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TCC Concluido Patr Cia

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A EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DA LIBERDADE SEGUNDO OS ESCRITOS

DE PAULO FREIRE

Patrícia Fedatto
Pedagogia: Docência e Gestão Educacional
Universidade Estadual do Centro- Oeste do Paraná, UNICENTRO, campus
Chopinzinho
Profº. Drº. Suzete Terezinha Orzechowski

Resumo:
O texto trata das ideias de Paulo Freire sobre a prática da liberdade, para tanto,
a pesquisa bibliográfica realizou-se em obras que se referem a temática. A
análise é qualitativa buscando responder à construção do processo de liberdade
para a conscientização entre os sujeitos no processo educativo. O objetivo da
pesquisa está em analisar o termo liberdade baseado em duas obras do autor
Paulo Freire, Pedagogia do Oprimido (2013 e 1987) e Educação como Prática
da Liberdade (1967). As considerações finais trazem uma perspectiva de
emancipação possível.

Palavras-chave: Paulo Freire; Liberdade; Oprimido.

INTRODUÇÃO
Esta pesquisa tem por objetivo geral analisar o termo “liberdade” segundo
a ótica de Paulo Freire em suas obras Educação Como Prática da Liberdade
(1967) e Pedagogia do Oprimido (2013). A temática torna-se relevante pelo fato
de vivermos em uma sociedade em que grande parte da população sofre com a
opressão sem mesmo tomarem consciência disso, muitas vezes por não terem
condições de reconhecer a realidade na qual estão inseridos. Outros por
conhecerem a realidade e não ter alicerces para modificá-la, desta forma,
percebe-se que umas das possibilidades de transformar a realidade é a
educação. Paulo Freire coloca com a ideia de uma “pedagogia da liberdade”, se
dá por meio da conscientização de que é preciso tomar as rédeas e lutar por um
futuro melhor onde a liberdade se torne concreta. (FREIRE, 1967, P. 02),
Vivemos em uma sociedade cujos principais direitos dos seres humanos
são negligenciados, o direito de ir e vir muitas vezes cabe apenas às classes
altas, e os pobres trabalhadores não podem contar com o que está na
Constituição Federal. Paulo Freire nos mostra com seus estudos que os
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cidadãos devem sim ser “educados” para a prática da liberdade, para exigir seus
direitos e principalmente para ser crítico e democrático.
A metodologia será de pesquisa bibliográfica com análise sobre a
concepção de liberdade em duas obras de Paulo Freire: Pedagogia do Oprimido,
em sua 54º edição (2013) e Educação como prática da Liberdade, publicada em
(1967).
O artigo está organizado em três sessões principais, a primeira contendo
a vida e obras do autor Paulo Freire, a segunda sessão está relacionada ao
conceito de liberdade seguindo a ótica de Paulo Freire que está subdividida em
conceitos de dois de seus livros que tratam do assunto, Pedagogia do Oprimido
e Educação como Prática da Liberdade. E uma terceira sessão onde são
relatadas algumas formas de opressão e a luta pela liberdade por meio da
educação.

1. VIDA E OBRA DE PAULO FREIRE


Paulo Reglus Neves Freire, nasceu em Recife em 19 de setembro de
1921, na cidade de Pernambuco. No ano de 1931, Freire juntamente com sua
família mudam-se para Jaboatão/SP. Após alguns anos volta para Recife onde
estuda no Colégio Oswaldo Cruz. Quando tinha 22 anos inicia a faculdade de
direito.
Em 1944 casa-se com Elza Maria Costa Oliveira e com ela teve 5 filhos.
Elza era educadora, ela sempre dizia que Freire não podia ser outra coisa que
não educador. Freire foi professor de língua portuguesa no Colégio Oswaldo
Cruz. No ano de 1947 torna-se diretor e depois superintendente de educação e
cultura do Serviço Social da Industria (SESI) que foi onde teve contato com
adultos e trabalhadores, foi então que percebeu a necessidade de enfrentar o
problema da falta de alfabetização para essas pessoas. (GADOTTI, 2003)
No ano de 1958, firmou-se como educador progressista no II Congresso
Nacional de Educação de Adultos, realizado no Rio de Janeiro. Neste congresso,
Paulo Freire defendia uma educação voltada para a realidade vivida pelos
trabalhadores, ao invés de ensinar letras, palavras e frases.
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Nos anos 60 Paulo Freire engajou-se nos movimentos de educação


