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PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Organização Fernanda Bellicieri Glaucia Davino HISTÓRIAS DE ROTEIRISTAS MÚLTIPLAS TELAS CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA São Paulo PM Studium 2012 2 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR APOIO: CAPA CAPA CAPA PARCEIRO: University of Nevada Las Vegas NUDRAMA — ECA — USP SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 3 Ficha catalográfica elaborada por: PMStudium Comunicação e Design. Histórias de roteiristas: Multiplas Telas | organização: Glaucia Davino e Fernanda Bellicieri. São Paulo: Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2012. ISBN: 978-85-62814-09-9 610 p. ; 51 il.; 0 vid. CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO 978-85-62814-09-9 FICHA FICHAFICHA 1. Audiovisual. 2. Roteiro. 3. Comunicação. I. Núcleo Audiovisual – UPM. II. Centro de Comunicação e Letras - UPM. III. DAVINO, G. IV. BELLICIERI, F. - IV MACKPESQUISA CDD – 791.043 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 4 CREDITOS 1. C orpo D iretivo I nstitucional 1.1. Corpo Diretivo Universidade Presbiteriana Mackenzie • Chanceler | Rev. Davi Charles Gomes • Reitor | Prof. Dr. Benedito Guimarães Aguiar Neto • Vice-Reitor | Dr. Marcel Mendes • Decano Acadêmico | Profª Drª Esmeralda Rizzo CAPA CAPA CAPA • Decano de Pesquisa e Pós Graduação | Prof. Dr. Moises Ari Zilber • Decano de Extensão | Prof. Dr. Cleverson Pereira de Almeida SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO 1.2. Corpo Diretivo Centro de Comunicação e Letras • Diretor | Prof. Dr. Alexandre Huady Torres Guimarães FICHA FICHAFICHA • Coordenador de Publicidade e Propaganda | Prof. Dr. Perrotti Pietrangelo Pasquale • Coordenador de Jornalismo | Prof. Ms. Osvaldo Takaoki Hattori • Coordenador de Letras | Prof. Dr. Ronaldo Batista PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA • Coordenador de Pesquisa | Profª Drª Ana Lucia Trevisan • Coordenador de Extensão | Profª Drª Isabel Orestes Silveira. 5 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 2. C omissão O rganizadora A comissão organizadora foi composta por docentes do Centro de Comunicação e Letras, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, e por professores pesquisadores de outras instituições públicas e particulares. • Prof Dr Adolpho Queiroz | Líder do Grupo Jornalismo e Marketing Político | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Profª Drª Angela Schaun | Vice-líder do Grupo Núcleo Audiovisual - NAv | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Profª Drª Ariane Daniela Cole | Líder do Grupo Design, arte, linguagens e processo CAPA CAPA CAPA | Desenho Industrial - FAU - Mackenzie • Profª Drª Debora Burini | Docente e Pesquisadora do Curso de Imagem e Som | Universidade Federal de São Carlos SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO • Prof. Ms. Edson Capoano | Pesquisador do Núcleo Audiovisual - NAv | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Profª Ms Fernanda Nardy Bellicieri | Pesquisadora do Núcleo Audiovisual - FICHA FICHAFICHA NAv | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie Vice- Coordenadora do III Seminário Histórias de Roteiristas • Prof. Ms. Flávio Duarte C. de Albuquerque | Pesquisador do Núcleo Audiovisual NAv | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA • Mestrando Francisco Tupy Gomes Correa | Pesquisador no Grupo Cidade do Conhecimento | Universidade de São Paulo 6 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR • Prof. Dr. Gilson Schwartz | Líder do Grupo Cidade do Conhecimento - USP | Diretor para América Latina Games for Change | Universidade de São Paulo • Profª Drª Glaucia Davino | Líder do Grupo Núcleo Audiovisual - NAv | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie | Coordenadora do III Seminário • Profª Drª Leticia Passos Affini | Líder dos Grupos de Estudos Audiovisuais GEA e de Alálise do Audiovisual GRAAu | UNESP PPG TV Digital • Prof. Dr. Pelopidas Cypriano de Oliveira Pel | Líder do Grupo de Pesquisa Artemidia Videoclip | Livre docente do Instituto de Artes - UNESP  - SP • Prof. Dr. Roberto Moreira | Membro fundador do NUDRAMA | Docente e pesquisador | Universidade de São Paulo CAPA CAPA CAPA • Prof. Dr. Rubens Rewald | Membro fundador do NUDRAMA | Docente e pesquisador | Universidade de São Paulo SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO 3. C omissão E xecutiva A comissão executiva do “3º Seminário Historias de Roteiristas. Múltiplas telas” foi composta por membros internos da Universidade Presbiteriana Mackenzie e por membros de outras instituições FICHA FICHAFICHA universitárias brasileiras listados a seguir • Débora Burini | Docente e Pesquisadora do Curso de Imagem e Som | Universidade Federal de São Carlos • Denise C Paiero | Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero e Etnia GERE | PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Fernanda Bellicieri | Vice-Coordenadora do III Seminário | Pesquisadora NAv | 7 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Flávio Albuquerque | Pesquisador NAv | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Glaucia Davino | Líder do NAV | Coordenadora Geral e Presidente do III Seminário | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Isabel Orestes da Silveira | Coordenação de Extensão | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Leticia Passos Affini | Líder dos Grupos de Estudos Audiovisuais GEA e de Alálise do Audiovisual GRAAu | UNESP PPG TV Digital • Osvaldo Takaoki Hatori | Coordenação de Jornalismo | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Pelópidas Cypriano Pel | Líder do Grupo de Pesquisa Artemidia Videoclip | Livre docente do Instituto de Artes - UNESP  - SP • Perrotti Pietrangelo Pasquale | Coordenador de Publicidade e Propaganda | Centro CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO de Comunicação e Letras - Mackenzie • Roberto Moreira | Membro fundador do NUDRAMA | Docente e pesquisador | Universidade de São Paulo • Ronaldo de Oliveira Batista | Coordenador de Letras | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie • Rubens Rewald | Membro fundador do NUDRAMA | Docente e pesquisador | FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Universidade de São Paulo ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 8 Alunos de Graduação • Fernando Berlezzi | Organizador do concurso e mostra de vídeos “Vida de Roteirista” | Pesquisador do Núcleo Audiovisual - NAv | Centro de Comunicação e Letras - Mackenzie 4. M onitoria Foi realizada por alunos de graduação do Centro de Comunicação e Letras do Mackenzie, de forma voluntária. Foram responsáveis por receber os participantes, encaminhá-los, dirimir dúvidas, controlar a frequência e estar presente em cada atividade para auxílio no bom andamento do evento. • Alana Parra • Camila Regueiro CAPA CAPA CAPA • Eduardo Lima Cabral • Guilherme Martins • Isabela Bolzani • Laura de Oliveira Fernandes SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO • Vitor Watanabe FICHA FICHAFICHA Equipe de Apoio • Sra. Rosana Mattos • Sra. Sheila Lima Souza Cunha • Sra. Janaina Santiago 5. C omissão T écnico C ientífica Foi formada por doutores e profissionais convidados pro bono acadêmico, por sua competência 9 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR profissional, científica e/ou acadêmica em áreas relacionadas aos temas do Seminário. Foram responsáveis por avaliar e emitir pareceres sobre os artigos e trabalhos submetidos, opinando sobre sua qualidade e relevância. Consultores ad hoc foram acionados para emissão de opinião quando o coordenador considerou necessário. • Adelina Silva Univ. Aberta de Lisboa e CEMRI • Alexane Kieling UCB • Alfredo Caminos RED INAV • Almir Almas ECA - USP • Ana Silvia Rocha Ipiranga FUNCAP • Angela Schaun CCL-Mackenzie • Ariane Daniela Cole FAU - DI- Mackenzie CAPA CAPA CAPA • Casimiro Pinto Univ. Aberta de Lisboa e CEMRI • Celso Figueiredo CCL -Mackenzie • Charles Vincent Coordenador Desenho Industrial - FAU - UPM • Glaucia Davino CCL –Mackenzie (presidente Comitê) SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO • Helena Bonito Couto Pereira PPG-Letras CCL/ Mackenzie • Isabel Orofino PPGCOM -ESPM FICHA FICHAFICHA • Jerónimo León Rivera Betancur Director RED INAV • João Anzanello Carrascoza PPG ESPM • Jorge Campos Cinema –Politécnica de LIsboa • José Ribeiro Pós Graduação Universidade Aberta Lisboa PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA • Leticia Passos Affini Unesp -Radio e TV - Bauru • Márcia Perencin Tondato PPG ESPM • Marcos Rizolli PPG-Educação Arte e Historia da Cultura - Mackenzie 10 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR • Maria Cristina Lima Paniago Lopes UCDB, MTS • Maria do Céu Marques Universidade Aberta de Lisboa • Maria Fátima Nunes Instituto Superior da Maia - ISMAI, Portugal • Maria Ignês Carlos Magno PPG Anahembi - Morumbi • Mônica Morais de Oliveira USP - SP • Ortelinda Barros Univ. Porto • Paulo Cezar Barbosa Mello - USP - SP • Pelopidas Cypriano de Oliveira (PEL) Instituto de Artes - UNESP • Peo Helín Universidad Murcia, Espanha • Regina Giora PPG EAHC/ Mackenzie • Rogério Ferraraz PPG Anhembi Morumbi CAPA CAPA CAPA • Rubens Eduardo de Toledo FAAP - SP • Sabina Anzuategui Casper Líbero/ Escritora/ roteirista • Tânia Hoff PPG ESPM SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO • Vander Casaqui PPG ESPM • Vicente Gosciola PUC, SP e PPG/ ANHEMBI MORUMBI 6. C omissão E ditorial e A rtística • Organização | Drª Glaucia Davino • Co-organização | Ms. Fernanda Nardy Bellicieri FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA • Editor Executivo | Ms Paulo Cezar Barbosa Mello • Identidade visual | Maria Lúcia Nardy Bellicieri 11 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 7. A poios e P arceirias • Apoio | Mackpesquisa • Parceiros • Autores de Cinema [Associação] • Latin America for games • Nevada University • Artemídia Videoclip [grupo de pesquisa IA UNESP] • Rede Internacional Imagens da Cultura Cultura das Imagens • Universidade Aberta de Lisboa • Cidade do Conhecimento [grupo de pesquisa USP] • Red Iberoamericana de narrativa audiovisuales CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 12 SUMÁRIO A P R E S E N TA Ç ÃO III SEMINÁRIO HISTORIAS DE ROTEIRISTAS G laucia Davino 19 P R E F Á C IO UM UNIVERSO PLURAL: MERCADO E ACADEMIA, PROFISSIONAIS E NOVOS TALENTOS. Alexandre H uady Torres G uimarães 28 C A P ÍT U L O 1 - P E NS AME NTO S, PRÁTICAS E REFLEXÕ ES N AS MÚ LTI P L AS TE L AS O PERSONAGEM CONCEITUAL E O CINEMA DE FICÇÃO-FILOSÓFICA 31 TELENOVELA: DA PRODUÇÃO À RECEPÇÃO. ASPECTOS DA FICÇÃO BRASILEIRA TRADICIONAL E TRANSMIDIÁTICA 50 IMPRESSÕES E EXPERIÊNCIAS NO ENSINO DE ROTEIRO NA UNIVERSIDADE ESCREVENDO A SESSENTA MÃOS 67 COMO TORNAR VISÍVEL O INVISÍVEL 90 Leonel A guiar | A ngela Schaun Maria A parecida Baccega Leandro V ieira Maciel Roberto Moreira ARTEMÍDIA INFLUENTE: ROTEIRO PARA CRIAÇÃO DE ATELIÊ-LABORATÓRIO NA INTERFACE ARTE CIÊNCIA E TECNOLOGIA. 102 ROTEIRO PARA GAME: O CASO DO GAME ACADÊMICO ILHA CABU 112 ENSINAR DRAMATURGIA AUDIOVISUAL- NOVOS PARADIGMAS EM TEMPOS DE DIGITAL 135 GÊNEROS TELEVISIVOS: RETOMADAS HISTÓRICO-CONCEITUAIS NA EXPLORAÇÃO DOS FORMATOS FICCIONAIS 150 Célio Martins Arlete dos da Matta | Pelópidas Cypriano de O liveira P el Santos Petry Luciana Rodrigues Silva Marcia P erencin Tondato 13 CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR C A P ÍT U L O 2 - R OT E IR O E H ISTÓ RIA: AN ÁLISE E TRAJETÓ RIA D O TE M P O UMA TRADUÇÃO VISUAL E SONORA DA FEIRA DO VER-O- PESO: EM BELÉM DO PARÁ, A ESTÉTICA NA CULTURA DE BORDAS. 164 I AM DRACULA – O VAMPIRO CAMALEÔNICO DO CINEMA 188 O NOME DA ROSA: UMA VIAGEM À IDADE MÉDIA PELAS MÃOS DE ANNAUD 201 MEMÓRIA E IMAGINAÇÃO NO TRATAMENTO CINEMATOGRÁFICO DA HISTÓRIA ESTRATÉGIAS NARRATIVAS NO CINEMA DE UGO GIORGETTI 215 HISTÓRIA E MÍDIA: O CINEMA COMO DOCUMENTO 229 Marlise Borges | Cilene N abiça Yuri G arcia Maria do Céu Martins Monteiro Marques Luciano V az F erreira Ramos Rosana Schwartz NARRATOLOGIA AUDIOVISUAL DO HIP HOP Marcos Zibordi 238 C A P ÍT U L O 3 - F R A GME NTAÇÃO VISUAL: ESTRUTURA, CRIAÇÃO E AN ÁL I S E JOGOS DIGITAIS E DISPOSITIVOS MÓVEIS: AS NARRATIVAS E A FRAGMENTAÇÃO DO ATO DE JOGAR 246 A EXPERIÊNCIA DA FICÇÃO ATRAVÉS DA EXPLORAÇÃO NO JOGO: O CASO DE RED DEAD REDEMPTION 260 A ESTÉTICA DO DOCUMENTÁRIO NO CINEMA CONTEMPORÂNEO DE FICÇÃO CIENTÍFICA. UM OLHAR SOBRE O FILME “DISTRITO 9” , DE NIELL BLOMKAMP. 274 DOJO DIGITAL – ESTÉTICA E CONSCIÊNCIA EM “SUPER STREET FIGHTER IV” 292 Bruno H enrique de P aula Alessandra Maia | Ivan Mussa Marcio A lmeida Ribeiro. F rancisco Tupy CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA C A P ÍT U L O 4 - DIÁ L OGOS : AN ÁLISES E IN TERTEXTUALID AD ES DA CRIAÇÃO AO ROTEIRO E DO ROTEIRO AO ROMANCE Maria Luiza G uarnieri A tik 14 319 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR ADAPTAÇÃO DE LITERATURA PARA O AUDIOVISUAL: TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO NO PROCESSO DE TRANSPOSIÇÃO ENTRE MEIOS. 331 A DANÇA DE AMÉLIE POULAIN 343 O ROTEIRO NO TEATRO DE CRIAÇÕES COLETIVAS E NO PERSONAGEM PALHAÇO 356 AMORES ARDENTES: A PAIXÃO DA REDE GLOBO PELO “IMPÉRIO DAS HEROÍNAS” E DO CINEMA BRASILEIRO PELOS MARGINALIZADOS SOCIAIS A PARTIR DE ADAPTAÇÕES DOS ROMANCES DE JORGE AMADO 372 F abrício Barbosa Cassiano Jean P ierre Chauvin Marlene F ortuna Márcio Rodrigo Ribeiro C A P ÍT U L O 5 - NA R R AT IVA S E SEMIO SIS: AN ÁLISES E MÉTO D O S A PERCEPÇÃO DA IDEIA DE IDENTIDADE NA MODERNIDADE LÍQUIDA: UMA ANÁLISE DO FILME GRAN TORINO 385 ROTEIROS DE AUDIODESCRIÇÃO: EM BUSCA DE UMA VISUALIDADE NO NÃO VER 398 Adalberto Bastos N eto F lávia Mayer ROTEIROS ROTEIROS ROTEIROS – MULTIFORMATO EM MULTIPLATAFORMAS 407 EU NÃO GOSTO DE SAMBA! UMA ABORDAGEM ACERCA DAS DIFERENÇAS PSICOSSOCIOCULTURAIS NO FILME “RIO”. 424 Regina Mota Isabel O restes Silveira | Mirtes de Moraes | N ora Rosa Rabinovich CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA C A P ÍT U L O 6 - C R IAÇ Ã O: P RO CESSO S CRIATIVO S SERIADO DESLOCADOS: GÊNESE DE UMA SÉRIE TELEVISIVA UNIVERSITÁRIA TENDO COMO BASE A ANÁLISE DOS ROTEIROS DE SITCOM’S DE SUCESSO 444 A EXPERIÊNCIA ESTÉTICA COMO REVELAÇÃO DO SER: INVESTIGAÇÕES SOBRE O JOGO CRIATIVO DO CINEMA DE AUTOR – UMA INTRODUÇÃO 459 A COR NA PROPOSIÇÃO DE ATMOSFERAS NARRATIVAS NO CINEMA 470 F ernando Luis Cazarotto Berlezzi | F ernanda N ardy Bellicieri P atricia Dantas Renata H einz 15 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR MARIZA, UM FILME 480 PROJETO EXPERIMENTAL: A ERA DA INFORMAÇÃO 498 Roberto G ustavo Reiniger N eto Mirna A yumi K ajiyama | G abriel Sidorenko | Mariana Buglia | Thiers G omes Silva C A P ÍT U L O 7 - R OT E IR O E MERCAD O O FLÂNEUR DA CONTEMPORANEIDADE 517 PRÓFUGOS: NOVOS FORMATOS NA FICÇÃO SERIADA LATINO-AMERICANA 529 GÊNEROS E FORMATOS AUDIOVISUAIS NOS ESTUDOS DE COMUNICAÇÃO NO BRASIL 542 SEGUNDA TELA: DESAFIOS DE UM MERCADO EM EXPANSÃO 554 GÊNESE DE UM PROGRAMA EDUCATIVO MULTIMÍDIA APLICANDO OS OBJETIVOS DO MILÊNIO 564 Isabela Sanchez | Raquel do N ascimento G omes Luiza Lusvarghi Aécio Magalhães Santos Elissa Schpallir Silva F ernando Luis Cazarotto Berlezzi | F red Izumi Utsunomiya CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO C A P ÍT U L O 8 - E M C ONS T R UÇÃO : PRO CESSO E CRIATIVID AD E EM CONSTRUÇÃO: A DESCOBERTA DE NOVOS AUTORES EM BUSCA DAS MÚLTIPLAS TELAS 581 O CATARINA 584 G laucia Davino Rodrigo A yres de A raújo DAS PÁGINAS PARA AS TELAS: PROPOSTAS PARA A TRANSPOSIÇÃO CINEMATOGRÁFICA DO ROMANCE ‘AGORA É QUE SÃO ELAS’ DE PAULO LEMINSKI 589 CONCERTO EM RÉ MAIOR 603 RESUMOS BILHETE 615 J oão K nijnik N icole Zatz Darlielson 16 de Sousa Lima FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR FOTO , A Artur H enrique da 616 Costa Pinto VITÓRIA 617 MARIZA - O FILME 618 ALCÂNTARA 623 G isele da Mota Trindade Roberto G ustavo Reiniger N eto Miriam Rezende G onçalves PROJETO EXPERIMENTAL: A ERA DA INFORMAÇÃO Mirna A yumi K ajiyama | G abriel Sidorenko | Mariana Buglia | Thiers G omes CONCERTO EM RÉ MAIOR N icole Z atz da Silva 625 639 CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 17 CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA Apresentação PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR III SEMINÁRIO HISTORIAS DE ROTEIRISTAS G laucia D avino Os Seminários Histórias de Roteiristas são eventos de cunho acadêmico e profissional realizados pelo grupo de pesquisa Núcleo Audiovisual (NAV) e o Centro de Comunicação e Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Seus objetivos são os de promover trocas de conteúdos acadêmicos, culturais e issionais nas áreas do roteiro audiovisual (cinema e outras mídias) com diálogo permanente com a tecnologia e a geração de novos conhecimentos. A terceira edição dos Seminários Histórias de Roteiristas contemplou o enfoque das múltiplas telas. Roteirista e público se envolvem atualmente com a multiplicidade telas, fixas, móveis, imensas, pequenas, 3D, 2D, etc. que relacionam sua diversidade em diálogos. Personagens da TV, cinema, games CAPA CAPA CAPA e outras modalidades viajam entre uma tela e outra. Cada individuo os vê sob perspectivas únicas pois a construção destes personagens e de suas trajetórias podem ser fornecidas de forma picotada e espalhada. Não se trata apenas de escolha de suporte de imagem e som para acessar determinados conteúdos. Se ele está longe de seu computador de tela de 21 polegadas, ele pode acessar o conteú- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO do de seu smatphone e esta é apenas uma opção. Também não se trata somente dos dispositivos de interatividade, em que o espectador “clica” e determina a ordem em que irá assistir às tramas narrativas, que é a segunda opção. Outra, dentre tantas opções, pode se estabelecer um diálogo quase randômico entre essas telas, determinado pelos recursos que o espectador tem naquele momento. As FICHA FICHAFICHA telas permitem a diversidade. Assim, o espectador pode montar seu conhecimento sobre a historia de seu interesse a partir de informações que ele absorve de várias plataformas de comunicação e expressão audiovisual. As atividades desta terceira edição/ Múltiplas telas foram realizadas em 29, 30 e 31 de outubro de PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA 2012, no Centro de Comunicação e Letras. O tema proposto está relacionado ao crescente prestígio do roteirista do audiovisual no Brasil e no  mundo e às necessidades mercadológicas e artísticas desencadeadas pela multiplicidade de formatos de concepção, produção, distribuição e recepção de 19 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR mensagens nos formatos, tamanhos e proporções mais diversos. S obre as atividades do S eminário / P rogramação As duas edições anteriores (2009 “Novo paradigma Audiovisual” e 2010 “Arte e comunicação na era dos roteiristas”) consolidaram experiências sobre a programação que foram adotadas em favor do 3º Seminário. Desta forma, foram oferecidos os mini cursos, palestras acadêmicas, apresentação de trabalhos nos GTs e workshops “Vivências e Experiências”. As novidades da terceira edição recaem sobre as Mesas de Debates e ao Concurso de Vídeos. M esas de D ebates CAPA CAPA CAPA Diferentemente das duas edições anteriores, à 3ª edição foram acrescentadas as “Mesas de Debates” com o intuito de tratar e debater assuntos contemporâneos e específicos do roteiro audiovisual, num trabalho conjunto com membros de outras instituições. A primeira mesa, foi concebida e organizada pelas professoras doutoras Letícia Passos Affini (PPG SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO TV Digital/ UNESP) e Débora Burini (UFSCAR) e abordou o tema “Desafios dos Roteiristas na TV Digital”. Participaram deste debate os professores doutores Adib Salomão - ECA - USP (São Paulo), Jefferson José Ribeiro de Moura - FATEA (Lorena) e UNITAU (Taubaté), Lauro Teixeira UNESP (Bau- FICHA FICHAFICHA ru) e Gerente de Programação da TV Aparecida (Aparecida), Letícia Passos Affini - UNESP (Bauru), Rosana Hermann - R7 e FAAP (São Paulo) com a mediação de Débora Burini (UFSCAR) O segundo debate girou em torno do tema “Ensino do Roteiro, Experiências e Resultados”. Esta mesa foi concebida e realizada pelo NUAMA- USP, com a coordenação dos professor doutores Roberto PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Moreira e Rubens Rewald. Neste debate participaram os professores Leano Vieira Maciel (Anhembi-Morumbi), Luciana Roigues Silva (FAAP), Renata Correia Lima Ferreira Gomes (SENAC), Roberto Franco Moreira (ECA-USP), Sabina Reggiani Anzuategui (Casper Líbero), Rubens Rewald (ECA 20 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR USP), com a mediação de Carlos da Silva Pinto (ECA USP). A terceira mesa de debates com o tema “Roteiro de Games”, foi concebida e realizada pelo Grupo de pesquisa Cidade do Conhecimento, coordenado por Gilson Schwartz e Ms Francisco Tupy Gomes Correa (USP), Neste debate participaram os professor doutores Marília Franco (USP), Pollyana N. Mustaro (Mackenzie), Sergio Bairon (USP), e Arlete dos Santos Petry (FMU) com a mediação de Tupy Gomes Correa (USP). P alestras Centrado no conhecimento de pesquisadores de longa e unda experiência acadêmica, com publicações de artigos e livros nas áreas da comunicação, linguagens, o ciclo de palestras teve o intuito de aproximar pesquisadores, novos pesquisadores e interessados, de trazer ao público um dos saberes CAPA CAPA CAPA consolidados, temas que envolvem o pensamento reflexivo sobre o audiovisual e propostas de novos desafios. A pesquisadora e uma das fundadoras do “Núcleo de Telenovela” (ECA USP), Maria Aparecida SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Baccega (ECA USP e PPG ESPM) versou sobre o gênero narrativo televisivo com ênfase nas telenovelas brasileiras. Ela é autora dos livros Trabalho e consumo, Gestão da Comunicação, Comunicação e Culturas do Consumo, Gestão de Processos Comunicacionais, Comunicação e Linguagem - discursos e ciência, dentre outros. Erick Felinto (PPG Comunicação da UERJ), abordou sob aspectos da filosofia e da comunicação o tema “Cinema de gênero no novo milênio”. O professor é autor de A Religião das Máquinas: Ensaios sobre o Imaginário da Cibercultura (Sulina, 2005), Passeando no Labirinto: Ensaios sobre as Tecnologias e Materialidades da Comunicação (EDIPUCRS, 2006) e Avatar – O futuro do cinema e a ecologia FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA das imagens digitais (Sulina, 2010, em co-autoria com Ivana Bentes), entre outros. ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 21 W orkshops V ivências e E xperiências Voltado ao público universitário, à pesquisadores, à acadêmicos e profissionais no ciclo de “Workshops Vivências e Experiências” profissionais da área compartilham suas experiências na prática da roteirização ou nos usos e funções dos roteiros, sem necessariamente estarem relacionadas ao universo acadêmico. Este ciclo tenta aproximar as reflexões sobre as relações entre teorias e realidades, entre a obra e o autor, etc. David Schmoeller, professor da Universidade de Nevada (LV, USA), diretor e consagrado considerado um dos ícones do gênero de terror, fez a projeção de seu último e inédito filme “Little Monsters” (2012) e explanou sobre o processo criativo do roteiro no gênero terror. Ana Paula, roteirista brasileira com vasta experiência em cinema e televisão e membro da Associação de Roteiristas (AR) desenvolveu workshop sobre a especialidade do “Roteiro para Series de TV”, da CAPA CAPA CAPA concepção, o fluxo de trabalho, a equipe, as estruturas, a forma criativa. O evento foi encerrado pelo workshop de Mara Mourão, produtora e diretora de documentários que trouxe para expor “Quem se Importa ou Todo Mundo Pode Mudar o Mundo” (inédito), experiência de construção documental em que empreendedores pequenos conseguem ajudar outras pessoas com SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO idéias e soluções simples. G rupos de T rabalho (GT s ) Esta atividade, tradicional e de caráter essencialmente acadêmica, reúne grupos de pesquisadores, seus pares, para exporem e debaterem resultados de seus trabalhos de pesquisa. Esses grupos foram formados segundo a proximidade de assuntos, abordagens, estética, etc. Como FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA sugestão inicial, porém em aberto, as propostas e respectivas publicações poderiam alinhar-se diretamente a um dos temas propostos e até três enfoques ou terem como proposta temas emergentes e/ ou referentes às buscas individuais. 22 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Os temas propostos foram • Criação (ementa) • Estudos teóricos; narratologia audiovisual; análise do roteiro, estética. • Prática do roteirista; manuais, técnicas e modelos de roteiros; “anti-modelos”; escrita fílmica e adaptações; personagem; métodos e procedimentos criativos; etapas de roteirização. Roteiro e Recepção. • Produção (ementa) • Relações da peça escrita ou de sua confecção com o desenvolvimento do trabalho do diretor; do fotógrafo; do diretor de arte; do ator; dos especialistas em efeitos especiais; dos atores; dos produtores; dos distribuidores e com as condições/recursos CAPA CAPA CAPA financeiros e materiais. • Mercado (ementa) • Relação do roteirista com o mercado; legislação; políticas de incentivos governamentais; SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO as modalidades e estética do trabalho dos roteiristas; mercado nacional e internacional; legislação e ensino/aprendizagem; roteiro e mídias. • História (ementa) • Abordagens e reflexões históricas, memorial, documental, arquivos e processos de construção da história do roteiro e da trajetória dos roteiristas. Biografias. Os roteiristas do cinema nacional e internacional. Linguagens e Inovações. Relações internacionais. Regionalização. Roteiristas e tecnologias contemporâneas. Os enfoques e ou linguagens sugeridas, mas não limitadas a elas, foram: 1. 23 Animação FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 2. Áudio e/ou Rádio 3. Cinema 4. Games 5. HQ 6. Institucional e documentário 7. Internet e mídias móveis 8. Mídias Digitais 9. Roteiros na Publicidade CAPA CAPA CAPA 10. Tecnologias 11. TV 12. Vídeo SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO 13. Outros ou Multidisciplinar A partir dos resumos submetidos e aceitos, formaram-se dez grupos com temas afins, ficando os GTs divididos desta forma a seguir. • Análises e Intertextualidades • Criação: Processos criativos • Diálogos audiovisuais: Contemporaneidade • Fragmentação audiovisual Estrutura, Criação e análise • Linguagens, experimentações, análises e práticas 24 FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR • Narrativas e Semiosis Análises e métodos • Roteiro e História: Análise e Trajetória no tempo • Roteiro e mercado • Televisão, Formatos, Tecnologia e multiplataforma • Especial: Processo e Criatividade em construção Cabe ressaltar que o grupo de trabalho Especial “Processo e criatividade em construção”, até então inédito, foi constituído por roteiristas iniciantes, fora dos moldes acadêmicos de artigos fechados para que seus participantes expusessem e debatessem seus roteiros, suas idéias, seus trabalhos em progresso. M ini C ursos Nesta rica malha de conhecimentos, durante os três dias, há participantes que desejam ampliar seus conhecimentos e realizam os mini cursos. Em “Múltiplas Telas” foram oferecidos dois: CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO • “Elaboração de projetos culturais e Economia Criativa” (duração 6 hs), teve como responsáveis Leonardo Cassio, Thais Polimeni e Willian Alexanino, sócios proprietários da empresa “Cultcultura Marketing”. Este curso foi realizado em dinâmica FICHA FICHAFICHA teórico-pratica sobre a formação de projetos para Lei de Incentivo à Cultura e a Cadeia da Economia Criativa no setor Audiovisual • O roteirista issional Di Moretti (AC), que participa destes seminários desde sua primeira edição, foi responsável pelo mini curso de 9 horas de duração, PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA de “Roteiro Básico”, no qual engloba temas específicos que descrevem a confecção de um roteiro cinematográfico, documental ou ficcional, curta ou longa-metragem, dividido em módulos que enfocam as diversas atividades 25 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR do roteirista. C oncurso e M ostra de V ídeo Para incentivar novos talentos, o terceiro seminário ofereceu um concurso de roteiro, com a mostra de vídeos intitulado “Vida de Roteirista”. Esta atividade foi criada e coordenada pelo aluno do curso de graduação de Publicidade e Propaganda, do Centro de Comunicação e Letras, Fernando Berlezzi. CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 26 CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Prefácio ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR UM UNIVERSO PLURAL: MERCADO E ACADEMIA, PROFISSIONAIS E NOVOS TALENTOS. Alexandre H uady Torres G uimarães Diretor do Centro de Comunicação e Letras - Universidade Presbiteriana Mackenzie No Salão Grand Café, na Paris de 1895, precisamente no dia 28 de dezembro, os irmãos Lumière libertaram as fronteiras da nossa imaginação com a exibição de dez filmes, entre eles o mais conhecido do grande público, L’Arrivée d’un Train à La Ciotat. Esse foi um marco histórico, entretanto o homem já contava sua história e suas histórias por meio de tecnologias que uniam imagens e movimentos como o zoopraxiscópio, o praxinoscópio, o fenacistocópio, o teatro de sombra e, também, por outros meios como as tapeçarias – a de Bayeux que conta CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO a conquista da Inglaterra pelos normandos –, as colunas – a Trajano que com imagens em sequência conta a vitória dos romanos sobre os dácios – e as pinturas rupestres muitas vezes gravadas em continuidade. FICHA FICHAFICHA O cinema amplia nossa capacidade de criar e recriar histórias perpetuando imagens, diálogos, trilhas sonoras, locais, épocas, personagens que chegam, inúmeras vezes, a ultrapassar barreiras geográficas e temporais criando e perpetuando diferentes imaginários e, inclusive, mitos. Cronologicamente posterior ao cinema, a televisão foi outra mídia que expandiu a nossa capacidade PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA de contar, de imaginar e de desfrutar a linguagem audiovisual. Passado quase meio século desde o evento dos irmãos Lumière, transmitindo do alto do Empire State Building, na cidade de Nova Iorque, em 1941, a NBC inaugurou a televisão. 28 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Dos anos 1940 para o século XXI, diversas outras mídias surgiram. Hoje, além dos prestigiosos e históricos cinema e televisão, novas múltiplas telas despontaram como campos de comunicação, de informação, de entretenimento, de arte e, consequentemente, de atuação para os roteiristas. Diante das mídias tradicionais, desafiado pelas novas mídias e pelas necessidades mercadológicas, o roteirista tem à sua disposição uma pluralidade de linguagens, de formatos, de distribuição, de produção, de formas de recepção, de estéticas que, acima de tudo, estendem e expandem as possibilidades de seu exercício profissional. Tendo em vista a movimentação e a dinâmica da área, são fundamentais os espaços de reflexão em que dialoguem as esferas acadêmica, cultural e profissional, como ocorre há três edições com os Seminários Histórias de Roteiristas realizados pelo grupo de pesquisa Núcleo Audiovisual (NAV) e pelo Centro de Comunicação e Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie. CAPA CAPA CAPA Espaços com esse reforçam o crescente prestígio dos roteiristas de audiovisual e concedem a possibilidade de contato, de comunicação e de correspondência entre os profissionais e destes com os estudantes, ou seja, com os novos possíveis talentos. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 29 Capítulo 1 Pensamentos, práticas e reflexões nas múltiplas telas CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR O PERSONAGEM CONCEITUAL E O CINEMA DE FICÇÃO-FILOSÓFICA Leonel Aguiar | Angela Schaun Professor do Programa de Pós-graduação em Comunicação Social da PUC-Rio. Doutor em Comunicação e Cultura pela UFRJ. | Professora adjunta e pesquisadora do Centro de Comunicação e Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ. CAPA CAPA CAPA R esumo A proposta desse artigo é estudar os olhares de determinados estudiosos brasileiros sobre um fenô- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO meno comunicacional francês: o filme O Abecedário de Gilles Deleuze. Para conhecer certos aspectos das influências do pensamento deleuziano, pesquisa alguns autores e artigos que discutem as questões teóricas presentes nessa obra de Deleuze. Como premissa, entende que O Abecedário não FICHA FICHAFICHA é um documentário com a gravação de uma longa entrevista de um filósofo. A partir da apropriação conceitual produzida pelos autores brasileiros pesquisados, o filme é analisado como possibilidade de invenção de um personagem conceitual para atuar em uma nova forma de expressão para o pensamento: o cinema de ficção-filosófica. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Palavras-chave: cinema de ficção-filosófica; personagem conceitual; formas de expressão. ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 31 A bstract The purpose of this essay is to study some Brazilian scholars’s point of views about a French communicational phenomenon: the Gilles Deleuze’s film The Abecedaire. In order to learn about certain aspects of the influences of Deleuzian thoughts, this essay studies some authors and articles that discuss the theoretical issues present in such Deleuze’s work. As a premise, this essay understands that The Abecedaire is not a documentary that contains a record with a philosopher`s long interview. From the conceptual appropriation made by Brazilian authors who were surveyed, the film is analyzed as a possible invention of a conceptual character born to act in a new form to express a thought: the philosophical-fiction film. Keywords: fiction-philosophical film; conceptual character; forms of expression. CAPA CAPA CAPA I ntrodução Para que serve uma conversa, pergunta Deleuze. A resposta é encontrada no poema de Bob Dylan, pois para os dois pensadores não serve para o pensamento “sentar e meditar/perdendo e contemplando o tempo/pensando pensamentos que não foram pensados”1. Esse trabalho, portanto, se en- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO saia como uma conversa, pois seríamos todos ladrões de pensamento que produzem encontros pela e na escritura, construindo e reconstruindo. Encontrar é achar, é capturar, é roubar, mas não há método para achar, nada além de uma longa pre- FICHA FICHAFICHA paração. Roubar é o contrário de plagiar, de copiar, de imitar ou de fazer como. A captura é sempre uma dupla-captura, o roubo, um duplo-roubo, e é isso que faz, não algo de mútuo, mas um bloco assimétrico, uma evolução a-paralela, núpcias, sempre “fora” e “entre”. Seria isso, pois, uma conversa (DELEUZE e PARNET, 1998, p. 15). PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA O Abecedário de Gilles Deleuze (1996) foi exibido em um seminário promovido pelo Núcleo de 1 32 Trecho de um poema de Bob Dylan citado por Deleuze. Cf. DELEUZE e PARNET (1998, p. 15). ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Cinema e Vídeo (NCV) do Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)2 durante três dias, em setembro de 2004. O ensaio aqui apresentado tem como proposta revelar determinados aspectos das influências do pensamento deleuziano a partir de autores e artigos que discutem as questões teóricas presentes nessa obra de Deleuze. Escolhemos dois filósofos que, além de terem participado desse evento, também produziram artigos sobre o filme: Jorge Vasconcellos, autor do artigo “Estilo e criação filosófica: apontamentos sobre a constituição de novos meios de expressão filosófica, O Abecedário de Gilles Deleuze” e Elton Luiz, autor do artigo “Letra G, de Gilles”3. Capturamos de Vasconcellos a idéia de ficção-filosófica, produzida também nas obras de Rosset (1995; 1999) e de Flusser (1998). Já de Elton Luiz, tomamos a vinculação entre personagem conceitual, humor e conversação, segundo os próprios conceitos deleuzianos. Dessas duplas capturas, emergiu o personagem conceitual no cinema de ficção-filosófica: o professor que encontra a concepção musical de aula, heterônimo do filósofo. Em CAPA CAPA CAPA suma, esse artigo é tributário dos trabalhos de Jorge Vasconcelos e Elton Luiz, dos quais “roubamos” e misturamos as principais linhas de potência do pensamento sobre o filme deleuziano. 453 SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO minutos Ao pensar sobre a relação entre estilo e criação filosófica, Jorge Vasconcelos (2006, p. 47) lembra que, em Diferença e Repetição, Deleuze já apontava para a importância de se continuar a pesquisar novos FICHA FICHAFICHA meios de expressão após a reincorporação do poema e do aforismo à filosofia realizada por Nietzsche. Essa pesquisa, segundo Deleuze, deveria prosseguir estando relacionada com a renovação que acontecem no teatro e no cinema. Autor de dois livros que são, simultaneamente, de cinema e de filosofia4, Deleuze assume, no filme O Abecedário, um personagem conceitual (DELEUZE, 1997, p. 2 O seminário O Abecedário de Gilles Deleuze na UERJ (2004) exibiu o filme pela primeira vez em uma instituição pública de ensino superior no Brasil com legendas em português. Mais detalhes sobre a programação e o evento em http:// br.geocities.com/NCVUERJ/. O filme foi apresentado em três partes, nos dias 21, 22 e 23 de setembro de 2004. 33 3 Os dois artigos estão publicados no livro organizado por Jorge Cruz (2006): Gilles Deleuze: sentido e expressões. 4 A imagem-movimento e A imagem-tempo, lançados originalmente em 1983 e 1985. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 81) para experimentar novas possibilidades de formas de expressão filosófica: “Deleuze, em O Abecedário, faz ficção-filosófica” (VASCONCELLOS, 2006, p. 61). Quando aceita o convite de Claire Parnet para filmar uma longa conversa com 453 minutos de duração que toma, como ponto de partida, as 26 letras do alfabeto, Deleuze inventa, conjugando as inspirações abertas por Vasconcellos e Luiz, o cinema da ficção-filosófica encenado por um personagem conceitual. O filme O Abecedário de Gilles Deleuze (1996), dirigido por Pierre-André Boutang, recebeu uma cláusula de só ser divulgado após a morte de Deleuze, pois o filósofo considerava inconcebível responder a uma questão sem ter refletido com maior rigor. Conforme sua declaração no início da filmagem: “já me sinto reduzido ao estado de puro arquivo de Pierre-André Boutang, de folha de papel, e isso me anima muito, é quase no estado de puro espírito, eu falo, falo... após minha morte...” (DELEUZE, 1996). Está criado, pela singularidade do estilo deleuziano, o personagem conceitual, o “heterônimo” do filósofo, enquanto que o nome do próprio filósofo não passa do simples CAPA CAPA CAPA pseudônimo de seu personagem. O personagem conceitual é o oposto do filósofo – ou melhor, “o filósofo é somente o invólucro de seu principal personagem conceitual” (DELEUZE e GUATTARI, 1997, p. 86). Como na enunciação SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO filosófica não se faz algo dizendo-o, mas faz-se o movimento por intermédio de um personagem conceitual, pensando-o, esse se torna o agente de enunciação e, simultaneamente, potências de conceitos. Platão escreveu por Sócrates; Nietzsche assinou “Dionísio crucificado”; Deleuze inventa, a partir dessa filmagem, o “professor da aula musical” em descaracterização da aula magistral realizada na FICHA FICHAFICHA universidade. Um concerto de pop’filosofia, onde “não há nada a compreender, nada a interpretar” (DELEUZE e PARNET, 1998, p. 12), pois os conceitos são intensidades como sons, cores ou imagens. Assim, “os princípios em filosofia são gritos, em torno dos quais os conceitos desenvolvem verdadeiros cantos” (DELEUZE e GUATTARI, 1995, p. 09). PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Mil Platôs (1995) retoma a dupla articulação entre forma de conteúdo – a máquina social técnica – e forma de expressão – a máquina coletiva semiótica constituinte dos regimes de signos – para apontar 34 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR que o conteúdo e a expressão possuem, em desdobramento, uma forma e uma substância5. Percorrendo a trilha de Vasconcelos, podemos apontar que Deleuze recria esta articulação no Abecedário, pois para ele “o próprio cinema é uma nova prática das imagens e dos signos, cuja teoria a filosofia deve fazer como prática conceitual” (DELEUZE, 2005, p. 332). 4 de novembro de 1995 A câmera desliza sobre uma multidão que ouve o filósofo, mas não escutamos o que ele diz. Uma suave trilha sonora e a voz de Parnet nos impedem de ouvir o que se fala: a ex-aluna nos alerta que Deleuze sempre se negou a aparecer na televisão. Em 1988, entretanto, no início das filmagens do Abecedário, talvez por achar a sua doença parecida com a “petit mort” entoada pela delicada canção francesa, ele mudou de opinião. A partir de uma cláusula de que o filme só fosse exibido após sua CAPA CAPA CAPA morte, Deleuze faz sua primeira intervenção: “eu falo depois de minha morte” (DELEUZE, 1996). Seguindo a pista de Elton Luiz (2006, p. 15), sugerimos que o humor deleuziano aspira a uma alegria espinosista: anuncia que não conhece bem os temas propostos para as conversações e que apenas refletiu um pouco sobre as questões; mas que, entretanto, a cláusula o “salva”, pois os espectadores SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO do filme sabem que “um puro espírito não dá resposta muito profundas, nem muito inteligentes, é um pouco sumário” (idem). O humor deleuziano transparece quando ele, já sabendo que sua fala ficaria para a posteridade, FICHA FICHAFICHA pois estaria morto, avisa que sobreviverá como imagem e palavra, ou seja, como signo (LUIZ, 2006, p.17). Para Espinosa, a imortalidade é inseparável de uma alegria que a filosofia é capaz de produzir, pois um homem que é capaz de expandir sua potência consegue reduzir, ao mínimo, “o poder de subtração do acontecimento-morte” (idem, p. 16). Os que são afetados pela potência do pensamento deleuziano permitem que esse afeto perdure como imortalidade. Essa alegria possi- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA bilitada pela filosofia é, antes de tudo, mais estética do que intelectual: se não podemos conhecer 5 Essa discussão aparece em dois textos: “10.000 a.C. – A Geologia da Moral (quem a Terra pensa que é)”; “20 de novembro de 1923 – Postulados da Linguística”. Ver, respectivamente, volumes 1 e 2 de Mil Platôs. 35 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR essa imortalidade, podemos senti-la como um campo de intensidade. A questão espinosista acerca da imortalidade-intensiva nos permite entender, conforme aponta Elton Luiz no artigo “Letra G, de Gilles”, que – ao se converter naquilo que sua filosofia mesma afirma – Deleuze se torna, no Abecedário, em um signo expressivo que habita a superfície do acontecimento-tempo. “Deleuze metamorfoseou-se em sentido incorporal encarnado no signo material que o evoca. Para além da imagem-movimento-Deleuze, mas habitando-a, vive a imagem-tempo-Deleuze” (LUIZ, 2006, p. 17). É esse “Deleuze-signo” que, no exercício da sua potência, “ri da morte que dele só levou a menor parte” (idem, p. 18) e a parte maior que perdura, intensamente, é o exercício criativo de um devir-criança. Elton Luiz lembra que desde Heráclito até Nietzsche, a criança se constitui como personagem conceitual de uma filosofia do devir. Em Heráclito, com sua imagem da existência como um jogo de criança; em Nietzsche, no trecho “As três metamorfoses do espírito” de Assim falou Zaratustra, CAPA CAPA CAPA com a alegoria representada pelos três estágios que o homem e a própria filosofia atravessam, expressas na tipologia do burro, do leão e da criança. O próprio Deleuze ressalta que um filósofo merece viver sua vida enquanto um devir-criança: dizer sim ao que ainda não emergiu, afirmando desse modo que aquilo que já emergiu tem que ser superado para que o novo produza a sua emergência e SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO se torne possível. “Um pouco de possível, senão eu sufoco” (DELEUZE, 1992, p. 131). A frase de Foucault foi repetida, em entrevista sobre a morte do amigo, por Deleuze ao afirmar que o pensamento jamais foi questão FICHA FICHAFICHA de teoria e sim “problema de vida, é a própria vida”. Como a criança diz sim à vida, Deleuze muda de opinião em relação ao momento de exibição do filme e, com seu assentimento, O Abecedário é exibido, entre novembro de 1994 e maio de 1995, no canal franco-alemão TV Arte. No dia 4 de novembro de 1995, Deleuze precipita-se, talvez (in)voluntariamente ou não, para a morte. “São os organismos PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA que morrem, não a vida” (idem, p. 179). ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 36 B estiário filosófico Deleuze está sentado à frente de uma cômoda, em cima da qual há um espelho. Pendurado na parede, seu conhecido chapéu. Quase em frente ao filósofo, está Claire Parnet. A câmera localiza-se atrás do ombro esquerdo dela, suas costas estão parcialmente visíveis, ocupando um terço do quadro. Com a abertura do ângulo, seu rosto reflete-se no centro do espelho, atrás de Deleuze. Esse espelho oferece o encantamento do duplo: no momento em que coloca o rosto de Parnet de frente para o espectador, este é capturado para entrar na tela: o espelho inesperado faz brilhar o rosto que o filósofo vê, mas também faz aparecer aquela quem olha e conversa com o filósofo. Tal reflexo mostra aquilo que os espectadores olham no primeiro plano. A lembrança de um texto clássico de Foucault – “Las meninas”, em As palavras e as coisas (1999, p. 03-21) – é inevitável. “Talvez haja, neste quadro de Velásquez, como que a representação da representação clássica e a definição do espaço que ela abre” (FOUCAULT, 1999, p. 20), pois, nessa dispersão que a imagem reúne e exibe em conjunto, o sujeito CAPA CAPA CAPA representado é elidido e a representação pode se dar como pura representação. O que se apresenta na cena, lá em Velásquez, como aqui em Deleuze, é o desaparecimento necessário daquilo que funda a representação, daquele a quem a imagem se assemelha e daquele a cujos olhos ela não passa de semelhança. Esse sujeito representado – lá na pintura, como no filme – foi elidido: Deleuze apresen- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ta-se como um personagem conceitual do seu próprio fazer filosófico. O Abecedário é uma obra única: apresenta-se como uma conversação 6 na perspectiva nietzschiana em oposição ao diálogo socrático. “Uma conversa, o que é, para que serve?” (DELEUZE e PARNET, FICHA FICHAFICHA 1998, p. 07). Para Deleuze, é difícil “se explicar – uma entrevista, um diálogo, uma conversa; quando me colocam uma questão, mesmo que ela me interesse, percebo que não tenho estritamente nada a dizer” (idem, p. 09). O importante, ressalta, é a arte de construir um problema mais do que responder as questões. “Uma entrevista poderia ser simplesmente o traçado de um devir” (idem, p. 10). Ao invés de um abecedário, Deleuze provavelmente teria preferido um “bestiário” como o de “uma PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA certa enciclopédia chinesa” transcrita por Jorge Luis Borges e que inicia o prefácio de As palavras e 6 37 Cf. LUIZ (2006, p. 11) e VASCONCELLOS (2006, p. 60). ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR as coisas: ‘Os animais se dividem em: a) pertencentes ao imperador, b) embalsamados, c) domesticados, d) leitões, e) sereias, f) fabulosos, g) cães em liberdade, h) incluídos na presente classificação, i) que se agitam como loucos, j) inumeráveis, k) desenhados com um pincel muito fino de pêlo de camelo, l) et cetera, m) que acabam de quebrar a bilha, n) que de longe parecem moscas’. No deslumbramento dessa taxonomia, o que de súbito atingimos, o que nos é indicado como o encanto exótico de um outro pensamento, é o limite do nosso: a impossibilidade patente de pensar isso (FOUCAULT, 1999, ix). Para Foucault, o que transgride todo o pensamento possível, no texto de Borges, é a série alfabética CAPA CAPA CAPA (a, b, c, d) que liga, a todas as outras, cada uma dessas categorias. Para nós, entretanto, O Abecedário de Deleuze apresenta-se como um acaso nessa linha pré-ordenada que é o abecedário. Segundo José Gil (2000), o alfabeto – composto de letras que formam palavras e frases para articular uma questão e construir um problema – não deve ser confundido com uma gramática ou um código. Para esse au- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO tor, o alfabeto é uma potência virtual e móvel, um simples meio para se aprender a pensar. Por isso, “não só permite pensar as singularidades como continua também o pensamento de autores a que se aplica” (GIL, 2000, p. 15). Podemos, portanto, inventar que uma alegoria para se compreender o pensamento de Deleuze seja o alfabeto; ou melhor, um abecedário de conceitos deleuzianos que nos FICHA FICHAFICHA evite cair na armadilha do pensamento representativo, agrupado sob as categorias de identidade e de unidade, como aponta José Gil. Melhor do que um abecedário filosófico: um bestiário filosófico. O Abecedário é, como afirma Elton Luiz, uma conversação sobre conceitos que emergem nos platôs deleuzianos (LUIZ, 2006, p. 09). A conversação não é um diálogo platônico ou socrático, no qual o PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA contexto comunicacional requer, como pressuposto fundamental, o bom senso entre os interlocutores. “O efeito da partilha do bom senso é a suposição de um senso comum universal” (idem). Esta suposição se toma como a premissa o fato de que um dos participantes do diálogo é o representante 38 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR do senso comum. Para esse autor, o diálogo platônico-socrático deve apresentar evidências de que opiniões divergentes encontrarão uma solução única com a revelação da verdade. É através desse modo de construção do diálogo que o filósofo platônico – isto é, o portador da verdade – “demonstra que o lugar de sua enunciação coincide com a neutralidade de um sujeito do enunciado” (idem). Já a conversação aponta é uma criação que se desdobra em “quarta pessoa do singular” (DELEUZE, 2006, p. 143), um sujeito coletivo de enunciação produzido no agenciamento. Ao contrário do que ocorre no diálogo platônico, onde um dos interlocutores procura impor-se diante de seu rival, na conversação-agenciamento o que se busca é criar as condições de possibilidade para a emergência de um ‘terceiro indivíduo’, no qual cada indivíduo comprometido com o processo de conversação será incorporado como uma espécie de sub-in- CAPA CAPA CAPA dividualidade. Este ‘terceiro indivíduo’ está presente em cada sub-indivíduo como potência de pensar não-egóica e não pessoal. Esse ‘terceiro indivíduo’, segundo Deleuze, é a “quarta pessoa do singular”, cuja subjetividade é automodeladora de seus universos incorporais de referência SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO (LUIZ, 2006, p. 11). Na perspectiva desse autor, não se trata, portanto, de uma questão de poder, mas de potência. Deleuze utiliza-se do humor contra a ironia socrática (DELEUZE, 2006, p. 138), estratégia retórica FICHA FICHAFICHA sempre presente nessa perspectiva de diálogo. O destino da ironia está ligado à representação, pois ironia assegura a individuação do representado ou a subjetivação do representante. A ironia clássica consiste em mostrar que o mais universal na representação se confunde com a extrema individualidade do representado que lhe serve de princípio. “Há, na ironia, uma pretensão insuportável: a de PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA pertencer a uma raça superior e ser a propriedade dos mestres” (DELEUZE e PARNET, 1998, p. 83). O humor solicita, ao contrário, de um devir-minoritário: é ele quem faz uma língua gaguejar, que lhe impõe um uso menor ou constitui todo um bilingüismo na mesma língua. O humor não utiliza 39 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR jogo de palavras, equívocos que pertencem ao significante, que são como um princípio dentro do princípio. O humor é a arte das conseqüências, faz alguma coisa fluir: o humor é uma arte dos acontecimentos puros. Nunca se trata de jogos de palavras, mas de acontecimentos de linguagem, uma linguagem minoritária tornada, ela própria, criadora de acontecimentos. F icção - filosófica Para Vasconcellos (2006, p. 47), Deleuze já ressaltava, em Diferença e repetição (1988), a importância da filosofia pesquisar novos meios de expressão. “Já não será possível escrever um livro de filosofia como há muito tempo se faz” (DELEUZE, 1988, p. 18). Lembra Vasconcellos que, em Nietzsche (1985), Deleuze apontou que o pensador alemão reintroduziu o aforismo e o poema na filosofia. “Nietzsche integra na filosofia dois meios de expressão: o aforismo e o poema” (DELEUZE, 1985, CAPA CAPA CAPA p. 17). Se Nietzsche faz de seu estilo de escrita, em cada um de seus livros, uma forma de expressão muito mais próxima da dança do que propriamente da literatura ou da escrita literária – “escrever como quem baila” (VASCONCELLOS, 2006, p. 50) –, Deleuze prefere ter um estilo que está mais próximo da composição musical. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO A composição de um livro é algo que não se resolve previamente. Ela acontece ao mesmo tempo em que o livro é escrito. Há dois livros meus que me parecem compostos. Sempre dei importância à composição. Penso FICHA FICHAFICHA em um livro chamado Lógica do sentido que é composto por séries. Para mim, é uma composição serial. E Mil platôs é uma composição por platôs. Para mim, são duas composições musicais, sim. A composição é um elemento fundamental do estilo (DELEUZE, 1996). PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Vasconcellos (2006, p. 53) discute como Clement Rosset pode afirmar que os textos filosóficos, em função de seu caráter reflexivo, não fogem ao domínio geral da literatura, apesar de se constituírem em um domínio particular. Os textos filosóficos pertencem ao domínio da literatura “pela simples ra40 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR zão de que são, como um romance, uma poesia, uma peça de teatro, exclusivamente constituídos de palavras” (ROSSET, 1995, p. 62). Ou seja, é possível dizer que o texto filosófico também é um gênero literário: o gênero “ficção-filosófica”. Vasconcellos lembra que Rosset segue a perspectiva aberta por Nietzsche ao afirmar que a filosofia também é ficção (ROSSET, 1999, p. 54). Em seu texto “Da ficção filosófica” (2001), Gustavo Bernardo lembra que, entre alguns filósofos que tiveram uma relação de proximidade com a ficção, Wittgenstein chegou a sugerir que convinha fazer filosofia como poesia. Para Vilém Flusser, em Ficções Filosóficas (1998), o tratado filosófico não encontra mais adequado à situação da cultura: Há muito tempo estou com a idéia de que o tratado filosófico não mais se adequa à situação da cultura, de que os filósofos acadêmicos são gente morta, e de que a verdadeira a filosofia atual é feita por gente como Felli- CAPA CAPA CAPA ni, como os criadores de clips, ou os que sintetizam imagens. Mas como eu próprio sou prisioneiro do alfabeto, e como sou preso da vertigem filosófica, devo contentar-me em fazer textos que sejam pré-textos para imagens. A maneira de fazê-lo é escrever fábulas, porque o fabuloso é o SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO limite do imaginável (FLUSSER, 1998, p. 07). A possível alternativa entre a sistematicidade do tratado e a fluência do ensaio, Vilém Flusser chamou de “ficção filosófica”. FICHA FICHAFICHA A tarefa dos filósofos, conforme Deleuze e Guattari, é inventar conceitos do mesmo modo que um romancista cria seus personagens. Estamos, então, diante dos personagens conceituais da filosofia e o filósofo deve se preocupar não só com o que está sendo escrito, mas como está sendo escrito. Na filosofia, pensar e escrever são indissociáveis. Para Vasconcellos (2006, p. 61), O Abecedário é uma PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA nova forma de expressão filosófica, na qual Deleuze faz ficção-filosófica, ou segundo a própria terminologia deleuziana, pop’filosofia: “não há questão alguma de dificuldade nem de compreensão: os conceitos são exatamente como sons, cores ou imagens, são intensidades que lhes convêm ou 41 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR não, que passam ou não passam” (DELEUZE e PARNET, 1998, p. 12). Nesta mesma direção, podemos, foucaultianamente, apostar que Deleuze inventa uma narrativa de cinema: o filme de ficção filosófica encenado por um personagem conceitual. Na letra P de professor, encontramos a modo de construção desse personagem conceitual – o professor da aula musical. No momento da filmagem, Deleuze vivia seu primeiro ano sem dar aulas, depois de exercer o magistério no ensino médio e na universidade durante 40 anos. “Uma aula é ensaiada. É como no teatro e nas cançonetas, há ensaios. Se não tivermos ensaiado o bastante, não estaremos inspirados. Uma aula quer dizer momentos de inspiração, senão não quer dizer nada” (DELEUZE, 1996). Inspiração já presente quando era professor do ensino médio, onde, mesmo sendo muito consciencioso ao seguir o currículo mínimo da disciplina, era capaz de tocar serrote em sala de aula. Ainda era a época em que o professor de filosofia era recebido com muita complacência, perdoavam-lhe muitas coisas porque ele era uma espécie CAPA CAPA CAPA de louco, de idiota da aldeia. Eu podia praticamente fazer tudo que quisesse. Eu ensinava meus alunos a tocar serrote: eu tocava e todos achavam normal. O serrote, como você sabe, tem de ser curvado e obtemos o som num ponto da curva. São as curvas móveis que lhes interessavam muito SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO (DELEUZE, 1996). O destino do filósofo é transformar-se em seu personagem conceitual, ao mesmo tempo que esse personagem conceitual se torna, ele mesmo, coisa diferente do é historicamente. As possibilidades FICHA FICHAFICHA de vida ou os modos de existência não podem inventar-se, senão sobre um plano de imanência que desenvolve a potência de personagens conceituais. O rosto e o corpo dos filósofos abrigam estes personagens que lhes dão, frequentemente, um ar estranho, sobretudo no olhar, como se algum outro visse através de seus olhos. Ou, como afirmam Deleuze e Guattari: “nós, filósofos, é por nossos PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA personagens que nos tornamos sempre outra coisa, e que renascemos como jardim público ou zoológico” (1997, p. 97). Traçar, inventar, criar: esta é a trindade filosófica. Cada personagem conceitual inventar seu próprio modo de expressão. Já na universidade, Deleuze inventa um novo modo de 42 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR expressão: a “concepção musical de aula”, ao invés do termo – muito usado na academia – aula magistral, do professor que fala sem interrupções. Uma aula é uma espécie de matéria em movimento: é por isso que é musical. Uma aula é tanto emoção quanto inteligência. Não é uma questão de entender e ouvir tudo, mas de acordar em tempo de captar o que lhe convém pessoalmente. É por isso que um público variado é muito importante (DELEUZE, 1996). Se a filosofia mobiliza e trata de conceitos, uma aula implica que haja vocalizações dos conceitos – “o mais importante é a relação entre a voz e o conceito” (DELEUZE, 1996). Os filósofos elaboram um estilo, que para Deleuze é algo puramente auditivo: “o estilo é sonoro, só me interessa a sonoridade”. Outro ponto destacado, ainda nessa relação entre audição de uma música e a concepção musical CAPA CAPA CAPA de aula, é que o público não interrompe o andamento da música, mas pode muito bem interromper palavras. Não interrompemos a música, mas podemos muito bem interromper palavras. O que significa uma concepção musical de aula? Conhecendo o que SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO foi meu público, penso: ‘sempre tem alguém que não entende na hora. E há o que chamamos de efeito retardado’. Também é como na música. Na hora, você não entende um movimento, mas, três minutos depois, aquilo FICHA FICHAFICHA se torna claro porque algo aconteceu nesse ínterim. Uma aula pode ter efeito retardado. Podemos não entender nada na hora e, dez minutos depois, tudo se esclarece. Há um efeito retroativo. Se ele já interrompeu... É por isso que as interrupções e perguntas me parecem tolas. Você pergunta porque não entende, mas basta esperar (DELEUZE, 1996). Deleuze destaca a importância de um público variado nas aulas e para realizar esse “concerto musical” inventou o termo pop’filosofia: a filosofia deve ser dirigida tanto a filósofos quando a não-filóso43 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR fos. Do mesmo modo, a pintura está voltada tanto aos pintores e quantos aos não-pintores e a música não se dirige preferencialmente aos especialistas em música, mas aos músicos e aos não-músicos. A filosofia deve ser exatamente igual, dirigir-se tanto a não-filósofos quanto a filósofos, sem mudar. Quando dirigimos a filosofia aos não-filósofos, não temos de simplificar. É como na música. Não simplificamos Beethoven para os não-especialistas. É a mesma coisa com a filosofia. Para mim, a filosofia sempre teve uma dupla audição: uma audição não-filosófica e uma audição filosófica. Se não houver as duas, ao mesmo tempo, não há nada. Senão, a filosofia não valeria nada (DELEUZE, 1996). C omunicação e duplo instável CAPA CAPA CAPA Foi em Conversções que Deleuze voltou a criticar os “universais da comunicação”; aliás, em sua obra encontramos vários momentos permeados pelas críticas a todo tipo de universais. Na verdade, o que ele propõe em primeira instância é a valorização de paradoxos em contraponto às doxas do senso comum e do bom senso. Sua perspectiva está longe de estabelecer consenso entre indivíduos de va- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO riados pontos de vistas e que vão em busca de uma intersubjetividade universalizante e idealizada, a exemplo de Habermas. A comunicação para Deleuze desestabiliza, pois sempre ocorre no âmbito da heterogênese, a saber: “quando a comunicação é estabelecida entre séries heterogêneas, toda sorte FICHA FICHAFICHA de conseqüências flui no sistema. Alguma coisa ‘passa’ entre os bordos; estouram acontecimentos, fulguram fenômenos do tipo relâmpago ou raio” (DELEUZE, 1988, p. 197 -198). Alessandro Sales (2005) buscou refletir sobre relações possíveis entre comunicação e semiótica na obra de Deleuze. Para esse autor, a conclusão é de que existe sempre uma “espécie de desnível, de PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA desequilíbrio entre as séries, cuja comunicação é garantida pelo estatuto de um terceiro: o objeto = x, o precursor sombrio em Diferença e Repetição, a casa vazia na Lógica do Sentido” (SALES, 2005, p. 9). Na verdade, identifica-se o duplo na realização de um terceiro. O duplo, enquanto conceito, que 44 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR é um aspecto fundamental na construção criativa da obra deleuzeana. Como escapar da fala excessiva e vazia? Deleuze (1992, p. 170) aponta um outro caminho. “A filosofia consiste sempre em inventar conceitos. O conceito é o que impede que o pensamento seja uma simples opinião, um conselho, uma discussão, uma tagarelice. Todo conceito é forçosamente um paradoxo”. Para ele, a racionalidade comunicativa nunca foi capaz de produzir conceitos (DELEUZE e GUATTARI, 1992, p.14). Buscando uma analogia dessas questões com o Abecedário, podemos dizer que Deleuze e Claire Parnet buscam criar justamente esse elemento que impede o fechamento das séries em uma situação de espelho perfeito, de pura semelhança, pela qual um objeto nada mais faria que refletir a imagem do outro, o que terminaria podando qualquer tipo de deslizamento, de escape, de novidade (SALES, 2005, p.9). CAPA CAPA CAPA Em Diferença e Repetição, Deleuze afirma essa instabilidade do duplo. Se supomos que as séries entram em comunicação sob a ação de uma força qualquer, vemos que esta comunicação relaciona diferenças a outras diferenças ou constitui, no sistema, diferenças de diferenças: “estas diferenças em segundo grau desempenham o papel de ‘diferenciante’, isto é, relacionam umas às outras as diferen- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ças de primeiro grau” (DELEUZE, 1988, p. 196-197). No final de Conversações, Deleuze cria o conceito de sociedade de controle, onde o aspecto político é relacionado, mais uma vez, à comunicação. Para ele, a racionalidade comunicativa teria encontrado FICHA FICHAFICHA lugar como sustentação teórica dos requisitos e normas relativos ao imaginário predominante nos mercados e nas mídias (SALES, 2005). A comunicação nada tem a ver com o pensamento nem com a criação. Retomando a idéia de conceito enquanto ato de criação, e buscando estabelecer um ponto de ligação PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA entre o problema da filosofia e o da comunicação no filme o Abecedário podemos dizer que nos 453 minutos de conversação com Claire Parnet, Deleuze está o tempo todo estabelecendo um duplo sentido, onde parece buscar sair da fala enquanto simples ato e encontrar o paradoxo do conceito, onde 45 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR algo finalmente acontece. O conceito é o que impede que o pensamento seja uma simples opinião, um conselho, uma discussão, uma tagarelice. Todo conceito é forçosamente um paradoxo. Para Deleuze, a racionalidade comunicativa nunca foi capaz de produzir conceitos (DELEUZE e GUATTARI, 1992, p.14). Em o Abecedário fica ainda mais evidente a missão que Deleuze se propõe de abolir com a fala, enquanto comunicação, por considerá-la envelhecida, passada, apodrecida. Para ele, urge um desvio, algo que a torne instável e criativa. Em entrevista a Toni Negri, Deleuze manifesta sua idéia de que “talvez a fala, a comunicação, estejam apodrecidas. É preciso um desvio da fala. Criar foi sempre coisa distinta de comunicar. O importante talvez venha a ser criar vacúolos de não-comunicação, interruptores, para escapar ao controle” (DELEUZE, 1992, p. 217). Para Alan Badiou (1997, p. 47-49), todo o empreendimento levado por Deleuze está voltado a um mo- CAPA CAPA CAPA vimento de duplo percurso, golpe de pensamento que precisa se dar sem mediações, em velocidade absoluta, segundo um método intuitivo. A idéia do duplo, da dupla articulação, está contida numa ação informal, de um lado enquanto contidas no conceito de páthos e de poíesis e, do outro, numa atividade mais empírica, que poderia abrigar a idéia do logos e da alétheia, ambos parte de um mes- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO mo processo, que se apresentam enquanto figuras conceituais comunicantes, o dentro e o fora, que produzem no movimento, na instabilidade, o acontecimento, o sentido. Em Conversações, Deleuze afirma que “os signos são as imagens consideradas do ponto de vista de FICHA FICHAFICHA sua composição e de sua gênese. É a noção de signo que sempre me interessou” (DELEUZE, 1992, p.83). C onsiderações PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA finais O que Deleuze faz é retomar a dupla articulação entre forma de conteúdo e forma de expressão, apontando que o conteúdo (a máquina social técnica) e a expressão (a máquina coletiva semiótica constituinte dos regimes de signos) desdobram-se em uma forma e uma substância. O que tentamos 46 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR demonstrar nesse trabalho foi que esta dupla articulação é recriada no Abecedário, durante todo o tempo, uma letra do alfabeto, qualquer que seja, nunca remete ao seu significante, ela sempre cria um paradoxo, desestabiliza, pois é letra e signo, cuja possibilidade é infinita e não se restringe ao campo dominado do significante. Os grandes diretores de cinema são como grandes pintores ou grandes músicos: são eles que melhor falam do que fazem. Mas, falando, tornam-se outra coisa, tornam-se filósofos ou teóricos (...) Tanto assim que sempre há uma hora, meio-dia ou meia-noite, em que não se deve mais perguntar ‘o que é cinema?’, mas ‘o que é filosofia?’(DELEUZE, 2005, p. 332). Então, um dia, talvez, o cinema possa ser deleuziano. R eferências AGUIAR, Leonel. Deleuze, um personagem conceitual no cinema de ficção-filosófica. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DA SOCINE, 9., 2007, Rio de Janeiro. CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ____. Deleuze e Foucault: amizade filosófica e questões em torno da noção de poder. Trabalho apresentado no seminário O Abecedário de Gilles Deleuze na UERJ, 21-23 set. 2004, Rio de Janeiro. BADIOU, Alan. Deleuze: o clamor do ser. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. BERNARDO, Gustavo. Da ficção filosófica. In:___. Dubito Ergo Sum. Rio de Janeiro: [s.n.], 2001. Disponível em: http://www.dubitoergosum.xpg.com.br/editor05.htm. Acesso em: 25 jan 2007. DELEUZE, Gilles. Lógica do sentido. São Paulo: Perspectiva, 2006. FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ____. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 2005. ____. L’Abécédaire pour Gilles Deleuze. Produção e direção de Pierre-André Boutang. Entrevista de Claire 47 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Parnet. Paris: Éditions Montparnasse, 1996. 3 dvd. ____. Conversações. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992. ____. Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 1988. ____. Nietzsche. Lisboa: Edições 70, 1985. ____; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? 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Se a importância desse produto cultural é fato incontestável, reafirmamos que o menosprezo da academia, por um longo tempo, parece ter significado uma “aprovação silenciosa, num desaprovando SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO debochado” dos jogos que a telenovela sempre instituiu. Afinal, lugar da reflexão e da crítica, compete à Universidade produzir e divulgar novos olhares, científicos e não de senso comum, dialógicos e não maniqueístas (bom e mau) sobre os produtos da FICHA FICHAFICHA indústria cultural, colaborando, assim, para a construção de uma nova variável histórica. Esse, aliás, um dos objetivos prioritários da inserção social da Universidade. U m P ouco D e H istória PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA A primeira característica à qual podemos atribuir o êxito da telenovela é seu caráter narrativo. A 1 Livre-Docente da Escola de Comunicações e Artes da USP. Decana do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da ESPM. Coordenadora do OBITEL-Brasil/ESPM e da RIEC-Brasil. 50 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR narrativa acompanha desde sempre o ser humano, desde que o homem adquiriu a faculdade de representar. Como lembra Milly Buonanno 2, o termo narrativa, na sua acepção alargada, pode ser utilizado para qualquer forma de conto de imaginação que a história humana tenha conhecido – da pintura rupestre à poesia épica, às obras teatrais, aos diversos gêneros de prosa literária; da narração cinematográfica, aos quadrinhos e aos desenhos animados. Contemporaneamente, o termo ficção tende a ser utilizado em duas principais e específicas acepções: a primeira se circunscreve, no âmbito literário, à produção em prosa de romances e novelas; a segunda se refere, no âmbito da mídia, à produção narrativa de televisão, ou ficção televisiva. O narrador sempre ocupou lugar de destaque nas sociedades: quer seja ao redor da fogueira, quer seja nas cortes ou nas ruas, quer seja nos jornais, no rádio, na televisão e, agora, na chamada ciber- CAPA CAPA CAPA cultura. Embora se pudesse lembrar, para estabelecer as origens da telenovela, que Charles Dickens tinha o hábito de dramatizar seus romances diante do público usando vozes diferentes e Mark Twain declamava seus contos, consideramos mais adequado estabelecer a origem desse formato de narrativa – a SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO telenovela – em meados dos Anos 20, na soap opera americana, transmitida pelo rádio. Na América Latina, o ponto de partida é Cuba, que vai incluir no formato mais tarde transformado em gênero, a característica do melodrama, que tão bem espelha a América Latina. Segundo Délia FICHA FICHAFICHA Fiallo3, em Cuba “o gênero teve um curioso antecedente nos ‘leitores de tabacaria’, os quais, para entreter os trabalhadores enquanto estes torciam e despalhavam as folhas de tabaco, liam as novelas melodramáticas e românticas mais famosas, seguindo a preferência de seu auditório”. Essas afirmações de Délia Fiallo nos remetem ao período Glória Magadã, ou Maria Magdalena Iturrioz, 2 BUONANNO, Milly. Leggere la fiction. ‘Narrami o diva revisitata’. Napoli, Liguori Ed., 1996. p. 19 3 FIALLO, Délia. La telenovela, el viejo melodrama que nunca muere. Comunicación. Estudos venezolanos de comunicación. Nº 91. 3º trimestre de 1995. p. 16. Os dados históricos referentes a Cuba foram retirados desse artigo. 51 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR no Brasil. Fugida da Revolução Cubana, essa selecionadora de sinopses da Colgate-Palmolive cubana, que nunca havia escrito uma radionovela ou uma telenovela, carrega consigo as sinopses que lá estavam e com elas acaba por se tornar, no Brasil, durante alguns anos, a “dona” da teledramaturgia, fazendo adaptações não de obras teatrais, mas de sinopses dos dramaturgos cubanos, sem conhecimento deles. A radionovela cubana prossegue com êxito e entre seus dramaturgos se destaca Félix B. Caignet, autor de Chan Li Po, A serpente vermelha, entre outras, e da mais conhecida de todas, O direito de nascer, a qual, no Brasil, foi apresentada no rádio, com enorme êxito. Além das transmissões radiofônicas, foram produzidos, à época, livretos, que continham os capítulos da novela e eram vendidos em bancas de jornais (duas mídias como suporte, portanto). Também já teve duas versões para telenovela (Tupi, 1965 e Tupi, 1978). No Brasil, a primeira telenovela diária aconteceu em 1963, chamava-se 2-5499 Ocupado, escrita por CAPA CAPA CAPA Dulce Santucci. Baseada em original do argentino Alberto Migré, teve Glória Menezes e Tarcísio Meira nos papéis principais e foi veiculada pelo Canal 9 (Excelsior, São Paulo) e Canal 2 (Rio de Janeiro). Segundo Ismael Fernandes4, “desde então a telenovela já mostrava seu poder de penetração junto às massas. Um rapaz, no Sul do país, foi obrigado a mudar o número do seu telefone por coincidir com SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO o número do título da telenovela”. Certamente essa penetração da telenovela – como afirma Délia Fiallo – é que deve ter levado Gabriel Garcia Marques a Cuba para perguntar a Félix Cagnet o segredo do seu sucesso. Ou ainda deve ser o FICHA FICHAFICHA que embasa a afirmação de Jorge Amado, citada no mesmo artigo: “Seria muito classista pensar que são tolas as milhões de pessoas que vêem uma boa telenovela em todos os países do mundo”. A telenovela brasileira tem suas raízes na telenovela cubana. T elenovela B rasileira : D as T radicionais À s S ocioculturais 4 52 FERNANDES, Ismael. Telenovela brasileira. Memória. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 39 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Na verdade, produto antropofagicamente construído pelos brasileiros, que deglutiram as influências do circo, do folhetim e do cordel, da soap opera, dos cubanos e de Glória Magadã, já se pode percebê-la em fases: da brasilidade que Beto Rockfeller, de Bráulio Pedroso, instalou às novelas críticas dos tempos da ditadura, sobretudo década de 70 e princípios da década de 80, quando dramaturgos como Dias Gomes e Lauro César5, cassados do teatro, abrigam-se na televisão, dividindo o país em povoados onde se exercita a crítica e se prega a liberdade, até à telenovela contemporânea, escrita e dirigida por uma equipe e não mais por um único autor e diretor, com todos os problemas daí decorrentes. Nas primeiras telenovelas – início da década de 60 –, as quais podemos chamar tradicionais, a concepção de mundo era maniqueísta, dividindo os personagens entre bons e maus, sem possibilidade de mudança; os diálogos eram pobres e as situações, baseadas em estereótipos consagrados por todas as classes sociais: o homem é o que pensa e decide e a mulher é um ser emocional dele dependente; CAPA CAPA CAPA existem profissões só masculinas e só femininas; os médicos são sempre abnegados e os políticos, corruptos; a família era sempre do tipo nuclear, com pai, mãe e filhos, etc. Diferentemente, passamos a ter, no elenco das telenovelas que podemos chamar de socioculturais, a presença da complexidade social, em todas as esferas: as personagens deixam de ser planas, com possibilidade de construir seu SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO próprio “destino”, em interação com o contexto socioeconômico-cultural, à vista do telespectador. Abordam-se novas temáticas e se modifica o tratamento dado ao melodrama e à estruturação dos capítulos. A família vai se configurar de modos múltiples, incluindo arranjos familiares, mais de FICHA FICHAFICHA acordo com a sociedade; a corrupção e o mau caratismo nem sempre são punidos, como é o caso da novela Vale tudo; ou Belíssima, de Sílvio de Abreu, não há personagens só boas ou só más e, talvez o mais importante, cria-se um número grande de subtramas que passam a ter grande importância no desenvolvimento da história, gerando a possibilidade de discussão múltipla de uma ampla variedade de temas e exposições de vários pontos de vista. A história de amor, central, não desaparece, mas PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA se torna muito mais complexa. Esta é a telenovela brasileira. 5 MUNIZ, Lauro César. Nos bastidores da telenovela. Comunicação & Educação nº 4. São paulo, CCA/ECA-USP; Moderna, set/dez de 1995. p.94-103 53 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Sobre ela falam, hoje, 200 milhões de brasileiros. E falam também alguns milhões de estrangeiros. Conforme aponta Márcia Perencin Todato6, as exportações americanas, hegemônicas no período 6570, começam a declinar após 72. Seu lugar é ocupado pelas produções de México, Brasil, Argentina e Venezuela, da qual 70% são telenovelas. “Num contexto de internacionalização, a ficção é promovida e, dentro dela, o melodrama revela seu potencial de universalidade. Neste processo, a telenovela, formalmente derivada da soap opera americana, se destacou como um produto acessível, ideal para exploração publicitária, até tornar-se o principal produto de exportação cultural de países tradicionalmente importadores, se não invertendo, pelo menos modificando os fluxos de comunicação internacionais. Ver novela diariamente é muito difícil tanto para homens quanto para mulheres. A novela já é feita para não ser vista diariamente, ela tem uma estrutura dramatúrgica que prevê a “repetição”, de tal modo que aqueles que só podem vê-la duas ou três vezes por semana não vão perder o conteúdo da CAPA CAPA CAPA história. Renata Pallottini7, dramaturga e pesquisadora, lembra que também pela extensão do gênero, quem escreve telenovela sabe que deve repetir, e não apenas pode fazê-lo – redundar é um dever. O que é SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO mau é redundar pura e simplesmente. O autor de telenovela – a quem um amigo meu chama carinhosamente de “noveleiro” – sabe que precisa repetir, mas sabe também que deve: • repetir de outro modo; FICHA FICHAFICHA • repetir com outro personagem; • repetir acrescendo informação.” 6 TODATO, Márcia Perencin. Telenovelas exportadas. Mimeo. Apresentado no XXI Congresso da Intercom, Recife, Pe, 1998. 17p. 7 PALLOTTINI, Renata. Dramaturgia de televisão. São Paulo, Moderna, 1998. Optamos pela citação de todo o trecho por considerá-lo importante para nossas reflexões sobre telenovela. 54 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR T elenovela : I nfluência D a e N a S ociedade Ainda que a pessoa nunca se sente diante da telenovela e faça questão de dizer que nunca se sentou diante dela, ela estará discutindo a temática da telenovela porque é a que estará presente no seu local de trabalho, no seu meio de transporte, nos jornais, nos telejornais. Podemos afirmar, então, que tanto as telenovelas educam as pessoas quanto as pessoas, através de pesquisas de opinião e outros meios, influenciam os rumos de uma telenovela. As telenovelas abordam temas que estão presentes na sociedade. Ela se institui como relação ficção e realidade, ou seja, a própria temática da telenovela emerge daquele período histórico, daquela sociedade em que está vivendo o artista, em que está vivendo o dramaturgo. A partir daí, evidencia-se a relação com a sociedade, o que, aliás, é característica de qualquer produção no nível da superestrutura. No momento em que a telenovela vai para o ar, ela tem dez, quinze, CAPA CAPA CAPA até vinte capítulos gravados. São os primeiros capítulos. Esses capítulos emergiram dessa história construída a partir do tema que veio da sociedade e que tem o dramaturgo como intermediário. A partir dos capítulos seguintes há uma interação com a sociedade, através de pesquisas, como hoje se sabe, através da própria repercussão na mídia, através de fatos históricos, ou de catástrofes, enfim SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO de acontecimentos que possam ocorrer naquele período. Tudo isso vai estar presente na telenovela. A telenovela brasileira, que é um gênero construído pelos brasileiros, e que se diferencia de todas as produções de ficção televisiva seriada existentes no mundo, incluindo a maioria das telenovelas latino-americanas, é uma obra em aberto, onde há uma interação permanente entre a obra que está FICHA FICHAFICHA sendo levada e a sociedade que está opinando, que está interferindo de algum modo, nos caminhos dessa própria telenovela. Há uma interação permanente. Toda a produção dos meios de comunicação, e não só a telenovela, está marcada pelos processos de interpretação-recepção de outros discursos, midiáticos ou não que envolvem o emissor/produtor e o receptor/usuário. Existirá sempre um PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA diálogo, uma interlocução, ainda que mediata, indeterminada, até mesmo tênue. Afinal, o sujeito-comunicador, no caso o dramaturgo, forma-se no conjunto dos discursos sociais, nos quais se banha, reelaborando-os. 55 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Essas interações com a sociedade não significam que a telenovela venha a se desfigurar em função daquilo que a sociedade quer que aconteça. A sociedade quer que se mate um personagem. Esse personagem será morto, dentro da história, se no universo ficcional, arquitetado pelo dramaturgo com base na verossimilhança, convier que ele seja morto, se isso não prejudicar a espinha dorsal da história que o dramaturgo planejou. Há, portanto, uma grande influência da sociedade, do momento histórico etc, mas não no sentido de que essa influência venha a desfigurar a telenovela enquanto construção que circula no universo ficcional, com suas “regras” próprias, características desse gênero. A R ecepção D a T elenovela Os receptores tornam-se co-produtores do produto cultural. São eles que o (re)vestem de significado, possibilitando a atualização de leituras, o rompimento de caminhos pré-estabelecidos de significa- CAPA CAPA CAPA dos, a abertura de trilhas que poderão desaguar em reformulações culturais8. Durante o período em que a telenovela está sendo exibida, existe uma apropriação daquilo que está acontecendo na telenovela: moda, música, determinadas expressões lingüísticas, determinados jeitos de ser etc. No entanto, isso não se incorpora na população. A telenovela se confronta sempre com o SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO conservadorismo que caracteriza a população. E não apenas do receptor individual, aquele que assiste à telenovela e a interpreta. No caso desse gênero televisivo, a recepção é constituída por uma rede de receptores que se falam, se comunicam, FICHA FICHAFICHA que dialogam entre si ou com publicações especializadas. Ou seja: a recepção da telenovela, ainda que num primeiro momento se constitua num ato individual que acontece numa sala com ruídos domésticos, telefones tocando e filhos chorando ou brincando ruidosamente, acaba entrando no circuito dos diálogos ente as pessoas nos locais de trabalho, nas feiras livres, nos espaços públicos em PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA geral. E, além disso, a recepção é uma cadeia da qual fazem parte, também, as publicações especiali8 Outras reflexões sobre recepção feitas por nós estão publicadas em Recepção: nova perspectiva nos estudos de comunicação. Comunicação & Educação, São Paulo, (12), 7 a 16, mai/ago.1998. 56 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR zadas, como a tradicional Contigo, além das colunas ou suplementos dos jornais, onde a construção de sentidos se realiza. E tudo isso ocorre, hoje, na rapidez das redes sociais. Nessa rede, aquela recepção primeira, solitária, reformula-se, constituindo-se apenas em uma das vozes nessa polifonia da recepção. E, ao retornar à telenovela (cuja exibição dura em média 6 a 8 meses) vai engendrando um significado outro, resgatando o potencial de significados dela que, de outro modo, ficaria escondido. E o significado da telenovela resultará, portanto, não apenas dela própria enquanto produção, nem apenas da relação de sua temática com a realidade, mas do processo de recepção que, na verdade, compreende os e resulta dos aspectos anteriores. Ou seja: o sentido se constrói no encontro emissor-receptor, carregando traços de ambos. P ara L er A T elenovela : A lgumas O bservações CAPA CAPA CAPA A telenovela proporciona a experiência da sensação de viver determinadas situações, e não uma análise conceptual dessas situações. No entanto, ela não se limita a “refletir” passivamente essa experiência e, por isso, embora contida na ideologia, possibilita o distanciamento dela. Permite ao telespectador “sentir” e “apreender” a ideologia da qual se originou, não no sentido do conhecimento SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO da “verdade” que a ideologia mascara, mas no sentido de que a vivência emocional de uma situação permite conhecê-la numa de suas dimensões e leva à transformação do sujeito-receptor. Como diz Terry Eagleton, não se trata de “conhecimento científico – o tipo de conhecimento, por exemplo, do FICHA FICHAFICHA capitalismo que nos é dado pel’O Capital de Marx e não por Hard Times de Dickens”. A vivência da experiência pela emoção pode “conduzir-nos no sentido da compreensão plena da ideologia que é o conhecimento científico”9. Assim, a telenovela permite o exercício da faculdade de julgar, própria do telespectador. Esse “julga- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA mento” está preso, obviamente, ao universo do espectador: ele vai “iluminar” determinados conceitos e pré-conceitos que circularam na telenovela e submetê-los a esse universo. Nesse diálogo se es9 57 EAGLETON, Terry. Marxismo e crítica literária. Porto, Afrontamento, 1976. p. 31 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR tabelecerá a interpretação, a qual, ainda que vinculada à hierarquia dos valores dos telespectadores, ao instituir o diálogo acaba por permitir uma reflexão com conseqüências no “real”. A ficção mostra um outro horizonte para o mundo que está sendo vivido. Ela não reflete esse mundo, nem apenas o refrata. Trabalha no território entre reflexo e refração, possibilitando que aí sejam construídas e “experimentadas” pelo telespectador novas experiências, instaurando novos horizontes. As fronteiras da ficção, enfim, não se desfazem. Elas permanecem claramente determinadas, ainda que algumas das conexões temáticas que circulam no universo ficcional sejam extremamente próximas da realidade vivida pelo receptor. Isso porque, no mundo ficcional, a relação entre os temas e os horizontes de possibilidades se dão num outro universo, que se fixa apenas quando o leitor adentra o universo da ficção, no qual se tematiza a própria relação entre tema e horizonte de possibilidades. E é essa condição que conduz o telespectador “no sentido da compreensão plena da ideologia que é o conhecimento científico”. T ransmidialidade E P rodução D e I nteratores À L uz D a N arrativa T elevisiva Esta parte do trabalho tem sua autoria dividida com Andrea Antonacci, mestranda da ESPM e bol- CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO sista do PROSUP-CAPES, e Mariana Garatelli, bolsista de iniciação científica da ESPM. O surgimento das redes digitais estabeleceu novas configurações nos âmbitos da produção, circulação e consumo dos meios de comunicação de massa. De um lado, produtores iniciaram ações diver- FICHA FICHAFICHA sas – tanto para estar presente neste ambiente digital quanto para tentar garantir a manutenção de público. De outro, consumidores encontram um novo cenário para consumir produtos midiáticos. Jesús Martín-Barbero nos fala das conexões propostas entre comunicação e cultura, colocando a tecnicidade como um dos processos relevantes nas mudanças culturais ocorridas em nossa sociedade a PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA partir da cibercultura. Ao fugir do determinismo tecnológico, Martín-Barbero posiciona nosso olhar para enxergar tecnicidade não como sinônimo de aparatos digitais mas sim para novas maneiras de percepção e linguagem que surgem a partir da comunicação digital interativa. (MARTÍN-BARBERO, 58 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 2002, p. 10-11). Ainda ao advogar contra análises centradas no caráter puramente tecnológico, Martín-Barbero, no prefácio do livro Hipermediaciones, do argentino Carlos Scolari, reflete: todas as tecnologias da comunicação são sociais pelo valor que imprimem a seus produtos, pelos processos de consumo que desatam e pelas ligações que estabelecem com outras tecnologias (…). Todas as tecnologias da comunicação são cognitivas, pelo modo que transformam nossa percepção de mundo, pela capacidade de nos reprogramarmos como usuários, pelo que nos deixam (é nós nos deixamos) fazer (MARTÍN-BARBERO IN SCOLARI, 2008, p. 14). Que caminhos a narrativa da telenovela parece estar tomando na cibercultura? Recorremos a Slater, para quem “é através das formas de consumo culturalmente específicas que produzimos e reprodu- CAPA CAPA CAPA zimos culturas, relações sociais e, na verdade, a sociedade” (SLATER, 2002, p. 131). Assim, faz-se necessário estabelecer um diálogo entre a presença das telenovelas nas redes digitais e a construção social ocorrida a partir do consumo da narrativa teleficional. Assim: As culturas dos sujeitos, as práticas socioculturais de ambos os polos SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO (emissão e recepção) dão as trilhas da produção e da recepção e fundamentam a interpretação dos programas televisivos. E provavelmente servem de suporte às transformações desses conteúdos televisivos nas ou- FICHA FICHAFICHA tras plataformas (BACCEGA, 2012, p. 1304). A internet como personagem O melhor exemplo que temos, até agora, é a telenovela Cheias de Charme. Levada ao ar no horário PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA das 19h, estreou em 16 de abril de 2012 com um claro propósito da produção: ampliar a audiência na ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 59 emergente classe C, que em 2011 passou a representar 54% da população brasileira 10. Assim, inovou ao colocar como protagonistas três empregadas domésticas, normalmente relegadas a personagens acessórias. Na trama, Penha (Taís Araújo), Rosário (Leandra Leal) e Cida (Isabelle Drummond) são domésticas, criam um grupo musical e conquistam o sucesso. Com bons índices de audiência, que ultrapassavam os 30 pontos11, Cheias de Charme representou uma inovação na Rede Globo pois, pela primeira vez, uma cena importante do enredo foi exibida antes na internet. Trata-se do clipe Vida de empreguete, que foi lançado no site oficial da emissora e em 24 horas teve 4 milhões de acessos. Em crítica da jornalista Patrícia Kogut publicada em seu blog no site O Globo, um dos autores da telenovela, Filipe Miguez, confirma a relevância da internet na trama, colocando-a como um dos personagens. “E o internauta, quando reproduz o clipe, criando memes, passa a difundir e viralizar conteúdo para a novela” (KOGUT, 201212). A estratégia adotada pela Rede Globo em Cheias de Charme vem ratificar esse olhar voltado ao uni- CAPA CAPA CAPA verso digital. Ela foi a pioneira no país na inclusão da transmidialidade, integrando novas plataformas de comunicação em suas produções teleficcionais. Utilizamos o conceito de transmidialiade de Henry Jenkins, para quem: uma história transmídia desenrola-se através de múltiplas plataformas de mídia, com cada novo texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ideal da narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de melhor [...]. Cada produto determinado é um ponto de acesso à franquia como um todo. A compreensão obtida por meio de diversas mídias sustenta uma profundidade de experiências que motiva mais consumo (JENKINS, 2009, p. 138). FICHA FICHAFICHA A Globo possui uma de suas centrais dedicada a projetos dessa natureza – Central Globo de Desenvolvimento Artístico (CGDA). Embora tenha iniciado as ações voltadas à transmídia em 2007, a temporada 2006-2007 de Malhação contou com um blog para uma das personagens da série, que PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA 10 Disponível em: <http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/redacao/2012/03/22/classe-c-inclui-mais-da-metadeda-populacao-brasileira-em-2011-mostra-pesquisa.jhtm>. Acesso em junho de 2012. 11 Disponível em: http://virgula.uol.com.br/ver/noticia/diversao/2012/05/17/300447-cheias-de-charme-surpreende-econquista-audiencia-de-novela-das-nove. Acesso em junho de 2012. 12 Disponível em: <http://oglobo.globo.com/cultura/kogut/posts/2012/05/25/critica-cheias-de-charme-pioneira-emcasamento-com-internet-446958.asp>. Acesso em junho de 2012. 60 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR consistia na publicação de conteúdo com histórias sobre esoterismo – um dos temas abordados na ficção. Em 2009, a emissora ampliou a proposta interativa de Malhação, promovendo sua primeira websérie. No mesmo ano, foi lançado o programa Ger@l.com, que utilizava além da plataforma televisiva, internet, o microblog twitter e celular. Em telenovela, podemos destacar Caminho das Índias e Viver a Vida (ambas de 2009), que lançaram mão de conteúdo informativo ou serviços em blogs, revista feminina online, newsletter, vídeos das gravações etc. No caso de Viver a Vida, a Globo criou o Portal da Superação e o blog Sonhos de Luciana. O primeiro, como o nome já adianta, trouxe casos de superação, com depoimentos verídicos de pessoas que enfrentaram situações difíceis mas transpuseram as adversidades. Já Sonhos de Luciana apresentou relatos em primeira pessoa da personagem (vivida pela atriz Alline Moraes) e de sua rotina de superação após tornar-se tetraplégica em um acidente de ônibus. Em ambos, a emissora abriu espaço para comentários do público e Sonhos de Luciana trouxe antecipação de elementos da CAPA CAPA CAPA trama da telenovela na mídia social (FECHINE; FIGUEIRÔA, 2011, p. 45-48). Recentemente, Ti Ti Ti, Passione, Insensato Coração (2010-2011) Cordel Encantado e Morde & Assopra (2011) são produções que utilizaram transmidialidade e interatividade. Nelas, encontram-se, por SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO exemplo, elementos da trama que foram adiantados –Ti Ti Ti –; pistas sobre assassinatos – Passione; blog de personagens que ganharam popularidade como os de Jacques Leclair (Alexandre Borges) e Victor Valentim (Murilo Benício) – ambos em Ti Ti Ti – e Natalie Lamour (Deborah Secco), em Insensato Coração; blog informativo como o de paleontologia da personagem Júlia (Adriana Esteves) FICHA FICHAFICHA em Morde & Assopra e jogos – para vestir as personagens – Cordel Encantado –, encontrar fósseis – Morde & Assopra – e até consertar problemas de encanamento numa casa – Fina Estampa –, dentre outros. Mas, se anteriormente a Rede Globo já utilizava estratégias transmidiáticas e interativas, Cheias de PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Charme mostrou-se a experiência mais audaciosa e, ao mesmo tempo, bem-sucedida da emissora no processo de integração entre redes digitais e telenovela. Além de o uso da internet para adiantar um conteúdo da trama transformar-se em sucesso, a emissora criou o concurso “A empregada mais cheia 61 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR de charme do Brasil”, para que os telespectadores criassem um videoclipe mostrando seu talento. O concurso foi lançado no programa Fantástico. O produtor do clipe mais criativo ganharia participação na telenovela. Além disso, elaborou uma campanha para as redes sociais que nasceu na ficção mas chegou à vida real. Na novela, as domésticas foram presas depois do sucesso conquistado pelo clipe. Os amigos Elano (Humberto Carrão) e Kleiton (Fábio Neppo) elaboraram a campanha #empregueteslivres. O resultado na vida real: entrou para os assuntos mais comentados (trending topics) do twitter. A chegada aos trending topics também não é novidade nas telenovelas da Globo. Personagens como a Gérson (Marcello Antony) e Diana (Carolina Dieckmann) de Passione, Naomi (Flávia Alessandra) de Morde & Assopra, Vinícius (Thiago Martins) de Insensato Coração são alguns dos que ganharam notoriedade no twitter. Inovadora é a maneira como Cheias de Charme faz uso das redes digitais, utilizando estratégias de transmídia e crossmídia e, especialmente, dando novos espaços para a par- CAPA CAPA CAPA ticipação do interator na trama. De fato, interpelar e engajar o espectador como interator13 parece ser cada vez mais importante, não somente em termos propriamente comerciais como também para conferir uma roupagem contempo- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO rânea a formatos e gêneros midiáticos mais tradicionais, como no caso da telenovela, preservando seu interesse e relevância em tempos de convergência e transmidialidade. (CASTRO, 2012, p. 36). A participação do receptor de maneira ativa – modificando inclusive a trama – também não é inova- FICHA FICHAFICHA ção. O que muda no cenário de redes digitais é a velocidade e a capilaridade – “agora tudo ocorre com uma velocidade maior e tem condições de atingir um número quase incalculável de pessoas” (BACCEGA, 2012, p. 1298). Além da quantidade de usuários, há ainda um caráter tribal estabelecido. São criadas novas redes de pessoas, que se relacionam tendo como base gostos em comuns. Em defesa de seu caráter social, André Lemos afirma que “a cibercultura não é uma cibernização da socie- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA dade, mas a tribalização da cibernética” (LEMOS, 2010, p. 90). Outro autor a pensar na participação 13 A autora utiliza o conceito de interator de Janet Murray para designar receptores que são também produtores em plataformas transmidiáticas. 62 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR social dos espectadores é Scolari: Basta terminar a emissão de um episódio de uma série televisiva, para poucos minutos depois, os fóruns e páginas web entrem em estado de agitação. Os espectadores discutem o texto que acabaram de ver, analisam suas possíveis continuações e debatem sobre os personagens e a trama do episódio. Ou seja, em muitos casos a construção de mundos possíveis deixou de ser um processo individual para converter-se em um processo coletivo que se desenvolve nas redes sociais (SCOLARI, 2011, p. 130). Em diálogo com a teoria proposta por Martín-Barbero – de transferir os estudos comunicacionais dos meios para as mediações – Scolari sugere que ampliemos nosso campo de visão para as hipermediações14. Ainda em seu blog, ao comentar sobre o conteúdo proferido por Martín-Barbero em CAPA CAPA CAPA conferências realizadas em universidades de Barcelona, no ano de 2010, Scolari enfatiza a atenção dada pelo teórico à narrativa: Jesús Martín-Barbero não deixou de mencionar a fragmentação das audiências e experiências de consumo audiovisual, a dissolução das barreiras SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO entre os meios e os processos de convergência… Qual convergência? A tecnológica? A empresarial? Segundo ele a convergência mais interessante é a narrativa, a convergência de relatos que moldam nossas indentida- FICHA FICHAFICHA des e surfam pelos meios e pelas redes (SCOLARI, 2010, tradução nossa). Os caminhos da narrativa – apropriações e ressignificações das tecnicidades As ressignificações narrativas anteriormente mostram a atualidade das colocações de Omar Rincón 14 Hipermediação é entendida por Scolari como o processo de “intercâmbio, produção e consumo simbólico desenvolvidos em um entorno caracterizado pela grande quantidade de sujeitos, meios e linguagens interconectados tecnologicamente e de maneira reticular entre si” (SCOLARI, 2008). 63 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR sobre os modos de contar. Para este autor, a narração ocorre a partir de regras narrativas15 para compreender e imaginar histórias (RINCÓN, 2006, p. 102). O filósofo Paul Ricoeur tem uma elucidativa reflexão sobre inovação e sedimentação no discurso. Qualquer desvio só é possível com base numa cultura tradicional, que cria espectativas para o que será revelado por quem cria a narrativa (RICOEUR, 2000, p. 194). Nas colocações de Rincón e Ricouer, vislumbramos um diálogo com o papel das temporalidades no processo cultural. Raymond Williams classifica as mediações culturais em três categorias – residual, dominante e emergente. Embora haja narrativas dominantes, elas estão em constate negociação com os discursos residuais (aqueles que nascem no passado e mantêm sua presença na atualidade) e com os emergentes – matrizes culturais recentes (WILLIAMS, 1979). Isso se pode perceber com mediana clareza nos videoclipes produzidos pelos espectadores a partir de Vida de empreguete: há discursos que imperam mas também há outros que surgem, num processo de negociação entre dominante, re- CAPA CAPA CAPA sidual e emergente. (Vejam-se o vídeo das estudantes baianas e o videoclipe Vida de piriguete, entre outros) Quando a telenovela reaparece nas outras plataformas podemos também verificar as camadas de SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO sentido presentes nos novos produtos. Ou seja: acompanhar o palimpsesto, verificar quais “pergaminhos” foram apagados, quais os mantidos nas transformações de linguagem, logo de sentidos, que caracteriza cada uma das plataformas – e acompanhá-las na sua apropriação pelas várias plataformas nas quais se desdobre essa matriz. Cada nova plataforma carrega as anteriores, modifica- as, FICHA FICHAFICHA mas sem se desfazer delas (BACCEGA, 2012, p. 1306). Na telenovela, da mesma forma, estão presentes narrativas dominantes, residuais e emergentes. A história da Gata Borralheira mantém-se principalmente na figura de Cida, que é empregada na casa da família Sarmento. Lá, vive como “meio empregada, meio cria de Sônia Sarmento, meio irmã das PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA filhas dela, Ariela e Isadora” (CHEIAS DE CHARME, 2012). As irmãs da Borralheiras, personagens 15 Rincón entende que as regras narrativas são estabelecidas “pela presença rotineira na vida”e “retomando modelos de referência canônicos a partir dos quais se constrói o imaginário narrativo” (RINCÓN, 2006). 