Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                
DIREÇÃO-GERAL DAS POLÍTICAS INTERNAS DEPARTAMENTO TEMÁTICO C: DIREITOS DOS CIDADÃOS E ASSUNTOS CONSTITUCIONAIS LIBERDADES CÍVICAS, JUSTIÇA E ASSUNTOS INTERNOS Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ESTUDO Resumo A pedido da Comissão LIBE, o presente estudo analisa a situação das crianças com deficiência em Portugal, a fim de identificar as disparidades existentes entre o quadro jurídico e a sua respetiva aplicação, os obstáculos que estas crianças enfrentam e as melhores práticas. O estudo deste país é parte integrante de um estudo mais alargado que analisa todos os 28 Estados-Membros. Na primeira fase, foi efetuada uma análise comparativa baseada em 18 dos estudos de países. Na segunda fase foi examinada a situação nos restantes dez países e na Escócia. O relatório global intitulado «As políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência» apresenta recomendações de ação da UE no sentido de melhorar a situação das crianças com deficiência. PE 519.203 EN DOCUMENTO SOLICITADO PELA COMISSÃO DAS LIBERDADES CÍVICAS, DA JUSTIÇA E DOS ASSUNTOS INTERNOS AUTORAS Paula Campos Pinto, Teresa Janela Pinto, Diana Teixeira Sob supervisão de Milieu Ltd. (Bélgica), 15 rue Blanche, B-1050, Bruxelas, tel: +32 25143601; diretora do projeto e revisora do relatório: Marta Ballesteros; e gestora do projeto: Nathalie Meurens; correio eletrónico: marta.ballesteros@milieu.be e nathalie.meurens@milieu.be; endereço do sítio Web: http://www.milieu.be/. ADMINISTRADORA RESPONSÁVEL Erika SCHULZE Departamento Temático C – Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais Parlamento Europeu B-1047 Bruxelas Correio eletrónico: poldep-citizens@ep.europa.eu Assistente editorial: Lucia-Cristina ACHIHAEI VERSÕES LINGUÍSTICAS Original: EN Tradução: PT SOBRE O EDITOR Os departamentos temáticos prestam aconselhamento especializado a nível interno e externo, a fim de apoiar as comissões do PE e outras instâncias parlamentares na elaboração de legislação e no exercício do controlo democrático. Para contactar o Departamento Temático, ou para assinar o respetivo boletim informativo mensal, escrever, por favor, para: poldep-citizens@ep.europa.eu Parlamento Europeu, manuscrito concluído em dezembro de 2014. © European Union, Brussels, 2014. O presente documento está disponível na Internet em: http://www.europarl.europa.eu/studies DECLARAÇÃO DE EXONERAÇÃO DE RESPONSABILIDADE As opiniões expressas no presente documento são da exclusiva responsabilidade do autor e não representam necessariamente a posição oficial do Parlamento Europeu. A reprodução e a tradução para fins não comerciais estão autorizadas, mediante menção da fonte e aviso prévio ao editor, a quem deve ser enviada uma cópia. Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ ÍNDICE LISTA DE ABREVIATURAS 5 RESUMO 6 INTRODUÇÃO 8 1. PERSPETIVA GLOBAL DA SITUAÇÃO E DOS PROBLEMAS ENFRENTADOS PELAS CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA EM PORTUGAL 10 1.1. Introdução à situação das crianças com deficiência em Portugal 10 1.2. Análise de questões e identificação de possíveis lacunas regulamentares 11 2. PERSPETIVA GLOBAL DO QUADRO JURÍDICO NACIONAL 13 2.1. Perspetiva geral do quadro jurídico e institucional nacional 13 2.2. Quadro jurídico e institucional específico para crianças com deficiência 14 2.2.1. Quadro jurídico 14 2.2.2. Instituições e autoridades 16 2.2.3. Definições 17 3. QUADRO JURÍDICO PARA CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA EM PORTUGAL 19 3.1. Aplicação das disposições previstas na CDPD e na CDC 19 3.1.1. Interesse superior da criança (artigo 3.º da CDC; artigo 7.º da CDPD) 19 3.1.2. Não discriminação (artigo 2.º da CDC; artigos 3.º e 5.º da CDPD) 3.1.3. Desenvolvimento das capacidades da criança (artigo 5.º da CDC e artigo 3.º da CDPD) 23 3.1.4. O direito a ser ouvida/a participar (artigo 12.º da CDC; artigos 7.º e 30.º da CDPD) 25 3.1.5. Proteção contra violência (artigo 19.º da CDC; artigo 16.º da CDPD) e sua aplicação 27 3.1.6. Direito à vida familiar (artigo 9.º da CDC; artigo 23.º, n.º 3, da CDPD) 29 3.1.7. Direito a assistência (artigo 23.º da CDC; artigos 23.º, n.º 5, e 28.º da CDPD) 31 3.1.8. Direito a uma educação inclusiva (artigo 28.º da CDC; artigo 24.º da CDPD) e sua aplicação 3.2. Problemas específicos enfrentados por crianças com deficiência 21 33 36 3.2.1. Vulnerabilidade de género 36 3.2.2. Crianças enquanto suspeitos vulneráveis 37 3.2.3. Outros problemas específicos enfrentados por crianças com deficiência em Portugal 38 4. AVALIAÇÃO DA APLICAÇÃO PRÁTICA DOS DIREITOS E DOS PRINCÍPIOS JURÍDICOS 39 3 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ 4.1. Mecanismos de aplicação e de comunicação 39 4.2. Disparidades, problemas e dificuldades na aplicação 41 4.3. Melhores práticas 44 4.4. Dados e mecanismos de acompanhamento 45 4.5. Recomendações 46 5. CONCLUSÕES 48 REFERÊNCIAS 49 ANEXO 1 – QUADRO DE SÍNTESE 52 ANEXO 2 – INFORMAÇÃO ESTATÍSTICA 117 ANEXO 3 - ESTUDO SOBRE AS POLÍTICAS DOS ESTADOS-MEMBROS RELATIVAS A CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA - RESUMO 122 ANEXO 4 - PERSPETIVA GLOBAL DE ESTUDOS CONEXOS 134 4 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ LISTA DE ABREVIATURAS Carta A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia CEI Currículo Específico Individual TJUE Tribunal de Justiça da União Europeia CNE Conselho Nacional de Educação CoE Conselho da Europa CPCJ Comissão de Proteção de Crianças e Jovens CDC Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança CDPD Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência CEDH Convenção do Conselho da Europa para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais ECMIJ Entidades com competência em matéria de infância e juventude UE A União Europeia CIF Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde CEI Currículo Específico Individual INR Instituto Nacional para a Reabilitação PEI Programas Educativos Individuais PIT Plano Individual de Transição PSP Polícia de Segurança Pública SNIPI Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância TUE Tratado da União Europeia TFUE Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia ONU Organização das Nações Unidas 5 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ RESUMO Portugal ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CDC) e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), bem como o seu Protocolo Opcional. Ambos os tratados são diretamente aplicáveis no país e, por conseguinte, podem ser invocados em tribunal. O quadro jurídico realça o direito à inclusão, à participação e à não discriminação. Os direitos das crianças e das pessoas com deficiência encontram-se bem refletidos na legislação nacional. Consequentemente, de um modo geral, os direitos das crianças com deficiência estão assegurados no quadro jurídico português. O bem-estar das crianças com deficiência é objeto recente da legislação e da política pública em Portugal. Até à revolução de 1974, o apoio concedido a crianças com deficiência era pouco ou inexistente, dependendo estas exclusivamente das suas famílias para a prestação dos cuidados necessários. Na sequência da revolução, foi criado um conjunto de cooperativas e de organizações sem fins lucrativos destinadas a fornecer educação, formação vocacional e atividades de cuidados diurnos a crianças e adultos com deficiência, na medida em que foram disponibilizados fundos públicos para apoio a esses programas; contudo, foi aprovada uma segregação das crianças com deficiência. A adesão de Portugal à União Europeia em 1986 e, mais recentemente, a ratificação da CDPD contribuíram para que fosse atribuída uma atenção renovada às questões da deficiência, nomeadamente uma maior ênfase em políticas de combate à discriminação, de promoção da inclusão e de participação social. De um modo geral, embora os direitos e os princípios reconhecidos na CDC e na CDPD estejam previstos no quadro jurídico, a aplicação prática de muitos deles é problemática. O direito à não discriminação em razão da deficiência está consagrado em legislação específica, incluindo em domínios referentes à situação das crianças com deficiência (tais como o acesso a bens e serviços, educação, saúde e transportes), e a obrigação de facultar adaptações razoáveis encontra-se reconhecida relativamente ao ensino e ao emprego. Todavia, os direitos e as vulnerabilidades específicas das raparigas com deficiência não são mencionados de todo, nem é reconhecido que podem ser sujeitas a discriminação múltipla. O direito de a criança ser ouvida em todas as decisões que a afetem e de acordo com o seu grau de maturidade encontra-se claramente expresso na maioria dos estatutos jurídicos. No entanto, existem lacunas significativas na aplicação desse direito nos processos judiciais, muitas vezes justificadas por argumentos que salientam os potenciais riscos para a criança (por exemplo, voltar a traumatizar ou o risco de ser manipulada por adultos). Além disso, este princípio encontra-se ausente da legislação que regula a educação inclusiva, o que impede que as crianças participem nas tomadas de decisão relativas à sua educação. O direito a uma vida familiar está bem protegido no quadro jurídico, mas verificam-se problemas no que se refere à sua aplicação. O número de crianças em risco que são retiradas às suas famílias e institucionalizadas continua muito elevado no país. A criação de escolas de referência para crianças surdas e cegas obriga-as a percorrer diariamente longas distâncias para assistirem às aulas (em especial nas zonas rurais), o que potencialmente pode violar o seu direito a manter laços afetivos com irmãos e familiares. O acesso a assistência está assegurado, mas o nível de prestações sociais disponíveis é muito reduzido e não está disponível um regime de apoio pessoal. As medidas de 6 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ austeridade introduzidas desde 2011 conduziram a critérios de elegibilidade mais restritos e a cortes orçamentais na prestação de serviços sociais. O direito a uma educação inclusiva está plenamente reconhecido e regulamentado a vários níveis. O Sistema de Intervenção Precoce, recentemente reorganizado no país, garante um bom início para um número crescente de crianças com deficiência ou em risco de apresentar deficiências em matéria de desenvolvimento. Uma nova lei sobre educação inclusiva conduziu ao encerramento de escolas de ensino especial e à integração das crianças com deficiência em escolas regulares. Contudo, a insuficiente qualidade e quantidade de recursos humanos e materiais existentes nestas escolas está a comprometer o processo educativo das crianças com deficiência. Por fim, a inexistência de uma Estratégia Nacional para a Deficiência (a anterior terminou em 2013) para orientar e coordenar a política em matéria de deficiência a nível nacional, a fraca aplicação das disposições legais, nomeadamente no domínio da acessibilidade, e a falta de consciencialização da sociedade portuguesa para os direitos das pessoas com deficiência criam muitos obstáculos ao pleno gozo dos seus direitos por parte das crianças com deficiência. 7 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ INTRODUÇÃO Em dezembro de 2010, a União Europeia (UE) tornou-se parte da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD). Ao fazê-lo, reconheceu os problemas que enfrentam as pessoas com deficiência para garantirem os seus direitos e sublinhou a necessidade de medidas de apoio por parte da UE integrarem a agenda da União Europeia e dos seus Estados-Membros. As crianças com deficiência já são vulneráveis pelo facto de serem crianças. Mas a sua deficiência acentua particularmente a sua vulnerabilidade. Portanto, merecem salvaguardas e proteção específicas por parte da UE e dos seus Estados-Membros. O quadro jurídico fundamental para a ação da UE neste domínio consiste na decisão da UE de ratificar a CDPD, na exigência prevista no artigo 10.º do TFUE de a UE combater a discriminação em razão da deficiência, bem como no objetivo da UE de promover a proteção dos direitos da criança, previsto no artigo 3.º do TUE. Este quadro coloca a UE numa posição única para impulsionar uma maior proteção dos direitos das crianças com deficiência e para realizar iniciativas legislativas e políticas. A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CDC) fornece igualmente uma base para ação neste domínio1. O presente relatório relativo a Portugal integra um estudo mais alargado que visa dotar o Parlamento Europeu de uma perspetiva geral da situação das crianças com deficiência em todos os Estados-Membros da UE, tendo em vista avaliar a necessidade de legislação europeia que reforce os direitos das crianças com deficiência na União Europeia. O projeto analisa os quadros jurídicos, políticos e institucionais existentes nos Estados-Membros. Os relatórios por país examinam a aplicação dos princípios e dos direitos internacionais decorrentes da CDPD e da CDC, a fim de detetar eventuais questões específicas que exijam mais ações políticas e legislativas a nível nacional e da UE. Numa primeira fase, foram analisados 18 países selecionados, tendo os seus resultados formado a base para uma análise comparativa presente no relatório global intitulado «As políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência» publicado em 2013. Numa segunda fase, que decorreu em 2014, foi analisada a situação das crianças com deficiência nos restantes dez países, bem como na Escócia, em estudos específicos por país, nos quais se inclui o presente relatório. Entre os elementos essenciais que decorrem da CDC e da CDPD, no que se refere a crianças com deficiência, incluem-se:  A obrigação de agir de acordo com os interesses superiores da criança;  O direito à não discriminação;  A consideração das capacidades em desenvolvimento da criança;  O direito a ser ouvida/a participar;  O direito a não ser objeto de violência;  O direito à vida familiar;  O direito à assistência;  O direito à educação, incluindo educação inclusiva. 1 Todos os 28 Estados-Membros ratificaram a CDC e todos os 28 Estados-Membros assinaram a CDPD (a Finlândia, a Irlanda e os Países Baixos assinaram mais ainda não ratificaram). 8 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ Tendo em conta que ratificaram2 ambas as convenções das Nações Unidas, os Estados-Membros estão obrigados a tomar as medidas necessárias, a fim de assegurar o respeito dos direitos estabelecidos para todas as crianças ou pessoas com deficiência na sua jurisdição. Os Estados-Membros devem tomar as medidas adequadas para garantir que as crianças estão protegidas contra todas as formas de discriminação ou violência, incluindo através da adoção de medidas legislativas, administrativas e outras apropriadas para a aplicação desses direitos. Além disso, a proteção dos direitos das crianças com deficiência deve ser integrada em todas as políticas e em todos os programas, em conformidade com o artigo 4.º, n.º 3, da CDPD sobre o envolvimento das pessoas com deficiência em todos os processos de tomada de decisão. Devido à dimensão desta matéria e à escassez de materiais disponíveis, o âmbito do presente estudo não abrange em pormenor a grande variedade de assuntos que decorrem e estão relacionados com a situação das crianças com deficiência. Não pretende fornecer uma análise aprofundada, mas sim uma perspetiva geral da situação dos direitos das crianças com deficiência em Portugal. O presente estudo apresenta algumas das principais questões e obstáculos enfrentados pelas crianças com deficiência e pelas suas famílias, uma análise jurídica da aplicação dos principais direitos e princípios reconhecidos na CDC e na CDPD e relevantes no contexto da situação das crianças com deficiência, bem como aponta para potenciais soluções a nível nacional e da UE para melhorar a sua situação. Cada relatório por país é estruturado do seguinte modo: primeiro analisa a situação das crianças com deficiência a nível nacional. Descreve o quadro jurídico e institucional nacional relativo à proteção das crianças com deficiência e examina a aplicação nacional dos princípios e dos direitos previstos nas convenções da ONU (CDC e CDPD). De seguida, examina aspetos específicos relevantes para a situação das crianças com deficiência, incluindo crianças enquanto suspeitos, questões de género e educação. Por fim, o relatório analisa os mecanismos em vigor para aplicação do quadro jurídico, salientando lacunas, problemas, melhores práticas e recomendações encontradas na literatura ou através de entrevistas às partes interessadas. 2 Exceto a Finlândia, a Irlanda e os Países Baixos, que assinaram mas ainda não ratificaram a CDPD. 9 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ 1. PERSPETIVA GLOBAL DA SITUAÇÃO E DOS PROBLEMAS ENFRENTADOS PELAS CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA EM PORTUGAL   1.1. PRINCIPAIS CONSTATAÇÕES A política nacional centra-se nos seguintes domínios: inclusão e participação em intervenção precoce e educação, bem como direito à não discriminação. Foram identificados os seguintes problemas, lacunas e desafios: inexistência de dados sobre os direitos das crianças com deficiência, cortes orçamentais em áreas como a educação, a saúde e a ação social, reduzindo a prestação de serviços e aumentando o risco de pobreza, falta de acesso ao meio edificado, aos transportes e a informação, inexistência de serviços de apoio pessoal, persistência de estereótipos, preconceitos e atitudes negativas, bem como atitudes excessivamente protetoras por parte da família. Introdução à situação das crianças com deficiência em Portugal Portugal assinou a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) e o seu Protocolo Opcional em 30 de março de 2007, tendo o tratado assumido caráter vinculativo após a sua ratificação em 23 de setembro de 2009. A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CDC) é igualmente vinculativa em Portugal, tendo sido assinada em 26 de janeiro de 1990 e ratificada em 21 de setembro do mesmo ano (ver secção 2.1). O bem-estar das crianças com deficiência é objeto recente da legislação e da política pública em Portugal. Até à revolução de 1974, as iniciativas públicas centradas na deficiência eram de âmbito limitado. Além de um número reduzido de grandes instituições públicas do século XIX e início do século XX, havia apenas algumas organizações de caridade, fundadas por famílias e profissionais liberais nas décadas de 1950 e 1960. Perante a inexistência de apoios e de serviços públicos, a maioria das crianças com deficiência ficava em casa, ao cuidado das famílias. Na sequência da revolução, surgiu um conjunto de cooperativas locais, geridas por pais de crianças com deficiência e por profissionais, bem como outras associações sem fins lucrativos, destinadas a fornecer serviços de ensino especial a crianças com deficiência e, à medida que cresciam, programas de formação profissional, emprego protegido e atividades de ocupação diurna3. Foram igualmente disponibilizados fundos para o financiamento de programas educativos e de reabilitação, embora a segregação de crianças com deficiência fosse geralmente aceite. 4 A adesão de Portugal à União Europeia em 1986 e, mais recentemente, a ratificação da CDPD e do seu Protocolo Opcional contribuíram para que fosse atribuída uma atenção renovada às questões da deficiência, nomeadamente uma maior ênfase em políticas de combate à discriminação e de promoção da inclusão e da participação social. Foi aprovada 3 Pinto, Paula. «At the crossroads: Human rights and the politics of disability and gender in Portugal» (2001). Alter, European Journal of Disability Research, 5(2): 116-128. 4 Nomeadamente através da Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986. Esta lei aceitava que os «alunos do ensino especial» fossem colocados em salas de aula separadas na escola regular ou, com mais frequência, em escolas separadas, quer privadas, sem fins lucrativos ou públicas. 10 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ uma nova lei em matéria de deficiência5, bem como uma nova lei que proíbe e pune a discriminação6. Nenhum destes atos legislativos refere especificamente crianças com deficiência; todavia, contêm princípios que orientam a política em matéria de deficiência em geral e disposições que são especialmente relevantes para estes grupos (por exemplo, o artigo 22.º da lei em matéria de deficiência relativo a «apoio à família», o artigo 24.º relativo a «prevenção» e o artigo 34.º relativo a «direito à educação e ensino»). O quadro jurídico que visa proteger os direitos das crianças com deficiência afigura-se especialmente forte nos domínios da assistência (intervenção precoce) e da educação. O recentemente criado Sistema de Intervenção Precoce presta serviços a crianças entre os 0 e os 6 anos, bem como às suas famílias, através da ação de equipas locais e multidisciplinares que realizam «ações de natureza preventiva e reabilitativa, designadamente no âmbito da educação, da saúde e da ação social»7, com o objetivo de estimular o desenvolvimento e a inclusão social da criança. Da mesma forma, o decreto-lei recentemente aprovado relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva (alterado em maio de 2008) promove a colocação de crianças com deficiência em escolas regulares, conduzindo ao encerramento de escolas de ensino especial. No ano letivo de 2012/2013, houve 66 004 alunos que receberam algum tipo de apoio especializado, num conjunto de 1 408 890 alunos que frequentam o ensino obrigatório. Apesar do progresso alcançado nos últimos anos, ainda não existe um Plano Nacional que aborde especificamente os direitos das crianças com deficiência; a Estratégia Nacional para a Deficiência8, em vigor nos anos 2011-2013, continha algumas medidas relacionadas com as crianças (por exemplo, campanhas de sensibilização nas escolas, a aplicação do Sistema de Intervenção Precoce e a desinstitucionalização das crianças com deficiência), mas esta política entretanto expirou e ainda não foi substituída por uma nova. 1.2. Análise de questões e identificação de possíveis lacunas regulamentares Falta literatura e dados sobre a situação das crianças com deficiência em Portugal. Nunca foi realizado um inquérito oficial sobre esta matéria e o último recenseamento da população (Censos 2011), que incluiu questões do Washington Group sobre «dificuldade na realização de atividades do quotidiano» como indicadores para a deficiência, excluiu desta avaliação crianças com idade inferior a seis anos. Um estudo realizado em 2012 sobre o impacto das medidas de austeridade do Governo português nos direitos das pessoas com deficiência9 aborda um conjunto de questões pertinentes para as crianças com deficiência. O estudo conclui que a crise económica e as medidas de austeridade aplicadas no país a partir de 2008 tiveram um impacto significativo e negativo na vida das crianças com deficiência. As reformas efetuadas impuseram cortes orçamentais em áreas como a educação, a saúde e a ação social, reduzindo a prestação de serviços e atrasando ou adiando apoios à promoção de uma vida autónoma (tais como regimes de apoio pessoal e acessibilidade no meio edificado). As autoras do estudo 5 Lei n.º 38/2004, que «Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência», Diário da República de 18 de agosto de 2004. 6 Lei n.º 46/2006, que «Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde», Diário da República de 28 de agosto de 2006. 7 Artigos 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º 281/2009, que tem por objeto a «Criação de um Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância», Diário da República de 6 de outubro de 2009. 8 Resolução do Conselho de Ministros n.º 97/2010 «Estratégia Nacional para a Deficiência», Diário da República de 14 de dezembro de 2010, disponível em http://www.inr.pt/bibliopac/diplomas/rcm_0097_2010.htm. 9 Pinto, Paula & Teixeira, Diana, «Impacto dos Planos de Austeridade dos Governos Europeus nos Direitos das Pessoas com Deficiência» (2012), disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/. 11 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ salientam os efeitos destas medidas para as famílias, que se encontram sob uma pressão crescente para assumirem responsabilidades pela prestação de cuidados, agravando a sua vulnerabilidade económica e social, reforçando simultaneamente o papel de dependência das pessoas com deficiência na família e na sociedade. De acordo com o mesmo estudo, as restrições impostas ao orçamento da segurança social traduziram-se ainda na introdução, em 2010, de critérios de elegibilidade mais restritivos e num congelamento das pensões desde 2011. Tendo em conta que as famílias de crianças com deficiência dependem em grande medida de transferências sociais como principal fonte de rendimentos, o relatório sugere que as alterações exacerbaram o risco de pobreza entre este grupo. Mais recentemente, foi publicado um estudo de acompanhamento sobre os direitos humanos das crianças com deficiência.10 A investigação incluiu um estudo qualitativo das experiências de vida de pessoas com deficiência com 12 anos de idade ou mais, recolhidas através de entrevistas aprofundadas. As crianças que participaram relataram casos de violações e de negação de direitos que abrangem os domínios da educação, da intimidade e vida familiar, da participação social, da saúde e reabilitação, da segurança económica e do acesso a apoio social e a sistemas de informação e comunicação. As barreiras ao acesso a direitos incluíam com frequência:  Falta de acesso ao meio edificado (estradas e outras instalações interiores e exteriores, incluindo escolas, habitações, instalações de saúde e locais de trabalho), a transportes e a sistemas de informação e comunicação, o que diminuiu as oportunidades de interação social para crianças com deficiência;    Falta de serviços de apoio pessoal, exigindo que as crianças dependessem da família para o apoio necessário, o que aumentou o seu isolamento, vulnerabilidade a abusos na família e exclusão social; Persistência de estereótipos, preconceitos e atitudes negativas em relação às crianças com deficiência, nomeadamente por parte de crianças sem deficiência em escolas regulares. Estas atitudes levaram as crianças a vivenciar a erosão da dignidade pessoal e a segregação, mesmo frequentando escolas regulares; Atitudes excessivamente protetoras por parte da família, impedindo a criança com deficiência de participar em atividades sociais consideradas típicas para crianças da sua idade. Estes dados sugerem a necessidade de ações de sensibilização e educação para a deficiência destinadas a famílias de crianças com deficiência, aos seus pares e à sociedade em geral, a fim de desconstruir os estereótipos negativos associados à deficiência, e a aplicação de medidas que visem facilitar a acessibilidade e a vida autónoma de crianças com deficiência. 10 Pinto, Paula Campos et al., «Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal: Relatório Holístico» (2014), disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/. 12 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ 2. PERSPETIVA GLOBAL DO QUADRO JURÍDICO NACIONAL   2.1. PRINCIPAIS CONSTATAÇÕES Portugal assinou e ratificou ambas as convenções: a CDC foi assinada em 26 de janeiro de 1990 e ratificada em 21 de setembro do mesmo ano; a CDPD e o seu Protocolo Opcional foram assinados em 30 de março de 2007 e ratificados em 23 de setembro de 2009. Os direitos das crianças com deficiência estão incluídos na legislação geral que abrange os direitos das crianças, bem como em leis específicas em matéria de deficiência. As mais importantes são: a Constituição da República (nomeadamente o artigo 69.º sobre a Infância), o Código Civil (em especial o Volume IV sobre Direito da Família), a Lei n.º 147/99 de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, a Lei n.º 38/2004 que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência, o Decreto-Lei n.º 281/2009 que cria o Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância e o Decreto-Lei n.º 3/2008 que proporciona o quadro jurídico para o ensino especial. Os dois últimos incidem especificamente nas crianças com deficiência. Perspetiva geral do quadro jurídico e institucional nacional O sistema jurídico português baseia-se no sistema continental de codificação, sendo a legislação aprovada pela Assembleia da República a principal fonte do direito. Portugal possui uma Constituição que, em termos hierárquicos, consiste na primeira e mais importante lei do país. Até ao século XIX, o sistema jurídico francês influenciou de forma significativa o sistema jurídico português, mas mais recentemente o sistema jurídico alemão assumiu maior relevância neste domínio. Nos termos da Constituição da República, o sistema político português encontra-se dividido em três poderes principais independentes: o poder executivo é exercido pelo Governo, o poder legislativo é exercido pela Assembleia da República e o poder judicial é exercido pelos Tribunais. A Assembleia da República é o principal órgão legislativo. Contudo, em domínios específicos e mediante autorização especial por parte da Assembleia, o Governo pode igualmente legislar. As fontes de direito são as seguintes: O direito está publicado em diversos códigos e atos legislativos, havendo uma hierarquia segundo a qual a Constituição é a lei mais importante, seguida dos decretos da Assembleia da República e depois as várias leis e regulamentos emitidos pelo Governo. A jurisprudência desempenha igualmente um papel enquanto fonte secundária de direito, visto que as decisões dos tribunais são muitas vezes tidas em consideração em novos processos legislativos. O sistema judicial português é estruturado do seguinte modo: na base situam-se os Tribunais de Primeira Instância (havendo vários tribunais especializados, incluindo tribunais de menores e família), depois os Tribunais de Relação e, no topo da hierarquia, surge o Supremo Tribunal de Justiça. Para casos que suscitem dúvidas quanto ao cumprimento do direito constitucional, o tribunal de último recurso é o Tribunal Constitucional. Portugal tem um sistema monista. Os tratados internacionais (incluindo as convenções da ONU) 13 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ entram em vigor e são diretamente aplicáveis após ratificação pela Assembleia da República. 2.2. 2.2.1. Quadro jurídico e institucional específico para crianças com deficiência Quadro jurídico Em Portugal, os direitos das crianças com deficiência estão previstos através de legislação geral e de legislação específica em matéria de deficiência. O artigo 69.º da Constituição da República Portuguesa11 é dedicado à infância e determina que «as crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, (...) especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições». O Código Civil, Volume IV, sobre Direito da Família12 determina outras medidas de proteção, nomeadamente no que se refere ao divórcio, responsabilidades parentais, tutela e adoção13. A Lei Tutelar Educativa14 prevê o respeito pela saúde física e psíquica e pela dignidade do menor e especifica que é proibida a aplicação de medidas que se traduzam em tratamento cruel, desumano, degradante ou que possam comprometer a saúde física ou psíquica do menor. A lei refere ainda que a aplicação de medida disciplinar não pode traduzir-se em castigos corporais, privação de alimentos ou do direito a receber visitas e que nenhuma sanção disciplinar pode ser executada com violação do respeito pela dignidade da pessoa do menor. Esta lei reforça os princípios contidos na Constituição e no Código Penal, proibindo todas as formas de violência contra menores. A legislação mais importante em matéria de proteção das crianças é a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo15, que define a estrutura e o funcionamento do sistema de proteção de crianças e jovens. A lei estabelece que uma intervenção para promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais, o representante legal, quem tenha a guarda de facto, terceiros ou a própria criança ou jovem ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento. Aplica-se especialmente em casos de abandono, maus tratos físicos ou psíquicos, abusos sexuais, trabalho forçado e outras circunstâncias que possam afetar o bem-estar e o desenvolvimento integral da criança16. O Decreto-Lei sobre o Regime de Execução do Acolhimento Familiar define que o acolhimento familiar visa a integração da criança ou do jovem em meio familiar e a prestação de cuidados adequados às suas necessidades e bem-estar e a educação necessária ao seu desenvolvimento integral17. 11 Constituição da República Portuguesa, 2005. Código Civil. 13 Artigos 1576.º a 2020.º, ibid. 14 «Lei Tutelar Educativa», Diário da República de 14 de setembro de 1999. 15 Lei n.º 147/99 «Proteção de Crianças e Jovens em Perigo», Diário da República de 1 de setembro de 1999. 16 Artigos 1.º e 3.º, ibid. 17 Artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 11/2008 «Regime de Execução do Acolhimento Familiar», Diário da República de 17 de janeiro de 2008. 12 14 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ A Lei relativa à prevenção da violência doméstica, à proteção e à assistência das suas vítimas18 estabelece um regime jurídico de apoio às vítimas de violência doméstica, independentemente da sua idade, e prevê um conjunto de princípios de intervenção, incluindo a obtenção do consentimento livre e esclarecido da vítima antes de se dar início a qualquer intervenção19. Os direitos das crianças com deficiência não são abordados de forma específica na Lei em matéria de deficiência20. Contudo, esta lei contém princípios básicos, tais como o princípio da participação21 ou o princípio da qualidade22, que orientam a evolução da política em matéria de deficiência, bem como algumas disposições particularmente relevantes para crianças com deficiência (por exemplo, o artigo 22.º sobre «apoio à família», o artigo 24.º sobre «prevenção» e o artigo 34.º sobre o «direito à educação e ensino», etc.). Prevê igualmente o acesso a habitação, transportes e informação. A Lei que proíbe e pune a discriminação23 abrange todos os setores e refere-se aos direitos das crianças com deficiência no contexto da proibição de discriminação no acesso à educação24. O Decreto-Lei relativo ao Sistema de Intervenção Precoce25 refere-se especificamente a crianças com deficiência. Este instrumento jurídico inclui os princípios da CDC e surge na sequência de um despacho conjunto, emitido em 1999, que pretendia já implementar um sistema de intervenção precoce, mas que não conseguiu alcançar uma distribuição geográfica equilibrada na prestação do serviço. O sistema de intervenção precoce revisto visa: a) assegurar às crianças a proteção dos seus direitos e o desenvolvimento das suas capacidades; b) detetar e sinalizar todas as crianças com risco de alterações ou alterações nas funções e estruturas do corpo ou risco grave de atraso de desenvolvimento; c) assegurar as medidas de intervenção adequadas, de modo a prevenir ou reduzir os riscos de atraso no desenvolvimento; d) apoiar as famílias no acesso a serviços e recursos dos sistemas da segurança social, da saúde e da educação; e) envolver a comunidade através da criação de mecanismos de suporte social26. O Decreto-Lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva27 estabelece um quadro jurídico para o ensino especial e prevê o direito à educação de crianças com deficiência. Nos termos da lei, as escolas públicas e particulares, direta ou indiretamente financiadas pelo Ministério da Educação, estão sujeitas ao princípio da não discriminação em razão da deficiência e, por conseguinte, não podem rejeitar a matrícula ou a inscrição de alunos com base na incapacidade que manifestem. Assim sendo, a frequência de uma instituição de ensino especial constitui um último recurso, quando não for possível a inclusão numa escola regular, tendo em conta as necessidades 18 Lei n.º 112/2009 relativa a «Violência Doméstica e Assistência às Vítimas», Diário da República de 16 de setembro de 2009. 19 Artigo 9.º, ibid. 20 Lei n.º 38/2004 que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 21 Artigo 9.º, ibid. 22 Artigo 11.º, ibid. 23 Lei n.º 46/2006 que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. 24 Artigo 4.º, alíneas h) e i), ibid. 25 Decreto-Lei n.º 281/2009 relativo ao Sistema de Intervenção Precoce. 26 Artigo 4.º, ibid. 27 Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo», Diário da República de 7 de janeiro de 2008. 15 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ do aluno e a inexistência de apoio na escola. A fim de facilitar o acesso à educação a crianças com deficiência, a legislação prevê um conjunto de medidas educativas, tais como apoio pedagógico personalizado ou adequações curriculares. Este decreto-lei cria igualmente as chamadas «escolas de referência» para alunos surdos e/ou cegos ou com baixa visão. As escolas de referência são escolas públicas regulares que concentram recursos humanos e técnicos para a educação bilingue de alunos surdos e a educação de alunos cegos e com baixa visão. A legislação não prevê que as crianças com deficiência possam contestar decisões tomadas em relação à sua própria educação. A Lei de Bases da Saúde28 prevê que sejam tomadas medidas especiais relativamente a grupos sujeitos a maiores riscos, tais como crianças e deficientes. O Decreto-Lei da promoção da acessibilidade29 estabelece normas de acessibilidade aos edifícios públicos e ao espaço público, uma condição prévia para a promoção da participação social e da inclusão de crianças com deficiência na vida das suas comunidades. 