ISSN 2359-4799
Volume 6 / Número 4 / Ano 2020 – p. 242-256
DOI: 10.36524/ric.v6i4.854
NÚMEROS PRIMOS: RELAÇÃO
HISTÓRICA E ALGUMAS CURIOSIDADES
PRIME NUMBERS: RELATIONSHIP
HISTORY AND SOME CURIOSITIES
1
Carlos Costa dos Reis.
2
Valmecir Bayer.
1
2
Universidade Federal do Espirito Santo. E-mail: carlos.ufes81@gmail.com.
Universidade Federal do Espirito Santo. E-mail: bayervalmecir@gmail.com.
Artigo submetido em 28/09/2020, aceito em 08/10/2020 e publicado em 28/12/2010.
Resumo: Este trabalho traz um texto com um olhar sobre a história dos números primos e várias
curiosidades em que se observa o seu uso no cotidiano e na natureza. Pode auxiliar no suporte para
professores e alunos dos ensinos fundamental e médio ou mesmo no aprimoramento para turmas que
se preparam para as olimpíadas de matemática. A sequência dos temas faz uma explanação histórica
sobre os números primos, um resumo da teoria básica e, por fim, fragmentos e artigos sobre
curiosidades no mundo inteiro a respeito dos números primos.
Palavras-chave: números primos; história; curiosidades.
Abstract: This work brings a text with a look at the history of prime numbers and several curiosities
in which its use in everyday life and in nature is observed. It can assist in the support for teachers and
students of elementary and high school or even in the improvement for classes that are preparing for
the math Olympics. The sequence of themes provides a historical explanation of prime numbers, a
summary of basic theory and, finally, fragments and articles on curiosities around the world about
prime numbers.
Keywords: prime numbers; history; curiosities.
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho expõe um contexto
técnico, prático e histórico sobre o uso dos
Números Primos. Pesquisando sobre o
assunto, verificamos que, além de muito
interessante, no que diz respeito aos
conhecimentos
teóricos
e
suas
curiosidades, existem vários trabalhos e
artigos sobre números primos, porém
pouco divulgados. Nos livros didáticos
aparecem apenas a teoria e muitos
exercícios, quase sempre mecânicos, que
não exigem muito do aluno. Quando
falamos em exigência, queremos dizer:
pensar e sentir-se atraído pelo assunto a
ponto de buscar aprofundar mais, levandoo a fazer uso no seu cotidiano.
Trabalhando o conteúdo em sala de
aula e ampliando o conhecimento sobre
múltiplos e divisores, um aluno do sexto
ano do ensino fundamental (antiga 5ª série)
243
v.6 n.4 2020
trouxe a seguinte afirmação: “Todo número
quadrado perfeito de primo possui apenas
três divisores naturais”. A maturidade da
afirmação desse aluno é o fator motivador
para buscar formas de levar outros alunos a
entrarem no mundo da Matemática com
mesmo prazer que este tem demonstrado
durante o processo de aprendizagem.
Seguindo essas diretrizes, o
Ministério da Educação, por meio dos
Parâmetros Curriculares Nacionais de
Matemática, destaca a importância desse
momento com o aluno e incentiva a
continuidade deste trabalho ao dizer que:
[...] as necessidades cotidianas fazem com
que os alunos desenvolvam uma
inteligência essencialmente prática, que
permite reconhecer problemas, buscar e
selecionar informações, tomar decisões e,
portanto,
desenvolver
uma
ampla
capacidade para lidar com a atividade
matemática. Quando essa capacidade é
potencializada
pela
Escola,
a
aprendizagem apresenta melhor resultado.
([02], PCN,1997, p. 29)
e, completa:
[...] um conhecimento só é pleno se
for
mobilizado
em
situações
diferentes daquelas que serviram para
lhe dar origem. Para que sejam
transferíveis a novas situações e
generalizados, os conhecimentos
devem ser descontextualizados, para
serem contextualizados novamente
em outras situações. Mesmo no
ensino fundamental, espera-se que o
conhecimento aprendido não fique
indissoluvelmente vinculado a um
contexto concreto e único, mas que
possa ser generalizado, transferido a
outros contextos. ([02], PCN,1997, p.
30).
Nesse processo de pesquisa e
aprofundamento, observamos melhor as
histórias e curiosidades sobre os números
primos. Relações do nosso cotidiano que
aparecem pouco nos canais de informação,
numa intensidade menor ainda nos livros
didáticos, mas que, no processo de
planejamento de aula do professor, se torna
uma área muito rica para se explorar.
Visando tornar a aula atrativa e
motivadora, o professor pode agregar
história e curiosidades ao desenvolvimento
teórico, fazendo o aluno enxergar a
Matemática por completo, não como livros
de teorias maçantes que calejam a relação
professor aluno, fator esse destacado nas
páginas do PCN de Matemática:
[...] O conhecimento da história dos
conceitos matemáticos precisa fazer
parte da formação dos professores
para que tenham elementos que lhes
permitam mostrar aos alunos a
Matemática como ciência que não
trata de verdades eternas, infalíveis e
imutáveis, mas como ciência
dinâmica,
sempre
aberta
à
incorporação
de
novos
conhecimentos. ([02], PCN,1997,
p.30).
[...] Numa perspectiva de trabalho em
que se considere a criança como
protagonista da construção de sua
aprendizagem, o papel do professor
ganha novas dimensões. Uma faceta
desse papel é a de organizador da
aprendizagem; para desempenhá-la,
além de conhecer as condições
socioculturais,
expectativas
e
competência cognitiva dos alunos,
precisará escolher o(s) problema(s)
que possibilita(m) a construção de
conceitos/procedimentos e alimentar
o processo de resolução, sempre
tendo em vista os objetivos a que se
propõe atingir. ([02], PCN,1997 p. 30
- 31).
