Elenara 2
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CEFI - CENTRO DE ESTUDOS DA FAMÍLIA E DO INDIVÍDUO
ESPECIALIZAÇÃO EM TERAPIA SISTÊMICA
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Terapeuta Sistêmico: do protagonismo a co-construção dialógica.
RESUMO
O presente estudo teve como objetivo mostrar como alguns paradigmas teóricos
evidenciam à transformação da visão do terapeuta sistêmico de condutor do
processo à co-participante no setting terapêutico. Foram utilizados como marcos
teóricos a Teoria Sistêmica, a Teoria da Comunicação e o Construcionismo Social. A
metodologia de análise utilizada foi uma pesquisa de revisão narrativa da literatura
de periódicos indexados na base de dados da SciELO, PePSIC e Google
acadêmico, artigos científicos e livros tendo como aporte teórico as propositivas
instrumentais encontradas pelos autores estudados, a elaboração do conceito a
partir de perspectivas do desenvolvimento da teoria da comunicação e do
construcionismo social. A importância deste tema está na mudança fundamental do
posicionamento do terapeuta sistêmico, levando-o a uma postura menos hierárquica
e mais dialógica. Tendo claro as limitações teórico-metodológicas do trabalho aqui
realizado, vimos ser imprescindível mais estudos e pesquisas visando aprofundar a
questão teórica e a prática terapêutica.
ABSTRACT
The present study aimed to show how some theoretical paradigms evidence the
transformation of the systemic therapist’s vision from the process leader to the co-
participant in the therapeutic setting. Theoretical frameworks, the Theory of
Communication and Social Constructionism were used as theoretical frameworks.
1 Assistente Social – CRESS 2033, Especialista em Supervisão em Serviço Social pela PUCRS e em
Psicoterapia Reencarnacionista pela ABPR, aluna do Curso de Especialização em Terapia Sistêmica
com Indivíduos, Casais e Famílias – CEFI.
2 Psicóloga CRP – 07/04489, Mestre em Psicologia Social pela PUCRS, Especialista em Terapia
Sistêmica pelo CEFI, Professora e Supervisora no CEFI.
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The methodology of analysis was a research of narrative review of the literature of
journals indexed in the database of SciELO, PePSIC and Google academic, scientific
articles and books having as a theoretical contribution the concept from perspectives
of the development of communication theory and social constructionism. The
importance of this theme lies in the fundamental change in the position of the
systemic therapist, leading him to a less hierarchical and more dialogical posture.
Having clear the theoretical and methodological limitations of the work carried out
here, we have seen that it is essential to carry out further studies and research in
order to deepen the theoretical question and the therapeutic practice.
INTRODUÇÃO
TEM QUE FAZER UMA CHAMADA ANTES DE COLOCAR A CITAÇÃO.
“Sempre existe mais a ver daquilo que é visto por alguém. Existem,
portanto, muitas imagens não feitas (imagens em movimento) de várias
situações. Talvez ainda mais importante, existe uma grande possibilidade de
duas pessoas fazerem distinções diferentes da mesma situação
apresentada ou “mapas” diferentes do mesmo território, como diz Bateson.
Ele vai mais além quando diz que ‘a unidade elementar de informação é
uma diferença que faz uma diferença’” (ANDERSEN, p.80, 1996,).
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Utilizamos uma revisão narrativa, por entendermos ser a forma apropriada
para uma discussão – mesmo que muito breve – de conceitos e diretrizes teóricos e
o não protagonismo do terapeuta sistêmico.
1. A MUDANÇA DE OLHAR
Apesar do aprendizado acadêmico sobre a prática clínica salientar que o
terapeuta deve ser neutro, alguns estudos indicam para a impossibilidade desta
neutralidade e a utilização da figura do terapeuta como ferramenta significativa no
processo. Para que se possa entender o processo metodológico realizado para uma
nova visão do terapeuta, faz-se importante contextualizar, brevemente, o conceito de
Cibernética.
A concepção sistêmica vê o mundo como um sistema vivo e dinâmico. Esta
dinâmica nos leva ao conceito de Cibernética, que estuda a comunicação e o
sistema de controle dos organismos vivos e, também, das máquinas.
O estudo da Cibernética levou a dividi-la em duas fases: Primeira Ordem, e
Segunda Ordem. Para este trabalho nos deteremos na Cibernética de primeira
ordem, que se divide em primeira cibernética e segunda cibernética.