2.2.2. Instituições e autoridades A responsabilidade sobre matérias relacionadas com crianças com deficiência em Portugal é partilhada por vários ministérios: os assuntos relacionados com educação encontram-se sob a alçada do Ministério da Educação (ME), os assuntos relacionados com assistência social (prestações e serviços sociais) encontram-se sob a tutela do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social (MSESS) e a saúde e reabilitação cabem ao Ministério da Saúde (MS). Cada ministério define os seus próprios critérios de elegibilidade e aplica diferentes instrumentos de avaliação da deficiência – o Ministério da Educação segue a Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), enquanto o MSESS utiliza uma escala muito mais antiga de aferição da incapacidade. A única exceção é o Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI), que é gerido e financiado pelos três ministérios (ME, MSESS e MS). A CIF-CJ é uma escala utilizada no SNIPI para avaliar as necessidades das crianças e determinar a elegibilidade para o programa, mas abrange apenas crianças dos 0 aos 6 anos de idade. O sistema de proteção de crianças e jovens em perigo30 português foi criado em conformidade com um conjunto de princípios, nomeadamente o interesse superior da criança/jovem; o direito à privacidade; intervenção precoce, mínima e proporcionada; responsabilidade parental e prevalência da família; obrigatoriedade de informação da criança/jovem e da sua família sobre os seus direitos e os motivos que determinaram a intervenção; audição obrigatória e participação da criança/jovem em todas as decisões que lhe digam respeito; e, finalmente, o princípio da subsidiariedade. O último princípio implica que o sistema seja criado seguindo uma lógica de descentralização. Tal significa que a responsabilidade por assegurar a proteção e o bemestar da criança deve caber, a título prioritário, às instituições locais que trabalham com crianças e jovens (ou seja, serviços públicos no domínio da educação, saúde, segurança, desporto e cultura, bem como serviços sociais e quaisquer organizações privadas envolvidas na prestação de serviços a crianças ou jovens), designadas por ECMIJ (Entidades com competência em matéria de infância e juventude). Sempre que estas entidades de primeira linha não conseguirem eliminar a situação de perigo, é ativada uma estrutura de intervenção de segunda linha – as Comissões de 28 Base II, alínea c), da Lei n.º 48/90 «Lei de Bases da Saúde», Diário da República de 24 de agosto de 1990. Decreto-Lei n.º 163/2006, relativo ao «Regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via pública e edifícios habitacionais», Diário da República de 8 de agosto de 2006. 30 Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 29 16 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ Proteção de Crianças e Jovens – CPCJ. As CPCJ são instituições oficiais não judiciais com autonomia funcional, que visam promover os direitos das crianças e dos jovens, bem como prevenir ou eliminar situações suscetíveis de afetar a sua segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento integral. Nos casos em que os pais/representantes legais não derem o seu consentimento ou não cooperarem com as CPCJ em conformidade com o plano de intervenção estabelecido (acordo de promoção e proteção), o processo é remetido para as autoridades judiciais, ou seja, para os tribunais cíveis (terceira e última linha de intervenção). As CPCJ e os tribunais podem ordenar medidas de proteção e promoção específicas, que incluem medidas no meio natural de vida, tais como apoio junto dos pais e/ou outros familiares, e medidas de colocação, tais como acolhimento familiar ou acolhimento em instituição. No setor da deficiência, o Instituto Nacional para a Reabilitação (INR) é o organismo público responsável pela aplicação da lei que proíbe e pune a discriminação31. As queixas contra discriminação em razão da deficiência devem ser efetuadas através de um formulário específico ou de um relatório escrito enviado ao INR, aos membros do Governo responsáveis pela política em matéria de deficiência ou a outras organizações com competência para dar início a um processo de infração (por exemplo, a Autoridade Nacional de Comunicações, o Instituto de Seguros de Portugal, a Inspeção-Geral da Educação e a Inspeção-Geral das Atividades Culturais, etc.). Logo que este processo seja iniciado, deve ser envida uma cópia para o INR, juntamente com o relatório final do processo. Podem apresentar queixas pessoas singulares ou organizações de pessoas com deficiência em seu nome. O INR está obrigado a elaborar um relatório anual com informações sobre atos discriminatórios comunicados ao longo do ano e as sanções finais impostas32. Criado legalmente através do Decreto-Lei n.º 212/75, desde 1999 que o Provedor de Justiça é igualmente a Instituição Nacional de Direitos Humanos portuguesa acreditada com estatuto A, em conformidade com os Princípios de Paris. O Provedor de Justiça visa assegurar a justiça e a legalidade dos trabalhos da administração pública, aplicando meios informais de investigação às queixas apresentadas pelos cidadãos. Além da possibilidade de receber queixas em linha ou presencialmente, o Provedor de Justiça português tem em funcionamento linhas telefónicas exclusivas para crianças e cidadãos com deficiência, que fornece serviços de informações, de encaminhamento e de intervenção quando necessário. Em Portugal não existe um Provedor da Criança. 2.2.3. Definições O Código Civil define «menor» como uma criança que «não tiver ainda completado dezoito anos de idade»33. Ao perfazer os dezoito anos, adquire plena capacidade de exercício de direitos, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens34. A Lei em matéria de deficiência apresenta uma definição de pessoa com deficiência explicando que «considera-se pessoa com deficiência aquela que, por motivo de perda ou anomalia, congénita ou adquirida, de funções ou de estruturas do corpo, incluindo as 31 Artigo 8.º da Lei n.º 46/2006 que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. 32 Artigo 8.º, n.º 3, ibid. 33 Artigo 122.º do Código Civil. 34 Artigo 130.º, ibid. 17 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ funções psicológicas, apresente dificuldades específicas suscetíveis de, em conjugação com os fatores do meio, lhe limitar ou dificultar a atividade e a participação em condições de igualdade com as demais pessoas»35. Esta definição segue a abordagem proposta pela CIF, que reconhece a interação de fatores corporais e do meio na produção da deficiência. Não é apresentada uma definição de «criança com deficiência» nem de «deficiência». 35 Artigo 2.º da Lei n.º 38/2004 que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 18 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ 3. QUADRO JURÍDICO PARA CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA EM PORTUGAL   3.1. 3.1.1. PRINCIPAIS CONSTATAÇÕES De um modo geral, o quadro jurídico reflete efetivamente as normas, os princípios e as regras consagrados na CDC e na CDPD. Contudo, verificaram-se duas grandes lacunas: a falta de reconhecimento do direito de uma criança com deficiência exprimir as suas opiniões sobre matérias relacionadas com ensino especial; e a não consideração da especial vulnerabilidade das raparigas com deficiência a discriminação e violência. A aplicação dos princípios e dos direitos previstos na CDPD e na CDC está incompleta e é, nalguns casos, problemática, principalmente devido: (a) à falta de tradição de dar à criança uma oportunidade para expressar as suas opiniões (sociedade paternalista e patriarca); (b) à prática persistente de institucionalizar as crianças e os jovens em perigo e às recentemente criadas «escolas de referência» para alunos surdos e cegos; (c) às restritivas condições de elegibilidade e a menores níveis de prestações sociais pagas às crianças com deficiência e às suas famílias; (d) às medidas de austeridade em vigor, que tiveram um impacto negativo na disponibilização de serviços e de recursos no domínio da deficiência. Aplicação das disposições previstas na CDPD e na CDC Interesse superior da criança (artigo 3.º da CDC; artigo 7.º da CDPD) A obrigação geral de agir no interesse superior da criança é estabelecida no artigo 69.º da Constituição da República, que determina que «as crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral». O mesmo princípio está consagrado em vários artigos do Código Civil, nomeadamente nos que se referem ao exercício das responsabilidades parentais entre cônjuges36 e em caso de divórcio ou separação judicial37 (ambos integram a Lei do Divórcio atualizada em 2008)38. A Lei do Divórcio confere poderes ao tribunal para avaliar até que ponto o interesse superior da criança está protegido nos acordos em matéria de responsabilidades parentais, bem como nas decisões relativas ao local de residência da criança e aos direitos de visita39. Em todas estas decisões, o tribunal deve considerar acima de tudo o interesse superior da criança «tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles»40. Nos termos da lei portuguesa, a adoção é decretada para cumprir o interesse superior da criança41 e, por conseguinte, depende de um conjunto de condições, incluindo se os pais biológicos, por ação ou omissão, puserem em perigo a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação do menor42. 36 37 38 39 40 41 42 Artigo 1901.º do Código Civil. Artigo 1906.º, ibid. Lei n.º 61/2008 que «Altera o regime jurídico do divórcio», Diário da República de 31 de outubro de 2008. Artigo 1906.º, n.º 5, do Código Civil. Artigo 1906.º, ibid. Artigo 1974.º, ibid. Artigo 1978.º, ibid. 19 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ A Lei de proteção de crianças e jovens em perigo determina que o interesse superior da criança e do jovem constitui o princípio prioritário que deve orientar a promoção e a proteção de crianças e jovens que se encontram em sério risco ou em perigo43. Estabelece que é da competência das comissões alargadas44 desenvolver ações e colaborar com as entidades competentes tendo em vista a deteção dos factos e situações que se mostrem desfavoráveis ao desenvolvimento e inserção social da criança, bem como informar e colaborar com as entidades competentes no levantamento das carências e na identificação dos recursos necessários à promoção dos direitos, do bem-estar e do desenvolvimento integral da criança e do jovem45. A lei estabelece ainda que a criança e o jovem, em separado ou na companhia dos pais ou de pessoa por si escolhida, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição de medidas que lhes digam respeito46. Não existe uma referência explícita à proteção do «interesse superior da criança» na Lei de Bases do Sistema Educativo47, na Lei de Bases da Segurança Social48 ou na Lei Tutelar Educativa49. Contudo, existem várias disposições nestes atos que sugerem que o princípio do interesse superior da criança orientou o legislador na elaboração dessas leis. Por exemplo, a Lei de Bases do Sistema Educativo afirma que um dos princípios organizativos do sistema educativo é «contribuir para a realização do educando, através do pleno desenvolvimento da personalidade, da formação do caráter e da cidadania, preparando-o para uma reflexão consciente sobre os valores espirituais, estéticos, morais e cívicos e proporcionando-lhe um equilibrado desenvolvimento físico»50 e a Lei Tutelar Educativa estabelece, como um dos critérios de escolha das medidas a aplicar, que «o tribunal dá preferência, de entre as que se mostrem adequadas e suficientes, à medida que represente menor intervenção na autonomia de decisão e de condução de vida do menor e que seja suscetível de obter a sua maior adesão e a adesão de seus pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto»51. Embora a legislação que refere o princípio do «interesse superior da criança» não faça uma menção explícita a crianças com deficiência, presume-se que as regras supramencionadas se apliquem igualmente a elas. Tendo em conta as normas da CDPD (artigo 7.º), a não referência ao interesse superior da criança com deficiência é mais surpreendente no contexto de legislação específica em matéria de deficiência. Contudo, nem a lei que define as bases gerais do regime de reabilitação em Portugal52, nem o decreto-lei que define o apoio a prestar à promoção da educação inclusiva53, nem mesmo o decreto-lei que cria o 43 Artigo 4.º, alínea a), da Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». De acordo com o artigo 12.º da Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo», as comissões de proteção são «instituições oficiais não judiciárias com autonomia funcional que visam promover os direitos da criança e do jovem e prevenir ou pôr termo a situações suscetíveis de afetar a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral». As comissões alargadas são compostas por um representante de cada uma das seguintes entidades: município, segurança social, Ministério da Educação, serviços de saúde, associações de pais, forças de segurança e associações locais privadas sem fins lucrativos que trabalhem com crianças e suas famílias (artigo 17.º da Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo»). 45 Artigo 18.º, ibid. 46 Artigo 4.º, alínea i), ibid. 47 Lei n.º 49/2005, «Lei de Bases do Sistema Educativo», Diário da República de 31 de agosto de 2005. 48 Lei n.º 83-A/2013, «Lei de Bases da Segurança Social», Diário da República de 30 de dezembro de 2013. 49 Lei n.º 166/99, «Lei Tutelar Educativa». 50 Artigo 3.º da Lei n.º 49/2005, «Lei de Bases do Sistema Educativo». 51 Artigo 6.º da Lei n.º 166/99, «Lei Tutelar Educativa». 52 Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 53 Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 44 20 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ Sistema de Intervenção Precoce54 referem especificamente este princípio. Este facto pode ser problemático, pois é contrário à capacitação, autonomia e capacidade de defesa na proteção dos direitos e dos interesses das crianças com deficiência. Além disso, juristas académicos e peritos em direitos das crianças55 salientaram que é necessária uma clarificação sobre o significado de interesse superior da criança e, consequentemente, o princípio é mais vezes enunciado do que aplicado de facto. 3.1.2. Não discriminação (artigo 2.º da CDC; artigos 3.º e 5.º da CDPD) O direito geral à não discriminação está consagrado para todos os cidadãos na Constituição da República, que determina que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual56. Esta disposição não refere especificamente a deficiência como uma razão pela qual a discriminação está proibida. A Constituição reconhece ainda que as pessoas com deficiência «gozam plenamente dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição, com ressalva do exercício ou do cumprimento daqueles para os quais se encontrem incapacitados»57. Pressupõe-se que o direito à não discriminação esteja aqui incluído, embora não seja feita uma referência explícita a isso mesmo. O direito de todas as crianças serem protegidas contra «todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão» está igualmente previsto na Constituição58, não sendo especificadas, porém, as razões com base nas quais é proibida a sua discriminação. A proibição da discriminação em razão da deficiência foi mais recentemente readotada em dois documentos jurídicos essenciais: a Lei em matéria de deficiência de 200459 e a Lei que proíbe e pune a discriminação de 200660. Ambos os atos legislativos proíbem formas diretas e indiretas de discriminação em razão da deficiência em todas as esferas da vida e apontam o princípio da ação positiva e da discriminação positiva como uma forma de compensar as desigualdades estruturais que enfrentam as pessoas com deficiência. A lei que proíbe e pune a discriminação define o que constituem práticas discriminatórias61. Estas incluem, entre outras, a recusa de fornecimento ou o impedimento de fruição de bens ou serviços, a recusa ou a limitação de acesso ao meio edificado ou a locais públicos ou abertos ao público, aos cuidados de saúde, aos transportes públicos e às novas tecnologias. A proibição de discriminação de crianças com deficiência está explicitamente enunciada nos princípios orientadores do Decreto-Lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva, que refere que as escolas públicas e as escolas privadas financiadas com fundos públicos não podem rejeitar a matrícula ou a inscrição de qualquer 54 Decreto-Lei n.º 281/2009, relativo ao Sistema de Intervenção Precoce. IAC, O Superior Interesse da Criança na perspetiva do respeito pelos seus direitos, disponível em http://www.iacrianca.pt/index.php/publicacoes-iac/item/632. 56 Artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa. 57 Artigo 71.º, ibid. 58 Artigo 69.º, ibid. 59 Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 60 Lei n.º 46/2006, que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. 61 Artigo 4.º, ibid. 55 21 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ criança ou jovem com base na incapacidade62. A Lei de Bases da Saúde63 prevê que sejam tomadas medidas especiais em relação a grupos particularmente vulneráveis, incluindo as crianças e os deficientes, mas não aborda diretamente a discriminação de crianças e pessoas com deficiência. Os direitos e as vulnerabilidades específicas das raparigas com deficiência não são mencionados em nenhuma destas leis, nem é reconhecido que podem ser sujeitas a discriminação múltipla. Contudo, o Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não-discriminação 2014 -201764 inclui uma medida que visa combater a discriminação de raparigas e mulheres com deficiência, nomeadamente através de atividades de sensibilização. A obrigação de facultar «adaptações razoáveis» está prevista na Lei de Bases do Sistema Educativo65, que refere que na conceção dos edifícios e na escolha do equipamento devem ser tidas em conta as necessidades e as características das crianças com deficiência. A Lei em matéria de deficiência prevê o acesso a habitação, transportes e informação66. No Decreto-Lei de promoção da acessibilidade67, que determina as normas de acessibilidade aos edifícios públicos e ao espaço público, o princípio de adaptações razoáveis é utilizado para justificar exceções às regras de acessibilidade, que são permitidas «quando as obras necessárias à sua execução sejam desproporcionadamente difíceis, requeiram a aplicação de meios económico-financeiros desproporcionados ou não disponíveis»68. Sendo assim, esta disposição pode ser invocada para justificar a não aplicação da lei. Por fim, as adaptações razoáveis também se refletem na legislação portuguesa respeitante ao trabalho, mas tal não é particularmente relevante para as crianças com deficiência69. É importante referir que o Decreto-Lei de promoção da acessibilidade se encontra em revisão desde 2012 e que nunca foi dado início à segunda fase do Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade 2012/202070. Investigação demonstra que a falta de acesso a sistemas de transportes, comunicação e informação, bem como ao meio edificado, constitui uma das principais causas de exclusão e de sonegação de direitos a pessoas com deficiência em Portugal71. 62 Artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 63 Base II, alínea c), da Lei n.º 48/90, «Lei de Bases da Saúde», Diário da República de 24 de agosto de 1990. 64 Medida 33 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 103/2013, «V Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não-discriminação 2014-2017», Diário da República de 31 de dezembro de 2013. 65 Artigo 42.º da Lei n.º 49/2005, «Lei de Bases do Sistema Educativo». 66 Artigos 32.º, 33.º e 43.º da Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 67 Decreto-Lei n.º 163/2006, relativo ao regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via pública e edifícios habitacionais. 68 Artigo 10.º, ibid. 69 Artigos 85.º, 86.º, 87.º e 88.º da Lei n.º 27/2014, «Código do Trabalho», Diário da República de 8 de maio de 2014. 70 Resolução do Conselho de Ministros n.º 9/2007, «Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade», Diário da República de 17 de janeiro de 2007. Pinto, Paula Campos & Teixeira, Diana «DRPI-Portugal: Relatório Final». (2012), Lisboa, ISCSP, disponível em: http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/13-estudopiloto-drpi-portugal e Pinto, Paula & Teixeira, Diana, «Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal: Relatório Holístico» (2014), disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/201304-24-18-50-23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/151-monitoriza%C3%A7%C3%A3o-dos-direitos-daspessoas-com-defici%C3%AAncia-em-portugal. 71 22 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ Nos termos da Lei que proíbe e pune a discriminação, as queixas relativas a discriminação devem ser efetuadas através de um formulário específico ou de um relatório escrito enviado ao Instituto Nacional para a Reabilitação (INR), que é o organismo público responsável pela política em matéria de deficiência, ou a outras organizações com competência para dar início a um processo de infração. Logo que este processo seja iniciado, deve ser envida uma cópia para o INR, juntamente com o relatório final do processo. Podem apresentar queixas pessoas singulares ou organizações de pessoas com deficiência em seu nome. Presume-se que as queixas apresentadas em nome de crianças com deficiência sigam procedimentos semelhantes. Podem igualmente ser apresentadas queixas junto do Provedor de Justiça e as crianças também podem ter acesso a este mecanismo. Só chegam aos tribunais casos de discriminação se lhes forem remetidos pelo INR ou pelo Provedor de Justiça. 3.1.3. Desenvolvimento das capacidades da criança (artigo 5.º da CDC e artigo 3.º da 72 CDPD) A expressão «desenvolvimento das capacidades da criança» decorre do inglês «evolving capacities of the child», mas não constitui uma tradução direta para português e, por conseguinte, tem sido interpretada pelo direito e pela política portugueses de várias formas. O artigo 1878.º do Código Civil, que clarifica o conceito de responsabilidades parentais, declara que «de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida». O artigo reconhece a importância da promoção do desenvolvimento e da autonomia da criança, de acordo com o seu grau de maturidade. Embora remonte já a 1977, a legislação subsequente demonstra que a inclusão deste princípio ainda é, de uma forma geral, inexistente. A maior parte da legislação aborda esta questão em termos incompletos, referindo-se à necessidade de promover «o desenvolvimento integral» da criança, sem nunca definir o conceito. Por conseguinte, não existe na legislação portuguesa o reconhecimento de uma maior autodeterminação da criança que acompanha o desenvolvimento das suas capacidades. Por exemplo, a Constituição da República prevê o direito de a criança receber proteção da sociedade e do Estado, «com vista ao seu desenvolvimento integral»73. O Decreto-Lei relativo ao Sistema de Intervenção Precoce refere a necessidade de assegurar às crianças a proteção dos seus direitos e o desenvolvimento das suas capacidades74, mas não apresenta qualquer especificação do conceito nem o que este implica. Outra legislação reflete este princípio de uma forma mais explícita. Por exemplo, a Lei de proteção de crianças e jovens em perigo define, como seu objeto, a promoção dos direitos e a proteção das crianças e dos jovens em perigo, por forma a garantir o seu bem-estar e desenvolvimento integral75. Determina ainda que as medidas de proteção das crianças e 72 O conceito de desenvolvimento das capacidades da criança determina que, à medida que as crianças adquirem competências e experiência, há uma menor necessidade de orientação e uma maior capacidade de as crianças assumirem responsabilidade pelas decisões que afetam a sua vida. À luz da CDC, o conceito de desenvolvimento das capacidades da criança implica que os pais (ou os representantes legais) devem ter o direito e o dever de assegurar à criança, de forma compatível com o desenvolvimento das suas capacidades, a orientação adequada ao exercício dos direitos que lhe são reconhecidos. Para uma descrição mais pormenorizada do conceito, pode consultar-se a síntese do relatório de projeto. 73 Artigo 69.º da Constituição da República Portuguesa. 74 Artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 281/2009 relativo ao Sistema de Intervenção Precoce. 75 Artigo 1.º da Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 23 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ dos jovens visam proporcionar-lhes as condições que permitam proteger e promover, nomeadamente, o seu bem-estar e desenvolvimento integral. Todavia, este princípio é incluído sem abordar especificamente a necessidade de ter em conta o desenvolvimento das capacidades da criança e a sua autonomia crescente, refletindo um entendimento relativamente estático das necessidades, interesses e competências da criança. A legislação que regulamenta as medidas de promoção e de proteção76, bem como a lei relativa a violência doméstica77, preveem o direito de a criança ser ouvida e participar de acordo com a sua maturidade. Alguma legislação relativa a medidas específicas de proteção de crianças e jovens vai um pouco mais além no reconhecimento do princípio de desenvolvimento das capacidades da criança. Por exemplo, o Decreto-Lei sobre o Regime de Execução do Acolhimento Familiar define que o acolhimento familiar visa a integração da criança ou do jovem em meio familiar e a prestação de cuidados adequados às suas necessidades e bem-estar e a educação necessária ao seu desenvolvimento integral78. Prevê igualmente que a revisão da medida de acolhimento familiar deve ter em consideração a «estabilidade emocional», bem como «os sinais concretos da evolução da capacidade da família natural para a integração no seu seio, da criança ou do jovem, em termos de garantir a satisfação das necessidades do seu desenvolvimento integral»79. Além disso, determina ainda, como obrigações das famílias de acolhimento, orientar e educar a criança ou jovem com diligência e afetividade, contribuindo para o seu desenvolvimento integral80. Toda a legislação supramencionada aplica-se de forma igual a todas as crianças, independentemente de serem ou não portadoras de deficiência. O Decreto-Lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva afirma que «a educação especial tem por objetivos a inclusão educativa e social, o acesso e o sucesso educativo, a autonomia, a estabilidade emocional, bem como a promoção da igualdade de oportunidades, a preparação para o prosseguimento de estudos ou para uma adequada preparação para a vida pós-escolar ou profissional»81. Este ato legislativo refere a necessidade de promover o desenvolvimento e a autonomia da criança, ainda que apenas em termos gerais. A Lei em matéria de deficiência apresenta uma compreensão mais geral do conceito de desenvolvimento das necessidades e das capacidades, determinando o direito das pessoas com deficiência «aos bens e serviços necessários ao seu desenvolvimento ao longo da vida»82 e «à qualidade dos bens e serviços de prevenção, habilitação e reabilitação, atendendo à evolução da técnica e às necessidades pessoais e sociais»83. Determina ainda 76 Artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 12/2008, relativo à «Proteção em Meio Natural de Vida», Diário da República de 17 de janeiro de 2008. Artigo 24.º da Lei n.º 11/2008, «Regime de Execução do Acolhimento Familiar». 77 Artigo 9.º da Lei n.º 112/2009, relativa a «Violência Doméstica e Assistência às Vítimas». 78 Artigo 2.º da Lei n.º 11/2008, «Regime de Execução do Acolhimento Familiar». 79 Artigo 6.º, ibid. 80 Artigo 21.º, ibid. 81 Artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 82 Artigo 10.º da Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 83 Artigo 11.º, ibid. 24 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ que habilitação84 e reabilitação são constituídas por medidas no domínio do emprego, trabalho e formação, consumo, segurança social, saúde, habitação e urbanismo, transportes, educação e ensino, cultura e ciência, sistema fiscal, desporto e tempos livres, que tenham em vista a aprendizagem e o desenvolvimento de aptidões, a autonomia e a qualidade de vida da pessoa com deficiência85. Contudo, não aborda especificamente as necessidades das crianças com deficiência. 3.1.4. O direito a ser ouvida/a participar (artigo 12.º da CDC; artigos 7.º e 30.º da CDPD) O direito a ser ouvida O direito de uma criança a ser ouvida está consagrado na legislação portuguesa. De facto, Portugal foi pioneiro na consagração jurídica do direito da criança a ser ouvida. O artigo 1878.º do Código Civil86, que clarifica o conceito de responsabilidades parentais, declara que «de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida». O direito da criança a ser ouvida em processos judiciais que a afetem está claramente previsto na Lei de proteção de crianças e jovens em perigo87 (processos de promoção e proteção) e na Lei Tutelar Educativa88 (processos penais89). A Lei de proteção de crianças e jovens em perigo90 reconhece e protege o direito da criança a ser ouvida em eventuais processos que decorram no âmbito da intervenção e proteção de crianças, referindo a necessidade de informar as crianças sobre os seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa. Prevê igualmente o direito de a criança ser ouvida e participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção, em separado ou na companhia dos pais ou de pessoa por si escolhida. Além disso, a intervenção por parte das comissões de proteção de crianças e jovens depende do «consentimento expresso dos seus pais, do representante legal ou da pessoa que tenha a guarda de facto», mas também da «não oposição da criança ou do jovem» com idade igual ou superior a 12 anos (condição obrigatória)91. Embora a oposição de crianças com idade inferior a 12 anos também devesse ser tida em consideração, atribuindo o devido peso à capacidade de a criança compreender os motivos que conduziram à intervenção, podem ser aplicadas, no superior interesse da criança, medidas de proteção sem consentimento, sempre que a ausência de intervenção colocar a criança em perigo92. A Lei Tutelar Educativa93 refere que o menor tem direito a «ser ouvido, oficiosamente ou quando o requerer, pela autoridade judiciária» e a ser «informado dos direitos que 84 Habilitação envolve a aquisição de competências, de aptidões e de conhecimentos que permitirão que uma pessoa funcione em sociedade. Estes tipos de programas geralmente são destinados a crianças que nasceram com deficiência. Reabilitação significa recuperar capacidade e aptidão. Geralmente aplica-se a deficiências adquiridas. 85 Artigo 25.º, ibid. 86 Código Civil. 87 Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 88 Lei n.º 166/99, «Lei Tutelar Educativa». 89 Os processos penais relativos a crianças entre os 12 e os 16 anos de idade regem-se pela Lei Tutelar Educativa; os processos relativos a crianças com idades inferiores são abrangidos exclusivamente pela Lei de proteção de crianças e jovens em perigo. 90 Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 91 Artigos 9.º e 10.º da Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 92 Artigo 91.º, ibid. 93 Artigo 45.º da Lei n.º 166/99, «Lei Tutelar Educativa». 25 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ lhe assistem» em qualquer fase do processo judicial. A lei refere ainda que estes direitos podem ser exercidos, em nome do menor, pelos pais, representante legal, pessoa que tenha a sua guarda de facto ou defensor. Estão presentes princípios semelhantes na legislação específica relativa a medidas de promoção e proteção (por exemplo o Decreto-Lei sobre o Regime de Execução do Acolhimento Familiar e o Decreto-Lei relativo à «Proteção em Meio Natural de Vida»94). O direito da criança a ser ouvida em todos os processos jurídicos que lhe digam respeito está igualmente incluído no artigo 45.º da Lei Tutelar Educativa95 e nos artigos 9.º e 10.º da Lei n.º 112/200996 relativa a «Violência Doméstica e Assistência às Vítimas». O direito a participar A Lei em matéria de deficiência, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência, não aborda especificamente os direitos das crianças com deficiência. Todavia, o artigo 9.º (Princípio da participação) prevê o direito de uma pessoa com deficiência participar no planeamento, desenvolvimento e acompanhamento da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. O artigo 40.º da mesma lei especifica ainda que «a participação é constituída pelas medidas específicas necessárias para assegurar a participação da pessoa com deficiência, ou respetivas organizações representativas, nomeadamente na elaboração da legislação sobre deficiência, execução e avaliação das políticas referidas na presente lei, de modo a garantir o seu envolvimento em todas as situações da vida e da sociedade em geral». Apesar de estar claramente enunciado na maioria dos atos jurídicos, o direito de a criança ser ouvida e participar nas tomadas de decisão que a afetam nem sempre é respeitado, por uma variedade de motivos (por exemplo, o risco de que ouvir a criança em processos de guarda ou de proteção possa voltar a traumatizar a criança, ou o risco de a criança ser manipulada pelos adultos com quem tem maior proximidade). Contudo, nestes casos, conforme afirma a Ordem dos Advogados portuguesa97, estes riscos não devem obstruir as partes envolvidas, comprometendo o direito à participação; pelo contrário, exigem que seja dado apoio para que a criança seja ouvida nas melhores condições possíveis. Considerando que o direito a ser ouvido e a participar está consagrado na Constituição, é de certa forma surpreendente verificar que este princípio se encontra totalmente ausente do Decreto-Lei n.º 3/200898, que estabelece os apoios especializados para uma educação inclusiva. De facto, ao analisar quem deveria ser consultado aquando da definição do programa educativo individual, o artigo 10.º refere que este deve ser elaborado «conjunta e obrigatoriamente», pelo docente do grupo ou turma, pelo docente de educação especial, pelo encarregado de educação e, sempre que se considere necessário, por outros serviços de apoio à criança. No entanto, não faz qualquer referência à necessidade de envolver e ouvir a criança na elaboração do programa educativo, em clara violação do princípio da participação, conforme estabelecido na CDC e na CDPD. 94 Decreto-Lei n.º 12/2008, relativo à «Proteção em Meio Natural de Vida». Lei n.º 166/99, «Lei Tutelar Educativa». 96 Lei n.º 112/2009, relativa a «Violência Doméstica e Assistência às Vítimas». 97 Disponível em: http://www.oa.pt/cd/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?sidc=31634&idc=8351&idsc=21852&ida=75761. 98 Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 95 26 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ 3.1.5. Proteção contra violência (artigo 19.º da CDC; artigo 16.º da CDPD) e sua aplicação O princípio geral de proteção da criança contra todas as formas de violência e violações da sua dignidade e direitos encontra-se consagrado no artigo 69.º da Constituição, que prevê o direito de a criança receber proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. O Código Penal99 prevê um agravamento da sentença em casos de violência doméstica ou de maus tratos quando a vítima for menor100. O artigo 152.º do Código Penal determina que quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais a pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite, é punido com pena de prisão de um a cinco anos. A lei prevê um agravamento da sentença de dois a oito anos se a vítima for menor. Se o ato resultar numa ofensa à integridade física grave da vítima ou na morte da vítima, a sentença é igualmente agravada. Além disso, quem for condenado por crime previsto nesse artigo pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício do poder paternal, da tutela ou da curatela por um período de um a dez anos. O Código Penal especifica igualmente as condições que podem configurar num caso de maus tratos101, nomeadamente se o agressor «tendo ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direção ou educação ou a trabalhar ao seu serviço, pessoa menor ou particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez», «lhe infligir, de modo reiterado ou não, maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, ou a tratar cruelmente» e «a empregar em atividades perigosas, desumanas ou proibidas» ou «a sobrecarregar com trabalhos excessivos». Os agressores condenados por maus tratos enfrentam uma pena de prisão de um a cinco anos, com agravamento da sentença se dos seus atos resultar ofensa à integridade física grave ou a morte da vítima. A Lei relativa à prevenção da violência doméstica e assistência às vítimas102 estabelece um quadro jurídico de apoio a vítimas de violência doméstica, independentemente da sua idade. Nos termos da referida lei, toda a vítima, independentemente da ascendência, nacionalidade, condição social, sexo, etnia, língua, idade, religião, deficiência, convicções políticas ou ideológicas, orientação sexual, cultura e nível educacional goza dos direitos fundamentais inerentes à dignidade da pessoa humana, sendo-lhe assegurada a igualdade de oportunidades para viver sem violência e preservar a sua saúde física e mental103. Esta lei prevê igualmente um conjunto de princípios de intervenção, nomeadamente a obrigação de informar a vítima104, o direito de a vítima ser ouvida e ser testemunha105, bem como a necessidade de obter o consentimento livre e esclarecido da vítima antes de se 99 Código Penal, 1995. Artigo 152.