Por fim, esperamos com este
trabalho didático proporcionar opções para
o desenvolvimento da Matemática de uma
forma lúdica e participativa, sem perder,
porém, o prazer em aprofundar-se nos
conhecimentos teóricos, a partir das
curiosidades que os números primos
trazem ao nosso cotidiano.
2 UM POUCO DE HISTÓRIA
“Podemos, em especial nas
ciências matemáticas, observar a
ordem, a simetria e a restrição; e
244
v.6 n.4 2020
estas são as formas superiores do
belo.” Aristóteles, Metafísica.
Os números primos e as suas
propriedades
foram
estudados,
extensivamente, pela primeira vez, pelos
matemáticos
gregos
antigos.
Os
matemáticos da escola de
a 300 a.C.) estavam interessados nos
números
pelas
suas
propriedades
numerológicas e místicas. Por definição,
número primo “p” é aquele que é diferente
de 1 e possui dois, e somente dois divisores
naturais: o 1 e o próprio p. Os demais
números diferentes de 1 são chamados
compostos. Entendiam a ideia de
primalidade, e revelavam interesse em
números perfeitos e amigáveis (um número
natural é perfeito se ele for igual a soma
dos seus divisores próprios, isto é, dos
divisores positivos menores que , por
exemplo, o número tem como divisores
e
,
tem
naturais
e
como divisores naturais
).
Conhecendo os divisores de pares
de números encontramos a definição para
os Números amigáveis: são pares de
números onde um deles é a soma dos
divisores do outro. Por exemplo, os
são
divisores
de
e
, cuja
. Por outro lado, os divisores de
soma é
são
e
e a soma deles é
. Fermat descobriu também o par
e
.
Quando Os Elementos de Euclides
apareceram (cerca de
a.C.), muitos
resultados importantes sobre números
primos tinham sido provados. No livro IX
de Os Elementos, Euclides prova que
existem infinitos números primos. Esta é
uma
das
primeiras
demonstrações
conhecidas a usar o método da contradição,
com vista à obtenção de um resultado.
Euclides nos dá, também, uma
demonstração do Teorema Fundamental da
Aritmética – qualquer inteiro pode ser
escrito como produto de números primos
em, essencialmente, uma única maneira –.
)
O matemático Leonard Euler (
mostrou que todos os números pares
perfeitos são desta forma. Não é conhecido
até hoje nenhum número perfeito ímpar.
a.C. o grego Eratóstenes
Em
apresentou um algoritmo para calcular
números primos, o Crivo de Eratóstenes.
Segue-se um largo período de tempo de
interregno, na História dos Números
Primos, a chamada Idade Negra. O
desenvolvimento seguinte na História dos
números primos nos é fornecido por Pierre
de Fermat, no início do século XVII,
provando uma especulação conjecturada
por Albert Girard, onde estabelece que
pode
todo número primo da forma
ser escrito de um só modo, como soma de
dois quadrados de números inteiros, além
disso
criou/provou
as
seguintes
metodologias: qualquer número inteiro
positivo pode ser escrito como soma de
quatro quadrados, um novo método para
fatorar números primos grandes e o
Pequeno Teorema de Fermat (para
distinguir do denominado Grande Teorema
de Fermat): se
for um número primo,
então para qualquer número inteiro :
Tal teorema prova, em parte, a
chamada Hipótese Chinesa, de cerca de
anos antes, que um inteiro é primo,
é
se e somente se o número
divisível por . A recíproca deste teorema
é falsa; vê-se facilmente, por exemplo, que
é divisível por
e
.
O Pequeno Teorema de Fermat é a
base de muitos resultados da Teoria dos
Números e de métodos conceituados, no
tocante a determinação de números primos,
ainda hoje utilizados em larga escala em
computação.
Fermat
manteve
correspondência com outros matemáticos
do seu tempo, em particular com o monge
Marin Mersenne. Numa das suas cartas a
Mersenne, ele conjecturou que os números
da forma:
seriam primos. Estes números também são
denominados números de Fermat. Somente
245
v.6 n.4 2020
cerca de
anos depois, Euler demonstra
que
tal
conjectura
falha:
é divisível por
e, portanto, não é primo.
Os números da forma
também atraíram atenção, devido ao fato
que, caso não seja primo, estes números
são compostos, classicamente, chamados
,
de
números
de
Mersenne
referenciando o estudo dedicado por este
matemático. Naturalmente, nem todos os
, com primo,
números da forma
são
primos.
Por
exemplo,
é
composto. No entanto isto só foi
.
descoberto por volta de
de
Por muitos anos os números
primo, forneceram os
Mersenne, com
maiores números primos conhecidos. O
número
é primo e isto foi provado por
, e este
Pietro Antonio Cataldi, em
foi o maior número primo conhecido por
anos, até que François E. A.
cerca de
(número de
Lucas mostrou que
dígitos) é primo, este número foi o
recordista até a era dos computadores
eletrônicos.
foram descobertos os
Em
números de Mersenne,
,
,
,
,
por Raphael M. Robinson
com a ajuda de um primitivo computador
eletrônico (LLT/SWAC) e isto estabelece o
início da era eletrônica. Até a presente
números
data, é conhecido um total de
primos de Mersenne, sendo o maior deles o
número
, com
dígitos.
