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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: http://www.researchgate.net/publication/280568658 Políticas de Igualdade: um mundo empenhado e ativo CHAPTER · JANUARY 2011 DOWNLOADS VIEWS 8 9 5 AUTHORS, INCLUDING: Nuno Costa University of Lisbon 25 PUBLICATIONS 7 CITATIONS SEE PROFILE Paulo Jorge Vieira University of Lisbon 14 PUBLICATIONS 1 CITATION SEE PROFILE Available from: Pedro Palma Retrieved on: 20 September 2015 Capítulo 2 Políticas de Igualdade: um mundo empenhado e ativo Margarida Queirós, Nuno Marques da Costa, Paulo Jorge Vieira e Pedro Palma Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos Artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948 A existência de instrumentos internacionais e nacionais de promoção da igualdade e de luta contra as diferentes formas de discriminação constitui um dado fundamental para criação e desenvolvimento de políticas públicas de âmbito nacional, regional e local. A nível internacional, as Convenções das Nações Unidas são formuladas com o objectivo de criar normas jurídicas vinculativas dos sujeitos intervenientes, e enquadram-se como elementos de promoção dos direitos humanos ao nível das políticas públicas. Foram subscritas pelo Estado Português (Quadro 1) e, no contexto nacional, assumem uma relativa visibilidade. QUADRO 1 REFERÊNCIAS INTERNACIONAIS SOBRE OS DIREITOS E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS Direito à não discriminação Declaração Universal dos Direitos do Homem Convenção da ONU sobre Direitos Civis e Políticos Convenção da ONU sobre Direito Económicos, Sociais e Culturais Convenção da ONU sobre a Eliminação da Discriminação Racial Convenção da OIT nº 111 Princípio geral de igualdade Declaração Universal dos Direitos do Homem Convenção da ONU sobre Direitos Civis e Políticos Convenção Europeia dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia 24 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO Neste sentido, os documentos formais internacionais devem ser observados como o plasmar de um desígnio emanado em primeira instância da Declaração Universal dos Direitos Humanos e, em segunda instância, da política social europeia e finalmente, ao nível nacional, da Constituição da República Portuguesa. Ao nível da União Europeia os direitos dos cidadãos e das cidadãs estão protegidos pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, cujo objectivo é assegurar que todos os Estados‑Membros e instituições europeias defendem e promovem medidas para a igualdade, a justiça, a dignidade e os direitos das pessoas. De entre os vários documentos formulados ao nível internacional, a Carta dos Direitos Fundamentais destaca-se pela sua natureza, por ser fundadora de um conjunto de documentos formais da própria União Europeia. Representa a síntese dos valores comuns dos seus Estados‑Membros e, pela primeira vez, reúne num único texto os direitos civis e políticos, bem como os direitos económicos e sociais. Os objectivos são explicados no preâmbulo: é necessário, conferindo-lhes maior visibilidade por meio de uma Carta, reforçar a proteção dos direitos fundamentais, à luz da evolução da sociedade, do progresso social e da evolução científica e tecnológica. Tal como é expresso nos artigos 20º e 21º reafirmando o princípio da igualdade e da anti-discriminação. O primeiro destes artigos reforça a igualdade perante a lei ao afirmar que todas as pessoas são iguais perante a lei sendo que o seguinte salienta a não discriminação ao certificar que é proibida a discriminação em razão, designadamente, do sexo, raça, cor ou origem étnica ou social, características genéticas, língua, religião ou convicções, opiniões políticas ou outras, pertença a uma minoria nacional, riqueza, nascimento, deficiência, idade ou orientação sexual. Pode-se dizer que há três momentos importantes na evolução das políticas para a igualdade na Europa. O primeiro deles (que se inicia em meados dos anos 19703) corresponde ao liberalismo político, no qual se defende o princípio da igualdade para todos perante a lei. Depois, um momento a partir do qual as políticas para a igualdade se dirigem à discriminação positiva, ou seja, são orientadas por ações específicas positivas. Por fim, no período pós Conferência de Pequim, em 1995, as orientações destinam-se progressivamente para a promoção da transversalidade de género (mainstreaming) em todas as políticas e todos os domínios da tomada de decisão. Na União Europeia a transversalidade de género foi incluída no Tratado de Amesterdão (1997) formalizando-se assim este compromisso (Artigos n.º2 e n.º3). O Artigo n.º13 faz da eliminação das desigualdades e, especialmente, da promoção da igualdade entre homens e mulheres, uma das considerações centrais em todas as políticas públicas, aos níveis administrativos central e local. Na sequência do Tratado e no espírito de Pequim, a Comissão Europeia tem aprofundado esta preocupação e muitos países da UE adoptaram iniciativas neste sentido (Gaspar, Queirós, Marques da Costa et al., 2009). 3 Primeira Conferência Mundial sobre as Mulheres, que decorreu no México, em 1975. POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS No âmbito da legislação europeia e nos dez anos que seguiram à publicação da Carta dos Direitos Fundamentais em 2000, a União Europeia aprovou um conjunto de diretivas e decisões de luta contra a discriminação, das quais se evidenciam as seguintes: • Diretiva 2000/43/CE e Diretiva 2000/78/CE: constituem os alicerces da política comunitária, proíbem a discriminação direta e indireta com base na origem racial ou étnica, na religião ou nas convicções, na deficiência, na idade e na orientação sexual. • Diretiva 2004/113/CE: aplica o princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços. • COM (2004) 379 final, de 28 de Maio de 2004: Livro Verde – Igualdade e combate à discriminação na União Europeia alargada. • Decisão n.º771/2006/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Maio de 2006: institui o Ano Europeu da Igualdade de Oportunidades para Todos (2007) - Para uma Sociedade Justa. • Decisão‑Quadro 2008/913/JAI: estabelece normas comuns para a luta contra os crimes raciais; relativa à luta por via do direito penal contra formas e manifestações de racismo e xenofobia. Destaca-se ainda como fundamental a Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA) ‑ a partir do Observatório Europeu do Racismo da Xenofobia ‑ criada pelo Regulamento (CE) n.º168/2007 do Conselho para uma abordagem integrada no tratamento da desigualdade e da defesa de direitos. A FRA é um órgão de aconselhamento sediado em Viena e tem por missão recolher evidências e informações, fornecer assistência e implementar competências para ajudar a respeitar os direitos humanos e contribuir para soluções de melhoria das situações. Finalmente, uma menção ao Comité das Regiões, que tem sido um defensor determinado da política comunitária no domínio da anti-discriminação. Segundo Avelãs Nunes (20104), o modelo económico-social europeu pressupõe soluções que tornam as preocupações sociais compatíveis com a eficiência económica. Por esse motivo, a União Europeia tem investido na defesa da diversidade de culturas, no combate às desigualdades, na promoção das realizações culturais enquanto elementos identificadores dos europeus. Estas ideias pressupõem uma UE constituída por Estados soberanos e iguais em direitos, apostada no reforço permanente da coesão social. Esse investimento não passa somente pela produção de instrumentos legais, mas pelas organizações que têm criado e apoiado no seu seio e que na UE combatem a discriminação e promovem a igualdade. Por conseguinte, existem hoje inúmeras redes de grupos que representam e defendem os direitos de pessoas vítimas de discriminação e atuam no domínio da defesa dos direitos fundamentais, bem como promovem a igualdade entre homens e mulheres e a inclusão de grupos vulneráveis. O Quadro 2 contém algumas referências a estas redes europeias de entidades não governamentais. 4 http://resistir.info/europa/notas_avelas.html 25 26 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO QUADRO 2 ONG PARA OS DIREITOS DE PESSOAS VÍTIMAS DE DISCRIMINAÇÃO QUE ATUAM NO DOMÍNIO DA DEFESA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA EUROPA EWL Lobby europeu das mulheres A maior aliança de organizações não governamentais da UE que promove os direitos das mulheres e a igualdade entre sexos YFJ Fórum Europeu da Juventude Plataforma que representa as organizações de juventude europeias nas instituições internacionais em questões relevantes para os jovens Eurochild Rede de organizações e indivíduos que atuam na Europa para melhorar a qualidade de vida das crianças e jovens AGE Plataforma europeia das pessoas idosas Rede europeia de pessoas de mais de 50 anos que procura dar voz e promover os interesses dos cidadãos seniores da Europa ILGA – Europe Associação internacional de lésbicas e de homossexuais Trabalha em torno do reconhecimento e respeito pelos direitos humanos fundamentais, em particular no Desenvolvimento do movimento LGBT, procurando igualdade para as pessoas com orientação homo, bi, trans e intersexual na Europa EDF Fórum Europeu da Deficiência ONG que monitoriza as iniciativas da UE e propõe legislação para defender os direitos de cidadãos com deficiência ENAR Rede europeia contra o racismo Rede europeia para combate ao racismo em todos os países membros da EU atuando como a voz do movimento antirracista na Europa EAPN Rede Europeia Anti-pobreza Rede que defende os direitos humanos fundamentais e procura garantir que todos tenham as condições necessárias ao exercício da cidadania e a uma vida digna http://ec.europa.eu/social/main.jsp?catId=330&langId=pt Para além da legislação, dos textos formais e das entidades e grupos organizados que proliferam na UE, ainda há que contar com a disponibilização de instrumentos financeiros (Fundo Social Europeu; Iniciativa Comunitária EQUAL 2000-2006) que nos últimos períodos de programação integraram a igualdade e a discriminação nas estratégias e programas de políticas. Apontam-se alguns dos principais, como os (i) programas em matéria de educação, formação, juventude, de integração e asilo: INTI (integração dos nacionais de países terceiros); ARGO (cooperação administrativa em matéria de fronteiras externas, vistos, asilo e imigração); Programas de integração das minorias étnicas no plano social e no mercado de trabalho (PHARE e Estratégia Europeia de Emprego e as atuais orientações para o emprego); e (ii) o Programa Comunitário para o Emprego e a Solidariedade Social – PROGRESS 2007-2013 (Decisão n.