APRESENTAÇÃO
O QUE OS ESTUDOS DE ROTEIRO PROVOCAM NO CAMPO DOS ESTUDOS
CINEMATOGRÁFICOS?
What do script studies do to the field of film studies
¿Qué le hacen los estudios de guión al campo de los estudios cinematográficos?
Lúcia Ramos Monteiro1
Pablo Gonçalo2
Introdução
Fundada em 2006, a Screenwriting Research Network, rede internacional que congrega pesquisadores do campo dos estudos
de roteiro, escolheu para seu último encontro o tema da ampliação de fronteiras – ou “pushing boundaries”. O congresso, realizado em
2021 de forma on-line, abriu-se para temas realmente diversos, com trabalhos sobre roteiros para realidade virtual, sobre as relações
com a literatura, sobre a escrita para séries de TV e ainda sobre o uso de inteligência artificial na criação de roteiros.
Tal leque é apenas um dos sinais concretos do inegável o florescimento nesse campo de estudos. Pode-se pensar, por um lado,
que essa abertura se deva sobretudo àquilo que vem sendo chamado de “convergência digital”, com a explosão de telas e de formatos
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Doutora; Universidade Federal Fluminense (UFF). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Endereço de e-mail: luciarmonteiro@gmail.com - Orcid: https://orcid.org/0000-0003-0962-1498.
Doutor; Universidade de Brasília (UnB). Brasília, DF, Brasil. Endereço de e-mail: pablogoncalo@gmail.com - Orcid: https://orcid.org/0000-0002-3745-161X
MONTEIRO, Lúcia R.; GONÇALO, Pablo. Apresentação
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da linguagem audiovisual (JENKINS, 2009), que traria, junto consigo, a expansão dos domínios da escrita para as telas. Por outro
lado, observamos que os fundamentos da expansão nos estudos de roteiro têm raízes mais profundas, ligadas à própria reivindicação
de autonomia por parte do campo, assim como por parte dos próprios roteiros, cujo valor como "objeto artístico" foi tradicionalmente
questionado na academia. Em seu livro de 2009, Steven Maras, professor da University of Western Australia, escreve:
Os estudos cinematográficos nem sempre souberam o que fazer com o roteiro. Os estudos de roteiro, por sua vez,
podem nutrir uma relação ambivalente com as principais abordagens dentro do campo dos estudos cinematográficos.
Parece que falta reconhecimento entre essas duas áreas… o lugar do roteiro e da escrita no processo de produção, o
formato do que está sendo escrito não é extensivamente considerado. (MARAS, 2009, nossa tradução).
Agora, passados mais de dez anos da publicação do livro de Maras, e à luz de um crescente conjunto de estudos na área, talvez
seja o momento de colocar sua proposição em outros termos: o que podem fazer os estudos de roteiro com os estudos
cinematográficos? O que as novas pesquisas com roteiros provocam no campo já mais estruturado dos estudos de cinema? Não
pretendemos, neste texto introdutório, responder a essa questão diretamente. Acreditamos, porém, que o conjunto de artigos aqui
reunidos oferece, a partir de diferentes perspectivas, demonstrações das perturbações que a pesquisa com os roteiros pode trazer à
historiografia do cinema, para algumas abordagens teóricas e para certos paradigmas de análise fílmica.
É preciso reconhecer que o adensamento desse campo de estudos abala a concepção do roteiro como somente uma etapa
anterior ao filme, como algo fadado ao desaparecimento ou ao esquecimento a partir do instante em que as linhas tomam corpo, na
filmagem e depois, já transformadas em imagens, quando finalmente encontram a plateia. Evidentemente, o roteiro não deixa de
representar, como coloca Jean-Claude Carrière, um "estado transitório", uma "forma passageira destinada a se metamorfosear e a
desaparecer como a larva ao se transformar em borboleta" (CARRIÈRE e BONITZER, 1996, p. 11). Ou, nas palavras de Pier Paolo
Pasolini, uma "estrutura que quer ser outra estrutura" (numa nova e mais recente tradução para o português, o ensaio escrito pelo
cineasta italiano integra este dossiê). No entanto, os estudos dessa forma peculiar de escrita – seja investigando o objeto "roteiro" para
além do cotejo com o filme, seja recuperando a trajetória de roteiristas importantes e/ou esquecidos, seja observando traços de estilo
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e transformações em sua estrutura – revelam qualidades que ultrapassam em muito o aspecto utilitário de sua vocação primordial de
peça inicial na confecção de um filme.