O trabalho de Euler tem também
um grande impacto na Teoria dos Números
em geral e na Teoria dos Números Primos,
em particular, pois estende o Pequeno
Teorema de Fermat e introduz a função φ
(de Euler). Como mencionado, Euler
fatorou o quinto número de Fermat:
e descobriu
pares de números
amigáveis. Além disso, conjecturou (mas
não provou) a Lei da Reciprocidade
Quadrática, provada posteriormente por
Johann Carl Friedrich Gauss.
Ademais, Euler foi o primeiro a
perceber que a Teoria dos Números pode
ser estudada usando as ferramentas da
Análise, introduzindo, desta forma, a
Teoria Analítica dos Números. Mostrou,
não apenas que a conhecida série
harmônica
é divergente, mas que a série harmônica
com
primo
também é divergente.
Na teoria, a soma dos primeiros
termos da série harmônica ordinária cresce
logaritmicamente, enquanto a outra série
(considerando apenas os primos) diverge
ainda
mais
lentamente,
sendo
assintoticamente
comparável
a
. Isto significa que somando
os inversos de todos os números primos já
conhecidos, mesmo utilizando o mais
poderoso dos computadores modernos,
obtemos o valor dessa soma em torno de 4,
apesar da série ser divergente.
À primeira vista, os números
primos parecem não obedecer a uma regra
específica de aparecimento. Por exemplo,
primeiros números
em relação aos
imediatamente antes de
existem apenas nove números primos,
enquanto nos
números que se seguem
existem apenas dois números primos. No
entanto, numa maior escala, a distribuição
de números primos parece ser mais regular.
Considerando o estudo sobre a
densidade dos números primos, Legendre
(Adrien-Marie Legendre) e Gauss fizeram
extensos cálculos. Gauss (um prodígio do
cálculo) disse a um amigo que, quando
minutos de folga, ocupava-se
tinha
contando os números primos num alcance
números. Estima-se que, até o fim
de
da sua vida, Gauss tenha contado todos os
números primos até três milhões.
246
v.6 n.4 2020
No desbravamento dos números
primos, Legendre e Gauss chegaram à
conclusão que, para
suficientemente
grande, a densidade de números primos até
de
é aproximadamente
. Legendre
deu uma estimativa para a quantidade
dos números primos até :
enquanto Gauss estimou este mesmo
número, em termos da integral logarítmica,
,
e previu que a densidade de números
primos era igual a
. Hoje, isto é
conhecido como Teorema dos Números
Primos.
Tentativas
de
prová-la
continuaram pelo século XIX com
progressos notáveis pelo matemático russo
Pafnuty Lvovich Chebyshev e pelo
matemático alemão Georg Friedrich
Bernhard Riemann que foram capazes de
relacionar o problema com algo próximo à
chamada Hipótese de Riemann que é uma
conjectura sobre os zeros no plano
complexo de uma função chamada função
(zeta) de Riemann.
Na verdade, usando métodos
poderosos da Análise Complexa, o
Teorema dos Números Primos foi
)
demonstrado,
primeiramente
(
independentemente, por dois matemáticos
franceses, Jacques Hadamard e CharlesJean de La Vallée Poussin, quando
estavam interessados no estudo da função
zeta de Riemann.
Ainda há muitas questões por
desvendar (algumas delas que datam de
centenas de anos atrás) relacionadas com
números primos. (Fonte: [08])
3 TEORIA DOS NÚMEROS
O conjunto dos números naturais é
representado pela letra maiúscula e estes
números são representados, utilizando os
algarismos
, também
conhecidos como algarismos indoarábicos. Conhecendo um pouco a história
sobre eles, sabe-se que no século VII, os
árabes invadiram a Índia, difundindo o seu
sistema numérico.
Embora o zero não seja um número
natural, no sentido que tenha sido
proveniente de contagens naturais de
objetos, iremos considerá-lo como um
número natural, pois é conveniente do
ponto de vista algébrico. Na verdade, o
zero foi criado pelos hindus na montagem
do sistema posicional de numeração, para
suprir a deficiência de algo nulo. Na
sequência, consideraremos os naturais
iniciados com o número zero e
escreveremos este conjunto como:
.
As reticências (três pontos) indicam
a infinitude do conjunto . Excluindo o
zero do conjunto dos números naturais, o
conjunto resultante será representado por:
.
A Aritmética é a área da
Matemática que estuda os conjuntos
numéricos e as suas operações básicas,
desenvolvendo propriedades fundamentais
para a construção dos números e o seu uso.
No conjunto dos números naturais
observamos a presença de dois tipos de
números: primos e compostos.
Os números primos tem grande
importância nessa teoria. Por definição,
número primo “p” é aquele que é diferente
de 1 e possui dois, e somente dois divisores
naturais: o 1 e o próprio p. Os demais
números diferentes de 1 são chamados
compostos. O Teorema Fundamental da
Aritmética (ou Teorema da Fatoração
Única) nos diz que todo número composto
pode ser decomposto, de modo único, a
menos da ordem dos fatores, como um
produto de números primos.
247
v.6 n.4 2020
Utilizando o Teorema Fundamental
da Aritmética, podemos calcular o Máximo
Divisor Comum (MDC) e o Mínimo
Múltiplo Comum (MMC) de um conjunto
finito de números naturais. Essas
aplicações e algumas curiosidades são os
temas fundamentais deste trabalho.
Faz-se necessário ressaltar que o
número 1 (um) não é primo nem composto
e o número 2 (dois) é o único número
natural par e primo. O estudo da fatoração
em números primos é muito importante
para diversas áreas da Matemática, como
por exemplo, para a potenciação e a
radiciação.