º1672/2006/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro). O Programa PROGRESS ao juntar domínios habitualmente apoiados por diferentes programas de ação, demonstra uma evolução na formulação de políticas, ao se preocupar com a coerência e a eficácia das políticas comunitárias (Fig. 2). POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS FIGURA 2 O PROGRESS 2007-13 Programa Comunitário para o Emprego e a Solidariedade Social - PROGRESS Decisão n.º 1672/2006/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 24 de Outubro de 2006 Cinco grandes domínios de Ação Um único programa-quadro Emprego Até à data, as ações comunitárias nestes 5 domínios eram apoiadas por diferentes programas de ação Proteção e inclusão sociais Luta contra a discriminação e diversidade Orçamento de 743 milhões de euros para o período de 2007-13 (repartição financeirade 23% para a discriminação e 12% para a igualdade) Integração de programas de ação Condições de trabalho Igualdade entre homens e mulheres Maior e coerência e eficácia Fonte: Queirós, Marques da Costa, et al. (2010) Por fim, são de assinalar outros instrumentos “de sensibilização” e que evidenciam prioridades políticas, como as ações de sensibilização relacionadas com o Ano Europeu de Pessoas com Deficiência em 2003, o Ano Europeu da Igualdade de Oportunidades para Tod@s em 2007, o Ano Europeu do Diálogo Intercultural em 2008 e o Ano Europeu de Luta contra a Pobreza e a Exclusão Social em 2010. No quadro dos documentos formais em Portugal, salienta-se a importância do texto fundador da democracia portuguesa, a Constituição da República Portuguesa, na expressão da igualdade de todos e na necessidade da luta contra as diferentes formas de discriminação. Assim revisitam-se os Artigos 13º e 26º: Artigo 13.º (Princípio da igualdade). 1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual. 27 28 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO Artigo 26.º (Outros direitos pessoais). 1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reservada intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação. 2. A lei estabelecerá garantias efetivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias. 3. A lei garantirá a dignidade pessoal e a identidade genética do ser humano, nomeadamente na criação, desenvolvimento e utilização das tecnologias e na experimentação científica. 4. A privação da cidadania e as restrições à capacidade civil só podem efetuar-se nos casos e termos previstos na lei, não podendo ter como fundamento motivos políticos. Sendo este articulado fundamental na promoção da igualdade como desígnio nacional, a sua tradução em legislação complementar surge dispersa e diferenciada em função das categorias analíticas da discriminação (género, idade orientação sexual, deficiência e imigrantes/minorias étnicas) o que se deve aparentemente ao modo como o Estado Português vai estabelecendo prioridades e como os diferentes organismos do Estado se organizam ‑ e encaram institucionalmente as diferentes discriminações. No entanto, fruto do processo integrador europeu e de decisões políticas relativas ao modelo social dos governos nacionais, inicia‑se uma alteração profunda desta dispersão a partir de 2005 (XVII e XVII Governos Constitucionais) no sentido de uma convergência legislativa nacional impulsionadora da igualdade. Nos últimos anos tem-se assistido a uma série de desenvolvimentos importantes nos esforços nacionais para combater a discriminação e assegurar a igualdade de oportunidade para todos, tanto em termos legislativos como em outras formas de intervenção das políticas públicas. De seguida expõe-se uma síntese da evolução da legislação nacional e de instrumentos relevantes por categoria de discriminação. IGUALDADE DE GÉNERO De modo a dar prosseguimento a este desígnio político, surgem nos últimos anos documentos formais que transmitem um olhar transversal sobre as políticas de igualdade entre homens e mulheres, dos quais se distinguem, por um lado, os Planos Nacionais contra a Violência Doméstica (4ª versão), os Planos Nacionais contra o Tráfico de Seres Humanos (2ª versão) 3 os Planos Nacionais para a Igualdade (já na sua 4ª versão) Por outro lado, alguns documentos legais, como a Lei Orgânica da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) (Decreto-Lei n.º164/2007), a Lei n.º14/2008, de 14 de Março que proíbe e sanciona a discriminação em função do sexo no acesso a bens e serviços, a RCM n.º161/2008, de 22 de Outubro que adopta medidas de promoção da transversalidade da perspectiva de género na Administração Central e cria a figura da Conselheira/o da Igualdade e, muito recentemente, o Quadro de POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS Referência do Estatuto das Conselheiras e dos Conselheiros Locais para a Igualdade (RCM n.º39/2010, de 25 de Maio). Num contexto de consolidação da política nacional no domínio da Igualdade de Género merecem referência: (i) o IV Plano Nacional Contra a Violência Doméstica que constitui um instrumento de política de promoção da cultura para a cidadania e igualdade, de reforço de campanhas de informação e de formação, e de apoio e acolhimento das vítimas numa perspectiva de reinserção e autonomia; e (ii) em virtude de uma crescente feminização da pobreza, portanto, da maior vulnerabilidade das mulheres (e das crianças), a tornarem-se vítimas de tráfico, os I e II Planos Nacionais contra o Tráfico de Seres Humanos que têm como objectivo contribuir para a erradicação do fenómeno em Portugal e proteger os grupos expostos a situações de exploração sexual e laboral5 segundo um modelo que define áreas estratégicas de intervenção. Os Planos Nacionais para a Igualdade são instrumentos fundamentais de políticas públicas de promoção da igualdade de género e enquadram-se nos compromissos assumidos por Portugal nas várias instâncias internacionais e europeias. Os objectivos dos PNI afirmam a igualdade como factor de competitividade e desenvolvimento. Atualmente em vigor, o IV PNI (IV Plano Nacional Para a Igualdade - Género, Cidadania e não Discriminação, 2011-2013) reforça a articulação interministerial e aposta na proximidade com os municípios e as organizações da sociedade civil, de modo a estimular uma atuação em rede e de proximidade com as populações. A rede de municípios que promovem a igualdade de género e a cidadania, bem como a sociedade civil organizada (organizações não governamentais) são os parceiros estratégicos na implementação das políticas públicas de igualdade e não discriminação. Estruturado em três capítulos, o plano prevê a adopção de um conjunto de medidas estruturadas em torno de 14 Áreas Estratégicas: (i) Integração da dimensão de género na Administração Pública, Central e Local; (ii) Independência Económica, Mercado de Trabalho e Organização da vida profissional, familiar e pessoal; (iii) Educação e Ensino Superior e Formação ao longo da vida; (iv) Saúde; (v) Ambiente e Organização do Território; (vi) Investigação e Sociedade do Conhecimento; (vii) Desporto e Cultura; (viii) Media, Publicidade e Marketing; (ix) Violência de Género; (x) Inclusão Social; (xi) Orientação Sexual e Identidade de Género; (xii) Juventude; (xiii) Organizações da Sociedade Civil; (xiv) Relações Internacionais e Cooperação. Importa porém destacar que o IV PNI dá continuidade ao III PNI e reforça a componente municipal da atuação da política pública iniciada também pelo III Plano 5 Um relatório elaborado no âmbito da Iniciativa Global Contra o Tráfico de Seres Humanos das Nações Unidas (UN, 2009) indica que a exploração sexual assume-se como a forma mais relatada de tráfico, com 79% dos casos, registando o tráfico para fins de exploração laboral 18% das situações identificadas; as mulheres (80-84%) e as crianças (13-21%) são as principais vítimas do tráfico. 29 30 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO Nacional para a Igualdade – Cidadania e Género (III PNI, resultante da RCM n.º82/2007, de 22 de Junho)6. Este plano confere um lugar destacado às políticas públicas na esfera da administração pública local. O III PNI reafirma a importância da Administração Pública nas diferentes escalas, como responsável pela construção e implementação de políticas de igualdade e de não discriminação. Para tal são enunciados dois objectivos claros de aplicação no âmbito local: apoiar a integração da dimensão de género nas diferentes áreas de política da Administração Local; dinamizar o envolvimento das Autarquias no reforço da cidadania. Assim, o primeiro objectivo indica formas de intervenção junto das autarquias assinalando os instrumentos legais e políticos a concretizar: sensibilizar as Autarquias para a criação e desenvolvimento de Planos Municipais para a Igualdade; preparar o enquadramento jurídico relativo ao Conselheiro ou Conselheira Local para a Igualdade visando a promoção da igualdade em todas as políticas locais, nomeadamente no quadro da Rede Social; definir e elaborar recursos, instrumentais e materiais, de suporte ao trabalho das Autarquias e outros atores locais. Estes objectivos sugerem a existência de planos e politicas locais de igualdade, bem como a figura institucional de promoção da igualdade - que são os Conselheiros/as da Igualdade. Por outro lado, no item de promoção da cidadania, o III PNI reforça o papel das Autarquias locais propondo: estimular o desenvolvimento de estratégias, ao nível local, promotoras do envolvimento da sociedade civil, nomeadamente, de associações locais; apoiar os mecanismos de proximidade entre o poder local e os cidadãos e as cidadãs, divulgando as boas práticas existentes neste domínio. Este plano surge assim como o documento inovador de politicas nacionais a que seguiram a criação da CIG7, nascida da anterior Comissão para a Igualdade e Direitos das Mulheres (CIDM), bem como a legislação (Resoluções do Conselho de Ministros) que cria as figuras das Conselheiras(o)s da Igualdade na Administração Central e Local (de 2008 e 2010 respectivamente). A RCM n.