiram, inicialmente, no incremento da eficácia bélica em
fortificações do tipo de Transição; em seguida, na troca do tipo de Transição pelo tipo Moderno,
que já corresponde a um incremento da eficácia bélica nas fortificações; e, complementarmente,
no incremento da eficácia bélica em fortificações do tipo Moderno. Deve-se registrar, no
entanto, que essas transformações não ocorreram numa ordem crescente e acumulativa,
corroborando com precisão a ideia de Quintanilla e Basalla, quando defendem que as
transformações tecnológicas não são lineares, são rápidas ou lentas, caóticas ou progressivas,
acumulativas ou dispersas.
PRIMEIRO SISTEMA DEFENSIVO PORTUGUÊS
No que concerne ao Primeiro Sistema Defensivo Português, anterior à chegada dos holandeses,
três fortificações puderam ser analisadas, sendo que apenas uma era do tipo de Transição,
enquanto as outras duas eram do tipo Moderno. A escolha quase predominante pelo tipo
Moderno condiz com do tipo de armas de fogo que se usava na Europa, desde 1530,
especificamente, a artilharia pirobalística com efeito de destruição.
A única fortificação do tipo de Transição foi o Forte de São Jorge, construído a partir de 1590.
Sobre suas características físicas pouco se sabe, pois ainda não há vestígios arqueológicos
conhecidos; sabe-se, no entanto, pela iconografia, que é uma típica fortificação de Transição.
Sua estrutura é formada por muralhas altas e estreitas, com dois níveis de canhoneiras, além de
canhoneiras no terraço, e por quatro tambores nos ângulos. Como demonstram as referências
históricas identificadas no Capítulo 2, essa estrutura não era capaz de se defender do ataque da
artilharia pirobalística com seu efeito de destruição. Chegou a ser considerada pelos
holandeses, no momento da invasão, como de pouca importância, sob o argumento de que os
canhões dos navios seriam capazes de danificá-la, enquanto os navios inimigos pouco seriam
molestados por ela.
228
As demais fortificações construídas antes da chegada dos holandeses, e analisadas nesse
trabalho: Forte de São Francisco da Barra e Forte de São Francisco de Olinda, apresentavam,
por sua vez, características físicas coincidentes com aquelas das Fortificações Modernas. Eram
fortificações formadas por uma estrutura maciça composta por reparo, com escarpa em talude,
de baixa altura. No entanto, eram fortificações que além de não ter baluartes, eram de pequena
dimensão, cerca de 20 m de diâmetro, o Forte de São Francisco da Barra e cerca de 14 m de
largura por 20 m de comprimento, o Forte de São Francisco de Olinda.
Esse modelo de fortificação maciça, quadrangular, sem baluartes, tanto podia ser encontrado
em todos os tratados de fortificação do século XVII, como podia nem ser apresentado, por ser
um modelo bastante difundido e conhecido entre os homens de guerra, que não necessitava de
uma apresentação estruturada em documento. Esse modelo, no entanto, não era considerado de
muita capacidade de defesa. Segundo Goldman, os Redutos, como foram denominados, não
eram capazes de se defender inteiramente e o inimigo poderia se aproximar sem resistência
(Goldman, 1645: p. 3-12). Segundo Scamozzi, que denominou esse modelo de forte de
campanha, ele servia para incomodar o inimigo, mas deveria ser construído longe da fortaleza,
pois se fosse tomado não traria grandes problemas (Scamozzi, 1615: p.187).
Em síntese, as análises aqui apresentadas confirmam que, do ponto de vista da transformação
tecnológica, antes da chegada dos holandeses, os portugueses optaram por utilizar duas
diferentes técnicas. Num primeiro momento, em 1590, construíram uma Fortificação de
Transição: o Forte de São Jorge; num segundo momento, a partir de 1620, construíram duas
Fortificações Modernas. Já se poderia falar, portanto, em transformação tecnológica nesse
período.