3.1 O QUE SIGNIFICA FATORAR?
Quando aprendemos multiplicar
(nas primeiras séries do Ensino
Fundamental), também aprendemos o
conceito de fator. Fatorar um número
significa encontrar uma multiplicação de
números que resulte o número dado.
Exemplos:
Uma possível fatoração para o número 4
pode ser
. Assim,
. Da
mesma forma,
direito, em seguida efetuamos divisões
sucessivas desse número por números
primos dispostos do lado esquerdo da
barra, como no exemplo a seguir:
18 2
9 3
3 3
1
3.2 CRITÉRIOS DE DIVISIBILIDADE
Para facilitar a fatoração é
conveniente utilizar os critérios básicos de
divisibilidade por
e .
Esses critérios estão listados a seguir e
algumas ideias de demonstrações e
justificativas
estão
indicadas
nas
referências deste trabalho.
- Por 2: Um número é divisível por 2 se ele
for par;
- Por 3: Um número é divisível por 3 se a
soma dos seus algarismos resultar em um
divisível por 3;
- Por : Um número é divisível por se os
dois últimos algarismos formarem um
número divisível por ;
- Por : Um número é divisível por
terminar em zero ou ;
Todos estes são exemplos de
fatoração, mas daremos especial atenção à
fatoração em números primos. Fatorar um
número em fatores primos é encontrar uma
multiplicação de primos que resulte o
número dado. Nos dois últimos exemplos
acima, as fatorações não são em primos,
uma vez que 16 e 15 são números
compostos. Então, aquelas decomposições
são apenas fatorações.
Há um algoritmo prático, que
aprendemos nas primeiras séries do Ensino
Fundamental II, para fatorar um
determinado número em fatores primos.
Primeiramente, escrevemos o número a
fatorar com uma barra vertical ao lado
se
- Por : Um número é divisível por se for
divisível por e ao mesmo tempo;
-Por : Devemos multiplicar por
o
último algarismo do número. Subtrair este
valor do número inicial sem o último
algarismo, se o resultado for divisível por
, então o número inicial também será.
- Por : Um número é divisível por se os
três últimos algarismos formarem um
número divisível por ;
- Por : Um número é divisível por se a
soma dos seus algarismos resultar em um
divisível por ;
248
v.6 n.4 2020
3.3 CÁLCULO DO MDC E MMC
Duas das aplicações importantes do
Teorema da Fatoração Única são os
cálculos do MDC (Máximo Divisor
Comum) e do MMC (Mínimo Múltiplo
Comum). É interessante observar que,
utilizando as mesmas fatorações dos
números podemos obter, simultaneamente,
o MDC e o MMC. Vejamos um exemplo
no qual foi feita a fatoração simultânea dos
números
e .
(Divisor Comum)
(Divisor Comum)
Note que na fatoração foram
destacados os números que dividiram
simultaneamente os números
e . Isto
é um passo importante para conseguirmos
determinar o MDC. Se fossemos listar os
divisores de cada um dos números,
teríamos a seguinte situação:
Note que o maior dos divisores
e 4 é o
comuns entre os números
. Observando a fatoração
número
simultânea, o valor é obtido realizando a
multiplicação dos divisores comuns, ou
. Assim,
seja,
podemos encontrar o MDC de dois ou mais
números naturais fazendo o produto dos
fatores
comuns
na
decomposição
simultânea desses números.
Por outro lado, o MMC será obtido
ao multiplicar todos os divisores da
fatoração simultânea. Sendo assim,
.
Evidenciamos na Matemática um
espaço para uma disciplina especial
chamada “Resolução de Problemas”. Essa
teoria básica sobre Números Primos nos
permite desenvolver uma quantidade
enorme de problemas práticos e usuais em
nosso cotidiano. Neste sentido, destacamos
agora
algumas
curiosidades
que
extrapolam o uso e a importância dos
Números Primos em nosso cotidiano e na
natureza. (Fonte: [04], [07], [09], [10])
4 CURIOSIDADES
Destacamos algumas curiosidades
em que os números primos são
protagonistas. A mídia, os canais de
informação e os livros didáticos não
fornecem o devido destaque e importância
observados nessas histórias reais do nosso
cotidiano. Assim, com o uso desse
material, podemos, de forma lúdica,
conhecer um pouco mais da aplicabilidade
desses números no dia a dia e na natureza.
4.1 PRIMOS GALÁTICOS
Elemento
fundamental
na
composição e desenvolvimento dos
esportes, os números são usados para
identificar os competidores/jogadores,
enumerar ou mesmo nomear táticas e
regras, além de quantificar o resultado final
para vencedores e perdedores. Nesse
sentido, os números trazem curiosidades
impressionantes num dos meios mais
competitivos e lucrativos do esporte: o
Futebol.
Destaca DU SAUTOY em “Os
mistérios dos números, uma viagem pelos
grandes enigmas da matemática” uma
curiosa história sobre o time galáctico do
Real Madrid (Espanha) na temporada
2003/2004.
Contratado
junto
ao
Manchester United (Inglaterra), muito se
especulou qual seria o número utilizado
por David Beckham para compor a
constelação das estrelas madrilenhas.
Tanto no time inglês quanto em sua
seleção vinha jogando com a camisa .
249
v.6 n.4 2020
Porém, Raul era o dono dessa camisa no
Real Madrid e não parecia estar disposto a
ceder o número para o “menininho
glamoroso” da Inglaterra.
O número escolhido foi o “primo”
23. Muitas teorias foram levantadas sobre
o motivo para tal escolha e a mais natural
tem ligação com o mercado internacional.