Na primeira cibernética um dos principais norteadores é o mecanismo de
homeóstase, ou seja, estratégias de ação dos sistemas e organismos para a
manutenção de sua estabilidade. Já na segunda cibernética, coloca-se que o
sintoma não é mais o foco, mas sim apenas o identificador de que algo não está
bem, sendo o foco as relações.
Estes conceitos são absorvidos pela teoria clínica, passando, esta, a observar
mais o sistema humano do que o indivíduo fora de seu contexto. Um dos primeiros
estudos é o de Kurt Lewin que nos apresenta a Teoria de Campo, baseada na física.
Nesta teoria “campo” é entendido como sendo qualquer evento da vida de uma
pessoa, seja ele passado, presente ou futuro, que possa influenciar o seu
comportamento.
Lewin (1936) denominou este campo de espaço vital. Este espaço vital é
compreendido pela interação das necessidades do indivíduo com o ambiente
psicológico e responderá de formas diferentes de acordo com as experiências de
vida acumuladas.
Ainda no contexto da teoria de campo, Yontef (1998) distingue cinco
pressupostos, sendo:
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1.Um campo é uma teia sistemática de relacionamentos, uma totalidade de forças
mutuamente influenciáveis;
2.Um campo é contínuo no tempo e no espaço;
3.Tudo é de um campo, isto é, objetos e organismos existem somente como parte de
um campo e têm significado somente como interação nesse campo;
4.Os fenômenos são determinados pelo campo todo, os significados derivam da
totalidade dos fatos coexistentes; e
5.O campo é uma totalidade unitária, tudo afeta o resto no campo.
No início da década de 30, de acordo com Witteazaele e Garcia, Gregory
Bateson constatou que a maneira que o indivíduo se comporta, depende das
reações dos que o cercam. Para os estudiosos dessa teoria é importante levar em
consideração a rede relacional da pessoa, ou seja, o fenômeno da comunicação.
Nesta assertiva do genoma que torna o indivíduo único e diferente dos
demais, a forma como as informações são “utilizadas” pelos indivíduos no contato
com seu meio ambiente, torna-se foco de suas pesquisas, passando a estudar os
efeitos sobre o comportamento dos indivíduos a partir do surgimento de paradoxos
nas trocas de informações.
O construcionismo social, mudança trazida pela segunda cibernética, rompe
as convenções da ciência e desenvolve uma teoria de conhecimento em que não se
faz referência a uma realidade do “ser” objetiva. A teoria diz respeito ao
ordenamento e à organização de um mundo constituído pela experiência, sem ter
preocupação com a verdade, já que a realidade independe do observador.
(Grandesso, 2000).
Pretende recuperar a capacidade de atuar no mundo de forma a experimentá-
lo como uma construção. Não se preocupa em explicar o mundo como ele é, mas
sim em pensar como pode parecer quando trabalhamos com ele. Esta concepção da
construção do conhecimento desafia a noção do conhecimento como algo criado
dentro da mente de um observador imparcial. (Anderson e Goolishian, 1988)
Em todas as teorias citadas anteriormente, tem-se presente que o indivíduo
deixa de ser apenas intrapsíquico e passa a ser visto como parte de um contexto
social, onde a figura do terapeuta deixa de ser um mero observador e torna-se um
co-participante.
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2. O TERAPEUTA E A NOVA VISÃO PARADIGMÁTICA DO SEU PAPEL NA
TERAPIA
Na ampliação da percepção analítica da função intrapsíquica na interação
social, tem-se, por consequência, uma reformulação no papel do terapeuta.
Nessa nova perspectiva, o terapeuta passa a fazer parte do sistema e sua
posição é vista como igualitária em relação aos demais membros do sistema e não
hierárquica. Não acredita saber mais que o restante do sistema e sua atitude é de
colaboração, reciprocidade, modéstia e respeito. O terapeuta não ignora suas
crenças e preconceitos, mas os vê como uma forma de crescimento (Anderson e
Goolishian, 1988).
Para Efran e Clarfield (1995) o terapeuta pode ter suas crenças e
preconceitos, inclusive teóricos, e expô-los aos clientes, porém sua obrigação é se
responsabilizar por qualquer posição que assuma.
Grandesso (2000) define o terapeuta como mais um recurso, mais uma forma
de estar no mundo. A autora acredita que a vida pessoal e profissional se funde
durante uma sessão terapêutica, formando uma filosofia de vida, tornando-se
coautor “das construções discursivas de seus clientes”.