popular. Foi dentre outros um dos fundadores do Movimento de Cultura Popular
(MCP) em Recife. A base de seu pensamento era a de uma educação como
prática libertadora, começa a pesquisar e desenvolve um método de
alfabetização para adultos, esse método era intitulado por ele mesmo como
“palavras geradoras”, trazia também os “círculos de cultura”, onde fazia a
investigação da realidade vivida pelos adultos. (GADOTTI, 2003)
Seu método segue as normas metodológicas e linguísticas, porém vai
muito mais além, pois desafia quem aprende a se apropriar do código escrito e
se politizarem através dessa posse. Em 1963, seu método é aplicado em Angicos
no Rio Grande do Norte, alfabetizando 300 trabalhadores em apenas 40 horas,
segundo Gadotti (2012)1, Freire “centrava a educação na relação”. Essa
experiência em Angicos tornou Paulo Freire conhecido em todo o país.
Ainda neste ano, Paulo de Tarso que era ministro da educação do governo
João Goulart, convida Freire para coordenar o Plano Nacional de Alfabetização.
(GADOTTI, 2003). Um ano depois com o golpe militar Paulo Freire é preso.
Então aos 43 anos parte para o exílio, é obrigado a ficar longe do Brasil e de seu
povo. A princípio ficou na Bolívia para em seguida ir para o Chile, onde continuou
trabalhando em programas de educação de adultos no Instituto Chileno para a
Reforma Agrária. Paulo trabalhou muito no exílio, foi nessa época que escreveu
seu livro intitulado Pedagogia do Oprimido, traduzido em mais de 20 idiomas.
Neste escrito Freire apresenta seu método, que é a proposta pedagógica mais
importante pensada para o terceiro mundo. (VALE, 2005)
O exílio possibilitou à Freire andarilhar pelo mundo. Em 1969, Paulo Freire
vai para os Estados Unidos trabalhar como professor convidado na Universidade
de Harvard. Em 1970, tornou-se consultor especial do Departamento de
Educação do Conselho Mundial das Igrejas em Genebra na Suíça, onde atuou
durante 10 anos. (GADOTTI, 2003). Neste período viajou muito para países de
terceiro mundo, principalmente no continente Africano.
No ano de 1980 Freire retorna para o Brasil, após 16 anos de exílio. Seu
desafio era reaprender o Brasil e sua realidade. Reaprender o caminho para a

1 https://www.youtube.com/watch?v=jzUgb75GgpE, acessado em 28/06/2019.


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democracia. Com a sua volta passa a lecionar na Universidade de Campinas –


UNICAMP – e em São Paulo na Pontifícia Universidade Católica. (VALE, 2005)
Elza Freire morreu 6 anos após a volta da família Freire ao Brasil. Viveram
juntos por 42 anos. Quando o Partido dos Trabalhadores assumiu a prefeitura de
São Paulo, Freire tornou-se o secretário de Educação do Município. Empenhou-
se em desenvolver movimentos de alfabetização e recuperação salarial dos
professores. Mobilizou todos da escola em promover a democracia na educação.
Em 1993 é indicado para receber o prêmio Nobel da Paz, sendo que em 86
recebeu da UNESCO o prêmio Educação para a Paz.
Freire possui mais de 40 títulos de Doutor Honoris Causa em instituições
espalhadas por todo o mundo. Seu nome estampa algumas instituições
educativas. Ele foi e será sempre um cidadão do mundo com um extenso
currículo dedicado à liberdade e justiça social, porém, nunca deixou de ser um
nordestino apaixonado e orgulhoso das suas raízes. Paulo Reglus Neves Freire,
morreu no dia 02 de maio de 1997, vítima de um infarto fulminante. Vale (2005)
ressalta que:
No dia 2 de maio, morreu o seu corpo, mas sua filosofia, seus sonhos
e sua ética continuam vivos, no Brasil e no mundo. Têm estado
presentes onde quer que proliferem práticas que tenham, como causa
maior, a causa de todos os “condenados da Terra”. (VALE, 2005, p.54)