No entanto, do ponto de vista da transformação tecnológica como resposta à necessidade de
aumentar a eficácia bélica das fortificações e do Sistema Defensivo, a mudança do tipo de
fortificação não trouxe grande incremento à eficácia bélica do primeiro Sistema Defensivo de
Pernambuco. Lembrando que, nessa pesquisa, a eficácia bélica está sendo considerada como
um pressuposto básico para a construção de uma fortificação. O modelo de Fortificação
Moderna escolhido, além de ter pequena dimensão, não poderia reunir grande quantidade de
artilharia, nem de homens de guerra. Não contava com linhas flancantes e, portanto, não poderia
fazer a defesa flancante. No caso específico do Forte de São Francisco de Olinda, este foi
construído em desobediência ao modelo quadrangular, resultando numa figura geométrica
229
irregular. O Sistema Defensivo antes da invasão holandesa apresentava baixa capacidade
defensiva, ou seja, belicamente era ineficaz.
SEGUNDO SISTEMA DEFENSIVO PORTUGUÊS
Com relação ao Segundo Sistema Defensivo Português, durante a permanência dos holandeses
em Pernambuco, período em que foram construídas oito fortificações 56, como foi apresentado
no Capítulo 2, apenas três puderam ser analisadas nesse trabalho. Das três fortificações
analisadas, duas eram do tipo Fortificação de Transição e uma era do tipo Moderno. A escolha
pela utilização do tipo de Fortificação de Transição, em pleno século XVII, não condiz com do
tipo de armas de fogo que se usava na Europa, a artilharia pirobalística com poder de destruição.
As duas fortificações do tipo de Transição foram o Forte Real do Bom Jesus e o Forte de Nossa
Senhora de Nazaré. O Forte Real do Bom Jesus, construído em 1630, apesar de contar com
baluartes e ter a estrutura composta por reparo com escarpa em talude, foi considerado uma
fortificação de Transição. A análise das suas características físicas revelou que seus baluartes
eram atípicos; seu formato era ambíguo, não sendo evidente qual polígono regular deu origem
à fortificação; contava com obras externas típicas da Fortificação de Transição (barbacã), e não
apresentava defesa completa, tinha linhas flancantes, mas que não envolviam toda a
fortificação. O Forte de Nossa Senhora de Nazaré, por sua vez, construído em 1631, também
foi classificado como Fortificação de Transição, pois não contava com baluartes modernos e,
tinha linhas flancantes em apenas uma cortina.
A outra fortificação construída durante a presença dos holandeses e analisada nesse trabalho, o
Forte de São Francisco de Xavier de Gaibu apresentava, por sua vez, características físicas
coincidentes com aquela da Fortificação Moderna. Esse Forte, construído em 1634, era formado
por uma estrutura maciça composta por reparo, com escarpa em talude, de baixa altura. Assim
como o Forte de São Francisco de Olinda e o Forte de São Francisco da Barra, construídos em
1620, não tinha baluartes e era de pequena dimensão (cerca de 20 m de diâmetro). Esse modelo
não era considerado de muita capacidade de defesa.
56
As oito fortificações construídas de 1630 a 1654 foram: 1. Forte Real do Bom Jesus. 1630; 2.Reduto em
Itamaracá. 1632; 3.Forte de Nossa Senhora de Nazaré. 1631; 4. Baterias de São Jorge. 1632; 5.Forte do Pontal.
1633; 6.Forte do Rio Formoso. 1632; 7.Forte de São Francisco Xavier de Gaibú. 1634; e, 8.Forte Novo do Bom
Jesus. 1645.
230
Em síntese, do ponto de vista da transformação tecnológica, durante a permanência dos
holandeses, observa-se que os portugueses optaram novamente por utilizar duas diferentes
técnicas. Num primeiro momento, em 1630 e 1631, construíram duas Fortificações de
Transição: Forte Real do Bom Jesus e o Forte de Nossa Senhora de Nazaré. Num segundo
momento, a partir de 1634, construíram uma Fortificação Moderna. Nesse período também se
pode falar em transformação tecnológica; no entanto, verifica-se que os portugueses voltaram
a utilizar o tipo de Transição, apesar de já terem construído Fortificações Modernas na
Capitania, anteriormente. Parece que houve um atraso na Capitania de Pernambuco,
considerando que as Fortificações de Transição já não eram eficazes belicamente.