A título de introdução para o conjunto de artigos reunidos a seguir, é importante nos dedicarmos à questão central, que aliás
promete desdobramentos do campo disciplinar: quais seriam, afinal, as contribuições dos estudos de roteiro para os estudos de cinema?
Quais temas eles levantam que, de alguma maneira, não estariam abarcados na agenda de estudos audiovisuais atualmente em voga?
É claro que qualquer resposta a essas interrogações será sempre provisória e incompleta. Mas, embalados pela leitura dos
trabalhos que compõem este dossiê, arriscamos propor que a principal contribuição do adensamento dos estudos de roteiro para o
campo mais amplo dos estudos de cinema talvez esteja em provocar uma perturbação de alguns paradigmas, de certas práticas analíticas
e críticas.
Os artigos – que abrangem desde investigações sobre história do cinema, história do roteiro e trajetórias de roteiristas, até
abordagens teóricas sobre a singularidade da escrita de roteiro, reflexões metodológicas sobre a pesquisa nessa área e desafios práticos,
como os envolvidos na reconfiguração de mesas de roteiro para série de TV durante a pandemia de Covid-19 – tornam mais fluidas
(e complexas) as relações entre obra e texto, escrita e interpretação, análise fílmica e análise textual, autoria e gênero.
No contexto dos estudos cinematográficos, a perspectiva do roteiro implica forçosamente em um deslocamento: da obra
pronta para o processo de criação; do filme acabado e lançado para os gestos dramatúrgicos que o antecedem. Ao buscarem alternativas
para a hegemonia dos manuais de roteiro, que pressupunham (ou pressupõem?) uma análise fílmica clássica e fragmentada, os estudos
de roteiro também levam a entender os roteiristas como autores e mesmo como motores da narrativa fílmica. Nessa abordagem, operase outro importante deslocamento: o do paradigma autoral. É necessário questionar a ênfase exclusiva no diretor para então poder
abarcar visões mais detalhadas das contribuições de roteiristas e de sua influência na história do cinema.
Num primeiro momento, abordaremos o debate sobre a autonomia e o valor artístico do roteiro, em que a emblemática posição
defendida pelo filósofo da arte Noël Carroll é contestada pelo teórico Ted Nannicelli, seu ex-aluno. Em seguida, examinaremos
brevemente o gesto da "adaptação" de uma forma literária para as telas do cinema, vertente que predominou nos estudos de roteiro
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até muito recentemente, notadamente por conta da preponderância da visão de não-autonomia. Na seção seguinte deste artigo, damos
um passo atrás para questionar a identidade do roteiro, buscando definições e também na tentativa de entender o próprio campo dos
estudos de roteiro, indicando alguns sinais da maior independência conquistada nos últimos tempos, em consonância com a afirmação
e o reconhecimento da atividade. Ainda, num contexto em que a história do roteiro – e de maneira mais sensível a história do roteiro
no Brasil – não está completamente estabelecida, reunimos considerações sobre a diversidades de práticas e perspectivas relacionadas
ao roteiro ao longo das últimas décadas e, finalmente, trazemos algumas considerações sobre método e metodologia.
O roteiro como forma (artística?) autônoma e a questão da "adaptação"
A discussão sobre a autonomia do roteiro como objeto de estudo e seu valor artístico está presente já nas primeiras pesquisas
acadêmicas na área. O livro seminal de Claudia Sternberg (1997), resultante de sua tese de doutorado na Universidade de Colônia, na
Alemanha, tem entre seus objetivos estabelecer o estatuto do roteiro audiovisual como texto literário, observando o olhar negligente
que esse tipo de escrita vinha recebendo tanto por parte dos estudos cinematográficos, quanto por parte dos estudos literários.
Se nos anos 1990 o gesto de pensar certo protagonismo do roteiro criava tensões com áreas próximas, aí incluídas a semiótica,
a história da arte, os estudos de adaptação, alguns desses atritos perseveram, se desdobram e se reconfiguram. Nesse sentido, o debate
entre o teórico Ted Nannicelli, professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de Queensland, na Austrália, e o filósofo
da arte britânico Noël Carroll, aqui reproduzido em primeira mão em português, localiza um ponto fundamental em que há dissenso:
o roteiro cinematográfico pode ser encarado como obra de arte? Interessantes e apurados, os argumentos de um e outro – na direção
de uma ontologia, como propõe Carroll, ou no apontamento de contradições, exercício a que se dedica Nannicelli – funcionam, na
realidade, como estímulos para novos estudos na área, capazes de apontar singularidades de cada caso, seja para defender o valor
estético de determinado roteiro ou para questionar o potencial de estudo oferecido por roteiros redigidos e publicados depois do
lançamento (e do sucesso) do filme.