º, ibid. 101 Artigo 152.º-A, ibid. 102 Lei n.º 112/2009, relativa a «Violência Doméstica e Assistência às Vítimas». 103 Artigo 5.º, ibid. 104 Artigo 15.º, ibid. 105 Artigo 16.º, ibid. 100 27 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ iniciar qualquer intervenção106. O consentimento da vítima é uma condição obrigatória e suficiente para dar início a procedimentos de apoio, se a vítima tiver idade igual ou superior a 16 anos; é uma condição obrigatória, mas normalmente não suficiente, se a vítima tiver idade inferior a 16 anos (neste caso, deve ser obtido o consentimento do representante legal ou de uma entidade designada pela lei). As crianças com idade inferior a 12 anos têm direito a pronunciar-se, em função do seu grau de maturidade107. A lei prevê igualmente um conjunto de mecanismos de apoio e assistência às vítimas de violência doméstica, nomeadamente consulta jurídica, aconselhamento e proteção direta, quando as autoridades considerarem que a vítima se encontra em perigo108. As vítimas especialmente vulneráveis podem realizar o seu depoimento com recurso a meios alternativos, dispensando a necessidade de audiência pública, sempre que permitido pelo Ministério Público. Contudo, a lei não especifica o que é considerado uma vítima especialmente vulnerável e se as crianças com ou sem deficiência podem ser incluídas neste grupo. Além destas regras gerais que se aplicam a todas as vítimas, independentemente da sua idade, a Lei n.º 113/2009109 inclui princípios gerais de proteção de menores contra a exploração sexual e os abusos sexuais, incluindo um princípio da não discriminação, segundo o qual as medidas tendentes a proteger os direitos das vítimas devem ser aplicadas «sem qualquer discriminação com base no sexo, na raça, na cor, na língua, na religião, nas opiniões políticas ou outras, na origem nacional ou social, na pertença a uma minoria nacional, na riqueza, no nascimento ou em qualquer outra situação.» Não é feita qualquer referência específica a idade ou deficiência como razões para uma possível discriminação. A Lei Tutelar Educativa110 aborda o respeito pela saúde física e psíquica e pela dignidade do menor, especificando que é proibida a aplicação de medidas que se traduzam em tratamento cruel, desumano, degradante ou que possam comprometer a saúde física ou psíquica do menor e que nenhuma sanção disciplinar pode ser executada com violação do respeito pela dignidade da pessoa do menor111. Esta lei reforça os princípios já contidos na Constituição e no Código Penal, proibindo todas as formas de violência contra menores. O ato jurídico mais importante no que se refere à proteção das crianças é a Lei n.º 147/99112, que define o sistema de proteção de crianças e jovens, nomeadamente em casos de abandono, maus tratos físicos ou psíquicos, abusos sexuais, entre outras situações que possam colocar em risco ou comprometer o bem-estar da criança. Segundo o princípio da subsidiariedade, a proteção da criança dever ser assegurada, prioritariamente, pelas organizações locais que trabalham com crianças e jovens. Quando estas instituições não conseguirem remover o perigo para o bem-estar da criança, são envolvidas as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) e estas podem ativar um conjunto de medidas de proteção, tais como apoio parental, apoio a outros membros da família, acolhimento em instituição, entre outras. Sempre que as CPCJ não obtiverem o 106 Artigo 9.º, ibid. Artigo 9.º, n.º 5, ibid. 108 Artigo 20.º, ibid. 109 Lei n.º 113/2009, «Contra a Exploração Sexual e o Abuso Sexual de Crianças», Diário da República de 17 de setembro de 2009. 110 Lei Tutelar Educativa. 111 Artigo 188.º, ibid. 112 Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 107 28 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ consentimento e a cooperação da criança e dos seus representantes legais para o plano de intervenção estabelecido, o processo é remetido para as autoridades judiciais. As principais lacunas atribuídas ao sistema de proteção de crianças português incluem a atribuição de tempo insuficiente aos membros das CPCJ, a rotação frequente desses membros, o que implica períodos adicionais de formação e instabilidade no acompanhamento dos casos de proteção de crianças, a burocracia dos processos e a falta de procedimentos de comunicação eficazes entre as entidades envolvidas113. Em suma, Portugal reconhece claramente o direito da criança a não ser objeto de violência, através de um conjunto de disposições jurídicas. Todavia, foram relatadas importantes falhas na aplicação da legislação existente. Além disso, o quadro jurídico existente não reflete a vulnerabilidade adicional enfrentada por raparigas e crianças com deficiência. 3.1.6. Direito à vida familiar (artigo 9.º da CDC; artigo 23.º, n.º 3, da CDPD) O direito à vida familiar está, de facto, refletido na legislação nacional, quer no quadro jurídico geral, quer na legislação específica em matéria de deficiência. O direito geral à vida familiar está consagrado na Constituição da República, que refere especificamente que «os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial»114. O respeito pela preservação dos laços afetivos com familiares próximos encontra-se igualmente protegido nos termos do Código Civil, que determina que os pais não podem privar os filhos do convívio com os irmãos e ascendentes115. O Código Civil atribui ao tribunal a competência de proteger o interesse superior da criança e o seu desenvolvimento emocional saudável, assegurando que a criança mantém relações de proximidade com ambos os pais, mesmo em caso de divórcio ou separação.116 A Lei de proteção de crianças e jovens em perigo determina que a colocação das crianças em acolhimento alternativo deve ser temporária e que a decisão de institucionalizar uma criança deve ser revista de seis em seis meses117. O direito da criança a ser ouvida, quando for considerado necessário separá-la de ambos os pais, está igualmente garantido. A «Lei de proteção de crianças e jovens em perigo» estabelece, como princípio geral, que a criança e o jovem, em separado ou na companhia de pessoa por si escolhida, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção, incluindo medidas de institucionalização118. Nos termos da lei portuguesa, é necessário para a adoção o consentimento do adotando se este for maior de 12 anos119. Embora todas as medidas supramencionadas se apliquem a todas as crianças, incluindo às com deficiência, a Lei em matéria de deficiência define as bases gerais do regime jurídico da reabilitação e indica os direitos das famílias de crianças com deficiência. De acordo com esta lei, compete ao Estado adotar medidas que proporcionem à família da 113 Perista, P. & Silva, M. Combating child abuse and neglect in Portugal (2011). Relatório apoiado pelo Programa Daphne III. Lisboa: CESIS. 114 Artigo 36.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa. 115 Artigo 1887.º-A do Código Civil. 116 Artigos 1776.º-A, 1901.º e 1906.º, ibid. 117 Artigo 62.º da «Lei de proteção de crianças e jovens em perigo». 118 Artigo 4.º, alínea i), ibid. 119 Artigo 1981.º do Código Civil. 29 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ pessoa com deficiência as condições para a sua plena participação120. Na sequência deste quadro geral, o Decreto-Lei relativo ao Sistema de Intervenção Precoce cria o «Sistema de Intervenção Precoce na Infância», com o intuito de apoiar as crianças com deficiência (entre os 0 e os 6 anos) e as suas famílias. Da mesma forma, o Decreto-Lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva clarifica o papel das famílias na educação declarando que «os pais ou encarregados de educação têm o direito e o dever de participar ativamente, exercendo o poder paternal nos termos da lei, em tudo o que se relacione com a educação especial a prestar ao seu filho, acedendo, para tal, a toda a informação constante do processo educativo»121. Apesar de estar devidamente consagrado no quadro jurídico, a aplicação do direito à vida familiar é muitas vezes problemática na prática. Um estudo recente demonstra que o número de crianças retiradas à família entrando numa das respostas de acolhimento em 2012 foi o mais elevado dos últimos seis anos (2 289 ou 27 % - mais 177 do que em 2011 e mais 105 ou 5 % do que em 2006).122 A situação foi denunciada no relatório apresentado pela UNICEF-Portugal e outras organizações da sociedade civil, alternativo aos terceiro e quarto relatórios periódicos de Portugal no âmbito da Convenção sobre os Direitos da Criança123. O mesmo relatório alega que «apesar de a Lei de proteção de crianças e jovens em perigo (Lei n.º 147/99, de 1 de setembro) determinar que a colocação de crianças em instituições de acolhimento deve ser temporária e que essa decisão deve ser revista de seis em seis meses, tal não se verifica na prática» e muitas crianças continuam sem um projeto de vida individualizado e sem um plano de acolhimento, o que provavelmente irá adiar o seu regresso à família natural124. Segundo o estudo citado125, de todas as crianças em situação de acolhimento em 2012 (8 557 crianças), em 14 % encontra-se presente uma deficiência mental, em 3 % uma deficiência física e em 4 % uma deficiência psicossocial (doença mental)126. Os autores reconhecem que estes números podem estar subestimados, nomeadamente no que se refere ao diagnóstico de deficiências psicossociais; não obstante, indicam que uma percentagem significativa das crianças com deficiência está a ser privada do seu ambiente familiar. A aplicação do Decreto-Lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva é igualmente problemática. O estatuto cria as chamadas «escolas de referência», que as crianças surdas e cegas têm de frequentar a fim de aprenderem língua gestual ou braille127, independentemente de a escola estar ou não situada na sua comunidade. Tal exige que os alunos com deficiência, em especial os que residem em zonas rurais, viajem longas distâncias. Esta situação cria uma nova forma de segregação que provavelmente também 120 Artigo 22.º da Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 121 Artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 122 Instituto da Segurança Social, I.P.: Departamento de Desenvolvimento Social e Programas/ Unidade de Infância e Juventude/Núcleo de Assessoria Técnica aos Tribunais e Acolhimento Institucional, «CASA 2012: Relatório de Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens», março de 2013, disponível em http://www4.seg-social.pt/documents/10152/13326/CASA2012. 123 UNICEF et al., «Alternative report to the third and fourth periodic reports of Portugal under the Convention on the Rights of the Child», disponível em http://tbinternet.ohchr.org/_layouts/TreatyBodyExternal/SessionsList.aspx?Treaty=CRC. 124 UNICEF et al., «Alternative report to the third and fourth periodic reports of Portugal under the Convention on the Rights of the Child», sem data, página 17. 125 Instituto da Segurança Social, I.P.: «Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens» 126 Instituto da Segurança Social, I.P.: «Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens» 127 Artigos 18.º e 19.º do Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 30 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ viola os direitos das crianças com deficiência a manter os laços familiares afetivos, ao reduzir o tempo que passam com a família e com irmãos da mesma idade não portadores de deficiência, que provavelmente frequentarão uma escola diferente128. 3.1.7. Direito a assistência (artigo 23.º da CDC; artigos 23.º, n.º 5, e 28.º da CDPD) A legislação portuguesa prevê efetivamente o direito a assistência das crianças com deficiência. O artigo 71.º da Constituição enuncia os deveres do Estado na promoção de uma política nacional «de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias». A Lei relativa às bases gerais do regime jurídico da reabilitação especifica vários domínios que essa política tem de abranger, desde habilitação e reabilitação, desporto e tempos livres, educação e ensino, a emprego e formação, segurança social e saúde, habitação, transportes e urbanismo129. Esta política tem evoluído ao longo dos anos e está consagrada num conjunto de documentos jurídicos (decretos-lei, regulamentos e portarias). De acordo com esta legislação, as crianças com deficiência têm direito a programas de intervenção precoce130 e a apoio educativo especializado131, a cuidados de habilitação e reabilitação, a tecnologias de apoio e a programas de formação profissional132. O Sistema de Intervenção Precoce inclui a Comissão de Coordenação nacional, subcomissões de coordenação regionais, núcleos de supervisão técnica e equipas locais de intervenção, que prestam serviços a crianças dos 0 aos 6 anos, com deficiência ou risco de deficiência, e às suas famílias. Estas equipas locais multidisciplinares devem identificar as crianças que podem beneficiar do programa e elaborar e aplicar as estratégias adequadas de intervenção individualizada, de acordo com o diagnóstico e a avaliação do contexto. Realizam «ações de natureza preventiva e reabilitativa, designadamente no âmbito da educação, da saúde e da ação social»133. De acordo com o Decreto-Lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva134, o apoio especializado que visa facilitar às crianças com deficiência o acesso à educação inclui: a) apoio pedagógico personalizado; b) adequações curriculares individuais; c) adequações no processo de matrícula; d) adequações no processo de avaliação; e) currículo específico individual; e f) tecnologias de apoio135. Tanto as medidas de intervenção precoce como as formas de apoio educativo especializado são disponibilizadas às crianças com deficiência a título gratuito136. 128 Correia, L. M. «Special education in Portugal: the new law and the ICF-CY». Procedia Social and Behavioral Sciences, 9 (2010) 1062-1068. 129 Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência, artigos 25.º, 26.º, 30.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º e 38.º. 130 Decreto-Lei n.º 281/2009, relativo ao Sistema de Intervenção Precoce. 131 Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 132 Decreto-Lei n.º 290/2009, «Programa de Apoio à Qualificação de Pessoas com Deficiência», Diário da República de 12 de outubro de 2009. 133 Artigos 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º 281/2009, relativo ao Sistema de Intervenção Precoce. 134 Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 135 Artigo 16.º, ibid. 136 Artigo 3.º da Lei n.º 85/2009, que «Estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 5 anos de idade», Diário da República de 27 de agosto de 2009. 31 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ Tendo por base uma prova de rendimentos da família, as crianças com deficiência e as suas famílias podem igualmente ter direito a prestações sociais especiais, que visam compensar os custos relacionados com a deficiência e a dependência137. Os requisitos de elegibilidade138 que é preciso cumprir para acesso a essas prestações sociais são determinados consoante a «necessidade» dos candidatos, que é calculada com base nos rendimentos de todos os membros da família (incluindo os dos parentes ou afins em linha reta e em linha colateral, até ao terceiro grau, que residam no mesmo agregado familiar). Para efeitos desse cálculo, são considerados todos os rendimentos provenientes de trabalho, capitais e ativos, pensões e prestações sociais, com exceção de prestações sociais por deficiência. São tomadas medidas especiais no setor da reabilitação e da saúde para promover o acesso a cuidados de saúde para todas as pessoas com um grau de incapacidade superior a 60 %. Estas medidas especiais incluem a comparticipação de medicamentos139 e o transporte não urgente de doentes140. O serviço nacional de saúde é universal e tendencialmente gratuito, tendo em conta uma avaliação das condições económicas e sociais dos cidadãos141. Contudo, em 2012 foram introduzidas taxas moderadoras no acesso aos serviços de saúde (por exemplo, consultas, exames médicos, terapias e tratamentos de urgência), que se aplicam igualmente a pessoas com deficiência. Apenas as pessoas com um grau de incapacidade superior a 60 % e as crianças com menos de 12 anos estão isentas do pagamento de taxas moderadoras no acesso aos cuidados de saúde142. Estão incluídas no Código do Trabalho outras medidas de discriminação positiva para pais de crianças com deficiência, incluindo a disponibilidade de um horário de trabalho flexível ou a tempo parcial, bem como a redução do tempo de trabalho para assistência a filho menor com deficiência143. Todavia, existe uma disparidade entre os compromissos jurídicos e a sua aplicação na prática. Conforme relatado num estudo recente sobre o impacto das medidas de austeridade nos direitos das pessoas com deficiência144, «desde 2008, têm vindo a ser implementadas uma série de reformas que resultaram numa considerável redução dos recursos alocados a programas e serviços, nomeadamente nas áreas do emprego, saúde, educação e assistência social. Em consequência, temos vindo a assistir à redução, ou pelo menos estagnação, da prestação de serviços». No domínio da segurança social, por exemplo, as reformas implicaram a introdução de critérios de elegibilidade mais restritivos em 2010 e um congelamento das pensões desde 2011; no setor da saúde, resultou na introdução de taxas moderadoras para pessoas com deficiência e outros grupos, tendo por base uma prova de rendimentos; na educação, implicou uma política agressiva de 137 Decreto-Lei n.º 133/97, «Prestações familiares», Diário da República de 30 de maio de 1997. Decreto-Lei n.º 70/2010, «Regras de cálculo para atribuição de prestações familiares», Diário da República de 16 de junho de 2010. 139 Decreto-Lei n.º 70/2010, ibid. 140 Portaria n.º 142-B/2012 «Transporte não urgente de doentes», Diário da República, de 15 de maio de 2012. 141 Base XXIV da Lei n.º 48/90, «Lei de Bases da Saúde», e artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa. 142 Artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 113/2011, relativo a taxas moderadoras, Diário da República, de 29 de novembro de 2011. 143 Artigos 49.º, 53.º, 54.º, 55.º e 56.º da Lei n.º 27/2014, «Código do Trabalho». 144 Pinto, Paula e Teixeira, Diana, «Impacto dos Planos de Austeridade dos Governos Europeus nos Direitos das Pessoas com Deficiência: Relatório de Portugal» (2012), página 26, disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/59-avaliaro-impacto-das-medidas-de-austeridade-dos-governos-europeus-sobre-os-direitos-das-pessoas-comdefici%C3%AAncia-relat%C3%B3rio-de-portugal 138 32 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ encerramento de escolas de ensino especial privadas e sem fins lucrativos, bem como a colocação de crianças com deficiência em escolas regulares, sem a afetação do apoio adequado; e no emprego e formação profissional, determinou uma redução drástica do número de horas de formação profissional para jovens com deficiência e a eliminação de alguns incentivos para as entidades empregadoras contratarem pessoas com deficiência. Além disso, devido à falta de serviços de apoio pessoal no acesso a instalações e serviços de saúde, por exemplo a inexistência de serviços de interpretação de língua gestual portuguesa nos hospitais e nos centros de saúde, bem como à falta generalizada de transportes adaptados145, as crianças com deficiência podem enfrentar discriminação no acesso aos cuidados de que necessitam. Investigação demonstrou que, para muitas pessoas com deficiência (incluindo crianças) e para as suas famílias, as prestações sociais constituem as principais fontes de rendimento; tendo em conta os baixos níveis das prestações sociais pagas, muitas delas estão a viver abaixo da linha de pobreza146. A aplicação das medidas de austeridade dificultou-lhes ainda mais a vida e, por conseguinte, o relatório conclui que «a concretização dos direitos das pessoas com deficiência e das suas famílias está, pois, em forte risco, ao mesmo tempo que os avanços conseguidos com a ratificação da Convenção, com a adoção da Estratégia Nacional para a Deficiência, e com as reformas já iniciadas na promoção da educação inclusiva, na melhoria da acessibilidade e na promoção da vida independente, vêm sendo comprometidos ou adiados devido à redução do financiamento público e ao imperativo de conter a dívida soberana»147. 3.1.8. Direito a uma educação inclusiva (artigo 28.º da CDC; artigo 24.º da CDPD) e sua aplicação O direito à educação é reconhecido pela Constituição da República Portuguesa148,que determina igualmente que é obrigação do Estado promover e apoiar o acesso dos cidadãos portadores de deficiência ao ensino149. Em Portugal, o ensino é obrigatório e gratuito para todas as crianças com idades entre os 5 e os 18 anos, desde o pré-escolar ao 12.º ano150. Compete ao Ministério da Educação fornecer os recursos técnicos e humanos e os instrumentos necessários para assegurar a educação e ensino a todas as crianças, independentemente das suas capacidades151. Pinto, Paula Campos et al.,«DRPI-Portugal: Relatório Final» . (2012), Lisboa, ISCSP, disponível em: http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/13-estudopiloto-drpi-portugal e Pinto, Paula et al., «Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal: Relatório Holístico» (2014), disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-5023/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/151-monitoriza%C3%A7%C3%A3o-dos-direitos-das-pessoas-comdefici%C3%AAncia-em-portugal. 146 Portugal, Sílvia (Coord), Sena Martins, Bruno e Hespanha, Pedro, «Estudo de Avaliação do Impacto dos Custos Financeiros e Sociais da Deficiência» (2010), disponível emhttp://www.ces.uc.pt/myces/UserFiles/livros/1097_impactocustos%20(2).pdf. 147 Pinto et al., op. cit., páginas 26-27. 148 Artigo 73.º da Constituição da República Portuguesa. 149 Artigo 74.º, ibid. 150 Artigos 1.º, 2.º e 3.º da Lei n.º 85/2009, que estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 5 anos de idade. 151 Constituição da República, artigo 74.º; Lei n.º 85/2009, que estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 5 anos de idade, artigo 3.º; e Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência, artigo 34.º. 145 33 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ O direito das crianças com deficiência à educação e ensino está igualmente previsto na Lei em matéria de deficiência152 e na Lei de Bases do Sistema Educativo153. Além disso, a Lei que proíbe e pune a discriminação especifica que a recusa ou a limitação de acesso a estabelecimentos de ensino, públicos ou privados, constitui uma prática discriminatória154. O decreto-lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva (alterado em maio de 2008) conduziu ao encerramento de escolas de ensino especial e à colocação das crianças com deficiência em escolas regulares. De acordo com esse decreto-lei, as escolas públicas e particulares, direta ou indiretamente financiadas pelo Ministério da Educação, estão sujeitas ao princípio da não discriminação em razão da deficiência. Por conseguinte, não podem rejeitar a matrícula ou a inscrição de qualquer criança ou jovem com base na incapacidade que manifestem155. São estabelecidas medidas de discriminação positiva, a fim de facilitar o acesso ao ensino, nomeadamente através da atribuição de prioridade na matrícula às crianças com deficiência156. O mesmo decreto-lei refere que o ensino especial em Portugal está organizado em torno de «modelos diversificados de integração», proporcionando a todas as crianças «ambientes o menos restritivos possível», desde que «dessa integração não resulte qualquer tipo de segregação ou de exclusão da criança ou jovem com necessidades educativas especiais»157. Em situações nas quais a aplicação de medidas de ensino especial seja insuficiente «em função do tipo e grau de deficiência do aluno», podem os intervenientes no processo de referenciação e avaliação da criança (incluindo os pais) «propor a frequência de uma instituição de educação especial»158. Por conseguinte, a frequência de uma escola de ensino especial é considerada pela lei como último recurso, quando não tiver êxito a inclusão na escola regular, dado o grau de necessidades do aluno e a falta de apoio adequado prestado pelas escolas regulares. O Decreto-Lei n.º 3/2008 prevê o direito de os pais contestarem a colocação dos filhos numa escola de ensino especial, bem como quaisquer outras decisões relacionadas com a prestação de apoio educativo aos seus filhos. Nestas circunstâncias, os pais podem recorrer da decisão, mediante documento escrito, aos serviços competentes do Ministério da Educação159. A legislação não prevê que a criança possa contestar decisões tomadas em relação à sua própria educação. Quando uma criança ou jovem com necessidades educativas especiais for encaminhado para uma escola, é realizada uma avaliação do aluno pelos serviços de ensino especial e de psicologia da escola. Esta avaliação deve determinar se a criança apresenta ou não «limitações significativas ao nível da atividade e da participação num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de caráter permanente»160. 152 Artigo 34.º da Lei n.º 38/2004, que define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. 153 Especificamente nos artigos 20.º, 21.º, 28.º e 42.º, n.º 4, e de forma mais genérica nos artigos 2.º, 5.º e 7.º da Lei n.º 49/2005 de 30 de agosto. 154 Artigo 4.º da Lei n.º 46/2006, que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. 155 Artigo 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 156 Artigo 2.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 157 Artigo 4.º, n.º 6, ibid. 158 Artigo 4.º, n.º 7, ibid. 159 Artigo 3.º, n.º 3, ibid. 160 Artigo 1.º, ibid. 34 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ Embora possam ser utilizados outros instrumentos de avaliação, a Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) constitui a referência para a avaliação dos alunos. Os pais têm direito a participar ativamente no processo de avaliação dos filhos, mas não é feita qualquer referência na lei à participação da criança/jovem. O resultado da avaliação é um relatório técnico-pedagógico que se torna a base para a elaboração do programa educativo individual (PEI) do aluno161. Um PEI descreve as estratégias de ensino e de avaliação específicas que serão aplicadas para o aluno, as disciplinas que serão abrangidas, os objetivos gerais e específicos que serão atingidos, bem como os recursos humanos e técnicos que serão necessários, incluindo equipamento e materiais especiais. Os pais têm de assinar o PEI, como forma de declarar a sua concordância162. Quando as escolas não possuírem os recursos humanos necessários para aplicar o PEI, nomeadamente se forem precisos profissionais especializados tais como terapeutas da fala, terapeutas ocupacionais, psicólogos, intérpretes de língua gestual e outros, as escolas podem contratá-los, «nos termos legal e regulamentarmente fixados»163. As escolas podem igualmente estabelecer parcerias com organizações privadas sem fins lucrativos e centros de recursos especializados, a fim de obterem apoio especializado. De acordo com o Decreto-Lei n.º 3/2008, as crianças podem aprender braille e língua gestual do pré-escolar ao fim da escolaridade obrigatória em escolas regulares especialmente designadas - as chamadas escolas de referência para alunos surdos e/ou cegos ou com baixa visão. As escolas de referência são escolas públicas regulares que concentram recursos humanos e técnicos para a educação bilingue de alunos surdos e a educação de alunos cegos/com baixa visão164. Por conseguinte, a fim de aprenderem braille ou língua gestual, os alunos surdos e cegos/com baixa visão precisam de frequentar uma escola de referência, independentemente de esta se situar ou não na sua área de residência165. Apesar da retórica da lei, persistem lacunas importantes na aplicação desses princípios e regras. As escolas regulares têm falta de recursos humanos e técnicos para responder às necessidades de crianças com deficiência166. Além disso, a utilização da CIF como instrumento de avaliação tem sido problemática para muitos alunos com deficiência: tem sido reportada uma falta de formação para a aplicação do instrumento e um nível elevado de subjetividade nas avaliações realizadas e, consequentemente, no apoio prestado167. Outro estudo168 demonstrou igualmente que o número de alunos com direito a apoio especial diminuiu desde 2008 (o ano de aplicação do Decreto-Lei n.º 3/2008). O autor alega que o novo sistema de educação inclusiva está, na verdade, a promover a exclusão de muitas crianças, pois incide apenas naquelas com deficiência permanente, 161 Artigo 6.º, ibid. Artigo 9.º, ibid. 163 Artigo 29.º, ibid. 164 Artigo 18.º, ibid. 165 Artigo 19.º, ibid. 166 Pinto, Paula Campos e Teixeira, Diana, «Impacto dos Planos de Austeridade dos Governos Europeus nos Direitos das Pessoas com Deficiência: Relatório de Portugal» (2012), Consórcio Europeu de Fundações para os Direitos Humanos e a Deficiência; e Pinto, Paula Campos e Teixeira, Diana, «Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal: Relatório Holístico» (2014) disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/151monitoriza%C3%A7%C3%A3o-dos-direitos-das-pessoas-com-defici%C3%AAncia-em-portugal. 162 FENPROF, «Estudo sobre aplicação da CIF nas escolas». Lisboa (2010) disponível em http://www.fenprof.pt/?aba=27&mid=115&cat=67&doc=4497. 168 Correia, L. M., «Special education in Portugal: the new law and the ICF-CY». Procedia Social and Behavioral Sciences, 9 (2010) 1062-1068. 167 35 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ criando simultaneamente novas formas de segregação ao concentrar o apoio em apenas algumas escolas (as escolas de referência), enquanto todas as outras ficam sem os recursos adequados. Uma conclusão semelhante é especificada no relatório do Conselho Nacional de Educação169, que aponta para problemas criados pelos critérios de elegibilidade, que excluem crianças com necessidades educativas de caráter temporário. Não tendo respostas educativas adequadas em tempo útil, arriscam-se a que as suas dificuldades se tornem permanentemente incapacitantes. Por fim, um estudo de monitorização recente sobre os direitos das pessoas com deficiência170 verificou que a persistência de rótulos e de estereótipos negativos associados a deficiência contribuem para relações de desrespeito entre alunos com e sem deficiência. O mesmo estudo refere que a falta de apoios especializados nas escolas regulares, incluindo a ausência de material de apoio em formato acessível, a falta de formação dos docentes e restante pessoal e a inexistência de transportes acessíveis, constitui uma barreira significativa à educação de crianças com deficiência em Portugal. 3.2. 3.2.1. Problemas específicos enfrentados por crianças com deficiência Vulnerabilidade de género A legislação portuguesa não protege devidamente as crianças com deficiência contra a discriminação de género. A vulnerabilidade e os direitos específicos das raparigas com deficiência não são reconhecidos na Lei que proíbe e pune a discriminação nem na Lei em matéria de deficiência e, por conseguinte, a discriminação múltipla não se encontra reconhecida na legislação. Em Portugal, a esterilização só é permitida em mulheres com mais de 25 anos de idade; é obrigatório o consentimento livre e informado da mulher, exceto nos casos em que a esterilização é determinada por razões de ordem terapêutica171. O Código Deontológico da Ordem dos Médicos refere ainda que, em casos de menores ou incapazes, a esterilização só deve ser executada «no sentido de evitar graves riscos para a sua vida ou saúde dos seus filhos hipotéticos e, sempre, mediante prévio consentimento judicial»172. A educação sexual é obrigatória nas escolas173 e é ministrada no âmbito da educação para a saúde. O Instituto Nacional para a Reabilitação oferece todos os anos ações de formação sobre questões relacionadas com deficiência. Em 2014, o programa anual inclui, entre outras, uma ação sobre sexualidade na deficiência, uma sobre discriminação e outra sobre prevenção dos maus tratos. Estas ações de formação são gratuitas e são frequentadas por profissionais ligados à deficiência, pessoas com deficiência e suas famílias. 169 Perdigão, Rute; Casas-Novas, Teresa; Gaspar, Teresa, «Políticas Públicas de Educação Especial: Relatório Técnico» . Conselho Nacional de Educação (2014) disponível em http://www.cnedu.pt/content/noticias/CNE/RelatorioTecnico_EE.pdf. 170 Pinto, Paula Campos et al., «Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal: http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50Relatório Holístico» (2014) disponível em 23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/151-monitoriza%C3%A7%C3%A3o-dos-direitos-das-pessoas-comdefici%C3%AAncia-em-portugal. Artigo 10.º da Lei n.º 3/84, «Educação sexual e planeamento familiar», Diário da República de 24 de março de 1984. 172 Artigo 66.º do Código Deontológico da Ordem dos Médicos. 173 Lei n.º 60/2009, que «Estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar», Diário da República de 6 de agosto de 2009. 171 36 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ Além disso, o V Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Nãodiscriminação 2014-2017174 inclui ações de prevenção da discriminação contra mulheres e raparigas com deficiência através da realização de atividades de sensibilização destinadas a profissionais que trabalham no domínio da inclusão social. 3.2.2. Crianças enquanto suspeitos vulneráveis Em Portugal, dependendo da idade do infrator, aplicam-se diferentes regimes jurídicos. Embora em termos de direito civil a maioridade seja atingida aos 18 anos de idade175, no direito penal está estabelecida nos 16 anos. As crianças com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos estão sujeitas a um regime específico, o Regime dos Jovens Adultos176, enquanto aquelas com idade inferior a 16 anos não podem ser criminalmente imputáveis pelos seus atos. Não obstante, a Lei Tutelar Educativa determina que, se um menor com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos praticar um ato qualificado pela lei como crime, dá lugar à aplicação de medida tutelar educativa177. Este regime pretende educar o menor e promover a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade178. Sendo assim, a medida tutelar aplicada deve refletir a gravidade do ato cometido pelo menor. Além disso, o interesse superior da criança deve ser tido em consideração na escolha da medida179. As medidas tutelares podem incluir as seguintes: privação do direito de conduzir ciclomotores ou de obter permissão para conduzir ciclomotores; reparação ao ofendido180; realização de prestações económicas ou de tarefas a favor da comunidade; imposição de regras de conduta (por exemplo, proibição de visitar determinados locais ou de adotar certos comportamentos); internamento em centro educativo (ou seja, centro de detenção); etc.181. As crianças menores de 12 anos que assumam comportamentos ou se entreguem «a atividades ou consumos que afetem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento» são tratadas de acordo com a Lei de proteção de crianças e jovens em perigo182, que apresenta um conjunto de medidas, incluindo apoio junto da família, confiança a pessoa idónea, apoio para a autonomia de vida, acolhimento familiar e acolhimento em instituição. A lei prevê uma inimputabilidade das crianças em razão de «anomalia psíquica». Nestes casos, o Ministério Público encaminha a criança para serviços de saúde mental e, se for caso disso, providencia o internamento compulsivo183. A criança pode ser obrigada a submeter-se a programas de tratamento médico, médico-psiquiátrico, médico-psicológico 174 Resolução do Conselho de Ministros n.º 103/2013, «V Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não-discriminação 2014-2017», Diário da República de 31 de dezembro de 2013. 175 Artigo 122.º, Código Civil. 176 Decreto-Lei n.º 401/82, «Regime dos Jovens Adultos», Diário da República de 23 de setembro de 1982. 177 Artigo 1.º da Lei Tutelar Educativa. 178 Artigo 2.º, ibid. 179 Artigos 6.º e 7.º, ibid. 180 Segundo o artigo 11.