º161/2008, de 22 de Outubro, adoptou medidas de promoção da transversalidade da perspectiva de género na administração central do Estado e aprovou o Estatuto das Conselheiras e dos Conselheiros para a Igualdade, bem como dos membros das equipas interdepartamentais para a igualdade, introduzindo, nomeadamente, a obrigação de utilização da linguagem não discriminatória em todos os atos normativos do Estado. Este foi assim um importante passo dado para a promoção da igualdade a nível da administração pública. 6 Antecedeu-lhe o II Plano Nacional para a Igualdade, PNI 2003‑2006. 7 A CIG é um organismo da Administração Pública integrado na Presidência do Conselho de Ministros e tutelada atualmente pela Secretaria de Estado da Igualdade, criada pelo Decreto-Lei n.º202/2006, de 27 de Outubro tem no Decreto-Lei n.º164/2007, de 3 de Maio de 2007, a sua lei orgânica). POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS O passo fundamental seguinte aconteceu já em 2010, com a publicação, da RCM n.º39/2010, de 25 de Maio, que cria o quadro de referência do Estatuto das Conselheiras e dos Conselheiros Locais para a Igualdade. Este documento é essencial para a construção de uma visão integrada e transversal das questões da igualdade. Segundo este documento, as conselheiras e os conselheiros locais para a igualdade têm por atribuição acompanhar e dinamizar a implementação das políticas locais para a cidadania e a igualdade de género, promovendo a aplicação (no âmbito multi‑escalar da administração pública) das políticas de igualdade entre mulheres e homens. O preâmbulo da referida resolução afirma que tendo em conta o desígnio constitucional e político da igualdade entre homens e mulheres (RCM n.º39/2010, 1768): A valorização desta temática nas políticas públicas de âmbito local reveste -se de enorme importância. Consequentemente, tem vindo a ser feito um trabalho de sensibilização junto das autarquias para a integração sistemática da dimensão de género nas diferentes áreas de política da administração local, através da elaboração e desenvolvimento de planos municipais para a igualdade. Esse é um dos domínios em que a cooperação entre a administração central e as autarquias locais nos domínios da integração da igualdade de género, da eliminação dos estereótipos e da promoção da cidadania tem vindo a ser aprofundada com resultados mais significativos. Esta recente legislação reafirma como competências das conselheiras e dos conselheiros locais para a igualdade as seguintes (RCM n.º39/2010, 1769): • Acompanhar e dinamizar a execução das medidas de política local na perspectiva de género; • Acompanhar e dinamizar a implementação das medidas previstas nas estratégias locais de promoção da igualdade, nomeadamente o Plano Municipal para a Igualdade, e de prevenção da violência doméstica e outras formas de discriminação; • Pronunciar-se, quando consultados, relativamente ao impacto de medidas de natureza administrativa, regulamentar ou outras que o município pretenda prosseguir nos domínios transversalizados da educação para a cidadania, da igualdade e não discriminação, da proteção da maternidade e da paternidade, da conciliação da vida profissional, pessoal e familiar de homens e mulheres, do combate à violência doméstica e outras formas de discriminação; • Apresentar propostas concretas de ação nos domínios referidos na alínea anterior; • Divulgar informações sobre a igualdade de género, designadamente nos domínios da educação para a cidadania, da igualdade e não discriminação, da proteção da maternidade e da paternidade, da conciliação da vida profissional, pessoal e familiar de homens e mulheres, e do combate à violência doméstica e outras formas de discriminação; • Participar no fórum anual das conselheiras e dos conselheiros locais para a igualdade; • Assegurar a cooperação do município com a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género. ORIENTAÇÃO SEXUAL Em Portugal não existe uma política pública dirigida para combater a discriminação ou para defesa dos direitos das populações LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e 31 32 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO transgéneros). A orientação sexual é, de entre as categorias analíticas estudadas, a menos contemplada na produção legislativa ‑ o que se deve ao facto do tema da orientação sexual ser um tópico novo assumido no quadro institucional e político da sociedade portuguesa. E, certamente, por a minoria LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero) sofrer de formas de discriminação não facilmente detectáveis/explícitas, ou seja, a homofobia e a transfobia como formas de discriminação encontram‑se muitas vezes presentes em práticas e discursos sociais tidos como aceitáveis ainda que funcionem como modos de discriminação através do silenciamento e da injúria desta população. É apenas em 2004 que a orientação sexual é introduzida no n.º2 do Artigo 13º no quadro Constituição Portuguesa, fruto de uma intervenção do movimento LGBT e da influência da legislação europeia anti‑discriminação. É pois a partir da segunda metade desta década que institucionalmente se opera uma mudança na relação do Estado português com a orientação sexual, sendo que a mesma é ainda expressa de um modo pouco claro nos documentos orientadores, tendo duas das associações LGBT passado a fazer parte do Conselho Consultivo da CIG em 2008, a ILGA Portugal e a Opus Gay. As referidas associações atuam no âmbito social para a melhoria da qualidade de vida; na luta contra a discriminação em função da orientação sexual e da identidade de género, e através da promoção da cidadania, dos Direitos Humanos e da igualdade de género. Anteriores a esta mudança de política existiram algumas alterações legais que começam com a descriminalização da homossexualidade que sai da legislação portuguesa no Código Penal de 1982. Este foi o primeiro passo para uma alteração da percepção social, cultural e institucional de lésbicas e gays que ganha um impulso, já nesta década, com um conjunto de iniciativas legislativas surgidas do trabalho de pressão política, social e cultural do movimento LGBT. Em 2001 é aprovada a Lei de Uniões de Facto (Lei n.º7/2001, de 11 de Maio) que pretendeu regular a situação jurídica de duas pessoas, independentemente do sexo, que vivam em união de facto há mais de dois anos. Esta legislação concedeu os mesmos direitos a casais de pessoas do mesmo sexo e de sexo diferentes exceptuando o impedimento de casais de pessoas do mesmo sexo de adoptarem. Devido a uma ausência de regulamentação posterior a lei não é aplicada em toda a sua potencialidade, pois em matérias onde a devida regulamentação seria necessária, a sua aplicação ficou sujeita ao conhecimento e vontade dos agentes de várias estruturas do Estado. Posterior a esta mudança, em 2004, e no âmbito VI Revisão Constitucional, a Assembleia da República introduz uma alteração no artigo 13º (Principio da Igualdade) o que coloca o país na linha da frente da proteção constitucional em função da orientação sexual onde ombreia com a África do Sul e o Equador. Esta alteração leva a que o Tribunal Constitucional considere inconstitucional o artigo 175º do Código Penal que diferenciava a idade de consentimento para relação heterosse- POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS xual e homossexual. Esta posição conduz à revogação do Artigo 175º (na revisão do Código Penal de 2005) e eliminação de todas as menções à homossexualidade, passando, pelo contrário (e pela primeira vez), a penalizar explicitamente o incitamento à discriminação com base na orientação sexual, prevendo ainda o agravamento penal explícito de crimes motivados pela homofobia, bem como, introduz também a referência à violência doméstica em casais de pessoas do mesmo sexo. Este percurso legislativo - que começa com a descriminalização em 1982 - culmina em 2010 com a aprovação da legislação que permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo (Lei n.º9/2010, de 31 de Maio) sendo que os casais de pessoas do mesmo sexo possuem os mesmos direitos e deveres (com exceção da adopcão pelo casal). Para além dos textos legais que procuram responder perante as necessidades e reivindicações destas minorias, existem no país algumas iniciativas que merecem uma referência por serem inovadoras e procurarem intervir nos níveis mais baixos do processo de socialização, como é a Lei n.