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Em "Seria o roteiro uma obra de arte?", Nannicelli se debruça sobretudo na resposta negativa a essa pergunta, tal como
formulada por Carroll (2008), considerado um dos principais teóricos do cinema. Por essa perspectiva, o ensaio desconstrói um
argumento influente, que vê no roteiro um objeto desprovido de autonomia estética, um subproduto do filme. Para Carroll, o roteiro,
diferentemente do texto teatral, não possui valor literário autônomo, nem mesmo apresentaria, em sua visão, uma possibilidade de
fruição de leitura.
De forma perspicaz, Nannicelli busca argumentos dentro da própria filosofia de Carroll para desmontar seu ponto de vista.
Ele ressalta sobretudo como as práticas apreciativas do roteiro se transformam ao longo da história, e observa, no contexto
contemporâneo, uma ampla demanda por compreender o roteiro como forma autônoma, calcada na linguagem verbal e cada vez mais
próxima de uma apreciação literária.
A posição de Nannicelli abre possibilidades não apenas de desmantelar pré-julgamentos acirrados da estética (e dos estudos de
cinema) sobre o status artístico do roteiro. O autor também enfatiza como essa conceituação é fluida e deve ser observada nas suas
mutações históricas. Indiretamente, os manuais de roteiro e a padronização da sua escrita acarretaram uma percepção anacrônica e
destituída de história sobre a prática da escrita para as telas. Os roteiros do cinema mudo, por exemplo, possuem pouquíssimas
afinidades formais com os roteiros escritos a partir da década de 1930. Com o chamado "modelo blueprint", ao menos em Hollywood,
os roteiros tornam-se uma peça central de organização do orçamento e da produção.
Historicamente, a perspectiva defendida por autores que desconsideram a autonomia estética do roteiro contribuiu, direta ou
indiretamente, para que as pesquisas mais frequentes do campo se concentrem na chamada "adaptação" cinematográfica de obras
literárias. De fato, as próprias conotações do próprio termo "adaptação" na seara da relação entre roteiro, filme e literatura deixaram
há muito de ser objeto de consenso. Professor emérito de Literatura Inglesa na Universidade de Bangor, no Reino Unido, Steven Price
(2010) inverte de maneira paradoxal a visão do roteiro como objeto acessório, apostando suas fichas no valor do gesto de "adaptar".
Para ele, um filme nada mais é que a adaptação de seu roteiro. De acordo com sua perspectiva, todo processo de interpretação de uma
obra literária ganha uma primeira tradução no instante do roteiro e uma segunda, que tendemos a acreditar como definitiva, após a
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montagem, no formato "final" do filme. No entanto, nada disso impede que um roteiro – assim como ocorre com o texto teatral –
tenha outras e futuras versões.
Antes de Price, a teórica da literatura e do cinema Marie-Claire Ropars-Wuilleumier (1993) havia proposto a substituição do
termo "adaptação" por "reescritura" quando se trata de transpor um objeto da literatura para o cinema, falando de "reescritura fílmica
de obra literária". De acordo com ela, que foi professora da Universidade de Vincennes, essa mudança vocabular contribuiria para
alterar a maneira de ver a relação entre filme e texto: "ao princípio de fidelidade, fundado na busca de equivalência semiótica, opõe-se
o ponto de vista de um devir diferencial" (p. 11, nossa tradução).
Tal gesto, por sua vez, atribui ao roteiro dito "adaptado" – e ao filme – uma carga de invenção criativa que eram
costumeiramente reservados à escrita literária. Ainda que os trabalhos de Ropars-Wuilleumier (1936-2007) não possam ser
formalmente incluídos no campo dos estudos de roteiro e apresentem influência das teorias semióticas fortes em seu período de
formação, a autora é ainda hoje referência na área, oferecendo contribuições fundamentais para pensar a relação entre literatura e
cinema, com publicações voltadas a pensar a "escrita fílmica" desde 1970 (De la littérature au cinéma. Genèse d'une écriture) e uma série de
estudos dedicados às operações envolvidas na passagem da literatura ao cinema de realizadores como Duras (1981) e Renoir (1991).
Afinal, o que é "roteiro"?