º da Lei Tutelar Educativa, a reparação ao ofendido pode ser feita de três formas, cabendo a decisão ao juiz de acordo com as circunstâncias específicas: a) Apresentar desculpas ao ofendido; b) Compensar economicamente o ofendido, no todo ou em parte, pelo dano patrimonial; c) Exercer, em benefício do ofendido, atividade que se conexione com o dano, sempre que for possível e adequado. 181 Artigo 4.º, ibid. 182 Artigo 3.º, n.º 2, alínea f), da Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 183 Artigo 49.º da Lei Tutelar Educativa. 37 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ ou equiparado junto de entidade ou de instituição oficial ou particular, em regime de internamento ou em regime ambulatório184. A lei prevê o direito de a criança participar e ser ouvida em todas as tomadas de decisão ou processos judiciais relativos a medidas tutelares185. A criança tem igualmente direito a ser acompanhada pelos pais, representante legal ou pessoa que tiver a sua guarda de facto, salvo decisão fundada no seu interesse, dependendo das circunstâncias específicas do caso, mediante decisão do juiz. Contudo, a lei não faz qualquer referência a direitos específicos de crianças com deficiência nem estabelece quaisquer medidas de proteção especiais a elas destinadas. Por fim, a Lei de proteção de testemunhas refere que as testemunhas especialmente vulneráveis em razão da idade ou estado de saúde têm direito ao apoio de um técnico de serviço social ou outra pessoa especialmente habilitada, incluindo durante o processo, e, se for caso disso, que lhe seja proporcionado apoio psicológico186. 3.2.3. Outros problemas específicos enfrentados por crianças com deficiência em Portugal Um estudo sobre a monitorização dos direitos das pessoas com deficiência em Portugal187, que incluiu entrevistas aprofundadas com crianças com deficiência com idades compreendidas entre os 12 e os 17 anos, recolheu relatos individuais de experiências sobre a negação e a violação de direitos durante os últimos cinco anos. O estudo conclui que as pessoas com deficiência em Portugal, incluindo crianças, continuam a enfrentar discriminação e violações dos seus direitos. Isolamento, marginalização, bem como constantes imagens negativas e situações de desrespeito, constituem as principais barreiras sociais enfrentadas pelas pessoas com deficiência. A falta de acesso ao meio edificado e aos transportes, bem como a ausência de apoio adequado para uma vida autónoma, agravam a privação dos seus direitos. O estudo monitorizou igualmente as políticas nacionais em matéria de deficiência e avaliou os principais instrumentos políticos face às normas da CDPD. Os autores concluíram que a política em matéria de deficiência em Portugal se encontra em estado de estagnação, conforme se verifica pela falta de aplicação de várias medidas da Estratégia Nacional para a Deficiência 2011-2013 e do Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade, bem como pelo atraso na adoção de uma nova estratégia. Tudo isto demonstra um forte desinvestimento na proteção dos direitos das pessoas com deficiência e, por conseguinte, também das crianças com deficiência. 184 Artigo 14.º, ibid. Artigo 45.º, ibid. 186 Artigos 26.º e 27.º da Lei n.º 93/99 de «Proteção de testemunhas», Diário da República de 14 de julho de 1999 (alterada pela Lei n.º 42/2010, Diário da República de 3 de setembro de 2010, e pela Lei n.º 29/2008, Diário da República de 4 de julho de 2008). 187 Pinto, Paula Campos et al., «Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal: http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50Relatório Holístico» (2014) disponível em 23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/151-monitoriza%C3%A7%C3%A3o-dos-direitos-das-pessoas-comdefici%C3%AAncia-em-portugal. 185 38 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ 4. AVALIAÇÃO DA APLICAÇÃO PRÁTICA DOS DIREITOS E DOS PRINCÍPIOS JURÍDICOS      4.1. PRINCIPAIS CONSTATAÇÕES A criança e, com mais frequência, os seus representantes legais geralmente recorrem primeiro aos mecanismos de apresentação de queixas e de mediação no âmbito o INR e do Provedor de Justiça antes de interporem uma ação judicial. As principais lacunas identificadas relativamente à aplicação prática dizem respeito à falta de qualidade e de quantidade de recursos, nomeadamente em escolas regulares, para executar o programa de educação inclusiva, bem como à aplicação incompleta da legislação em matéria de acessibilidade e à persistência de situações negativas e de estereótipos em relação às pessoas com deficiência. Existe um conjunto de boas práticas, incluindo a legislação que promove a educação inclusiva, o Sistema de Intervenção Precoce e a existência de redes sociais locais e de comissões de proteção de menores a nível local. Existe uma falta de dados recolhidos e desagregados de acordo com o tipo de deficiência, idade e sexo. O INR recolhe dados sobre queixas de discriminação em razão da deficiência. As recomendações envolvem a aprovação de uma nova Estratégia Nacional para a Deficiência que coordene a política em matéria de deficiência a nível nacional e reforce os mecanismos de aplicação da legislação existente, nomeadamente nos domínios da acessibilidade, direito à educação e participação social. Mecanismos de aplicação e de comunicação Os direitos das crianças com deficiência em Portugal estão assegurados através de diversos mecanismos de proteção, aplicação e comunicação, que podem ser ativados separadamente ou em conjunto por alguns autores de denúncias, a fim de proteger o interesse superior da criança. A maioria das queixas relacionadas com a violação dos direitos das crianças com deficiência é apresentada junto das seguintes organizações:  As queixas relacionadas com discriminação em razão da deficiência devem ser apresentadas ao Instituto Nacional para a Reabilitação (INR), que é o organismo público responsável pela aplicação da Lei que proíbe e pune a discriminação188. Essas queixas podem ser apresentadas diretamente ao INR através do seu sítio Web ou de um relatório escrito enviado ao INR ou a outras organizações com competência para dar início a um processo de infração (por exemplo, a Autoridade Nacional de Comunicações, o Instituto de Seguros de Portugal, a Inspeção-Geral da Educação e a Inspeção-Geral das Atividades Culturais, entre outras). Deve ser enviada ao INR uma cópia de todos os processos relacionados com discriminação em razão da deficiência, estando o INR obrigado a acompanhar essas queixas e a elaborar um relatório anual sobre todos os atos discriminatórios praticados contra pessoas com deficiência189. A lei que proíbe e pune a discriminação não refere se as crianças podem apresentar pessoalmente queixas 188 Artigo 8.º da Lei n.º 46/2006, que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. 189 Artigo 8.º, n.º 3, da Lei n.º 46/2006, que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. 39 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________   junto do INR. Além disso, o sítio Web não está especificamente direcionado para crianças e jovens. O Provedor de Justiça, que é simultaneamente, desde 1999, a Instituição Nacional de Direitos Humanos, tem por função a defesa e promoção dos direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos dos cidadãos, assegurando a justiça e a legalidade do exercício dos poderes públicos190. O Provedor de Justiça pode intervir na sequência de uma queixa formal ou por iniciativa própria, sempre que tome conhecimento de situações que possam justificar uma intervenção. Esta é independente de outros processos administrativos ou judiciais191. O Provedor de Justiça pode apresentar recomendações às entidades competentes, identificar lacunas jurídicas, emitir recomendações para a interpretação, alteração ou revogação da legislação existente, realizar visitas de verificação e inspeção e, de um modo geral, proceder a todas as investigações e inquéritos que considere necessários para salvaguardar os interesses legítimos dos cidadãos. O Provedor de Justiça possui uma Unidade da Criança, uma Unidade do Cidadão Idoso e uma Unidade do Cidadão com Deficiência, que são responsáveis por gerir queixas e desenvolver atividades para a promoção e proteção dos direitos destes grupos-alvo, disponibilizando igualmente três linhas telefónicas de apoio, dirigidas a cada um destes grupos, bem como uma página «amiga das crianças», que apenas parcialmente cumpre as normas de acessibilidade. Através destes meios, as crianças com deficiência, ou outra pessoa em seu nome, podem apresentar as suas queixas diretamente ou colocar perguntas relacionadas com os seus direitos. Podem também ser apresentadas queixas formais diretamente por correio eletrónico. A maioria das situações é resolvida através da linha de apoio, fornecendo informações e/ou remetendo os casos para os serviços adequados. Contudo, se não for obtida resposta por parte dos serviços em causa 48 horas após o encaminhamento, é aberto um processo formal que é transferido para a unidade competente do Gabinete do Provedor de Justiça. As Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) são instituições oficiais não judiciais com autonomia funcional, que visam promover os direitos das crianças e dos jovens, bem como prevenir ou eliminar situações suscetíveis de afetar o seu bem-estar e desenvolvimento. As queixas relacionadas com situações de violência, negligência ou maus tratos contra crianças com deficiência podem ser remetidas, direta ou indiretamente, para as CPCJ. Esta comunicação pode ser efetuada por uma autoridade judicial ou policial192, pelas entidades com competência em matéria de infância e juventude (ECMIJ)193 ou por qualquer pessoa que tenha conhecimento de uma situação de risco194. Neste último caso, o processo de comunicação pode ser realizado primeiramente junto das ECMIJ, das CPCJ ou diretamente junto do Ministério Público. A lei não especifica se as crianças podem ou não apresentar elas próprias uma queixa, apesar de a prática comum ser a criança denunciar primeiro a situação junto das ECMIJ, pois são os profissionais que interagem diretamente com ela (por exemplo, professores, profissionais de saúde, funcionários de serviços comunitários, entre outros), enquanto os profissionais que trabalham nas CPCJ geralmente não realizam um trabalho de proximidade e apenas intervêm junto da criança após ter sido feito o primeiro encaminhamento. 190 De acordo com o artigo 23.º da Constituição da República e o artigo 1.º do Estatuto do Provedor de Justiça. De acordo com o artigo 23.º, n.º 2, da Constituição da República e os artigos 4.º e 21.º, n.º 2, do Estatuto do Provedor de Justiça. 192 Artigo 64.º da Lei n.º 147/99 de «Proteção de crianças e jovens em perigo». 193 Artigo 65.º, ibid. 194 Artigo 66.º, ibid. 191 40 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ Na sequência de uma queixa, todas as organizações referidas supra podem realizar procedimentos de intervenção (por exemplo, a fim de clarificar a natureza da queixa, identificar de que forma é afetado o interesse superior da criança e, sempre que possível, sugerir medidas para minimizar ou ultrapassar a situação). Ao contrário do Provedor de Justiça, que pode dar início a estes procedimentos mesmo sem ter recebido uma queixa específica sempre que tome conhecimento de situações que possam justificar uma intervenção195, as CPCJ e o INR apenas podem intervir após a apresentação de uma queixa específica. Ainda assim, as suas decisões não são juridicamente vinculativas196. Por este motivo, sempre que as suas recomendações não sejam respeitadas ou se revelem insuficientes para resolver a situação, o processo pode ser remetido para uma autoridade judicial, a fim de assegurar a proteção do interesse superior da criança. De acordo com este princípio, as situações que coloquem em perigo a saúde, a segurança e o desenvolvimento da criança podem ser enviadas para o Ministério Púbico, enquanto última salvaguarda da proteção do bem-estar da criança. Da mesma forma, o Provedor de Justiça pode remeter algumas situações para o Tribunal Constitucional, a fim de confirmar se as disposições jurídicas cumprem os princípios previstos na Constituição da República. No que se refere ao direito da criança a ser ouvida e a apresentar uma queixa, todos os mecanismos anteriores permitem que a criança seja ouvida em conformidade com as disposições jurídicas referidas na secção 4.1.4. Não obstante, conforme salientado por um dos intervenientes entrevistados197, este direito só pode ser verdadeiramente respeitado se for dado à criança o apoio necessário aquando da apresentação da queixa ou da sua audiência na sequência da queixa, nomeadamente se for proporcionado apoio e mediação adequados por parte de profissionais que trabalham nessas organizações ou em organizações de proteção das crianças ou defensoras dos direitos das pessoas com deficiência. Isto raramente acontece. Na maioria dos casos, as queixas são apresentadas por familiares, pela escola ou por serviços comunitários. 4.2. Disparidades, problemas e dificuldades na aplicação A análise da situação das crianças com deficiência em Portugal revela uma disparidade significativa entre a recente evolução verificada no quadro jurídico de proteção das crianças com deficiência e a sua aplicação na prática198. Os problemas começam com o processo de formulação da lei. Os regulamentos existentes relacionados com crianças com deficiência são muitas vezes inadequados ou incompletos, falta-lhes especificações de como devem ser aplicados e dos necessários mecanismos de controlo e execução, o que conduz com frequência a discrepâncias na interpretação e aplicação das diretivas da UE pertinentes199. Estes problemas são especialmente evidentes no domínio da educação, uma área que se encontra atualmente sob uma intensa análise e críticas em Portugal, tendo sido igualmente 195 Artigo 4.º do «Estatuto do Provedor de Justiça». De acordo com o artigo 8.º da Lei n.º 46/2006, que «Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde», o artigo 11.º da Lei n.º 147/99, de «Proteção de crianças e jovens em perigo», e o artigo 3.º do «Estatuto do Provedor de Justiça». 197 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (FENACERCI). 198 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA, FENACERCI, Pais em Rede). 199 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA, FENACERCI, Pais em Rede). 196 41 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ referidos por todos os entrevistados200. No seguimento da publicação do Decreto-Lei n.º 3/2008, a maioria das crianças e dos jovens que costumavam frequentar escolas de ensino especial foi integrada em escolas regulares. Esta transição devia ser acompanhada de um conjunto de medidas concebidas para apoiar a integração, mas na realidade as atuais restrições financeiras e os problemas de articulação entre estruturas resultam na ausência de uma afetação atempada de recursos fundamentais e na inobservância das adaptações previstas pela lei sobre educação inclusiva e outros atos jurídicos (por exemplo, dimensão excessiva das turmas; atrasos consideráveis na aplicação do ensino especial e rotatividade frequente que prejudicam a estabilidade e qualidade da intervenção; falta de pessoal especializado; ausência de materiais de apoio adequados e de outros recursos; questões relativas à adaptação dos procedimentos de referenciação e avaliação)201. Esta situação foi recentemente objeto de duras críticas por parte do Conselho Nacional de Educação (CNE), que afirmou existir um claro desfasamento entre os princípios previstos no quadro jurídico em matéria de ensino especial e a qualidade e quantidade de recursos disponíveis para a sua aplicação, levando o CNE a declarar que estes problemas «representam um desperdício de recursos, mas sobretudo de tempo, essencial e irrecuperável num processo de aprendizagem, nomeadamente para alunos/as que requerem a existência de recursos e profissionais especializados. A existência destas respostas, nomeadamente no que concerne aos meios e profissionais que servem na e com a escola, em toda a extensão do ano letivo, é condição fundamental, sem a qual o princípio da inclusão não passa de mera retórica.»202. Outra preocupação expressa diz respeito à total desadequação de determinadas disposições jurídicas, nomeadamente a Portaria n.º 275-A, de 11 de setembro de 2012. Esta portaria apresenta graves problemas de aplicação, pois implica vários recursos e requisitos que, com frequência, não podem ser cumpridos pelas escolas, tais como a definição rígida das áreas disciplinares que devem ser ensinadas e a carga horária de cada disciplina203. Como tal, estes alunos ficam sem uma opção viável para o prosseguimento dos estudos. Além disso, o processo de certificação dos alunos com currículos individuais tem igualmente de ser repensado, a fim de fazer referência às competências específicas desenvolvidas ao longo do percurso escolar204. A utilização da CIF como instrumento de avaliação para determinar as necessidades educativas especiais tem sido outra questão problemática. Embora seja considerado importante para a criação de uma linguagem universal entre os vários profissionais envolvidos no apoio às crianças com deficiência, na medida em que implica uma abordagem baseada na funcionalidade, este instrumento tende a resultar na criação de Programas Educativos Individuais (PEI) padronizados, mesmo para alunos com necessidades muito diversas205. Além disso, até à data, vários profissionais ainda não dominam a linguagem e os conceitos da CIF, o que dificulta o seu entendimento e 200 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça; Fundação LIGA; FENACERCI; Pais em Rede). 201 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça; Fundação LIGA; FENACERCI; Pais em Rede); Perdigão, R.; Casas-Novas, T.; Gaspar, T., «Políticas Públicas de Educação Especial: Relatório Técnico . Conselho Nacional de Educação (2014), disponível emhttp://www.cnedu.pt/content/noticias/CNE/RelatorioTecnico_EE.pdf. 202 Grácio, Anabela, «Políticas Públicas de Educação Especial: Recomendação», Conselho Nacional de Educação (2014), disponível em http://www.cnedu.pt/content/noticias/CNE/Recomenda%C3%A7%C3%A3o_EE.pdf. 203 Grácio, Anabela, «Políticas Públicas de Educação Especial: Recomendação», Conselho Nacional de Educação (2014), disponível em http://www.cnedu.pt/content/noticias/CNE/Recomenda%C3%A7%C3%A3o_EE.pdf 204 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Pais em Rede) e Grácio, Anabela, «Políticas Públicas de Educação Especial: Recomendação», Conselho Nacional de Educação. 205 Grácio, Anabela, «Políticas Públicas de Educação Especial: Recomendação», Conselho Nacional de Educação (2014). 42 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ aplicação, gerando discrepâncias nas avaliações206. Esta situação é agravada pelo facto de não existir um sistema de recurso eficaz no domínio da educação, no qual os pais e outras partes interessadas se possam apoiar quando considerarem que o superior interesse do seu filho não foi devidamente tido em conta207. O sistema de recurso permite apenas a contestação da colocação de uma criança numa escola, mas não a avaliação dessa criança. A rejeição da matrícula ou inscrição de qualquer criança com base na incapacidade ou nas necessidades educativas especiais que manifeste é proibida por lei208. Contudo, visto que a lei refere igualmente que devem ser prestados a estas crianças os melhores cuidados possíveis, frequentemente este facto conduz a situações de rejeição atenuada, na qual as crianças são redirecionadas para outras escolas, supostamente melhor adaptadas a elas, mas que não foram as suas primeiras escolhas209. Quanto a outras questões, a criação do Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI) trouxe vantagens importantes, nomeadamente um aumento significativo do número de crianças apoiadas. Não obstante, mais uma vez este crescimento do número de beneficiários não foi acompanhado por um aumento proporcional dos recursos disponíveis, o que significa que a qualidade do apoio prestado nem sempre é a mais adequada210. A escassez de recursos adequados é especialmente prejudicial para o bem-estar de crianças com deficiências graves ou múltiplas, que têm maior necessidade de cuidados terapêuticos e apoio educativo personalizados, que muitas vezes são insuficientes devido a restrições em termos de recursos211. As crescentes restrições orçamentais tiveram igualmente um impacto nas prestações sociais diretas212, nomeadamente na atribuição do «subsídio de educação especial» ou no «subsídio por assistência a terceira pessoa». Contudo, o Provedor de Justiça afirma que nem todos os problemas relacionados com estes suplementos têm que ver com cortes orçamentais e que muitos problemas decorrem de questões de regulamentação e execução (por exemplo, falta de clareza dos regulamentos existentes relativos aos critérios de elegibilidade e aos procedimentos de candidatura; ausência de articulação entre estruturas e procedimentos burocráticos, que resulta em obstáculos adicionais para o acesso a prestações)213. Foram identificados problemas semelhantes em relação aos cuidados de saúde e ao processo de disponibilização de tecnologias de apoio214. Outro problema diz respeito à aplicação incompleta do Decreto-Lei de promoção da acessibilidade, o que resulta na persistência de barreiras no acesso ao ambiente 206 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Pais em Rede) e Grácio, Anabela, «Políticas Públicas de Educação Especial: Recomendação», Conselho Nacional de Educação (2014). 207 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Pais em Rede) e Grácio, Anabela, «Políticas Públicas de Educação Especial: Recomendação», Conselho Nacional de Educação (2014), disponível em http://www.cnedu.pt/content/noticias/CNE/Recomenda%C3%A7%C3%A3o_EE.pdf 208 Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 209 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA e Pais em Rede) e Perdigão, R.; Casas-Novas, T.; Gaspar, T., «Políticas Públicas de Educação Especial: Relatório Técnico», Conselho Nacional de Educação. 210 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA). 211 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA, FENACERCI, Pais em Rede). 212 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA, Pais em Rede). 213 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça). 214 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA). 43 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ edificado, nomeadamente a instalações escolares e de saúde, e na falta de transportes adaptados215. Por fim, as atitudes e imagens negativas por parte dos profissionais, e até mesmo das famílias, foram consideradas barreiras por alguns dos intervenientes. Muitos dos profissionais que trabalham com crianças com deficiência não possuem formação específica e adequada no domínio da deficiência216. Quanto às famílias, em resposta à vulnerabilidade adicional que enfrentam as crianças com deficiência (por exemplo, violência, maus tratos, bullying), muitas famílias ainda demonstram atitudes excessivamente protetoras e de infantilização, em especial em relação a crianças com deficiência intelectual e raparigas, o que prejudica a sua participação social e o seu desenvolvimento integral217. 4.3. Melhores práticas Apesar das limitações supramencionadas e das restrições a nível de recursos, é possível identificar um conjunto de melhores práticas relativas à proteção e promoção dos direitos das crianças com deficiência em Portugal. A existência de redes sociais que funcionam corretamente em todo o país pode ser especialmente útil para a promoção da inclusão social das crianças com deficiência218. Em Portugal, há dois tipos de estruturas que demonstraram ser particularmente úteis a este nível:  Redes locais ou nacionais de organizações públicas ou privadas (por exemplo, redes sociais em cada concelho ou comissões alargadas de proteção de menores), que promovem a discussão de vários temas pertinentes para o bem-estar e a proteção de crianças com deficiência.  Estruturas e iniciativas formais e informais para jovens, que trabalham sobre diversos temas relacionados com crianças e jovens, incluindo os direitos das crianças com deficiência (por exemplo, Parlamento dos Jovens; conselhos nacionais e municipais da juventude). Ambos os tipos de estruturas contribuem para a identificação de jovens em risco de exclusão e elaboram planos de intervenção, promovendo uma afetação de recursos mais eficaz e eficiente. Ajudam igualmente a sensibilizar para questões fundamentais e promover a solidariedade e a inclusão a nível local. No que se refere a disposições jurídicas, apesar de alguns problemas de aplicação, é amplamente reconhecido que tanto o decreto-lei sobre educação inclusiva (Decreto-Lei n.º 3/2008) como o Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI) representam passos significativos no sentido da evolução dos direitos das crianças com deficiência em Portugal219. A aplicação do SNIPI permitiu um aumento significativo do número de crianças abrangidas por programas de intervenção precoce, nomeadamente em zonas rurais, contribuindo para uma diminuição das desigualdades regionais. Da mesma forma, o decreto-lei sobre educação inclusiva contribuiu para uma redução das disparidades em termos de compreensão e práticas para a integração escolar das crianças, 215 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA, Pais em Rede). 216 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA, Pais em Rede). 217 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA, FENACERCI, Pais em Rede). 218 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (FENACERCI). 219 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA). 44 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ conduzindo a várias alterações positivas e a um maior reconhecimento do direito a uma educação inclusiva. Outro exemplo importante de uma prática promissora é o programa Significativo Azul, uma iniciativa levada a cabo pela FENACERCI e pela PSP (Polícia de Segurança Pública), que visa promover um intercâmbio de conhecimentos e experiência entre estas duas entidades sobre questões relacionadas com os direitos, as vulnerabilidades e a intervenção junto de pessoas com deficiência. Através desta parceria, ambas as organizações contribuem para aumentar a sensibilização das pessoas com deficiência para os seus direitos e os mecanismos de execução disponíveis, a fim de proporcionar um melhor acesso à proteção dos seus direitos220. 4.4. Dados e mecanismos de acompanhamento Conforme referido na secção 4.1, o Instituto Nacional para a Reabilitação (INR) é a entidade responsável pela supervisão da aplicação da Lei que proíbe e pune a discriminação221. Como tal, todas as queixas que tenham por base deficiências devem ser comunicadas ao INR. Isto implica que, apesar de várias organizações poderem tratar de queixas relacionadas com violações dos direitos das crianças com deficiência (por exemplo, INR; Provedor de Justiça; Comissões de proteção de crianças e jovens; Ministério Público), todas as queixas devem ser comunicadas ao INR, que é depois obrigado a elaborar um relatório anual de acompanhamento que compila estas informações (por exemplo, número total de queixas; objeto das queixas; situação do processo). Até 21 de novembro de 2014, ainda não tinha sido publicado o relatório de 2013, mas segundo o relatório de 2012222, publicado em março de 2013, o número de queixas quase triplicou em 2012 relativamente a 2011 (de 54 para 131), uma tendência que no relatório se considera dever-se «ao trabalho de divulgação e sensibilização deste organismo». Segundo o mesmo relatório, a maioria das queixas apresentadas em 2012 incidiram, tal como nos anos anteriores, no setor das acessibilidades, mas aumentaram igualmente as queixas no âmbito da saúde, do emprego e da educação. Contudo, estes dados não se encontram desagregados por idade, pelo que não é possível identificar quantos destes casos se referem a crianças com deficiência. Não obstante, não foi interposta qualquer ação judicial por discriminação com base na deficiência. O mesmo relatório explica que tal se poderá dever ao facto de se tratar de processos ainda em curso, mas também à falta de recursos financeiros por parte do requerente e de um sistema de proteção judicial eficaz que tenha em conta as especificidades dos requerentes com deficiência, bem como à falta de clareza na definição de «discriminação com base na deficiência» e às dificuldades da sua prova. O INR é igualmente o organismo público responsável pela aplicação da CDPD e pela recolha de dados estatísticos em matéria de deficiência. Existe uma lacuna significativa em termos de dados relacionados com a vida das crianças com deficiência. Embora os Censos 2011 tenham incluído perguntas do Washington Group para determinar dificuldades na realização de atividades do quotidiano (como indicadores para a deficiência), estas perguntas não foram aplicadas a crianças com idade inferior a seis anos. Os dados dos Censos 220 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (FENACERCI). Artigo 8.º da Lei n.º 46/2006, que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. 222 INR, «Relatório Anual – 2012 sobre A Prática de Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco Agravado de Saúde» (2013), disponível em http://www.inr.pt/content/1/1185/lei-da-nao-discriminacao. 221 45 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ demonstram que existem em Portugal 52 214 crianças entre os 5 e os 14 anos com dificuldades em pelo menos uma atividade do quotidiano (das quais 57 % são rapazes e 43 % raparigas, 45 % têm entre 5 e 9 anos de idade e 55 % têm entre 10 e 14 anos). 4.5. Recomendações Com base nas questões abordadas anteriormente, podem ser feitas algumas recomendações ao Governo português:  Aprovação de uma nova Estratégia Nacional para a Deficiência (a anterior terminou em 2013), que oriente e coordene a política em matéria de deficiência a nível nacional, nomeadamente no que se refere a todos os aspetos pertinentes para o bem-estar das crianças com deficiência223.     Reforço dos mecanismos de acompanhamento e execução das disposições jurídicas existentes no domínio da educação. Algumas opções sugeridas pelos intervenientes incluem a criação de um sistema de recurso mais eficaz, no âmbito do Ministério da Educação, com competência para rever e dar resposta a queixas no domínio da educação de forma atempada; ou a criação de uma estrutura de acompanhamento, que integre representantes dos pais, do INR, do Ministério da Educação, do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, entre outras estruturas pertinentes, capaz de acompanhar, avaliar e orientar os processos, os instrumentos e os recursos envolvidos no ensino especial224. Garantia da efetiva aplicação e execução dos regulamentos em matéria de acessibilidades, em conformidade com o princípio do desenho universal contido na CDPD e com as diretrizes específicas presentes no Decreto-Lei de promoção da acessibilidade225. Revisão da legislação existente, a fim de assegurar que todos os atos jurídicos essenciais relativos a crianças com deficiência respeitam os princípios da CDPD e da CDC. Todas as intervenções relacionadas com crianças com deficiência devem cumprir os princípios da participação e capacitação. Como tal, as crianças, as suas famílias e as organizações que as representam devem ser ouvidas e envolvidas ativamente, não só no processo de aplicação das políticas, mas também no processo da sua formulação e acompanhamento. Deve igualmente ser reforçada a participação das crianças e das suas famílias na definição dos seus planos educativos, revendo os critérios estabelecidos no Decreto-Lei relativo aos apoios especializados para uma educação inclusiva, por forma a incluir o princípio do direito da criança a ser ouvida na definição e avaliação do seu plano educativo, bem como a assegurar o envolvimento efetivo dos pais e dos alunos na elaboração do CEI (Currículo Específico Individual) e do PIT (Plano Individual de Transição), evitando uma colaboração de mera formalidade que se limita à assinatura do plano pelos pais, sem que haja uma verdadeira hipótese de compreensão, discussão e influência no plano, como acontece com frequência226. Garantia de que as atuais restrições financeiras não servem de desculpa para negligenciar os direitos fundamentais das crianças com deficiência, 223 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Pais em Rede). Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA, Pais em Rede). 225 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA, FENACERCI, Pais em Rede). 226 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA, Pais em Rede). Tal implica a revisão, nomeadamente, do Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 224 46 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________     nomeadamente o direito a uma educação inclusiva, incluindo as adaptações necessárias, em conformidade com os tratados internacionais e com a legislação nacional227 (por exemplo, integração das crianças com deficiência, sempre que possível, em turmas regulares, respeitando o limite máximo de alunos por turma e proporcionando o apoio adicional adequado)228. Revisão dos regulamentos atuais relativos à atribuição de subsídios de educação especial, a fim de clarificar os critérios de elegibilidade e as responsabilidades de cada interveniente, bem como de harmonizar os procedimentos e reduzir os encargos burocráticos para as famílias e os serviços e que existem atualmente devido a problemas de coordenação229. Revogação da Portaria n.º 275-A/2012, que remete os alunos com currículos específicos individuais (CEI) para um percurso institucional, baseado em formação funcional, bloqueando o direito a outros percursos educativos230. Realização de investigação sobre os direitos das crianças com deficiência e recolha sistemática de dados desagregados por sexo, a fim de investigar intersecções de deficiência e sexo e elaborar políticas adequadas231. Promoção de iniciativas de sensibilização e de formação especial, sobre questões de deficiência, direcionadas para diversos grupos-alvo: o Formação obrigatória, inicial e contínua, especificamente sobre deficiência, destinada a profissionais envolvidos nos cuidados prestados a crianças com deficiência, nomeadamente no contexto educativo, mas também de saúde e dos serviços sociais232; o Apoio e formação específicos para pais de crianças com deficiência, no intuito de lhes proporcionar as competências necessárias para tomarem decisões informadas sobre as necessidades dos seus filhos233; Campanhas de sensibilização sobre matérias relacionadas com violência e o risco especial enfrentado por crianças com deficiência (por exemplo, abordagem a diferentes tipos de violência e abuso e como agir nessas circunstâncias), tanto a nível nacional como da UE234. 227 CDPD; CDC; Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo». 228 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Pais em Rede) e Perdigão, R.; Casas-Novas, T.; «Políticas Públicas de Educação Especial: Relatório Técnico», Conselho Nacional de Educação. 229 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça, Fundação LIGA, Pais em Rede). 230 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Pais em Rede). 231 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (FENACERCI, Pais em Rede). 232 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Pais em Rede) e Grácio, Anabela, «Políticas Públicas de Educação Especial: Recomendação», Conselho Nacional de Educação. 233 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA, FENACERCI). 234 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Fundação LIGA, FENACERCI). 47 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ 5. CONCLUSÕES De um modo geral, os direitos das crianças com deficiência estão garantidos na legislação portuguesa, mas a aplicação prática de muitos deles continua a ser problemática. O direito à não discriminação em razão da deficiência está reconhecido e o direito a adaptações razoáveis é abordado no contexto da educação e do emprego. Além disso, embora a legislação que impõe normas de acessibilidade a novas construções e a adaptação progressiva das novas infraestruturas exista desde 1997, a aplicação dessa lei é fraca e continuam a existir muitas barreiras ao meio edificado e aos transportes públicos, criando obstáculos à participação das crianças com deficiência na vida social. O direito de as crianças expressarem a sua opinião sobre decisões que as afetam está garantido na lei geral, mas não está previsto em legislação específica em matéria de deficiência, nomeadamente no setor da educação. A violência contra crianças e pessoas vulneráveis devido a deficiência é severamente punida pelo Código Penal, mas faltam dados para determinar a sua eficácia. O acesso a assistência está assegurado, mas o nível das prestações sociais disponíveis é, de um modo geral, muito reduzido. Contudo, o Sistema de Intervenção Precoce, recentemente reorganizado no país, é uma boa prática que está a garantir um início melhor para um número crescente de crianças com deficiência ou em risco de apresentar problemas de desenvolvimento. Legislação recentemente aprovada sobre educação inclusiva previu a integração acentuada de crianças com deficiência em escolas regulares. Todavia, a maioria das escolas regulares não possui a qualidade e quantidade de recursos (técnicos e humanos) necessários para proporcionar os cuidados adequados às crianças com deficiência. Este facto compromete a qualidade da sua educação e tem como consequência que muitas crianças regressem a instituições de assistência social após concluírem a escolaridade. Em conclusão, os direitos das crianças com deficiência estão garantidos e beneficiam, de um modo geral, de uma proteção jurídica satisfatória. No entanto, existem várias lacunas, principalmente no que se refere à aplicação prática dos direitos e princípios em Portugal, o que resulta em barreiras ao pleno gozo dos seus direitos. 