64 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR fixadas na memória social, estão na música Vida de empreguete: são “as filhas da patroa, a nojenta e a entojada”, que só sabem explorar, não valem nada”. Mas, no discurso das empreguetes, são colocadas como “as filhas da patroa”, ao invés de “as filhas da madastra”. C ultura da mídia , cultura social Conhecer as narrativas que se contam pela mídia é mapear a cultura de uma sociedade (Baccega, 2012, p. 1300). A reflexão sobre os discursos presentes na telenovela Cheias de Charme – e o diálogo que se estabelece entre eles com os videoclipes surgidos por interatores – ratificam esse olhar. São elementos que nos dão sinais das ressignificações estabelecidas. Por isso podemos afirmar que, tal qual em outras obras ficcionais, a telenovela se caracteriza pela autonomia, mas não pela independência: suas raízes se fundam na cultura que a produz. A realida- CAPA CAPA CAPA de que ela constrói não é nem pode ser separada de tudo o que a rodeia. Se assim fosse, não haveria possibilidade de compreendê-la, pois o sentido se forma a partir do que já é, do que já está. Ela se relaciona com outras telenovelas. Se a telenovela tem normas específicas, também é verdade que não é nela própria que ela vai encontrar substância para elaborar estas normas. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Os dizeres presentes nas narrativas dos interatores igualmente reforçam o papel da cotidianeidade social, que age como mediadora no processo de ressignificação. A multiplicidade dos dizeres e a riqueza dos discursos, adaptados de maneiras diversas, revelam ainda assuntos em destaque na so- FICHA FICHAFICHA ciedade brasileira. No caso de Cheias de Charme e de Vida de empreguete, são as domésticas que representam a ascendente classe C, que “acorda cedo, mora longe do emprego e enfrenta condução cheia”, que trabalha muito mas mas sonha com a casa própria e a ascensão social: “um dia compro apartamento, viro PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA socialite”. Nas produções dos interatores, surgem narrativas que criticam as desigualdades sociais e a necessi65 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR dade de um ensino público brasileiro de qualidade. Há da mesma forma narrativas que combinam discursos dominantes na sociedade sobre comportamento sexual das mulheres e práticas sexuais nas permissivas na contemporaneidade. Rincón defende que “somos na medida em que sabemos narrar em relação a nossos modelos de referência, que podem ter alterações mas jamais podem ser esquecidos” (RINCÓN, 2008, p. 108). Assim, Cheias de charme, Vida de empreguete, Vida de estudete e Vida de piriguete revelam aproveitamentos e apropriações das narrativas na cibercultura. Elas revelam ainda caminhos que a ficção televisiva segue quando se transmidializa. Caminhos que convivem com discursos de ontem e de hoje, narrativas da contemporaneidade que controem hoje a maneira que contaremos histórias no amanhã. CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 66 IMPRESSÕES E EXPERIÊNCIAS NO ENSINO DE ROTEIRO NA UNIVERSIDADE - ESCREVENDO A SESSENTA MÃOS Leandro Vieira M aciel Universidade Anhembi Morumbi | lvmaciel@anhembimorumbi.edu.br | lvmaciel@gmail.com CAPA CAPA CAPA R esumo Este artigo se propõe a analisar a disposição das disciplinas de roteiro dos cursos de audiovisual, em particular no curso de Rádio e Televisão da Universidade Anhembi Morumbi. Serão analisadas as metodologias de teoria e prática de escrita, com destaque para experiências de criação coletiva em SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO roteiro. Uma destas experiências em destaque considerou a adaptação de métodos práticos (alguns usados profissionalmente), num processo que questionou o papel do aluno e do professor, e estimulou a participação coletiva num projeto de série. Assim, o roteiro será analisado como ferramenta de ensino, e a sala de aula como um reduto revelador do imaginário de um grupo. Palavras-Chave: roteiro, metodologia de ensino, criação coletiva, imaginário. A bstract FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA This article aims to analyze the arrangement of writing disciplines in cinema and radio&television courses, particularly Radio & TV´s course from Anhembi Morumbi University. It will analyze theorical and practical methodologies for writing, highlighting experiences of collective creation scre67 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR enwriting. One remarkable experience was the adaptation of practical methods (some them used by audiovisual market), a process that challenges student and teacher ’s roles, encouraging group participation in a tv series project. Thus, the screenplay will be analyzed as a tool for teaching, and the classroom space as a potential “catcher” of an imaginary´s group and revealing the inner space of the student. Keywords: screenplay, teaching methodologies, collective creation, imaginary. “- Professor, se tiver erro de português eu perco nota?” “ - Ah, mas eu não preciso de roteiro mesmo...” “- A gente ainda não vai entregar o trabalho... quem vai a trazer é a Carol” [autor de fato do trabalho]. CAPA CAPA CAPA “- Como faço pra ser criativo?” Estas frases são exemplos cotidianos de nossa convivência com os alunos ao longo de 7 anos como professor de roteiro, e cada uma delas de certa forma encarna os obstáculos do período. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Nossa experiência com ensino começou antes da carreira universitária. Em 2003, após prêmio na área de roteiro, fomos convidados a dar palestras sobre o assunto. Dois anos depois, iniciamos as aulas das disciplinas de roteiro, na Universidade Anhembi Morumbi, em sua maioria aulas no curso de FICHA FICHAFICHA Rádio & TV. Avaliando os benefícios e contratempos da dupla disposição como docente e roteirista freelancer, podemos considerar o saldo positivo do período. Afinal de contas, o que poderia ser melhor do que trabalhar diariamente com um tema de que se gosta tanto? PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Como professor, notamos a necessidade de avaliação constante do processo do ensino, onde atualizações e falhas são variáveis comuns. Assim, aqui relatamos algumas experiências e impressões a partir da vivência com os cerca de 300 alunos com que travamos contato a cada semestre. Incluímos 68 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR também algumas percepções sobre o roteiro: como ferramenta de ensino e como filtro do imaginário de um grupo. Iremos apresentar agora nosso campo de experimento: o curso e as disciplinas; o perfil do aluno com quem se travou contato; algumas das experiências relevantes; e por fim descreveremos a experiência que consideramos mais importante: a criação coletiva de um projeto de série, com atribuições individuais e por grupo, e que pode indicar caminhos para a pedagogia na atualidade. O C urso e as D isciplinas Segundo dados de 20091, o curso de Rádio & TV da Universidade Anhembi Morumbi é considerado um dos maiores do país. Contando com cerca de 1000 estudantes no total, tem o ingresso de mais de 300 alunos anualmente. Os alunos cursam disciplinas semestrais, por no mínimo 4 anos, com aulas CAPA CAPA CAPA teóricas e práticas. O curso foi criado em 1993, como uma resposta à chegada das companhias a cabo no país. Desde então, o curso passou por algumas atualizações em sua grade. Em 2005 foram implementadas SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO 4 disciplinas de roteiro, que o aluno cursava nos 4 primeiros semestres. Ao final deste período, ele receberia um diploma (uma formação parcial em criação de roteiros, um diploma de roteirista). A proposta era competir com os cursos que formavam tecnólogos2. FICHA FICHAFICHA Em 2010, o curso precisava se adequar ao panorama atual de convergência e democratização de acesso a equipamentos digitais de alta resolução. Além disso, a Universidade deveria seguir as normas de sua nova proprietária, a empresa americana Laureate Universities. A multinacional tem cobrado um maior controle orçamentário de cada curso. Uma das soluções dos 1 Dados relacionado no artigo FERREIRA, Gisele Sayeg Nunes; LAGO, Claudia. Radio as a means for democratization: the use by students. Paris: IAMCR, 2007, p. 10. Os dados de 2012 ainda não se encontram consolidados. 2 Segundo nos informa o Prof Ms. Cláudio Suetu Yutaka, coordenador do curso de Rádio & TV de 2010 a 2012, em entrevista concedida em 16 de outubro de 2012. 69 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR coordenadores foi manter um quadro docente relativamente enxuto, considerando-se o número de alunos. No momento, por exemplo, há 3 professores de roteiro no curso de Rádio & TV - cada um com pelo menos 24 horas-aula. Outras medidas desta mudança de grade foram a ampliação das aulas online, com um mínimo de carga horária para todos os cursos, e a padronização do sistema de ensino, com a obrigatoriedade de um certo número de trabalhos de provas individuais, no semestre, seguindo suposto modelo estipulado pelo MEC3. No primeiro semestre de 2010 as novas turmas encontraram uma grade com 3 disciplinas de roteiroo ( no caso a última disciplina foi eliminada: Projeto Experimental em Roteiro, no 4º semestre). Segundo o coordenador Yutaka (2012), o grande número de atendimentos que o plano de aula previa (no sistema conhecido como script doctor4) gerava algumas reclamações por parte dos alunos. CAPA CAPA CAPA Além disso, ainda segundo Yutaka, era um contrassenso dar o diploma de roteirista para o aluno que realizava os quatro semestres, sem a garantia de que ele de fato era um roteirista. Na opinião dele, para se alcançar um nível profissional em roteiro seria necessário um número reduzido de alunos por sala, para que o professor pudesse ler os projetos individuais, dividindo a turma em duplas eventu- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO almente. Hoje neste curso pode-se dizer que o foco saiu da formação de possíveis roteiristas para uma educação mais generalista de roteiro. Levamos em conta o contexto da universidade (como salas com cerca FICHA FICHAFICHA de 70 alunos nos semestres iniciais) e a pequena parcela de estudantes com preferência pela especialidade. A intenção hoje é chegar a um conjunto de habilidades e conhecimentos mínimos que um produtor ou técnico audiovisual deve ter, para criar, ler ou criticar um projeto ou o próprio roteiro. 3 Sigla para Ministério da Educação e da Cultura 4 Script doctor, ou consultor de roteiro, é um especialista contratado por grandes estúdios, produtoras e emissoras de televisão, que analisa e critica ( faz o doctoring) os roteiros de interesse da empresa. Um dos script doctors mais conhecido é o americano Syd Field, que explica um pouco desta ocupação em FIELD, Syd. Manual do roteiro. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995, p. 8 70 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR No curso de Rádio & TV atualmente as disciplinas de roteiros estão dispostas da seguinte maneira5: • 1º semestre: Estrutura de Roteiro 6: disciplina voltada às teorias narrativas, com atividades lúdicas eventuais. • 2º Semestre: Técnicas de Roteiro: a disciplina oferece repertório técnico para as múltiplas possibilidades de adaptação; • 4º Semestre: Práticas de Roteiro: o estudo do processo criativo e a formatação de ao menos um projeto de roteiro, realizado em caráter interdisciplinar. O P erfil do A luno Os dados apontam um perfil sócio-econômico razoavelmente homogêneo, ainda que culturalmente CAPA CAPA CAPA os alunos sejam bastante diferentes entre si. Em sua pesquisa, LAGO, SAYEG (2009) levantaram dados do aluno de Rádio & TV7: “Com relação aos dados sócio-econômicos, observou-se que a maioria dos SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO alunos (80%) têm entre 17 e 22 anos, mas não há muita diferença entre o número de estudantes do sexo masculino (52%) e mulheres (48% ). A maioria (64%) tiveram seus estudos fundamentais em escolas particula- FICHA FICHAFICHA res, um número que sobe para 65% quando se considera o ensino médio. Mais de metade dos alunos (53%) trabalha e uma parcela significativa (39%) já trabalham em rádio ou televisão. (...). Os dados revelam alunos 5 É importante relatar que no momento da redação deste artigo a carga horária de cada disciplina de roteiro foi reduzida para 60 horas semestrais, sendo que a exigência inicial era eliminar uma das disciplinas de roteiro. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA 6 A disciplina Estrutura de Roteiro é oferecida para todos os cursos da Escola de Comunicação no primeiro semestre, mas cada curso adapta pedagogicamente a matéria de acordo com suas demandas. 7 As disciplinas de roteiro no curso de Cinema são muito parecidas com as de Rádio & TV, mas o perfil é diferente do aluno médio deste último curso (no geral o aluno de Cinema é mais velho, de família mais rica e com repertório audiovisual maior). Esta diferença que demandaria um artigo à parte. 71 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR com um nível econômico relativamente elevado, que foram capazes de estudar em escolas particulares e que, apesar do fato de que trabalham, continuam a contar com a família para pagar seus estudos.” FERREIRA, LAGO (2007), p.12 [tradução nossa]. Yutaka (2012) afirma que, segundo dados parciais do ano corrente, os alunos de Rádio & TV na verdade pertencem em sua maioria à classe B, com menor participação das classes A e C. Alguns poucos alunos utilizam bolsas oferecidas pelo governo federal, através do PROUNI8 . Pode-se inferir que pela localização do campus (no bairro do Brás, próximo ao metrô Bresser) e pelo nível da mensalidade (aproximadamente mil reais), o curso atende a famílias em ascensão econômica, provenientes dos bairros periféricos de São Paulo e de algumas cidades no entorno da Grande São Paulo, como Jundiaí e Guarulhos. Ressalta-se que o “achatamento” de classes dos últimos anos CAPA CAPA CAPA ampliou a base de alunos atendidos. É comumente aceito entre os professores que o aluno pretendente a radialista é o que chamamos informalmente de despojado, ou liberal, na média. Generalizando, o aluno de Rádio & TV é por natureza aberto a todo tipo de referências, sem grandes barreiras a novos conteúdos, mesmo que dos SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO mais diversos. Mas a falta de um repertório mais específico (como filmes, literatura e programas de TV mais antigos) é um dos desafios iniciais da faculdade. No caso de roteiro, soma-se a crença na instrumentalização (a ânsia, de certa forma aceitável, em uti- FICHA FICHAFICHA lizar o aparato técnico disponibilizado pela universidade, e a busca pelo DRT 9 como uma permissão para funções técnicas na área). Traçado o perfil do curso e do alunado, passaremos agora a debater o imaginário deste e as experiências que realizamos em nossa jornada. 8 9 72 PROUNI é a sigla para Programa Universidade para Todos, institucionalizado em 2005. DRT é a sigla para Delegacia Regional do Trabalho, que emite um certificado de qualificação profissional na área. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR R epertório e imaginário dos alunos Seria necessário dedicar um artigo completo apenas ao estudo do imaginário dos alunos, mas por hora daremos apenas um panorama deste tópico. Colocamos uma questão muito ampla e quase poetica no caminho do professor de roteiro: como o espaço limitado da sala de aula pode revelar o espaço interno do aluno? Num recente evento que participamos, os professores de roteiro ecoaram a mesma queixa: a falta de repertório audiovisual e de conhecimentos gerais dos alunos ingressam no curso (como dissemos anteriormente). No entanto, pouco se falou do repertório que o aluno já traz consigo. Isto é, sem deixar de lado a necessidade de conhecimento histórico sobre cinema (em especial), a aula de roteiro permite uma medida do que se passa na mente do aluno e, indiretamente, do grupo social dele. No nosso dia-a-dia na sala de aula notamos diferenças culturais mesmo dentro do mesmo perfil só- CAPA CAPA CAPA cio-econômico. Um caso recente, indiretamente ligado à nossa cadeira, aconteceu na disciplina Direção em TV: os alunos do 7º semestre sob nossa orientação deveriam criar e produzir um talk show. Um debate dividiu a turma entre os alunos que preferiam um conteúdo e estilo mais anárquico e polêmico, e outros alunos que optaram por algo mais convencional e que tivesse mais aceitação de SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO público. O centro da polêmica, no caso, foi a criação de um apresentador cujo texto e maneirismos seria vagamente inspirado num Jesus histórico. Encontramos alguns temas ou mesmo recursos narrativos mais populares, que se repetem mesmo FICHA FICHAFICHA com o passar do tempo. Ainda é comum o roteiro “de meninos”: alguns grupos gostam de sugerir histórias cheias de ação, com policias de óculos Rayban, fazendo escutas wireless dentro de uma van branca- situação copiada diretamente dos seriados policias americanos. Por outro lado, há a influência ainda presente da novela como principal produto ficcional consumido; recursos melodramáticos como a mocinha injustada ou situações trágicas deus ex-machina são populares entre os alunos. Nas atividades que envolvam adaptações do dramaturgo William Shakespeare, por algum motivo os alunos costumam transferir a ação que se passa numa corte medieval para uma luta de traficantes na 73 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR favela, ou outro contexto parecido. A brincadeira que costumamos fazer é que “este ano está vetado Romeu e Julieta no baile funk”. Possivelmente a favela e a periferia se tornaram espaços cool para o grupo cujo perfil analisamos; para ele produções como “Cidade de Deus” 10 ou “Tropa de Elite”11 são obras populares. Precisamos também considerar o próprio repertório do professor, pois estudamos este universo Cidade de Deus no mesmo semestre em que a adaptação de Shakespeare é proposta. Assim, os alunos podem de alguma forma buscar a aceitação por parte do professor. Os temas do noticiário televisivo mantêm a repercussão na sala de aula. No primeiro semestre, um exercício previsto é a criação de uma lenda urbana baseada na observação do próprio aluno, e uma redação da Trajetória do Heroi12 aplicada a um monstro de caráter mitológico. O grande tema de 2011 foi a Cracolândia; podemos atestar isso pelo número de lendas urbanas ligadas ao consumo e tráfico de drogas. O usuário de crack (o craqueiro) e o mendigo surgem como os monstros do imaginário do alunado. O curioso é que no mesmo exercício com as turmas de 2012, o mendigo monstruoso deu CAPA CAPA CAPA lugar ao poeta lunático, ou ao sujeito com ar messiânico. O subgênero mais popular entre os alunos tem sido o terror. Na metade de 2012, os alunos do 4º semestre realizaram um interdisciplinar de áudio. O roteiro foi definido a partir de tutoria de diversos SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO professores de diferentes cadeiras. A coordenadora do interdisciplinar, Cláudia Lago, comentou que o terror foi escolhido como subgênero em uma reunião de planejamento pedagógico, quando “avaliamos que o tipo educativo, aplicado no semestre anterior, não deu muito certo. Então decidimos por um tema que tem grande apelo junto aos alunos, para que eles pudessem fazê-lo em tempo hábil13”. No entanto, durante a realização das atividades para este interdisciplinar, alguns grupos apareceram com histórias muito parecidas a respeito de exorcismo. Questionamos alguns alunos a respeito da FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA 10 “Cidade de Deus” é um longa-metragem dirigido por Fernando Meirelles, co-dirigido por Kátia Lund, escrito por Bráulio Mantovani, em 2002. O filme é inspirado no livro homônimo de Paulo Lins. 74 11 “Tropa de Elite” é um filme dirigido por José Padilha, escrito por Bráulio Mantovani, em 2007. 12 Assim como descrito em: VOGLER, Christopher. A jornada do escritor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006. 13 Profª. Drª. Cláudia Lago, em entrevista concedida em 23 de outubro de 2012. ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR preferência sobre o tema, e transcrevemos aqui o comentário de um deles: “Em 2010 com a legião dos espíritos [tema da Noite do Terror do Playcenter, evento no qual o aluno entrevistado trabalhou] percebi que a curiosidade das pessoas e medo eram maiores porque não era um tema óbvio de não ser real. [...]tudo aquilo que acontece e não podem explicar [as pessoas] jogam para o espiritismo a resposta. O fato de termos escolhido exorcismo([o] que acho que cabe aos outros grupos) é o medo que o tema causa, a dúvida e a sensação de e “se for verdade”? Você se questiona sobre espíritos, o que é diferente em zumbis e vampiros” 14. A popularidade desse tema precisa considerar um grande leque de variáveis, como: idade dos alunos (no caso a turma do 4o semestre está na faixa dos 20-25 anos), hábitos e costumes religiosos e espiri- CAPA CAPA CAPA tuais deste grupo social (a turma analisada parece se interessar particularmente por temas espirituais), referencial filmográfico da turma. Por hora apontamos aqui algumas direções, para serem retomadas com maior profundidade em artigo futuro. C onflitos nas aulas sobre conflito SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA Ainda que o cenário descrito pareça pouco favorável para o ensino de roteiro, as experiências debatidas a seguir apontam alguns caminhos. Os subitens deste capítulo são frases corriqueiras ditas com alguma frequência pelos alunos. Elas representam embates que surgiram e que ainda se mantêm nas nossas aulas. A cada um deles, expo- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA remos que tentativas foram feitas para a superação estes conflitos. 14 75 Victor Soriano Silva, aluno do 4o semestre de Rádio & TV ,em entrevista realizada em 10 de outubro de 2012. ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR “ - Professor, se tiver erro de português eu perco nota?” Aula de roteiro também é aula de português, já que o centro da aula é a escrita. Para muitos alunos pode parecer uma surpresa, já que do ponto de vista deles, um curso com alto teor tecnicista não precisa mais de Português. Considerando que essa barreira é superada ao menos psicologicamente nos primeiros semestres, a dificuldade persiste quando os alunos precisam modular a língua da norma culta para formas mais orais, o que acontece quando escrevem diálogos ou loucuções, por exemplo. Para enfrentar essa dificuldade, exibimos compilações com os erros ortográficos mais comuns cometidos pelas turmas anteriores, e pedimos ao alunos que apontasse o que era incorreto: UMA BELÍ SSI MA HI STÓRI A Este filme é sobre gente como agente: uma sucesão de intrigas e reviravoltas que vai te prender o expectador na poltrona do começo ao fim! A história vai girar entorno de um começo bem original: Marta tem que escolher entre dois homens. Lucas, um jovem rico e ambicioso que não mede esforços para conseguir o que quer; e Luan, que não tem emprego. Mais quem vai escolher o destino dela é ele. (figura 1- slide com exemplos de erros de redação) No caso do slide acima, foram incluídos erros ortográficos comuns como expectador (no lugar do CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA correto espectador); mais (no lugar de mas, porém); agente (no lugar de a gente). O texto também usa vícios comuns do aluno que iniciante em roteiro, como a linguagem vaga e o uso de clichês melodramáticos. 76 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR “- Como faço pra ser criativo?” O professor demasiado humano e o aluno um tanto genial é algo que tentamos mostrar às turmas com que convivemos. Historicamente enfrentamos 2 mitos. O primeiro é que, aos olhos de alguns alunos, o professor é um arcabouço do saber, capaz de reter uma quantidade exponencial de informação, infinito em sua sabedoria (será fácil responder “em que ano nasceu Aristóteles, prof?”). Este mito parece se opor ao do aluno ainda apegado ao conceito romântico da criação (por isso a pergunta “como eu faço para ser criativo?”). Este apego pode vir travestido de um certo pudor pós-adolescente(“professor, posso terminar o trabalho em casa?”). Um dos trabalhos propostos para se enfrentar este obstáculo é o “Saco de Ideias”15, feito a cada se- CAPA CAPA CAPA mestre de acordo com a dinâmica de cada professor, mas valorizado particularmente no 4º semestre (Práticas de Roteiro). Este registro particular do aluno é um levantamento do seu perfil criador e de potenciais cenas, personagens, situações e cenários. À medida que este registro é feito pelo aluno, ele o utiliza como ponto de partida de alguns exercícios16, tais como a criação de diálogos a partir de SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO observação do real17 ou a situação a partir do sonho. O “Saco de Ideias” sugere ao aluno que “a grande história” já está dentro da mente dele, precisando ser quase que extraída diariamente, sem precisar de um lampejo regado a ópio e vinho. Realizamos FICHA FICHAFICHA exercícios rápidos em sala de aula, com pequena atribuição de nota, registrados na forma de uma “diário de bordo”; a rapidez dos exercícios ajudava o aluno a encarar a sua criatividade dentro do que era mais adequado e possível dentro das limitações de tempo e de produção. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA 15 Assim como descrito, entre outros, CANNITO, Newton; SARAIVA, Leandro. Manual de Roteiro - ou Manuel, o primo pobre dos manuais de roteiro. São Paulo: Conrad, 2004. 16 A referência é: RABINGER, Michael. Developing Story Ideas: Find the Ideas You Haven’t Yet Had. Boston: Butterworth-Heinemann, 2005; 17 Adaptamos este exercício para uma oficina de criação de documentário, onde os grupos deveriam no mesmo produto analisar voyeuristicamente algum anônimo, e depois entrevistá-lo, comparando - através do vídeo- o real e o imaginário. 77 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR “- Ah, mas eu não preciso de roteiro mesmo...” Em geral essa frase é dita pelo aluno que já trabalha na área, ou que tem amplo conhecimento técnico. Aquele que se identifica como um diretor ou um fotógrafo, e para quem a etapa do roteiro pode ser suprimida. Este conflito surge da crença de que o roteiro e as disciplinas que o debatem são demandas meramente teóricas. Isso é potencializado pela glamurização da figura do diretor (como o autor). Para superar este embate são realizadas atividades que demonstram o roteiro como um meio, uma peça de comunicação entre os integrantes de uma equipe, equipe esta que no mínimo precisa ser liderada pelo autor. E ainda que não se apresente fisicamente, o roteiro precisa ser internalizado por essa equipe, seja como a história a ser contada, a nossa premissa ou qualquer outra metáfora capaz de ser compartilhada. A maioria das atividades realizadas em torno deste tópico é feita no 2º semestre (Técnicas de Rotei- CAPA CAPA CAPA ro), como uma espécie de transição entre a iniciação feita no semestre anterior e o projeto prático a ser feito no semestre seguinte. Uma das atividades propostas é a leitura dramática. A exigência é que os alunos criem cenas breves SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO a partir da adaptação livre de alguns cânones da literatura (como o já citado Shakespeare), parte de um projeto da instituição, chamado “Universidade que Lê”. Os grupos leriam a peça, adaptariam uma das cenas e então fariam sua leitura em sala de aula. FICHA FICHAFICHA Normalmente gravamos esta leitura e exibimos o material bruto para os alunos. Assim, os alunos vivem de forma simplificada as etapas do processo audiovisual, podendo identificar qual é a importância do roteiro neste processo. Ainda que haja uma dificuldade em se variar o autor utilizado na atividade, ela efetivamente tem funcionado, uma vez que a maior parte dos alunos parece gostar da atividade e então compreende o roteiro como esta peça de comunicação. No ano de 2012, foi proposta a redação de um projeto integrado de série. O aluno faria trabalhos interdependentes em cada disciplina do 2º semestre, com o objetivo de publicar um projeto de série 78 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR transmídia num portal chamado “Lumlab”18. Cada disciplina dedicaria espaço a itens deste projeto. Assim, a disciplina de Técnicas de Roteiro organizaria os trabalhos iniciais, com a criação de uma sinopse geral da série, enquanto a disciplina de Linguagem Audiovisual colaboraria com a redação de uma proposta de linguagem. A atividade, apesar do objetivo positivo, falhou em sua realização, pela falta de comunicação entre os próprios professores (com itens pedindo a mesma coisa com nomes diferentes), pelo semestre relativamente curto, e pelas deficiência do próprio portal (com uma profusão muito grande de itens, alguns com diferenças muitos sutis).Uma solução para experiências futuras será a criação de um formulário simplificado onde cada aluno pode colocar sua participação dentro de parâmetros bem simples. “- A gente ainda não vai entregar o trabalho...quem vai trazer é a Carol” CAPA CAPA CAPA Após alguns resultados frustrados na disciplina Projeto Experimental em Roteiro (atual Práticas de Roteiro), decidimos adotar uma nova postura. A frustração vinha quando os alunos se dividiam em grupos e criavam a bíblia (o projeto comercial) SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO de um curta-metragem de 15 minutos. Após um mês de exercícios de aquecimento, de revisão dos semestres anteriores e de análise do processo criativo, era criada uma escala de atendimento, dividindo o horário da aula para o doctoring dos projetos. FICHA FICHAFICHA Nos atendimentos, os alunos deveriam receber a crítica do professor e discutir em grupo os possíveis caminhos para o roteiro. A reescrita prosseguiria dentro de um cronograma razoavelmente extenso (variando de 4 a 6 semanas), considerando a realidade do curso. Apesar da inegável profundidade deste trabalho (a reescrita de um projeto de roteiro completo), o PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA que acontecia na prática é que a maior parte dos alunos de cada equipe ficava à deriva enquanto o professor discutia o roteiro com “a mina que escreve do grupo” (que chamamos de Carol, como parte 18 79 O portal, criado pela Fundação Padre Anchieta, está disponível em http://www.lumlab.com.br. ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR de uma piada interna dos professores de roteiro. Além de ser um nome comum, um dos alunos acaba naturalmente liderando o grupo. No caso do trabalho em roteiro, este aluno ou aluna é que costuma redigir e entregar os roteiros). Dois princípios, que podem soar como opostos, são definidores deste conflito seminal. O primeiro princípio pode ser resumido pela afirmação de senso geral que diz: “as melhores ideias aparecem em grupo”. Apesar de aparentemente previsível, uma vez que valorizamos os brainstormings 19, pitchings 20e outras atividades que envolvam algum nível de criação coletiva, recentes pesquisas revelaram que confiar demais na máxima duas cabeças pensam melhor do que uma 21 pode ser improdutivo. Por outro lado, entre os escritores e roteiristas se aceita que “Não se escreve em grupo”.22 Este princípio diz que boa parte do trabalho de escrita, como a entrega da versão final de um roteiro, deve ser CAPA CAPA CAPA feita por um único escritor. Ele considera que dentro do processo de escrita, alguém precisa literalmente dar a última palavra. Outro problema a ser considerado é que o tempo que se gasta para se escrever o roteiro sozinho é em geral menor do que quando se discute em grupo. Lidando com estes dois princípios divergentes em sala de aula, decidimos por criar regras ou passos SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO de trabalho que alternem entre ambos os princípios (individual/grupo), o que é de certa forma “um aprendizado por pares”23. Assim, realizamos atividades em grupos, com alguns momentos de livre FICHA FICHAFICHA 19 É aceito que a técnica de brainstorming meeting nasceu na publicidade americana. O publicitário Alex Osborn é considerado o formulador do conceito, descrito em: OSBORN,Alex. Your Creative Power. London: Charles Scrimers Sons, Ltd., 1948. 20 Muito comum na televisão, o Pitching é uma seleção que envolve 2 etapas: a primeira é a leitura prévia de projetos por um júri, seguida por uma defesa rápida feita pelo autor da proposta. Há diversos guias que explicam o funcionamento dos pitchings, como: Koch, Jonathan; Kosberg, Robert; Norman, Tanya Meurer. Pitching Hollywood: How to Sell Your TV Show and Movie Ideas. Chicago: Linden Publishing , 2004. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA 21 Matéria sobre esta pesquisa: http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,duas-cabecas-nem-sempre-pensam-melhorque-uma-mostra-estudo,600783,0.htm; Pesquisa sobre trabalho em grupo, com uma nota sobre o efeito Dunning-Kruger: http://people.howstuffworks.com/decisions-groups-decisions-alone.htm 22 Muitos escritores já comentaram a solidão da escrita. O escritor Jessamyn West certa vez disse que “família, amigos, e a sociedade são inimigos naturais do escritor”. 23 80 O aprendizado pelos pares, ferramenta de ensino sistematizada pelo professor de Física Eric Mazur, avalia os alunos ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR associação de ideias (com a redação de itens individuais mínimos), para em seguida “afunilarmos” o trabalho, estabelecendo uma hierarquia dentro do grupo, com a escolha de um líder (que podemos chamar de editor de texto), responsabilizado por filtrar o trabalho criativo da equipe. Então, feita esta reflexão sobre a necessidade de alternância do trabalho individual e em grupo na redação do roteiro, partimos para uma experiência em sala de aula a título de teste, que descrevemos agora. E xperiência em destaque : C riação C oletiva de U ma S érie de TV Em 2008, inspirado pela experiência de trabalho na série “9 mm: São Paulo”, e com 2 turmas de pouco mais de 30 alunos com um desempenho bastante satisfatório nos semestres anteriores, propusemos a redação de uma quadra de série de televisão criada coletivamente. A quadra, ou beat sheet, é uma tabela que relaciona o que acontece com cada personagem em uma série, de acordo com cada episódio. Na organização da sala de aula, cada aluno pôde propor um personagem diferente; cada grupo sugeriu uma série com este personagem; e a sala como um todo CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO escolheu a série favorita, cuja primeira temporada foi resumida nesta quadra. FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA diariamente e, a partir dos resultados dessa avaliação, direciona o andamento da aula (definindo, por exemplo, uma possível atividade em grupo). A aproximação à instrução por pares em roteiro é a nomeação de editores de texto, que tem por função coordenar seu grupo na redação de itens de determinado projeto. Estabelecemos alguns itens mínimos que o aluno deveria criar nos trabalhos do semestre. A descrição deste método está em: CROUCH, Catherine H.; MAZUR, Eric. Peer Instruction: Ten years of experience and results. Harvard University, Cambridge: American Association of Physics Teacher. 