Concordando com Anderson e Goolishian, Grandesso (2000), acredita que a
especialidade do terapeuta está na sua capacidade de criar um espaço dialógico,
assumindo uma postura de respeito, de não saber, de responsabilidade
compartilhada e ética, pois acredita que a realidade que vê, não é “a realidade”, mas
“uma” delas, e junto ao cliente construirá uma realidade, dentre as possíveis, no
processo terapêutico, como Chazenbalk (2013) que define “o estilo” como os
padrões únicos de cada pessoa, sua forma de ver a si mesma e o mundo, suas
crenças, situação socioeconômica e afetiva, momento evolutivo que se encontra e
experiências de vida. Isto não quer dizer que haja um “perfil de terapeuta específico
que se mostre mais eficaz para todos os tipos de pacientes”, mas sim a necessidade
de combinação de determinadas características entre terapeuta e cliente (Oliveira,
Benetti, 2015).
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Já Gergen e McNamee (1998) nos trazem a metáfora da “vara de condão
quebrada”, onde desmistifica a figura do terapeuta como “o mágico que utiliza sua
varinha para que tudo seja resolvido e equacionado”. Isto porque, de acordo com os
autores, o cliente não apresentará um comportamento como mera resposta ao que
os outros fazem, mas sim um comportamento que será um resultado de seu próprio
conhecimento e dos demais envolvidos no processo.
Neste sentido, cai por terra a figura do terapeuta observador e detendo todo o
saber. Passa-se a enfatizar o conhecimento como uma construção social (Von
Foerster, 1981 e Von Glaserfeld, 1984). As crenças mantidas pelo terapeuta e
clientes constroem as realidades, e estas são mantidas pela interação social, que
por sua vez é confirmada pelas crenças que se originam socialmente. (Moscovici,
1961, 1982, 1984, 1988).
Temos um novo processo terapêutico no setting clínico, onde terapeuta e
cliente passam a perceber uma realidade co-construida. O terapeuta não é mais um
mero observador, mas sim, constrói, com o cliente, a situação que está sendo
observada (Fruggeri, 1990).
Assim, o poder e a responsabilidade do terapeuta são redefinidos, havendo
uma liberação da noção de controle unilateral, passando a uma dinâmica de co-
construção sistêmica. A responsabilidade do terapeuta passa a ser a “construção”
nos domínios relacional/social.
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Bateson (1971), em seu trabalho “Communication”, volta a tentar
compreender a comunicação humana como a noção de consciência. Nem tudo que
é transmitido ao indivíduo, sejam mensagens transmitidas ou outras formas de
comunicação, é retido por ele. Existe uma seleção inconsciente, onde apenas o que
será usado ou terá relevância ascende ao consciente.
Suas análises reforçam, ainda, que as mensagens, além da intenção,
possuem as emoções, as pulsões sexuais, os medos, desejos e fantasias
inconscientes de seus criadores. Faz-se necessário romper a separação entre razão
e emoção, tornando a mensagem uma comunicação global.
Temos então a metáfora de comunicação como sendo uma orquestra, e não
mais como um telégrafo. A comunicação não é apenas a transmissão verbal de uma
mensagem, mas tudo aquilo que permite que o indivíduo utilize para perceber e
refletir sobre seus atos, levando a mudança ou não dos mesmos. Os órgãos
transmissores e os sensoriais receptores, local de origem e destino, são os
instrumentos da comunicação, uma vez que para Bateson e Ruesch (1965),
comunicar é receber e transmitir mensagens de maneira a obter informação e
chegar a novas conclusões com esta informação.
Pode-se, então, entender que é necessário um constante aprendizado e
negociação na comunicação humana, a partir deste entendimento, é um processo
social, humano e linguístico, tendo tantos níveis e complexidade que a metáfora do
telégrafo não conseguiria abordar. É um processo circular, onde os valores e
condutas do indivíduo estão em constante atualização e transformação perante
novas situações. Todo indivíduo conhece certo grau de incerteza em relação à
clareza de suas mensagens e de como o outro a está recebendo.
Poderíamos dizer que este é um dos grandes méritos de Bateson, levar à
reflexão da natureza do ser humano e das características da sua relação com o
outro. A comunicação é determinada pelo fato da pessoa “dar-se conta” que a sua
percepção foi notada pelos outros,
A comunicação não se refere somente ao verbal. “Não existem nenhumas
‘simples palavras’. Só há palavras com gestos, ou tom de voz, ou coisas do gênero.