Uma interrogação que surge decorrente da leitura de textos que pensam o roteiro, e em especial o de Nannicelli, diz respeito
à definição mesma de roteiro: o que se tem em mente quando se lê a palavra "roteiro"? É curioso que utilizemos a mesma palavra para
descrever documentos de trabalho escritos previamente às filmagens e transcrições produzidas por terceiros a partir do visionamento
do filme. Em sua defesa da possibilidade de encarar roteiros como obras de arte, ele tem em mente roteiros escritos por roteiristas
antes da filmagem – e mesmo reescritos durante o processo de realização – e não as versões publicadas após o lançamento, muitas
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vezes baseadas em transcrições. Embora ele afirme que publicações de transcrições de filmes não devam ser chamadas de roteiro,
reconhece que boa parte dos livros contendo roteiros de filmes de sucesso foram escritos a posteriori.
No percurso traçado pelos trabalhos aqui reunidos, chama atenção a tremenda instabilidade de termos e procedimentos usados
na prática da escrita de roteiros e de certo modo reproduzidos nos estudos da área. Trata-se, claro, de um sintoma da juventude do
campo. Ao mesmo tempo, é também algo que decorre de sua história, uma história de matrizes sobretudo anglófonas, marcada por
importantes mudanças no papel do roteiro no fazer cinematográfico.
Se a diversidade vocabular do inglês – "screenplay", "screenwriting", "script", "continuity script" e "scriptwriting", entre outras
expressões – não raro se traduz para o português simplesmente como "roteiro", seria impreciso encarar esses termos como sinônimos
sem observar que há, sim, perda de sentido na tradução para o português. O que distingue hoje (e em outras épocas) argumento,
sinopse, decupagem, tratamento, roteiro, roteiro técnico? Diferentes palavras designam realidades distintas, indo do objeto que,
impresso (às vezes dobrado, amassado, molhado pela chuva), serve como guia em um set de filmagem, até a narrativa contida em
determinado filme e reconhecida em uma premiação. Os estudos de roteiro precisam lidar com variações terminológicas e combater
imprecisões envolvidas no gesto de traduzir e incorporar referências vindas de idiomas estrangeiros.
Embora as reflexões formalmente acadêmicas na área sejam recentes, o debate sobre o que é o roteiro e suas implicações não
havia passado despercebido por autores clássicos da teoria do cinema, como Béla Balázs, e cineastas-ensaístas, como Pier Paolo
Pasolini. Tradicionalmente o roteiro foi compreendido como forma passageira, como embrião de escrita fílmica, como algo
incompleto. Em "O roteiro como 'estrutura' que quer ser outra 'estrutura'", Pasolini realiza uma das reflexões mais originais sobre o
entrelugares, o viés fronteiriço e o anseio de metamorfose que singulariza o roteiro. Já em sua primeira frase, Pasolini sintetiza com
precisão algo que ainda hoje desperta discussão: "O dado concreto da relação entre cinema e literatura é o roteiro". No ensaio, que se
inicia com essas palavras, o autor traça um criativo percurso argumentativo, mostrando como não se pode restringir o roteiro a uma
técnica cinematográfica nem tampouco defini-lo como mero objeto que serve para estabelecer um diálogo com a equipe
cinematográfica.
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Em um avanço para além do dilema classificatório e linguístico, Pasolini percebe no roteiro uma nova forma de escrita, ou
escritura, ainda em construção histórica. O roteiro implica uma leitura complementar, dadas as suas lacunas, a sua ontologia incompleta,
que acena para uma mutação futura, uma outra obra que ainda está por ser feita – o filme. O ponto interessante de sua mirada sobre
essa estrutura sequiosa de um câmbio futuro é apontar para estilos emergentes e novas poéticas, ainda em desalinho quando da redação
do ensaio, nos anos 1960.
É curioso como o argumento de Pasolini sobre a especificidade do roteiro ainda foi pouco disseminado e assimilado nos
estudos de cinema no Brasil e nas pesquisas de roteiro mais atuais. Para o poeta e cineasta italiano, o roteiro constitui-se como elemento
material básico a vincular cinema e literatura. O intrigante de seu argumento é que ele possui a semiótica como ponto de partida,
embora se articule para além dela. Ele nota a fluidez do roteiro, sua intenção de ir de uma estrutura "A", o texto literário, para uma
outra estrutura "B", o acontecimento cinematográfico. Desse modo, extrapola o viés técnico. Pasolini enaltece suas características,
mostrando como a experiência da leitura de um roteiro é uma forma de reviver, empiricamente, essa transição de estruturas.
Mais recentemente, e em consonância com o gesto proposto por Nannicelli, outras iniciativas, tanto no âmbito dos estudos
acadêmicos quanto no da produção cinematográfica e na crítica, têm reforçado a visão do roteiro como objeto artístico com valor
próprio. Nessa seara, é interessante os estudos que surgem de roteiros de filmes materialmente "inexistentes" ou "inacessíveis". De
fato, nos últimos anos, nota-se a emergência de mais pesquisas com roteiros não filmados ou que sobreviveram ao desaparecimento
dos filmes a que deram origem3. Na impossibilidade de acesso ao filme físico, o roteiro ganha relevância e não apenas permite especular
sobre características de filmes perdidos como também abre possibilidades de estudo sobre as intenções do autor, estilo, influências
etc.