º60/2009, de 6 de Agosto, que estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar e que tem as seguintes finalidades: (...) f) O respeito pela diferença entre as pessoas e pelas diferentes orientações sexuais; h) A promoção da igualdade entre os sexos; l) A eliminação de comportamentos baseados na discriminação sexual ou na violência em função do sexo ou orientação sexual. O debate sobre homofobia no espaço escolar é importante pelo papel (re)produtor da educação na promoção da igualdade e na luta contra a discriminação o que leva o movimento LGBT, nomeadamente a associação rede ex aequo, a promover um conjunto de projetos, dos quais se destaca um programa de sensibilização para o bullying homofóbico nas escolas, que aponta para a ocorrência de muitas situações de homofobia e transfobia nas escolas em Portugal e, por esse motivo, alerta para o facto da escola ainda não ser um espaço seguro para muitos jovens homossexuais, bissexuais e/ou transgéneros, ou percepcionados como tal. De acordo com o Observatório de Educação LGBT8: (…) as agressões no espaço escolar contribuem seriamente para situações de baixa autoestima, isolamento, depressões e ideação e tentativas de suicídio, assim como para o insucesso e abandono escolar de muitos jovens LGBT (...) (…) urge a necessidade de formar e informar corretamente professores, alunos e auxiliares de educação. (…) (…) Cada queixa/denúncia reflete vivências intra/interpessoais reais do dia-a-dia. Essas situações ocorreram e continuarão a ocorrer se nada se fizer em contrário(…) 8 Relatório de 2008 sobre homofobia e transfobia. Rede Ex aequo. 33 34 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO IDADE O quadro legislativo que configura a luta contra a discriminação em função da idade, em especial dos grupos mais sensíveis ‑ crianças, jovens e idosos ‑ é bastante menos integrado quando comparado com as políticas de igualdade de género, de integração de imigrantes ou de luta contra a discriminação de pessoas deficientes. No caso das crianças, o artigo 69º da Constituição da República Portuguesa refere que estas têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. Este contexto constitucional e os compromissos e recomendações internacionais de referência no domínio dos direitos das crianças e jovens, dão origem a documentos e entidades formais: Comissões de Proteção de Menores (Decreto‑Lei n.º189/91, de 17 de Maio), Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º147/99, de 1 de Setembro), Lei Tutelar Educativa (Lei n.º166/99, de 14 de Setembro) e o Plano Nacional de Ação para a Inclusão 2006/08, PNAI. A Lei n.º147/99, de 1 de Setembro cria um novo modelo de proteção de crianças e jovens em risco; em vigor desde Janeiro de 2001, apela à participação ativa da comunidade, numa relação de parceria com o Estado, concretizada nas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), capaz de estimular as energias locais potenciadoras de estabelecimento de redes de desenvolvimento social. Anterior à lei que está na base das CPCJ, o enquadramento institucional para as crianças e jovens em risco de 1997 (RCM nº193/97, de 3 de Outubro), tem como entidade fundamental a Comissão Nacional de Proteção das Crianças e Jovens em Risco (CNPCJR) à qual compete planificar a intervenção do Estado, bem como a coordenação, acompanhamento e avaliação da ação dos organismos públicos e da comunidade, em matéria de proteção de crianças e jovens em risco. A CNPCJR tem como objectivos: • A proteção de crianças e jovens em perigo (Família, Ministério Público, Tribunais, CPCJ); • O apoio dos Municípios: disponibilização de recursos, apoio administrativo, cedência de instalações, presidência das CPCJ (cerca de 50-60%); • O apoio da Segurança Social e escolar. A política de auxílio das crianças e de promoção dos direitos da criança em Portugal está estruturada para a criação de um modelo de proteção das crianças vítimas de abuso e de maus tratos, orientada para a violência doméstica, para amparo e assistência das suas vítimas, incluindo crianças ou jovens vítimas de violência. As causas mais frequentes das situações de risco ou perigo para as crianças são a negligência, maus tratos físicos e psíquicos, abandono escolar, exposição a comportamentos desviantes. POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS O modelo de proteção de crianças e jovens em risco, em vigor desde Janeiro de 2001, apela à participação ativa da comunidade, numa relação de parceria com o Estado, concretizada nas CPCJ, capaz de criar sinergias para o estabelecimento de redes de desenvolvimento social. As Comissões de Proteção de Menores, criadas na sequência do Decreto-Lei n.º189/91, de 17 de Maio, foram reformuladas de acordo com a Lei n.º147/99, de 1 de Setembro (alterada pela Lei n.º31/2003, de 22 de Agosto, e Regulamentada pelo DL n.º332‑B/2000, de 30 de Dezembro) para dar origem às CPCJ. As CPCJ, como instituições oficiais não judiciárias visam promover os direitos da criança e do jovem e prevenir ou pôr termo a situações susceptíveis de afectar a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral, intervindo sempre que a criança está em perigo como sejam: o abandono por parte da família; maus tratos físicos ou psíquicos ou quando é vítima de abusos sexuais; não recebimento de cuidados e afeição adequados à sua idade e situação pessoal; é obrigada a atividade ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento; entre muitos outros. A legislação destinada à juventude tem um enquadramento amplo no sentido de (i) disponibilização de informação relacionada com programas para a juventude, (ii) promoção da participação dos jovens em todos os domínios da vida social e de (iii) integração dos jovens nas diversas dimensões da vida ativa ‑ política de habitação, emprego, desporto, lazer, entre outras – domínios fundamentais para apoiar os jovens no seu processo de emancipação e de integração no mercado de trabalho. Porém, se há uma profusão de documentos estruturantes, não existe um documento geral e integrador da política nacional da juventude. No conjunto de políticas sectoriais para a juventude, destaca-se o Programa Porta 65 que possibilita o arrendamento por jovens beneficiando de condições facilitadas, ou a criação do Cartão Jovem Municipal (ao abrigo do sistema Cartão Jovem, gerido no âmbito da Secretaria de Estado da Juventude e Desporto). Num sentido mais amplo, a educação para a cidadania, da iniciativa do Ministério da Educação, dirige-se à educação escolar para jovens e visa assegurar que estes se tornarão cidadãos ativos e responsáveis, capazes de contribuir para o desenvolvimento e o bem-estar da sociedade. A educação para a cidadania procurar estimular a reflexão sobre um conjunto de temas atuais, tais como direitos humanos, ambiente, saúde, sexualidade, prevenção rodoviária, igualdade de género e outros que preparam os jovens para uma cidadania responsável (Comissão Europeia, 2005). No quadro legislativo orientado para a juventude são os Conselhos Municipais de Juventude (CMJ) criados na Lei nº 8/2009, de 18 de Fevereiro, que enquadram as políticas públicas locais de juventude. Estes Conselhos têm várias competências das quais se destacam: 35 36 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO • Colaborar na definição e execução das políticas municipais de juventude, assegurando a sua articulação e coordenação com outras políticas sectoriais, nomeadamente nas áreas do emprego e formação profissional, habitação, educação e ensino superior, cultura, desporto, saúde e ação social; • Promover a discussão das matérias relativas às aspirações e necessidades da população jovem residente no município respectivo; • Promover iniciativas sobre a juventude a nível local; colaborar com os órgãos do município no exercício das competências destes, relacionadas com a juventude. Em Portugal também não existe uma lei geral de proteção às pessoas idosas. Porém, regista-se um conjunto de direitos e benefícios do Cidadão Idoso - em particular os relativos à Segurança Social (pensão social, pensão mínima, complemento de dependência, comparticipação para lar, …), à Saúde (isenção de taxas moderadoras, bonificação na comparticipação de medicamentos, …) e à Justiça (obrigação de prestação de alimentos, contratos de arrendamentos, …). Merece uma referência o Decreto-lei nº265/99, de 14 de Julho que, de certa forma enquadra o apoio na velhice, e se dirige a pessoas com mais graves carências sociais ao definir e regular a proteção social a conceder a pensionistas em situação de dependência (indivíduos que não possam praticar de forma autónoma os atos indispensáveis à satisfação das necessidades básicas da vida quotidiana, carecendo da assistência de outrem). Mais focalizado nos idosos, o Decreto-Lei n.º232/2005, de 29 de Dezembro (alterado pelos DL n.º151/2009, de 30 de Junho e DL n.º 236/2006, de 11 de Dezembro), institui uma prestação extraordinária de combate à pobreza dos idosos, designada por complemento solidário para idosos, integrada no subsistema de solidariedade. A acessibilidade das pessoas de mobilidade reduzida, os deficientes, os idosos, as famílias com crianças ou as próprias crianças é um elemento estruturante para a inclusão (Livro Verde, 2007 - Por uma nova cultura de mobilidade urbana). No Livro Verde - Por uma nova cultura de mobilidade urbana entende-se a acessibilidade em sentido amplo, representando o acesso a locais, bens, serviços e infraestruturas, e à informação (conceito não exclusivo à noção de mobilidade). Em termos de condições de mobilidade, contextos de vida e autonomia, existe uma forte correlação entre a deficiência e a idade, e este problema acentua-se no caso das mulheres. Por seu lado, a urbanização e o envelhecimento também se relacionam na maior dificuldade no acesso aos espaços públicos, habitação, transportes, saúde, serviços básicos, informação, limitando as pessoas nestas condições à participação na vida em sociedade. Procurando prevenir diversas formas de discriminação ou exclusão e tendo em vista proporcionar um aumento da qualidade de vida das pessoas com mobilidade condicionada ou necessidades especiais, o Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade (PNPA 2007-2015), propõe medidas integradas para promover a acessibilida- POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS de ao meio edificado, aos espaços públicos, aos transportes e às tecnologias de informação a pessoas com mobilidade condicionada ou com necessidades especiais. Com efeito, o PNPA constitui um instrumento estruturante das medidas que visam a melhoria da qualidade de vida, em especial, a realização dos direitos de cidadania das pessoas com necessidades especiais, pois as barreiras promovem a exclusão social, acentuam preconceitos e favorecem práticas discriminatórias, prejudicando, nomeadamente, as pessoas com deficiência e os mais idosos. Para além de ser um imperativo de cidadania, a promoção da acessibilidade é, também, uma oportunidade para inovar e para promover a qualidade, a sustentabilidade e a competitividade9. No mesmo sentido, o Decreto-lei n.