48 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________ REFERÊNCIAS 1. Legislação a. Direito internacional  Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.  Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. b. Direito nacional235  Constituição da República Portuguesa, 2005.  Código Civil.  Código Penal, 1995.  Lei n.º 46/2006, que «Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde».  Lei n.º 38/2004, que «Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência».  Decreto-Lei n.º 163/2006, «Regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via pública e edifícios habitacionais».  Base II, alínea c), da Lei n.º 48/90 «Lei de Bases da Saúde».  Lei n.º 49/2005, «Lei de Bases do Sistema Educativo».  Lei n.º 27/2014, «Código do Trabalho».  Lei n.º 83-A/2013, «Lei de Bases da Segurança Social».  Decreto-Lei n.º 133/97, «Prestações familiares».  Decreto-Lei n.º 70/2010, «Regras de cálculo para atribuição de prestações familiares».  Artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 113/2011, relativo a taxas moderadoras.  Decreto-Lei n.º 281/2009, «Criação de um Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância».  Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação préescolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo».  Decreto-Lei n.º 290/2009, «Programa de Apoio à Qualificação de Pessoas com Deficiência».  Lei n.º 85/2009, que «Estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 5 anos de idade».  Lei n.º 112/2009, relativa a «Violência Doméstica e Assistência às Vítimas».  Lei n.º 147/99, «Proteção de Crianças e Jovens em Perigo».  Decreto-Lei n.º 11/2008 «Regime de Execução do Acolhimento Familiar».  Lei n.º 166/99, «Lei Tutelar Educativa».  Decreto-Lei n.º 12/2008, «Proteção em Meio Natural de Vida».  Lei n.º 113/2009, «Contra a Exploração Sexual e o Abuso Sexual de Crianças».  Lei n.º 93/99 de «Proteção de testemunhas» (alterada pela Lei n.º 42/2010 e pela Lei n.º 29/2008).  Portaria n.º 142-B/2012 «Transporte não urgente de doentes».  Lei n.º 3/84, «Educação sexual e planeamento familiar».  Lei n.º 60/2009, que «Estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar».  Decreto-Lei n.º 401/82, «Regime dos Jovens Adultos». 235 A legislação está disponível em https://dre.pt/web/guest/pesquisa-avancada 49 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________ 2. Literatura  Correia, L. M. «Special education in Portugal: the new law and the ICF-CY». Procedia Social and Behavioral Sciences, 9 (2010) 1062-1068.  CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2009» (2010), disponível em http://www.cnpcjr.pt/preview_documentos.asp?r=3143&m=PDF.  CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2010» (2011), disponível em http://www.cnpcjr.pt/preview_documentos.asp?r=3453&m=PDF.  CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2011» (2012), disponível em http://www.cnpcjr.pt/preview_documentos.asp?r=3795&m=PDF.  CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2012» (2013), disponível em http://www.cnpcjr.pt/Relatorio_2012_28maio.pdf.  CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2013» (2014), disponível em http://www.cnpcjr.pt/%5CRelatorio_Avaliacao_CPCJ_2013.pdf.  FENPROF, «Estudo sobre aplicação da CIF nas escolas». Lisboa (2010) disponível em http://www.fenprof.pt/?aba=27&mid=115&cat=67&doc=4497.  INR, «Relatório Anual – 2009 sobre A Prática de Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco Agravado de Saúde» (2010), disponível em http://www.inr.pt/content/1/1185/lei-da-nao-discriminacao.  INR, «Relatório Anual – 2010 sobre A Prática de Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco Agravado de Saúde» (2011), disponível em http://www.inr.pt/content/1/1185/lei-da-nao-discriminacao.  INR, «Relatório Anual – 2011 sobre A Prática de Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco Agravado de Saúde» (2012), disponível em http://www.inr.pt/content/1/1185/lei-da-nao-discriminacao.  INR, «Relatório Anual – 2012 sobre A Prática de Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco Agravado de Saúde» (2013), disponível em http://www.inr.pt/content/1/1185/lei-da-nao-discriminacao.  Instituto da Segurança Social, I.P.: Departamento de Desenvolvimento Social e Programas/Unidade de Infância e Juventude/Núcleo de Assessoria Técnica aos Tribunais e Acolhimento Institucional, «CASA 2012: Relatório de Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens», março de 2013, disponível em http://www4.seg-social.pt/documents/10152/13326/CASA2012.  Perdigão, R.; Casas-Novas, T.; Gaspar, T., «Políticas Públicas de Educação Especial: Relatório Técnico». Conselho Nacional de Educação (2014) disponível em http://www.cnedu.pt/content/noticias/CNE/RelatorioTecnico_EE.pdf.  Perista, P. & Silva, M. Combating child abuse and neglect in Portugal (2011). Relatório apoiado pelo Programa Daphne III. Lisboa: CESIS, disponível em http://www.youthpolicy.nl/yp/downloadsyp/Daphne-report-Portugal.pdf.  Pinto, P. & Teixeira, D., «Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal: Relatório Holístico» (2014), disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/publicacoes-dosinvestigadores-oddh/item/151-monitoriza%C3%A7%C3%A3o-dos-direitos-daspessoas-com-defici%C3%AAncia-em-portugal.  Pinto, P. & Teixeira, D., «DRPI-Portugal: Relatório Final» . (2012), Lisboa, ISCSP, http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50disponível em: 23/publicacoes-dos-investigadores-oddh/item/13-estudo-piloto-drpi-portugal.  Pinto, P. e Teixeira, D., «Impacto dos Planos de Austeridade dos Governos Europeus nos Direitos das Pessoas com Deficiência: Relatório de Portugal» (2012), página 26, disponível em http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/publicacoesdos-investigadores-oddh/item/59-avaliar-o-impacto-das-medidas-de-austeridade-dos- 50 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________  governos-europeus-sobre-os-direitos-das-pessoas-com-defici%C3%AAnciarelat%C3%B3rio-de-portugal. Portugal, S. (Coord), Sena Martins, B. e Hespanha, P., «Estudo de Avaliação do Impacto dos Custos Financeiros e Sociais da Deficiência» (2010), disponível em http://www.ces.uc.pt/myces/UserFiles/livros/1097_impactocustos%20(2).pdf. 3. Outros  Resolução do Conselho de Ministros n.º 103/2013, «V Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não-discriminação 2014-2017», disponível em http://www.cig.gov.pt/planos-nacionais-areas/cidadania-e-igualdade-de-genero/.  Resolução do Conselho de Ministros n.º 9/2007, «Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade», disponível em http://www.min-saude.pt/NR/rdonlyres/2B978891A1DC-422D-AD8D-2E619BAF00A8/0/03660377.pdf.  UNICEF et al., «Alternative report to the third and fourth periodic reports of Portugal under the Convention on the Rights of the Child», sem data, disponível em http://tbinternet.ohchr.org/_layouts/TreatyBodyExternal/SessionsList.aspx?Treaty=CRC    . Ordem dos Advogados, «Informação sobre o Superior Interesse da Criança» (2009), disponível em http://www.oa.pt/cd/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?sidc=31634&idc=8351&id sc=21852&ida=75761. «Código Deontológico da Ordem dos Médicos», disponível em https://www.ordemdosmedicos.pt/send_file.php?tid=ZmljaGVpcm9z&did=c06d06da966 6a219db15cf575aff2824. «Estatuto do Provedor de Justiça», Lei n.º 9/91, de 9 de abril de 1991 (alterada pela Lei n.º 30/96, de 14 de agosto de 1996, pela Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro de 2005, e pela Lei n.º 17/2013 de 18 de fevereiro de 2013), disponível em http://www.provedor-jus.pt/?idc=81&idi=15378. 51 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ ANEXO 1 – QUADRO DE SÍNTESE Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Interesse superior da criança CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA Artigo 36.º Família, casamento e filiação Aplicação incompleta Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à O princípio pode encontrar-se no manutenção e educação dos filhos. quadro jurídico português, 2. Os filhos nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objeto de nomeadamente no que se refere à qualquer discriminação e a lei ou as repartições oficiais não podem usar designações legislação sobre separação dos pais, discriminatórias relativas à filiação. responsabilidades parentais, privação do ambiente familiar e adoção. 3. Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos. Contudo, não é referido explicitamente 4. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram no contexto da legislação específica em os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. matéria de deficiência, nomeadamente 5. A adoção é regulada e protegida nos termos da lei, a qual deve estabelecer formas na legislação que estabelece a base céleres para a respetiva tramitação. jurídica do sistema de reabilitação português, o Sistema de Intervenção Artigo 69.º Precoce e a prestação de apoio para Infância facilitar a educação inclusiva. Por este 1. As crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu motivo, a aplicação é avaliada como desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de incompleta. discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. Além disso, existem algumas lacunas 2. O Estado assegura especial proteção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer na aplicação deste princípio, no que se forma privadas de um ambiente familiar normal. refere a: 1. 52 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 3. É proibido, nos termos da lei, o trabalho de menores em idade escolar.   CÓDIGO CIVIL Artigo 1887.º-A Convívio com irmãos e ascendentes Os pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com os irmãos e ascendentes. Artigo 1776.º-A Acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais 1. Quando for apresentado acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais relativo a filhos menores, o processo é enviado ao Ministério Público, para que este se pronuncie sobre o acordo no prazo de 30 dias. 2. Caso o Ministério Público considere que o acordo não acautela devidamente os interesses dos menores, podem os requerentes alterar o acordo em conformidade ou apresentar novo acordo, sendo neste último caso dada nova vista ao Ministério Público. Artigo 1901.º Responsabilidades parentais na constância do matrimónio 1. Na constância do matrimónio, o exercício das responsabilidades parentais pertence a ambos os pais. 2. Os pais exercem as responsabilidades parentais de comum acordo e, se este faltar em questões de particular importância, qualquer deles pode recorrer ao tribunal, que tentará a conciliação. 3. Se a conciliação referida no número anterior não for possível, o tribunal ouvirá o filho, antes de decidir, salvo quando circunstâncias ponderosas o desaconselhem. Artigo 1906.º Exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, 53 Falta de clarificação do conceito e do que implica; Grande preocupação em encontrar soluções rápidas, em vez de soluções melhor adaptadas à complexidade dos assuntos em causa. Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional declaração de nulidade ou anulação do casamento 1. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio... 2. Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores. 3. … 4. … 5. O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro. 6. … 7. O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles. Artigo 1915.º Inibição do exercício das responsabilidades parentais 1. A requerimento do Ministério Público, de qualquer parente do menor ou de pessoa a cuja guarda ele esteja confiado, de facto ou de direito, pode o tribunal decretar a inibição do exercício das responsabilidades parentais quando qualquer dos pais infrinja culposamente os deveres para com os filhos, com grave prejuízo destes, ou quando, por inexperiência, enfermidade, ausência ou outras razões, não se mostre em condições de cumprir aqueles deveres. 2. A inibição pode ser total ou limitar-se à representação e administração dos bens dos filhos; pode abranger ambos os progenitores ou apenas um deles e referir-se a todos os filhos ou apenas a algum ou alguns. 54 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 3. … Artigo 1918.º Perigo para a segurança, saúde, formação moral e educação do filho Quando a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação de um menor se encontrem em perigo e não seja caso de inibição do exercício das responsabilidades parentais, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer das pessoas indicadas no nº 1 do artigo 1915.º, decretar as providências adequadas, designadamente confiá-lo a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência. Artigo 1919.º Exercício das responsabilidades parentais enquanto se mantiver a providência 1. Quando tiver sido decretada alguma das providências referidas no artigo anterior, os pais conservam o exercício das responsabilidades parentais em tudo o que com ela se não mostre inconciliável. 2. Se o menor tiver sido confiado a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência, será estabelecido um regime de visitas aos pais, a menos que, excecionalmente, o interesse do filho o desaconselhe. Artigo 1974.º Requisitos gerais [para adoção] 1. A adoção visa realizar o superior interesse da criança e será decretada quando apresente reais vantagens para o adotando, se funde em motivos legítimos, não envolva sacrifício injusto para os outros filhos do adotante e seja razoável supor que entre o adotante e o adotando se estabelecerá um vínculo semelhante ao da filiação. 2. … Artigo 1978.º Confiança com vista a futura adoção 1. Com vista a futura adoção, o tribunal pode confiar o menor a casal, a pessoa singular ou a instituição quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos 55 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações: a) Se o menor for filho de pais incógnitos ou falecidos; b) Se tiver havido consentimento prévio para a adoção; c) Se os pais tiverem abandonado o menor; d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento do menor; e) Se os pais do menor acolhido por um particular ou por uma instituição tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança. 2. Na avaliação das situações descritas supra, o tribunal deve, em primeiro lugar, respeitar os direitos e o superior interesse da criança. Lei n.º 147/99 Proteção de crianças e jovens em perigo Artigo 4.º Princípios orientadores da intervenção A intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo obedece aos seguintes princípios: a) Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; b) c) d) e) f) g) h) ... i) Audição obrigatória e participação - a criança e o jovem, em separado ou na companhia dos pais ou de pessoa por si escolhida, bem como os pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção. 56 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Lei n.º 166/99 Lei Tutelar Educativa 7 - Nos casos previstos nos n.os 4 e 6 [menores com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos que tenham praticado facto qualificado pela lei penal como crime] é aplicável a medida que concretamente se mostre mais favorável ao interesse educativo do menor, tendo em conta a gravidade do facto e a necessidade de educação do menor para o direito manifestada na prática do facto e subsistente no momento da decisão. Lei n.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) não refere especificamente o princípio do superior interesse da criança com deficiência Decreto-Lei n.º 281/2009 Criação de um Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância não refere especificamente o princípio do superior interesse da criança com deficiência Decreto-Lei n.º 3/2008 Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo não refere especificamente o princípio do superior interesse da criança com deficiência Não discriminação  Geral Aplicação incompleta CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA Artigo 13.º Princípio da igualdade 1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 57 A proibição da discriminação em razão da deficiência está prevista na Lei que proíbe e pune a discriminação (Lei n.º 46/2006 de 28 de agosto) e na Lei Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual. Artigo 26.º Outros direitos pessoais 1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação. 2, 3, 4, Artigo 71.º Cidadãos portadores de deficiência 1. Os cidadãos portadores de deficiência física ou mental gozam plenamente dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição, com ressalva do exercício ou do cumprimento daqueles para os quais se encontrem incapacitados. 2. O Estado obriga-se a realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias, a desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com eles e a assumir o encargo da efetiva realização dos seus direitos, sem prejuízo dos direitos e deveres dos pais ou tutores. 3. … 236 em matéria de deficiência (Lei n.º 38/2004 de 18 de agosto). Naquele estatuto jurídico, são mencionados os direitos específicos das crianças com deficiência no que se refere ao acesso à educação (artigo 4.º, alíneas h) e i)). A discriminação direta e indireta com base na deficiência é proibida. Os direitos e as vulnerabilidades específicas das raparigas com deficiência não são mencionados de todo, nem é reconhecido que podem ser sujeitas a discriminação múltipla. A Lei que proíbe e pune a discriminação limita o princípio de «adaptações razoáveis» a situações apenas relacionadas com o trabalho (artigo 5.º), mas a Lei de Bases do Sistema Educativo prevê «adaptações razoáveis» no contexto da conceção dos edifícios escolares e dos equipamentos e no Decreto-Lei de promoção da acessibilidade236, que estabelece normas de acessibilidade Decreto-Lei n.º 163/2006, relativo ao regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via pública e edifícios habitacionais. 58 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Artigo 69.º Infância 1. As crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. 2. O Estado assegura especial proteção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal. 3. É proibido, nos termos da lei, o trabalho de menores em idade escolar. Lei n.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) Artigo 6.º Princípio da não discriminação 1. A pessoa não pode ser discriminada, direta ou indiretamente, por ação ou omissão, com base na deficiência. Lei n.º 46/2006 Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde Artigo 1.º Objeto 1 — A presente lei tem por objeto prevenir e proibir a discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência, sob todas as suas formas, e sancionar a prática de atos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros, por quaisquer pessoas, em 59 aos edifícios públicos e via pública, o princípio das adaptações razoáveis é utilizado para justificar exceções às regras de acessibilidade, que são permitidas «quando as obras necessárias à sua execução sejam desproporcionadamente difíceis, requeiram a aplicação de meios económico-financeiros desproporcionados ou não disponíveis». Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional razão de uma qualquer deficiência. … 2. Artigo 4.º Práticas discriminatórias Consideram-se práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência as ações ou omissões, dolosas ou negligentes, que, em razão da deficiência, violem o princípio da igualdade, designadamente: a) A recusa de fornecimento ou o impedimento de fruição de bens ou serviços; b) c) … d) A recusa ou o impedimento da utilização e divulgação da língua gestual; e) A recusa ou a limitação de acesso ao meio edificado ou a locais públicos ou abertos ao público; f) A recusa ou a limitação de acesso aos transportes públicos, quer sejam aéreos, terrestres ou marítimos; g) A recusa ou a limitação de acesso aos cuidados de saúde prestados em estabelecimentos de saúde públicos ou privados; h) A recusa ou a limitação de acesso a estabelecimentos de ensino, públicos ou privados, assim como a qualquer meio de compensação/apoio adequado às necessidades específicas dos alunos com deficiência; i) A constituição de turmas ou a adoção de outras medidas de organização interna nos estabelecimentos de ensino público ou privado, segundo critérios de discriminação em razão da deficiência, salvo se tais critérios forem justificados pelos objetivos referidos no n.º 2 do artigo 2.º. j) … l) A adoção de ato em que, publicamente ou com intenção de ampla divulgação, pessoa singular ou coletiva, pública ou privada, emita uma declaração ou transmita uma informação em virtude da qual um grupo de pessoas seja ameaçado, insultado ou aviltado por motivos de discriminação em razão da deficiência; m) A adoção de medidas que limitem o acesso às novas tecnologias. 60 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Decreto-Lei n.º 3/2008 Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo (retificado pela Lei n.º 21/2008 de 12 de maio) Artigo 2.º Princípios orientadores 1 — A educação especial prossegue, em permanência, os princípios da justiça e da solidariedade social, da não discriminação e do combate à exclusão social, da igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativo, da participação dos pais e da confidencialidade da informação. 2 — Nos termos do disposto no número anterior, as escolas ou os agrupamentos de escolas, os estabelecimentos de ensino particular com paralelismo pedagógico, as escolas profissionais, direta ou indiretamente financiados pelo Ministério da Educação (ME), não podem rejeitar a matrícula ou a inscrição de qualquer criança ou jovem com base na incapacidade ou nas necessidades educativas especiais que manifestem. 3 — As crianças e jovens com necessidades educativas especiais de caráter permanente gozam de prioridade na matrícula, tendo o direito, nos termos do presente decreto-lei, a frequentar o jardim-de-infância ou a escola nos mesmos termos das restantes crianças. 4 — As crianças e os jovens com necessidades educativas especiais de caráter permanente têm direito ao reconhecimento da sua singularidade e à oferta de respostas educativas adequadas. … Lei n.º 48/90 LEI DE BASES DA SAÚDE Base II Política de saúde 1. A política de saúde tem âmbito nacional e obedece às diretrizes seguintes: a)… b) É objetivo fundamental obter a igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados 61 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional  de saúde, seja qual for a sua condição económica e onde quer que vivam, bem como garantir a equidade na distribuição de recursos e na utilização de serviços; c) São tomadas medidas especiais relativamente a grupos sujeitos a maiores riscos, tais como as crianças, os adolescentes, as grávidas, os idosos, os deficientes, os toxicodependentes e os trabalhadores cuja profissão o justifique; d) e) f) g) h) i) … Oculta (discriminação indireta) Lei n.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) Artigo 6.º Princípio da não discriminação 1. … 2. A pessoa com deficiência deve beneficiar de medidas de ação positiva com o objetivo de garantir o exercício dos seus direitos e deveres corrigindo uma situação factual de desigualdade que persista na vida social. Lei n.º 46/2006 Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde Artigo 3.º Conceitos Para efeitos da presente lei, entende-se por: a) b) c) … d) «Discriminação positiva» medidas destinadas a garantir às pessoas com deficiência o 62 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional exercício ou o gozo, em condições de igualdade, dos seus direitos.  Sexo Resolução do Conselho de Ministros n.º 103/2013 Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não-discriminação 2014 -2017 33) Promover ações de prevenção do fenómeno da discriminação de raparigas e mulheres com deficiência [4 por ano]  Acessibilidade Lei n.º 46/2006 de 28 de agosto Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde Artigo 4.º Práticas discriminatórias Consideram-se práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência as ações ou omissões, dolosas ou negligentes, que, em razão da deficiência, violem o princípio da igualdade, designadamente: a) A recusa de fornecimento ou o impedimento de fruição de bens ou serviços; b) c) … d) A recusa ou o impedimento da utilização e divulgação da língua gestual; e) A recusa ou a limitação de acesso ao meio edificado ou a locais públicos ou abertos ao público; f) A recusa ou a limitação de acesso aos transportes públicos, quer sejam aéreos, terrestres ou marítimos; g) … h) A recusa ou a limitação de acesso a estabelecimentos de ensino, públicos ou privados, assim como a qualquer meio de compensação/apoio adequado às necessidades específicas dos alunos 63 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional com deficiência; i) j) l) … m) A adoção de medidas que limitem o acesso às novas tecnologias. Lei n.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) Artigo 3.º Objetivos Constituem objetivos da presente lei a realização de uma política global, integrada e transversal de prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência, através, nomeadamente, da: a) b) c) d) Promoção de uma sociedade para todos através da eliminação de barreiras e da adoção de medidas que visem a plena participação da pessoa com deficiência. Artigo 24.º Prevenção 1— … 2— O Estado deve promover, direta ou indiretamente, todas as ações necessárias à efetivação da prevenção, nomeadamente de informação e sensibilização sobre: a) Acessibilidades … Artigo 32.º Direito à habitação e urbanismo Compete ao Estado adotar, mediante a elaboração de um plano nacional de promoção da acessibilidade, tendo em atenção os princípios do desenho universal: 64 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional a) Medidas específicas necessárias para assegurar o direito à habitação da pessoa com deficiência, em articulação com as autarquias locais; b) Medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência, nomeadamente aos espaços interiores e exteriores, mediante a eliminação de barreiras arquitetónicas na construção, ampliação e renovação. Artigo 33.º Direito aos transportes Compete ao Estado adotar, mediante a elaboração de um plano nacional de promoção da acessibilidade, medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência, nomeadamente à circulação e utilização da rede de transportes públicos, de transportes especiais e outros meios de transporte apropriados, bem como a modalidades de apoio social. Artigo 43.º Informação 1 — O Estado e as demais entidades públicas e privadas devem colocar à disposição da pessoa com deficiência, em formato acessível, designadamente em braille, carateres ampliados, áudio, língua gestual, ou registo informático adequado, informação sobre os serviços, recursos e benefícios que lhes são destinados. 2 — Os órgãos de comunicação social devem disponibilizar a informação de forma acessível à pessoa com deficiência bem como contribuir para a sensibilização da opinião pública, tendo em vista a eliminação das práticas discriminatórias baseadas na deficiência. Artigo 44.º Sociedade da informação Compete ao Estado adotar, mediante a elaboração de um plano nacional de promoção da acessibilidade, medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência à sociedade de informação. 65 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Decreto-Lei n.º 163/2006 de 8 de agosto Regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via pública e edifícios habitacionais Artigo 2.º Âmbito de aplicação … 2— As normas técnicas aplicam-se também aos seguintes edifícios, estabelecimentos e equipamentos de utilização pública e via pública: a) Passeios e outros percursos pedonais pavimentados; b) c) ... d) Centros de saúde, centros de enfermagem, centros de diagnóstico, hospitais, maternidades, clínicas, postos médicos em geral, centros de reabilitação, consultórios médicos, farmácias e estâncias termais; e) Estabelecimentos de educação pré-escolar e de ensino básico, secundário e superior, centros de formação, residenciais e cantinas; f) Estações ferroviárias e de metropolitano, centrais de camionagem, gares marítimas e fluviais, aerogares de aeroportos e aeródromos, paragens dos transportes coletivos na via pública, postos de abastecimento de combustível e áreas de serviço; g) Passagens de peões desniveladas, aéreas ou subterrâneas, para travessia de vias férreas, vias rápidas e autoestradas; h) i)... j) Instalações sanitárias de acesso público; l) Igrejas e outros edifícios destinados ao exercício de cultos religiosos; m) Museus, teatros, cinemas, salas de congressos e conferências e bibliotecas públicas, bem como outros edifícios ou instalações destinados a atividades recreativas e socioculturais; n)... 66 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional o) Instalações desportivas, designadamente estádios, campos de jogos e pistas de atletismo, pavilhões e salas de desporto, piscinas e centros de condição física, incluindo ginásios e clubes de saúde; p) Espaços de recreio e lazer, nomeadamente parques infantis, parques de diversões, jardins, praias e discotecas; q) r) s)... 3— As normas técnicas sobre acessibilidades aplicam-se ainda aos edifícios habitacionais. Desenvolvimento das capacidades da criança CÓDIGO CIVIL Artigo 1878.º 1. ... 2. Os filhos devem obediência aos pais; estes, porém, de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA Artigo 69.º Infância 1. As crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. (…) DECRETO-LEI N.º 281/2009 Criação de um Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância Artigo 4.º Objetivos 67 Aplicação incompleta A expressão «desenvolvimento das capacidades da criança» decorre do inglês «evolving capacities of the child», mas não constitui uma tradução direta para português e, por conseguinte, tem sido traduzida e interpretada pelo direito e pela política portugueses de várias formas. A maior parte da legislação em matéria de proteção de menores aborda esta questão em termos incompletos, referindo-se geralmente à necessidade de promover «o desenvolvimento integral» da criança, sem nunca definir o conceito. Além disso, em muitos casos este princípio é incluído sem qualquer referência à necessidade de Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional O SNIPI tem os seguintes objetivos: ter em consideração o 1. Assegurar às crianças a proteção dos seus direitos e o desenvolvimento das suas desenvolvimento das capacidades da capacidades, através de ações de IPI em todo o território nacional. criança e a sua autonomia crescente. (…) LEI N.º 147/99 Proteção de crianças e jovens em perigo Artigo 1.º Objeto O presente diploma tem por objeto a promoção dos direitos e a proteção das crianças e dos jovens em perigo, por forma a garantir o seu bem-estar e desenvolvimento integral. Artigo 18.º Competência da comissão alargada 1. (...) 2. São competências da comissão alargada: a) (...) b) Promover ações e colaborar com as entidades competentes tendo em vista a deteção dos factos e situações que, na área da sua competência territorial, afetem os direitos e interesses da criança e do jovem, ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação ou educação ou se mostrem desfavoráveis ao seu desenvolvimento e inserção social; c) Informar e colaborar com as entidades competentes no levantamento das carências e na identificação e mobilização dos recursos necessários à promoção dos direitos, do bem-estar e do desenvolvimento integral da criança e do jovem; d) e) f) g) h) (...) Artigo 34.º Finalidade [das medidas de proteção] 68 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional As medidas de promoção dos direitos e de proteção das crianças e dos jovens em perigo, adiante designadas por medidas de promoção e proteção, visam: a) (...) b) Proporcionar-lhes as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral; c) (...) DECRETO-LEI N.º 11/2008 Regime de Execução do Acolhimento Familiar Artigo 2.º Definição e objetivos do acolhimento familiar Conforme o disposto no artigo 46.º do anexo à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, o acolhimento familiar consiste na atribuição da confiança da criança ou do jovem a uma pessoa singular ou a uma família, habilitadas para o efeito, e visa a integração da criança ou do jovem em meio familiar e a prestação de cuidados adequados às suas necessidades e bem-estar e a educação necessária ao seu desenvolvimento integral. Artigo 6.º Revisão da medida A revisão da medida, prevista no artigo 62.º do anexo à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, pressupõe a avaliação da situação atual da criança ou do jovem e os resultados do processo da sua execução. Para efeitos da avaliação referida no número anterior, a equipa técnica deve considerar, nomeadamente: 1. A satisfação das necessidades básicas de alimentação, higiene, saúde, afeto e conforto da criança ou do jovem; 2. A sua estabilidade emocional; 69 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 3. O cumprimento do plano de escolaridade, orientação vocacional, formação profissional e ocupação dos tempos livres, no respeito pela individualidade, iniciativa e interesses da criança ou do jovem; 4. O cumprimento do plano de cuidados de saúde e de orientação psicopedagógica; 5. A opinião da criança ou do jovem, dos pais, do representante legal ou da pessoa que tenha a guarda de facto, e da pessoa ou da família a quem tenha sido atribuída, em acolhimento familiar, a confiança da criança ou do jovem; 6. A integração social e comunitária da criança e da família natural; 7. Os sinais concretos da evolução da capacidade da família natural para a integração no seu seio, da criança ou do jovem, em termos de garantir a satisfação das necessidades do seu desenvolvimento integral. Artigo 21.º Obrigações das famílias de acolhimento 1. Constituem obrigações das famílias de acolhimento: 2. Atender, prioritariamente, aos interesses e direitos da criança e do jovem; 3. Orientar e educar a criança ou jovem com diligência e afetividade, contribuindo para o seu desenvolvimento integral. DECRETO-LEI N.º 3/2008 Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo Artigo 1.º 70 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Objeto e âmbito 1. … 2. A educação especial tem por objetivos a inclusão educativa e social, o acesso e o sucesso educativo, a autonomia, a estabilidade emocional, bem como a promoção da igualdade de oportunidades, a preparação para o prosseguimento de estudos ou para uma adequada preparação para a vida pós-escolar ou profissional. LEI N.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) Artigo 10.º Princípio da globalidade A pessoa com deficiência tem direito aos bens e serviços necessários ao seu desenvolvimento ao longo da vida. Artigo 11.º Princípio da qualidade A pessoa com deficiência tem o direito à qualidade dos bens e serviços de prevenção, habilitação e reabilitação, atendendo à evolução da técnica e às necessidades pessoais e sociais. (…) Artigo 25.º Habilitação e reabilitação A habilitação e a reabilitação são constituídas pelas medidas, nomeadamente nos domínios do emprego, trabalho e formação, consumo, segurança social, saúde, habitação e urbanismo, transportes, educação e ensino, cultura e ciência, sistema fiscal, desporto e tempos livres, que tenham em vista a aprendizagem e o desenvolvimento de aptidões, a autonomia e a qualidade de vida da pessoa com deficiência. (…) 71 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional O direito da criança a ser ouvida/direito a participar CÓDIGO CIVIL Artigo 1878.º ... 3. ... 4. Os filhos devem obediência aos pais; estes, porém, de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida. LEI N.º 147/99 Proteção de crianças e jovens em perigo Artigo 4.º Princípios orientadores da intervenção A intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo obedece aos seguintes princípios: a), b), c), d), e), f), g) … h) Obrigatoriedade da informação - a criança e o jovem, os pais, o representante legal ou a pessoa que tenha a sua guarda de facto têm direito a ser informados dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa; i) Audição obrigatória e participação - - a criança e o jovem, em separado ou na companhia dos pais ou de pessoa por si escolhida, bem como os pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção; Aplicação incompleta O direito de a criança ser ouvida em todas as decisões que a afetem encontra-se claramente expresso na maioria dos estatutos jurídicos. Contudo, este direito nem sempre é respeitado, sob diversos pretextos (por exemplo, o risco de que ouvir a criança em processos de guarda ou de proteção possa voltar a traumatizá-la; ou o risco de a criança ser manipulada por adultos). Além disso, este princípio está totalmente ausente do Decreto-Lei n.