Mas, evidentemente, gestos sem palavras são frequentes” (BATESON, 1972
PAGINA).
Para compreendermos a Teoria da Comunicação humana, é preciso
conhecermos o que a mesma engloba. Na Teoria da Comunicação temos três
dimensões: sintaxe (transmissão de informação), semântica (significado dos
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símbolos) e pragmática (aspectos comportamentais da comunicação). Além destas a
teoria também apresenta o conceito de metacomunicação (comunicação sobre a
comunicação) e o uso de mensagens congruentes ou incongruentes Watziawick,
Beavin & Jackson (1973).
Ao lado dessas três dimensões, necessário ainda reportar-se a Bateson e
Watziawick, que relacionam os cinco axiomas chaves dessa teoria. São eles:
1.É impossível não comunicar – atividade ou inatividade, palavra ou silêncio, tudo
possui um valor de mensagem;
2.Toda comunicação tem aspecto de relato (conteúdo – o que é dito) e de ordem
(relação – como é dito);
3.A natureza de uma relação está na contingência da pontuação das sequências
comunicacionais entre os comunicantes (cada comportamento é causa e efeito do
outro);
4.Os seres humanos se comunicam de maneira digital (comunicação verbal) e
analógica (comunicação não verbal); e
5.Todas as permutas comunicacionais ou são simétricas ou complementares, e
estão baseadas na igualdade ou na diferença (Watziawick et all. 1973).
6.O paradigma sistêmico demanda, portanto a não existência de uma realidade
objetiva, independente do observador. É a compreensão dos padrões
comunicacionais que possibilitam ou dificultam as relações, sendo, portanto, os
mesmos, fundamentais para um trabalho terapêutico nesta perspectiva.
Aliando-se a esses paradigmas, o construcionismo social também tem
protagonismo no papel terapêutico.
4. O CONSTRUCIONISMO SOCIAL
De acordo com Grandesso (2000), o construcionismo social é importante para
o terapeuta sistêmico porque é uma concepção que rompe com as convenções
tradicionais da ciência, desenvolvendo uma teoria de conhecimento que não faz
referência a uma realidade ontológica objetiva. Nessa teoria, o conhecimento diz
respeito ao ordenamento e à organização de um mundo constituído pela
experiência, sem ter qualquer preocupação com a verdade, já que ela corresponde a
uma realidade independente do observador.
O construcionismo social visa atuar no mundo de forma a experimentá-lo
como uma construção. Não se preocupa em explicar como o mundo é, mas sim
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como parece ao trabalharmos com ele. Isto porque, quem cria o mundo que observa
é o próprio observador, através do seu conhecimento acerca do mundo.
Essa concepção do conhecimento construído desafia a noção do
conhecimento como algo criado dentro da mente de um observador imparcial. Nesta
abordagem, a psicoterapia pode ser considerada como “o processo de mudar o
discurso ‘problemático’ atual do cliente para outro discurso que seja mais fluido e
permita uma gama maior de interações possíveis” (LAX, p. 86,1998).
Essa descrição da psicoterapia coloca ênfase em um dos pontos mais
centrais, que é a narrativa. Isto porque os construcionistas acreditam que a
organização social é o produto da comunicação social, que é o discurso que define a
organização social e que a realidade é um produto do intercambio do diálogo
Anderson e Goolishian (1988).
Segundo Anderson e Goolishian (1988), os homens ouvem e veem de acordo
com a maneira com a qual estão estruturados e não de acordo com a organização
social na qual estão inseridos. Assim, “os sistemas sociais são um produto de
realidades socialmente comunicadas em constante mudança” (p.16,1988).
De acordo com estes autores, ao levarmos esses conceitos para a clínica,
podemos pensar nos sistemas como “narrativas que evoluem através da
conversação terapêutica”. Estes sistemas são formados pelos clientes e terapeuta e,
quando necessário, pela inclusão da equipe terapêutica.
Em todo o processo, se acredita que a comunicação é repleta de “não ditos”,
de “caminhos” não pensados, e que através de um “novo sistema” outras opções
possam ser pensadas e faladas para que novos significados possam surgir, sem que
palavras sobreponham-se à ação.
Este alerta encontra fundamento em Clarfield e Efran (1998), que
demonstram como culturalmente, costuma-se ver como muito distante as palavras e
as ações e tende-se a desvalorizar as primeiras. Ou seja, não se percebe que as
palavras são formas especializadas de ações e estão presentes em quase todas as
formas dessas.