º163/2006, de 8 de Agosto, define a política a construção de um sistema global, coerente e ordenado em matéria de acessibilidades, susceptível de proporcionar às pessoas com mobilidade condicionada, condições iguais às das restantes pessoas. PESSOAS COM DEFICIÊNCIA Do conjunto das pessoas com deficiência e/ou com necessidades especiais, fazem parte sujeitos com mobilidade condicionada, isto é, pessoas que se deslocam em cadeiras de rodas, incapazes de andar ou que não conseguem percorrer grandes distâncias, com dificuldades sensoriais, tais como as pessoas cegas ou surdas, e ainda aquelas que, em virtude do seu percurso de vida, se apresentam transitoriamente condicionadas, como as grávidas, as crianças e os idosos. A Lei de Bases da Prevenção, Habilitação, Reabilitação e Participação das Pessoas com Deficiência (Lei n.º38/2004, de 18 de Agosto), estabelece que compete ao Estado a promoção de uma sociedade para todos através da eliminação de barreiras e da adopção de medidas que visem a plena participação da pessoa com deficiência. A legislação sobre deficiência é marcada por uma dispersão de instrumentos ao longo do tempo, bem como das instituições do Estado a que competia tutelar as diferentes políticas sectoriais. Será com a publicação de dois documentos legais que se tornam fundamentais para as orientações políticas do Estado Português na luta contra a discriminação das pessoas portadoras de deficiência: por um lado, a Lei n.º46/2006, de 28 de Agosto que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde; por outro, a RCM n.º120/2006, de 21 de Setembro, que institui o Plano de Ação para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade (PAIPDI), posteriormente revisto em 2008 (RCM n.º88/2008, de 29 de Maio). Este plano estrutura-se em três eixos: 9 Em consonância com o PNPA, o Programa RAMPA (regime de apoio aos municípios para a acessibilidade) corresponde a uma segunda geração de planos de acessibilidades apoiados pelo POPH para promoção de boas práticas no âmbito da deficiência. 37 38 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO • EIXO 1. Acessibilidade e informação: aprova o regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via pública e edifícios habitacionais,… (o referido Decreto-Lei n.º163/2006, de 8 de Agosto); • EIXO 2. Educação, qualificação, emprego: Centros Novas Oportunidades para pessoas com deficiência; Programa curricular de língua gestual; Formação contínua nos centros de recursos locais e especializados do IEFP,…; • EIXO 3. Habitação e condições de vida dignas: criação de Serviços de informação e mediação nas Autarquias (SIM-PD); Aumento da frota dos transportes públicos urbanos totalmente acessível; Aumento da capacidade instalada em centros, lares, apoio domiciliário, …; Adaptação de fogos… A RCM n.º9/2007, de 17 de Janeiro de 2007, define o Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade (PNPA) que apresenta um conjunto de medidas que visam possibilitar ao segmento populacional das pessoas com mobilidade condicionada, uma utilização plena de todos os espaços públicos e edificados, mas também dos transportes e das tecnologias de informação, o qual irá proporcionar um aumento da sua qualidade de vida e a prevenção e eliminação de diversas formas de discriminação ou exclusão. O Guia Acessibilidade e Mobilidade para Todos, Desenho Universal ou Desenho para Todos, bem como o Regime da Acessibilidade aos Edifícios e Estabelecimentos que Recebem Público, Via Pública e Edifícios Habitacionais (Decreto-Lei n.º163/2006, de 8 de Agosto) são instrumentos de política que se complementam na luta contra a mobilidade condicionada. A Lei n.º46/2006, de 28 de Agosto (proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde) previne e proíbe a discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência e sanciona atos que se traduzam na violação de direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de direitos económicos, sociais, culturais ou outros, por pessoas, em razão de uma qualquer deficiência. Esta figura apenas se refere às autarquias locais ao elencar o tipo de práticas discriminatórias que são alvo de proibição ao abrigo da referida lei. Neste sentido a alínea j) do artigo 4º refere a adopção de prática ou medida por parte de qualquer empresa, entidade, órgão, serviço, funcionário ou agente da administração direta ou indireta do Estado, das Regiões Autónomas ou das autarquias locais, que condicione ou limite a prática do exercício de qualquer direito, reforçando a importância que as autarquias locais, na promoção da igualdade e na luta contra a discriminação. Nesse mesmo ano é publicado o PAIPDI que pretendeu, tal como referiu o então Ministro responsável, Vieira da Silva, na versão alargada do plano10: O XVII Governo Constitucional operou uma viragem na tradição institucional portuguesa face às questões da reabilitação das pessoas com deficiência, ao assumir, pela primeira vez, a sua consagração como área individualizada na orgânica do Governo. Foi uma opção simbólica, mas também estratégica, com base na convicção de que uma abordagem integrada do 10 Plano de Ação para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade, p.7 (versão alargada). POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS ponto de vista da condução política favorece não apenas a visibilidade da problemática da deficiência mas também a coordenação, a eficácia e a responsabilização dos poderes públicos nesta matéria tão complexa. Este documento parte do quadro político europeu para a redefinição e clarificação da política nacional de promoção da igualdade e luta contra a discriminação das pessoas portadoras de deficiência. De entre as temáticas, está a clarificação de um dos problemas mais destacados das políticas de igualdade para pessoas com deficiência que está relacionada com a acessibilidade aos edifícios públicos. Assim, o Decreto-Lei n.º123/97, de 22 de Maio, que aprovou as normas técnicas destinadas a permitir a acessibilidade das pessoas com mobilidade condicionada ao edificado público, e à via pública, constitui um instrumento legal muito importante que desencadeia um processo de eliminação de barreiras arquitectónicas no meio edificado público, estabelecendo inclusivamente um horizonte temporal de sete anos para a introdução de alterações nas acessibilidades nos edifícios já construídos. Este documento salienta a dificuldade de aplicação desta legislação por parte dos diferentes intervenientes públicos e estatais salientando que este se deve aos seguintes factores11: A ausência de uma política nacional articulada e determinada para este fim; • A falta de diagnósticos a nível autárquico, que permitam, a nível nacional, deter informação consistente e atualizada sobre o estado da acessibilidade nos edifícios públicos, via pública e estabelecimentos que recebem público; • A ausência, na generalidade, de planos municipais de intervenção faseados para a criação de condições de acessibilidades; • E a ausência da aplicação do regime fiscalizador e penalizador previsto na lei. Legislação posterior (Portaria n.º193/2005, de 17 de Fevereiro) veio reafirmar e clarificar as disposições legais a observar em matéria de urbanização e edificação, quanto à eliminação de barreiras arquitectónicas. Neste PAIPDI é reafirmada a importância das autarquias locais em outros aspectos da luta contra a discriminação indicando como importante a conexão entre a sociedade civil e as autarquias como estruturas de proximidade. Assim, como refere o plano, pretendese o: alargamento de uma rede de serviços de informação e mediação para as pessoas com deficiências e incapacidade e suas famílias, no âmbito da Autarquias — Gabinetes Autárquicos (SIM-PD), através da celebração de acordos de parceria entre o MTSS e as autarquias (PAIPDI, p. 87). A criação destes gabinetes constitui um dos veículos de maior informação dos direitos dos portadores de deficiência, e também um elemento importante para a dinamização de uma nova cultura local em torno do combate a qualquer forma de 11 Plano de Ação para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade p.45 (versão alargada). 39 40 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO discriminação a pessoas com deficiência. Como é referido no próprio documento (PAIPDI, p.89): a produção legislativa por si só é claramente insuficiente. Ela tem de ser acompanhada por uma firme liderança que imprima um modelo consistente com os direitos humanos e promova uma melhor coordenação dos esforços entre os sectores públicos e privado e a sociedade civil em geral, bem como, o planeamento estratégico de âmbito territorial assente num correto reconhecimento das necessidades, das suas prioridades e dos meios e recursos a ativar. Valoriza-se aqui o papel fundamental das autarquias e das organizações não governamentais, nomeadamente das ONGPD. Neste sentido o plano propõe uma nova cultura de ligação entre autarquias e a sociedade civil potenciando a criação de uma estrutura formal a que corresponderá o gabinete autárquico de informação. Esta alteração das políticas públicas de luta contra a discriminação está dependente, como em outros casos, de um maior intercâmbio entre o município e a sociedade civil. IMIGRANTES/MINORIAS ÉTNICAS No 3º Relatório sobre Portugal, de 2007, a Comissão Europeia Contra o Racismo e a Intolerância (ECRI), do Conselho da Europa, é referido que o país tem atualmente mais e melhores instituições12 e financiamento, assim como melhores normas. No entanto, continua a detectar-se no território nacional a existência de preconceitos raciais e xenofobia, situações de exclusão e discriminação ‑ mormente de comunidades ciganas, negros, judeus, grupos de imigrantes, e outras minorias ‑ muitas delas com origem nos próprios representantes das autoridades. A legislação portuguesa relacionada com a igualdade e a luta contra a discriminação em função da nacionalidade e da raça/etnia está organizada num conjunto de documentos legais diversificados que traduzem a vontade do Estado no seguimento da legislação europeia de combate a esta forma de discriminação. A Lei n.