º 3/2008237, que estabelece os apoios especializados para uma educação inclusiva. De facto, quando se analisa quem deve ser consultado aquando da elaboração do programa educativo individual da criança, o artigo 10.º refere que deve ser criado «conjunta e obrigatoriamente» por uma variedade de intervenientes (ou seja, professores, encarregado de 237 Decreto-Lei n.º 3/2008, «Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo», Diário da República de 7 de janeiro de 2008, disponível em: http://legislacao.min-edu.pt/np4/np3content/?newsId=1530&fileName=decreto_lei_3_2008.pdf. 72 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional j)… educação, outros profissionais), mas omite completamente a necessidade de Artigo 9.º consultar a criança, o que se encontra Consentimento em clara violação do princípio da A intervenção das comissões de proteção das crianças e jovens depende do consentimento participação, conforme previsto tanto expresso dos seus pais, do representante legal ou da pessoa que tenha a guarda de facto, na CDC como na CDPD. consoante o caso. Artigo 10.º Não oposição da criança e do jovem 1. A intervenção das entidades referidas nos artigos 7.º e 8.º depende da não oposição da criança ou do jovem com idade igual ou superior a 12 anos. 2. A oposição da criança com idade inferior a 12 anos é considerada relevante de acordo com a sua capacidade para compreender o sentido da intervenção. Artigo 84.º Audição da criança e do jovem 1. As crianças e os jovens com mais de 12 anos, ou com idade inferior quando a sua capacidade para compreender o sentido da intervenção o aconselhe, são ouvidos pela comissão de proteção ou pelo juiz sobre as situações que deram origem à intervenção e relativamente à aplicação, revisão ou cessação de medidas de promoção e proteção. 2. A criança ou o jovem tem direito a ser ouvido individualmente ou acompanhado pelos pais, 73 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional pelo representante legal, por advogado da sua escolha ou oficioso ou por pessoa da sua confiança. Artigo 86.º Informação e assistência 1. O processo deve decorrer de forma compreensível para a criança ou jovem, considerando a idade e o grau de desenvolvimento intelectual e psicológico. 2. … Artigo 91.º Procedimentos urgentes na ausência do consentimento 1. Quando exista perigo atual ou iminente para a vida ou integridade física da criança ou do jovem e haja oposição dos detentores do poder paternal ou de quem tenha a guarda de facto, qualquer das entidades referidas no artigo 7.º ou as comissões de proteção tomam as medidas adequadas para a sua proteção imediata e solicitam a intervenção do tribunal ou das entidades policiais. LEI N.º 112/2009 Violência Doméstica e Assistência às Vítimas Artigo 9.º Princípio do consentimento 1. Sem prejuízo do disposto no Código de Processo Penal, qualquer intervenção de apoio à vítima 74 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional deve ser efetuada após esta prestar o seu consentimento livre e esclarecido. 2. A intervenção de apoio específico, nos termos da presente lei, ao jovem vítima de violência doméstica, com idade igual ou superior a 16 anos, depende somente do seu consentimento. 3. A intervenção de apoio específico, nos termos da presente lei, à criança ou jovem vítima de violência doméstica, com idade inferior a 16 anos, depende do consentimento de representante legal, ou na sua ausência ou se este for o agente do crime, da entidade designada pela lei e do consentimento da criança ou jovem com idade igual ou superior a 12 anos. 4. O consentimento da criança ou jovem com idades compreendidas entre os 12 e os 16 anos é bastante para legitimar a intervenção de apoio específico nos termos da presente lei, caso as circunstâncias impeçam a receção, em tempo útil, de declaração sobre o consentimento de representante legal, ou na sua ausência ou se este for o agente do crime, da entidade designada pela lei. 5. A criança ou jovem vítima de violência doméstica, com idade inferior a 12 anos, tem o direito a pronunciar-se, em função da sua idade e grau de maturidade, sobre o apoio específico nos termos da presente lei. 6. A vítima pode, em qualquer momento, revogar livremente o seu consentimento. 7. O disposto no presente artigo não prejudica os procedimentos de urgência previstos nos artigos 91.º e 92.º da Lei de Proteção das Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro. 75 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Artigo 10.º Proteção da vítima que careça de capacidade para prestar o seu consentimento 1. Fora do âmbito do processo penal, qualquer intervenção de apoio a vítima que careça de capacidade para prestar o seu consentimento apenas poderá ser efetuada em seu benefício direto. 2. … 3. A vítima em causa deve, na medida do possível, participar no processo de autorização. Lei n.º 166/99 LEI TUTELAR EDUCATIVA Artigo 45.º Direitos do menor 2. Em qualquer fase do processo, o menor tem especialmente direito a: a) Ser ouvido, oficiosamente ou quando o requerer, pela autoridade judiciária; b), c), d), e), f), g) … h) Ser informado dos direitos que lhe assistem; i) … 4. Os direitos referidos nas alíneas f) e h) do n.º 2 podem ser exercidos, em nome do menor, pelos pais, representante legal, pessoa que tenha a sua guarda de facto ou defensor. DECRETO-LEI N.º 11/2008 Regime de Execução do Acolhimento Familiar Artigo 24.º Direitos e deveres da criança ou do jovem 1. A criança ou o jovem com idade superior a 12 anos, ou de idade inferior mas com 76 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional maturidade para compreender o sentido da intervenção, tem direito: a) A ser ouvida pela instituição de enquadramento sobre o processo de escolha da família de acolhimento; b) A ser ouvida pela instituição de enquadramento no âmbito do processo de elaboração do plano de intervenção e a nele participar. 2. Em todo o procedimento da execução da medida, a criança ou o jovem tem direito ao respeito pela intimidade e reserva da vida privada e, de acordo com o seu grau de maturidade, o direito de ser ouvida e o direito e o dever de participar, colaborando na execução do plano de intervenção. DECRETO-LEI N.º 12/2008 Proteção em Meio Natural de Vida Artigo 22.º Direitos da criança ou jovem 1. A criança ou o jovem quando lhe seja aplicada uma medida de apoio junto dos pais de apoio junto de outro familiar ou de confiança a pessoa idónea tem direito: a) A ser ouvido e a participar em todos os atos relacionados com a execução da medida, de acordo com a sua capacidade para entender o sentido da intervenção; b) A ser ouvido pela comissão de proteção ou pelo tribunal que aplicou a medida, sempre que o requeira e o seu grau de maturidade o permita, podendo fazer-se acompanhar pelos pais, representante legal, pessoa que tenha a guarda de facto ou pessoa da sua confiança; 77 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional c) A receber a proteção e educação que garanta o desenvolvimento integral da sua personalidade e suas potencialidades, sendo-lhe assegurada a prestação dos cuidados de saúde, formação escolar, vocacional e profissional e a participação em atividades culturais, desportivas e recreativas, de acordo com as suas motivações e interesses; d) e) … LEI N.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) Artigo 9.º Princípio da participação A pessoa com deficiência tem o direito e o dever de participar no planeamento, desenvolvimento e acompanhamento da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência. Artigo 40.º Participação A participação é constituída pelas medidas específicas necessárias para assegurar a participação da pessoa com deficiência, ou respetivas organizações representativas, nomeadamente na elaboração da legislação sobre deficiência, execução e avaliação das políticas referidas na presente lei, de modo a garantir o seu envolvimento em todas as situações da vida e da sociedade em geral. DECRETO-LEI N.º 3/2008 Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo Artigo 10.º 78 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Elaboração do programa educativo individual 1. Na educação pré-escolar e no 1.º ciclo do ensino básico, o programa educativo individual é elaborado, conjunta e obrigatoriamente, pelo docente do grupo ou turma, pelo docente de educação especial, pelos encarregados de educação e sempre que se considere necessário, pelos serviços referidos na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 6.º, sendo submetido à aprovação do conselho pedagógico e homologado pelo conselho executivo. 2. Nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e no ensino secundário e em todas as modalidades não sujeitas a monodocência, o programa educativo individual é elaborado pelo diretor de turma, pelo docente de educação especial, pelos encarregados de educação e sempre que se considere necessário pelos serviços referidos na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 6.º, sendo submetido à aprovação do conselho pedagógico e homologado pelo conselho executivo. 3. No caso dos alunos surdos com ensino bilingue deve também participar na elaboração do programa educativo individual um docente surdo de LGP. (Nota: (O direito de a criança ser ouvida está totalmente ausente deste diploma) Direito a não ser objeto de violência CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA Artigo 69.º Infância 2. As crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. CÓDIGO PENAL Artigo 152.º Violência doméstica 1. Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais: a) b), c) … 79 Aplicação incompleta Portugal reconhece claramente o direito da criança a não ser objeto de violência, através de um conjunto de disposições jurídicas. Todavia, foram relatadas importantes falhas na aplicação da legislação existente. Além disso, o quadro jurídico existente não reflete a vulnerabilidade adicional enfrentada por raparigas e crianças com deficiência. Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional d) A pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. 2. No caso previsto no número anterior, se o agente praticar o facto contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima é punido com pena de prisão de dois a cinco anos. 3. Se dos factos previstos no n.º 1 resultar: a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de dois a oito anos; b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de três a dez anos. 4. … 5. … 6. Quem for condenado por crime previsto neste artigo pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício do poder paternal, da tutela ou da curatela por um período de um a dez anos. Artigo 152.º-A Maus-tratos 1. Quem, tendo ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direção ou educação ou a trabalhar ao seu serviço, pessoa menor ou particularmente indefesa, 80 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez, e: a) Lhe infligir, de modo reiterado ou não, maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, ou a tratar cruelmente; b) A empregar em atividades perigosas, desumanas ou proibidas; ou c) A sobrecarregar com trabalhos excessivos; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. 2. Se dos factos previstos no número anterior resultar: a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de dois a oito anos; b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de três a dez anos. LEI N.º 112/2009 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E ASSISTÊNCIA ÀS VÍTIMAS Artigo 5.º Princípio da igualdade Toda a vítima, independentemente da ascendência, nacionalidade, condição social, sexo, etnia, língua, idade, religião, deficiência, convicções políticas ou ideológicas, orientação sexual, 81 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional cultura e nível educacional goza dos direitos fundamentais inerentes à dignidade da pessoa humana, sendo-lhe assegurada a igualdade de oportunidades para viver sem violência e preservar a sua saúde física e mental. Artigo 9.º Princípio do consentimento 8. Sem prejuízo do disposto no Código de Processo Penal, qualquer intervenção de apoio à vítima deve ser efetuada após esta prestar o seu consentimento livre e esclarecido. 9. A intervenção de apoio específico, nos termos da presente lei, ao jovem vítima de violência doméstica, com idade igual ou superior a 16 anos, depende somente do seu consentimento. 10. A intervenção de apoio específico, nos termos da presente lei, à criança ou jovem vítima de violência doméstica, com idade inferior a 16 anos, depende do consentimento de representante legal, ou na sua ausência ou se este for o agente do crime, da entidade designada pela lei e do consentimento da criança ou jovem com idade igual ou superior a 12 anos. 11. O consentimento da criança ou jovem com idades compreendidas entre os 12 e os 16 anos é bastante para legitimar a intervenção de apoio específico nos termos da presente lei, caso as circunstâncias impeçam a receção, em tempo útil, de declaração sobre o consentimento de representante legal, ou na sua ausência ou se este for o agente do crime, da entidade designada pela lei. 12. A criança ou jovem vítima de violência doméstica, com idade inferior a 12 anos, tem o direito a pronunciar-se, em função da sua idade e grau de maturidade, sobre o apoio específico nos termos da presente lei. 82 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 13. A vítima pode, em qualquer momento, revogar livremente o seu consentimento. 14. ... Artigo 15.º Direito à informação 1. É garantida à vítima, desde o seu primeiro contacto com as autoridades competentes para a aplicação da lei, o acesso às seguintes informações: a) O tipo de serviços ou de organizações a que pode dirigir-se para obter apoio; b) O tipo de apoio que pode receber; c) Onde e como pode apresentar denúncia; d) Quais os procedimentos sequentes à denúncia e qual o seu papel no âmbito dos mesmos; e) Como e em que termos pode receber proteção; f) Em que medida e em que condições tem acesso a: i) ii) Aconselhamento jurídico; ou Apoio judiciário; ou iii) Outras formas de aconselhamento; g) Quais os requisitos que regem o seu direito a indemnização; 83 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional h) Quais os mecanismos especiais de defesa que pode utilizar, sendo residente em outro Estado. 2. Sempre que a vítima o solicite junto da entidade competente para o efeito, e sem prejuízo do regime do segredo de justiça, deve ainda ser-lhe assegurada informação sobre: a) O seguimento dado à denúncia; b) Os elementos pertinentes que lhe permitam, após a acusação ou a decisão instrutória, ser inteirada do estado do processo e da situação processual do arguido, por factos que lhe digam respeito, salvo em casos excecionais que possam prejudicar o bom andamento dos autos. Artigo 16.º Direito à audição e à apresentação de provas 1. A vítima que se constitua assistente colabora com o Ministério Público de acordo com o estatuto do assistente em processo penal. 2. As autoridades apenas devem inquirir a vítima na medida do necessário para os fins do processo penal. LEI N.º 166/99 LEI TUTELAR EDUCATIVA Artigo 188.º Respeito pela saúde física e psíquica e pela dignidade do menor 1. É proibida a aplicação de medidas que se traduzam em tratamento cruel, desumano, degradante ou que possam comprometer a saúde física ou psíquica do menor. 84 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 2. A aplicação de medida disciplinar não pode, em caso algum, de maneira direta ou indireta, traduzir-se em castigos corporais, privação de alimentos ou do direito a receber visitas, não proibidas pelo tribunal, dos pais ou representante legal. 3. Nenhuma sanção disciplinar pode ser executada com violação do respeito pela dignidade da pessoa do menor. LEI N.º 113/2009 CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL E O ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS Artigo 2.º Princípio da não discriminação A implementação da presente Convenção pelas Partes, em particular das medidas tendentes a proteger os direitos das vítimas, deve ser assegurada sem qualquer discriminação com base no sexo, na raça, na cor, na língua, na religião, nas opiniões políticas ou outras, na origem nacional ou social, na pertença a uma minoria nacional, na riqueza, no nascimento ou em qualquer outra situação. (Não é feita referência a deficiência) LEI N.º 147/99 PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO Artigo 1.º Objeto O presente diploma tem por objeto a promoção dos direitos e a proteção das crianças e dos jovens em perigo, por forma a garantir o seu bem-estar e desenvolvimento integral. Artigo 3.º 85 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Legitimidade da intervenção 1. A intervenção para promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem, nomeadamente nas seguintes situações: a) Está abandonada ou vive entregue a si própria; b) Sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais; c) Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal; d) É obrigada a atividades ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento; e) Está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional; f) Assume comportamentos ou se entrega a atividades ou consumos que afetem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento sem que os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação. Artigo 4.º Princípios orientadores da intervenção A intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo obedece 86 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional aos seguintes princípios: a) Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; b) Privacidade - a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada; c) Intervenção precoce - a intervenção deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida; d) Intervenção mínima - a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas entidades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e do jovem em perigo; e) Proporcionalidade e atualidade - a intervenção deve ser a necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontram no momento em que a decisão é tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade; f) Responsabilidade parental - a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o jovem; g) Prevalência da família - na promoção de direitos e na proteção da criança e do jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem na sua família ou que promovam a sua adoção; 87 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional h) Obrigatoriedade da informação - a criança e o jovem, os pais, o representante legal ou a pessoa que tenha a sua guarda de facto têm direito a ser informados dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa; i) Audição obrigatória e participação - a criança e o jovem, em separado ou na companhia dos pais ou de pessoa por si escolhida, bem como os pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção; j) Subsidiariedade - a intervenção deve ser efetuada sucessivamente pelas entidades com competência em matéria da infância e juventude, pelas comissões de proteção de crianças e jovens e, em última instância, pelos tribunais. Artigo 7.º Intervenção de entidades com competência em matéria de infância e juventude A intervenção das entidades com competência em matéria de infância e juventude é efetuada de modo consensual com os pais, representantes legais ou com quem tenha a guarda de facto da criança ou do jovem, consoante o caso, de acordo com os princípios e nos termos do presente diploma. Artigo 8.º Intervenção das comissões de proteção de crianças e jovens A intervenção das comissões de proteção de crianças e jovens tem lugar quando não seja possível às entidades referidas no artigo anterior atuar de forma adequada e suficiente a remover o perigo em que se encontram. Artigo 9.º Consentimento A intervenção das comissões de proteção das crianças e jovens depende do consentimento 88 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional expresso dos seus pais, do representante legal ou da pessoa que tenha a guarda de facto, consoante o caso. Artigo 10.º Não oposição da criança e do jovem 3. A intervenção das entidades referidas nos artigos 7.º e 8.º depende da não oposição da criança ou do jovem com idade igual ou superior a 12 anos. 4. A oposição da criança com idade inferior a 12 anos é considerada relevante de acordo com a sua capacidade para compreender o sentido da intervenção. Artigo 11.º Intervenção judicial A intervenção judicial tem lugar quando: a) Não esteja instalada comissão de proteção de crianças e jovens com competência no município ou na freguesia da respetiva área da residência ou a comissão não tenha competência, nos termos da lei, para aplicar a medida de promoção e proteção adequada; b) Não seja prestado ou seja retirado o consentimento necessário à intervenção da comissão de proteção ou quando o acordo de promoção de direitos e de proteção seja reiteradamente não cumprido; c) A criança ou o jovem se oponham à intervenção da comissão de proteção, nos termos do artigo 10.º; d) A comissão de proteção não obtenha a disponibilidade dos meios necessários para aplicar ou executar a medida que considere adequada, nomeadamente por oposição de um serviço ou entidade; e) Decorridos seis meses após o conhecimento da situação pela comissão de proteção não tenha sido proferida qualquer decisão; f) O Ministério Público considere que a decisão da comissão de proteção é ilegal ou inadequada à promoção dos direitos ou à proteção da criança ou do jovem; 89 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional g) O tribunal decida a apensação do processo da comissão de proteção ao processo judicial, nos termos do n.º 2 do artigo 81.º. Secção II Comissões de proteção de crianças e jovens Subsecção I Disposições gerais Artigo 12.º Natureza 1. As comissões de proteção de crianças e jovens, adiante designadas comissões de proteção, são instituições oficiais não judiciárias com autonomia funcional que visam promover os direitos da criança e do jovem e prevenir ou pôr termo a situações suscetíveis de afetar a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral. 2. As comissões de proteção exercem as suas atribuições em conformidade com a lei e deliberam com imparcialidade e independência. 3. As comissões de proteção são declaradas instaladas por portaria conjunta do Ministro da Justiça e do Ministro do Trabalho e da Solidariedade. Capítulo III Medidas de promoção dos direitos e de proteção Secção I Das medidas Artigo 34.º Finalidade 1. As medidas de promoção dos direitos e de proteção das crianças e dos jovens em 90 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional perigo, adiante designadas por medidas de promoção e proteção, visam: Afastar o perigo em que estes se encontram; Proporcionar-lhes as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral; c) Garantir a recuperação física e psicológica das crianças e jovens vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso. Artigo 35.º Medidas 1. As medidas de promoção e proteção são as seguintes: a) b) a) Apoio junto dos pais; b) Apoio junto de outro familiar; c) Confiança a pessoa idónea; d) Apoio para a autonomia de vida; e) Acolhimento familiar; f) Acolhimento em instituição; g) Confiança a pessoa selecionada para a adoção ou a instituição com vista a futura adoção. 2. (…) Secção V Acordo de promoção e proteção e execução das medidas Artigo 55.º Acordo de promoção e proteção 91 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 1. O acordo de promoção e proteção inclui obrigatoriamente: a) A identificação do membro da comissão de proteção ou do técnico a quem cabe o acompanhamento do caso; b) O prazo por que é estabelecido e em que deve ser revisto; c) As declarações de consentimento ou de não oposição necessárias; 2. Não podem ser estabelecidas cláusulas que imponham obrigações abusivas ou que introduzam limitações ao funcionamento da vida familiar para além das necessárias a afastar a situação concreta de perigo. Capítulo IV Comunicações Artigo 64.º Comunicação das situações de perigo pelas autoridades policiais e judiciárias 1. As entidades policiais e as autoridades judiciárias comunicam às comissões de proteção as situações de crianças e jovens em perigo de que tenham conhecimento no exercício das suas funções. 2. Sem prejuízo do disposto no número anterior, as autoridades judiciárias adotam as providências tutelares cíveis adequadas. Artigo 65.º Comunicação das situações de perigo conhecidas pelas entidades com competência em matéria de infância e juventude 1. As entidades com competência em matéria de infância e juventude comunicam às comissões de proteção as situações de perigo de que tenham conhecimento no exercício das suas funções 92 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional sempre que não possam, no âmbito exclusivo da sua competência, assegurar em tempo a proteção suficiente que as circunstâncias do caso exigem. 2. Caso a comissão de proteção não esteja instalada ou quando não tenha competência para aplicar a medida adequada, designadamente sempre que os pais da criança ou do jovem expressem a sua vontade quanto ao seu consentimento ou à não oposição para a futura adoção, as entidades devem comunicar a situação de perigo diretamente ao Ministério Público. 3. As instituições de acolhimento devem comunicar ao Ministério Público todas as situações de crianças e jovens que acolham sem prévia decisão da comissão de proteção ou judicial. Artigo 66.º Comunicação das situações de perigo por qualquer pessoa 1. Qualquer pessoa que tenha conhecimento das situações previstas no artigo 3.º pode comunicálas às entidades com competência em matéria de infância ou juventude, às entidades policiais, às comissões de proteção ou às autoridades judiciárias. 2. A comunicação é obrigatória para qualquer pessoa que tenha conhecimento de situações que ponham em risco a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade da criança ou do jovem. 3. … Artigo 84.º Audição da criança e do jovem 3. As crianças e os jovens com mais de 12 anos, ou com idade inferior quando a sua capacidade para compreender o sentido da intervenção o aconselhe, são ouvidos pela comissão de proteção ou pelo juiz sobre as situações que deram origem à intervenção e relativamente à aplicação, revisão ou cessação de medidas de promoção e proteção. 4. A criança ou o jovem tem direito a ser ouvido individualmente ou acompanhado pelos pais, 93 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional pelo representante legal, por advogado da sua escolha ou oficioso ou por pessoa da sua confiança. Artigo 86.º Informação e assistência 3. O processo deve decorrer de forma compreensível para a criança ou jovem, considerando a idade e o grau de desenvolvimento intelectual e psicológico. 4. Na audição da criança ou do jovem e no decurso de outros atos processuais ou diligências que o justifiquem, a comissão de proteção ou o juiz podem determinar a intervenção ou a assistência de médicos, psicólogos ou outros especialistas ou de pessoa da confiança da criança ou do jovem, ou determinar a utilização dos meios técnicos que lhes pareçam adequados. Capítulo VII Procedimentos de urgência Artigo 91.º Procedimentos urgentes na ausência do consentimento 2. Quando exista perigo atual ou iminente para a vida ou integridade física da criança ou do jovem e haja oposição dos detentores do poder paternal ou de quem tenha a guarda de facto, qualquer das entidades referidas no artigo 7.º ou as comissões de proteção tomam as medidas adequadas para a sua proteção imediata e solicitam a intervenção do tribunal ou das entidades policiais. 94 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 3. (…) Direito à vida familiar CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA Aplicação efetiva Artigo 36.º Família, casamento e filiação 1. … 2. A norma está, de facto, refletida na legislação nacional, quer no quadro jurídico geral, quer na legislação específica em matéria de deficiência. 3. … Os filhos nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objeto de Porém, a aplicação no terreno é qualquer discriminação e a lei ou as repartições oficiais não podem usar designações frequentemente problemática: discriminatórias relativas à filiação.  O número de crianças 5. Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos. consideradas em risco que são 6. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram retiradas às famílias e os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. institucionalizadas continua muito elevado; 7. A adoção é regulada e protegida nos termos da lei, a qual deve estabelecer formas céleres para a respetiva tramitação.  A criação de «escolas de referência» para crianças CÓDIGO CIVIL surdas e cegas obriga-as a Artigo 1887.º-A percorrer diariamente longas Convívio com irmãos e ascendentes Os pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com os irmãos e ascendentes. distâncias para assistirem às Artigo 1776.º-A aulas (em especial nas zonas Acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais rurais), o que pode violar o seu 3. Quando for apresentado acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais direito a manter laços afetivos 4. 95 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional relativo a filhos menores, o processo é enviado ao Ministério Público, para que este se pronuncie sobre o acordo no prazo de 30 dias. 4. Caso o Ministério Público considere que o acordo não acautela devidamente os interesses dos menores, podem os requerentes alterar o acordo em conformidade ou apresentar novo acordo, sendo neste último caso dada nova vista ao Ministério Público. Artigo 1901.º Responsabilidades parentais na constância do matrimónio 4. Na constância do matrimónio, o exercício das responsabilidades parentais pertence a ambos os pais. 5. Os pais exercem as responsabilidades parentais de comum acordo e, se este faltar em questões de particular importância, qualquer deles pode recorrer ao tribunal, que tentará a conciliação. 6. Se a conciliação referida no número anterior não for possível, o tribunal ouvirá o filho, antes de decidir, salvo quando circunstâncias ponderosas o desaconselhem. Artigo 1906.º Exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento 5. O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro. 6. … 7. O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles. 96 com irmãos e familiares. Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Artigo 1919.º Exercício das responsabilidades parentais enquanto se mantiver a providência 4. Se o menor tiver sido confiado a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência, será estabelecido um regime de visitas aos pais, a menos que, excecionalmente, o interesse do filho o desaconselhe. Artigo 1978.º Confiança com vista a futura adoção 3. Com vista a futura adoção, o tribunal pode confiar o menor a casal, a pessoa singular ou a instituição quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações: f) Se o menor for filho de pais incógnitos ou falecidos; g) Se tiver havido consentimento prévio para a adoção; h) Se os pais tiverem abandonado o menor; i) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento do menor; j) Se os pais do menor acolhido por um particular ou por uma instituição tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança. 4. Na avaliação das situações descritas supra, o tribunal deve, em primeiro lugar, respeitar os direitos e o superior interesse da criança. Lei n.º 147/99 Proteção de crianças e jovens em perigo Artigo 4.º Princípios orientadores da intervenção A intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo obedece aos seguintes princípios: c) Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender 97 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; d) c) d) e) f) g) h) ... j) Audição obrigatória e participação - a criança e o jovem, em separado ou na companhia dos pais ou de pessoa por si escolhida, bem como os pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção. Lei n.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) Artigo 22.º Apoio à família Compete ao Estado adotar medidas que proporcionem à família da pessoa com deficiência as condições para a sua plena participação. Artigo 27.º Conciliação entre a atividade profissional e a vida familiar Compete ao Estado adotar medidas específicas necessárias para assegurar o direito de conciliação entre a atividade profissional e a vida familiar da pessoa com deficiência, bem como dos familiares com pessoas com deficiência a cargo. Lei n.º 281/2009 Criação de um Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI) Artigo 2.º Âmbito O SNIPI abrange as crianças entre os 0 e os 6 anos, com alterações nas funções ou estruturas do 98 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional corpo que limitam a participação nas atividades típicas para a respetiva idade e contexto social ou com risco grave de atraso de desenvolvimento, bem como as suas famílias. Decreto-Lei n.º 3/2008 Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo Artigo 3.º Participação dos pais e encarregados de educação 1. Os pais ou encarregados de educação têm o direito e o dever de participar ativamente, exercendo o poder paternal nos termos da lei, em tudo o que se relacione com a educação especial a prestar ao seu filho, acedendo, para tal, a toda a informação constante do processo educativo. Direito a assistência CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA Artigo 71.º Cidadãos portadores de deficiência 1. … 2. O Estado obriga-se a realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias, a desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com eles e a assumir o encargo da efetiva realização dos seus direitos, sem prejuízo dos direitos e deveres dos pais ou tutores. 3. … Lei n.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) 99 Aplicação efetiva A norma está, de facto, refletida a nível nacional na Constituição e em legislação específica em matéria de deficiência. Contudo, a sua aplicação prática está repleta de lacunas, principalmente devido a:  Critérios de elegibilidade restritivos;  Menores níveis de prestações sociais pagas; Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Artigo 3.º Objetivos Constituem objetivos da presente lei a realização de uma política global, integrada e transversal de prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência, através, nomeadamente, da: a) Promoção da igualdade de oportunidades, no sentido de que a pessoa com deficiência disponha de condições que permitam a plena participação na sociedade; b) Promoção de oportunidades de educação, formação e trabalho ao longo da vida; c) Promoção do acesso a serviços de apoio; d) Promoção de uma sociedade para todos através da eliminação de barreiras e da adoção de medidas que visem a plena participação da pessoa com deficiência. Artigo 25.º Habilitação e reabilitação A habilitação e a reabilitação são constituídas pelas medidas, nomeadamente nos domínios do emprego, trabalho e formação, consumo, segurança social, saúde, habitação e urbanismo, transportes, educação e ensino, cultura e ciência, sistema fiscal, desporto e tempos livres, que tenham em vista a aprendizagem e o desenvolvimento de aptidões, a autonomia e a qualidade de vida da pessoa com deficiência. Artigo 26.º Direito ao emprego, trabalho e formação 1. Compete ao Estado adotar medidas específicas necessárias para assegurar o direito de acesso ao emprego, ao trabalho, à orientação, formação, habilitação e reabilitação profissionais e a adequação das condições de trabalho da pessoa com deficiência. 2. ... Artigo 30.º Direito à segurança social Compete ao Estado adotar medidas específicas necessárias para assegurar a proteção social da pessoa com deficiência, mediante prestações pecuniárias ou em espécie, que tenham em vista 100  Medidas de austeridade em vigor, que tiveram um impacto negativo na disponibilização de serviços e de recursos. Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional a autonomia pessoal e uma adequada integração profissional e social. Artigo 31.º Direito à saúde Compete ao Estado adotar medidas específicas necessárias para assegurar os cuidados de promoção e vigilância da saúde, o despiste e o diagnóstico, a estimulação precoce do tratamento e a habilitação e reabilitação médico-funcional da pessoa com deficiência, bem como o fornecimento, adaptação, manutenção ou renovação dos meios de compensação que forem adequados. Artigo 32.º Direito à habitação e urbanismo Compete ao Estado adotar, mediante a elaboração de um plano nacional de promoção da acessibilidade, tendo em atenção os princípios do desenho universal: a. Medidas específicas necessárias para assegurar o direito à habitação da pessoa com deficiência, em articulação com as autarquias locais; b. Medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência, nomeadamente aos espaços interiores e exteriores, mediante a eliminação de barreiras arquitetónicas na construção, ampliação e renovação. Artigo 34.º Direito à educação e ensino Compete ao Estado adotar medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência à educação e ao ensino inclusivo, mediante, nomeadamente, a afetação de recursos e instrumentos adequados à aprendizagem e à comunicação. Artigo 38.