2001, p.1 81 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 101 – MAYARA VAL 102- VINICIUS V - 1.01: VAL x entrar na sociedade V - 1.02: VAL x a sabotagem de Leila ?) MOMENTO QUE APRESENTE VAL COMO UMA MASSOTERAPEUTA (VOLTANDO DO ESTÁGIO?) ?) MOMENTO QUE LEMBRE VAL COMO UMA MASSOTERAPEUTA (??) A) A caminho da Sociedade, Leila discute com V. (não quer que ela entre na sociedade).] B) Nos fundos da igreja, V. chega e o Salvador explica o teste para 1ª cantora. Reação das meninas, aflitas. Segue o ensaio C) Val ensaia em casa (expectativa para o teste)- Leilla, irritada com a historia do casal gay, pega no pé de Val. PROBLEMA NESTE EPISÓDIO: FALTA LINHA QUE SÓ DURE ESTE EPISÓDIO . SUGESTÃO: CRIAR UMA SITUAÇÃO OU “FECHAR” A DE MARCAO AQUI V - 1.03: VAL X as chantagens de Henrique A) Ensaio na sociedade. Val sente garganta raspar (pigarreia). Salvador recomenda remédio. A) Val chega tarde em casa. Leila discute com ela. Val insiste: estava no ensaio do coral. (EM PARALELO, Alicinha paquera Salvador) B) (H - 1.03) Val chantageia Henrique (por causa do suborno)ela pede para H ajudar a manipular leila, do mesmo modo que ele ajudou Marcao.Contrariado, H. aceita B) em casa, Val aplica o remédio (spray de garganta). Leila observa, curiosa. – Leila reclama da proximidade de Val com o líder ... 103- CLAYTON C) Secretamente, Leila coloca alguma substancia no remédio (Henrique vê Leila). ... C) Henrique escuta conversa “suspeita” entre Val e Líder; CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO D) Henrique planta suspeita na cabeça dos pais, de que Val tem algo com o Líder FICHA FICHAFICHA (FIGURA 2. Trecho de quadra de série criada por alunos) No exemplo acima, a ação de um episódio corresponde à coluna, enquanto o personagem agente desta ação corresponde à linha da tabela. Cada episódio foi nomeado de acordo com o editor de texto do grupo responsável pela redação final do episódio. Exemplo o grupo da Mayara deveria entregar PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA o roteiro final do episódio 1. As etapas na ordem foram as seguintes: 82 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR - Definição do projeto coletivo: a partir da discussão com a sala, fechou-se como objetivo: redigir a bíblia e os 5 primeiros roteiros de uma série cômica de 30 minutos, possivelmente próxima ou dentro do formato de sitcom. O professor incentivou este objetivo, pois seria viável escrevê-lo dentro do prazo sem gerar expectativas ambiciosas demais, e o conhecimento prévio que a maioria dos alunos possui do formato facilitaria a discussão. Cada grupo ficaria responsável por alguns itens da bíblia e pelo roteiro de um dos episódios; - Estudo de caso: um par de aulas foi dedicado a análise de pelo menos um caso de série, estudando os arquivos de trabalho dela até o resultado final. Apresentamos como critérios de redação da sitcom: - um espaço compartilhado por todos ou pela maioria dos personagens; - na ausência do espaço, algum elo que unisse o grupo de personagens; CAPA CAPA CAPA - a série se concentra num núcleo de 4-8 personagens centrais (restringimos este número à quantidade de grupos, para que cada equipe se responsabilizasse pelo perfil de um personagem) - “Brainstorming individual”: em seguida, os alunos atenderam a demandas individuais: SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO • Redação ou consolidação do Saco de Ideias, que deveria incluir ao menos uma referência de série; • Criação da Biografia de Egri para um personagem; FICHA FICHAFICHA -Pitching do grupo: Nisso, os grupos foram reunidos e estimulado a tentar unir os personagens criados individualmente em uma série dentro da meta. Cada grupo deveria redigir uma ou duas sinopses de projetos que julgavam adequados ou que simplesmente gostavam; -Pitching da turma: cada grupo elegeu um orador e, num tempo delimitado, expôs à sala pelo menos PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA uma das propostas selecionadas na etapa anterior. A sala, através do debate e finalmente de uma votação, escolheu a série da turma. 83 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Nesse momento o aluno era convidado a se posicionar na frente da sala, trocando de lugar com o professor. - Organização do trabalho: a partir da seleção da turma, os grupos elegeram um representante (orador) e um redator final (ou editor de texto); o representante era o articulador, deveria participar de reuniões entre os representantes de cada grupo, além de servir como porta-voz do grupo em outros pitchings que poderiam acontecer. O redator final era chamado carinhosamente de “o menos analfabeto do grupo”, e a função dele era recolher os itens escritos pelo grupo, revisá-los e publicá-los num fórum compartilhado através da intranet da faculdade (Unidade Web) Deu-se preferência a uma dupla que trabalhasse dividindo as duas tarefas, idealmente como os produtores executivos das séries no sistema das emissoras americanas, mas caso necessário foi permitido que o mesmo aluno acumulasse as funções. CAPA CAPA CAPA Cada grupo recebeu como demanda extra-classe: Criar um banco de situações possíveis de cada personagem, escrito dentro de certo padrão, numa planilha; SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Resumir e publicar a biografia do seu personagem, já sugerindo a história da temporada desse personagem (uma linha narrativa contínua [ou arco longo] que atravessaria todos os episódios); Fechar a sinopse de uma história forte do episódio (linha narrativa unitária), com total liberdade FICHA FICHAFICHA para o grupo; Progressivamente colocar todos esses dados na quadra, atualizada e visível a todos os alunos pela intranet. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA - Oficina/ Doctoring: a aula era dividida em 2 tempos, que algumas vezes eram transformados em 2 aulas alternadas: Os representantes/ redatores finais se reuniam com os professores para, via datashow, analisar a 84 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR progressão dos itens coletivos (o banco de situações e a quadra). Enquanto isso os demais integrantes do grupo deveriam trabalhar na redação de outros itens da bíblia (como, por exemplo, a proposta de direção)24. Nessas reuniões as decisões eram tomadas por estes líderes, com professor e estes alunos sentados em semicírculo. Nos primeiros encontros nessa organização, foi permitido que o grupo todo acompanhasse o seu representante, por isso a dispersão foi constante. A partir do terceiro encontro, somente um representante se reunia com o professor. Os demais alunos iam para laboratórios ou salas de aula, com a obrigação de trazer algum resultado mesmo que manuscrito ao final da aula. No tempo restante da aula era feita a análise crítica dos itens redigidos até o momento. O primeiro critério era sempre a comunicabilidade: os demais membros da sala poderiam compreender o conflito descrito naquela sinopse? A adequação à proposta da série e o inusitado das situações também CAPA CAPA CAPA era discutido; Todos os arquivos gerados deveriam ser atualizados semanalmente, e os grupos mantiveram a comunicação via email (a penetração das redes sociais na época não era tão proeminente como hoje). R esultados Ao final de 6 semanas, a turma “A” chegou à bíblia completa de uma série cômica que narrava o SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA cotidiano de um jornal de bairro, incluindo a quadra em anexo, além do roteiro de 4 episódios (no decurso do processo um dos grupos foi extinto por falta de integrantes). Cada grupo defendeu em banca pública seu episódio e determinados itens da bíblia. A banca formada pelo professor orientador e por professor convidado atribuiu a nota média de 9 para os grupos. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA A turma “B” realizou a bíblia de uma série mais próxima do formato de minissérie, com 5 capítulos 24 Admitimos que nesta etapa seria mais eficiente a reserva de um laboratório de informática para acompanhamento dos alunos. 85 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR com “ganchos” mais evidentes entre si. A história se concentrava nas intrigas de moradores de uma “rua fechada”, típica de bairros tradicionais de São Paulo. Os grupos também foram aprovados com nota média 9. Mas cada grupo recebeu sua nota à parte, de acordo com o roteiro do episódio escrito por ele. A principal diferença de notas entre os grupos se deveu às habilidades específicas em roteiro: justamente aqueles que conseguiram criar e escrever melhores diálogos receberam notas maiores- aqueles que tinham mais domínio da língua e que conseguiram do modular as normas desta língua. Esta é uma boa medida do funcionamento do laboratório, pois é senso comum que uma das habilidades mais difíceis de se atingir como roteirista é a escrita de diálogos adequados ao roteiro proposto. Assim, ainda que o projeto tenha sido coletivo, e ainda que dentro da composição da quadra cada aluno pôde participar individualmente, a decisão final do grupo (ou do roteirista líder de cada gru- CAPA CAPA CAPA po) no roteiro de cada episódio também foi determinante. Pôde-se garantir os conhecimentos gerais em roteiro; no entanto, a capacitação de roteiristas ficou relevada a um número limitado de alunos dentro do contexto. No entanto, posteriormente não foi possível repetir os resultados deste laboratório. Para funcionar, SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ele demanda muita preparação pré-aula, o que para nós tem sido inviável no atual cenário. É necessário também algum tipo de sintonia entre professor, redatores/editores de texto e as equipes. Ainda, parece-nos que acima de 30 alunos, mesmo esta organização não pode ser adequadamente FICHA FICHAFICHA mantida por apenas um professor. C omentários e provocações finais Uma de nossas conclusões mais fortes é de que filosoficamente falando o roteiro seja como disciplina PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA seja como ferramenta de aprendizado é uma das mais belas e prolíficas. Acreditamos numa aptidão quase vanguardística da matéria, que sempre é ao mesmo tempo estudo e realização prática. 86 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR A dinâmica de criação é ao mesmo tempo ferramenta de avaliação em grupo e termômetro do imaginário coletivo do grupo que o aluno- e que possivelmente o próprio professor- se insere. Na nossa experiência em destaque, deixando de lado a avaliação quantitativa, alguns resultados qualitativos foram percebidos por nós: O sistema alternando participação individual, por grupo e coletivamente permitiu um contato mais variado com diferentes exigências na criação do roteiro, que foram desde a articulação verbal de ideias até a capacidade em utilizar as ferramentas online; A escolha do tema foi feita pelos alunos, valorizando o imaginário deles; a referência dos espaços (o jornal de bairro e a rua fechada) foi baseada na observação de locais reais das regiões onde os alunos moram. CAPA CAPA CAPA A narrativa está mais viva do que nunca e o dia-a-dia das aulas de roteiro provam isso, com um sem número de histórias, desde aquelas que os alunos contam a todo momento até aquelas que fazem parte do imaginário do alunado. Mas como ensinar roteiro nessa perspectiva de salas lotadas, dividindo a atenção dos alunos com SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO todas as suas “próteses eletrônicas”? Uma das possibilidades seria investir em sistemas criativos informatizados, nos moldes do laboratório que descrevemos aqui. Um laboratório de roteiro prático, assumindo redes sociais e ferramentas FICHA FICHAFICHA de busca com parte do processo criativo. Consideramos nosso modo de dar aula ultrapassado, até mesmo condenado. É um drama diário para nós o modo como a sala de aula está distante da realidade da profissão e mesmo de nosso cotidiano. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Salvo exceções em determinados momentos, o computador, em todas as suas formas, ainda não foi merecidamente integrado e controlado em nossa sala de aula. Do nosso ponto de vista, no caso de nossa disciplina o futuro ideal seria um laboratório para criação 87 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR coletiva, com registro diário das atividades, avaliações já “presetadas”, mas que possam mudar dinamicamente, e amplo acesso às redes sociais e às ferramentas de comunicação e pesquisa. Mas pensemos num conflito quase épico: seria possível escrever um roteiro a sessenta mãos, sentados todos na frente de um computador? Para nós é como se saíssemos de uma pedagogia do afeto, e admitíssemos uma pedagogia por conflitos. Para nós a amizade cede lugar a um respeito bastante tenso, já que a natureza do ensino é conflituosa, mas que não precisa ser transformada num embate de classes (como diria GADOTTI, 1998). O roteiro - sua análise, prática e discussão em sala de aula- é o palco ideal da encenação do conflito motor do ensino: o professor, aquele que deve ensinar (ou assim lhe parece); e o aluno, aquele que deve aprender (idem). A sala de aula é o lugar do drama. R eferência ARISTÓTELES. Arte poética. São Paulo: Martin Claret, 2007; VOGLER, Christopher. A jornada do escritor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006. CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO CANNITO, Newton; SARAIVA, Leandro. Manual de Roteiro - ou Manuel, o primo pobre dos manuais de roteiro. 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FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 89 COMO TORNAR VISÍVEL O INVISÍVEL R oberto M oreira Professor de direção e roteiro no curso de Audiovisual ECA-USP R esumo Este artigo faz um balanço das diferentes estratégias pedagógicas adotadas pela disciplina Drama- CAPA CAPA CAPA turgia Audiovisual, primeiro contato do aluno com a atividade de escrita de roteiros no Curso Superior do Audiovisual da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Ao longo de 10 anos várias experiências foram tentadas articulando o processo de escrita e a reflexão sobre a dramaturgia. Em especial, foram usados os exercícios de Ripeau (1998), Dancynger (1995) e Rabiger SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO (2005), cujos resultados são analisados. Hoje, a prioridade foi deslocada dos aspectos técnicos da escrita, para uma compreensão do porque precisamos contar histórias, de como a narrativa dá forma à experiência e quais suas estratégias de comunicação. Cada aula propõe um problema que o aluno precisa resolver através da escrita ou da pesquisa de textos e analise de obras audiovisuais. O maior desafio colocado ao professor de dramaturgia é tornar palpável seu assunto. Ao contrário da fotografia, da montagem e da encenação, aspectos ligados ao estilo do filme e perceptíveis na superfície mesma da imagem, a matéria do drama não é visível. Compreender, se interessar e emocionar-se por um filme, são efeitos produzidos na mente do espectador. Através da análise de exemplos FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA e da escrita de roteiros, o professor de dramaturgia deve auxiliar o aluno a utilizar os conceitos da dramaturgia de modo a tornar tangíveis as estruturas profundas que permeiam a experiência de ver um filme. 90 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR A bstract This paper analyses the pedagogical strategies of the Audiovisual Dramaturgy subject, the first encounter of the student with screenwriting in the Audiovisual Arts Course of the School of Communications and Arts at São Paulo University. Over ten years, many experiments were attempted in order to articulate the process of writing and the understanding of drama. In particular, we used the exercises by Ripeau (1998), Dancynger (1995) and Rabiger (2005), and analyzed their results. Today, the focus has shifted from the technical aspects of writing to investigating why we need to tell stories, how narrative organizes experience and the way it communicates with the audience. The teacher ’s challenge is to make drama palpable. The material of drama is invisible, unlike photography, editing and staging -- aspects linked to the film’s style and noticeable on the surface of the image. The understanding of the characters’ actions, the ability to interest and to arouse emotions in the public are all effects produced in the viewer ’s mind by these deep structures. Through the analy- CAPA CAPA CAPA sis of examples and exercises in writing, the teacher helps the student to use dramaturgical concepts to make tangible the deep structures that underlies the experience of seeing a film. Palavras chave: Dramaturgia, Ensino, Audiovisual A decisão de prosseguir a carreira acadêmica em paralelo à minha atividade de cineasta, nasceu da necessidade de esclarecer as técnicas artísticas ligadas à direção e ao roteiro. No meu curso de gra- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA duação, apesar do esforço de meus professores, apenas resvalamos num universo que me fascina até hoje. Tratar a produção artística como um objeto de estudo e ensino me parece imprescindível para o audiovisual brasileiro se confrontar com outras cinematografias cuja formação artística conta já com uma longa história. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Na academia brasileira ainda vige uma concepção escolar e romântica do ensino das artes: trata-se de apreender a história da disciplina e seus grandes teóricos, ou seja, de ilustrar o futuro artista. Essa visão teve sua expressão mais caricatural no curriculum dos cursos de comunicação e artes que 91 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR surgiram nos anos 60 e 70. Para “ilustrar” o artista/comunicador, estudava-se Sociologia da Comunicação, Filosofia da Comunicação, Psicologia da Comunicação, História das Artes, etc. Fui vitima desse curriculum cujas disciplinas eram um difícil purgatório. O melhor caminho é o inverso, do particular para o geral, porque aí sim o aluno percebe o conceito no próprio material com o qual está trabalhando. Os alunos de audiovisual querem colocar a mão na massa e temos que partir dessa necessidade autêntica -afinal eles são artistas!- para daí então abrir perspectivas mais amplas sobre nossa cultura. Mas o que são essas “perspectivas amplas”? Muitas vezes vejo alunos perseguindo aquilo que acham que nós queremos que eles façam, ou seja, querem conformar seu trabalho às expectativas criadas pela leitura dos textos teóricos que entregamos. Na sua angustia em entender o mundo, abraçam esquemas consensuais na academia. Isso é terrível porque os condena ao passado. A beleza da arte CAPA CAPA CAPA é propor leituras inesperadas do mundo, e, por definição, deve procurar o que não foi dito. Sobrecarregar o jovem artista com grandes narrativas da cultura, faz com que ele se veja como mais um evento nessa tradição e dificulta o surgimento do novo. É melhor deixar que eles mesmos construam suas respostas e não se contentar com a repetição de respostas que julgamos corretas. Condenar essa SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO atitude não significa que os alunos não devam ser ilustrados, mas sim refletir como essas leituras devem se articular à atividade poética de modo construtivo. Na nossa tradição acadêmica a prática artística é considerada um dom que não pode ser ensinado. FICHA FICHAFICHA Até hoje, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP o ensino da literatura como atividade criativa não é praticado. Me parece que o Curso Superior do Audiovisual, a partir do trabalho pioneiro de Jean-Claude Bernardet nos anos 90, foi o primeiro a desenvolver de modo sistemático a escrita criativa no Brasil. A título de contraste, nos Estados Unidos, em 1905 George Pierce Baker já possuía um workshop de escrita para teatro em Harvard, do qual participou Eugene O’Neill, e, PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA em 1925, fundou o primeiro curso com diploma em dramaturgia na Universidade de Yale. Em 1930 foi criado por Norman Forster o primeiro curso de creative writting, o The Iowa Writers Workshop. De lá para cá muitos autores foram formados em escrita criativa. Para citar alguns bem conhecidos: 92 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Michael Chabon, Kazuo Ishiguro e Ian McEwan. Transformar a escrita numa atividade acadêmica não “seca” a criatividade, pelo contrário, revitaliza a crítica e a história da literatura. No nosso departamento, Ismail Xavier sempre defendeu que era importante para o crítico de cinema realizar o exercício de fazer um filme. Só assim ele poderia entender a dificuldade da empreitada e romper com uma visão ingênua e transparente do meio que estuda. Isso também vale para o estudante de literatura. Quem já tentou escrever um soneto e enfrentou os rigores da metrificação, lê Camões com mais cuidado. Estes dois movimentos, análise e composição, já estão interligados no texto fundador da crítica literária ocidental, a Poética. Aristóteles chega a dar conselhos ao dramaturgo. Recomenda, por exemplo, que o autor visualize a cena que está descrevendo, ou que, antes de escrever a peça, faça uma escaleta da história. Portanto, reflexão e exercício devem andar juntos e este tem sido o grande desafio que enfrentamos CAPA CAPA CAPA nas disciplinas de dramaturgia do Curso Superior do Audiovisual. Nosso curriculum prevê quatro matérias: duas obrigatórias, Dramaturgia Audiovisual e Roteiro 1, e duas optativas: Roteiro 2 e Roteiro 3. Dramaturgia Audiovisual é uma introdução, Roteiro 1 tem ênfase na escrita para televisão, Roteiro 2 já é uma disciplina da especialização e se dedica à escrita dos vários gêneros do audiovisu- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO al, e Roteiro 3 ao processo de desenvolvimento de projetos. Desde que o curso foi criado dez anos atrás, tenho ministrado Dramaturgia Audiovisual e como este é o primeiro contato dos alunos com a matéria ensaiei várias estratégias de ensino. Confesso que FICHA FICHAFICHA ainda não encontrei uma boa solução. A principal dificuldade dos alunos no primeiro ano do curso é desenvolver a sensibilidade para conceitos básicos como conflito, motivação, exposição, caracterização etc. Ao contrário da fotografia ou da direção, aspectos visíveis de uma peça audiovisual, o roteiro é intangível. Os alunos dificilmente PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA reconhecem a matéria que faz a dramaturgia. Todo o esforço da disciplina Dramaturgia Audiovisual é encontrar estratégias que coloquem em evidência esta estrutura difícil de ser percebida. Primeiro, tentei estudar textos clássicos do teatro (Édipo Rei, As Troianas, Macbeth, Casa de Bone93 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR cas, A Gaivota e Os Ossos do Barão), com a expectativa de chamar a atenção para o desenvolvimento histórico de diferentes estratégias dramáticas. É claro que o contato com tais textos é de grande valia para os alunos, mas infelizmente a dificuldade deles em dominar os conceitos básicos de dramaturgia persistiu. Eles se perdiam em meio a tantas referências. Resolvi então concentrar todo o semestre no estudo da forma do curta-metragem de ficção: partindo do surgimento do conto e de sua consolidação nas teorias de Edgar Allan Poe, passando pelo problema da transposição da literatura para o cinema e chegando na análise de vários curta-metragens. O curso pretendia, assim, esgotar um formato que para os alunos é fundamental, pois será aquele usado nos seus trabalhos de conclusão do curso. Também a forma curta parece mais sintética, mais possível de ser apreendida e, importante, mais fácil de ser exibida em sala de aula, abrindo a possibilidade de apresentar vários exemplos. Ao final do semestre fui novamente surpreendido pela dificuldade dos alunos em absorver conceitos fundamentais. Mudei de estratégia e estabeleci um sistema gradual, em que cada conceito é introduzido lentamente e só são estudados aspectos mais complexos de dramaturgia conforme o aluno consolida o conteúdo anterior. A referência inicial passou a ser o cinema de longa-metragem clássico, cujas estratégias CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO narrativas descrevia com minúcia. Como o filme clássico parece “natural” aos olhos dos alunos, em seguida analisava um filme com problemas de dramaturgia justamente para mostrar como o efeito de transparência é difícil de ser construído. Também era muito produtivo analisar cenas isoladas. Decompunha a cena em bits e procurava ressaltar como toda cena tem uma estrutura semelhante, FICHA FICHAFICHA começando com um gancho, uma progressão dramática até o clímax e um novo gancho para a próxima cena. A análise de cenas é interessante porque permite diferenciar com clareza o estilo e a dramaturgia. Nos vários exemplos o estilo sempre varia -fotografia, decupagem, composição da imagem, encenação- mas os procedimentos dramáticos são constantes. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Simultaneamente, buscava articular este conhecimento da dramaturgia à atividade de escrita. No início, a abordagem era excessivamente escolar: ensinava a teoria na esperança que os alunos “aplicassem” o que aprenderam em seus textos nas várias atividades práticas. Não havia uma articulação 94 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR entre a escrita e os textos que liam. Os primeiros exercícios que utilizei enfatizaram a habilidade de escrita. Minha referência principal foi um workshop do qual participei ministrado por Jean-Claude Carrière e Marie-Geneviève Ripeau, professora na escola de audiovisual francesa FEMIS, em Quito no ano de 1992. Os exercícios de Ripeau (1998) não seguiam uma progressão previsível e pretendiam justamente colocar os alunos frente a situações inesperadas. Eram no total dez exercícios: Escreva um argumento no qual você se projeta no personagem principal. Em outras palavras, se apresente através de uma ficção curta na qual o personagem principal é uma projeção de você mesmo. 1. Escrever uma história a partir de uma foto. CAPA CAPA CAPA 2. Escrever o início de um filme. 3. A partir de uma foto, escrever um diálogo sem indicação de cena. 4. Quatro personagens estão sentados em volta de uma mesa em frente a um bolo. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO 5. Escolher uma cena clichê e subvertê-la. 6. Contar uma mesma história de dois pontos de vista diferentes. FICHA FICHAFICHA 7. Escrever um diálogo sem pé nem cabeça, como se dois loucos estivessem conversando. 8. Escrever uma cena cômica entre duas pessoas reunidas contra a vontade. 9. Escrever uma cena que contenha um homem nú no balcão de um prédio. Apesar de alguns exercícios serem bem abertos, todos enfatizam aspectos técnicos da escrita. A questão da busca criativa do autor só é resvalada no primeiro exercício. 95 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Nessa mesma linha trabalha o professor da New York University Ken Dancyger (1995), cuja ênfase é desenvolver uma escrita adequada do roteiro, despojada dos vícios literários característicos dos estreantes. Os exercícios enfatizavam a observação da realidade e sua descrição. Por exemplo, primeiro descrevia-se separadamente, uma pessoa que o estudante conhece, depois uma locação e, num terceiro momento o estudante tinha que imaginar esse personagem adentrando a locação e a situação que seria criada. Em seguida retornava-se à locação e observava-se os sons. Aí eles eram somados à cena. E assim por diante. O resultado dos exercícios de Ripeau e Dancynger é uma melhora na qualidade da escrita dramática mas os roteiros ficam corretos e desinteressantes, incapazes de tocar aspectos significativos da experiência humana. Este problema, identificado em várias escolas de cinema de todo o mundo, levou à metodologia desenvolvida por Michael Rabiger (2005) na Universidade de Chicago. Como encontrar boas idéias? Como o aluno pode desenvolver uma disciplina criativa? Como pode encontrar o seu CAPA CAPA CAPA universo de temas e inquietações? Como simular em sala de aula uma pequena audiência capaz de colocar em contexto a idéia do aluno? O autor propõe três tipos de exercícios. 1. Identidade criativa, onde trata-se de esquadrinhar os temas e influências do aluno, SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO suas questões, anseios e vontade expressiva. 2. Improvisações, onde trata-se de exercitar o “músculo” da criatividade, como dizia Bunuel, através da invenção de histórias em sala de aula num prazo máximo de dez FICHA FICHAFICHA minutos. 3. Tarefas, onde são apresentadas dez diferentes estratégias ficcionais, como o conto da infância, a história a partir de notícia de jornal ou a descrição de um sonho. Este conjunto de atividades leva o aluno no final do semestre a apresentar um caderno que reúne PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA todos estes materiais, compondo um retrato de seu momento como escritor. O uso desses exercícios apresentou resultados excelentes, muito superiores às tentativas anteriores. 96 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR As aulas passaram a ser um fórum dinâmico de discussão dos projetos e anseios criativos dos alunos. Seus exercícios traziam experiências e questões profundamente vivenciadas. Também o nível de invenção aumentou muito com o uso das improvisações. Foram adotadas diversas atividades em sala de aula para incentivar o trabalho em colaboração e ressaltar o caráter lúdico de toda atividade criativa. A visão romântica do artista que cria sozinho obras geniais que surgem da pura atividade de sua imaginação é colocada radicalmente em xeque. Trata-se, ao contrário, de procurar estímulos externos capazes de desafiar os alunos. O roteirista de cinema e televisão é obrigado a lidar com limitações financeiras e artísticas, que devem ser encaradas de modo positivo, como problemas a serem solucionados. Também o trabalho em equipe é a norma nessa área. Portanto, o aluno precisa estar aberto a provocações do exterior e aprender a reagir de modo rápido, preciso e inventivo. Estes exercícios transformam a atividade de escrita numa experiência e obrigam o aluno a assumir a responsabilidade pelo o que cria. CAPA CAPA CAPA No entanto, atividades desse tipo exigem classes pequenas e um tratamento individualizado do aluno. O que é impossível na atual estrutura curricular, onde Dramaturgia Audiovisual tem de 36 a 40 alunos. O resultado é que limitamos esses exercícios aos 12 alunos de Roteiro 3. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Outra experiência importante desses anos foi a difícil tarefa de integrar as atividades de dramaturgia com as demais disciplinas do departamento. No desenho original do curso, as disciplinas de roteiro foram pensadas sem relação com as demais; acreditava-se que a dramaturgia poderia ser objeto de estudo por si só, sem estar diretamente vinculada a uma atividade prática. No entanto, esta escolha revelou-se problemática. O resultado apresentado nos roteiros estava muito aquém do esperado. Mesmo com uma ênfase maior em vários exercícios de escrita criativa, percebemos que os alunos encaravam as várias tarefas de escrita sem compromisso e que se interessavam apenas pelos roteiros dos exercícios que seriam realizados no semestre seguinte. O que motiva os FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA alunos são trabalhos que serão filmados. Decidi então colocar a elaboração desses roteiros como atividade central dos cursos. No início de 97 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR cada semestre eram exibidos os exercícios realizados pelos alunos do ano anterior. Os problemas narrativos apareciam com extrema contundência e eram rapidamente assinalados. Ficava claro, por meio dos trabalhos dos colegas, o descompasso entre intenção e capacidade de realização. A partir dessa análise organizava-se uma série de atividades durante o semestre para suprir as carências mais agudas da classe. Textos teóricos eram lidos, filmes analisados, exercícios criativos experimentados mas sempre articulados com o processo de roteirização dos exercícios. Esta experiência foi estendida a todos os semestres e os alunos passaram a escrever projetos que seriam realizados nos semestres seguintes em outras disciplinas. Como no processo de produção audiovisual, nossos alunos primeiro escreviam e depois realizavam. Os resultados foram muito bons e os roteiros apresentados na conclusão das disciplinas passaram a atender a um padrão mínimo de dramaturgia, compatível com um curso universitário. No entanto, fomos percebendo dois problemas. O primeiro é que os alunos tendem a transformar CAPA CAPA CAPA o menor exercício em projeto de filme, com todas as implicações de produção e investimento emocional que isso acarreta. O curso, ao articular várias disciplinas em torno de uma única atividade, reforçou essa tendência. Assim, o que era para ser um simples exercício, vira um esforço titânico de produção que anula quaisquer outras atividades pedagógicas. Ler e estudar desaparece do horizonte SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO dos alunos. Mas, pior do que isso, o curso se amesquinhou, colocou-se a serviço de um objetivo muito pequeno: um semestre inteiro de curso universitário para chegar no roteiro de um exercício de 3 minutos! É FICHA FICHAFICHA pouco e muito frustrante para professores e alunos. Por isso retomei a carga teórica no curso Dramaturgia Audiovisual e o desvinculei em parte das outras atividades departamentais. As perguntas que procuro responder são: qual o repertório mínimo de um aluno de dramaturgia? Como se estrutura uma cena? Como se dá o processo criativo? Elaborei PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA então um programa onde lemos Sófocles, Shakespeare, Aristóteles, Stanislavski, McKee, Egri, Bordwell, entre outros. Também vemos cenas de filmes recorrentes em manuais e textos teóricos como Chinatown (Polansky, 1974), Crepúsculo dos Deuses (Billy Wilder, 1950), A Malvada (Mankiewics, 98 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 1950), Umberto D (De Sica, 1952), mas também Ivan, O Terrível (Eisenstein, 1944), Barry Lyndon (Kubrick, 1975), Beijos Roubados (Truffaut, 1968), Psicose (Hitchcock, 1960). O único filme que analiso mais extensamente é Tootsie (Pollack, 1984), justamente por ser hiper-clássico. A ênfase em todo o curso é na poética, ou seja, como essas obras foram escritas e quais os procedimentos que utilizaram. É uma leitura especializada e voltada para a escrita. Por exemplo, um trabalho de leitura solicitado é a realização do pitching de um projeto de produto audiovisual a partir de Édipo Rei. O resultado tem sido excelente. Os alunos leem os clássicos com outros olhos e treinam a expressão verbal de seus projetos, o que é uma qualidade fundamental no mundo profissional hoje. Simultaneamente, desenvolvi uma série de exercícios voltados para a construção de personagens. Minha formação privilegiou os aspectos estruturais da narrativa e sempre subscrevi a afirmação de Aristóteles que diz ser possível uma história sem personagens, mas não sem enredo; ou seja, que o personagem é um dispositivo narrativo e que vê-lo como um ser humano é uma atitude ingênua. CAPA CAPA CAPA Esta visão foi ratificada nos estudos literários do século XX pelo estruturalismo. É um pano de fundo que molda nossas atitudes e todos os exercícios descritos até agora compartilham esse pressuposto. Não é hora de entrar no percurso teórico que me levou a questionar esta descrição da ficção como um fato de linguagem, mas hoje vejo os personagens como entidades que habitam o universo ficcional e SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO que partilham muitos traços “humanos”. Decidi então partir do personagem nos exercícios. Mesmo porque esse também é um ponto fraco nos trabalhos dos alunos e do audiovisual brasileiro em geral. Esta é a nova sequência dos exercícios: 1. Descrição de um personagem: Utilizando como inspiração o texto de Lajos Egri,-7 faça uma descrição pormenorizada de um personagem. É importante escolher uma pessoa conhecida, mas esconda a identidade mudando o nome ou até mesmo o sexo. FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA 2. Escrever uma cena que revele o seu personagem: Escreva uma cena de 2 páginas que permita ao espectador entender quem é o seu personagem. 