Um exemplo interessante é o trabalho do Mathieu Kleyebe Abonnenc, artista e pesquisador de cinema que se debruçou, ao longo de anos, no roteiro anotado
do filme perdido de Sarah Maldoror, Fuzis para Banta, realizado na Guiné-Bissau em 1970. A esse respeito, ver KOIDE (2016). Em suas pesquisas, Gonçalo
dedica-se aos roteiros não filmados, como os escritos por Bertolt Brecht, Mário Peixoto e outros autores do cinema brasileiro (GONÇALO, 2017; 2020; 2021).
Neste dossiê, como será exposto adiante, o artigo de Marcelo Cordeiro de Mello examina um roteiro não filmado de Luiz Sergio Person e Jean-Claude Bernardet.
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Ao lado desse movimento, há a ampla proliferação de roteiros de fan fiction, que se tornaram um gênero à parte, e assim
viralizam pelas redes. Curiosamente, esses roteiros escritos por fãs não anseiam gerar filmes futuros. Sua escrita e leitura – como já
ocorre com a dramaturgia teatral – prescinde da encenação, da materialização na tela. Em sociedades contemporâneas marcadas pela
onipresença da linguagem audiovisual, os leitores de roteiros já flertam com um robusto, consistente e influente imaginário
cinematográfico e televisivo.
Por outro lado, na economia do cinema contemporâneo, surgem cada vez mais linhas de financiamento e estruturas de apoio
para o desenvolvimento do roteiro, de modo que, também em termos muito práticos, ele deixa de ser o pressuposto para o
estabelecimento do orçamento de um filme, passando a ser encarado como parte da obra. Recentemente, por exemplo, mesas de
roteiro obtiveram linhas de financiamento específicas e um estímulo de políticas públicas liderado pela Ancine, entre outras instituições.
Se no passado o roteiro era a peça inicial sem a qual não havia como obter fundos para iniciar a produção do filme, hoje televisões
públicas e privadas, festivais de cinema e outras instituições oferecem bolsas e apoios para desenvolvimento do roteiro, o que contribui
para a profissionalização da categoria em todo mundo. O roteiro consolidou-se como uma espécie de "capital semente", para utilizar
um jargão econômico caro às indústrias criativas mais atuais.
História(s) do roteiro
Se escrever para o cinema – ou para as telas – tem mesmo uma multiplicidade de significados, Steven Maras (2009) propõe-se
a abarcar essas variações num percurso histórico vasto que passa pelo exame de manuais das décadas de 1910 e 1920. No cinema
silencioso, essa escrita restringia-se, em boa parte dos casos, aos letreiros e intertítulos que apareciam entre as imagens. De acordo
com Maras (2009), até a emergência do sonoro, havia uma maior tendência em obter uma escrita junto à tela.
Com os talkies, o "script' concentrado no papel torna-se mais central e é só então que começa a se consolidar melhor a prática
do que hoje compreendemos como sendo um roteiro. Não devemos esquecer, porém, que essa conceituação é fluida e diversa de
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acordo com os diferentes contextos culturais e econômicos em que o cinema se desenvolve. Se olharmos sob o prisma do cinema
moderno, por exemplo, observamos uma valorização das escritas originais para o cinema, pedindo uma maior interação com a tela, a
escrita fílmica no espaço e a encenação.