No entanto, do ponto de vista da transformação tecnológica como resposta à necessidade de
aumentar a eficácia bélica das fortificações e do Sistema Defensivo, os formatos das
Fortificações de Transição construídas possibilitaram um incremento à eficácia bélica do
segundo Sistema Defensivo de Pernambuco. Tanto no Forte Real do Bom Jesus como no Forte
de Nossa Senhora de Nazaré os formatos utilizados possibilitaram a formação de linhas
flancantes, elemento não explorado do primeiro sistema defensivo (nem mesmo no modelo de
Fortificação Moderna utilizado). Por outro lado, o modelo de Fortificação Moderna escolhido,
nesse segundo sistema defensivo, repetindo o modelo escolhido no Sistema Defensivo anterior,
não contava com linhas flancantes. O Sistema Defensivo implantado pelos portugueses em
Pernambuco, durante a invasão holandesa, também apresentava baixa capacidade defensiva,
porém era um pouco mais eficaz que o primeiro Sistema Defensivo.
TERCEIRO SISTEMA DEFENSIVO PORTUGUÊS
Finalmente, após a desocupação de Pernambuco pelos holandeses, foi instalado o Terceiro
Sistema Defensivo Português. Das dez fortificações construídas nesse período57, como foi
apresentado no Capítulo 2, apenas quatro puderam ser analisadas nesse trabalho 58. Todas as
fortificações analisadas eram do tipo Fortificação Moderna. A escolha predominante pelo tipo
57
As dez fortificações construídas, recuperadas ou reformas de 1654 até o final do século XVII foram: 1.Forte de
São Francisco da Barra; 2.Forte do Brum. 1654; 3.Forte Madame Brum. 1654; 4.trincheira na porta da povoação;
5.Forte de São Tiago das Cinco Pontas; 6. Forte de São Francisco de Olinda; 7.Forte de Santa Cruz de Itamaracá.
1654; 8. Forte de Nossa Senhora de Nazaré; 9. Forte de São Francisco Xavier de Gaibu; 10. Forte de Santo Inácio
de Loyola de Tamandaré. 1654.
58
Do conjunto de dez fortificações, quatro delas já foram analisadas neste trabalho, pois integram Sistemas
Defensivos anteriores, são elas: Forte de São Francisco da Barra, Forte de São Francisco de Olinda, Forte de Nossa
Senhora de Nazaré e Forte de São Francisco Xavier de Gaibu.
231
Moderno condiz com o tipo de armas de fogo que se usava na Europa, desde 1530,
especificamente, a artilharia pirobalística com efeito de destruição.
As quatro fortificações estudadas: o Forte do Brum, Forte de Santa Cruz de Itamaracá, Forte de
Santo Inácio de Loyola de Tamandaré e o Forte de São Tiago das Cinco Pontas, construído a
partir de 1654, são fortificações com formato de polígono quadrangular composto por reparo
maciço, com escarpa em talude, contendo baluarte pentagonais e regulares (com suas faces e
flancos) e cortina. Eram fortificações que tinham tamanho mediano, variando de 80 x 75 m até
120 x 120 m, de baluarte a baluarte. Esse modelo era considerado capaz de defender um sítio.
Em síntese, do ponto de vista da transformação tecnológica no período após a capitulação
holandesa, observa-se que os portugueses optaram por utilizar apenas uma técnica: construíram
fortificações do Tipo Moderno; utilizando um mesmo modelo. Não é possível falar de
transformação tecnológica nesse período, no entanto, é possível tratar de transformação
tecnológica na comparação com os Sistemas Defensivos anteriores. Verifica-se que os
portugueses deixaram de usar o modelo de fortificação formada por uma estrutura pequena,
maciça, composta por reparo, com escarpa em talude, de baixa altura e sem baluarte, para
utilizar uma estrutura maior e com baluartes poligonais.