3. Escrever o monólogo do seu personagem na cena: Escreva um monólogo do seu per99 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR sonagem na cena do exercício anterior , com no máximo 1 página . 4. Reescreva sua cena. Os resultados foram excelentes. O personagem é uma ponto de partida bem mais acessível ao aluno, menos árido do que a ênfase no enredo. É fundamental a exigência dele basear seu personagem numa pessoa conhecida, pois o obriga a escapar dos clichês. No ano passado criei a exigência de uma situação dramática única: um encontro entre desconhecidos. Foi uma estratégia para fugir do mini-filme, ou seja, um curta de 3 minutos com várias locações e um enredo. Ao contrário, minha ênfase durante o curso foi na escrita da cena. A avaliação dessa última experiência também foi muito positiva. A sequência de exercícios produziu cenas mais interessantes, personagens credíveis que vivem conflitos humanos. No próximo ano pretendo manter estes exercícios e os pitchings a partir de clássicos. CAPA CAPA CAPA A sequência de leituras teóricas precisa ser revisada de modo a se inserir melhor nas inquietações que a prática da escrita produz. Meu ideal é organizar o curso de modo a confrontar o aluno com uma sucessão de problemas a serem resolvidos. Por exemplo, para enfrentar o excesso de ações pouco motivadas, ler um texto de Stanislavsky sobre as circunstâncias dadas, ou Umberto Eco sobre a SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO coerência das normas do mundo ficcional. Devem ser intervenções pontuais que atendem a necessidades bem específicas dos alunos. Também pretendo deixar para o final textos de maior fôlego, como a Poética, e realizar uma prova teórica para diminuir o peso do roteiro na avaliação. Nem todos os FICHA FICHAFICHA alunos são obrigados a serem roteiristas. Depois de 10 anos da criação do Curso Superior do Audiovisual creio que construímos uma grade sólida para a formação de nossos alunos de roteiro. Mas não ideal. O certo seria começar com uma disciplina dedicada ao desenvolvimento de idéias logo no primeiro semestre com a classe dividida PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA em 3 turmas de 12 alunos. Em seguida, teríamos o curso Dramaturgia Audiovisual, cujo conteúdo seria mais histórico e teórico. A especialização começaria com Roteiro 1, onde os vários gêneros dramáticos seriam estudados e continuaria com Roteiro 2, visando a escrita de um roteiro com mais de 100 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 20 páginas. Apesar de tantas idas e vindas, de tantas dúvidas, posso assegurar que os resultados obtidos nos últimos anos tem sido muito animadores. Nossos alunos tem obtido boas oportunidades profissionais como roteiristas e ganharam vários prêmios em concursos de produção. Sem dúvida, hoje essa é a maior carência do audiovisual brasileiro. Temos nível técnico e excelentes realizadores. Mas faltam roteiristas. Faltam boas histórias bem contadas. R eferências BÍRÓ, Y.; RIPEAU, M. To dress a nude: exercises in imagination. Dubuque, Iowa: Kendall/Hunt, 1998. DANCYNGER, K.; RUSH, J. Alternative Scriptwriting. Nova York: Focal Press, 1995. CAPA CAPA CAPA RABIGER, M. Developing story ideas. Boston: Butterworth-Heinemann, 2005.Roberto Moreira SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 101 ARTEMÍDIA INFLUENTE: ROTEIRO PARA CRIAÇÃO DE ATELIÊ-LABORATÓRIO NA INTERFACE ARTE CIÊNCIA E TECNOLOGIA. C élio M artins da Matta | Pelópidas C ypriano de O liveira Pel Professor Mestre da FAU Mackenzie - Doutorando do programa de Pós-Graduação do Instituto de Artes UNESP - zcelio@yahoo. com.br | Prof Dr Livre Docente do programa de Pós-Graduação do Instituto de Artes UNESP - Orientador CAPA CAPA CAPA R esumo O artigo visa demonstrar a resultados parciais da pesquisa de doutorado em desenvolvimento no Programa de Mestrado e Doutorado em Artes do Instituto de Artes da Universidade Estadual Pau- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO lista – UNESP. Tratando de possíveis correlações da Arte Contemporânea com a interface Arte, Ciência e Tecnologia observável na construção e manutenção do Ateliê-Laboratório de Imagem Cinética Eletrônica [ALI- FICHA FICHAFICHA CE] (Figura 01). O texto relata a importância de um ambiente no qual o pesquisador nele inserido possa fazer experimentações e, pela via mais empírica, possa chegar a conclusões de algum pensamento ou sentimento que ele esteja procurando, sentindo ou analisando. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Partindo antecipadamente do pensamento de que seria necessário um ambiente onde o artista pudesse trabalhar seus conceitos criativos de artes visuais em duas e três dimensões, procuro adaptar esse ambiente para que promova melhor qualidade e capacidade de estudos para estudantes de artes 102 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR e áreas correlatas que serão futuros profissionais. O local vem sendo utilizado e organizado como um laboratório de experimentação para estudos na captura e tratamento de imagens estáticas e cinéticas. Para tal, procuro a elaboração, aplicação e avaliação de protótipos que se apresentam em formas de maquinas, experimentos, testes ou situações. O intuito do trabalho também é procurar entender o processo criativo dos futuros profissionais (hoje alunos) através da aplicação de processos e procedimentos artísticos. Palavras chave: 1. Design 2. Artes Visuais 3. Ateliê 4. Laboratório 5. Experimental CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FICHA FICHAFICHA Figura 1 - [ALICE] - Ateliê Laboratório de Imagem Cinética e Eletrônica Fonte: acervo do autor Célio M. Matta 103 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR A bstract The article aims to demonstrate the partial results of doctoral research in the development of Master ’s and Doctoral Program in Fine Arts Institute of the Universidade Estadual Paulista - UNESP. Addressing the possible correlations with the interface Contemporary Art Art, Science and Technology observable in the construction and maintenance of the Atelier-Picture Kinetics Electronics Laboratory [ALICE]. This report describes the importance of an environment in which the researcher involved can do experiments, and via more empirical, can reach some conclusions or thought or feeling that he is looking, feeling or analyzing. Starting early thought it would take an environment where the artist could work their creative concepts of visual art in two and three dimensions, try to adapt to this environment that promotes im- CAPA CAPA CAPA proved quality and capacity studies for students of arts and related areas who will be future professionals. The site has been used and organized as a laboratory for experimentation in studies to capture and SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO imaging static and kinetic. To do this, try the design, implementation and evaluation of prototypes which are in forms of machines, experiments, tests or situations. The aim of the work is trying to understand the creative process of future professionals (students FICHA FICHAFICHA today) through the application process and artistic procedures. Keywords: 1. Design 2. Visual Arts 3. Workshop 4. Laboratory 5. Experimental PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA I ntrodução Partindo de uma dificuldade (em local escolhido), realizar experimentos que são sugeridos e praticados por usuários selecionados em cada ocasião para que esses experimentos laboratoriais venham 104 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR apresentar soluções para problemáticas em arte através de aplicação prática de arte, design e áreas correlatas. São utilizados diversos livros para verificação de informações teóricas sobre problemáticas e soluções em arte além de aplicação de conhecimento técnico, de bacharelado e mestrado do autor e com essa coletânea de dados, pela via empírica desenvolver um laboratório de experimentos que possa gerar novas experimentações. Por exemplo, os experimentos e criações nos ambientes desenvolvidos serão construídos com base em conhecimento anterior, mas procurando atender a necessidade do momento dos envolvidos em uma experiência ou teste, e a cada momento são determinadas novas necessidades. Apresentando um funcionamento e um avanço contínuo e cíclico. O pesquisador necessita de um ambiente para que possa criar, representar e elaborar a sua arte. Ao CAPA CAPA CAPA mesmo tempo em que ele deve fazer experimentações desta arte. Para essas experimentações, é sugerido a via empírica, para que teste na prática seus mecanismos de trabalho e que possa chegar a conclusões de algum ou pensamento ou sentimento a que ele esteja SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO procurando, sentindo ou analisando. Essa pesquisa dentro de um ateliê controlado promove ao pesquisador uma análise dos usuários e este sendo um professor pode utilizar essas pesquisas para fomentar e dar subsídios as suas aulas e FICHA FICHAFICHA metodologias de ensino. O bjetivo A intenção deste trabalho é propiciar as bases práticas e teórico-metodológicas para a criação de um PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ambiente propício para pesquisas científicas, e com isso colher informações para aplicação em aulas laboratoriais técnico-práticas. 105 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR M étodos A maneira que acredito ser a mais específica para se conseguir criar um espaço ou adaptar um espaço existente para realizar essas experiências seria me embasar nas experiências de fato; experiências estas que serão realizadas mediante a utilização dos conhecimentos advindos a formação pretérita, bem como a que venho adquirindo; além disso, agrego os dias testes e simulações de ambientes, que me permitiram (e ainda permitem) estudar formas de se capturar as imagens de diversas maneiras possíveis dentro de um ateliê em construção no Instituto de Artes da UNESP (Universidade Júlio de Mesquita Filho). Para estudar este fato, a maneira proposta segue a idéia de inventividade contínua segundo Pareyson (1993). Além disso, procuro utilizar uma vertente fenomenológica – Ênfase no sujeito. O que ele pode pro- CAPA CAPA CAPA duzir e como sua produção sofre interferências do meio. Especificamente do ateliê- laboratório em que está inserido. Podemos chamar a experiência de “experienciar”, testar. Tomada a análise fenomenológica para evidenciar as vivências subjacentes àquela experiência, indicando o movimento intencional da cons- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ciência. Em minha pesquisa, esses testes empíricos trazem além de observações, conceitos e técnicas de arte, design e áreas correlatas, a situação criativa de estimulação e ordenação de insights criativos através FICHA FICHAFICHA de uma sequencia racional, que é um processo de materialização utilizado em Arte. Isso ocorre porque um doutor deve estar preparado para atender as duas vertentes de projeto – o técnico e o artístico – e deve com desenvoltura permitir com que os novos alunos (criadores/autores) aperfeiçoem-se utilizando-se de técnica e tecnologia disponível para o desenvolvimento de projetos PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA no mundo atual, sem que essa utilização prejudique ou intervenha de forma ou negativa na expressão do processo criativo do aluno (criador/autor). 106 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR A partir dessa preocupação com o aluno que se tornará um profissional, é possível verificar a necessidade de zelar principalmente pela utilização dessa tecnologia, mas não de maneira desenfreada a ponto de estagnar o processo de concepção e intuitivo de novas criações, principalmente na arte e no design. Os professores devem procurar perceber de que mais do elaborar uma imagem, escultura ou produto criativo qualquer mediante a um software ou plugin de criação de imagens, seria necessário ter o conhecimento teórico referente à tecnologia aplicada na concepção. Através de aplicações de exercícios na aula, é possível que se verifique que mesmo com a correta utilização de algum software ou plugin, a imagem criada pode não passar exatamente a mesma sensação pensada e previamente ensaiada porque a ferramenta tecnológica é subutilizada ou mecanicamente utilizada. CAPA CAPA CAPA Nesse caso, a tecnologia deve contribuir com o processo completo de criação e de concepção de projeto, ela deve ultrapassar a sua real funcionalidade que é a de servir de ferramenta para o processo representativo do aluno e não para bloqueá-lo em seu processo criativo. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Todo o processo criativo deve ser acompanhado pelo professor que orienta o trabalho na sala – o ateliê – e deve intervir de maneira positiva estimulando o aluno a mais do que utilizar técnicas ou tecnologias, fazendo com que o assistido consiga expressar sua criação de diversas maneiras. FICHA FICHAFICHA O professor precisa reforçar que o importante é a criação em design ou arte e que a ferramenta deve ser híbrida para facilitar a sua expressão. Devem-se utilizar conceitos teóricos, mas não se pode esquecer-se da aplicação dos conceitos para que se obtenha uma condição prática, essencial para quem busca analisar processos e procedimen- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA tos, pois as aplicações de métodos processuais requerem essa prática. Dessa forma um local deve ser adaptado ou modificado para abrigar essas aplicações, no caso uma sala, um ambiente, que foi denominado de ateliê-laboratório. 107 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Muitas vezes o falar não substitui a tentativa prática de pintar, desenhar, modelar, esculpir entre outras tentativas utilizadas no estudo da arte. Ao se tentar realizar essas práticas, o ateliê-laboratório modifica-se fisicamente para atender a condição imposta para o desenvolvimento de um ou outro trabalho. Por exemplo, se o professor puder ensaiar a modelagem de elementos de maneira tradicional antes de passar para uma modelagem assistida por software, esse aluno irá unir conhecimentos de modelagem tradicional com a modelagem digital que irá facilitá-lo no desenvolvimento de sua representação corretamente, ou seja, se não conseguir representar seu insight através de softwares, poderá tentar fazê-lo através de argila, plastilina, clay ou outro material, mas conseguirá registrar aquele momento criativo. Na ocasião, o ateliê-laboratório deverá prever as duas opções de desenvolvimento e apresentação da CAPA CAPA CAPA arte ou design em questão. Ou seja, as ferramentas de modelagem e os computadores com os softwares específicos. Se não for previsto antecipadamente, será modificado para tal. É o rigor do método essencial, legitimando uma fundamentação filosófica através de uma prática laboratorial. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO O ambiente em testes fenomenológicos em minha pesquisa de doutorado tem o intuito procurar um local “ideal” que possa oferecer qualidade e segurança em um local para os estudos de artistas, enquanto esses desenvolvem seu trabalho. FICHA FICHAFICHA É de extrema importância salientar que o principal não é a construção somente no âmbito físico de um ateliê laboratório, ou de um ou outro equipamento específico, mas sim expor o conhecimento dos testes acessíveis para todos aqueles que desejem construir seu próprio ateliê laboratório e ter acesso a aplicação da rotina de criação envolvida no assunto de uma maneira geral. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Este trabalho contará também com as seguintes obras que forneceram aspectos teórico-metodológico para o desenvolvimento e estruturação da pesquisa: Zamboni (2001, .Aumont (1993), Neufert (1987) entre outros. 108 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR D esenvolvimento da P esquisa Antes de qualquer conclusão precipitada que se possa levar essa experiência como tentativa de erro e acerto, deve ser salientado que todo projeto tem uma metodologia e a essa metodologia é agregado o valor de conhecimentos já estudados e uma base de dados já pesquisada no trabalho de mestrado. Mas também é verdade que o mesmo poderá ter conhecimentos agregados por Serendipidade, (também conhecido como Serendipismo, Serendiptismo ou ainda Serendipitia, que é um neologismo que se refere às descobertas afortunadas feitas, aparentemente, por acaso), é que é interessante se entender que história da ciência está repleta de casos que podem ser classificados como serendipismo, então caso ocorra, o fato será também considerado e não descartado. Para a análise e aplicação de testes (protótipos de vivência), é aplicado o uso da Cibernética Pedagógica Freneitiana. CAPA CAPA CAPA “A Cibernética Pedagógica possibilita, através de princípios científicos de comunicação e controle – portanto cibernético -, aperfeiçoar as relações entre dois sistemas; Sistema Docente (S.Do), aquele que pretende ensinar; e sistema Discente (S.Di.), aquele que deve aprender, sejam eles constitu- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ídos por seres humanos ou máquinas.” (SANGIORGI, 1999). Essa pedagogia foi apresentada pelo Prof. Dr. Pelópidas Cypriano de Oliveira em aula no Instituto de Artes da UNESP e também é utilizada dentro do grupo Artemídia e Videoclipe. Resumidamente, exemplifica a utilização de ensinos e ensaios laboratoriais, utilizando-se de um tratamento ao aluno como sendo um futuro artista. Com a utilização de exercícios direcionados a solução de problemas de apresentação de projetos em FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA arte e design é possível identificar como os alunos se comportam na concepção e materialização de insights criativos e como utilizam esses insights para formularem outros e criarem referenciais e subsídios para um processo cíclico, enquanto controlados em utilização segura de um ateliê. 109 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Conforme desenvolvem seus trabalhos, o professor em formação (doutorando) estimula a sua criatividade para que esta venha a ser utilizada de maneira natural na solução de outras problemáticas e analisa cientificamente os resultados. Nesse tipo de pedagogia pretende-se incluir na formação do aluno uma visão mais ampla do meio em que pesquisam e que vivem. Dessa forma, se tornará natural o estímulo da mente para resolução de problemas diversos com criatividade, algo imprescindível. C onsiderações F inais Os alunos devem criar ou modificar um trabalho mediante orientação do professor que ao mesmo CAPA CAPA CAPA tempo em que obriga uma qualidade técnica, permite o desenvolvimento criativo controlado até o ponto em que não interfira na solução ou aplicação da técnica em questão. E devo salientar que a utilização de ferramentas ou técnicas não devem se sobressair à criação e a personalidade do indivíduo. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO O “fazer” deve estar na formação artística dos envolvidos na pesquisa. Ao mesmo tempo em que irão alterando o espaço de trabalho, os envolvidos irão procurando auxi- FICHA FICHAFICHA liar no desenvolvimento dos equipamentos e ambientes para atender as suas próprias necessidades e colaboram nas pesquisas científicas. É de extrema importância informar que o interesse principal deste trabalho não é obrigar a construção física em si deste ou aquele ateliê-laboratório materialmente ou ditar uma regra obrigatória. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA O mais importante é expor um modelo de pesquisa conhecimento acessível para todos aqueles que desejem construir seu próprio ateliê ou espaço de criação. Com o andamento da pesquisa, será possível realizar e apresentar um roteiro completo dos proces110 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR sos e procedimentos que servirão como exemplo para a construção de ambientes que irão carregar valores humanos e as interfaces de arte ciência e tecnologia. A poio Grupo de Pesquisa “ARTEMÍDIA E VIDEOCLIP” | http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=0330609JCMT3EO Grupo de Pesquisa “ARTE E LINGUAGENS CONTEMPORÂNEAS”, | http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=0514803PHUCSSA Ambos do Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. R eferências AUMONT, Jacques. A Imagem. Campinas: Papirus, 1993. D’AMBROSIO, Oscar. Arte: Design aplicado. UNESP Ciência, São Paulo, ano3, n. 32, 44-45, julho, 2012. CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO FREINET, Célestin. As Técnicas Freinet da Escola Moderna; tradução de Silva Letra. Lisboa: Estampa, 1975. MATTA, Celio Martins da. Artemídia: Processos e Procedimentos no Ateliê-Laboratório do Artista-Cineas- FICHA FICHAFICHA ta. São Paulo: UNESP – Dissertação de Mestrado NEUFERT. A Arte de projetar em Arquitetura; tradução da 21.ª edição alemã. 1987 PAREYSON, L. Estética: Teoria da Formatividade; trad. De Ephraim Ferreira Alves. Petrópolis: Vozes, 1993. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA SANGIORGI, O. Cibernética e Educação. Comunicação & Educação. São Paulo, 1999. ZAMBONI, Silvio. A pesquisa em arte: um paralelo entre a arte e a ciência. São Paulo: Editores Associados, 2001. 111 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR ROTEIRO PARA GAME: O CASO DO GAME ACADÊMICO ILHA CABU Arlete dos Santos Petry 1 Escola de Comunicações e Artes - ECA | Universidade de São Paulo - USP R esumo CAPA CAPA CAPA Este artigo aborda reflexões e descreve ações realizadas para a produção de um game. Como o game visou a transposição da linguagem verbal escrita de certos conceitos teóricos em game, esse se insere na tipologia que denominamos jogos acadêmicos. Nosso foco neste texto será apontar para uma metodologia de trabalho que objetivou a construção de passos de roteirização a seguir quando do SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO planejamento e da produção de games. Essa proposta de trabalho foi organizada a partir de uma metodologia aberta, ou seja, o planejamento de cada passo do processo se dava mediante a avaliação dos resultados do passo precedente. Para a reflexão a respeito do andamento do processo de trabalho e de sua organização, contamos com alguns recursos que se mostraram eficazes. Palavras-Chave: Roteiro. Game acadêmico. Método. Produção de conhecimento. Game design document. Videojogos. 1 Doutora em Comunicação e Semiótica-PUCSP. Mestre em Educação-UNISINOS. Especialização em PsicopedagogiaFEEVALE. Graduação em Psicologia. Pós-doutorado em andamento na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo - USP com apoio da FAPESP. 112 FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR A bstract This article discusses considerations and describes actions taken to produce a game. As the game aimed the transposition of the verbal language writing of certain theoretical concepts in game, it occurs in the typology that we call academic games. Our focus in this paper will be point to a working methodology that aimed to construct routing steps to follow the planning and production of games. This propose of work was organized from an open methodology; in other words, the planning of each step of the process occurred by evaluating the results of the preceding step. For reflection about the progress of the work and its organization, we have some resources that have proven effective. Keywords: Screenplay. Academic Game. Method. Knowledge production. Game design document. Videogames. CAPA CAPA CAPA 1. I ntrodução Os games2 se constituem em uma das novas fronteiras na qual se dá o enfrentamento do espírito humano. Essa é a ideia básica que já havia sido apresentada na década passada, tanto por Sherry Turkle como por Janet H. Murray, duas pesquisadoras dos fenômenos da tecnologia, em estudos que indica- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO vam que os games seriam o próximo horizonte da revolução digital. Envolvendo uma multiplicidade de aspectos e áreas, os games se apresentam como um objeto dinâmico, de natureza interdisciplinar, transitando pelas mais diversas áreas do conhecimento, desde a tecnologia3, atravessando a arte, FICHA FICHAFICHA a matemática, a filosofia, a psicologia e chegando à comunicação 4. Envolvidos com essas e outras 2 Utilizamos a palavra inglesa game, por ser a expressão usual entre os jogadores brasileiros para indicar os jogos possibilitados pelas tecnologias eletrônicas e digitais, independente da mídia que os suporta. 3 É interessante atentar para a avaliação de McLuhan no texto Visão, som e fúria, de suas antigas posições frente às novas tecnologias. Escreve: “quando escrevi The mechanical bride há alguns anos, não tive a noção de que estava tentando uma defesa da cultura do livro contra os novos meios. Agora posso verificar que procurava fazer incidir nos novos meios da visão e do som a consciência crítica favorecida pela formação literária. Minha estratégia estava errada, porque a minha obsessão pelos valores literários cegava-me quanto a muito do que estava acontecendo de bom e ruim. O que temos de defender hoje não são os valores desenvolvidos em qualquer cultura especial ou por qualquer modo de comunicação” (McLuhan 2000: 162). 4 Esse é, por exemplo, o ponto de vista de Jenkins (2008), quando mostra a inter-relação entre as várias mídias e como os games podem dialogar com a televisão, com o cinema e a literatura, ampliando e aprofundando cada vez mais os horizontes 113 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR questões de fundo, um grupo de pesquisadores da PUCSP iniciou, em 2009, um projeto que buscou realizar o diálogo entre os saberes da academia, as estruturas narrativas e o universo da produção de games. Os resultados colhidos pelo trabalho dessa equipe, organizaram-se em uma estrutura triádica: uma tese de doutorado realizada no Programa de Comunicação e Semiótica da PUCSP que serviu como o núcleo central e motivador das investigações, três dissertações de mestrado no Programa de Pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital e, em terceiro lugar, um game acadêmico, desenvolvido colaborativamente pela equipe. Dedicaremo-nos aqui a enfocar esse terceiro elemento de pesquisa, o game acadêmico, que recebeu o nome de Ilha Cabu, bem como alguns de seus desdobramentos que adiante descreveremos. Se por um lado o game Ilha Cabu se apresenta como o resultado pragmático de uma série de reflexões teóricas acerca do conceito de jogo, a sua produção consistia na primeira grande experiência da maior parte da equipe na construção de um game. Ainda que parte do grupo já tivesse alguma expe- CAPA CAPA CAPA riência consolidada na área, desde os experimentos com modelagem tridimensional na produção de ambientes digitais interativos, passando por desenvolvimentos mais robustos na área da hipermídia, era a primeira vez que a equipe enfrentava em conjunto a tarefa de realizar uma produção maior com a moderna tecnologia das engines de games profissionais. Disso resultou uma atitude metodológica SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO que norteou todo o caminho a ser seguido: foi necessário, a cada passo, encontrar a maneira mais adequada de realizarmos a tarefa, pois, além do desenvolvimento do trabalho em si, o grupo tinha como objetivo um questionamento a respeito do método adequado e na justa medida a ser utilizado FICHA FICHAFICHA para tal empreendimento. O método de trabalho para a concepção e produção do roteiro para o game acadêmico que aqui exporemos teve uma forte influência da filosofia hermenêutica, a qual defende uma metodologia aberta de trabalho. Nesse sentido, a equipe de desenvolvimento procurou conduzir as tarefas sempre dei- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA xando aberto o campo de ação para a aprendizagem com o próprio objeto de pesquisa/produção, isto nos seus aspectos metodológicos essenciais. De outra forma diríamos que, no caso dessa pesquida narrativa. 114 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR sa, o método só poderia ser construído na perspectiva de uma organização para a ação de produção do game. Assim, a partir da experiência prévia de análise de hipermídias acadêmico-conceituais e de exercícios de transposição de textos em imagens, buscamos, ao produzir o jogo, refletir a respeito de seu próprio processo de produção. Outro argumento para a empreitada foi tomado de Kant (1724-1804), recolhido no livro Sobre a pedagogia. Trata-se da ideia de que “a melhor maneira de cultivar as potências da índole consiste no fazer por si mesmo o que se quer fazer […]. O melhor modo de compreender é fazendo” (Kant 2006: 70). Quanto a análise do trabalho de produção do game esta realizou-se já durante o seu fazer (pesquisa-ação) e, para tal, utilizamos um Caderno de Registro, criação de um Grupo de Discussão (googlegroups) e um Site com Blog e Wiki para registro de decisões e ações da equipe. 2. O conceito de G ame A cadêmico Inicialmente, entendemos o Jogo e o jogar como algo que vai além da condição de um ente e, como CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO tal, para além da presentificação em um dado objeto 5. O Jogo, para nós, é compreendido filosoficamente como a força geradora e impulsionadora da própria vida. Como tal, tem suas condições de existência, tem uma natureza que lhe é peculiar e uma estrutura que se põe a funcionar. Portanto, o Jogo Ilha Cabu, além de um game, apresenta-se como a realização de um processo que nos permitiu FICHA FICHAFICHA refletir a respeito de questões que estávamos investigando. Como os conteúdos da pesquisa tratavam de jogo, autoria, produção de conhecimento, puzzles, etc., era nossa intenção agregar à experiência com os conceitos da respectiva pesquisa, características como diversão, imersão, desafios a resolver e uma narrativa interessante, pois essa forma de comunicar, típica dos games, seria convergente com 5 Aqui estamos na sequência de um pensamento histórico sobre o jogo que remonta a Heráclito e chega ao século XX com Huizinga, Heidegger, Fink e Gadamer. Esse ponto de vista analítico foi desenvolvido em nossa tese de doutorado, intitulada, O jogo como condição da autoria e da produção de conhecimento: análise e produção em linguagem hipermídia. A pesquisa desta tese, inclusive durante o seu tempo de desenvolvimento, foi o polo norteador, ao redor do qual gravitou os trabalhos da equipe de desenvolvimento do game Ilha Cabu. 115 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR o conteúdo a ser comunicado. Nesse sentido é que indicamos que o game poderia ser pensado como a forma mais elaborada e mais intensa do jogo se fazer presente na linguagem hipermídia. Portanto, o game acadêmico Ilha Cabu é um objeto que foi produzido com o intuito de que ele permita mostrar o núcleo central de uma pesquisa e quais são as posições que foram alcançadas pela investigação. Logo, institucionalmente, não se insere imediata e prontamente no mundo do entretenimento, mas tampouco sustenta um muro intransponível entre pesquisa e entretenimento pois, como no caminho de Friedrich Schiller (1759-1805), poderíamos pensar no jogo que se estabelece entre razão e sensibilidade como a única saída para a possibilidade de um homem pleno6. Nessa concepção, a partir de nossa leitura de Peirce e da experimentação em equipe, buscou-se traduzir o texto verbal escrito da Tese em texto em linguagem hipermídia (game)7 - instinto e lógica, sensibilidade e razão podem trabalhar juntas na construção de uma experiência estética 8 que, como tal, falará tanto às nossas percepções dos sentidos quanto à nossa inteligência9. Como escreveu Peirce, em CP CAPA CAPA CAPA 7.381, “todos os sistemas das performances racionais tiveram no instinto o seu primeiro gérmen. Não apenas o instinto foi o seu primeiro gérmen, mas cada passo no desenvolvimento de tais sistemas de performance advém do instinto”. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO A partir desses pressupostos, Ilha Cabu é, ao mesmo tempo, um meio que encontramos para investigar certas questões e uma resultante da pesquisa empreendida. Ao mesmo tempo, um meio e um FICHA FICHAFICHA 6 Schiller denominará de Spieltrieb (impulso lúdico) a ação de forças aparentemente contrárias que se colocam frente a frente, sendo que caberia a cada uma delas neutralizar a força da outra e, assim, consequentemente, ambas continuariam agindo. 7 Cumprindo assim, tanto a perspectiva pensada por McLuhan, a qual nos diz que “o desenvolvimento inicial de um novo meio recuperará formas dos meios anteriores”, bem como a perspectiva da transposição defendida por Murray para os momentos iniciais de um novo meio e cultura, como no caso dos games e da hipermídia. 8 Referimo-nos nesse ponto ao termo estética que, proveniente do grego aisthesis, refere-se, essencialmente, ao sentimento e à sua integração com a atividade mental que o suporta (Barnouw 1980). 