Paulo Freire deixou um legado de ideias e um sonho de liberdade que se


torna realidade em cada estudante que se liberta pelo conhecimento.

2. A CONCEPÇÃO DE LIBERDADE EM PAULO FREIRE


2.1 Pedagogia do oprimido
Na obra intitulada Pedagogia do Oprimido, Paulo Freire (2013) apresenta
uma ideia de liberdade na educação, uma emancipação na forma de ver o
mundo, conhecendo primeiro para depois transformar a sua realidade através do
conhecimento. A forma como Freire vê o mundo e as pessoas é considerada por
muitos uma ingenuidade, desconhecimento da realidade vivida no dia a dia, tanto
dentro do âmbito escolar como nas diversas áreas que podemos associar à
educação. Freire (2013) trata este livro como uma verdade, já que quando
escreveu estava no exílio, traz para a realidade o que viveu como oprimido, fora
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do seu país, almejando a liberdade de poder retornar para a sua amada nação.
Por outro lado, nos remete a uma ótica de sociedade que por muitas vezes
não paramos para analisar, como é o caso do oprimido, daquele que tem seu
direito tirado de si pelo opressor, aquele ingênuo que não tem perspectiva de
melhorar sua realidade social. Este oprimido, segundo Freire (2013), não poderá
modificar sua realidade se não pela educação e pela prática da liberdade a qual
é sua de direito.

O que nos parece indiscutível é que, se pretendemos a libertação dos


homens, não podemos começar por aliena-los ou mantê-los alienados .
A libertação autentica, que é a humanização em processo, não é uma
coisa que se deposita nos homens, não é uma palavra a mais, oca,
mitificante. É práxis, que implica a ação e a reflexão dos homens sobre
o mundo para transformá-lo. (FREIRE, 2013, p. 93)

Falar sobre o que é realmente bom para outra pessoa não é fácil, por
vezes achamos que o que fazemos é certo. Mas será que o ser humano pode
ser moldado por outra pessoa que não esteja vivendo e passando pelo que o
mesmo passa? Será que de fato um dia os seres humanos serão
verdadeiramente livres? Podemos inculcar uma ideologia sem manipular a
liberdade do outro? Como saber se o homem oprimido quer ser liberto? Esses
questionamentos nos vêm à mente logo ao ler os escritos de Freire, quando trata
o homem oprimido como comum. O oprimido encontra-se dentro de si mesmos
em determinado momento da vida. Muitas vezes, o oprimido nem se reconhece
no processo de opressão.
Uma grande aliada de Paulo Freire (2013) no combate a opressão é a
escola e sua educação, que segundo Gadotti (2003 p.257), nos diz que “para
Paulo Freire a educação não é neutra. É um ato político”. É por meio dela que
podemos ter a oportunidade de estudar conteúdos científicos, que possibilitam
uma nova perspectiva de verdade, onde os saberes anteriormente adquiridos
são associados a novos conhecimentos e amplamente modificados. A educação
escolarizada pode oportunizar a opção por ser livre e o educador é o grande
responsável por promover este espaço de trocas de conhecimento, debates, e
construção de um ideário livre. O processo escolarizado, por meio de seus
conteúdos e do trabalho pedagógico do professor/educador, pode e deve
promover a libertação de todos os envolvidos no processo educacional. Bem
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como, ao trabalhar um processo de informação acentua a opressão levando os