º134/99, de 28 de Agosto, proíbe as discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na raça, cor, nacionalidade ou origem étnica. É também este documento legal que cria a Comissão para a Igualdade e contra a Discriminação Racial obrigando, segundo o artigo 8º, ao dever de cooperação de todas as instituições do Estado com a referida Comissão, o que indicia um papel de destaque para as autarquias locais na luta contra a discriminação racial. Posteriormente o Estado português transpôs a Diretiva n.º2000/43/CE, do Conselho da União Europeia, de 29 de Junho, que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica, e tem por objectivo estabelecer um quadro jurídico para o combate à discriminação baseada em motivos de origem racial ou étnica (Lei n.º18/2004, de 11 de Maio). Esta diretiva estabelece a luta contra a discriminação no acesso a serviços públicos e privados 12 Unidade de Apoio à Vitima Imigrante e de Discriminação Racial ou Étnica; Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas; Serviço de Estrangeiros e Fronteiras,... POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS nomeadamente: à proteção social, incluindo a segurança social e os cuidados de saúde; aos benefícios sociais; à educação; ao acesso e fornecimento de bens e prestação de serviços postos à disposição do público, incluindo a habitação. Este novo quadro legal alarga a ação de promoção da igualdade e de luta contra a discriminação da legislação anterior. De salientar relativamente às autarquias locais, a referência, no elenco das práticas discriminatórias, à afirmação de que será discriminação a adopção de prática ou medida, por parte de qualquer órgão, funcionário ou agente da administração direta ou indireta do Estado, das Regiões Autónomas ou das Autarquias Locais, que condicione ou limite o exercício de qualquer direito. Na prática, a transposição desta diretiva obriga as autarquias à criação de mecanismos anti‑discriminação no seu funcionamento ‑ sabendo-se que este procedimento nem sempre acontecia. No entanto é na legislação relacionada com a imigração – fenómeno sociodemográfico e económico com crescente importância na sociedade portuguesa – que o debate público e a produção legislativa se têm centrado nos últimos anos. Na introdução da RCM n.º63-A/2007, de 3 de Maio, afirma-se que a integração dos imigrantes deve ser uma constante, quer numa perspectiva sectorial, designadamente nas áreas do trabalho, segurança social, habitação, saúde, educação e justiça, quer numa perspectiva transversal, no que toca às questões do racismo e discriminação, igualdade de género e cidadania, e nesta perspectiva se pretende desenvolver um programa político que identifique as áreas de intervenção específica de cada ministério. Esta RCM publica e coloca em vigor o Plano para a Integração dos Imigrantes (PII 2007-2010) que estabelece a política de imigração e de integração (nacional, regional e local) nos diferentes sectores, como o acesso a habitação, emprego, cuidados de saúde, bens e serviços. Tal como refere este documento (RCM n.º63-A/2007, 2964): Tradicionalmente país de emigração, Portugal passou, a partir dos anos 90, a caracterizarse por ser também um país de imigração. Os dados revelam que os imigrantes são hoje 9% da população ativa e 4% da população nacional. Neste quadro, o fenómeno migratório assume novos contornos para a sociedade portuguesa. Por um lado, consubstancia um importante contributo face à debilidade interna da situação demográfica; por outro é um factor positivo para o crescimento económico, para a sustentabilidade da segurança social e para o enriquecimento cultural do país. Contudo, esta realidade acarreta, igualmente, uma responsabilidade do Estado para com a integração destes cidadãos, com particular destaque para o reforço da coesão social e uma melhor integração e gestão da diversidade cultural. O papel positivo dos imigrantes na sociedade portuguesa não se dissocia, assim, da necessidade de políticas e medidas concretas que promovam o seu acolhimento e integração, e que assumem, por esta via, um cariz prioritário no âmbito das políticas de imigração. Este plano vai assim identificar 120 medidas distribuídas por diversas áreas sectoriais da administração pública assumindo como finalidade a integração dos imigrantes na sociedade portuguesa. Entre os seus princípios orientadores está o seguinte: igualdade de oportunidades para todos, com particular expressão na redução das 41 42 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO desvantagens no acesso à educação, ao trabalho, à saúde, à habitação e aos direitos sociais, rejeitando qualquer discriminação em função da etnia, nacionalidade, língua, religião ou sexo e combatendo disfunções legais ou administrativas. O PII 2007 revela-se sensível ao tema da igualdade de género, reconhecendo a dupla vulnerabilidade da condição mulher/imigrante. É pois a partir de um conjunto de princípios orientadores que destacam o papel do Estado na promoção da igualdade que o plano cria modelos de integração adequados. As autarquias locais são referenciadas neste documento em diferentes objectivos: • Desenvolvimento e abertura do mercado de habitação social com a colaboração das autarquias: um novo ciclo de habitação social que sirva, além dos portugueses elegíveis, os imigrantes, através da sua inserção habitacional em espaços partilhados e não segregados; • Reforço das soluções para habitantes de aglomerados habitacionais intervencionados pelo Programa Especial de Realojamento (PER), de modo a integrar população imigrante, recém-chegada a estes municípios; • Divulgação e formação no combate ao racismo e à discriminação racial com a realização de momentos de formação com a presença de inúmeras entidades do Estado e, entre elas, as Autarquias; • Participação das Associações de Imigrantes na política de acolhimento e integração estimulando a intervenção deste no processo de integração e promovendo a sua integração em políticas de âmbito local e em parcerias com as autarquias; • Consolidação e alargamento da Rede de Centros Locais de Apoio ao Imigrante (CLAI) com um forte envolvimento das autarquias e das instituições locais da sociedade civil. O Decreto-Lei n.º251/2002, de 22 de Novembro, (alterado pelo Decreto-Lei n.º27/2005, de 4 de Fevereiro) cria o Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME) entidade que dirige a atividade dos Centros Locais de Apoio ao Imigrante (CLAI), os quais asseguram a cobertura dos locais onde se verifique uma maior necessidade de informação dos cidadãos imigrantes, integrados no Centro Nacional de Apoio ao Imigrante (CNAI). Em 2006, a figura dos CLAI alterou-se (pelo Decreto-Lei n.º27/2005, de 4 de Fevereiro) e passou a designar-se Centro Local de Apoio à Integração do Imigrante – CLAII. Estes centros são espaços descentralizados de acolhimento e informação a fim de ajudar a responder aos problemas que se colocam ao processo de integração dos imigrantes. Com uma forte capacidade de interação com as entidades locais – autarquias e estruturas da sociedade civil – os CLAII têm como missão ir além da disponibilização de informação e apoiar o processo de adaptação. Em termos do seu funcionamento, os CLAII são espaços animados por técnicos da instituição parceira local que, na maioria dos casos, são as autarquias locais; todavia alguns deles são dinamizados por organizações da sociedade civil. São POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS parceiros usuais dos CLAII as autarquias, associações de imigrantes, organizações não governamentais, associações de desenvolvimento local e paróquias. REDE SOCIAL E INCLUSÃO Surgida no final dos anos 1990, pela RCM n.º197/97, de 18 de Novembro, a Rede Social foi definida como: o conjunto das diferentes formas de entreajuda, bem como das entidades particulares sem fins lucrativos e dos organismos públicos que trabalham no domínio da ação social e articulem entre si e com o Governo a respectiva atuação, com vista à erradicação ou atenuação da pobreza e exclusão social e à promoção do desenvolvimento social. Neste contexto legal, a rede social desenvolvia um conjunto de intervenções relacionadas com as seguintes áreas: a) famílias, crianças, jovens e idosos; pessoas portadoras de deficiência; b) jovens e adultos em situação de grande dependência; c) pessoas afectadas pela toxicodependência e pelo vírus HIV; d) pessoas em situação de marginalização ou marginalidade; fomento da economia social; e) animação social local. Depois de cerca de oito anos em processo de experiência piloto (41 municípios participaram neste programa experimental) foi decidida a sua implementação no território nacional pelo Decreto-Lei n.