Finalmente, do ponto de vista da transformação tecnológica como resposta à necessidade de
aumentar a eficácia bélica das fortificações e do Sistema Defensivo, o formato das Fortificações
Modernas construídas em Pernambuco possibilitou um incremento significativo na eficácia
bélica do terceiro Sistema Defensivo. Em todas as fortificações, a incorporação dos baluartes
possibilitou a formação de linhas flancantes e a execução das obras não modificou
significativamente o modelo normatizado, mantendo um bom grau de semelhança entre as
fortificações e seus modelos. Pode-se constatar, portanto, que o Sistema Defensivo implantado
pelos portugueses em Pernambuco, após a invasão holandesa, apresentava uma boa capacidade
defensiva.
____…___
A partir do exposto segue quadro síntese das fortificações de Pernambuco indicando para cada
uma das três fases bélicas, desde o final do século XVII até a primeira metade do século XVII,
a classificação tipológica, os modelos de fortificação Moderna utilizados, a capacidade de
defesa relacionada à existência de linhas flancantes e a eficácia bélica. Fica evidenciado,
portanto, que na primeira fase foram utilizadas duas diferentes técnicas: uma fortificação de
232
Transição e duas Modernas, demonstrando uma transformação tecnológica nesse período
apesar de não ter havido incremento à eficácia bélica. Na segunda fase, houve novamente o
emprego de duas diferentes técnicas: duas fortificações de Transição e uma Moderna,
conformando novamente uma transformação tecnológica que desta vez possibilitou em uma das
fortificações uma certa eficácia bélica pela utilização de linhas flancantes. E na terceira fase,
houve a construção de fortificações do Tipo Moderno; indicando uma transformação
tecnológica na comparação com os Sistemas Defensivos anteriores promovendo um incremento
significativo na eficácia bélica dessas fortificações.
Quadro 7.
Quadro-síntese indicando a classificação tipológica, os modelos de fortificação Moderna
utilizados, a capacidade de defesa relacionada à existência de linhas flancantes e a eficácia bélica das fortificações
de Pernambuco durante as três fases bélicas desde o final do século XVII até a primeira metade do século XVII.
A UTILIZAÇÃO DE TRATADOS NA CONSTRUÇÃO DAS FORTIFICAÇÕES EM PERNAMBUCO
Continuando as nossas reflexões, especificamente sobre a utilização de Tratados pelos
portugueses ao longo dos séculos XVI e XVII, vale ressaltar que os modelos oriundos de
Tratados sobre fortificações foram utilizados desde o primeiro Sistema Defensivo até o terceiro.
Entretanto, os primeiros modelos utilizados no Forte de São Francisco da Barra, em 1608, no
Forte de São Francisco de Olinda, em 1620 e no Forte de São Francisco Xavier de Gaibu, em
1634, foram modelos simplificados, sem baluartes. Consistiam em formas puras: noneágono,
quadrangulo e um pentágono, constituído por uma estrutura maciça composta por reparo, com
escarpa em talude, de baixa altura. Nem todos os Tratados apresentam esse modelo em seu
233
conteúdo, provavelmente por ser bem conhecido entre os profissionais envolvidos com a guerra.
Os modelos utilizados no terceiro Sistema Defensivo, por sua vez, já eram mais complexos e,
portanto, eram objeto de apresentação nos Tratados. Como fica demonstrado na figura abaixo.
A análise realizada pela comparação entre modelos e fortificações revelou que o Forte de Santa
Cruz de Itamaracá, o Forte de São Tiago das Cinco Pontas e o Forte de Santo Inácio de Loyola
de Tamandaré podem ser produto de um mesmo Tratado holandês, de autoria de Matthias
Dogen. Essas três fortificações foram construídas após a capitulação holandesa, sugerindo que
possa ter havido alguma influência.