sujeitos a não se reconhecerem como protagonistas históricos da transformação
sempre em curso. Quando a escola passa a informar tornando-se um veículo de
transmissão dos conteúdos, Freire (2013) denomina esse processo de educação
bancária, daí surge a alienação do conhecimento.
Alienado para aprender um conhecimento que além de não fazer parte
de sua realidade, tampouco usará em seu cotidiano. Desta forma o primeiro
passo para que de fato a alfabetização seja para a prática da liberdade é partir
do conhecimento prévio dos educandos, ou como Freire (1967) costuma chamar
“as palavras geradoras”.
Estas palavras, de uso comum na linguagem do povo e carregadas de
experiência vivida, são decisivas, pois a partir delas o alfabetizando irá
descobrir as sílabas, as letras e as dificuldades silábicas específicas
de seu idioma, além de que servirão de material inicial para descobert a
de novas palavras. São as palavras geradoras, a partir de cuja
discussão o alfabetismo irá tomando posse de seu idioma. (FREIRE ,
1967, p. 04)

Essas tais palavras geradoras impulsionam para o aprendizado concreto,


humanizador, tornando-se desta uma relação entre sujeitos, que protagonizam
o processo educacional, construindo uma prática pedagógica de liberdade entre
quem educa e quem é educado, assim se constrói a práxis pedagógica:

É através deste que se opera a superação de que resulta um termo


novo: não mais educador do educando, não mais educando do
educador, mas educador-educando com educando-educador. Desta
maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que,
enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser
educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do
processo em que crescem juntos e em que os “argumentos de
autoridade” já não valem. Em que, para ser-se, funcionalment e,
autoridade, se necessita de estar sendo com as liberdades e não
contra elas. (FREIRE, 2013, p.95-96)

O educador enquanto educa aprende também. Muitos conhecimentos tem


um educador, conhecimentos científicos embasados em teorias e que o
educando não faz a menor ideia de onde vai usar. Tais conhecimentos devem
ser trazidos para a prática cotidiana do educando, para que faça sentido
aprender mais. E por outro lado, muitos são os conhecimentos do educando,
“principalmente o adulto” (quando se trata de uma alfabetização no EJA),
conhecimento que o educador não detém. Ou saberia o educador construir uma
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casa? Ou cozinhar com excelência? Ou ainda entender sobre plantação, época


certa para plantar e colher seus alimentos. Pois é, por isso que não deve-se
ignorar o conhecimento prévio do educando, deve-se aproveita-lo para aprimorar
o conhecimento. Desta forma educador e educando aprendem juntos,
compartilham seus conhecimentos.
No entanto, não está errado o educador querer ensinar conhecimentos
científicos e novos conhecimentos para seus educandos, é obrigação dele
ensinar para que o educando possa modificar sua realidade. O que não pode
acontecer é uma educação puramente bancária, baseada no conhecimento do
educador, onde o educando recebe o que lhe é depositado. Sobre isso, assim
escreveu Freire (1987)
Na visão “bancaria” da educação, o “saber” é uma doação dos que se
julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa
das manifestações instrumentais da ideologia da opressão – a
absolutização da ignorância, que constitui o que chamamos de
alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no
outro. (FREIRE, 1987, p. 33)

A educação bancária “poda” o pensar, o criar e o imaginar. Torna o


sujeito/educando alienado sem sua liberdade, deixando-o impotente perante a
sociedade desonesta e desigual. Tornando-os mais um em meio à multidão.