Tendo claro este alerta, no construcionismo social “(…) a reflexão dá-se em
um contexto social de aprendizagem e observações mútuas e não no isolamento”
(Grandesso, PAGINA 2000). Desta forma existe uma valoração das práticas sociais
de intercâmbio entre os indivíduos, não enfatizando o indivíduo – e sua fala – como
“ser isolado”, mas inserido em um sistema.
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Ainda segundo Grandesso (2000), a proposta construcionista é de uma
construção social de mundo através de práticas discursivas. Termos referentes a
mundo e mente constituem as práticas discursivas integrantes da linguagem e como
tal, estão sujeitos à contestação e negociação. Mesmo as ideias, lembranças e
conceitos não são vistos como pertencendo ao indivíduo, já que os construcionistas
entendem que são produtos do intercâmbio social. Essa noção está diretamente
relacionada ao fato de o construcionismo relacionar o conhecimento aos
relacionamentos e a compreensão ao funcionamento individual ao intercâmbio
comum.
Compreender e refinar o processo psicoterapêutico implica buscar meios de
instrumentalizar a dialogicidade. E instrumentalizar a dialogicidade como uma função
psicoterapêutica, significa entender, analisar e pesquisar os tratamentos como
encontros produtores (e produtos) de signos emergentes em contextos e texturas
narrativas. Esses encontros fundamentam um espaço simbólico demarcado na
intersubjetividade que resultará em última análise, na história do tratamento
psicoterapêutico, Jardim, Souza & Gomes (2009).
Segundo Anderson e Goolishian (1988), a conversa terapêutica não é
basicamente diferente de nenhuma outra, mas sua especificidade estaria no fato de
acontecer em um sistema organizado por um problema e estar direcionada para a
mudança. Ou seja, “no diálogo, nada permanece igual. Mudar na terapia não é nada
mais do que mudança de significado derivada do diálogo e conversação”
(ANDERSON E GOOLISHIAN, p.21, 1988).
No mesmo sentido de citação acima, chamam a atenção ao colocar que:
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Existem discussões em torno das perspectivas que podem ser concebidas
como próprias ao construcionismo social. As equipes reflexivas de Tom Andersen
(1995) são uma delas e constituem o foco do item final deste trabalho.
5. A EQUIPE REFLEXIVA
A finalidade inicial da equipe reflexiva era oferecer novas perspectivas de
abordar os problemas ou situações difíceis. Os pressupostos fundamentais
sustentam-se nos processos reflexivos como ferramentas para mobilizar os clientes
a compreender o problema e elaborar novos significados para a situação vivenciada.
A estrutura da equipe reflexiva pode apresentar variações no seu modo de
funcionamento, mas prevê que tanto o terapeuta quanto o cliente ouvem as
reflexões dessa equipe que assiste à sessão. Na equipe reflexiva, Andersen (1996)
indica a existência de duas condições especiais de diálogo: o interno e o externo.
O diálogo interno ocorre quando o cliente e o terapeuta estão escutando
atentamente as contribuições da equipe. O diálogo externo refere-se à conversação
da equipe reflexiva enquanto está sendo observada pela família e pelo terapeuta.
São justamente a transição entre estas duas posições que Andersen (1998)
identificou o surgimento de processos, onde há a possibilidade de reflexão, e a
mesma se afirma a partir da criação de um contexto de colaboração entre equipe e
clientes, no qual os significados são relacionalmente construídos.
A equipe reflexiva não instrui o terapeuta como entrevistar ou conduzir a
sessão de terapia. O diálogo da equipe reflexiva é externo, ocorrendo apenas entre
os membros da equipe, sem a presença do terapeuta.
Observa-se que na equipe reflexiva o diálogo interno ocorre sem o terapeuta
ter tido qualquer contato prévio com a equipe, isto é:
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Goodwin (2004) comparou a experiência do teatro ao que acontece numa
sessão terapêutica de equipe reflexiva.
Justificou que, ao se assistir uma peça de teatro, é necessário pensar na
apresentação principal como se fosse uma família na terapia, na qual os atores
desempenham papéis e funções. Na terapia familiar, segundo Goodwin (2004), a
família está em cena, representando os seus dramas e seus problemas por meio do
relato.
No trabalho de campo, o terapeuta deve dar-se conta que não pode exercer a
função sem considerar a parceria. O profissional reflexivo deve estar atento ao que
ouve e ao efeito que o que ouve lhe causa. De acordo com Andersen (1991) a
reflexão é “algo ouvido que é internalizado e pensado antes de uma resposta a ser
dada”.