O Real Madrid queria expandir sua marca
no mercado americano e, segundo essa
teoria, associou o futebol (soccer para os
americanos) a um dos esportes mais
praticados e lucrativos nos EUA, o
basquetebol. Uma pesquisa identificou que
Michael Jordan era o nome mais famoso na
época e usou em toda sua carreira o
número 23 no Chicago Bulls. Era esperado
que associar a camisa do David Beckham à
estrela americana tornaria efetiva e
lucrativa essa magia dos números.
Essa mística sobre os números
primos e o Real Madrid não para na camisa
do Beckham. Como destaca DU SAUTOY
em seu livro: “...comecei a desconfiar que
talvez eles tivessem um matemático no
banco. Na época da transferência de
Beckham para lá, uma análise mais
detalhada revelaria que todos os
‘galácticos’, jogadores-chave do Real
Madrid, atuavam com camisas assinaladas
com números primos: Roberto Carlos (o
bloco construtivo da defesa), número 3;
Zidane (o coração do meio-campo),
número 5; Raúl e Ronaldo (os alicerces da
artilharia do Real Madri), 7 e 11.”.
Assim, talvez fosse inevitável que
Beckham tivesse um número primo, um
número ao qual ele ficou muito ligado”.
Como destacado anteriormente, o número
não é primo, assim, evidenciamos o fato
de o goleiro do Real Madrid, mesmo
fazendo parte da constelação de jogadores
madrilenhos, usar a camisa .
Místico ou não, a associação entre
futebol e os números primos é uma forma
muito curiosa e estimulante de observar os
números e toda a matemática como parte
essencial do nosso cotidiano. (Fonte: [05]
DU SAUTOY, 2013, p.10-13)
4.2 CIGARRAS USAM NÚMERO
PRIMO PARA SOBREVIVER
Uma das seis espécies existentes de
cigarras Magicicada
No ano de 2014, após passarem 17
anos no subsolo, alimentando-se de raízes,
bilhões de cigarras emergiram do chão nos
Estados Unidos prontas para acasalar. No
céu americano, nuvens de até 1,5 milhões
de indivíduos por acre se formaram e,
mesmo que inofensiva, a Magicicada sp
não é nada silenciosa. Famosas por seu
canto, o intenso ruído emitido por estes
insetos pode atingir 100 decibéis, uma
altura equivalente ao som de um cortador
de grama ou furadeira. Essa prática fez
parte do ritual de acasalamento que durou
cerca de seis semanas. Após depositar os
seus ovos (até seiscentos por indivíduo), a
fêmea adulta morre. Os filhotes voltaram a
repetir o processo de se enterrarem no solo,
.
onde ficarão até
Ao todo, existem seis espécies do
gênero Magicicada, três delas com ciclos
de 17 anos. Os insetos deste gênero
possuem olhos vermelhos e um curioso
mecanismo genético que os faz sair do solo
quando o mesmo atinge a temperatura de
18°C. Os cientistas acreditam que o longo
período de isolamento (curiosamente em
números primos - 17 ou 13 anos, no caso
das três outras espécies de Magicicada)
ajuda a evitar predadores. Ao fim do
processo, bilhões de cascas vazias são
deixadas para trás e os americanos podem
se preparar para usar suas pás para limpar
mais do que apenas folhas de jardim.
(Fonte: [05] DU SAUTOY, 2013; [06])
250
v.6 n.4 2020
4.3 CONJECTURA DE GOLDBACH
Harald Andrés Helfgott
O peruano Harald Andrés Helfgott
(foto) resolveu um problema com números
primos que estava sem solução há quase
300 anos. A chamada "conjectura fraca"
enviada em carta por Christian Goldbach
para Leonhard Euler, em 1742, diz que
cada número ímpar maior do que cinco
pode ser expresso como uma soma de três
números primos, mas ninguém tinha
conseguido
provar
isto.
Helfgott
desvendou a teoria fraca derivada da
"versão forte", no qual todo número par
maior que 2 é a soma de dois primos..
Helfgott não aborda a conjectura forte no
estudo. (Fonte: [01])
4.4 COMO OS PRIMOS 17 E 29 SÃO A
CHAVE PARA O FIM DOS TEMPOS?
Durante
a
Segunda
Guerra
Mundial, o compositor francês Olivier
Messiaen foi encarcerado como prisioneiro
de guerra em Stalag VIII-A, onde havia um
clarinetista, um violoncelista e um
violinista entre seus colegas de prisão.
Messiaen decidiu formar um quarteto com
os três músicos e ele próprio ao piano. O
resultado foi uma das grandes obras
musicais do século XX: Quarteto para o
fim dos tempos. Ele foi executado pela
primeira vez para os detentos e oficiais da
prisão dentro de Stalag VIII-A, com
Messiaen tocando um vacilante piano de
armário que encontrara no campo.
No primeiro movimento, chamado
“Liturgia de cristal”, Messiaen quis
produzir uma sensação de tempo
interminável, e os primos 17 e 29
revelaram-se a chave. Enquanto o violino e
a
clarineta
intercambiavam
temas
representando canto de pássaros, o
violoncelo e o piano forneciam a estrutura
rítmica. Na partitura do piano há uma
sequência rítmica de 17 notas que se repete
muitas e muitas vezes, e a sequência de
acordes tocada por cima desse ritmo é
formada por 29 acordes. Assim, quando o
ritmo de 17 notas começa pela segunda
vez, a sequência de acordes está chegando
apenas a . O efeito da escolha dos
números primos 17 e 29 é que as
sequências rítmicas e de acordes não se
da peça. Essa
repetiam até a nota
música em contínua mudança cria a
sensação de tempo interminável que
Messiaen teve a perspicácia de estabelecer
— e ele usa o mesmo truque que as
cigarras com seus predadores. Pense nas
cigarras como o ritmo e nos predadores
como os acordes. Os diferentes primos 17
e 29 mantêm as sequências fora de
sincronia, de modo que a peça termina
antes que você ouça a música se repetir.