º Direito à prática do desporto e de tempos livres Compete ao Estado adotar medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência à prática do desporto e à fruição dos tempos livres, mediante, nomeadamente, a criação de estruturas adequadas e formas de apoio social. 101 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Lei n.º 281/2009 Criação de um Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI) Artigo 1.º Objeto 1. O presente decreto-lei cria o Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância, adiante designado por SNIPI, o qual consiste num conjunto organizado de entidades institucionais e de natureza familiar, com vista a garantir condições de desenvolvimento das crianças com funções ou estruturas do corpo que limitam o crescimento pessoal, social, e a sua participação nas atividades típicas para a idade, bem como das crianças com risco grave de atraso no desenvolvimento. Decreto-Lei n.º 3/2008 Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo Artigo 1.º Objeto e âmbito 1. O presente decreto-lei define os apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo, visando a criação de condições para a adequação do processo educativo às necessidades educativas especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da atividade e da participação num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de caráter permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social. 2. A educação especial tem por objetivos a inclusão educativa e social, o acesso e o sucesso educativo, a autonomia, a estabilidade emocional, bem como a promoção da igualdade de oportunidades, a preparação para o prosseguimento de estudos ou para uma adequada preparação para a vida pós-escolar ou profissional. 102 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Decreto-Lei n.º 133/97 Prestações familiares Artigo 4.º Modalidades de prestações 1 – A proteção nos encargos familiares é realizada através da atribuição das seguintes prestações pecuniárias: a) Subsídio familiar a crianças e jovens; b) Subsídio por frequência de estabelecimento de educação especial; c) …; d) Subsídio por assistência de terceira pessoa; Artigo 6.º Subsídio familiar a crianças e jovens 1 – O subsídio familiar a crianças e jovens é uma prestação mensal que visa compensar os encargos familiares respeitantes ao sustento e educação dos descendentes do beneficiário. 2 – O subsídio familiar a crianças e jovens pode ser objeto de uma bonificação para compensar os encargos específicos de uma situação de deficiência, nos termos do artigo seguinte. Artigo 7.º Bonificação, por deficiência, do subsídio familiar a crianças e jovens A bonificação, por deficiência, do subsídio familiar a crianças e jovens destina-se a compensar o acréscimo de encargos familiares decorrentes da situação dos descendentes dos beneficiários, menores de 24 anos, portadores de deficiência de natureza física, orgânica, sensorial, motora ou mental, que torne necessário o apoio pedagógico ou terapêutico. Artigo 8.º Subsídio por frequência de estabelecimento de educação especial O subsídio por frequência de estabelecimento de educação especial é uma prestação mensal que 103 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional se destina a compensar os encargos diretamente resultantes da aplicação a crianças e jovens, de idade inferior a 24 anos, portadores de deficiência de medidas específicas de educação especial que impliquem necessariamente a frequência de estabelecimentos particulares com fins lucrativos ou cooperativos, ou o apoio educativo específico por entidade especializada fora do estabelecimento, igualmente com fins lucrativos Artigo 10.º Subsídio por assistência de terceira pessoa O subsídio por assistência de terceira pessoa é uma prestação mensal que se destina a compensar o acréscimo de encargos familiares resultantes da situação de dependência dos descendentes do beneficiário titulares de subsídio familiar a crianças e jovens, com bonificação por deficiência ou de subsídio mensal vitalício [para adultos com idade superior a 24 anos], que exijam o acompanhamento permanente de terceira pessoa Artigo 31.º Montante do subsídio familiar a crianças e jovens 1O montante do subsídio familiar a crianças e jovens é determinado em função do nível de rendimentos do agregado familiar de que o titular do direito à prestação é dependente, do número de titulares com direito à mesma e da respetiva idade. 2… Portaria n.º 511/2009 Fixa os montantes das prestações das crianças e jovens com deficiência Artigo 5.º Prestações por deficiência e dependência 1 — Os montantes mensais das prestações previstas no Decreto-Lei n.º 133-B/97, de 30 de maio, na redação que lhe foi dada pelos Decretos-Leis n.os 341/99, de 25 de agosto, e 250/2001, de 21 de setembro, no âmbito do regime geral de segurança social e do regime de proteção social da função pública, são os seguintes: 104 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional a) Bonificação por deficiência: (euro) 59,48, para titulares até aos 14 anos; (euro) 86,62, para titulares até aos 18 anos; (euro) 115,96, para titulares dos 18 aos 24 anos; b) ... c) O subsídio por assistência de terceira pessoa é de (euro) 88,37. Decreto-Lei n.º 290/2009 Criação do Programa de Apoio à Qualificação de Pessoas com Deficiência Artigo 1.º Objeto 1 — O presente decreto-lei cria o Programa de Emprego Apoio à Qualificação das Pessoas com Deficiências e Incapacidades e define o regime de concessão de apoio técnico e financeiro para o desenvolvimento das políticas de emprego e apoio à qualificação das pessoas com deficiências e incapacidades, que compreende as seguintes medidas: a) Apoio à qualificação; b) Apoios à integração, manutenção e reintegração no mercado de trabalho; c) Emprego apoiado; d) Prémio de mérito. Direito à educação (incluindo educação inclusiva) CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA Aplicação efetiva Artigo 73.º Educação, cultura e ciência 1. Todos têm direito à educação e à cultura. … Artigo 74.º Ensino A legislação portuguesa reconhece o direito à educação e à educação inclusiva das crianças com deficiência; compete ao Estado providenciar os recursos humanos e os meios para assegurar o acesso à educação. 105 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 1. Todos têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar. 2. Na realização da política de ensino incumbe ao Estado: a) b) c) d) e) f) g) Promover e apoiar o acesso dos cidadãos portadores de deficiência ao ensino e apoiar o ensino especial, quando necessário; h) Proteger e valorizar a língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades; … Lei n.º 38/2004 Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência (Lei em matéria de deficiência) A legislação recentemente aprovada em matéria de educação inclusiva (Decreto-Lei n.º 3/2008, alterado pela Lei n.º 21/2008 de 12 de maio) conduziu ao encerramento de escolas de ensino especial e à colocação de crianças com deficiência em escolas de ensino regular. De acordo com a lei em vigor, a matrícula em instituições de ensino especial constitui um último recurso, a ser ativado apenas quando não for Artigo 34.º possível a inclusão numa escola Direito à educação e ensino regular, devido à gravidade das Compete ao Estado adotar medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência à educação e ao ensino inclusivo, mediante, nomeadamente, a afetação de necessidades da criança ou à falta de apoio adequado por parte da escola recursos e instrumentos adequados à aprendizagem e à comunicação. regular. Lei n.º 46/2006 Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado Apesar destes progressos da legislação de saúde sobre educação inclusiva, subsistem problemas consideráveis em termos da Artigo 4.º sua aplicação, nomeadamente: Práticas discriminatórias  Insuficiência de recursos Consideram-se práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência as ações ou omissões, humanos, de serviços dolosas ou negligentes, que, em razão da deficiência, violem o princípio da igualdade, especializados (incluindo designadamente: serviços de transporte escolar) a) b) c) d) e) f) g) 106 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional h) A recusa ou a limitação de acesso a estabelecimentos de ensino, públicos ou privados, assim como a qualquer meio de compensação/apoio adequado às necessidades específicas dos alunos com deficiência; i) A constituição de turmas ou a adoção de outras medidas de organização interna nos estabelecimentos de ensino público ou privado, segundo critérios de discriminação em razão da deficiência, salvo se tais critérios forem justificados pelos objetivos referidos no n.º 2 do artigo 2.º. …  LEI N.º 49/2005 Lei de Bases do Sistema Educativo  Artigo 2.º Princípios gerais 1 — Todos os portugueses têm direito à educação e à cultura, nos termos da Constituição da República. … 2— É da especial responsabilidade do Estado promover a democratização do ensino, garantindo o direito a uma justa e efetiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares. Artigo 5.º Educação pré-escolar 1— São objetivos da educação pré-escolar: …. h) Proceder à despistagem de inadaptações, deficiências ou precocidades e promover a melhor orientação e encaminhamento da criança. Artigo 7.º 107 e de materiais, necessários para promover a efetiva integração de crianças com deficiência nas escolas regulares; Concentração de recursos e de apoios especializados na escola de referência, criando novas formas de exclusão para algumas crianças com deficiência; Problemas decorrentes da utilização da CIF como referência para a avaliação das necessidades dos alunos, conduzindo a uma atribuição inadequada de apoios e à redução do número de alunos que beneficiam desses apoios. Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Objetivos São objetivos do ensino básico: a) b) c) d) f) g) h) i) j) Assegurar às crianças com necessidades educativas específicas, devidas, designadamente, a deficiências físicas e mentais, condições adequadas ao seu desenvolvimento e pleno aproveitamento das suas capacidades; … Artigo 20.º Âmbito e objetivos da educação especial 1— A educação especial visa a recuperação e a integração socioeducativas dos indivíduos com necessidades educativas específicas devidas a deficiências físicas e mentais. 2—… 3— No âmbito dos objetivos do sistema educativo, em geral, assumem relevo na educação especial: a) O desenvolvimento das potencialidades físicas e intelectuais; b) A ajuda na aquisição da estabilidade emocional; c) O desenvolvimento das possibilidades de comunicação; d) A redução das limitações provocadas pela deficiência; e) O apoio na inserção familiar, escolar e social de crianças e jovens deficientes; f) O desenvolvimento da independência a todos os níveis em que se possa processar; g) A preparação para uma adequada formação profissional e integração na vida ativa Artigo 21.º Organização da educação especial 1— A educação especial organiza-se preferencialmente segundo modelos diversificados de integração em estabelecimentos regulares de ensino, tendo em conta as necessidades de atendimento específico, e com apoios de educadores especializados. 2— A educação especial processar-se-á também em instituições específicas quando 108 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional comprovadamente o exijam o tipo e o grau de deficiência do educando. 3— São também organizadas formas de educação especial visando a integração profissional do deficiente. 4— A escolaridade básica para crianças e jovens deficientes deve ter currículos e programas devidamente adaptados às características de cada tipo e grau de deficiência, assim como formas de avaliação adequadas às dificuldades específicas. 5— Incumbe ao Estado promover e apoiar a educação especial para deficientes. … Artigo 28.º Apoios a alunos com necessidades escolares específicas Nos estabelecimentos de ensino básico é assegurada a existência de atividades de acompanhamento e complemento pedagógicos, de modo positivamente diferenciado, a alunos com necessidades escolares específicas. Artigo 42.º Edifícios escolares … 4— Na conceção dos edifícios e na escolha do equipamento devem ser tidas em conta as necessidades especiais dos deficientes. … Lei n.º 85/2009 Estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 5 anos de idade Artigo 1.º Objeto 1 — A presente lei estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que 109 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional se encontram em idade escolar. 2 — A presente lei consagra, ainda, a universalidade da educação pré-escolar para todas as crianças a partir do ano em que atinjam os 5 anos de idade. Artigo 2.º Âmbito da escolaridade obrigatória 1 — Para efeitos do previsto no n.º 1 do artigo anterior, consideram-se em idade escolar as crianças e jovens com idades compreendidas entre os 6 e os 18 anos. 2 — O disposto no número anterior é também aplicável aos alunos abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, alterado pela Lei n.º 21/2008, de 12 de maio [decreto-lei sobre educação inclusiva]. … Artigo 3.º Universalidade e gratuitidade 1 — No âmbito da escolaridade obrigatória o ensino é universal e gratuito. 2 — A gratuitidade prevista no número anterior abrange propinas, taxas e emolumentos relacionados com a matrícula, frequência escolar e certificação do aproveitamento, dispondo ainda os alunos de apoios no âmbito da ação social escolar, nos termos da lei aplicável. 3 — Os alunos abrangidos pela presente lei, em situação de carência, são beneficiários da concessão de apoios financeiros, na modalidade de bolsas de estudo, em termos e condições a regular por decreto-lei. Artigo 4.º Educação pré-escolar 1 — A educação pré-escolar é universal para todas as crianças a partir do ano em que atinjam os 5 anos de idade. 2 — A universalidade prevista no número anterior implica, para o Estado, o dever de garantir a existência de uma rede de educação pré-escolar que permita a inscrição de todas as crianças por ela abrangidas e o de assegurar que essa frequência se efetue em 110 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional regime de gratuitidade da componente educativa Decreto-Lei n.º 3/2008 Apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo (alterado pela Lei n.º 21/2008 de 12 de maio) Artigo 1.º Objeto e âmbito 1. O presente decreto-lei define os apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário dos setores público, particular e cooperativo, visando a criação de condições para a adequação do processo educativo às necessidades educativas especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da atividade e da participação num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de caráter permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social. 2. A educação especial tem por objetivos a inclusão educativa e social, o acesso e o sucesso educativo, a autonomia, a estabilidade emocional, bem como a promoção da igualdade de oportunidades, a preparação para o prosseguimento de estudos ou para uma adequada preparação para a vida pós-escolar ou profissional. Artigo 2.º Princípios orientadores 1 — A educação especial prossegue, em permanência, os princípios da justiça e da solidariedade social, da não discriminação e do combate à exclusão social, da igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativo, da participação dos pais e da confidencialidade da informação. 2 — Nos termos do disposto no número anterior, as escolas ou os agrupamentos de escolas, os estabelecimentos de ensino particular com paralelismo pedagógico, as escolas profissionais, direta ou indiretamente financiados pelo Ministério da Educação (ME), não podem rejeitar a matrícula 111 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional ou a inscrição de qualquer criança ou jovem com base na incapacidade ou nas necessidades educativas especiais que manifestem. 3 — As crianças e jovens com necessidades educativas especiais de caráter permanente gozam de prioridade na matrícula, tendo o direito, nos termos do presente decreto-lei, a frequentar o jardim-de-infância ou a escola nos mesmos termos das restantes crianças. 4 — As crianças e os jovens com necessidades educativas especiais de caráter permanente têm direito ao reconhecimento da sua singularidade e à oferta de respostas educativas adequadas. … Artigo 4.º Organização … 3 — Para apoiar a adequação do processo de ensino e de aprendizagem podem as escolas ou agrupamentos de escolas desenvolver respostas específicas diferenciadas para alunos com perturbações do espetro do autismo e com multideficiência, designadamente através da criação de: a) Unidades de ensino estruturado para a educação de alunos com perturbações do espetro do autismo; b) Unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência e surdocegueira congénita. 4) 5)... 6) A educação especial organiza-se segundo modelos diversificados de integração em ambientes de escola inclusiva e integradora, garantindo a utilização de ambientes o menos restritivos possível, desde que dessa integração não resulte qualquer tipo de segregação ou de exclusão da criança ou jovem com necessidades educativas especiais. 7 — Nos casos em que a aplicação das medidas previstas nos artigos anteriores se revele comprovadamente insuficiente em função do tipo e grau de deficiência do aluno, podem os intervenientes no processo de referenciação e de avaliação constantes do presente diploma, propor a frequência de uma instituição de educação especial. 8 — Os pais ou encarregados de educação podem solicitar a mudança de escola onde o 112 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional aluno se encontra inscrito, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 3.º. … Artigo 4.º-A Instituições de educação especial 1 — As instituições de educação especial têm por missão a escolarização de crianças e jovens com necessidades educativas especiais que requeiram intervenções especializadas e diferenciadas que se traduzam em adequações significativas do seu processo de educação ou de ensino e aprendizagem, comprovadamente não passíveis de concretizar, com a correta integração, noutro estabelecimento de educação ou de ensino ou para as quais se revele comprovadamente insuficiente esta integração. 2 — As instituições de educação especial devem ter como objetivos, relativamente a cada criança ou jovem, o cumprimento da escolaridade obrigatória e a integração na vida ativa, numa perspetiva de promoção do maior desenvolvimento possível, de acordo com as limitações ou incapacidades de cada um deles, das suas aprendizagens, competências, aptidões e capacidades. … Artigo 8.º Programa educativo individual 1 — O programa educativo individual é o documento que fixa e fundamenta as respostas educativas e respetivas formas de avaliação. 2 — O programa educativo individual documenta as necessidades educativas especiais da criança ou jovem, baseadas na observação e avaliação de sala de aula e nas informações complementares disponibilizadas pelos participantes no processo. 3 — O programa educativo individual integra o processo individual do aluno. Artigo 16.º Adequação do processo de ensino e de aprendizagem 113 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 1 — A adequação do processo de ensino e de aprendizagem integra medidas educativas que visam promover a aprendizagem e a participação dos alunos com necessidades educativas especiais de caráter permanente. 2 — Constituem medidas educativas referidas no número anterior: a) Apoio pedagógico personalizado; b) Adequações curriculares individuais; c) Adequações no processo de matrícula; d) Adequações no processo de avaliação; e) Currículo específico individual; f) Tecnologias de apoio. … Artigo 20.º Adequações no processo de avaliação 1 — As adequações quanto aos termos a seguir para a avaliação dos progressos das aprendizagens podem consistir, nomeadamente, na alteração do tipo de provas, dos instrumentos de avaliação e certificação, bem como das condições de avaliação, no que respeita, entre outros aspetos, às formas e meios de comunicação e à periodicidade, duração e local da mesma. … Artigo 23.º Educação bilingue de alunos surdos 1 — A educação das crianças e jovens surdos deve ser feita em ambientes bilingues que possibilitem o domínio da LGP, o domínio do português escrito e, eventualmente, falado, competindo à escola contribuir para o crescimento linguístico dos alunos surdos, para a adequação do processo de acesso ao currículo e para a inclusão escolar e social. ... 23 — As escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos devem estar apetrechadas com equipamentos essenciais às necessidades específicas da população surda. 114 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional 24 — Consideram-se equipamentos essenciais ao nível da escola e da sala de aula os seguintes: computadores com câmaras, programas para tratamento de imagem e filmes, impressora e scanner; televisor e vídeo, câmara e máquinas fotográficas digitais, retroprojetor, projetor multimédia, quadro interativo, sinalizadores luminosos de todos os sinais sonoros, telefone com serviço de mensagens curtas (sms), sistema de vídeo-conferência, software educativo, dicionários e livros de apoio ao ensino do português escrito, materiais multimédia de apoio ao ensino e aprendizagem em LGP, ao desenvolvimento da LGP e sobre a cultura da comunidade surda, disponibilizados em diferentes formatos; material e equipamentos específicos para a intervenção em terapêutica da fala. … Artigo 24.º Educação de alunos cegos e com baixa visão 1 — As escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão concentram as crianças e jovens de um ou mais concelhos, em função da sua localização e rede de transportes existentes. … 5 — As escolas de referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão devem estar apetrechadas com equipamentos informáticos e didáticos adequados às necessidades da população a que se destinam. 6 – Consideram-se materiais didáticos adequados os seguintes: material em carateres ampliados, em braille; em formato digital, em áudio e materiais em relevo. 7 – Consideram-se equipamentos informáticos adequados, os seguintes: computadores equipados com leitor de ecrã com voz em português e linha braille, impressora braille, impressora laser para preparação de documentos e conceção de relevos; scanner; máquina para produção de relevos, máquinas braille; cubarítmos; calculadoras eletrónicas; lupas de mão; lupa TV; software de ampliação de carateres; software de transcrição de texto em braille; gravadores adequados aos formatos áudio atuais e suportes digitais de acesso à Internet. … Artigo 25.º 115 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ___________________________________________________________________________________________________________________________________________ Análise da aplicação jurídica dos direitos e dos princípios da CDPD e da CDC Observações/avaliação da aplicação Legislação nacional Unidades de ensino estruturado para a educação de alunos com perturbações do espetro do autismo 1 — As unidades de ensino estruturado para a educação de alunos com perturbações do espetro do autismo constituem uma resposta educativa especializada desenvolvida em escolas ou agrupamentos de escolas que concentrem grupos de alunos que manifestem perturbações enquadráveis nesta problemática. … 7 — As escolas ou agrupamentos de escolas onde funcionem unidades de ensino estruturado devem ser apetrechados com mobiliário e equipamento essenciais às necessidades específicas da população com perturbações do espetro do autismo e introduzir as modificações nos espaços e nos materiais que se considerem necessárias face ao modelo de ensino a implementar. Artigo 26.º Unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência e surdocegueira congénita 1 — As unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência e surdocegueira congénita constituem uma resposta educativa especializada desenvolvida em escolas ou agrupamentos de escolas que concentrem grupos de alunos que manifestem essas problemáticas. … 7 — As escolas ou agrupamentos de escolas onde funcionem unidades de apoio especializado devem ser apetrechados com os equipamentos essenciais às necessidades específicas dos alunos com multideficiência ou surdocegueira e introduzir as modificações nos espaços e mobiliário que se mostrem necessárias face às metodologias e técnicas a implementar. … 7 — As escolas ou agrupamentos de escolas onde funcionem unidades de apoio especializado devem ser apetrechados com os equipamentos essenciais às necessidades específicas dos alunos com multideficiência ou surdocegueira e introduzir as modificações nos espaços e mobiliário que se mostrem necessárias face às metodologias e técnicas a implementar. ... 116 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________ ANEXO 2 – INFORMAÇÃO ESTATÍSTICA Tipo de infração Violência Ano 2009 2010 238 Discriminação com base no sexo CPCJ238: 0,9 % (n=602) de todos os casos que envolvem situações de violência, abusos ou maus tratos relacionados com crianças e jovens com algum tipo de deficiência. Não houve queixas especificamente relacionadas com violência ou discriminação com base no sexo que afetem crianças com deficiência. INR239: número total de queixas relacionadas com discriminação com base na deficiência (n=47). Não há uma indicação específica de quantas destas queixas estão relacionadas com crianças e jovens com deficiência, mas n=6 estão relacionadas com discriminação com base no sexo na educação (4 apresentadas diretamente pelo INR e 2 pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência). CPCJ240: 1,6% (n=1068) de todos os 68 421 casos que envolvem situações de Não houve queixas especificamente relacionadas com violência ou INR241: número total de queixas relacionadas com discriminação com base na deficiência (n=47). Não há CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade INR, «Relatório Anual – 2009 sobre A Prática de Agravado de Saúde». 240 CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade 241 INR, «Relatório Anual – 2010 sobre A Prática de Agravado de Saúde». 239 Outra discriminação Suspeitos de crimes das CPCJ no ano de 2009». Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco das CPCJ no ano de 2010». Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco 117 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ Tipo de infração Violência Ano 2011 Discriminação com base no sexo Outra discriminação violência, abusos ou maus tratos relacionados com crianças e jovens com algum tipo de deficiência. discriminação com base no sexo que afetem crianças com deficiência. uma indicação específica de quantas destas queixas estão relacionadas com crianças e jovens com deficiência, mas n=4 estão relacionadas com discriminação com base no sexo na educação (2 apresentadas diretamente pelo INR e 2 pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência). As queixas apresentadas pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência foram arquivadas. Não existem informações disponíveis sobre a situação dos outros casos. CPCJ242: 1,2% (n=824) de todos os 67 941 casos que envolvem situações de violência, abusos ou maus tratos relacionados com crianças e jovens com algum tipo de deficiência. Não houve queixas especificamente relacionadas com violência ou discriminação com base no sexo que afetem crianças com deficiência. INR243: número total de queixas relacionadas com discriminação com base na deficiência (n=54). Não há uma indicação específica de quantas destas queixas estão relacionadas com crianças e jovens com 242 Suspeitos de crimes CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2011». INR, «Relatório Anual – 2011 sobre A Prática de Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco Agravado de Saúde». 243 118 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________ Tipo de infração Violência Ano Discriminação com base no sexo Outra discriminação Suspeitos de crimes deficiência, mas n=6 estão relacionadas com discriminação com base no sexo na educação (2 apresentadas diretamente pelo INR, 3 pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência e 1 pelo Provedor de Justiça). As 3 queixas apresentadas pela InspeçãoGeral da Educação e Ciência foram arquivadas. Não existem informações disponíveis sobre a situação dos outros casos. 2012 CPCJ244: 1,4% (n=990) de todos os 69 007 casos que envolvem situações de violência, abusos ou maus tratos relacionados com crianças e jovens com algum tipo de Não houve queixas especificamente relacionadas com violência ou discriminação com base no sexo que afetem crianças com deficiência. 244 INR245: número total de queixas relacionadas com discriminação com base na deficiência (n=131). Não há uma indicação específica de quantas destas queixas estão relacionadas CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2012». INR, «Relatório Anual – 2012 sobre A Prática de Atos Discriminatórios em Razão da Deficiência e do Risco Agravado de Saúde». 245 119 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ Tipo de infração Violência Ano Discriminação com base no sexo deficiência. Outra discriminação com crianças e jovens com deficiência, mas n=18 estão relacionadas com discriminação com base no sexo na educação (9 apresentadas diretamente pelo INR, 2 pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência e 7 pelo Provedor de Justiça). Duas das queixas apresentadas pela InspeçãoGeral da Educação e Ciência foram arquivadas. Não existem informações disponíveis sobre a situação dos outros casos. Provedor de Justiça246: 6 chamadas relativas a crianças e jovens com deficiência recebidas através da linha telefónica 246 Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça). 120 Suspeitos de crimes Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________ Tipo de infração Violência Ano Discriminação com base no sexo Outra discriminação especial. 2013 CPCJ247: 1,4% (n=992) de todos os 71 567 casos que envolvem situações de violência, abusos ou maus tratos relacionados com crianças e jovens com algum tipo de deficiência. Não houve queixas especificamente relacionadas com violência ou discriminação com base no sexo que afetem crianças com deficiência. Provedor de Justiça248: 32 chamadas relativas a crianças e jovens com deficiência recebidas através da linha telefónica especial. Ao todo, foram registadas 39 queixas relativas a subsídios por frequência de estabelecimento de educação especial (através do telefone, correio eletrónico ou outros procedimentos). O relatório do INR relativo a 2013 ainda não tinha sido publicado em 21/11/2014. 247 248 CNPCJR, «Relatório anual de avaliação da atividade das CPCJ no ano de 2013». Informação recolhida mediante consulta a intervenientes nacionais (Provedor de Justiça). 121 Suspeitos de crimes Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ ANEXO 3 - ESTUDO SOBRE ESTADOS-MEMBROS RELATIVAS DEFICIÊNCIA - RESUMO AS A POLÍTICAS CRIANÇAS DOS COM Existem cerca de 100 milhões de crianças na União Europeia e cerca de 80 milhões de europeus portadores de deficiência. Embora o número de crianças e o número de pessoas com deficiência estejam bem documentados, o mesmo não se pode dizer de crianças com deficiência. As crianças com deficiência combinam diferentes fatores de vulnerabilidade. Enquanto crianças, a proteção dos seus direitos requer a adoção de medidas especiais que se encontram reconhecidas pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CDC). Enquanto indivíduos com deficiência, são cidadãos da UE especialmente vulneráveis que merecem salvaguardas e proteção específicas, conforme reconhecido pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD). As crianças com deficiência e respetivas famílias enfrentam diariamente problemas específicos, tais como a falta de assistência e de apoio para a sua inclusão em escolas, experiências de violência e de falta de instrumentos adequados para as denunciar, dificuldades de acesso a edifícios ou serviços, ou obstáculos em ser ouvidas e participar em decisões que afetam a sua vida. As Convenções incluem disposições que abordam estas preocupações e fornecem proteção do direito de gozo de todos os direitos humanos e liberdades sem discriminação, assegurando  igualdade de oportunidades e acessibilidade,  a consideração do interesse superior da criança em todas as ações que lhe digam respeito,  a consideração do desenvolvimento das capacidades da criança com deficiência nas decisões  que a afetam,  o direito a ser ouvida em procedimentos e processos de tomada de decisão que afetem  a criança e o direito a uma participação plena e efetiva,  o direito à vida familiar,  o direito ao acesso efetivo a educação, incluindo educação inclusiva,  o direito a cuidados de saúde,  o direito a assistência e  o direito a não ser objeto de violência. O presente estudo está estruturado de modo a espelhar os requisitos de ambas as convenções, refletindo os principais direitos das crianças com deficiência a ser aplicados de um modo geral na UE, devido à elevada taxa de ratificação por parte dos seus Estados-Membros. Além disso, em dezembro de 2010, a União Europeia tornou-se parte da CDPD. Ao fazê-lo, a UE reconheceu os desafios que as pessoas com deficiência enfrentam para garantir o cumprimento dos seus direitos e assumiu a responsabilidade pela sua aplicação juntamente com os Estados-Membros. A responsabilidade da UE pela aplicação da CDC assume uma dimensão diferente. Apesar da falta de ratificação pela UE, os direitos e princípios da CDC orientam as suas políticas e ação, pois o Tratado reconhece os direitos da criança como um objetivo da UE. O presente estudo avalia a situação atual no que se refere aos direitos das crianças com deficiência na UE e a necessidade de legislação comunitária ou de outras medidas. As 122 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________ opções de ação ao nível da UE estão limitadas pelo âmbito das competências conferidas pelos Tratados, que podem ser exclusivas, partilhadas ou de apoio (artigo 2.º do TFUE). O atual quadro legislativo e político da UE reconhece os direitos e os princípios das Convenções aplicáveis a crianças com deficiência e um certo grau de aplicação. Contudo, a legislação existente da UE pertinente neste domínio é principalmente setorial (ou seja, emprego ou imigração). A legislação aborda a situação das pessoas com deficiência separadamente dos direitos da criança, quando é necessário ter em conta que as crianças com deficiência enfrentam uma discriminação múltipla, em razão da idade e da deficiência, e adaptar medidas para garantir que os seus direitos são respeitados. A. Análise comparativa de quadros jurídicos nacionais A análise comparativa dos quadros jurídicos nacionais sobre os direitos das crianças com deficiência em 18 Estados-Membros249 baseia-se num conjunto de critérios desenvolvidos para permitir uma avaliação dos dados comparáveis comunicados em cada estudo nacional. Os critérios têm por base os requisitos no âmbito de cada direito e princípio identificado como pertinente para a situação das crianças com deficiência.250 Além disso, decorrem do texto de ambas as convenções e dos comentários gerais da CDC sobre a sua interpretação. De um modo geral, os 18 Estados-Membros possuem quadros jurídicos completos que refletem os principais aspetos dos direitos e dos princípios identificados no âmbito da CDPD e da CDC. Embora se possa afirmar que os direitos das crianças com deficiência são amplamente reconhecidos nos termos dos sistemas jurídicos nacionais através de legislação geral ou específica, a sua aplicação prática revelou-se problemática na maioria dos Estados-Membros. A consideração do princípio do interesse superior da criança é geralmente reconhecida no âmbito das leis nacionais. Contudo, a sua aplicação limita-se principalmente a decisões em matéria de família e proteção social que afetam as crianças e não são reconhecidas as necessidades específicas das crianças com deficiência. Os estudos sobre os países constataram uma falta de compreensão do que implica o princípio, aliada a um desenvolvimento insuficiente do conceito através do direito e da jurisprudência, bem como uma ausência generalizada de regras de execução. O direito à não discriminação baseada na deficiência ou na idade está refletido nas legislações nacionais, porém a sua aplicação é, de um modo geral, apenas parcial e as medidas de adaptação razoável são geralmente insuficientes para garantir o direito. Na prática, a acessibilidade mantém-se um dos principais problemas na maioria dos Estados-Membros. Raramente são referidos os fatores de discriminação múltipla enfrentados por crianças com deficiência ou raparigas com deficiência. Verifica-se uma ausência de resultados de acompanhamento e de dados sobre casos de violações de direitos, que possam ajudar a definir medidas mais eficazes. A maioria dos países reconhece em parte as capacidades em desenvolvimento da criança, principalmente com base em considerações sobre a idade, maturidade e 249 Para a primeira fase do presente estudo, foram analisados os quadros jurídicos de 18 Estados-Membros selecionados: Bélgica, República Checa, Estónia, Finlândia, França, Áustria, Grécia, Hungria, Itália, Irlanda, Países Baixos, Malta, Polónia, Roménia, Eslovénia, Espanha, Suécia e Reino Unido. Estes países foram escolhidos pelo Parlamento Europeu nos Termos de Especificações do presente estudo. 