Ao lermos alguns dos ensaios contidos neste dossiê, notamos uma inquietação comum no que tange às história(s) do roteiro
e uma atenção às mutações presentes em especial na história do roteiro no cinema brasileiro. Pareceu-nos fundamental, nesse sentido,
resgatar e dar maior visibilidade ao ensaio "Notas para uma contribuição à história do roteiro", de Hernani Heffner, publicado
originalmente em 2012. Num raro esforço de sistematização da história do roteiro no Brasil, o conservador-chefe da Cinemateca do
Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro parte da constatação da escassez bibliográfica sobre a evolução do roteiro cinematográfico
brasileiro e, com um amplo fôlego historiográfico, delineia forças, autores e percursos, sempre em relação com o contexto
internacional, abrindo trilhas para que pesquisas futuras venham preencher lacunas identificadas. Heffner vê Adhemar Gonzaga e
Pedro Lima realmente como precursores em chamar atenção para o protagonismo que o roteiro – e a dramaturgia fílmica – deveria
conquistar no cinema brasileiro. E, numa história iniciada com os scenarios dos primórdios, marcada pela qualificação e harmonização
crescentes, Heffner localiza, no Cinema Novo, um ponto de virada:
Consoante a redefinida noção de autoria, o filme não deveria ser mais um espelho bem acabado do roteiro, mas revelarse uma transformação de seus pressupostos, podendo o produto final, inclusive, distanciar-se completamente da
premissa original pelo rumo tomado pelas filmagens ou pela montagem. Cada etapa deveria repensar a anterior. Nada
de submeter-se a padrões, modelos, fórmulas de escrita, decupagem e encenação, de resto associados a uma estratégia
considerada falida, a industrial. O roteiro assumia agora uma função criativa diversa, sendo lugar de experimentação das
possibilidades futuras, desenho do caminho próprio de cada filme, instrumento heurístico da concepção e sentido da
obra acabada. Não espanta assim, que Glauber Rocha escrevesse 5, 10, 15 versões de um mesmo roteiro, como os de
Deus e o Diabo na Terra do Sol, estudados por Josette Manzoni, e que este se pautasse por uma escrita particular, irredutível
a teorias e preceitos prévios (...) (HEFFNER, 2021).
A perspectiva histórica também guia o artigo escrito por Victor Vinicius, Suely Gomes e Rodrigo de Oliveira, "O olhar das
revistas A scena muda, Cinearte e O fan sobre roteiro cinematográfico brasileiro". Ligados à Universidade Federal de Goiás (UFG), os
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autores ressaltam a centralidade temática, e até mesmo política, que o roteiro obtinha em revistas na primeira metade do século XX e
norteiam-se pela seguinte questão: qual a concepção de roteiro cinematográfico trazida por autores que publicaram sobre essa matéria
em revistas brasileiras das décadas de 1920 e 1930? A pesquisa documental empreendida observou roteiros da época, publicados nas
revistas e difundidos como pequenos trailers dos filmes.
Referência para o estudo de Heffner, Luis Alberto Rocha Mello prossegue seu trabalho sobre o roteirista e argumentista Alinor
Azevedo com o artigo "Entre o gosto artístico e o espetáculo popular: Alinor Azevedo e o argumento de Cidade ameaçada". Nele, o
autor contextualiza o debate sobre a importância do argumento e do roteiro na afirmação de um cinema popular de qualidade, além
de examinar as relações entre a escrita e as formas de financiamento vigentes a partir da segunda metade dos anos 1950. Como objeto
para estudo de caso, Rocha Mello dedica-se ao filme Cidade ameaçada (Roberto Farias, 1960), a partir de informações sobre o processo
de escrita do seu argumento por Alinor Azevedo. No meio cinematográfico brasileiro dos anos 1940 e 1950, em que pese a existência
certa disputa entre modelos (de um lado, os clássicos da indústria hollywoodiana faziam sucesso; de outro, a emergência do
neorrealismo italiano representava vigor renovado), a escrita de argumentos e roteiros era considerada, nas palavras de Rocha Mello,
"uma etapa fundamental e incontornável na realização de um (bom) filme". Por conseguinte, a atividade de escrever para cinema
gozava de "razoável prestígio, decorrente do estatuto teórico esboçado pela crítica e pelos próprios realizadores" – isso pelo menos
até os anos 1960, quando o Cinema Novo e a força do “cinema de autor” passaram a favorecer a autonomia da mise-en-scène.
O gesto historiográfico de recorrer às publicações e à cultura visual de um determinado período de modo a iluminar o processo
criativo, numa bem-vinda aliança entre história e estética, está presente no artigo "A escrita cinematográfica de Mário de Andrade em
Amar, verbo intransitivo", dos pesquisadores Marília Corrêa Parecis de Oliveira e Arnaldo Franco Junior, ligados ao Departamento de
Estudos Linguísticos e Literários da Unesp de São José do Rio Preto. Aqui, não se trata de especular sobre uma eventual passagem
para as telas, mas de entender os procedimentos envolvidos na escrita cinematográfica andradiana. Para tanto, os autores aprofundamse na analogia entre construção narrativa e decupagem fílmica, anteriormente observada por Cunha (2011), e procuram demonstrar
como os aspectos linguísticos do romance (como o uso dos verbos no presente do indicativo) e de estilo (como a progressão espaçoMONTEIRO, Lúcia R.; GONÇALO, Pablo. Apresentação
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temporal análoga à da montagem cinematográfica) "produzem não só efeitos estéticos, mas também de sentido, afetando a
interpretação do texto literário".