Messiaen não foi o único
compositor a utilizar números primos.
Alban Berg também recorreu a um número
primo como assinatura de sua música.
Assim como David Beckham, Berg usava
o número
— na verdade, era obcecado
por ele. Por exemplo, em Lyric Suite,
sequências de 23 barras compõem a
estrutura da peça. Mas imersa dentro da
peça há a representação de um caso
amoroso que Berg tinha com uma rica
mulher
casada.
Sua
amante
era
simbolizada por uma sequência de 10
barras que ele emaranhava com sua própria
assinatura 23, usando a combinação de
Matemática e música para dar vida ao
romance.
Figura 1: ‘Liturgia de cristal’, de
Messiaen, do Quarteto para o fim dos
tempos.
Fonte: Messiaen (1994).
251
v.6 n.4 2020
O primeiro traço vertical indica onde
termina a primeira sequência rítmica de 17
notas, O segundo traço vertical indica o
timbre da sequência harmônica de 29
notas.
Da mesma maneira que Messiaen
empregou os primos no Quarteto para o
fim
dos
tempos,
a
matemática
recentemente foi usada para criar uma peça
que, embora não seja atemporal, não se
repetirá por mil anos. Para marcar a virada
do novo milênio, Jem Finer, membro
fundador da banda The Pogues, decidiu
criar uma instalação musical no East End
de Londres que se repetiria pela primeira
vez na virada do próximo milênio, em
3000. Ela se chama, apropriadamente,
Longplayer.
Finer começou com uma peça de
música criada com taças e sinos tibetanos
de diversos tamanhos. A fonte musical
original tem 20 minutos e 20 segundos de
duração, e, utilizando alguma matemática
similar aos truques empregados por
Messiaen, ele a expandiu para uma peça
com duração de mil anos. São tocadas
simultaneamente seis cópias da fonte
musical original, mas em diferentes
velocidades. Além disso, de 20 em 20
segundos, cada trilha é reiniciada a uma
distância determinada da reprodução
original, embora a alteração das trilhas seja
diferente. E na decisão de quanto alterar
cada trilha que se usa a matemática, para
garantir que as trilhas não se alinhem
perfeitamente de novo antes de mil anos.
Não apenas os músicos são obcecados por
primos. Esses números parecem entrar em
sintonia com praticantes de muitas espécies
de artes. O autor Mark Haddon só usava
números primos nos capítulos de seu bestseller O estranho caso do cachorro morto.
O narrador da história é um menino com
síndrome
de
Asperger
chamado
Christopher, que gosta do mundo
matemático porque pode entender como
ele se comportará — a lógica desse mundo
significa que ele não tem surpresas. As
interações humanas, porém, são repletas de
incertezas e mudanças ilógicas que
Christopher não consegue suportar. Como
ele próprio explica: “Eu gosto de números
primos. Acho que os números primos são
como a vida. São muito lógicos, mas a
gente nunca consegue entender as regras,
mesmo que se passe a vida toda pensando
nelas.”
Os números primos têm até uma
participação no cinema. No filme de
suspense futurista Cubo, sete personagens
são aprisionados num labirinto de salas que
se assemelha a um complexo cubo de
Rubik — o cubo mágico. Cada sala no
labirinto tem forma de cubo, com seis
portas levando a outras salas do labirinto,
O filme começa quando os personagens
acordam e se descobrem dentro do
labirinto. Eles não têm ideia de como
chegaram lá, mas precisam encontrar uma
saída. O problema é que algumas das salas
são armadilhas. Os personagens precisam
descobrir algum meio de saber se uma sala
é segura antes de entrar nela, pois uma
série de mortes horrorosas os aguarda,
inclusive ser incinerado, coberto de ácido
ou fatiado em minúsculos cubos — como
percebem depois que um deles é morto.
Uma das personagens, Joan, é
matemática e de repente vê que os números
na entrada de cada sala encerram a chave
para revelar se há uma armadilha. Parece
que se algum dos números na entrada é
primo a sala contém uma armadilha. “Que
lindo cérebro”, declara o líder do grupo
diante desse modelo de dedução
matemática. Acontece que eles também
precisam tomar cuidado com potências
primas, mas isso se mostra além da
capacidade da sagaz Joan. Eles passam a
depender de outro integrante, um autista
savant, o único que sai com vida do
labirinto de números primos. Como as
cigarras descobriram, saber matemática é a
chave para a sobrevivência neste mundo.
Qualquer professor com dificuldade
em motivar sua turma de matemática
poderia achar nas sangrentas mortes de
Cubo uma grande peça de propaganda para
fazer seus alunos aprenderem os números
252
v.6 n.4 2020
primos.
(Fragmento:
SAUTOY,2013,p.17-19)
[05]
DU
4.5 CRIPTOGRAfiA
Existem
muitos
estudos
e
curiosidades
sobre
criptografia
evidenciando a importância que esse tema
possui nos dias atuais. Dentre esses,
destacamos o que Coutinho (COUTINHO
2016) desenvolveu em material teórico
para a OBMEP (Olimpíada Brasileira de
Matemática para Escolas Públicas).