º115/2006, de 14 de Junho, que regulamenta a Rede Social, definindo o funcionamento e as competências dos seus órgãos, bem como os princípios e regras subjacentes aos instrumentos de planeamento que lhe estão associados, em desenvolvimento do regime jurídico de transferência de competências para as autarquias locais, com seguintes conceitos e objectivos: 1—A rede social é uma plataforma de articulação de diferentes parceiros públicos e privados que tem por objectivos: a) combater a pobreza e a exclusão social e promover a inclusão e coesão sociais; b) promover o desenvolvimento social integrado; c) promover um planeamento integrado e sistemático, potenciando sinergias, competências e recursos; d) contribuir para a concretização, acompanhamento e avaliação dos objectivos do Plano Nacional de Ação para a Inclusão (PNAI); e) integrar os objectivos da promoção da igualdade de género, constantes do Plano Nacional para a Igualdade (PNI), nos instrumentos de planeamento; f) garantir uma maior eficácia e uma melhor cobertura e organização do conjunto de respostas e equipamentos sociais ao nível local; g) criar canais regulares de comunicação e informação entre os parceiros e a população em geral; 2—A rede social assenta no trabalho de parceria alargada, efetiva e dinâmica e visa o planeamento estratégico da intervenção social local, que articula a intervenção dos diferentes agentes locais para o desenvolvimento social. 43 44 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO Este documento de 2006 fixa o papel das Redes Sociais na construção de políticas públicas locais de igualdade, inclusão e de luta contra a discriminação. Como refere o articulado: é fundamental que no planeamento social de carácter local, assim como na rentabilização dos recursos concelhios estejam sempre presentes as medidas e ações definidas nos diferentes documentos de planeamento, tais como o Plano Nacional para a Ação, Crescimento e Emprego (PNACE), o Plano Nacional de Ação para a Inclusão (PNAI), o Plano Nacional de Emprego (PNE), o Programa Nacional de Política de Ordenamento do Território (PNPOT), o Plano Tecnológico (PT), o Plano Nacional de Saúde (PNS), com especial enfoque na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, o Plano para a Ação e Integração para Pessoas com Deficiência e Incapacidades (PAIPDI), o Plano Nacional para a Igualdade (PNI), o Plano Nacional de Combate à Violência Doméstica (PNCVD) e a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável. Por outro lado, a Rede Social potencia uma maior horizontalidade entre todos os seus membros o que promove ainda uma maior transversalidade e interseccionalidade de diferentes políticas criando um novo tipo de parceria entre entidades públicas e privadas, atuando nos mesmos territórios, baseada na igualdade entre os parceiros, no respeito pelo conhecimento, pela identidade potencialidades e valores intrínsecos de cada um, na partilha, na participação e na colaboração, com vista à consensualização de objectivos, à concertação das ações desenvolvidas pelos diferentes agentes locais e à optimização dos recursos endógenos e exógenos ao território (Decreto-Lei n.º115/2006). Da responsabilidade do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (MTSS) merece ainda uma referência o Plano Nacional de Ação para a Inclusão (PNAI 2006-08) que vai na sua quarta versão (PNAI 2001-03; 2003-05; 2006-2008; 2008-11). Este instrumento estratégico de planeamento transversal, integrador e territorializado preconiza medidas de política, das quais se apresentam alguns exemplos: Prohabita, Progride, Contratos de Desenvolvimento Social, Bairros Críticos, PER, PARES, etc. A Portaria n.º396/2007, 2 de Abril, alterada um ano mais tarde pela Portaria n.º285/2008, de 10 de Abril, do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (cujo modelo de gestão prevê o financiamento de projetos selecionados centralmente) estabelece: o Programa CLDS e os Contratos Locais de Desenvolvimento Social (CLDS), cujos eixos prioritários se dirigem ao emprego, formação e qualificação intervenção familiar e parental; capacitação da comunidade e instituições; informação e acessibilidade. Os CLDS procuram promover a inclusão social de forma a combater a pobreza e a exclusão em territórios deprimidos. As Câmaras Municipais aprovam os Planos de Ação dos CLDS. Atualmente existem cerca de 80 CLDS. FINANCIAMENTO DAS POLÍTICAS Para além do quadro legislativo europeu, as questões da igualdade estão reflectidas nos documentos políticos mais importantes da UE. A Estratégia de Lisboa (2000) e a Estratégia Europeia de Emprego (2003) nomeiam o aumento do nível do emprego POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS de grupos sub‑representados, entre os objectivos da Comunidade. Preocupação especial é expressa em relação à inclusão social das pessoas com deficiência, minorias étnicas, migrantes e idosos. O Conselho Europeu de Copenhaga (2002) enfatizou a fraca participação destes grupos e encorajou os Estados membros a resolverem esta situação nos seus planos nacionais de ação para a inclusão social. No Livro Verde (2004) - Igualdade e combate à discriminação na União Europeia alargada - COM(2004)379 final - a Comissão dá uma visão geral das medidas planeadas para serem aplicadas nas políticas europeias de combate à discriminação. Especial atenção é dada à elaboração de mais medidas para promover a integração da igualdade e anti‑discriminação nas políticas públicas, tais como, na implementação e gestão dos fundos estruturais. Em razão deste contexto europeu, impulsionador de uma política para a igualdade e anti-discriminação, o Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) contempla um conjunto de intervenções que visam atingir esses objectivos em Portugal. Com efeito, para além do quadro legal e político, as políticas de promoção da igualdade e combate à discriminação são apoiadas por financiamento europeu e nacional, nomeadamente através do QREN, cuja estrutura operacional é sistematizada através de Programas Operacionais Temáticos e de Programas Operacionais Regionais para as regiões do Continente e para as duas Regiões Autónomas (RCM n.º25/2006, de 10 de Março). Entre as prioridades estratégicas do QREN, está a garantia da coesão social, na qual se inclui a promoção da igualdade de género na sociedade portuguesa. O programa operacional temático dedicado ao Potencial Humano (POPH)13 é dirigido à concretização de intervenções no âmbito do emprego, da educação e formação e da formação avançada, promovendo a mobilidade, a coesão social e a igualdade de género, num quadro de valorização e aprofundamento de uma envolvente estrutural propícia ao desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação (Fig. 3). FIGURA 3 QREN P.O. Temáticos QREN 2007-13 – POPH E OS EIXOS ESPECÍFICOS PARA A INCLUSÃO E A IGUALDADE POPH Eixo 6. Cidadania Inclusão e Desenvolvimento Eixo 7. Igualdade de Género 13 Para informações mais detalhadas consultar: http://www.poph.qren.pt/content.asp?startAt=2&categoryID=371 Eixo 8. Algarve Eixo 9. Lisboa 45 46 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO O Eixo 6 reúne um conjunto de instrumentos de política que visam criar condições de maior equidade social no acesso a direitos de participação cívica, à qualificação e educação e ao mercado de trabalho. Constituem prioridade deste eixo, que contempla ações de prevenção e reparação de fenómenos de exclusão social, políticas de apoio à inserção social e profissional de pessoas em situação de desfavorecimento e de promoção de uma cidadania mais ativa e alargada. As tipologias de intervenção apoiadas pelo eixo 6 encontram-se assinaladas no Quadro 3 (Norte, Centro e Alentejo). QUADRO 3 EIXO 6. POPH - CIDADANIA, INCLUSÃO E DESENVOLVIMENTO SOCIAL EIXO 6. TIPOLOGIAS DE INTERVENÇÃO 6.1 Formação para a Inclusão 6.2 Qualificação das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade 6.3 Apoio à Mediação e Integração das Pessoas com Deficiência ou Incapacidade 6.4 Qualidade dos Serviços e Organizações 6.5 Ações de Investigação, Sensibilização e Promoção de Boas Práticas 6.6 Formação em Língua Portuguesa para estrangeiros 6.7 Apoio a Consórcios Locais para a promoção da inclusão Social de crianças e jovens 6.8 Apoio ao Acolhimento e Integração de Imigrantes 6.9 Ações de Formação e Iniciativas de Sensibilização dirigidas a públicos estrangeiros no domínio do acolhimento e integração dos emigrantes 6.10 Ações de Investigação e Promoção de Campanhas de Sensibilização da Opinião Pública em matéria de Imigração 6.11 Programas integrados de promoção do sucesso educativo 6.12 Apoio ao Investimento a Respostas Integradas de Apoio Social - Área de Idosos 6.13 Apoio ao Investimento a Respostas Integradas de Apoio Social - Área das Pessoas com Deficiência 6.14 Contratos Locais de Desenvolvimento Social http://www.poph.qren.pt/index.asp O Eixo 7 tem como prioridade disseminar uma cultura de igualdade através da integração da perspectiva de género nas estratégias de educação e formação, mas também promover a igualdade de oportunidades no acesso e na participação no mercado de trabalho. A conciliação entre a vida profissional e familiar, a prevenção da violência de género e a promoção da eficiência dos instrumentos de política pública na promoção da igualdade de género e de capacitação dos atores relevan- POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS tes para a sua prossecução são igualmente prioridades reconhecidas neste eixo. As tipologias de intervenção apoiadas pelo eixo 6 encontram-se assinaladas no Quadro 4 (Norte, Centro e Alentejo). QUADRO 4 EIXO 7 POPH - IGUALDADE DE GÉNERO EIXO 7. TIPOLOGIAS DE INTERVENÇÃO 7.1 Sistema estratégico de informação e conhecimento 7.2 Planos para a Igualdade 7.3 Apoio Técnico e Financeiro às Organizações Não Governamentais 7.4 Apoio a projectos de formação para públicos estratégicos 7.5 Sensibilização e divulgação da Igualdade de Género e prevenção da Violência de Género 7.6 Apoio ao empreendedorismo associativismo e criação de redes empresariais de atividades económicas geridas por mulheres 7.7 Projectos de intervenção no combate à Violência de Género http://www.poph.qren.pt/index.asp Os eixos prioritários 8 (Algarve) e 9 (Lisboa) contemplam tipologias de intervenção das quais se assinalam (Quadro 5): • Qualificação inicial para elevação da habilitação dos jovens; • Cidadania, inclusão e desenvolvimento social; • Intervenções específicas para a promoção da igualdade de género. QUADRO 5 EIXOS 8 E 9 POPH - ALGARVE E LISBOA. TIPOLOGIAS DE INTERVENÇÃO (SELEÇÃO) Formação para a Inclusão Qualificação das Pessoas com Deficiência