Deve-se registrar, no entanto, duas questões. Primeiro, que a influência holandesa pode não ter
sido resultado apenas da presença holandesa na Capitania durante 24 anos. Pode também ter
resultado da cooperação militar acordada entre Portugal e Holanda, no âmbito do primeiro
Tratado de Haia, de 1641. Além da trégua de 12 anos, ficou acordada a união de forças contra
a Espanha (Procópio, 2014: p. 2). Um exemplo de que, de fato, houve cooperação militar entre
as duas nações foi a construção da praça-forte de Elvas, com projeto do jesuíta holandês João
Piscácio Cosmander.
A outra questão trata até que ponto chegou a influência da tratadística holandesa na construção
de fortificações em Pernambuco. Apesar do levantamento das fortificações construídas na
Capitania ter identificado a utilização do modelo de fortaleza de Matthias Dogen, exceto no
Forte do Brum, todas essas fortificações, incluindo o Forte do Brum, estão construídas ou ao
menos revestidas em pedra, utilizando rocha calcária ou arenítica. Essa não é uma
recomendação da tratadística da escola holandesa. Pelo contrário, como ficou demonstrado no
Capitulo 4, os holandeses eram categóricos em defender a terra como o material mais adequado
para se construir uma fortificação.
234
Figura 70.
Simulação da evolução das fortificações construídas em Pernambuco antes da invasão holandesa:
Fortificação de Transição; e após a saída dos holandeses, Fortificação moderna abaluartada, que reuniu o Modelo
holandês, material construtivo italiano e inclinação do século XVI.
235
O encamisamento do reparo em terra, utilizando a pedra ou tijolo como revestimento, era uma
recomendação dos tratadistas italianos. Por fim, deve-se ressaltar que, as obras do reparo dessas
fortificações, em todos os sistemas construtivos, executaram os taludes com inclinação que
variava de 70,7º a 82,2º, no primeiro Sistema Defensivo. No segundo Sistema Defensivo, a
inclinação do talude variou de 78,5º a 78,7º. E, finalmente, no terceiro Sistema Defensivo a
inclinação variou de 76,5º a 78,7º. Essa inclinação não era a recomendada nos tratados do século
XVII, os autores indicavam, unanimemente, a inclinação de 63,43º. Essa inclinação maior era
usual entre os tratadistas no século XVI, como Girolamo Maggi e Sebastiano Serlio e Carlo
Theti.
Quanto à utilização de Tratados europeus em Pernambuco, portanto, pode-se concluir que essa
foi uma prática dos colonizadores. No entanto, não houve obediência a um único Tratado; já se
observava na prática portuguesa na Capitania, a tendência da segunda metade do século XVII
em toda a Europa, ou seja, a consulta a diversos tratados enquanto referências para produzir um
novo modelo, que pode ser chamado de híbrido, mas pode também ser considerado um modelo
original português em Pernambuco.
7.2
AS ESCOLHAS TECNOLÓGICAS COMO RESULTADO DAS POSTURAS COLONIZADORAS
Como explicar a opção por um determinado produto, mesmo sabendo da sua inadequação para
o fim a que se propõe? As respostas mais ordinárias seriam justificá-la a partir da falta de
recursos ou do desconhecimento, ou seja, atribuindo a responsabilidade a circunstâncias alheias
a sua vontade ou distante da sua capacidade de interferência. Considerando, inclusive
inadequada o termo ‘escolha’. Pois, de fato, a justificativa mor seria considerá-la uma
imposição.
No caso das fortificações construídas em Pernambuco, ao longo dos séculos XVI e XVII, a
justificativa do desconhecimento não poderia ser aceita, haja vista todo o investimento de
Portugal, enquanto Nação, para sua introdução na ‘modernidade’. Desde o início do século XV,
já havia, em Portugal, preceptores italianos para os nobres, além de intelectuais estrangeiros,
que eram chamados pelo Governo e pela Igreja, para atuar em território português e nas
colônias. Portugal também estava se preparando para defender seu Império, foram traduzidos
tratados, contratados estrangeiros, enviados engenheiros para a Itália. Foi feito todo um esforço
para a formação de profissionais na arte da guerra (Wehling. 1999: p. 21 e 36).