A priori, temos a expressão cryptos,
que vem do grego e significa secreto,
oculto. A criptografia estuda os métodos
para codificar uma mensagem de modo que
só seu destinatário legítimo consiga
interpretá-la. É a arte dos “códigos
secretos”. Um dos códigos secretos mais
simples consiste em substituir uma letra do
alfabeto pela seguinte. Por exemplo, a
mensagem AMO A OBMEP seria
codificada como
Um código semelhante a este foi
usado, por exemplo, pelo ditador romano
Júlio César para comunicar-se com as
legiões romanas em combate pela Europa.
Este parece ser o primeiro exemplo de um
código secreto de que se tem notícia.
Vejamos como codificar uma
mensagem simples. Códigos como o de
César padecem de um grande problema:
são muito fáceis de “quebrar”. Quebrar um
código significa ser capaz de ler a
mensagem, mesmo não sendo seu
destinatário legítimo. Na verdade, qualquer
código que envolva substituir cada letra
sistematicamente por outro símbolo
qualquer sofre do mesmo problema. Isto
ocorre porque a frequência média com que
cada letra aparece em um texto de uma
dada língua é mais ou menos constante.
Por exemplo, a frequência média de cada
letra na língua portuguesa é dada na tabela
1, a seguir.
Tabela 1: Frequência das letras no Português
Fonte: Elaborada pelos autores.
Assim,
apenas
contando
a
frequência de cada símbolo no texto,
podemos
descobrir
a
que
letra
correspondem
os
símbolos
mais
frequentes. Isto geralmente é suficiente
para quebrar o código e ler toda a
mensagem. Observe, entretanto, que este
método para quebrar o código só funciona
bem se a mensagem for longa. É fácil
escrever uma mensagem curta cuja
contagem de frequência seja totalmente
diferente da contagem de frequência média
do português. Por exemplo, em “Zuza zoou
da Zezé” a letra mais frequente é o Z que
aparece 5 vezes em um texto de 14 letras.
Como 5/14 = 0, 35... a porcentagem do Z
no texto acima é de cerca de 35%; muito
acima dos usuais 0, 47%. Já o A aparece
uma só vez, o que dá uma porcentagem de
253
v.6 n.4 2020
cerca de 7%; portanto, abaixo dos 14%
usuais.
4.5.1 CÓDIGOS EM BLOCO
Por sorte, existe uma maneira
simples de tornar inviável a aplicação de
uma contagem de frequência. Para isso,
subdividimos a mensagem em blocos de
várias letras e embaralhamos estes blocos.
Por isso este processo de criptografar uma
mensagem é conhecido como código de
bloco. Por exemplo, considere a mensagem
Para codificá-la
seguintes passos:
seguiremos
os
• eliminamos os espaços e completamos a
mensagem com um A no final, caso tenha
uma quantidade ímpar de letras;
• subdividimos a mensagem em blocos de
duas letras;
• refletimos cada bloco;
• permutamos os blocos trocando o
primeiro com o último, o terceiro com a
antepenúltimo, e assim por diante, mas
deixando os outros como estão.
Aplicando isto, passo a passo, à
mensagem acima, obtemos primeiro
Depois
em seguida
e, finalmente,
que nos dá como mensagem codificada
Apesar de códigos como este serem
melhores que o código de César, eles
apresentam uma grande desvantagem
quando se trata de aplicações comerciais
da criptografia. Por exemplo, digamos que
faremos uma compra via web usando
nosso computador, em uma loja em que
nunca compramos antes. Para isso
acessamos a página da loja, escolhemos os
produtos que desejamos e, quando estamos
prontos para comprar, escolhemos “ir para
o caixa”. O pagamento será feito usando o
cartão de crédito. Para isso, precisamos
informar a loja sobre os dados do cartão:
geralmente o número e a data de
vencimento. Mas isto significa que
qualquer outra pessoa que tenha estes
dados pode fazer compras em nosso nome.
Para evitar este problema, as informações
sobre o cartão são codificadas pelo
computador antes de serem enviadas.
Note, contudo, que o nosso
computador não pode usar um código
qualquer para codificar estas informações,
porque a loja precisa lê-las e, para isso,
tem que saber como decodificar a
mensagem. Na prática o que ocorre é que o
nosso computador comunica-se com o da
loja, que lhe informa como deve ser feito o
processo de codificação. Isto é, nosso
computador codifica as informações do
cartão de crédito usando um processo de
codificação que é enviado pela loja.
Infelizmente os códigos de blocos não se
prestam a este tipo de aplicação porque o
computador da loja usa a linha telefônica
(ou de banda larga) à qual nosso
computador está interligado para enviar o
processo de codificação a ser utilizado.
Como é fácil pôr uma escuta na linha, uma
outra pessoa pode facilmente descobrir
como nosso computador vai codificar as
informações sigilosas que serão enviadas à
loja. Usando a mesma escuta é fácil
interceptar também as mensagens que
contêm os dados do cartão. Mas isto basta
porque, se sabemos como foi feito o
embaralhamento dos blocos, podemos
facilmente desfazê-lo e ler os dados do
cartão! A única maneira de contornar este
254
v.6 n.4 2020
problema é ter acesso ao que é conhecido
como um canal seguro: uma maneira
secreta de fazer a informação sobre o
processo de codificação chegar até o
computador do usuário da loja. Talvez a
loja pudesse mandar, pelo correio
registrado, um cartão especial com os
dados a serem usados para a codificação. O
problema é que isto tornaria a transação
lenta, já que seria necessário esperar dias
pela chegada do cartão – nesse meio tempo
nós talvez preferíssemos escolher uma loja
real, mesmo que fosse longe de casa. E
ainda há outro problema, mais sério. Se o
nosso computador for invadido por um
“hacker”, o processo de codificação será
descoberto e qualquer mensagem enviada
com ele poderá ser lida.