Não se deixa mover pelo animo de libertar o pensamento pela ação


dos homens uns com os outros na tarefa comum de refazerem o
mundo e de torna-los mais e mais humano. Seu ânimo é justamente o
contrário – o de controlar o pensar e a ação, levando os homens ao
ajustamento ao mundo. É inibir o poder de criar, de atuar. Mas, ao fazer
isto, obstaculizar a atuação dos homens, como sujeitos de sua ação,
como seres de opção, frustra-os. Quando porem, por um motivo
qualquer, os homens se sentem proibidos de atuar, quando se
descobrem incapazes de usar suas faculdades, sofrem. Este
sofrimento provém “do fato de se haver perturbado o equilíbrio
humano” (fromm). Mas, o não poder atuar, que provoca o sofrimento,
provoca também nos homens o sofrimento de recusa à sua impotência.
Tentam, então, “reestabelecer a sua capacidade de atuar” (fromm).
(FREIRE, 2013, p. 91)

Nestas frases Freire de uma maneira direta, nos assusta com suas
palavras direcionando a um pensamento de que é melhor não ter conhecimento
e não tentar modificar a sociedade do que ter conhecimento e se dar conta que
não pode fazer nada para modificá-la, quando Freire (1987) escreveu que:

Este é o caso do “reconhecimento” de caráter puramente subjetivista,


que é antes o resultado da arbitrariedade do subjetivista o qual, fugindo
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da realidade objetiva, cria uma falsa realidade “em si mesmo”. E não é


possível transformar a realidade concreta na realidade imaginaria.
(FREIRE, 1987, p. 21)

Pode-se perceber que tudo o que aprendemos é importante, porém,


infelizmente nem tudo podemos aplicar na nossa prática cotidiana. É o caso de
conhecimentos reais do quanto somos oprimidos pela sociedade, de como
somos facilmente manipulados pelo sistema e deixamos isso acontecer
ingenuamente ou, muitas vezes sabendo disso. Este é o caso de conhecer a
realidade e não poder modificá-la. Sabemos desta forma que sem conhecimento
nada se pode fazer, já se a pessoa tem o conhecimento e não pode usar é
frustrante e desanimador, e acaba motivando ainda mais para uma educação
sem sentido e bancária. E não uma educação libertadora e humanizadora que
tanto se almeja.

2.2 Educação como Prática da Liberdade

Liberdade, o que este termo quer dizer? Segundo o dicionário


Liberdade significa condição de uma pessoa poder dispor de si, faculdade de
poder praticar o que não é proibido por lei, livre-arbítrio, condição de homem
livre. (FERNANDES 1995). É também um conjunto de ideias liberais e dos
direitos de cada cidadão. Será que atualmente existe a liberdade de escolha?
Ou estamos sendo oprimidos pelo sistema escolhendo o que o sistema impõe
pela mídia, pelas opiniões disseminadas que conformam sem confrontos, sem
conflitos.
É também, por meio de uma educação de qualidade onde os direitos dos
seres humanos não sejam cassados que conseguiremos tomar posse desta
liberdade, liberdade de escolha, liberdade de expor as opiniões sem que isso
afete a opinião do outro, sem ter que se esconder para ser democrático. De
acordo com Paulo Freire (1967):
Uma pedagogia da liberdade, como a que Paulo Freire nos propõe, tem
suas exigências e a primeira delas é exatamente o reconhecimento dos
privilégios da prática. E este é particularmente o caso quando a própria
elaboração teórica, em sua abertura à história, ilumina a urgência da
alfabetização e da conscientização das massas neste País em que os
analfabetos constituem a metade da população e são a maioria dos
pauperizados por um sistema social marcado pela desigualdade e pela
opressão. (FREIRE, 1967, p.2)
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Concordando com o autor, vemos que hoje em nossa sociedade existem


muitas desigualdades sociais, que se dá pela falta de uma educação pautada na
igualdade e na liberdade. Além dos conteúdos os educandos devem modificar o
modo de pensar, de sentir e de mudar sua realidade.
A escola é o lugar onde os direitos e a democracia devem reinar, pois
segundo Freire (1967 p. 05) “a palavra jamais deve ser vista como dada” (ou
como uma doação do educador ao educando). Dessa forma percebe-se que,
como já visto, em alguns escritos do autor que a palavra deve partir da realidade
a qual o educando está inserido nessa perspectiva, Gadotti (2003),
O conhecimento do conhecimento anterior a que os alfabetizandos
chegam ao analisar a sua pratica concreta abre-lhes a possibilidade de
um novo conhecimento. Conhecimento novo, que indo mais além dos
limites do anterior, desvela a razão de ser dos fatos, desmistificando
assim as falsas interpretações dos mesmos. Agora nenhuma
separação entre pensamento, linguagem e realidade; daí que a leitura
de um texto demanda a “leitura” do contexto social a que se refere .
(GADOTTI, 2005, p. 258)

