O debate da qualidade está presente nos estudos televisivos desde os anos 1980 e foi incorporado na legislação da mídia de diversos países, principalmente europeus, como tentamos demonstrar em estudo sobre o serviço público prestado pela...
moreO debate da qualidade está presente nos estudos televisivos desde os
anos 1980 e foi incorporado na legislação da mídia de diversos países,
principalmente europeus, como tentamos demonstrar em estudo sobre o
serviço público prestado pela televisão portuguesa (Borges, 2014). Na ficção
televisiva, o conceito quality television surge com a entrada dos programas
ficcionais seriados da televisão estadunidense nos anos 1990. O
desenvolvimento tecnológico e o advento dos canais por cabo incentivaram
a propagação de séries com esta denominação. O termo começa a ser usado
como "um super gênero, uma fórmula em si mesmo", como nos relata
Thompson (2007, p. xvii). Por um lado, os canais por cabo foram o espaço
de experimentação na televisão no final dos anos 1990 e, por outro, adotaram
este "super gênero" a fim de enquadrar seus programas e vendê-los mais
facilmente. Com o surgimento da HBO e a sua denominação como "It's not
TV. It's HBO" uma nova fase se inicia e séries como Os Sopranos (HBO,
19992007) marcam o tom do que poderia ser esperado da linguagem
televisiva na chamada post-network era.
Nos anos 2000 o debate se encontrava acalorado, Cardwell (2007, p.
26) afirma que os programas de qualidade devem conter, no seu entender,
certas características de conteúdo, estrutura, tema e tom. No que diz respeito
aos programas de qualidade, a academia estadunidense tende a aceitar uma série de convenções e atributos estilísticos que permitem entender televisão
de qualidade como boa televisão. Os programas de qualidade são agrupados
num mesmo gênero, que é caracterizado por partilhar características
semelhantes, tais como altos valores de produção, estilo de atuação
naturalista, atores de renome, um senso de estilo visual variado, entre outros
(Cardwell, 2007, p. 26).
Porém, notamos que, em relação ao gênero ficcional humorístico, no
que diz respeito às sitcoms, por exemplo, encontramos uma lacuna nos
estudos televisivos brasileiros sob a perspectiva das discussões sobre a
qualidade. O gênero humorístico está presente na televisão brasileira desde
os seus primórdios, destacando-se pelo talento dos roteiristas e dos
humoristas e pela originalidade dos formatos audiovisuais apresentados na
TV aberta, principalmente nos anos 1980 e 1990. Nos anos 2000 é alavancado
pela TV por assinatura, com a criação de formatos seriados ficcionais que
trazem uma lufada de ar fresco para o gênero, que se tornou repetitivo devido
à massificação.
Neste sentido, a pesquisa ora em andamento procura problematizar
o conceito de humor de qualidade na criação de formatos seriados ficcionais.
Entendemos por humor de qualidade aquele que ultrapassa o riso cômico,
agregando valores e levantando discussões controversas que são relevantes
na sociedade atual e levam à reflexão. Indagamos, por um lado, se os modos
de representação utilizados promovem a diversidade e ampliam o horizonte
do público, não reforçando estereótipos e, por outro lado, se há alguma
forma de experimentação da linguagem audiovisual.