4.5.2 CÓDIGOS DE CHAVE PÚBLICA
As dificuldades que relacionamos
acima parecem condenar de maneira
irremediável a possibilidade de fazer
transações pela web. Afinal, seja qual for o
código utilizado, se sabemos como fazer a
codificação,
basta
desfazê-la
e
decodificamos a mensagem. Ou não?
De fato, isto é basicamente
verdade; mas há um porém. Acontece que
podemos imaginar um processo que seja
fácil de fazer, mas muito difícil de desfazer
e, ao utilizá-lo para criptografar uma
mensagem, estaríamos garantindo que
quem a interceptasse, mesmo sabendo
como foi codificada, teria um trabalho
enorme em decodificá-la. Abusando um
pouco da fantasia, podemos imaginar que o
trabalho de desfazer o processo levasse
tanto tempo que ninguém conseguisse pôlo em prática. É claro que quão difícil será
desfazer o procedimento depende dos
recursos disponíveis a quem interceptou a
mensagem.
A lagosta fica presa na gaiola
porque, para poder sair, teria que encontrar
e passar pela parte estreita do funil, que é
um problema complicado demais para uma
lagosta, cujo cérebro tem o tamanho
aproximado de uma ervilha. Não preciso
dizer que uma armadilha desse tipo não
funcionaria para pegar um macaco, nem
mesmo um passarinho. Muito interessante,
mas que problema matemático satisfaz esta
condição de ser “fácil de fazer e difícil de
desfazer”, para que possamos utilizá-lo em
criptografia?
4.5.3 CRIPTOGRAFIA RSA
O mais conhecido dos métodos de
criptografia de chave pública é o RSA.
Este código foi inventado em 1977 por R.
L. Rivest, A. Shamir e L. Adleman, que na
época trabalhavam no Massachussets
Institute of Technology (M.I.T.), uma das
melhores universidades americanas. As
letras RSA correspondem às iniciais dos
inventores do código. Há vários outros
códigos de chave pública, mas o RSA
continua sendo o mais usado em aplicações
comerciais.
Para entender como funciona o
método RSA precisaremos estudar várias
ideias e técnicas novas de matemática.
Digamos que você vai criar uma
implementação do RSA para uma
determinada loja, que vai usá-lo na
codificação de dados de clientes em
compras pela internet. Para começar, você
precisa escolher dois números primos
distintos e multiplicá-los, obtendo um
número inteiro . A loja manterá secreta a
informação sobre quais são os primos
escolhidos, porque é isto que é necessário
para decodificar as mensagens enviadas
usando a versão do RSA que você está
construindo.
vai ser enviado para o
Já
computador de qualquer pessoa que
compre nessa loja pela web, porque é dele
que o computador do usuário necessita
para codificar os dados sobre o do cartão
de crédito e enviá-los ao computador da
loja. Portanto, no caso do RSA, o problema
“fácil de fazer e difícil de desfazer” é
simplesmente multiplicar dois primos. Já
consigo imaginar você pensando: Só isso?
Mas para desfazer o problema basta fatorar
o número e achar os primos! É verdade,
255
v.6 n.4 2020
mas há um detalhe que esquecemos de
contar: estes números primos serão muito,
muito grandes. Na prática uma chave
segura de RSA é gerada a partir de
números primos de cerca de 100
algarismos cada, de forma que , que é o
produto destes primos, terá cerca de 200
algarismos. Acontece que podem ser
necessários zilhões de anos para fatorar um
número deste tamanho e achar seus fatores
primos – mesmo se usarmos os mais
poderosos
computadores
existentes
atualmente.
O que vimos acima sugere que os
principais
problemas
matemáticos
relacionados ao RSA são: como achar
números primos e como fatorar um
número. A área da matemática a que estes
problemas pertencem é conhecida como
teoria de números e tem por objetivo geral
o estudo das propriedades dos números
inteiros. Entre os problemas que teremos
que estudar para podermos descrever
completamente o RSA também estão:
• como calcular os restos da divisão
de uma potência por um número dado;
• como achar um número que deixa
restos especificados quando dividido por
uma série de números dados;
• como estabelecer critérios de
divisibilidade por números primos.
Há muitos outros problemas que
são parte da teoria dos números, mas dos
quais não trataremos aqui. (Fonte: [03])
5 CONCLUSÕES
Buscamos nesse trabalho evidenciar
a importância do uso dos números primos
em várias áreas do nosso cotidiano.
Analisando
o
contexto
histórico,
observamos
brilhantes
estudiosos
dedicando-se na busca por desvendar as
curiosidades e formalidade dos números
primos.
No tocante à sala de aula,
agrupamos um material que proporciona,
segundo a criatividade de cada profissional
da educação, transformar o ambiente de
aprendizagem mais lúdico e atrativo para o
ensino da matemática. Uma vez que a
motivação principal deste trabalho foi a
afirmação “madura” de um aluno de dez
anos de idade, trabalhar este conceito é
vencer os desafios das novas tecnologias,
transpor as barreiras da natureza e levar
para aqueles estudantes mais desejosos a
oportunidade
de
amadurecerem
cognitivamente e explorar as mais variadas
áreas da vida pela visão dos números.
Enxergar o uso dos números primos
fora dos livros didáticos, aplicando-os em
áreas como esportes, música, criptografia
e, até mesmo, na natureza, nos permite
entender o porquê tantos matemáticos se
dedicaram e entregam ainda hoje parte da
vida em estudos e pesquisas sobre esses
números tão curiosos.
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