As palavras geradoras de Paulo Freire (1987) ficam claras, já que não se


pode alfabetizar alguém que desconhece o que está aprendendo, assim, tudo
deve partir da realidade a qual este pertence e tem conhecimento. Parte-se de
algo que faça sentido. Isso não quer dizer que o alfabetizando vai aprender
apenas o que lhe é conhecido, mas, o ponto de partida pela qual o alfabetizador
dará o ponta pé no processo de alfabetização pode ser o já conhecido.
O processo de alfabetização para Freire (1967) consistia em um
pressuposto de que todas as pessoas alfabetizadas ou não, trazia consigo uma
bagagem de conhecimentos que deviam ser levados em consideração, estes
conhecimentos serviam de matéria prima para que se iniciasse o processo
alfabetizador, Gadotti (2005, p. 258), nos traz que “o aprendizado da leitura e da
escrita, como um ato criador, envolve aqui, necessariamente, a compreensão
crítica da realidade”, e o processo alfabetizador garante a leitura do mundo
concreto, por isso torna-se libertador.

3 AS FORMAS DE OPRESSÃO E A LUTA PARA A LIBERTAÇÃO

Na obra “Pedagogia do Oprimido”, Freire (1987) descreve uma


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preocupação com os oprimidos, preocupação que nenhum outro autor tivera por
eles. Ressalta a indiferença com que são tratados e as formas de opressões que
sofrem de seus opressores. Percebe-se, pela obra que o autor se preocupava
de verdade com os oprimidos, com aqueles que realmente não tinham condição
nenhuma de mudar a sua realidade. Os oprimidos desconhecem seus direitos,
nem ao menos querem lutar pela sua liberdade. As ideias destacadas a seguir
nos fazem refletir se realmente existem homens livres ou apenas acreditamos
nessa tal liberdade.

Quem melhor que o oprimido se encontrara preparado para entender


o significado terrível de uma sociedade opressora? Quem sentirá,
melhor que eles, os efeitos da opressão? Quem, mais que eles, para ir
compreendendo a necessidade da libertação? Libertação a que não
chegarão pelo acaso, mas pela práxis de sua busca; pelo
conhecimento e reconhecimento da necessidade de lutar por ela. Luta
que, pela finalidade que lhe derem os oprimidos, será um ato de amor,
com o qual se oporão ao desamor contido na violência dos opressores ,
até mesmo quando esta se revista da falsa generosidade referida.
(FREIRE, 1987, p. 17)

Ninguém além daquele que sofre a opressão para saber a importância da


liberdade para sua vida. É interessante falar sobre a falta de conhecimento na
liberdade, muitas pessoas que são oprimidas socialmente não querem ser livres,
acham que está tudo bem do jeito que vivem. Não querem assumir os “riscos” e
responsabilidades que a liberdade propõe, é muito cômodo continuar vivendo na
mesmice, sem o sentimento e os deveres conquistados junto com a liberdade.
Como é o caso de quem precisa de “assistencialismo”, ou da “caridade”
paternalista da igreja ou do estado opressor.
Existem várias maneiras de ser oprimido sem que ao menos o sujeito
oprimido saiba disso. Uma delas descrita por Freire (1967) em seu ensaio
denominado “Educação como Prática da Liberdade”