ou Incapacidade Apoio à Mediação e Integração das Pessoas com Deficiência ou Incapacidade Qualidade dos Serviços e Organizações Ações de Investigação, Sensibilização e Promoção de Boas Práticas Formação em Língua Portuguesa para Estrangeiros Apoio a Consórcios Locais para a Promoção da Inclusão Social de Crianças e Jovens 47 48 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO Apoio ao Acolhimento e Integração de Imigrantes Ações de Formação e Iniciativas de Sensibilização Dirigidas a Públicos Estratégicos no Domínio do Acolhimento e Integração dos Imigrantes Programas Integrados de Promoção do Sucesso Educativo Apoio ao Investimento a Respostas Integradas de Apoio Social - Área de Idosos Apoio ao Investimento a Respostas Integradas de Apoio Social - Área das Pessoas com Deficiência Contratos Locais de Desenvolvimento Social Planos para a Igualdade Apoio Técnico às Organizações Não Governamentais Apoio a Projectos de Formação para Públicos Estratégicos Apoio ao Empreendedorismo Associativismo e Criação de Redes Empresariais de Atividades Económicas Geridas por Mulheres Projectos de Intervenção no combate à Violência de Género http://www.poph.qren.pt/index.asp No Quadro 6 apresentam-se os montantes dirigidos a cada região no âmbito dos eixos prioritários do Programa Operacional temático. Pode-se verificar por estes montantes que o Algarve e Lisboa são contemplados com orçamentos mais modestos, se atendermos que ambos os eixos contêm mais tipologias de intervenção que não apenas as ligadas aos temas em estudo enquanto os eixos 6 e 7 são específicos destes temas, podendo o Norte, Centro e Alentejo recorrer aos eixos prioritários 1 a 5 para outros investimentos. QUADRO 6 ORÇAMENTO POPH POR EIXO PRIORITÁRIO Eixos POPH Euros Eixo prioritário 6 Norte, Centro e Alentejo 572 105 834 Eixo prioritário 7 Norte, Centro e Alentejo 68 302 621 Eixo prioritário 8 Algarve 141 503 774 Eixo prioritário 9 Lisboa 355 937 499 POPH Versão final aprovada pela Comissão Europeia em 24/10/2007 [Decisão C(2007) 5157] http://www.qren.pt/item3.php?lang=0&id_channel=34&id_page=203 POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS A Fig. 4 refere-se aos Programas Operacionais Regionais (POR) que apresentam eixos específicos para o tema em análise. Na generalidade, em todos os POR se encontram alusões ao princípio da não discriminação e igualdade de oportunidades. Todavia é no PO Norte e no PO Lisboa que se destacam prioridades estratégicas específicas para o tema em estudo. FIGURA 4 QREN 2007-13 – PROGRAMAS OPERACIONAIS REGIONAIS QREN P.O. Regionais P.O. Lisboa Eixo 3 - Apoiar a criação e desenvolvimento de serviços de proximidade dirigidos à população com necessidades especiais de apoio e promover a qualidade de vida e o bem estar urbano P.O. Norte Prioridade Estratégica Norte E. Quality - o seu principal objectivo é promover a inclusão social e territorial, nomeadamente, através da conciliação da vida pessoal com a profissional e através da prevenção e combate à exclusão POLÍTICAS DE IGUALDADE E DE ANTI-DISCRIMINAÇÃO EM PORTUGAL: UM BALANÇO Apresenta-se como uma missão complexa abranger todos os domínios da igualdade e do combate à discriminação, dada a natureza dispersa e as dinâmicas cruzadas dos problemas associados. Julga‑se, no entanto, ter mostrado um retrato nacional (ainda que incompleto) do enquadramento institucional destes assuntos, que permite uma visão abrangente das estratégias em curso bem como os seus principais instrumentos. 49 50 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO A nível nacional, as apostas estratégicas dos últimos anos resultaram em grande medida de influências internacionais, mas também de pressões internas, associadas às alterações demográficas, à necessidade de maximizar o potencial da sociedade e da economia (pelos seus efeitos positivos no emprego, na competitividade, nas qualificações e no desenvolvimento humano), e na resposta a situações de crescimento lento, desemprego e desigualdade social. A Fig. 5 evidencia os principais marcos da política pública para a igualdade de género: é a partir de meados dos anos 1990 e, sobretudo, na década de 2000, que se regista um nítido reforço e uma multiplicação de instrumentos indispensáveis à construção de uma política nacional de igualdade e de anti-discriminação em diferentes categorias analíticas. FIGURA 5 POLÍTICAS DE IGUALDADE E DE ANTI DISCRIMINAÇÃO: OS MARCOS 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 Género Orientação Sexual Imigrantes/Minorias Étnicas Deficiência Idade Fonte: Queirós (coord.), Marques da Costa et al., 2010 O enquadramento nacional para a igualdade de género e de oportunidades, o combate à discriminação e a promoção da inclusão, fica assim suficientemente conhecido, revelando claras e importantes prioridades. No entanto, a transversalidade das questões que o quadro legal e político nacional procura antecipar ou resolver, remete para um enquadramento complexo e confuso, colocando o desafio nacional de uma melhor e mais clara integração de políticas entre as entidades da Administração e entre estas e outras instituições da sociedade civil que operam nestes domínios (Figura 6). Sem menosprezar o papel da administração central, as Câmaras Municipais apresentam‑se inequivocamente como entidades privilegiadas para assegurar a passagem das prioridades identificadas ao mais alto nível da governação e as necessidades sentidas pela sociedade nos territórios de proximidade. E é precisamente neste contexto que importa relevar a figura do Plano Municipal para a Igualdade instaurada com o III PNI, que contém o potencial para integrar todas as políticas sociais de promoção da igualdade e de combate à discriminação no território municipal. Da análise efectuada ao contexto legal nacional e a consequente formulação de políticas e medidas nos temas aqui abordados, emergem entidades que, ao nível local, assumem um papel de liderança fundamental na ação e na implementação de projetos inclusivos e promotores de qualidade de vida. POLÍTICAS DE IGUALDADE NAS AUTARQUIAS LOCAIS FIGURA 6 ARTICULAÇÃO DO ENQUADRAMENTO FORMAL DAS POLÍTICAS PARA A IGUALDADE Pessoas com deficiência Legislação + políticas III Plano Igualdade 2007 Alterações constituição 2004 Lei anti discriminação 2006 Transversal Género 2008 Alteração código penal 2005 I Comissão Nacional de Protecção de Crianças 1998 PAIPDI 2007 Comissões locais CPCJ 1999 Conselheiros locais igualdade Categoria Orientações sexuais Estrutura Local Constituição da República Portuguesa (artigo 18º/26º) Género Crianças Jovens Imigrantes/ Minorias étnicas Lei anti discriminação racial 1999 Plano integração imigrantes 2007 Sistema Nacional Intervenção Precoce 2009 Gabinete autárquico informação Comissões de Protecção de Crianças e Jovens Conselheiros Municipais Juventude Centros Locais de apoio à Integração de Imigrantes Idosos R E D E Prestação extraordinária de combate à pobreza 2005 S O C I A L Plano Municipal de Igualdade Fonte: Queirós (coord.), Marques da Costa et al., 2010 Em síntese, a fig. 6 ainda permite destacar aquelas estruturas que, ao nível local, estão em posição privilegiada para o combate à discriminação, promoção da igualdade e inclusão dos grupos mais desfavorecidos. São elas: • Conselheiras(os) Locais para a Igualdade • Centro de Apoio à Integração dos Imigrantes (CLAII) • Gabinetes da Autarquias Locais (SIM-PD) • Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) • Conselhos Municipais de Juventude • Contrato Local de Desenvolvimento Social (CLDS), Centro Local de Ação Social, Rede Social,... O que é realmente interessante, para concluir, é que estas entidades locais estão mais fortes e essa capacidade advém-lhes, quer do enquadramento formal da Administração Central que multiplica e descentraliza progressivamente medidas de política, quer das dinâmicas das associações e organizações não governamentais, isto é dos parceiros sociais. Acresce que estas entidades, no quadro da rede social, têm hoje ao seu dispor o apoio reforçado da Administração Local, no caso das Câmaras Municipais aderirem aos planos municipais para a igualdade e possuírem um/a conselheiro/a local para a igualdade. 51 52 POLÍTICAS DE IGUALDADE: UM MUNDO EMPENHADO E ATIVO FIGURA7 IDEIAS FORTES RESULTANTES DO CONTEXTO NACIONAL Intervenção de proximidade das populações e dos território; a importância crescente do nível local e o papel das parcerias entre a Admin. Local e as entidades do 3º setor,.. Enfoques estratégicos para integração de políticas, formação de redes, procedimentos harmonizados, recursos humanos especializados Multidimensionalidade do problema da exclusão que envolve setores como a saúde, justiça, educação, habitação, segurança, emprego, acessibilidade... Estruturas de coordenação de políticas, governança multinível: ministérios, autarquias e redes locais em cooperação IDEIAS FORTES Uma seleção de ideias fortes que nascem da leitura efectuada do contexto nacional está contida na Fig. 7. É cada vez mais visível que as estruturas de coordenação nacional procuram a construção de uma relação mais robusta com as entidades locais, pelo que se evidenciam claros sinais de uma descentralização progressiva de poderes. A articulação sectorial ao nível local, o trabalho em rede e a qualificação dos recursos humanos que trabalham nestes domínios, são essenciais para responder aos desafios do combate à discriminação e da promoção da igualdade. Porém, sem vontade política (sensibilidade dos dirigentes e das chefias) e sem reestruturações internas no plano do funcionamento municipal, para reforçar estruturas interdepartamentais, no sentido de um maior envolvimento interno de agentes, técnicos, funcionários e chefias da administração local, a operacionalização de planos e de projetos de ação social será sempre dificultada. A adesão aos planos municipais para a igualdade constitui uma oportunidade simultaneamente para mudar a estruturas e as mentalidades.