250 Foram identificados oito direitos e princípios como sendo os mais pertinentes para a situação das crianças com deficiência: o interesse superior da criança, o direito à não discriminação, a consideração das capacidades em desenvolvimento, o direito de participação/audição, o direito a não ser objeto de violência, o direito à vida familiar, o direito a assistência e o direito à educação. 123 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ desenvolvimento da criança. Todavia, a situação das crianças com deficiência não é reconhecida de forma específica. A aplicação está limitada a um determinado tipo de decisões e os Estados-Membros tendem a ter principalmente em conta a idade da criança, o que pode não ser pertinente para crianças com deficiência e pode, de facto, excluí-las de processos de decisão que as afetam. Os direitos de participação e de audição nos processos de tomada de decisão que afetam as crianças com deficiência estão reconhecidos na legislação dos 18 Estados-Membros. Contudo, a sua aplicação está muitas vezes limitada a alguns procedimentos setoriais, principalmente relacionados com direito da família e, em certa medida, com a educação. Na prática, as crianças com deficiência não são envolvidas de forma sistemática e não conseguem participar na vida pública e privada ao mesmo nível que os seus pares sem deficiência. De um modo geral, o direito a não ser objeto de violência encontra-se reconhecido pela legislação dos Estados-Membros. No entanto, os abusos contra crianças com deficiência constituem um problema significativo reconhecido nos relatórios de todos os países. É especialmente preocupante a violência ocorrida em instituições. A inexistência de dados sistemáticos e a dificuldade de as vítimas denunciarem os abusos não permitem uma perspetiva geral da situação, necessária para a adoção das políticas e medidas adequadas. O direito à vida familiar encontra-se amplamente reconhecido nas leis dos Estados-Membros selecionados. Contudo, a orientação e apoio insuficientes prestados às famílias para a integração da criança com deficiência e para as ajudar na sua vida quotidiana constitui um problema na maioria dos 18 Estados-Membros. Sem a devida assistência, as famílias com dificuldades podem renunciar à sua responsabilidade, conduzindo a uma situação em que opções alternativas são improváveis e a institucionalização é a única resposta disponível. No global, o direito a várias formas de assistência (financeira, social, de cuidados de saúde, etc.), tanto para crianças com deficiência como para as respetivas famílias, está reconhecido na legislação ou em normas regulamentares. No entanto, mais uma vez na maioria dos casos a assistência é setorial (principalmente social e de saúde) e insuficiente (financeiramente e a nível de assistência humana). A crise económica está a contribuir para a eliminação e redução de assistência na maioria dos Estados-Membros. O acesso a assistência é muitas vezes percecionado não como um instrumento que permite a proteção de direitos, mas sim como uma medida discricionária sujeita a restrições orçamentais. Todos os Estados-Membros reconhecem o direito à educação nas suas Constituições ou quadros jurídicos; todavia, a capacidade de crianças com deficiência acederem à escola da sua escolha continua a ser muito difícil na prática. As escolas regulares mantêm-se, em grande medida, inacessíveis a crianças com deficiência em muitos Estados-Membros, enquanto noutros países as escolas possuem recursos insuficientes e o apoio para estas crianças é escasso. Além disso, os professores em escolas regulares não possuem formação e sensibilidade para as necessidades das crianças com deficiência e os programas não são sistematicamente adaptados a elas. Os mecanismos de conformidade são fracos e carecem de adaptação à situação das crianças com deficiência. A falta de informação e de orientação das famílias de crianças com deficiência sobre os seus direitos, procedimentos e autoridades competentes diminuem a sua capacidade de acesso a esses instrumentos. 124 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________ Tendo por base as suas constatações, o estudo apresenta conclusões e recomendações de ação para a UE, tendo em conta a competência conferida a esta pelos Tratados num conjunto de domínios políticos, incluindo deficiência e direitos das crianças. B.1 O papel da União Europeia A UE não possui competência explícita sobre crianças com deficiência. Contudo, o quadro da UE contém disposições que reconhecem o seu papel na promoção da proteção dos direitos da criança enquanto objetivo da UE, bem como a sua competência no combate à discriminação em razão da deficiência. Além disso, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, com valor jurídico semelhante aos Tratados, reconhece o direito à não discriminação em razão da deficiência no artigo 21.º e os direitos das crianças no artigo 24.º. Este reconhecimento, embora importante, não pode alargar as competências da UE relativamente às conferidas pelos Tratados. A UE, juntamente com os Estados-Membros em domínios de competência partilhada ou nacional, está vinculada às obrigações da CDPD e exige-se-lhe que tome as medidas necessárias para combater a discriminação em razão da deficiência no âmbito do artigo 19.º do TFUE ou em outras matérias que se enquadrem na competência da UE. O artigo 19.º, n.º 1, do TFUE proporciona a base jurídica para a ação da UE (ver, entre outras, a proposta de diretiva, de 2008, para a igualdade de tratamento251), mas a unanimidade necessária dificulta a obtenção de um acordo nos termos desta base jurídica. O artigo 19.º, n.º 2, prevê a possibilidade de a UE adotar princípios de base e medidas de incentivo para apoiar as ações dos Estados-Membros destinadas a combater a discriminação através do processo legislativo ordinário. Nem a proposta supramencionada de diretiva para a igualdade de tratamento nem quaisquer outras medidas da UE apresentam uma definição de deficiência. Antes da adoção da CDPD, num acórdão de julho de 2006, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) definiu deficiência no mesmo sentido que a CDPD no contexto da política de emprego como «uma limitação, que resulta, designadamente, de incapacidades físicas, mentais ou psíquicas e que impedem a participação da pessoa em causa na vida profissional».252 Recentemente, o TJUE aprofundou mais este conceito253 afirmando que a deficiência resulta de barreiras que podem impedir a participação plena e efetiva da pessoa em questão na vida profissional em condições de igualdade com os outros trabalhadores e apelando à entidade patronal que tome medidas de adaptação razoáveis. A ação da UE também é possível quando aliada a outros domínios políticos da sua competência. Várias questões relacionadas com os direitos da criança com deficiência estão ligadas a políticas da UE, tais como política social, coesão económica, social e territorial, transportes, liberdade, segurança e justiça, sendo todas de competência partilhada. Além disso, a UE tem a opção de agir para apoiar políticas dos Estados-Membros num conjunto de domínios que afetam as crianças com deficiência, tais como educação, desporto, juventude e saúde. 251 Proposta de diretiva do Conselho que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, independentemente da sua religião ou crença, deficiência, idade ou orientação sexual, COM/2008/0426 final, disponível em: http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A52008PC0426 (último acesso em 6.5.2013). 252 Acórdão C-13/05 do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 11 julho de 2006, Sonia Chacón Navas contra Eurest Colectividades, ponto 43. 253 Acórdão do Tribunal de Justiça, processos apensos C-335/11 e C-337/11 de 11 de abril de 2013, HK Danmark, na qualidade de mandatário de Jette Ring, contra Dansk almennyttigt Boligselskab (C-335/11) e HK Danmark, na qualidade de mandatário de Lone Skouboe Werge, contra Dansk Arbejdsgiverforening, na qualidade de mandatária da Pro Display A/S, em situação de insolvência (C-337/11), ponto 47. 125 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ B. 2 Legislação derivada da UE existente e pertinente O interesse superior da criança enquanto consideração principal em ações relacionadas com crianças constitui um requisito fundamental reconhecido na legislação da UE. O artigo 7.º da Diretiva 2008/52 relativa a mediação254 exige que o mediador assegure a proteção do superior interesse da criança quando decidir se esta pode fornecer provas em processos judiciais. A Diretiva relativa ao direito ao reagrupamento familiar255 exige que as autoridades dos Estados-Membros tenham em consideração o interesse superior dos filhos menores na análise dos pedidos de reagrupamento familiar (artigo 5.º)256. A proteção do interesse superior da criança é explicitamente mencionada na Diretiva 2004/81/CE257 do Conselho relativa a vítimas do tráfico de seres humanos. A não discriminação ao nível da UE é atualmente abordada por quatro diretivas comunitárias, a fim de combater a discriminação em razão de motivos protegidos, tais como sexo, origem racial ou étnica, religião ou convicções, idade ou orientação sexual, a maioria limitada ao domínio do emprego.258 Preveem regras que visam «o combate à discriminação (...) com vista a pôr em prática nos Estados-Membros o princípio da igualdade de tratamento».259 A deficiência é reconhecida como base para discriminação nos termos da Diretiva 2000/78/CE e, além disso, a proteção da igualdade entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à atividade profissional aplica-se a pessoas com deficiência. A Diretiva 2000/43/CE relativa a igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica, não inclui a deficiência como motivo protegido. A Diretiva 2004/113/CE relativa a igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços e seu fornecimento refere a discriminação em função do sexo, mas não da idade ou deficiência. A Comissão Europeia reconheceu as diferenças de proteção prestada nos vários motivos e publicou uma proposta de diretiva em 2008 que visa completar o quadro normativo antidiscriminação da UE e estabelecer um nível de proteção mais harmonizada entre os vários motivos260. Outras medidas em domínios políticos como o mercado interno ou os transportes têm um impacto no acesso das crianças com deficiência a serviços sem discriminação. Por exemplo, a Diretiva 2001/85/CE relativa ao transporte de passageiros exige recursos de acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida e com deficiência visual. Outros instrumentos abrangem os direitos das pessoas com deficiência quando viajam de avião, a acessibilidade a elevadores, na realização de concursos públicos e nas medidas para 254 Diretiva 2008/52/CE relativa a certos aspetos da mediação em matéria civil e comercial. Diretiva 2003/86/CE do Conselho relativa ao direito ao reagrupamento familiar. 256 «Developing indicators for the protection, respect and promotion of the Rights of the Child in the European Union», FRA, março de 2009, disponível em http://fra.europa.eu/sites/default/files/fra_uploads/358RightsofChild_summary-report_en.pdf. 257 Diretiva 2004/81/CE relativa ao título de residência concedido aos nacionais de países terceiros que sejam vítimas do tráfico de seres humanos ou objeto de uma ação de auxílio à imigração ilegal. 258 Diretiva 2006/54/CE relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à atividade profissional (reformulação); Diretiva 2004/113/CE que aplica o princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços e seu fornecimento; Diretiva 2000/43/CE que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica, e Diretiva 2000/78/CE que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional. 259 Artigo 1.º da Diretiva 2000/43/CE. 260 Proposta de Diretiva do Conselho que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, independentemente da sua religião ou crença, deficiência, idade ou orientação sexual (COM(2008)0426). Encontra-se atualmente bloqueada no Conselho. 255 126 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________ telecomunicações261. No âmbito das suas competências, a ação da UE na luta contra a discriminação é complementada por atividades das instituições da UE, que visam melhorar o conhecimento sobre discriminação (por exemplo através de uma maior sensibilização), apoiar intervenientes intermediários (por exemplo ONG, parceiros sociais e organismos para a igualdade), a fim de melhorar a sua capacidade de combater a discriminação e incentivar o intercâmbio de boas práticas nacionais. A consideração das capacidades em desenvolvimento das crianças está reconhecida no Regulamento Bruxelas II bis 2201/2003, que exige que os tribunais ouçam a opinião da criança, tendo em conta a sua idade ou grau de maturidade. Encontra-se o mesmo enunciado em legislação da UE relativa a imigração e asilo em relação a menores não acompanhados. O direito das crianças à participação encontra-se reconhecido em alguns documentos estratégicos da Comissão, incluindo a comunicação «Políticas europeias de juventude» de 2005, a «Estratégia da UE sobre os direitos da criança» de 2006, o programa «Juventude em Ação» e o Programa da UE para os direitos da criança de 2011. A legislação da UE em matéria de imigração e asilo reconhece o direito da criança a ser ouvida no decurso de processos nos termos do Regulamento Bruxelas II bis 2201/2003. A UE adotou um conjunto de medidas sobre a proteção das crianças contra a violência262 relacionada com o tráfico de crianças, a exploração sexual de crianças e a proteção das vítimas, incluindo várias diretivas263 que foram aprovadas para substituir alguns destes instrumentos. Por exemplo, a Diretiva 2011/36/UE relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas concentra-se na proteção das crianças, que são mais vulneráveis do que os adultos, e determina sanções agravadas para casos em que a infração seja cometida contra vítimas particularmente vulneráveis, como crianças e pessoas com deficiência. A Diretiva 2012/29/UE que estabelece normas mínimas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas reconhece que as vítimas da criminalidade devem ser tratadas sem discriminação com base em qualquer motivo, incluindo idade e deficiência. Por fim, a Diretiva 2011/92/UE relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil264 prevê a necessidade de proteção específica para crianças com deficiência. O direito à vida familiar e a manutenção da criança no contexto familiar encontra-se no 261 «Study on challenges and good practices in the implementation of the UN Convention on the Rights of Persons with Disabilities VC/2008/1214», Comissão Europeia, Bruxelas, 2010, Resumo, disponível em http://www.efc.be/programmes_services/resources/Documents/UN_Covention_Summary_EN.pdf. 262 Decisão-Quadro 2002/629/JAI relativa à luta contra o tráfico de seres humanos; Diretiva 2004/81/CE relativa ao título de residência concedido aos nacionais de países terceiros que sejam vítimas do tráfico de seres humanos; Decisão-Quadro 2004/68/JAI relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil; Decisão-Quadro 2001/220/JAI relativa ao estatuto da vítima em processo penal; Resolução 2001/C 283/01 do Conselho relativa ao contributo da sociedade civil na busca de crianças desaparecidas e sexualmente exploradas. Decisão n.º 1351/2008/CE que estabelece o programa «Internet mais segura» 2009-2013. 263 Diretiva 2011/36/UE relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas, e que substitui a Decisão-Quadro 2002/629/JAI do Conselho, Diretiva 2011/92/UE relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil, e que substitui a Decisão-Quadro 2004/68/JAI do Conselho, Diretiva 2012/29/UE que estabelece normas mínimas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade e que substitui a Decisão-Quadro 2001/220/JAI do Conselho. 264 Artigo 1.º da Diretiva 2011/92/UE. 127 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ cerne do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho Bruxelas II bis265. No âmbito das políticas de imigração, o direito da criança à vida familiar está assegurado pelas normas de reagrupamento familiar266 e pelo disposto nas diretivas relativas a asilo267 no que se refere a menores não acompanhados e ao respeito pela unidade das famílias. O princípio da máxima inclusão na sociedade das crianças com deficiência encontra-se refletido em documentos estratégicos, tais como a Estratégia Europeia para a Deficiência 2010-2020268 e o Programa UE 2020 relativo a educação e formação269. A Resolução do Conselho, de 2003, relativa à igualdade de oportunidades de alunos e estudantes com deficiência270 abordou o problema do acesso à educação por parte de crianças com deficiência. Em 2010, a Resolução do Parlamento Europeu sobre a mobilidade e a integração de crianças com deficiência271 sublinhou a necessidade de garantir o pleno respeito dos direitos das crianças com deficiência, incluindo o direito à educação e o direito à participação ativa na vida da comunidade. As Instituições da UE apoiam igualmente a Agência Europeia para as Necessidades Especiais e a Educação Inclusiva, a organização independente que atua como uma plataforma de colaboração em matéria de necessidades especiais e de promoção da participação plena na educação e formação regulares272. C. Recomendações para ação da UE Ao avaliar a necessidade de recomendações específicas destinadas a melhorar a situação das crianças com deficiência, importa salientar que as crianças com deficiência são acima de tudo crianças com as mesmas necessidades que quaisquer outras e que devem beneficiar de todos os direitos reconhecidos pela CDC. Porém, tem de ser reconhecida a diferença intrínseca em relação aos seus pares para que sejam elaboradas medidas políticas e legislativas adequadas. Questões transversais  Como recomendação inicial e geral, todos os Estados-Membros da UE que ainda não o tenham feito devem ratificar as duas convenções referidas no presente 265 Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em material matrimonial e em matéria de responsabilidade parental. 266 Diretiva 2003/86/CE do Conselho relativa ao direito ao reagrupamento familiar; Regulamento (CE) n.º 343/2003 do Conselho que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de um país terceiro; Diretiva 2004/83/CE do Conselho que estabelece normas mínimas relativas às condições a preencher por nacionais de países terceiros ou apátridas para poderem beneficiar do estatuto de refugiado ou de pessoa que necessite de proteção internacional; Diretiva 2008/115/CE Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados-Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular. 267 Diretiva 2001/55/CE do Conselho relativa a normas mínimas em matéria de concessão de proteção temporária no caso de afluxo maciço de pessoas deslocadas; Diretiva 2003/9/CE do Conselho que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros; Diretiva 2004/83/CE do Conselho que estabelece normas mínimas relativas às condições a preencher por nacionais de países terceiros ou apátridas para poderem beneficiar do estatuto de refugiado ou de pessoa que, por outros motivos, necessite de proteção internacional; Diretiva 2005/85/CE do Conselho relativa a normas mínimas aplicáveis ao procedimento de concessão e retirada do estatuto de refugiado nos Estados-Membros. 268 Área de intervenção 5 da Comunicação da Comissão «Estratégia Europeia para a Deficiência 2010-2020: compromisso renovado a favor de uma Europa sem barreiras» (COM(2010)0636 final). 269 Conclusões do Conselho de 12 de maio de 2009 sobre um quadro estratégico para a cooperação europeia no domínio da educação e da formação («EF 2020»), 2009/C 119/02, JO C 119/2 de 28 de maio de 2005. 270 Resolução do Conselho, de 5 de maio de 2003, relativa à igualdade de oportunidades em matéria de educação e formação de alunos e estudantes com deficiência, 2003/C 134/04. 271 Resolução do Parlamento Europeu, de 25 de outubro de 2011, sobre a mobilidade e a integração de pessoas com deficiência e a Estratégia Europeia para a Deficiência 2010-2020 (2010/2272(INI)). 272 Sítio Web da Agência Europeia para as Necessidades Especiais e a Educação Inclusiva, disponível em https://www.european-agency.org/languages/português. 128 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________  estudo e aplicar as suas disposições adotando legislação nacional e assegurando a sua prática. A Comissão Europeia, em colaboração com o Secretariado das Nações Unidas para a CDPD e o Secretariado das Nações Unidas para a CDC, deve assegurar que os Estados-Membros compreendem e aplicam várias definições das Convenções que constituem pilares para a aplicação dos direitos das crianças com deficiência, nomeadamente a definição de «deficiência», «interesse superior da criança» e «desenvolvimento das capacidades da criança». Devem liderar a realização de iniciativas que visem assegurar que as especificidades das crianças com deficiência são tidas em consideração. Para tal, recomenda-se que a Comissão tome a iniciativa de clarificar ao nível da UE a definição que a CDPD apresenta de «deficiência», pois é considerada como demasiado abrangente na prática e, por conseguinte, a sua aplicação a nível nacional torna-se difícil. Recomenda-se a criação de documentos de orientação, o intercâmbio de melhores práticas e a promoção dos manuais existentes.  A Comissão Europeia deve agir no sentido de promover que as crianças com deficiência são tidas em consideração em iniciativas de integração existentes para a não discriminação e igualdade de tratamento.   O PE, o Conselho e a Comissão devem fomentar a criação de instrumentos de informação nacionais que ajudem as famílias de crianças com deficiência a compreender os quadros jurídicos que lhes são aplicáveis, incluindo a acesso a medidas de assistência, autoridades competentes, procedimentos e mecanismos de conformidade. Os instrumentos destinados a estas famílias podem incluir um portal Web da UE que poderá estar ligado, se possível, a portais nacionais que fornecem informações completas sobre direitos, requisitos, critérios de aplicação, autoridades competentes e sistemas de coordenação. Esta iniciativa pode aproximar mais os cidadãos da UE. As Instituições da UE devem assumir um papel de liderança na promoção da sensibilização para questões relacionadas com os direitos das crianças com deficiência, seus interesses e necessidades específicas, a fim de fomentar a plena aplicação do princípio do interesse superior das crianças com deficiência. O PE e o Conselho podem igualmente utilizar a suas competências orçamentais para garantir o financiamento de campanhas de sensibilização. Interesse superior da criança  Embora a maioria dos países possua legislação que reconhece o princípio do interesse superior da criança, são poucos os Estados-Membros que contêm na sua legislação um requisito geral para a sua consideração sistemática em todas as decisões que afetam as crianças. Alguns Estados-Membros (tais como a Suécia e o Reino Unido) introduziram avaliações de impacto nas crianças da legislação proposta. Recomenda-se que a Comissão Europeia promova o intercâmbio destas iniciativas e elabore um guia sobre as metodologias para a realização dessas avaliações de impacto nas crianças aplicando o princípio do interesse superior da criança. Direito à não discriminação  O conceito de adaptações razoáveis em relação à situação específica das crianças com deficiência tem de ser clarificado e mais desenvolvido, a fim de definir as fronteiras para a utilização de encargos desproporcionados. A UE, através da 129 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________   Comissão, deve dar o seu apoio através do intercâmbio de melhores práticas a nível nacional relativamente à aplicação de adaptações razoáveis abrangendo diferentes situações. Este facto ajudará a definir as bases a partir das quais o respeito deste direito exige uma ação por parte das autoridades públicas e impede que essa ação fique sujeita a argumentos de custos desproporcionados. A Proposta de Diretiva do Conselho, de 2008, que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, independentemente da sua religião ou crença, deficiência, idade ou orientação sexual, se aprovada, tem potencial para resolver a situação das crianças com deficiência. A alteração 37 introduzida pelo Parlamento Europeu refere-se a discriminação múltipla. Neste contexto, poderia ser introduzida uma clarificação nos considerandos da proposta de diretiva, a fim de garantir que a situação das crianças com deficiência é considerada como parte do seu âmbito. O projeto da Comissão Europeia para uma futura lei europeia de promoção da acessibilidade deve abranger explicitamente o acesso das crianças com deficiência a bens e serviços, no mínimo com uma referência a casos de discriminação múltipla. Desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência  O PE deve ponderar formas de aumentar a consciencialização e de promover a consideração do desenvolvimento das capacidades das crianças, incluindo das crianças com deficiência, no intuito de que este princípio seja aplicado em todos os processos de tomada de decisão que as afete.  Todos os novos atos legislativos sobre justiça «amiga das crianças» devem incluir a consideração da capacidade da criança com deficiência ser ouvida em processos judiciais que a afetem. A Comissão deve assegurar que estas disposições são incluídas na legislação da UE prevista sobre as salvaguardas especiais para pessoas suspeitas ou acusadas que sejam vulneráveis, ou na legislação da UE prevista para o reconhecimento e aplicação de decisões de responsabilidade parental. Além disso, recomenda-se que a Comissão Europeia, o Conselho e o PE promovam a utilização das Orientações do Conselho da Europa sobre justiça «amiga das crianças» e apoiem a formação dos profissionais relevantes a todos os níveis. Direito a participação das crianças com deficiência  A futura lei europeia de promoção da acessibilidade pode prever a criação de instrumentos que assegurem a participação das crianças com deficiência nos processos de consulta das iniciativas legislativas e políticas que as afetam.  O PE deve explorar formas de aumentar a consciencialização sobre os requisitos necessários para garantir o direito a participação das crianças com deficiência através de medidas concretas, tais como simulação de reuniões plenárias no PE envolvendo crianças com deficiência, garantia do acesso físico aos edifícios do PE ou elaboração de instrumentos que assegurem a participação não física. Direito a audição das crianças com deficiência  A fim de permitir a aplicação efetiva do direito das crianças com deficiência a serem ouvidas, são necessárias mudanças nas atitudes dos agentes judiciais, administrativos e de execução. Para tal, o PE, o Conselho e a Comissão devem 130 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________  incentivar os Estados-Membros a realizar ações de sensibilização e formação destinadas às autoridades públicas. A Comissão, ao preparar legislação sobre justiça «amiga das crianças», deve garantir que são dados os passos adequados a fim de identificar a capacidade da criança para expressar a sua opinião em processos judiciais que a afetem, proporcionando um clima de confiança entre a criança e os agentes judiciais e de execução, bem como disponibilizando adaptações razoáveis para assegurar o direito efetivo das crianças com deficiência a serem ouvidas. Direito a não ser objeto de violência  Recomenda-se que o PE, o Conselho e a Comissão promovam a elaboração de informações estatísticas sobre a situação de violência que afeta as crianças e nomeadamente as crianças com deficiência. Além disso, devem fomentar o desenvolvimento de indicadores (tais como deficiência, crianças, raparigas, ambiente familiar) a serem integrados noutros inquéritos políticos ou gerais, de modo que sejam fornecidos dados sistemáticos sobre a situação das crianças com deficiência.   A Comissão Europeia e o PE devem incentivar a FRA a analisar a situação da violência contra crianças, nomeadamente em instituições, incluindo crianças com deficiência, visto serem especialmente vulneráveis. O financiamento necessário deve ser proposto à autoridade orçamental. A Comissão Europeia deve ponderar em especial a necessidade de medidas ao nível da UE que visem reduzir o número de casos de violência contra crianças, principalmente crianças com deficiência, em Estados-Membros (tanto em contexto doméstico como em instituições públicas). A Comissão pode dar início aos trabalhos preparatórios organizando grupos de trabalho com peritos dos Estados-Membros, a fim de considerarem:      propostas para assegurar que os Estados-Membros estabelecem medidas preventivas e sistemas de acompanhamento adequados para detetar casos de violência e de abusos contra crianças, a criação de mecanismos de controlo e inspeções regulares, revisões pelos pares ou o Método Aberto de Coordenação para aplicação das propostas, o acesso a serviços de informação e comunicação destinados a melhorar o sistema de apresentação de queixas relativas ao direito das crianças a não serem objeto de violência. A Comissão pode promover a organização de formação e de oficinas especializadas em toda a UE entre profissionais, a fim de partilhar conhecimento sobre processos de apresentação de queixas, medidas de notificação e acessibilidade dos serviços de comunicação a crianças com deficiência, especialmente a crianças com deficiências graves ou incapacidades intelectuais. A autoridade orçamental deve disponibilizar financiamento adequado para estas atividades. Direito das crianças com deficiência à vida familiar  A Comissão, o Conselho e o PE devem incentivar os Estados-Membros a criar estruturas de apoio adequadas para as famílias de crianças com deficiência, a 131 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________   fim de diminuírem os riscos de a criança perder vida familiar, salvaguardando simultaneamente o interesse superior das crianças com deficiência. No âmbito do Método Aberto de Coordenação, a Comissão deve elaborar Orientações sobre os requisitos mínimos a cumprir por instituições residenciais em relação a crianças com deficiência. As Orientações devem ter como objetivo assegurar que os centros de cuidados residenciais têm um número reduzido de utilizadores e a capacidade de acolher crianças com autismo ou deficiências intelectuais. A Comissão deve propor à autoridade orçamental a utilização de fundos da UE para a proteção do direito das crianças à vida familiar, dando prioridade a fundos para famílias, assegurando simultaneamente que se mantém a boa qualidade das instituições. Acesso a assistência  Deve ser criado um único organismo nacional especial (com escritórios regionais) responsável pela gestão dos serviços, orçamento e assistência às crianças e às suas famílias, a fim de assegurar coerência, coordenação, eficácia, maior acessibilidade e melhor orientação às famílias sobre o apoio financeiro disponível.   O PE deve continuar a realizar ações sobre crianças com deficiência, a fim de informar os Estados-Membros relativamente aos impactos negativos dos cortes orçamentais sobre a aplicação dos seus direitos, nomeadamente no domínio da educação, proteção social e cuidados de saúde. No âmbito do processo do Semestre Europeu, a Comissão deve apresentar recomendações adequadas aos Estados-Membros sobre como podem utilizar os recursos existentes de forma eficaz, em vez de cortarem simplesmente a assistência necessária às crianças com deficiência, que se inserem no grupo dos cidadãos mais vulneráveis. Acesso a educação inclusiva  A Comissão deve levar a cabo ações que ajudem os Estados-Membros a melhorar os sistemas de ensino para crianças com deficiência, através do Método Aberto de Coordenação ou de revisão pelos pares, respeitando simultaneamente a sua competência geral em matérias relacionadas com a educação. A ação ao nível da UE pode incluir:  A criação de guias de melhores práticas e recomendações sobre o tipo mínimo de recursos necessários em escolas regulares e sobre o papel dos pais e das crianças com deficiência nos processos de tomada de decisão que afetam estas crianças ou o desenvolvimento de objetivos educativos;    A promoção de formação para professores sobre uma melhor compreensão das necessidades e do desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência, metodologias de ensino e formas de lidar com as crianças com deficiência numa turma juntamente com os seus colegas sem deficiência; A promoção de instrumentos de ensino que ajudem à inclusão de crianças com deficiência nas escolas e fora delas, tais como o manual COMPASS do Conselho da Europa; A promoção de iniciativas anti-bullying e antiestigmatização, incluindo 132 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________  campanhas de sensibilização que promovam a inclusão das crianças com deficiência; e A criação de objetivos de qualidade para a educação oferecida às crianças com deficiência e a promoção de iniciativas para manter o apoio para o ensino superior. Financiamento da UE  O PE, o Conselho e a Comissão devem promover entre os Estados-Membros a utilização dos Fundos Estruturais para fomentar o desenvolvimento de serviços sociais de qualidade prestados a crianças com deficiência, facilitando simultaneamente a aplicação do Quadro Voluntário Europeu de Qualidade dos Serviços Sociais;  O PE, o Conselho e a Comissão devem promover a criação de alternativas baseadas na família e na comunidade, no intuito de desinstitucionalização. O PE, o Conselho e a Comissão devem incentivar a utilização de Fundos Estruturais para melhorar as acessibilidades e a educação inclusiva. 133 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ ANEXO 4 - PERSPETIVA GLOBAL DE ESTUDOS CONEXOS Denominação do estudo Número PE Número ISBN Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.416 978-92-823-4548-1 Relatório sobre a Bélgica para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.417 978-92-823-4542-9 Relatório sobre a República Checa para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.418 978-92-823-4549-8 Relatório sobre a Estónia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.419 978-92-823-4561-0 Relatório sobre a Finlândia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.420 978-92-823-4552-8 Relatório sobre a França para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.421 978-92-823-4562-7 Relatório sobre a Alemanha para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.422 978-92-823-4553-5 Relatório sobre a Grécia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.423 978-92-823-4563-4 Relatório sobre a Hungria para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.424 978-92-823-4554-2 Relatório sobre a Irlanda para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.425 978-92-823-4564-1 Relatório sobre a Itália para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.426 978-92-823-4555-9 Relatório sobre Malta para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.427 978-92-823-4565-8 Relatório sobre os Países Baixos para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.428 978-92-823-4556-6 134 Departamento temático C: Direitos dos Cidadãos e Assuntos Constitucionais _________________________________________________________________ Relatório sobre a Polónia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.429 978-92-823-4566-5 Relatório sobre a Roménia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.430 978-92-823-4567-2 Relatório sobre a Eslovénia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.431 978-92-823-4557-3 Relatório sobre Espanha para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.432 978-92-823-4558-0 Relatório sobre a Suécia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.433 978-92-823-4568-9 Relatório sobre Inglaterra, País de Gales e Irlanda do Norte para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 474.434 978-92-823-4559-7 Relatório sobre a Áustria para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.195 978-92-823-6950-0 Relatório sobre a Bulgária para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.196 978-92-823-6971-5 Relatório sobre a Croácia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.197 978-92-823-6977-7 Relatório sobre Chipre para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.198 978-92-823-6981-4 Relatório sobre a Dinamarca para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.199 978-92-823-6985-2 Relatório sobre a Letónia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.200 978-92-823-6989-0 Relatório sobre a Lituânia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.201 978-92-823-6950-0 Relatório sobre o Luxemburgo para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.202 978-92-823-6954-8 135 Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência ________________________________________________________________ Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.203 978-92-823-6957-9 Relatório sobre a Escócia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.204 978-92-823-6961-6 Relatório sobre a Eslováquia para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência PE 519.205 978-92-823-6965-4 136