Método e metodologia
Do ponto de vista metodológico, não há como depreender uma unidade nos estudos de roteiro. Pode-se, no entanto, localizar
algumas tendências preponderantes. Assim, aos trabalhos mais historiográficos, somam-se aqueles de cunho analítico, com ferramentas
emprestadas dos estudos literários, dos estudos cinematográficos, da antropologia, da sociologia ou mesmo da comunicação. Dentro
dessa vertente analítica, alguns trabalhos seguem o fio de um questionamento teórico ou metodológico.
Dessa maneira, a proposição de encarar "textos de roteiros cinematográficos" como "textos literários" está no cerne do artigo
de Marcelo Cordeiro de Mello, "O roteiro de A hora dos ruminantes – os limites do literário e a ferramenta do narrador-cantador".
Doutor pela Universidade Federal de Minas Gerais, Cordeiro de Mello analisa o roteiro não filmado de A hora dos ruminantes, escrito
em 1967 pelo cineasta Luiz Sergio Person e pelo crítico e roteirista Jean-Claude Bernardet, com base na obra de José J. Veiga.
Outra questão que norteia a análise do roteiro é a presença do narrador e as transformações envolvidas na passagem da
literatura para o cinema. A relação entre cinema e literatura é, aliás, central para "Adaptação em On the Road: fendas abertas na
realidade", de Vanessa Daniele de Moraes, Ana Saggese e Lorena da Silva Figueiredo, da UnB. O artigo reflete sobre a genealogia
daquilo que as autoras chamam de "ato de adaptação". Tendo como objeto o cotejo entre o livro On the road - Pé na estrada, de Jack
Kerouac, publicado pela primeira vez em 1957, e o filme de Walter Salles lançado em 2012, o artigo vê a adaptação como "um processo
em construção pelas subjetividades", mobilizando autor (Kerouac) e diretor (Salles), numa abordagem influenciada pelas proposições
de Deleuze e Guattari e de André Bazin, especialmente no ensaio "Por um cinema impuro: defesa da adaptação".
Igualmente fincado sobre uma reivindicação teórica está o artigo "Confluências entre a cena e o gênero audiovisual", de
Carolina Amaral, da Universidade Federal Fluminense. Enquanto os manuais de roteiro ensinam a observar arcos dramáticos,
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desenvolvimento de personagens e pontos de virada, Amaral concentra-se na cena, que a autora define como "unidade dramática na
qual os personagens interagem normalmente num mesmo espaço e num mesmo tempo", "filme em miniatura" dotado de intenção e
estrutura próprias. É pelo viés do gênero que o artigo analisa as cenas da série Pousando no amor, uma das chamadas "novelas coreanas"
(ou "K-dramas").
O cinema de gênero é questão central para o artigo: "Uma nova heroína para o suburbanismo fantástico", de Pedro Artur
Baptista Lauria e India Mara Martins. Lauria e Martins apresentam o suburbanismo fantástico como subgênero definido por vincular
a maturação do protagonista à jornada do herói e que privilegia homens brancos, cis, de classe média e heterossexuais (McFadzean,
2019, p.53). Apesar disso, conforme lembram os autores, protagonistas de inúmeros filmes do subgênero fogem a tal caracterização.
É o caso do filme Mate-me por favor (2015), de Anita da Rocha Silveira, que conta a história de amadurecimento de um grupo
de meninas, enquanto corpos surgem mortos e violentados nos matagais da Barra da Tijuca. Na análise, o filme brasileiro é comparado
ao clássico Conta Comigo (Stand By Me, 1986), um dos mais famosos títulos do subgênero.
Parte integrante da vertente analítica dos estudos de roteiro, o artigo "Environmental storytelling: a articulação entre espaço e
enredo", de Joanise Levy, da Universidade Estadual de Goiás, examina o filme Um dia muito especial (Una giornata particolare, 1977),
dirigido por Ettore Scola, que divide a autoria do roteiro com Ruggero Maccari, para colocar a prova a noção de "environmental
storytelling", forjada por Henry Jenkins (2004) para pensar a arquitetura dos videogames. Em seu contexto teórico original, a "narrativa
ambiental" permitiria a adoção de procedimentos criativos capazes de articular narrativa e espaço em favor da experiência imersiva do
jogo. Em seu artigo, Levy desloca essa discussão para os estudos de roteiros cinematográficos, inferindo que o espaço, em muitos
casos, "sobredetermina o enredo" e que "o enredo se estrutura em torno do espaço, segundo as precondições do environmental
storytelling".