236
A justificativa financeira, por sua vez, não é tão simples de refutar. De fato, o Brasil era
considerado uma colônia de segunda categoria, no século XVI e início do XVII, os interesses
estavam no Oriente. Portugal não ia investir em Pernambuco. Essa justificativa econômica, na
realidade, estava intimamente relacionada às questões de fundo político, Portugal não estava
interessado no Brasil, portanto, não ia investir nesse território. Mas porque, então, os colonos
não investiram? Não financiaram obras de fortificação mais eficazes? Afinal, a produção de
açúcar de Pernambuco era responsável por 1/3 da produção de toda a colônia.
Nesse primeiro momento, foram construídas quatro fortificações, todas muito pequenas e
frágeis, sem linhas de defesa. Um Sistema Defensivo inócuo apesar do conhecimento técnico,
dos recursos que se poderiam dispor e das ameaças constantes. A Capitania foi ‘protegida’ com
fortificações que não a ‘protegiam’. No segundo momento, com a invasão holandesa, percebeuse um investimento dos governantes e lideranças locais na defesa de Pernambuco. Mas nada de
muito mais significativo do que as fortificações construídas no momento anterior. Foram
construídas oito fortificações, todas também pequenas e frágeis, no entanto, já surgem formatos
que propiciam a formação de linhas de defesa. Os luso-brasileiros, que na fase anterior não se
esforçaram para defender a Capitania, começaram a demonstrar algum interesse.
No terceiro momento, houve uma mudança. Após a capitulação holandesa, Portugal passou a
se interessar pela colônia e a investir no seu Sistema Defensivo. Pernambuco passou a contar
com onze fortificações, destas, sete eram pequenas e frágeis, mas quatro eram mais robustas.
Fortificações abaluartadas, de traço holandês, revestimento à italiana, e inclinação do talude do
século XVI. Nesse momento, Portugal vivenciava problemas financeiros e o açúcar brasileiro
não vendia mais tão bem, enquanto as obras executadas em Pernambuco haviam sido
dispendiosas. Quatro fortificações começaram a ser construídas a partir do mesmo ano,
utilizando a pedra como revestimento. Deve-se ressaltar ainda, no caso dos Fortes de São Tiago
das Cinco Pontas e do Brum, que se as pedras não foram extraídas dos arenitos da praia, foi
necessário um grande investimento na sua construção, pois as fontes de rocha estavam a mais
de 15 km de distância.
O que justificaria todo esse esforço exatamente quando não havia condições de muitos
esforços? O que justificou um certo desdém pela Capitania, tanto por parte da Metrópole,
quanto pelos colonos locais, até mesmo quando havia condições de realizar investimentos na
defesa?
237
A explicação que agora se propõe, está colocada em forma de hipótese, no intuito de promover
novas discussões estimulando outras áreas do conhecimento a explorar os dados produzidos
pela arqueologia.
Retomando os dois conceitos de Sistema Defensivo, apresentado no Capítulo 2, enquanto um
dele restringia o Sistema Defensivo a um conjunto de fortificações e estruturas de defesa; o
outro considera que, além das fortificações, o Sistema Defensivo incorporaria as tropas e as
embarcações (Tonera, 2005: p.2). Acredita-se que as escolhas tecnológicas em Pernambuco
passaram pela compreensão de sistema defensivo como essa estrutura mais ampla de
fortificações, embarcações e tropas. E que a ausência desses outros elementos (embarcações e
tropas) impediu investimentos apropriados nas estruturas construtivas. Só no terceiro momento
bélico Portugal teria se voltado para o Brasil e teria disponibilizado os demais elementos,
justificando os elevados investimentos.
Além das análises e conclusões apresentadas no corpo deste trabalho, foram coletados muitos
mais dados durante a pesquisa de campo, o que poderá ser objeto de tratamento e publicações
posteriores.
238
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