A integração ao seu contexto, resultante de estar não apenas nele, mas


com ele, e não a simples adaptação, acomodação ou ajustamento,
comportamento próprio da esfera dos contatos, ou sintoma de sua
desumanização, implica em que, tanto a visão de si mesmo, como a
do mundo, não podem absolutizar-se, fazendo-o sentir-se um ser
desgarrado e suspenso ou levando-o a julgar o seu mundo algo sobre
que apenas se acha. A sua integração o enraiza. Faz dele, na feliz
expressão de Marcel, um ser “situado e datado”. Daí que a
massificação implique no desenraizamento do homem. Na sua
“destemporalização”. Na sua acomodação. No seu ajustamento.
(FREIRE, 1967, p.42)
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Esta acomodação descrita pelo autor é comum no meio social, as pessoas


não estão preocupadas em questionar se seu direito está sendo respeitado. É
mais comum ainda nas classes menos favorecidas que não tem poder de
escolha, que desconhecem a força que tem. Pessoas com um grau baixíssimo
de escolaridade, esses são os mais oprimidos da sociedade. Freire (1981)
esclarece que:
Ninguém é analfabeto por eleição, mas como conseqüência das
condições objetivas em que se encontra. Em certas circunstâncias, ‘o
analfabeto é o homem que não necessita ler’, em outras, é aquele ou
aquela a quem foi negado o direito de ler. (FREIRE, 1981, p.15).

Esses, tendem a aceitar as coisas da maneira que estão, sem questionar


o que lhe afeta, mesmo que esse questionamento ou a busca pelo seu direito
seja necessário para a sua subsistência. Mesmo que conheça seu direito, está
condicionado a ficar na mesmice, na sua condição pequena de oprimido,
colocando em risco a sua liberdade. Estes oprimidos que estão na condição de
oprimidos tanto pelo sistema político e econômico, quanto pela sociedade em
geral, sentem na pele a arrogância, o desamor, as cobranças, a falta de
compaixão e o preconceito com que é tratado, pelo seu total desconhecimento
da realidade em que está inserido. Eles sabem ou deveriam saber a importância
de lutar pela sua liberdade, liberdade essa que talvez não o tire da sua condição
de oprimido, mas lhe faça pensar sobre a sua existência e assim ele tome
consciência do seu estado real. A partir desta consciência existe a possibilidade
de se fazer liberto conscientemente, pois já conhece e contempla a sua realidade
concreta.
Uma das formas que Freire (1967) trata a liberdade do sujeito, baseia-se
na prática do alfabetizador, no professor ser liberto ou não como Gadotti (2005)
apresenta,
O problema que se põe àqueles que, mesmo em diferentes níveis, se
comprometem com o processo de libertação, enquanto educadores ,
dentro do sistema escolar ou fora dele, de qualquer maneira dentro da
sociedade (estrategicamente fora do sistema; taticamente dentro dele),
é saber o que fazer, como, quando, com quem, para que, contra que e
em favor de quê. (GADOTTI, 2005, p. 257)

Nessas circunstâncias faz-se necessário um questionamento se o professor


alfabetizador é um ser liberto ou não? Suas práticas alfabetizadoras são de fato
livres? O seu alfabetizando está se tornando um sujeito liberto? Tais
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questionamentos se analisados em decorrência da atual modernização da


sociedade, são frustrantes. Observar que muitos dos pedagogos que estão no
espaço escolar não são de fato libertos. Necessitam de aconselhamento sobre
o que se deve fazer ou como proceder na escolarização dos seus educados. De
fato se o alfabetizador não se considerar apto a tomar decisões por si só, como
pode alfabetizar mentes pensantes? Mentes de fato livres? O professor precisa
estar ciente de que o modo como alfabetiza não é apenas para o âmbito escolar,
e sim para a vida, para construir a sua liberdade e a liberdade da sociedade.
Então é preciso que o educador supere o pensamento de que apenas ele pode
educar ou ensinar, desta forma concordamos com Freire (1987, p. 14),
Na verdade [...] a razão de ser da educação libertadora está no seu
impulso inicial conciliador. Daí que tal forma de educação implique na
superação da contradição educador-educando, de tal maneira que se
façam ambos, simultaneamente, educadores e educandos.