9 Em nossa leitura da Crítica do Juízo de Kant entendemos que os atributos estéticos dos objetos acompanham os atributos lógicos fornecendo espírito (Witz) à obra e definindo-a como uma arte bela. Uma ideia estética é a contrapartida de uma ideia da razão. Enquanto esta última é um conceito indemonstrável para a razão, a ideia estética é uma representação inexponível pois nenhum conceito lhe é adequado, nenhuma linguagem a alcança inteiramente. Pelo fato de “dar muito a pensar”, a representação (o objeto) amplia esteticamente o conceito. 116 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR fim. É, nesse sentido, que também podemos entendê-lo como um metaverso10, no sentido de um universo dentro de outro, revelando que a forma escolhida para se alcançar um resultado é, nada mais nada menos, que parte integrante do resultado encontrado. Nessa perspectiva de trabalho, a partir de certo momento da investigação, texto verbal escrito e game em linguagem hipermídia passaram a ser influenciados um pelo outro. Não somente o texto verbal foi transposto para a linguagem hipermídia, mas também as descobertas na produção do game, abriram novas questões na discussão do texto. O que queríamos com o Ilha Cabu era discutir os dados de uma investigação de doutorado, mas dentro de uma narrativa em primeira pessoa, com ênfase na solução de puzzles11. Ou seja, que pudesse interessar a quem estuda as temáticas, mas também minimamente interessante para quem aprecie uma narrativa digital com certo grau de desafios. Essas opções estavam baseadas na relação que o investigador estabelece com sua pesquisa, ou seja: ele é o personagem que se defronta diretamente CAPA CAPA CAPA com os dados e, também, é ele quem precisa resolver os desafios (verdadeiros puzzles) que se colocam à sua frente no percurso da investigação. Por buscarmos estas características é que o modelo dos jogos ditos educativos não satisfaziam as nossas necessidades pois, em geral, possuem um forte apelo didático que os tornam “aborrecidos”, como dizem os jogadores. Nos jogos atuais e mais ela- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO borados, nos diz Assis (2007: 23), a classificação nem sempre é fácil. “Jogos recentes que se destacam no mercado como inovadores na forma ou no conteúdo usam elementos tomados de diversos gêneros de videogames e o sucesso parece realmente estar na combinação desses elementos”. 10 O conceito foi introduzido em 1992, por Neal Stephenson, no seu romance de ficção científica Snow Crash , no qual os seres humanos, como avatares, interagem entre si e com os agentes de software, em um espaço tridimensional que usa a metáfora do mundo real. Por isso, diz-se tratar-se de um mundo dentro de outro mundo, um tipo de mundo virtual que tenta replicar a realidade através de dispositivos digitais que desloquem os sentidos de uma pessoa para esta realidade virtual. Foi cunhado, por Stephenson, para descrever uma realidade virtual sucessora da Internet. A palavra metaverso é uma junção metafórica do prefixo “meta” (que significa “além”) e “universo”. 11 A palavra puzzle é de origem inglesa e foi dicionarizada pelo Houaiss (2007), como um correlato ao termo da língua portuguesa, quebra-cabeças. Stewart (2008: 8) nos indica que existem inúmeros modos de se transformar a matemática em algo divertido. Esta forma divertida de lidar com a matemática, foi historicamente denominada de puzzle. Na sua base, um puzzle possui uma estrutura lógica, apresentando sempre um problema ou questão na qual o raciocínio e a imaginação são convocados para a sua solução por diferentes métodos. 117 FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Debruçados sobre essa reflexão de qual a melhor forma de apresentar questões conceituais, portanto, que visasse a aprendizagem e compreensão de certos conceitos, pensamos que a “solução” seria combinar elementos que caracterizam o Jogo, como alternância de estados, risco, liberdade de ação, tensão, com algum conteúdo a ser aprendido. Mais ou menos isso é o que encontramos em alguns autores que discutem os jogos digitais. Embora não julgamos já ter atingido no game Ilha Cabu toda a qualidade que sabemos ser importante para ser atraente, esforçamo-nos dentro de todas as limitações que fomos enfrentando, a explorar nossas maiores qualidades ou forças, sem abandonar nossas referências conceituais. Uma delas era manter um adequado e alto grau de imersão, experiência de forte envolvimento com uma questão, como quando pesquisamos ou queremos descobrir algo. Por isso, não planejamos a possibilidade de reset (morrer e voltar, desfazer e voltar como se não tivesse feito). Cada caminho percorrido, cada experiência vivida ou percepção que nos chega, querendo ou não, nos marca inde- CAPA CAPA CAPA levelmente, e forma nossa “enciclopédia”, nas palavras de Eco (2004), para agir no mundo. Como um jogo de emulações12, Ilha Cabu é um mundo no qual situações e simulações se manifestam e se dão no acontecer do jogar o jogo. Planejamos também a possibilidade do jogador “salvar” suas ações no game para retomá-lo do ponto que o deixou anteriormente. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO No ponto em que nos encontramos em nossa pesquisa, a formulação da ideia de um game acadêmico situa-se pela conjunção entre a jogabilidade, a narrativa e os conceitos que lhe servem de matriz, ao mesmo tempo, inspiradora e reguladora. Dessa forma, definimos game acadêmi- FICHA FICHAFICHA co como um produto da linguagem hipermídia que, considerando as características presentes no conceito de Jogo, compreenda os conceitos acadêmicos como elementos integrados ao conteúdo lúdico-narrativo. 12 Sendo emulação uma conversão de uma realidade em outra, nos games se refere a tentativa de criar um mundo virtual respeitando as condições a ele designadas. Para mais detalhes vide: http://www.topofilosofia.net/textos/B_O_Ciborgue_e_a_ hipermidia_01.pdf 118 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 3. A construção narrativa do G ame Muitas vezes nos perguntamos acerca do momento no qual se começa a criar algo e, qual o elemento que nos coloca em movimento para trabalhar por uma ideia? Parece ser de tão variadas fontes e provenientes “dos mil focos da cultura”, como disse Barthes (1988) quando falava a respeito da origem dos textos, que não há como colocar algum limite nessa questão. Aliada a essa noção, temos em Peirce que o surgir de uma nova ideia provém de uma força instintiva que nos indica qual o caminho a seguir, portanto, em alguma medida, uma nova ideia provém de nossa luta pela sobrevivência. Instintos, para esse pensador americano, são “hábitos de nossa afiliação desconhecida”, portanto, construídos pela experiência da espécie, mas também pela experiência individual. Sendo assim, qualquer dado percebido, em qualquer lugar, é material que pode acionar em nós o movimento de produção de algo. Não há limites para a imaginação. Imaginação é, por excelência, liberdade. Basta existir um encontro entre, no mínimo, dois elementos13, em alguma medida inquie- CAPA CAPA CAPA tador para um sujeito 14, que está dada a fórmula que acionará uma possível produção. Aproximar semelhanças, como fazia o personagem Sherlock Holmes, criado pelo médico e escritor Conan Doyle, é uma das formas possíveis para a criação. Acreditamos, ainda, tendo em mente as pesquisas de Thomas Kuhn, Charles-Sanders Peirce e Jacques Lacan, que certa posição no mundo facilita o aciona- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO mento e a manutenção desse movimento. Trata-se de considerar as ideias que nos surgem na forma de uma irrupção na mente ou após alguns minutos de Musement15 - mesmo que tenham a aparência de absurdas e inconsistentes (inferências inconscientes ou abduções), e trabalhar para verificar se FICHA FICHAFICHA elas fazem sentido. 13 Quando nos referimos a “dois elementos”, nosso olhar não é dirigido à relação entre dois indivíduos. Não trabalhamos com essa categoria psico-sociológica, preferindo pensar mais ao modo da categoria peirceana de signo, ou seja, algo que possui uma existência material singular, que tem um lugar no mundo (real ou ficcional) e reage em relação a outros existentes (Santaella 1992). 14 Esta é a fórmula da constituição do sujeito na psicanálise de Jacques Lacan. Podemos depreender disso, que constituirse sujeito é um ato afirmativo frente ao que recebemos do Outro, constituir-se sujeito é equilibrar-se entre alienação e separação. 15 Musement é uma palavra criada por Peirce, portanto um neologismo. De difícil tradução ao português, geralmente é entendida como devaneio, desde que suprimamos o sentido fantasioso contido nessa palavra. 119 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Alguns, por resistirem a aventurar-se no desconhecido, não consideram as hipóteses que lhes surgem. Outros, por darem pouca atenção às informações de seu entorno, poucas abduções produzem. Há, ainda, aqueles que, embora muitas abduções lhes surjam, por um ou outro motivo, não possuem a força vital necessária para colocá-las à prova. Com esse cenário em vista, nada é produzido. Apesar disso, atualmente, de acordo com Lev Manovich (2009), “muito mais gente produz cultura e tudo faz parte de uma grande nuvem de informações. As pessoas escolhem pedaços de informação dessa nuvem e fazem suas próprias versões”. Segundo esse pesquisador russo, o que tem facilitado muito essa condição atual é a cultura do remix. Isso “que já foi tabu, hoje é o padrão”, diz ele. Contudo, isso que hoje é padrão, em absoluto é algo novo. Foi o que sempre se fez, embora por muito tempo não se admitisse16, ou tampouco se percebesse. Em alguma medida, sempre se fez combinações diversas com elementos já agrupados, ou então, a combinação de elementos nunca antes apro- CAPA CAPA CAPA ximados, mas já existentes de forma dispersa. Essas ações, a nosso ver, são possibilitadas tanto pelo reconhecimento e valorização do já existente quanto pela ousadia de propor uma outra organização para os elementos de um sistema. Além disso, sentidos diferentes se constroem em função de determinadas posições de sujeitos frente ao existente (Petry 2006). SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Como poderíamos criar algo do nada se, ao nascermos, já somos imersos em um mundo que já estava aí pulsando e produzindo e que logo passará a fazer parte de nós? Como seria possível pensarmos que somos o que somos, independentemente de nosso mundo? Como muito bem nos revela o concei- FICHA FICHAFICHA to de Heidegger de Dasein, há uma impossibilidade lógica em concebermos um Ser sem seu mundo (ser aí) 17. Ou, como diria Peirce, há uma conaturalidade entre mente e cosmos. 16 O fato de não admitir-se que, ao criar-se algo, estamos fortemente apoiados em outros que nos antecederam, é o resultado da concepção de autoria na modernidade. Na base da construção dessa concepção, encontram-se: a defesa da originalidade, a libertação das autoridades inspiradoras e legitimadoras (igreja e nobreza), a assunção da individualidade e do estilo próprio, a organização do capital em torno da propriedade intelectual da obra (Fernandes apud Petry, 2006). 17 Utilizamos aqui a tradução de Dasein, proposta por Ernildo Stein, como Ser-aí, embora este mesmo autor tenha abandonado a tentativa de traduzir esta palavra por nenhuma tradução alcançar a especificidade deste construto do pensamento filosófico. 120 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Foi com esses pensamentos que começamos a trabalhar em um roteiro para o game acadêmico. Posteriormente, percebemos que ao iniciar a redação de ideias para o roteiro, já havíamos começado sua escritura, quando nem sequer sabíamos que esse projeto seria realizado. Ainda não se sabia com qual engine se trabalharia e essa decisão foi fundamental para a “batida do martelo”, em relação a outros aspectos do ambiente. Quando optamos pelo engine de games Unity 3D®, dada sua flexibilidade para receber os objetos já produzidos, logo nos agradou um esboço de Ilha. Entretanto, seria necessário modificar sua topografia para abrigar algumas características particulares18. Tendo decidido a respeito de aspectos básicos, a etapa seguinte foi reunir a equipe e definir como e qual seria a participação de cada um. Foi redigida a proposta básica do roteiro, enviada àqueles que pela tarefa se interessaram e passamos a nos encontrar. A proposta básica para o roteiro 19 foi organizada rapidamente e, após a primeira reunião do grupo CAPA CAPA CAPA de roteiro, foram acrescentadas informações quanto ao tipo de narrativa pretendida para o game (câmera em 1ª pessoa, narrativa não-linear). Foi a partir deste contexto que propomos um tipo de organização que mostrou-se muito útil no trabalho inicial de construção do roteiro, cujos aspectos descrevemos a seguir. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO 3.1. Mote inicial: Todo jogo começa com uma ideia, portanto, o primeiro passo será a descrição que situa em que tipo de ambiente ocorre a narrativa do game, descreve minimamente a personagem principal e algumas de suas características. Podem ser acrescentadas algumas falas/pensamentos FICHA FICHAFICHA possíveis para a personagem. Também contextualiza as ações com as quais o navegador irá se defrontar, fornecendo um objetivo para a sequência de fatos, o que ajudará a definir o gênero do jogo. Aqui, pode-se já indicar de que forma e qual(is) o(s) desfecho(s) para a narrativa. Ou seja, trata-se 18 Nessa época, realizamos uma viagem a Cuba para participar de um Encontro Internacional de Psicologia, no qual apresentamos um trabalho parcial da pesquisa em andamento. A experiência foi importante para que desse significado à escolha do ambiente navegável ser uma Ilha e, ainda, para a proposta de seu nome ser Cabu, uma permutação das letras do nome da Ilha comunista. 19 Acessando: http://www.ilhacabu.net/pages/Docs/01_Anota_Hipermidia_Tese.pdf, pode-se ler a proposta inicial do roteiro. 121 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR de, brevemente, definirmos qual a proposta conceitual do jogo. 3.2. Tipo de roteiro: Caracterização do roteiro, por exemplo: se o roteiro seguirá as características da Tragédia (forma dramática), da Epopeia (forma épica) grega 20, ou mista 21, definição se a narrativa será linear ou não, se a história se dará em 1ª ou 3ª pessoa, responder quem vê, quem narra e quem fala na narrativa, qual o nível de bifurcação do roteiro (possibilidades de escolhas) 22, forma de revelação do que deve ser descoberto, etc. Segundo Gosciola (2007), conhecer o processo de roteirização do cinema, os sete elementos primários do drama, citados, entre outros, por Robert A. Berman (teórico e roteirista norte-americano), é uma necessidade para realizar-se um game. Esses elementos, adaptados por nós aos games, são: um conflito base; conflitos que constroem a narrativa; cenas que promovem diferentes situações espaço-temporais; comunicar/disponibilizar fatos básicos das personagens, especialmente do protagonista; diálogos; ações emocionais no desenrolar dos conflitos e suas superações; ações físicas através das quais os conflitos e suas superações se dão nos desloca- CAPA CAPA CAPA mentos espaço-temporais. 3.3. Ambientes: Se estamos criando um mundo, este pede pela construção de espaços. Será preciso trabalhar pela definição e caracterização dos ambientes a serem navegados ou em que ocorre a narra- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO tiva. A estética escolhida para os ambientes comunicará ao jogador tanto o conceito de mundo como a sensação por ele provocada. No caso do game aqui discutido, o que fizemos além da descrição de cada lugar foi planejar como se dariam as passagens de um a outro ambiente no universo dos vários 20 Para conhecer esta caracterização, aplicada aos games, vide GOSCIOLA, Vicente. A Linguagem Audiovisual do Hipertexto. In: FERRARI, Pollyana. Hipertexto Hipermídia: as novas ferramentas da comunicação digital. São Paulo: Contexto, 2007. 21 Lembramos que estas escolhas tem como base a Poética de Aristóteles (1973), para o qual tanto as formas classificadas como mistas, trágicas ou épicas precisam responder qual o meio, o objeto e o modo encontrado para imitar. Se apostarmos que os games podem ser um meio de expressão de um artista, esses seriam o meio de imitação. O objeto a ser imitado são as ações realizadas por agentes. No caso da tragédia, os atos dos heróis por estes realizados são o objeto e o modo como as ações são realizadas é dramática. O mesmo objeto, por exemplo, o herói, pode ser conhecido pelo modo narrativo típico da Epopeia. Nossa opção foi pela mista: o modo narrativo no cinematic inicial que contextualiza o enredo e as ações realizadas pelo jogador como agente das ações. 22 Brenda Laurel apud Gosciola (2007), chama a disponibilização de escolhas de alcance, uma das variáveis do conceito de interatividade contínua. As demais variáveis são frequência (com qual frequência há interação) e significância (o quanto as escolhas afetam os conteúdos). 122 FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR ambientes que compõem a ilha. 3.4. Elementos em cada um dos ambientes: Organização da lista das personagens e dos objetos com suas características peculiares. As ações e características físicas e psicológicas, bem como o clima emocional das personagens devem aqui ser acrescentados, passo que seguimos no documento de design de nosso game. Novamente, especialmente por se tratar de um game acadêmico, uma descrição e explicação dos conceitos a serem discutidos em cada ambiente se mostrou importante, particularmente no momento da criação dos desenhos e dos caracteres, das animações das personagens, da construção da engine de IA ( inteligência artificial) e do design sonoro. 3.5. Acontecimentos e fatos para o enredo: Trata-se da sequência dos eventos que se desdobram no jogo. Pode ser realizado em forma de uma grande lista de ações a ocorrerem em determinados locais e momentos da narrativa e, no caso de game acadêmico, o motivo para as escolhermos (conceito a ser CAPA CAPA CAPA trabalhado) é adequado que seja explicitado. 3.6. Frases e vocalizações para o roteiro: Fazer uma recolha de frases pertinentes à proposta do game mostrou-se fundamental para ir dando corpo ao roteiro. Isto por três motivos: 1) não tínhamos uma vasta experiência no campo da criação de roteiros; 2) o roteiro em linguagem hipermídia, a nosso ver, SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO não necessitava seguir o tipo de narrativa exigido no texto apenas verbal, escrito ou não e, ainda; 3) o game tinha como referência uma pesquisa acadêmica, ao mesmo tempo em que era parte integrante desta, ou seja, nele discutiam-se conceitos e defendia-se uma tese. Portanto, essas frases foram sendo FICHA FICHAFICHA colocadas na “boca” (fala) de personagens do game, representadas em ações ou mesmo materializadas em objetos. 3.7. Ideias-guia: Esta informação não é fundamental para a organização do roteiro, mas pode ser útil, quando queremos deixar registrada alguma ideia ou pensamento do qual não queremos nos afastar PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA como proposta de roteiro. Ela converge com o Mote inicial enquanto proposta de organização de trabalho e deverá funcionar como um item a nos lembrar do foco temático de nosso jogo. 3.8. Referências: lista de endereços Web com referências a objetos ou informações importantes para 123 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR a produção do game. 3.9. Enredo: O passo seguinte é a escrita do enredo ou história a ser contada/experienciada no jogo. Retomamos Aristóteles para quem a tragédia seria composta por seis partes que a designam: mito, caráter (qualidade dos personagens), elocução, pensamento, espetáculo e melopeia (melodia das falas). Mas o elemento que Aristóteles diz ser o mais importante da tragédia é a trama, que pode ser definida como o conjunto de nós que são provocados pelas ações praticadas pelos agentes. Assim, os agentes assumem caracteres para efetuar ações, sendo as ações e o mito, para o filósofo, o mais importante da tragédia, constituindo dessa forma, também a sua finalidade. Esse modelo se mostrou vantajoso para ser utilizado, com as devidas alterações ao tipo específico de projeto, por pessoas que não tem na escrita literária um ofício. Como não contamos com nenhum escritor profissional, construímos o roteiro tendo como referência as ideias centrais que a temática CAPA CAPA CAPA em investigação já havia conquistado, levando-as para cenários, personagens e objetos que nos ajudariam a dizer da pesquisa através de uma narrativa. Identificamos em Hight e Novak (2008), uma proposta de documentação de Design de Games, escrita por Chris Taylor, na qual encontramos muitas das informações que dispomos em nossa organização SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO inicial do game document design (GDD). Outras informações, que não apontamos no roteiro, foram disponibilizadas na Wiki do Projeto, prática usual entre muitos designers de games, já que facilita a visibilidade dos dados do game para acesso da equipe. FICHA FICHAFICHA Ainda a respeito da narrativa, diferentemente do relato oral de uma história, do qual espera-se uma explicação para os acontecimentos, em um game o que se quer é viver uma história, de alguma forma ser o responsável pelos fatos (Schuytema 2008). Como na vida, os ambientes, objetos e demais signos que encontramos em um game, comunicam pensamentos. No caso particular do Ilha Cabu, eles co- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA municam o tema e as questões discutidas na pesquisa. Em nosso esboço inicial de roteiro, o que buscamos foi caracterizar cada um dos ambientes da Ilha, as ilhotas, de forma a representar cada um dos conceitos principais da investigação. Desde o início 124 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR pensamos, e mantivemos esta ideia: os nomes das ilhotas (conceitos principais da pesquisa e da Tese associada) somente serviriam para a organização do trabalho, não se constituiriam em uma informação dada ao jogador. Se assim o fizéssemos, o game assumiria características de material didático, o que pretendíamos evitar. Foi assim que passamos a trabalhar no aprofundamento conceitual do roteiro, por meio de dois tipos de documentação: as representações gráficas e as parametrizações dos eventos. [Figura 1: Parametrização lógica e desenhos do evento Lobos] No trabalho de roteirização estávamos acompanhados por uma imagem ampliada do mapa da Ilha Cabu, que nos ajudava a planejar o espaço no qual cada elemento ou evento aconteceria. Essa foi a forma que nos pareceu mais natural para que o roteiro pudesse crescer cada vez mais. Não mais texto verbal escrito, mas texto na forma de Parametrizações e Desenhos. Se entendermos narração como uma “sequência de eventos que exibe o que acontece” (Assis 2007: 39), essa opção pode ter sido acertada em se tratando da produção de um game. Para marcar a localização no mapa de cada evento, objeto ou personagem, pensamos em utilizar miniaturas de obje- CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO tos23. Na falta destes, usamos como marcação, nosso velho conhecido das leituras: o adesivo Post-it. [Figura 2: Mapa da Ilha Cabu com seus marcadores] Esse trabalho de localização das personagens, objetos e eventos na imagem 2D da Ilha, serviu de in- FICHA FICHAFICHA dicativo para os programadores situarem os eventos planejados, como vemos na ilustração 3. [Figura 3: Mapa 3D da Ilha Cabu] Apostamos em tentar organizar o roteiro o máximo possível para nos ajudar na sequência dos traba- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA lhos. Mesmo assim, ainda ficaram alguns detalhes em aberto, questões que não conseguimos decidir 23 Muitas empresas de games, quando da fase de construção do planejamento do jogo, utilizam-se de protótipos físicos para ajudar a compreender os eventos e ações e, assim, melhor dimensioná-los. Vide: FULLERTON, Tracy. Game Design Workshop. 2 ed. Massachussets: Morgan Kaufmann, 2008. 125 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR naquele momento e que acreditávamos que somente se resolveriam à medida em que a programação e a animação começassem a dar “vida” à narrativa. Em nossa prática docente em curso de Jogos Digitais, orientamos nossos alunos a construir protótipos físicos e digitais, como passo que antecede a produção propriamente dita do jogo, como mais uma alternativa para evitar retrabalho de produção. Entretanto, como escreve Gosciola (2007: 119), “o roteiro é um organismo vivo suscetível a interferências e interferente em todas as outras atividades que compõem a criação e a execução da produção, tanto de um game quanto de um filme”. Portanto, à medida que avançávamos no trabalho de produção propriamente dito, íamos encontrando as soluções que faltavam, adaptando o planejado frente ao que seria possível, ou seja, criando novas ideias, insistindo na permanência de certas decisões anteriores e abrindo mão de outras tantas. Essa experiência reafirmou a fundamental importância do planejamento prévio e como conduzi-lo no processo de produção. 4. O s puzzles como pontes para a construção de conhecimento Assim como toda pesquisa científica inicia-se por um problema a ser resolvido, uma questão a ser CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO investigada - uma espécie de puzzle científico -, nosso desejo no game Ilha Cabu foi proporcionar ao navegador momentos de desafios e oportunidades para construções cognitivas, sejam estas referentes a narrativa em Cabu bem como ao resgate de conceitos supostamente já conhecidos. FICHA FICHAFICHA [Figura 4: Trajeto para a realização do puzzle] Portanto, esses desafios - puzzles - foram propostos a partir de conceitos metodológicos lógicos, matemáticos e narrativos, sendo apresentados e refletidos pela equipe de roteiro no decorrer das reuniões, mas também por meio de um mail-list do grupo. [Figura 5: Cena do início do puzzle] De forma geral na Ilha Cabu existem sete puzzles, sendo quatro de raciocínio lógico-matemático, 126 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR dois com características da lógica e um de memória auditiva. Há ainda outros de complexidade menor, como o dar corda em uma Caixa de Música, descobrir um Mapa da Ilha em meio a livros etc. Tínhamos como fio norteador que a consequência de resolver um puzzle deveria vir na forma de um maior esclarecimento a respeito da Ilha, ou seja, de um crescente desenvolvimento na produção e construção do conhecimento narrativo e também resgatando e provocando o navegador a prosseguir na pesquisa, na exploração dos espaços navegáveis da mesma. Em virtude disso, alguns puzzles oferecem como recompensa a passagem para outra ilhota, em outro caso, o jogador ainda recebe um barco que possibilita-o trafegar pelo rio entre as ilhotas. Em outro, a recompensa encontra-se em ouvir uma música que concomitantemente abre uma passagem que conduz a um portal. Os puzzles estão detalhados na Wiki do Projeto que foi disponibilizada à comunidade24. Para construirmos um puzzle, nesse ponto, fez-se necessário compreendermos o que é um puzzle. Stan Isaacs (apud Scott in Fullerton 2008), de forma muito simples diz que um puzzle tem duas ca- CAPA CAPA CAPA racterísticas: 1) é algo divertido e, 2) possui uma resposta correta. [Figura 6: Cena de chegada à Vila Medieval] De forma mais elaborada, Tonéis (2010, p.114), dirá que “um puzzle se constitui em uma estrutura SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO lógica organizada e aberta que encaminha um processo reflexivo que culmina na compreensão de um dado problema que se constitui no próprio puzzle”. Continua dizendo que o caminho da investigação e vivência de um puzzle tem seu apogeu em uma ampliação da experiência estética associada a FICHA FICHAFICHA ele, bem como em uma ampliação da potência de formular e resolver problemas. Assim um puzzle oferece, segundo Tonéis, uma abertura de mundo, na qual o processo de construção e re-construção de heurísticas, bem como o desenvolvimento do pensamento criativo encontram-se intrinsecamente desenvolvidos. Portanto, é no caminho da própria produção de conhecimento e em favor de seu constante crescimento e reflexão que os puzzles presentes na Ilha Cabu procuram oferecer momentos PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA desafiadores e instigantes aos exploradores, àqueles que se aventuram no caminho da descoberta. 24 127 A URL da Wiki do Projeto é: http://www.ilhacabu.net/wiki ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 5. U m método de trabalho Como um todo, nossa equipe estava envolvida na experimentação de uma atividade nunca antes vivenciada. Portanto, tínhamos uma certa consciência de que registrar o maior número possível de dados seria importante para a reflexão acerca do trabalho que se iniciava. O game, como já dissemos, fazia parte e seria a resultante de um projeto maior chamado Projeto Ilha Cabu, que abarcaria de forma inclusiva os desenvolvimentos e reflexões a respeito do game e de seu processo de desenvolvimento. Nesse sentido as ações do Projeto incluíam reuniões com a equipe dos participantes e a implantação de um espaço virtual no qual todos foram incentivados a armazenar as etapas de suas criações, na forma de um Site, Blog e Wiki. Na Wiki colocaríamos o documento de design da Ilha, no Blog as notícias mais relevantes do processo em andamento e o Site teria a função de tornar público o Projeto. Além desses, é claro, o Game propriamente dito, faria parte do Projeto e foi projetado para ser realizado o seu download e mesmo a sua execução on-line. CAPA CAPA CAPA Além da Wiki, como local de registro das etapas realizadas, mesmo antes da primeira reunião do Projeto, utilizamos um Caderno de Anotações, no qual foram feitos registros de reflexões e decisões relativas à Ilha Cabu. Essa prática acompanhou todo o processo, do planejamento à sua produção e, mostrou-se eficaz para que não perdêssemos da memória boas ideias e reflexões. Essa experiência SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO repetimos na disciplina de Inovação e Criatividade do curso de Jogos Digitais das Faculdades Metropolitanas Unidas - FMU em São Paulo, como prática que acompanha o planejamento de um game. Os resultados que aparecem nos sugerem que essa prática potencializa o processo de criação, pois leva FICHA FICHAFICHA o que era um pensamento ao plano da materialidade de uma página preenchida. No que diz respeito à forma adotada para o trabalho das equipes, embora cada uma delas se ocupasse com aspectos referentes ao seu maior interesse e conhecimento, à medida do envolvimento no projeto, todos eram incentivados a comentar, contribuir e mesmo realizar algo de uma especificidade PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA que não a sua. Sendo essa uma realidade quase impossível de ocorrer em grandes produtoras de games comerciais, teve um efeito motivacional importante sobre a equipe, inclusive na descoberta de novas habilidades em vários participantes. 128 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 5.1 Documento de Design Desde o início, entendemos que a parametrização seria importante não somente para os desenhistas, modeladores 3D e os programadores realizarem o seu trabalho, mas também como forma de organização da documentação do processo e evolução do design do game. No caso particular da programação, não sendo a equipe de roteiro a mesma que a da programação, parametrizar foi a forma que encontramos de comunicar a esta última, como os eventos ocorreriam no game. Os eventos da narrativa foram parametrizados para que a equipe de level design e programação pudesse ter o maior amparo possível. Além disso, fazendo a parametrização dos eventos/cenas estávamos gerando uma documentação e, assim, registrando o processo dessa produção. Desta forma, começamos a produzir um conhecimento a respeito de um método possível para a produção de games25. CAPA CAPA CAPA 5.2 Método de Programação O trabalho de programação foi construído a partir de reuniões da equipe de dois programadores, sendo somente um formado na área. Essa começou a reunir-se desde o início, concomitantemente SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO à equipe de roteiro: foram ciclos semanais para definir o escopo da programação e o que precisaria ser implementado. As ideias eram especificadas, pensadas, implementadas via trabalho no código, testadas em ambiente teste e apresentadas. A partir disso, novas definições eram especificadas. Esse ciclo de trabalho é denominado em computação de “modelo em espiral”, compreendendo: especifi- FICHA FICHAFICHA cação, codificação, testes e entrega. A engine utilizada foi a Unity, como já mencionamos, e a programação foi realizada em Javascript e C#. Foi implementado um sistema de Inteligência Artificial (IA) para o sistema de locomoção e comportamento das personagens. Planejado um caminho de percurso a ser executado por uma per- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA sonagem, foram estabelecidos pontos (chamados de way points) nos quais possíveis modificações 25 129 Para visualização e leitura das parametrizações descritivas e dos fluxogramas, acesse: www.ilhacabu.net/wiki ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR de comportamentos poderiam ocorrer dependendo das circunstâncias, como por exemplo, presença do navegador ou comportamentos anteriores já realizados. Muito utilizada nos games, este tipo de IA foi também relacionada com a ideia de máquina de estado, funcionando para ativar ou desativar situações nas quais uma personagem ou jogador deve passar em determinados momentos do jogo, bem como organizar os comportamentos das personagens dentro de hierarquias. 