A pandemia de Covid-19 exigiu que fossem repensadas questões nas mais diversas áreas do conhecimento e, no caso do
cinema, alterou as práticas de espectadores diante de conteúdos audiovisuais, modificando, ainda, as modalidades de escrita fílmica,
realização e análise. Alguns artigos do dossiê dedicam-se particularmente a pensar esse tempo (pós-)pandêmico. Influenciado por
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discussões que emergiram nesse contexto, ligadas à necessidade de uma transformação radical nas relações entre seres vivos humanos
e não humanos, Simão Farias Almeida, em "Contingências socioambientais do roteiro do filme Aquarius", propõe-se a pensar o "cinema
ambiental" e, mais especificamente, o "roteiro ambiental", analisando o roteiro do longa-metragem lançado em 2016 por Kléber
Mendonça Filho e publicado em 2020. "O roteiro ambiental precisa manter a relação entre homem, ecossistemas, fauna e flora, e ainda
contingência excessos discursivos como parte de sua denúncia contra a degradação ambiental e os sentidos antropocêntricos", escreve
ele, que procura identificar como a relação entre humanos e natureza se faz presente nas páginas do roteiro de Aquarius de Kleber
Mendonça Filho, valendo-se, entre outras referências, dos estudos pós-coloniais de Homi Bhabha (1998) e de autores como Nicole
Seymour (2013), Catriona Mortimer-Sandilands e Bruce Erickson (2010).
Marcel Vieira Barreto Silva, por sua vez, dedica-se a investigar os impactos da impossibilidade de encontros presenciais na
escrita coletiva de seriados audiovisuais. Em seu artigo, "Salas de roteiristas durante o isolamento social: métodos pandêmicos de
escrita colaborativa no Brasil", o autor analisa entrevistas de roteiristas que trabalharam em sala durante a pandemia, ponderando
vantagens e desvantagens do trabalho remoto nas condições específicas deste processo criativo de séries de TV.
O roteiro de séries televisivas vem ganhando interesse por parte dos pesquisadores, num movimento que acompanha, não na
mesma dimensão, o crescimento de público que esse tipo de produção audiovisual tem conquistado. Neste dossiê, Fabiano Grendene
de Souza e Júlia Ribeiro Cazarré também dedicam-se a pensar o roteiro de séries. No artigo "Subvertendo as convenções: o estilo de
escrita do piloto de The Leftovers", eles analisam o estilo presente no piloto da série criada por Damon Lindelof e Tom Perrotta (20142017). Tendo como parâmetro publicações de Claudia Sternberg (1997) e Steven Price (2010, 2013), os autores observam como a
escrita da série subverte convenções do padrão Master Scenes de escrita de roteiros, seja no emprego de uma linguagem menos técnica
e mais literária, seja por permitir-se o que Sternberg chama de "modo comentário", desaconselhado pela maioria dos manuais de
roteiro.
Por fim, Arthur Felipe Fiel traz uma preciosa entrevista com o roteirista Lucas Paraizo, autor ou co-autor dos roteiros dos
longas Divino Amor (Gabriel Mascaro, 2019), Gabriel e a Montanha (Fellipe Barbosa, 2017), Aos teus olhos (Carolina Jabor, 2017), Divinas
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Divas (Leandra Leal, 2016) e de narrativas seriadas como A Teia (2014), O Rebu (2014), Justiça (2016) e Sob Pressão (2017-). Em sua
trajetória, Paraizo dedicou-se a pensar o roteiro e a aprender com roteiristas consagrados, tendo dirigido o documentário O Roteirista
(2011) e publicado o livro de entrevistas Palavra de Roteirista (2015), interessado nas influências e no processo criativo de diversos
autores brasileiros. Entre outras coisas, o entrevistado traz importantes considerações sobre a necessidade de o roteirista ir acumulando
tempo de vida, repertório, experiência, para só então poder fazer bem a atividade:
Porque quando a gente fala de escrever roteiro, você não está falando de executar uma fórmula, um método. (...) É
quase como se a gente fosse um médico que precisasse de uma residência. Uma residência que se baseie numa
experiência pessoal diante das transformações da vida e do mundo, ao mesmo tempo que você aproxima essa
experiência dramatúrgica. (...) Você não sai da faculdade dizendo “Eu sou roteirista profissional”. Você sai da faculdade
dizendo “Eu tenho uma formação de roteirista”. E o mercado, a tua experiência, a tua visão de mundo, as tuas
oportunidades vão te dar essa bagagem que você precisa para trabalhar. E o tempo de vida é fundamental.
Boa leitura!
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