Claro que para muitos é cômodo estar vivendo do jeito que está,
questionar o que está errado é trabalhoso, exige esforço e dedicação. Então a
forma opressora que está vivendo é a melhor e menos exigente ou como Freire
(1987, p. 34) descreve “quanto mais se lhes imponha passividade, tanto mais
ingenuamente, em lugar de transformar, tende a adaptar-se ao mundo, à
realidade parcializada nos depósitos recebidos”.
O educador mostra o caminho da liberdade que se dá através da
educação. Todavia, a prática da liberdade deve partir do próprio oprimido. Ele se
liberta dessa condição de oprimido, quando se reconhece dentro de sua
realidade. Entretanto não basta apenas se reconhecer como sujeito oprimido,
mas a partir desse reconhecimento procurar mudar a sua prática social.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve como objetivo analisar o termo “liberdade” segundo a
ótica de Paulo Freire em suas obras Educação como Prática da Liberdade (1967)
e Pedagogia do Oprimido, (1987) e edição de 2013. No decorrer da pesquisa
foram identificados alguns desafios como o próprio pensamento do autor a
respeito da educação, pois sabemos que na prática as coisas não acontecem da
forma que planejamos. A partir desse pensamento percebemos que ainda falta
muito para o processo de libertação alcançar seu auge, pois mesmo dentro das
13

escolas muitas vezes continuamos vendados para o pensamento real de


liberdade. É claro que a partir do momento que conhecemos a realidade e
entendemos a sociedade, podemos escolher lutar pela liberdade ou continuar
aceitando as coisas da maneira que ela está. Como foi o caso dos 300
trabalhadores alfabetizados em Angicos, eles aprenderam a ver o mundo, não
apenas escrever seu nome, mas passaram a ver a sociedade de uma forma
totalmente livre, já que esses trabalhadores estavam alienados em todos os
sentidos da palavra. Talvez nem sempre conseguiremos como educadores
libertar nossos educandos, mas nosso dever é apresentar a verdade sobre sua
realidade e mostrar que é apenas através do conhecimento que ele poderá ser
livre e modificar a sua realidade.
A conclusão parte do processo de pesquisa bibliográfica das obras
“Pedagogia do Oprimido” (1987 e 2013) e “Educação como Prática da Liberdade”
(1967), ambas do escritor e educador Paulo Reglus Neves Freire. É interessante
apontar que o autor como ser humano traz uma das mais fortes e impactantes
mensagem de humanização para com os outros. O mundo está cheio de
pessoas fazendo sempre as mesmas coisas, correndo atrás das mesmas coisas
e nem param para pensar em seu próximo. Freire amou, amou as “gentes”, as
coisas, os bichos, amou o Brasil e a humanidade das pessoas.
A pesquisa oportunizou por meio das leituras, a reflexão que precisamos
ser mais humanos, humanizarmo-nos. Pensar não apenas na educação como
um conteúdo, um método educacional. Mas pensar a educação como
libertadora, para libertar o pensamento dos educandos, deixar fluir sua
imaginação, suas vontades, deixar que a mente seja livre.
O que se pôde perceber durante a pesquisa é que em tempos de voraz
consumo de tudo e de todos, inclusive da educação e do conhecimento, Paulo
Freire com todo o seu conhecimento e generosidade, nos remete a refletir sobre
a educação desejada. Seja formal ou informal, escolar ou universitária, a
educação é um processo que leva os sujeitos a pensar por si mesmos. É papel
da educação promover a liberdade para pensar e agir. Ajudar a criar sem oprimir
ou suprimir a criatividade, ajudar a interferir libertadoramente na realidade sem
medo e sem censura.
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REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. Educação Como Pratica da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1967.

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Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=jzUgb75GgpE, acesso em:


28/06/2019.

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