5.3 Desenvolvimento de cenários em imagem e som, design de personagens [Figura 7: Alguns personagens da Ilha Cabu] Todo conceito possui uma estrutura tridimensional. Partindo desta reflexão heideggeriana, nosso grupo de pesquisa desenvolveu a ideia de que todo modelar tridimensional pode ser uma forma de um pensar, o que se revelaria, inclusive, na produção digital dos games. Essa ideia é designada como topofilosofia (Petry 2003) e relaciona a atividade de modelagem tridimensional para os games e o CAPA CAPA CAPA pensar espacial na filosofia. Essa profundidade percebida nas personagens, objetos e ambientes 3D, foi o que nos fez decidir por trabalharmos tridimensionalmente os ambientes e personagens. A percepção em 3D facilita o envol- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ver-se com o mundo digital que aparece diante de nós, por exemplo, em um game. Foi a partir dessas ideias metodologicamente norteadoras que o trabalho de modelagem dos ambientes, objetos e personagens da Ilha Cabu foi iniciada a partir de uma lista que derivou do roteiro FICHA FICHAFICHA do Game e de seu Mapa. A lista das tarefas de modelagem de estruturas arquitetônicas e objetos foi distribuída aos membros da equipe formada ao todo por 9 pessoas, embora com quantidade muito variável de produção. A metodologia, entendida como a detalhada organização das etapas e processos de consecução do trabalho, tomou por base as etapas de conceituação, esboço-desenho-planejamento e execução em software de modelagem tridimensional. Dentro do processo foram utilizados PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA inúmeros softwares, sendo que para a modelagem de ambientes e objetos utilizamos: Cinema 4D, Wing3D e Hexagon. Algumas personagens foram trabalhados por diversos membros da equipe - o que entendemos e definimos como uma autoria compartilhada -, como foi o caso da personagem An130 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR toine. Dentro do processo de modelagem de personagens e animação foram utilizados especialmente os softwares: Quidam 3.1, Poser Pro, DAZ Studio e Cinema 4D. Já a animação inicial do game Ilha Cabu foi realizada em 2D, como uma proposta de contraste de linguagem imagética e, por um mesmo animador. Foi produzida uma cena inicial e outra final na estética pixel art. Já a construção sonora, desde o inicio ficou a cargo do pesquisador na equipe que possuía formação artística em música. Mesmo assim, outros integrantes colaboraram com sugestões e mesmo indicações de contatos para a produção sonora. Além disso, tivemos a participação de um compositor norte-americano, que nos cedeu algumas de suas músicas para uso no game; fizemos contato com outro músico brasileiro que colaborou na produção do som da animação inicial do game. Além disso, contatamos outros grupos de músicos para que autorizassem a inserção de seus vídeos musicais em uma apresentação organizada na Ilha, para compor a sequência da resolução do Puzzle da Jukebox. Também tivemos a participação de músicas do folclore popular, a partir de um CAPA CAPA CAPA autor de uma matriz de pesquisa antropológica, e o trabalho de criação de letra e canto de um poeta nordestino, que produziu o canto da personagem Trovador, que diz da Ilha na qual habita. As demais intervenções sonoras foram trabalhadas a partir de uma prévia descrição de cada um dos ambientes, personagens e ações principais, e produzidas a partir da ideia de síntese computacional26. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Todas essas etapas metodológicas que incluíam em si mesmas facetas teóricas e pragmáticas discutidas pela equipe de pesquisa, produziam uma energia que resultava naquilo que a fenomenologia hermenêutica designa como experiência estética: uma experiência que gerava um objeto conceitual- FICHA FICHAFICHA -estético e que tinha por característica a transformação cognitiva dos próprios participantes. 6. C onclusão PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA O desafio da realização de um game acadêmico é já em si mesmo algo gratificante. Mais ainda quan26 Documento que guiou esse trabalho situa-se em: http://www.ilhacabu.net/wiki/images/1/16/Conceito_ Ilhotas_01.pdf 131 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR do uma equipe de pesquisa pode efetivamente lançar-se em uma produção compartilhada, como ocorreu com a equipe do Projeto Ilha Cabu. Passar do conceito para a forma plástica e experiencial de um game foi um desafio que reuniu conhecimento, arte e, sem sombra de dúvida, divertimento. O que apresentamos aqui de forma sintética, foi o relato parcial de um ano de trabalho ao redor de conceitos, metodologias em desenvolvimento, técnicas e debates que em muito contribuíram para uma visão mais alargada do conceito de jogo e da sua importância, não somente para a cultura, mas fundamentalmente para os destinos da pesquisa acadêmica no Brasil. Como nosso leitor pode perceber, acreditamos - pois vivenciamos nessa experiência de produção que pensar o roteiro de games implica compreender as características da linguagem no qual é realizado, ou seja, compreender o que é a linguagem hipermídia. Feito isso, o roteiro para games se complexifica. Embora tenha suas bases históricas e conceituais na compreensão do roteiro na literatura impressa e nas aprendizagens com o teatro (Laurel 1993), o rádio, a televisão e o cinema (Manovich CAPA CAPA CAPA 2001), a hibridização dessas formas de expressão trazem consequências. Algo foi modificado quando estes meios/formas de comunicar se encontraram trazendo suas conquistas para o ambiente computacional, questionando, inclusive, o que entendemos por roteiro. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO A forma de trabalho adotada para a produção do jogo acadêmico Ilha Cabu mostrou-se adequada dentro do contexto que tínhamos para sua realização. Foi um marco irradiador para grande parte dos membros da equipe que, a partir dele, se engajaram de forma intensa na pesquisa e produção de games. A continuidade do projeto segue na discussão do conceito de game acadêmico, na verificação FICHA FICHAFICHA da possibilidade da fusão entre entretenimento e aprendizagem, na compreensão das qualidades narrativas dos games e sua influência nos jogadores (nosso pós-doutorado), em estudos a respeito dos puzzles (doutorado), entre outros. O trabalho de produção desse jogo nos mostrou a relevância do preparo da documentação do design PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA de um jogo, nos ensinou na prática quais os elementos essenciais no planejamento e na produção de um jogo, bem como pudemos experimentar uma forma de gestão da equipe de trabalho que trouxe um incremento nos processos de criação e autoria. O nosso desejo é que outras experiências desse 132 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR tipo possam ser realizadas, nas quais as fronteiras entre as várias disciplinas possam ser abrandadas e a formação de novas competências interdisciplinares possam ser promovidas. R eferências ARISTÓTELES, “Poética”. 1973,Tradução Eudoro de Souza. In: Os Pensadores, vol. IV. São Paulo: Abril, 443-471. ASSIS, J. P. 2007, Artes do videogame:conceitos e técnicas. São Paulo: Alameda. BARTHES, R. 1988, “A morte do autor”. In: O Rumor da Língua. São Paulo: Brasiliense. ECO, U. 2004, “Chifres, Cascos, Canelas: algumas hipóteses acerca de três tipos de abdução”. 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Igualmente, agradece a todos os demais cole- FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA gas da equipe que participaram da realização do game Ilha Cabu e à Isadora Raquel Petry pelas reflexões sobre a Poética de Aristóteles. - Texto modificado a partir da publicação anterior em: http:// www.feevale.br/files/documentos/pdf/46281.pdf 134 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR ENSINAR DRAMATURGIA AUDIOVISUAL- NOVOS PARADIGMAS EM TEMPOS DE DIGITAL Luciana R odrigues Silva Professora Titular do Departamento de Cinema da Faculdade de Comunicação e Marketing da Fundação Armando Álvares Penteado (FACOM-FAAP) e presidente em exercício do FORCINE | pelu@terra.com.br CAPA CAPA CAPA R esumo O presente trabalho, cuja síntese foi apresentada oportunamente na “Mesa de debate Ensino de roteiro, Experiências e Resultados” que compôs o programa do “III Seminário Histórias de Roteiristas – Múltiplas telas”, apesar de possuir um único escopo, sobre os desafios de ensinarmos dramaturgia SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO cinematográfica na atualidade divide-se em duas partes a fim de facilitar a compreensão e estimular futuros debates. Na primeira parte discorreremos sobre as ações e desafios do ensino de dramaturgia cinematográfica FICHA FICHAFICHA na instituição de ensino superior a qual me vinculo, o Departamento de Cinema da FACOM/FAAP, com 200 horas de matérias específicas, divididas em 5 semestres: Argumento Cinematográfico, I e II, Roteiro I, Roteiro II e Roteiro para projeto de TCC. No segundo momento do texto falarei acerca de alguns questionamentosque levantei na minha tese PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA de doutorado, sobre a dramaturgia cinematográfica e seu ensino em tempos de digital. Hasteio questões inerentes às dificuldades de diálogo entre professores, Imigrantes Digitais, com uma nova geração, Nativa Digital, que está ingressando nos bancos escolares e de um possível novo paradigma 135 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR dramatúrgico, com novos cenários e possibilidades no desenvolvimento de roteiros, com a figura do interator/jogador tomando o lugar do espectador clássico. Saliento a importância e a urgência do debate, principalmente em face de que em menos de dez anos o numero de escolas de ensino superior de graduação em cinema e audiovisual cresceu 300%, existindo hoje 54 escolas, sem contar as muitas de habilitações na área de radialismo. Palavras Chaves: Dramaturgia Cinematográfica-Nativos Digitais- Novos Paradigmas A bstract The following paper, whose summary was presented at the “Screenwriting Education, Experiences and Results Panel”, a part of the “III Screenwriter ’s History Symposium – Multiple Medias”, CAPA CAPA CAPA despite having an unique scope over the challenges of teaching screenwriting in the present day, is divided into two parts, as a way to favor its comprehension and stimulate future discussions. On the first part, we discussed the actions and challenges of teaching dramatic screenwriting in the institution of higher education of which I’m currently part of, The Cinema De- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO partment of FACOM/FAAP, with over 200 hours of specific courses, divided into 5 semesters: Fundaments of Screenwriting (I and II), Screenwriting (I and II) and Screenwriting Thesis. For the second part of the paper, I will speak about a few questions I came across with on my Doctoral thesis regarding Dramatic Screenwriting and its teaching in the digital era. I raise questions FICHA FICHAFICHA intrinsic to the difficulties of dialogues amongst professors - digital immigrants – and a new generation – digital natives – currently enrolling institutions as recent faculty members, as well as I present you a possible original dramatic paradigm, with new scenarios and potential approaches on narrative development, with the figure of an interactive audience replacing the classic spectator. PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA I accentuate the significance and urgency of this debate, specially taking into account the significant 300% growth on the number of Higher Education Film Programs over the last 10 years, reaching 54 institutions, not to mention many number of programs in the broadcasting field. 136 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Keywords: Dramatic Screenwriting-digital natives- new paradigm E nsinar D ramaturgia A udiovisual - novos paradigmas em tempos de digital O presente artigo traz algumas sínteses acerca de reflexões que venho realizando, tanto nas minhas atividades como docente, ministrando disciplinas de Argumento Cinematográfico, quanto nas minhas experiências na área de ensino de cinema, como pesquisadora, cujo mestrado e doutorado tiveram esse escopo1 e como membro de diversas gestões do FORCINE- Fórum Brasileiro de Ensino de Cinema e Audiovisual. Ressalte-se que esse texto é extremamente sintético e não dá conta da totalidade de desafios que enfrentamos na atualidade, principalmente frente ao crescente interesse despertado nos jovens em estudar audiovisual, com os cursos da área no Brasil crescendo 300% em menos de 8 anos, porém CAPA CAPA CAPA serve como provocação para debates futuros. O D epartamento de C inema da FAAP SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO O curso de Cinema da FAAP é uma habilitação da Comunicação Social, existindo desde o início dos anos 70 e convive com diferente habilitação da mesma Faculdade, específica em Rádio e TV. A área que podemos intitular de Dramaturgia Cinematográfica, além de ser tratada em outras disci- FICHA FICHAFICHA plinas, por exemplo, as de Direção e as de Animação, ocupa cinco semestres com total de 200 horas aulas ao todo, assim divididos: • Argumento I- 1º semestre- 40 horas aulas 1 Ambas orientadas pela professora Doutora Maria Dora Genis Mourão na ECA/USP, a dissertação se intitulou A Formação em Ensino em Instituições de Ensino Superior Brasileiras- Universidade Federal Fluminense, Universidade de São Paulo e Fundação Armando Álvares Penteado e a tese de doutorado O Cinema Digital e seus Impactos na Formação em Cinema e Audiovisual. 137 PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR • Argumento II- 2º semestre- 40 horas aulas • Roteiro I- 3º semestre- 40 horas aulas • Roteiro II- 4º semestre- 40 horas aulas • Roteiro para projeto de TCC- 7º semestre- 40 horas aulas. Em Argumento I ministro as principais teorias de dramaturgia procurando sempre, na mesma aula, desenvolvê-las com exercícios. Trabalhamos a origem da Dramaturgia, onde os alunos estudam, leem e analisam teatro grego e, no mínimo, cinco tragédias gregas e a Poética de Aristóteles. Também estudamos algumas passagens bíblicas, peças teatrais, estimulando a observação dos específicos de cada linguagem. Trabalhamos a Dramaturgia Clássica: os Atos; a construção das personagens; a lei da Progressão Contínua; o conflito; o processo de construção de uma história cinematográfica desde CAPA CAPA CAPA a inspiração, ideia, sinopse, escaleta, o argumento, noções dos tipos de roteiro; a jornada do Herói (Jung, Campbell, Vogler), Syd Field, McKee e outros. Há, ainda, sensibilização com imagens, artigos de jornal, frases, músicas, histórias familiares para construção de um argumento para cinema. São estudadas as Situações Dramáticas, As leis do drama em Boal, Brecht... e, ao final, realizamos análise SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO de filmes que podem ser enquadrados como modernos (não clássicos). Em Argumento II meu foco é na construção e análise de argumentos cinematográficos, de forma bastante prática. No início há exercício de construção de personagens a partir da análise dos próprios FICHA FICHAFICHA colegas, a construção de diálogos através de anotações do cotidiano, estudo das estratégias de adaptação de literatura para cinema. Encerramos a primeira parte do curso com análise de cada sequencia de um longa-metragem (três aulas). Depois usamos o método de oficina: os alunos apresentam o argumento adaptado de um conto bra- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA sileiro para a sala e os colegas o analisam e contribuem coletivamente para seu desenvolvimento, a cada aula. Sobre as disciplinas de Roteiro pedi informações ao titular, professor Hugo Harris, que informou 138 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR também manter um foco na prática, com exercícios direcionados para a criação de cenas, diálogos, exposição de conflitos e desenvolvimento de personagens e de roteiros completos. Em Roteiro I retrabalha ideias desenvolvidas em Argumento I e II, retomando e revisando do conteúdo com foco na construção do roteiro. No módulo seguinte, na disciplina de Roteiro II, pede aos estudantes que façam roteiros de média-metragem (entre 30 e 40 minutos), dando-lhes a possibilidade de escreverem algo mais longo, para não ficarem apenas no curta, que foi escrito no final de Roteiro I. A ideia é aproximá-los à realização de um longa-metragem. O desenvolvimento de roteiros de longa-metragem não seria possível dado o tempo curto para avaliação e a importância de um feedback cuidadoso. Nos 5º e 6º semestres não há disciplinas específicas de dramaturgia, mas os alunos fazem filmes, de diferentes formatos, nas disciplinas da área de Realização, nesse caso eles desenvolvem roteiros com CAPA CAPA CAPA professores dessas disciplinas que são submetidos apitchingspara serem realizados. O professor José Roberto Sadek é responsável por “Roteiro para projeto de TCC”, no 7º semestre. Nesse momento os alunos já estão preparando seus filmes de conclusão de curso, a serem realizados SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO no semestre seguinte (8º), então o professor retoma os princípios básicos que já foram ministrados e trabalha nos roteiros que serão submetidos a uma banca formada por professores, o pitching é publico e mobiliza grande número de alunos de Cinema. Pedi a Sadek para me falar sobre a sua experiência e relatar alguns desafios que vem enfrentando. Ele listou alguns, como: existe grande diferença entre o que os alunos querem dizer e o que efetivamente vem escrito em seus roteiros. Considera que a mediação, o roteiro, não está bem assimilada como código, não lhes sendo familiar como seria esperado. FICHA FICHAFICHA PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA Outra questão que lhe chama atenção é uma espécie de crise de forma, de experimentação, com grande incidência de filmes metalinguísticos, que parecem já terem sido vistos antes, mas que para os alunos se “configuram como um passo na direção da vanguarda ou da experimentação da linguagem 139 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR cinematográfica. A mim parecem apenas brincadeiras inofensivas sobre o universo que fica atrás das câmeras, em filmes que não acresceriam nada e talvez não precisassem ser feitos.” (sic). Um terceiro aspecto seria, para Sadek, uma crise de conteúdos, de temas, com pouca relevância nos assuntos tratados: “escolhem temas leves e quase fúteis ou temas extremos”(sic). Alguns filmes não passam de referencias, e superficiais, dos seus cotidianos ou de universos e personagens que os estudantes pouco conhecem. Existem poucas reflexões sobre situações sociais, políticas, humanas e muita incidência de temas relativos à morte: “que talvez venha da vida morna, sem objetivos, talvez venha da existênciade parentes em estado terminal, ou talvez venha de causas mais incomodascomo a morte- o que parece frequente nesta geração.” (sic). Essas preocupações não são exclusivas de professores da FAAP ou, mesmo, brasileiras. CONSIDERAÇÕES ACERCA DE ENSINAR ROTEIRO HOJE Essas considerações gerais que agora lhes apresento são frutos da pesquisa que conclui em 2011 e fazem parte da na minha tese, onde investiguei escolas do Brasil e do exterior com foco na produção CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO de obras audiovisuais em formato de filmes. No Brasil os cursos de graduação, bacharelado e tecnólogos, não têm formação específica para roteiro, existindo algumas possibilidades de escolhas de disciplinas que formam como ênfase, como FICHA FICHAFICHA na ECA/USP, assim ninguém se forma no Brasil apenas como “roteirista”, ao contrário de algumas escolas internacionais. Queixas comuns que ouvi de professores de dramaturgia, locais e estrangeiros,foi acerca da nova geração de estudantes que “não tem o repertório necessário para desenvolvimento dramatúrgico”, PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA como sintetizou o professor Stanislav Semerdjiev da NationalAcademy for TheaterandFilmArts (NATFA), da Bulgária, em entrevista para a autora comentando que a tecnologia digital é um problema em termos de dramaturgia cinematográfica, dado o repertório limitado dos alunos e a recusa em 140 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR realizarem pesquisas. Todavia, pensar em mudanças é uma necessidade. (…) porque agora nós temos que entender e ensinar nossos alunos como eles devem escrever para jogos de computadores, para a internet ou para programas de realidade virtual, o que é algo completamente novo, especialmente a estrutura de ramificações da ficção interativa, que esta se desenvolvendo no tempo e no espaço, e toda a ficção hiperativa, então normalmente eu pensaria que a mídia digital irá transformar por completo toda a noção de criação de roteiro e produção de filmes (…) (SEMERDJIEV, apud SILVA. 2012:78) Creio que isso sintetiza o quena atualidade devemos lidar, com pelo menos dois novos cenários que possuem grandes ramificações: a chegada de uma nova geração, Nativa Digital, e uma mudança de CAPA CAPA CAPA paradigma audiovisual, com o cinema digital. NATIVOS DIGITAIS SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Martín-Barbero nos traz uma importante lição acerca dos debates culturais enfrentados pela escola na contemporaneidade, o desafio “que torna visível a distância cada dia maior entre a cultura ensinada pelos professores e aquela aprendida pelos alunos”. (1995:19). Para esse autor a escola é o espaço a priori de reinvenção imaginativa e criativa do espaço público, mas há um abismo cultural FICHA FICHAFICHA entre os docentes e discentes. De fato ouvimos as mais diversas queixas de professores acerca das dificuldades em ensinar os jovens de hoje, dizem que eles não leem, não se interessam pelas matérias, não se concentram, não têm paciência para as palestras e para o aprendizado gradativo... A dificuldade de diálogo muitas vezes PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA reside na incompreensão de que uma nova geração vem ocupando as salas de aula, dotada de peculiaridades sem par com situações anteriores e devemos nos perguntar como podemos lidar de forma mais eficaz com essa situação. 141 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Em razão dos impactos, inclusive psíquicos, que as tecnologias de informação, em velocidade e emergência, causaram, muitos estudiosos defendem que esta geração, nascida na era digital, seria completamente diferente das anteriores na sua forma de pensar e agir. Os chamados “nativos digitais” vêm sendo objeto de diversas teses internacionais. Atribui-se tal termo a Marc Prensky, educador e especialista em tecnologia e educação, que também cunhou a denominação de “imigrantes digitais”. Nativos digitais são os que nasceram em tempos de linguagem digital, dos computadores, videogames e da internet. Eles usam instantaneamente o hipertexto: ao mesmo tempo mandam mensagens em celulares, twitam, postam, baixam músicas, filmes e leem e-books. Diversos professores dos cursos de cinema e audiovisual notam que os alunos já chegam sabendo fazer vídeo e postá-los em canais próprios. Já os “imigrantes digitais” seriam todos os que conheceram o digital em outros momentos de suas CAPA CAPA CAPA vidas e, de alguma forma, foram adotados e adotaram-no, ficando por este, no todo ou em parte, fascinados sem, entretanto, nunca agirem da mesma forma que os nativos. Para Prensky, os professores, imigrantes digitais, estão enfrentando o desafio de lidar com estruturas cerebrais completamente diferentes das suas, mesmo já sendo Imigrantes Digitais. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Concordando ou não se esta mudança é tão de raiz, considero ser impossível ignorar que esta geração imprime uma nova realidade dentro das escolas e cria quase um paradoxo: se por um lado um número grande de estudantes ingressa nos cursos já tendo contato com equipamentos de captação e FICHA FICHAFICHA edição de vídeos, o que lhes dá uma experiência original, por outro, muitos simplesmente não mais frequentam as salas de cinema. Claro que existem exceções, mas é bastante comum ouvir de professores do Brasil e de outros países relatos preocupantes a respeito de algumas posturas de seus alunos. Por outro lado, também há queixas de estudantes relativas à dificuldade de escolas e professores PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA dialogarem com eles. Para Prensky algumas das habilidades dessa geração não estão sendo bem exploradas e enumera algumas questões e peculiaridades dos nativos digitais: 142 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR • percebem informações muito rápido; • gostam do processo paralelo e da multitarefa; • preferem os gráficos antes dos textos e não o contrário; • usam o acesso aleatório (como o hipertexto); • reagem melhor quando ligados em rede; • prosperam na gratificação instantânea e recompensas frequentes; • são mais afeitos aos jogos do que ao trabalho “sério”. Conclui-se, assim, que o digital transformou de tal forma todas as pessoas que, dialeticamente, os métodos de ensino precisam ser repensados. Se compararmos com os tempos do analógico o acesso que temos a obras audiovisuais para fins de estudo e pesquisa na atualidade foifacilitado com a tecnologia digital, entretanto se tornou ainda mais complexo transmitir conhecimentos teóricos para uma grande parcela de uma geração que vive CAPA CAPA CAPA SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO e pensa somente o presente e que possui uma relação de fetiche com as máquinas. Sem querer me alongar sintetizo: as escolas receberam alunos novos não só em termos etários, mas também em comportamentos, singulares na forma de pensar e agir, denominados nativos digitais. FICHA FICHAFICHA Seus professores, imigrantes digitais, viram-se diante de um impasse: como chegar até eles? A primeira conclusão que chegamos é da necessidade de respeitar as habilidades próprias desta geração, ou seja, não ignorar seus conhecimentos e principalmente, usá-los a favor do ensino. Os estudantes não assistem filmes considerados relevantes por nós? Partamos então do que assistem, para PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA ligarmos com o que consideramos relevantes, afinal nosso maior legado é ensiná-los a combinar a técnica com o repertório. Ao ensinarmos, por exemplo, história e estéticas audiovisuais poderemos estimular a realização de 143 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR exercícios práticos como forma de experimentação das linguagens estudadas, incorporando obras audiovisuais contemporâneas como referências e desconstruindo seus mecanismos, organizando os programas e currículos de forma horizontalizada, entendendo que a linguagem se reconfigura em caminhos que ainda necessitam ser descobertos, tendo as escolas que assumir a vanguarda nessas buscas. MUDANÇAS DE PARADIGMAS? Ao propormos uma discussão sobre a dramaturgia fílmica em tempos de digital, também ouvimos muitas vozes de especialista mundiais afirmando que a forma de representar uma ação dramática mudou muito pouco desde os gregos antigos até os tempos atuais. Busca-se, como sempre se buscou, contar histórias que falem à emoção e/ou à racionalidade do público. CAPA CAPA CAPA Concordamos que os mecanismos de construção das personagens, progressão dramática, curva, a interligação necessária das cenas e tantos outros mecanismos de identificação do público como um espelho, a catarse, ainda são a base de toda a construção de histórias, seja para o suporte que forem, mas novos contornos se apresentam em tempos do digital. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Para NikPowel, professor da NationalFilmandTelevisionSchool, o que mudou foram as histórias em si, pois a sociedade mudou como um todo, não a narrativa. (SILVA. 2012:134). Diz Doe Mayer, da Universityof Southern California, que a tecnologia digital permitiu que novas formas criativas fos- FICHA FICHAFICHA sem exploradas e citou como exemplo a edição, porém pensa que não houve mudanças na essência da narrativa, seu trabalho “é de contar histórias e tem de questionar quais são atraentes, o que tem significado para o cineasta e quem ele deseja atingir, com quem a comunicação é estabelecida” (SILVA. 2012:134). Nesse sentido o professor de roteiro da ECA-USP, Rubens Rewald, crê que a tecnolo- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA gia do digital trouxe mudanças profundas em todas as áreas, direção, montagem e fotografia, mais do que para roteiro. (SILVA. 2012:134). Parece haver concordâncias entre os educadores, neles me incluo, de que o cerne de contar histórias 144 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR em tempos de digital é o mesmo do que dos tempos do analógico, todavia devemos nos propor investigar mais a fundo as novidades trazidas com o cinema digital e as possibilidades abertas para o ensino da dramaturgia nas escolas. As formas mais clássicas de roteiro hoje para cinema já apresentam vantagens sem precedentes propiciadas pelas as novas tecnologias, como a maior liberdade para criar histórias, sem o dramaturgo ter de se limitar a priori às possibilidades de produção, como locações, atores e personagens, dadas as vantagens e facilidades dos efeitos, principalmente de pós-produção. O roteirista, nesse caso, pode contar com a ajuda de outros membros da equipe, além do diretor, o fotógrafo e o editor podem auxiliar com informações preciosas, apresentando possibilidades criativas desde o início. Outro aspecto: com o cinema contaminando as novas mídias, e sendo por elas contaminado, ao falarmos sobre a dramaturgia hoje, é muito comum ouvirmos termos como narrativas hipermidiáticas, CAPA CAPA CAPA roteiros para novas mídias, hiperdrama, puzzle- films, ciberbardo, nova autoria, agência, interatores... tantas e tantas facetas que dão conta de que estamos lidando com novas possibilidades narrativas ainda não completamente conhecidas ou exploradas. No livro Puzzle Films: ComplexStorytelling in Contemporary Cinema, organizado por Warren Bu- SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO ckland, o historiador e professor Thomas Elsaesser no capítuloThe Mind Game Film, considera que o cinema se vê diante de novas tarefas que caminham em várias direções e uma delas leva à ideia de rizoma, arquivo, banco de dados, típica da era dos hipertextos no ciberespaço, que rompe com a FICHA FICHAFICHA linearidade. A nova geração de espectadores já não se aceita como mera observadora, voyeur de uma história previamente determinada, ela deseja ser uma jogadora. Esta necessidade de ver o cinema como um índice, com pistas e links que vão além do que o texto fílmico propôs, é típica de pessoas acostuma- PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA das à navegação na internet, nos labirintos de hipertextos e games. É natural, então, concluirmos que o cinema mais contemplativo poderá não ser “eficaz” na atração dos hiperativos nativos digitais. Chama a atenção de Elsaesser que os filmes-jogos podem ser interpretados como um indicativo de 145 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR que está em curso uma crise na relação do espectador com as técnicas clássicas do cinema como o ponto de vista, a sutura, a onisciência do narrador, a “mosca na parede”, a mise-en-scène da profundidade de campo. Então, se até os espectadores das telas únicas e tradicionais desejam um novo contrato com os filmes, quebrando com os conjuntos de regras de realismo, transparência e linearidade, ansiando por histórias flexíveis, diferenciais, adaptáveis e versáteis, o que dizer dos usuários das novas mídias? Hoje, ensinar roteiros de audiovisual demanda pensar para além da tela clássica renascentista do cinema, a nova vitalidade da linguagem cinematográfica está nas possibilidades de ocupação das obras em multiplataformas, na narrativa para jogos, no mobile, na internet, nas múltiplas telas, todavia, insistimos, todos estamos engatinhando em como adaptar a forma de contar histórias para além da que, efetivamente, aprendemos ao longo de mais de um século. CAPA CAPA CAPA As novas mídias, impulsionadas pelo digital, trouxeram outro nível de desejo do espectador de abandonar a condição anterior, ou seja, tornar-se interator, como MURRAY (2003) destaca acerca dos ambientes digitais, que teriam suas próprias especificidades: procedimentais, participativos, espaciais e enciclopédicos. SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO Quando pensamos nesse nível de interatividade, rapidamente nas nossas mentes surge a estrutura dos games, nos quais os jogadores podem escolher diversos caminhos. A linguagem audiovisual se mostra em diferentes níveis, mas a mais importante é típica da dramaturgia, que é a da projeção, em FICHA FICHAFICHA que os espectadores, como jogadores nos games, vivenciam a vida das personagens, identificando-se e experimentando outras vidas através das estratégias das ações dramáticas. Constantemente, somos surpreendidos e traídos pela nossa cultura baseada na linearidade da literatura e nos recursos naturalistas. Pensar hoje o roteiro significa pensar também nos recursos de PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA computação gráfica disponíveis, nas novas câmeras e, principalmente, nos recursos de finalização, ter um pensamento menos setorizado do cinema. 146 ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR Podemos, então, dizer que era mais simples ensinar dramaturgia em tempo de narrativa linear, mas talvez mais limitador. Hoje, nossos estudantes instigam-nos a pensar para além do que historicamente elaboramos como roteiro para cinema. É refletirmos que, no ato de ensinar argumentos e roteiros para novas mídias, devemos transmitir o que já faz parte da gramática cinematográfica, mas o desafio agora é ir além, como forma a ampliar suas possibilidades comunicacionais. O dramaturgo continua a ser o responsável pela primeira elaboração das imagens e sons que comporão os produtos audiovisuais tal como é o filme e outras formas narrativas consolidadas. Mas, o roteiro hipermídia pode demandar também outro trabalho do autor, como destaca o professor e pesquisador Vicente Gosciola: • na planificação, determina o tamanho e a localização da tela das imagens, sons e CAPA CAPA CAPA textos; na movimentação, define o movimento da câmera e o movimento das imagens, sons e textos; na transição, o link determina as maneiras de realizar a passagem de uma tela para outra (…) é a representação de uma estrutura de conjuntos de conteúdo e seus respectivos conjuntos de links e as possibilidades de trajetória SUMÁRIO SUMÁRIO SUMÁRIO para os usuários”(GOSCIOLA in http://galaxy.intercom.org.br8180/dspace/bitstram/1904/17808/1/R172-1.pdf Acesso em 18/11/2011). Tal como em tempos de cinema analógico filmes continuarão a ser feitos para grandes telas e FICHA FICHAFICHA cada vez mais para as pequenas. Com a mudança do público, crescentemente mais afeito às características da hipermídia, as formas clássicas de concepção dramatúrgica utilizarão novíssimas estratégias, aprendendo com narrativas hipermidiáticas e emprestando a elas o que a linguagem cinematográfica tem de mais valor. As escolas devem preparar os realizadores para que estejam a PRÓXIMA PRÓXIMA PRÓXIMA altura destes desafios. ANTERIOR ANTERIOR ANTERIOR 147 REFERÊNCIA BELLOUR, Raymond. Entre-imagens: Foto, cinema, vídeo. Campinas, SP: Papirus, 1997. ________ Fragmentos de um arquipélago. Imagens, n. 3, dez/1994. Campinas: Ed. Da Unicamp, 1994, pp. 20-27 BUCKLAND, Warren (org.) Puzzle Films: Complex Storytelling in Contemporary Cinema. Nova York: Paperback. 2009 COUCHOT, Edmond (trad. Sandra Rey) A tecnologia na arte: da fotografia à realidade virtual . Porto Alegre, 2003. Coleção Interfaces, Editora da UFRGS. _______A arte pode ainda ser um relógio que adianta? 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