A conexão com os membros da equipe reflexiva é essencial para que o
trabalho seja vivenciado de forma eficaz por todos os elementos do sistema.
A função do terapeuta de campo tende a ser a mais organizadora do encontro
terapêutico. Isto não implica se deixar levar por tendências objetivistas e
deterministas. Muitas vezes é mais difícil ser reflexivo na posição de terapeuta de
campo.
O terapeuta se constrói na relação terapêutica através de uma parceria
conversacional. Assim há uma combinação das especialidades do terapeuta e do
cliente.
A postura do “não saber” representa um dos principais traços característicos
desta abordagem psicoterápica. Há uma disposição ao risco de permitir ao cliente
dirigir o contar sobre sua própria história, sem ser guiado por perguntas do que o
terapeuta acha importante ser dito/conhecido.
Nas palavras de Anderson (1997), “um terapeuta precisa arriscar ser um
aprendiz a cada novo cliente” PAGINA. Através desta postura, é possível criar
conversações dialógicas e relacionamentos colaborativos caracterizados por atos de
conectar, colaborar e construir, e que marcam processos de mudança para todos os
envolvidos no sistema terapêutico.
Leal (2007) mostra-nos que a questão fundamental nessa prática terapêutica,
é a transformação que ocorre em cada terapeuta, revendo seus padrões,
preconceitos, ampliando o olhar e a escuta. A sintonia de uma equipe, ou a formação
necessária para que uma equipe tenha uma boa atuação, ainda segundo Leal
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(2007), depende, principalmente, das mudanças internas que o terapeuta é capaz de
realizar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve o objetivo de mostrar a evolução paradigmática na postura,
e por consequência, na participação do terapeuta sistêmico na terapia. Podemos
notar que pela influência das diversas teorias, que analisam e ressaltam o papel da
comunicação e dialogicidade, a postura do terapeuta passou de condutor do
processo, para co-participante do setting terapêutico.
O terapeuta, assim, é parte integrante de todo o processo, com seus valores,
crenças, origens familiares, e não mais o único responsável por toda ou qualquer
solução. A configuração do sistema de troca dentro do campo terapêutico foi
identificado e entendido em seu conjunto tanto com o cliente como em relação ao
cliente.
Percebem-se cada vez mais os profissionais influenciados por vários
referenciais teóricos e técnicos, os quais os convocam à fundamental tarefa de
integrar-se a melhor forma de terapia. A dialogicidade revela-se fundamental para
uma compreensão minuciosa e atualizada da psicoterapia.
A relação terapeuta/cliente é mediada por elementos comunicativos
complexos, mutáveis e estruturados para um projeto terapêutico que busca a
transformação social.
Finalizando, o terapeuta, enquanto coparticipante, deve dizer ou fazer algo
que “contenha diferença”. Essa diferença deve ser sutil, criativa e acrescentar
esperança e conduzir à mudança, este será o diferencial entre os terapeutas
verdadeiramente talentosos, que acrescentam algo novo e os que repetem “teorias”
sem nenhuma participação no processo terapêutico.
REFERÊNCIAS
15
ANDERSEN, Tom. Processos reflexivos, tradução Rosa Maria Bergallo, Rio de
Janeiro, Instituto NOOS, ITF – 1991,1996, 1998 p.54 e p.80.
ELKAÏM, Mony. Panorama das terapias familiares. São Paulo: Summus, 1998, v.2.
GOMES, L., BOLZE, S., BUENO, R., CREPALDI, M. As origens do Pensamento
Sistêmico. Pensando Familias, 18(2), dez/2014. p. 03 – 16.
NAMEE, Sheila Mc, GERGEN, Kenneth J. Terapia como construção social. Porto
Alegre. Artes Médicas, 1998. p. 51 – 65.
RADKE, Mariane Brusque. Uma dança para dois: O self do terapeuta e seu uso
técnico na Clínica Sistêmica. Monografia de Final de Curso de Especialização em
Terapia Sistêmica. Faculdade de Tecnologia do Ipê – FAIPE – 2018.
16
VASCONCELOS, Maria José de. Anais do Iº Congresso Brasileiro de Terapia
Familiar: A Cibernética como Base Epistemológica da Terapia Familiar
Sistêmica. São Paulo: ed. Rosa Mª Stefanini de Macedo- PUC, 1994, v. 2.
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